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0 1 Disciplina: Acordos e Convênios com as Organizações Sociais Autores: M.e Thiago Perez Bernardes de Moraes Revisão de Conteúdos: Esp. Murillo Hochuli Castex Designer Instrucional: Esp. Murillo Hochuli Castex Revisão Ortográfica: Esp. Alexandre Kramer Morgenterm Ano: 2020 Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de Marketing da Faculdade UNINA. O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança de direitos autorais. 2 Thiago Perez Bernardes de Moraes Acordos e Convênios com as Organizações Sociais 1ª Edição 2020 Curitiba, PR Faculdade UNINA 3 Faculdade UNINA Rua Cláudio Chatagnier, 112 Curitiba – Paraná – 82520-590 Fone: (41) 3123-9000 Coordenador Técnico Editorial Marcelo Alvino da Silva Conselho Editorial D.r Alex de Britto Rodrigues / D.r Eduardo Soncini Miranda / D.r João Paulo de Souza da Silva / D.ra Marli Pereira de Barros Dias / D.ra Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd / D.ra Wilma de Lara Bueno / D.ra Yara Rodrigues de La Iglesia Revisão de Conteúdos Murillo Hochuli Castex Designer Instrucional Murillo Hochuli Castex Revisão Ortográfica Alexandre Kramer Morgenterm Desenvolvimento Iconográfico Juliana Emy Akiyoshi Eleutério Desenvolvimento da Capa Carolyne Eliz de Lima FICHA CATALOGRÁFICA MORAES, Thiago Perez Bernardes de. Acordos e Convênios com as Organizações Sociais / Thiago Perez Bernardes de Moraes. – Curitiba: Faculdade UNINA, 2020. 64 p. ISBN: 978-65-87972-88-6 1.Acordos. 2. Convênios. 3. Organizações sociais. Material didático da disciplina de Acordos e Convênios com as Organizações Sociais – Faculdade UNINA, 2020. Natália Figueiredo Martins – CRB 9/1870 4 PALAVRA DA INSTITUIÇÃO Caro(a) aluno(a), Seja bem-vindo(a) à Faculdade UNINA! Nossa faculdade está localizada em Curitiba, na Rua Cláudio Chatagnier, nº 112, no Bairro Bacacheri, criada e credenciada pela Portaria nº 299 de 27 de dezembro 2012, oferece cursos de Graduação, Pós-Graduação e Extensão Universitária. A Faculdade assume o compromisso com seus alunos, professores e comunidade de estar sempre sintonizada no objetivo de participar do desenvolvimento do País e de formar não somente bons profissionais, mas também brasileiros conscientes de sua cidadania. Nossos cursos são desenvolvidos por uma equipe multidisciplinar comprometida com a qualidade do conteúdo oferecido, assim como com as ferramentas de aprendizagem: interatividades pedagógicas, avaliações, plantão de dúvidas via telefone, atendimento via internet, emprego de redes sociais e grupos de estudos o que proporciona excelente integração entre professores e estudantes. Bons estudos e conte sempre conosco! Faculdade UNINA 5 Sumário Prefácio ..................................................................................................... 06 Aula 1 – Reforma administrativa e reforma na mentalidade administrativa 08 Apresentação da aula 1 ............................................................................. 08 1.1 Mudando o curso da mentalidade e do modo de operação da administração pública ................................................................................ 09 Conclusão da aula 1 ................................................................................... 18 Aula 2 – Serviços privados de interesse público e serviços públicos .......... 19 Apresentação da aula 2 ............................................................................. 19 2.1 Interesses públicos e prestação de serviços ................................. 20 2.1.1 Terceirização e organizações sociais ......................................... 31 Conclusão da aula 2 ................................................................................... 37 Aula 3 – Organizações Sociais (OS) – Lei 9.637/98 ................................... 38 Apresentação da aula 3 ............................................................................. 38 3.1 Lei 9.637/98 – Dando forma para as Organizações Sociais .......... 39 3.1.1 Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) 42 Conclusão da aula 3 ................................................................................... 48 Aula 4 – Organização da sociedade civil – acordos de parceria – Lei 13.019/14 ................................................................................................... 49 Apresentação da aula 4 ............................................................................. 