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Vict�ria K. L. Card�so Mi�cardite Introdução Definição: inflamação do miocárdio que ocorre por exacerbação da resposta imune. ● Desencadeadores → agentes virais (mais comum), outros agentes infecciosos, agentes autoimunes, agentes farmacológicos ou não farmacológicos cardiotóxicos. ● É uma doença subdiagnosticada, por conta da baixa indicação nos critérios para biópsias (único método que confirma o diagnóstico). ● A distribuição etária é bimodal. ○ É considerada uma das principais causas de morte súbita em jovens e em atletas. Agentes etiológicos: ● Importante: ○ Enterovírus → principais agentes até 1990. ○ Adenovírus e parvovírus B19 → atuais principais agentes. ● Agentes virais: Coxsackie, enterovírus, CMV, parvovírus B19, HCV, influenza, HIV, herpes virus e Epstein-Barr vírus → principais causas. ○ A gravidade depende do vírus, da capacidade de resposta imune intrínseca do paciente, de doença cardíaca preexistente e da predisposição genética. ● Causas por hipersensibilidade: clozapina, sulfonamidas, cefalosporinas, antidepressivos tricíclicos e penicilinas. ● Causas autoimunes: Churg-Strauss, miocardite de células gigantes, Sjogren, LES, Takayasu, granulomatose de Wegener, sarcoidose e doença intestinal inflamatória. ● Bactérias: micobactérias, estreptococo, Chlamydia e Mycoplasma. ● Fungos: Candida, Aspergillus, Cryptococcus e Histoplasma. ● Protozoários: Trypanosoma cruzi. ● Toxinas: antraciclinas e cocaína. fisiopatologia (viral) Passo a passo: 1. Fase inicial: invasão do cardiomiócito por meio de receptores específicos → sem esses receptores ou correceptores, a miocardite não se desenvolve. 2. Replicação intracelular e agressão direta → lesão da membrana celular. 3. Ativação da resposta imune + (concomitantemente) proliferação viral. @p�sitivamed Vict�ria K. L. Card�so a. Ainda não se observaram anticorpos neutralizantes virais. 4. (7 a 10 dias depois) produção máxima dos anticorpos (na tentativa de eliminar o vírus). 5. Agressão do cardiomiócito e do endotélio vascular na tentativa de eliminar o vírus. 6. Reação cruzada entre os antígenos celulares, expostos pela lesão dos cardiomiócitos, com o antígeno viral. 7. Promoção de resposta imune humoral, com produção de autoanticorpos (e vai aumentando até 3 meses de doença). 8. Eliminação do vírus e regressão do processo inflamatório. Na presença de predisposição genética ou na incapacidade do sistema imunológico, há persistência da inflamação, com a presença de autoanticorpos que causam perda progressiva dos cardiomiócitos e proliferação de fibrose reparativa → remodelagem e disfunção ventricular → evolução para cardiomiopatia dilatada inflamatória (terceira fase do processo inflamatório). A partir da terceira fase pode haver cronificação do quadro → se houver associação com persistência viral = miocardite viral crônica mediada por resposta inflamatória celular com ou sem autoanticorpos. Se houver a manutenção da agressão inflamatória pelos autoanticorpos e sem presença viral = miocardite crônica autorreativa. Quadro clínico Fases evolutivas de apresentação clínica: ● Aguda: até 3 meses. ● Subaguda: 3-6 meses. ● Crônica: > 6 meses. ● Fulminante. Quadro geral: tem ampla apresentação. ● Manifestações mais comuns: ○ Dor torácica semelhante à SCA. ○ Quadro clínico de IC → arritmias ventriculares ou distúrbios de condução avançados, associados ou não a palpitações e síncope. ○ Dispneia recente ou progressiva nos últimos 3 meses. ○ Choque cardiogênico. ○ Morte súbita. ○ Quadro assintomático. ● Apresentação em crianças e adolescentes: dor torácica e sintomas constitucionais. ● Apresentação em adultos jovens: maior chance de sinais e sintomas de miocardiopatia dilatada. Obs: a ausência de outros fatores que possam justificar a clínica do paciente leva a suspeita de miocardite. @p�sitivamed Vict�ria K. L. Card�so Miocardite aguda: ● Pródromo viral: febre, mialgia, fraqueza e sintomas constitucionais (80%). ● Comum: dispnéia, palpitações, arritmias, dor torácica e IC. ○ Dor torácica: pode ser difícil de diferenciar da dor isquêmica. ■ Pode haver: alterações no ECG, aumento de troponina ultrassensível e CKMB e perda de contratilidade segmentar. ○ Insuficiência cardíaca: geralmente o diagnóstico ocorre por exclusão de outras causas (alterações valvar, isquêmica e hipertensiva). Miocardite fulminante: geralmente tem rápida progressão (< 2 semanas) e evolui para choque