49 4.1 Acordos e parcerias entre Estado e Organizações da Sociedade Civil ............................................................................................................ 50 4.1.1 Princípios das parcerias ............................................................. 54 4.1.2 CPI das ONGs ............................................................................ 58 Conclusão da aula 4 ................................................................................... 60 Índice Remissivo ........................................................................................ 62 Referências ............................................................................................... 63 6 Prefácio O Estado é uma figura onipresente em nossas vidas, suas funções e atribuições mudaram (e continuaram a mudar) ao longo da história. Em verdade, a configuração do Estado guarda uma relação profunda com uma consonância de fatores. Nesse sentido, no Brasil, durante a Era Vargas, tem-se o início da ideia de welfare state, compreendendo o Estado como o provedor de primeira instância. Porém, no presente, essa ideia foi convertida, de forma que o Estado, de provedor, passa a ser encarado como subsidiário, que, em parceria com a sociedade civil organizada, atua para atender às mais diversas demandas sociais. Não se trata apenas de uma mudança política ou normativa, antes disso, trata-se de uma mudança de postura e mentalidade; tal mudança, por sua vez, se dá em consonância com ditames neoliberais, que trazem consigo maior anseio por austeridade fiscal, desregulamentação, liberalização econômica e promoção de privatizações. Nesse trajeto, é durante a década de 1990, no Brasil, que a reforma do Estado ganha corpo oferecendo caminho para que as entidades da sociedade civil desprovidas de finalidade lucrativas atuem em serviços não exclusivos do Estado. Aqui, fala-se de um continuum de acontecimentos, que se deu em três diferentes ciclos, sendo o primeiro contemplando o período de 1950 a 1967, o segundo de 1968 a 2003 e, por fim, um terceiro ciclo inicia-se em 2004 e vai até o presente. A ideia de ampliação do papel do terceiro setor por via da terceirização das atividades do Estado guarda uma relação direta com três termos contábeis de suma importância: disclosure, compliance e accountability. Além disso, trabalha-se aqui com a necessidade de se assistir a transparência, tanto no atendimento quanto nos aspectos legais, na prestação de contas e na gestão de resultados. Como uma continuidade em relação à Lei 9.637, de 1997, a Lei 9.637/98 é promulgada, a fim de atuar no eixo de reforma do Estado, algo que tem início ainda no começo da década de 1990, com o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. As organizações sociais, nesse cenário, se apresentam como entes não estatais, desprovidos de finalidade lucrativa e que absorvem atividadespublicizáveis. Na mesma conjuntura, a Lei nº 9.790, de 1999, baliza 7 sobre a questão das Oscip’s, definindo não só o escopo de atuação, mas também quais são as entidades que podem ou não receber tal alcunha. Na mesma sequência de uma série de diplomas legais promulgados na década de 1990, a Lei nº 13.019/2014 traz consigo a ótica de um novo marco de regulação entre parcerias que contemplam a administração pública e a sociedade civil organizada. Tal diploma normativo chama atenção para a consagração de instrumentos de participação democrática, ao mesmo tempo em que introduz caminhos para se induzir a transparência e a eficiência. Nesse caminho, chama-se atenção também para o fato de que, apesar das parcerias entre administração pública e sociedade civil se darem em razão da mudança e mentalidade quanto a práticas administrativas, tais relações, por sua vez, não estão isentas da necessidade de assistirem a princípios fundamentais da gestão pública, dentre eles, se destaca a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a finalidade, a eficiência e a publicidade. Por fim, vale a pena lembrar que, quanto à ideia de combate à corrupção, dentro das relações que envolvem o terceiro e o primeiro setor, destaca-se a “CPI das Ong’s”, que teve início em 2007, se tornando um relatório em 2010. Basicamente, aqui se chama atenção para a possibilidade de fraudes e ilícitos diversos, reforçando a necessidade de fiscalização, a fim de que as boas práticas sejam priorizadas. 