cardiogênico com ou sem febre e toxemia. ● Há excesso de produção de citocinas inflamatórias, pela resposta à agressão inicial. ● Obs: a disfunção ventricular pode ser reversível em até 90% dos casos, com suporte hemodinâmico adequado, para aumentar as chances de recuperação. Quadro inespecífico que pode sugerir miocardite viral: ● Infecção respiratória ou gastrointestinal < 30 dias. ● Disfunção ventricular em pacientes jovens → afastando de fatores genéticos ou heredofamiliar. ● Disfunção cardíaca de início recente ou com piora progressiva sem fator determinante. ● Dor precordial em paciente jovem. ● Dor precordial sugestiva de acometimento pericárdico. Prognóstico geral: ● Em 50% das vezes há resolução do quadro em 2-4 semanas. ● 25% dos casos evoluem com miocardite crônica. ● 12-25% evoluem com IC refratária, miocardite fulminante ou arritmia fatal. Diagnóstico Padrão ouro: biópsia. Critérios diagnósticos de Dallas: é o mecanismo responsável pelos diagnósticos de miocardite → avaliam o processo inflamatório no miocárdio pela biópsia → subdiagnóstico pela dificuldade. Nova abordagem diagnóstica: ocorre pela avaliação de quatro variáveis. 1. Quadro clínico sugestivo. 2. Alteração estrutural, funcional ou dano miocárdico (na ausência de causa isquêmica). @p�sitivamed Vict�ria K. L. Card�so 3. RNM cardíaca sugestiva. 4. Evidência de infiltrado inflamatório (pelos critérios de Dallas) ou genoma viral em biópsia miocárdica. Possíveis resultados com a nova abordagem: ● 2 critérios = suspeita de miocardite. ● 3 critérios = compatível com miocardite. ● 4 critérios = alta probabilidade de miocardite. Exames complementares ● Geral: ○ ECG → boa sensibilidade. ○ Troponina → boa sensibilidade e boa especificidade. ○ CKMB → baixa sensibilidade. ○ Anticorpos antivírus ou miosina → baixa sensibilidade e mediana para baixa especificidade. ○ Cintilografia com índio → alta sensibilidade e mediana para baixa especificidade. ○ Ecocardiograma → verifica disfunção de VE → boa sensibilidade. ○ RNM cardíaca → alta sensibilidade e alta especificidade. ○ Biópsia - Dallas → mediana para baixa sensibilidade e boa especificidade. ○ Biópsia - PCR para genoma viral → mediana-baixa para boa sensibilidade e ótima especificidade. ● Exames laboratoriais: ○ PCRT e VHS → elevados (mas não confirmam o diagnóstico). ■ São marcadores de fase aguda → reforçam a suspeita de disfunção ventricular ou dor precordial, sem doença coronariana. ■ Nas miocardites subagudas ou crônicas não costumam estar elevados. ○ BNP ou pró-BNP → elevados. ■ Podem indicar pior prognóstico. ○ Marcadores de necrose miocárdica → CKMB e troponina ultra sensível. ■ Úteis, especialmente para o quadro de dor torácica, mas não descartam o diagnóstico de miocardite, pois são pouco sensíveis e específicos. ■ Quanto mais elevados, pior o valor prognóstico. @p�sitivamed Vict�ria K. L. Card�so ○ Pouca utilidade: citocinas inflamatórias, anticorpos anti coração e sorologias virais. ● Eletrocardiograma: (pode apresentar…) ○ Inversão da onda T. ○ Supra ou infradesnível do segmento ST. ○ Supra ou infradesnível do segmento PR. ○ Bloqueios de ramo → BAV avançado. ○ Arritmias supraventriculares e ventriculares. ● Ecocardiograma: ○ Achado clássico: hipocinesia difusa associada ou não à derrame pericárdico. ○ Formas clássicas de miocardite = dilatação ventricular. ○ Quadros fulminantes = hipertrofia septal e ventrículos pouco aumentados ou normais. ○ Pode ocorrer também: ■ Alteração da contratilidade segmentar, especialmente em parede lateral.■ Hipertrofia regional. ● Ressonância cardíaca: (pode ser usada para guiar a biópsia miocárdica) ○ Alteração da contratilidade segmentar. ○ Edema miocárdico. ○ RT positivo. ○ Hipertrofia regional. ○ Dilatação de câmaras cardíacas. ○ Realce tardio, após o gadolínio. ○ Subendocardio poupado → diferente da lesão isquêmica. ● Biópsia miocárdica: ○ Ocorre por via percutânea, com acesso venoso central. ○ Complicações (2-5%) → sangramento, arritmias, perfuração miocárdica e tamponamento. ○ Baixa sensibilidade = acometimento miocárdico desigual e pode ser em segmentos de difícil acesso para o biótomo. ■ Apesar das limitações, é o padrão-ouro para o diagnóstico definitivo. ■ Geralmente se faz no ventrículo direito, às cegas, mas, se possível, deve ser guiada pela RNM cardíaca, para tentar ir @p�sitivamed Vict�ria K. L. Card�so em áreas mais específicas de lesão. ● Biologia molecular - biópsia endomiocárdica: é fundamental para o tratamento etiológico dos quadros complicados → muito importante. ○ Avaliar a inflamação. ○ Faz pesquisa quantitativa (PCR) do genoma dos principais vírus cardiotrópicos. ○ Pesquisa doenças autoimunes (miocardite eosinofílica/células gigantes). ○ Disponibilidade limitada no Brasil. Obs: na RNM cardíaca, há 3 sequências classicamente utilizadas para o diagnóstico de miocardite → realce global precoce (RPG), edema miocárdico (T2) e realce tardio (RT). Obs: pacientes com FE > 40%, a presença de RT é fator de pior prognóstico. Obs: em pacientes com FE < 40% o RT não tem informação prognóstica significativa, mas FE reduzida e presença de RT indica marcadamente mais eventos. Obs: FE preservada e a ausência de realce tardio indica menores taxas anuais de miocardite e de morte. Indicações de biópsia miocárdica: ● IC aguda (< 2 semanas) + etiologia indefinida + rápida evolução + comprometimento hemodinâmico + refratário à terapia inicial. ● IC de início recente (< 3 meses) + etiologia indefinida + doença progressiva do sistema de condução ou arritmias ventriculares complexas e sem resposta à terapia inicial em 1 a 2 semanas. ● Pacientes com doença sistêmica prévia + disfunção ventricular sistólica recente sem origem conhecida. Tratamento Suporte geral: miocardite aguda não complicada não precisa de tratamento específico → apenas medidas de cardioproteção. Apresentação clínica para o tratamento da miocardite: ● Disfunção ventricular progressiva. ● Disfunção ventricular aguda fulminante. ● Arritmias ventriculares frequentes sintomáticas. ● Distúrbios de condução atrioventricular. Alvos terapêuticos: 1. Tratamento etiopatogênico específico. 2. Tratamento da IC descompensada e da disfunção e remodelagem ventricular + prevenção da morte súbita. Medidas gerais: ● Repouso → deve-se desencorajar os exercícios físicos até completa remissão @p�sitivamed Vict�ria K. L. Card�so do quadro e recuperação da função do VE (semanas a meses). ○ Base → evitar at. física moderada e intensa por 6 meses. ○ Deve-se realizar um teste ergométrico antes do retorno das atividades. ● NÃO se usa antiinflamatório (diferente da pericardite). ● Pacientes baixo risco e estáveis: ○ Analgesia → para a dor torácica. + ○ IECA, betabloqueadores e antagonistas da aldosterona → para IC. ○ Acompanhamento: 30 dias → 3 meses → 6 meses → 1 ano. ■ Pctes com normalização da função ventricular e sem realce tardio significativo na RNM = considerar gradual suspensão dos medicamentos → retirar 1 por vez e acompanhar com eco’s periódicas). ● Pacientes com IC: considerar diuréticos + vasodilatadores (nitroprussiato/nitroglicerina). ○ Em casos mais graves considerar: (com choque cardiogênico) ■ Inotrópicos. ■ Vasopressores. ■ Balão intra-aórtico. ■ Dispositivos de assistência ventricular mecânica. Antiviral: no caso de identificação do agente pela biópsia, deve-se tratar especificamente o agente. ● Interferon-beta: para adenovírus, enterovírus e parvovírus B19. ● Ganciclovir: para herpesvírus 6. Imunossupressão: deve-se considerar na miocardite por hipersensibilidade e em doença autoimune. ● Prednisona por 24 semanas, com alterações das doses. Imunoglobulina: possui efeito imunomodulador e antiviral, mas se usa APENAS em miocardites na infância. Prescrição Paciente de 21 anos, 70 kg, previamente hígido. Iniciou há 2 dias quadro de dor torácica em pontada, reentrante, de forte intensidade, sem fatores de melhora, associada a dispneia aos esforços. Relatava quadro de infecção de via aérea superior 2 semanas antes. Foi admitido no pronto-socorro com dor. ECG de entrada apresentou supradesnível de ST, de 2 mm, em derivações precordiais. Realizado CATE de urgência que revelou coronárias @p�sitivamed Vict�ria K. L. Card�so normais, disfunção moderada de VE e hipocinesia difusa. Marcadores de necrose miocárdica positivos. RNM cardíaca revelou realce tardio mesoepicárdico em parede lateral de VE. Exame físico: pressão arterial (PA) 100 × 60 mmHg, frequência cardíaca (FC) 80, sem sinais de insuficiência cardiaca descompensada. Prescrição - Miocardite: 1. Dieta via oral hipossódica. 2. Dipirona: 500 mg, via oral (VO), 6/6 h. 3. Codeína: 30 mg, VO, 4/4 h. 4. Captopril: 12,5 mg, 8/8 h. 5. Carvedilol: 3,125 mg, VO, 12/12 h. 6. Espironolactona: 25 mg, uma vez ao dia. 7. Não administrar anti-inflamatórios. 8. Monitoração eletrocardiográfica. 9. Repouso relativo. @p�sitivamed
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