8 Aula 1 – Reforma administrativa e reforma na mentalidade administrativa Apresentação da aula 1 O Estado, dentro da leitura clássica de Max Weber, é o detentor legítimo da violência, na forma de forças armadas, a fim de resguardar os indivíduos contra ameaças internas e externas. Nesse sentido, ao longo do desenvolvimento do Estado, houve uma constante mudança quanto aos papéis. No Século XX, surge a ideia de welfare state (bem-estar social), no qual o Estado não deve lidar apenas com a proteção dos indivíduos, mas também com a oferta de direitos culturais, econômicos e sociais. Aqui, o Estado torna-se o provedor maior de serviços para a sociedade. Contudo, essa mentalidade não dura para sempre, vindo a se alterar conforme os eventos históricos que se desenrolam. Nesse movimento, a atuação do Estado passa a ser questionada, algo que se dá concomitante com a ascensão de valores neoliberais. Nessa esteira, o Estado gradualmente deixa de ser provedor para se tornar subsidiário, havendo tanto a imposição de limites no que diz respeito ao escopo e ação do Estado, como também passa a fornecer incentivos para que organizações da sociedade civil, em parceria, passem a ofertar serviços sociais. O neoliberalismo, que é a mola ideológica de fundo a este processo, trabalha com a perseguição de alguns axiomas, como, por exemplo, a austeridade fiscal, a desregulamentação, a liberalização econômica, a promoção de privatização e a busca pela estabilização econômica. É nesse cenário que surge lugar para a sociedade civil organizada atuar de maneira protagonista dentro da esfera de prestação de serviços públicos, em parceria com o Estado, o que representa, por si só, uma guinada muito significativa no que diz respeito à mudança de mentalidade administrativa. Em suma, o Estado deixa de ser o protagonista, da mesma forma que a sociedade civil deixa de ser um foco passivo da relação, ou seja, a sociedade civil, de um lado, se “empoderou” e ganhou meios legítimos para atuar em parceria ao Estado, que, por sua vez, se tornou mais subsidiário e menos provedor. 9 1.1 Mudando o curso da mentalidade e do modo de operação da administração pública Quando falamos em Estado democrático de direito, estamos a falar também na reforma administrativa do Estado. Nesse itinerário, esse ideal novo de democracia mudou no que se entende como noção de interesse público, que passa, por sua vez, a ser interpelada como o bem-estar ofertado a toda a coletividade. Nesse sentido, tem-se a imposição de um tipo de participação popular no processo político e também em ações governamentais, efetivando junto à administração pública interesses públicos, plasmando-se aqui a ideia de Estado subsidiário. Assim, a ideia de princípio de subsidiariedade guarda relação com duas dimensões: (a) uma dimensão de limites ao Estado, que, por sua vez, deve ser resguardada à liberdade e também à autonomia por parte da sociedade civil, que, por sua vez, se faz representada em diferentes modelos, como, por exemplo, por via de pessoas jurídicas sem fins lucrativos que ofertam serviços em áreas de interesses diversos, como, por exemplo, a educação e a saúde; (b) a segunda dimensão que, por sua vez, se refere ao dever de prestar auxílio e estímulos aos desenvolvimentos de entidades por via da administração pública (PAES, 2014). Quanto à tal lógica e forma geral, é interessante anunciar que o princípio da subsidiariedade eleva a sociedade civil ao papel de protagonista dentro do eixo organizacional do Estado, concebendo, desse modo, um modelo de “cidadania ativa”, que, nessa circunstância, reconhece de um lado a importância da instância privada em lidar com os serviços relacionados ao interesse geral. Algo que se dá aliado à ideia de solidariedade; e manifestar que o antigo modelo de administração pública, baseado na meritocracia e na burocracia, passou a demandar ajustes, a fim de gerar harmonia face aos anseios sociais. A emenda Constitucional n. 19, de 1998, plasmou noções de conceitos administrativos voltados a alterar o núcleo duro da administração pública. 10 Admnistração pública Fonte: https://i2.wp.com/capacreative.co.uk/wp-content/uploads/2018/10/shutter stock1095954758.jpg?fit=3917%2C2611&ssl=1 A reforma administrativa que se pretendeu a partir dessa emenda teve como objetivo trazer alguma adequação frente à realidade do presente, para isso, foram instituídos mecanismos voltados à gestão dos negócios em âmbito estatal. Em verdade, é possível expor que, de um lado, a crise do Estado trouxe consigo a necessidade de reforma e reconstrução, do mesmo modo que, de outro lado, a globalização tornou imperativa a necessidade de se redefinirem as funções do Estado. Nesse mesmo sentido, antes de haver a integração em nível global dos mercados e também das bases produtivas, o Estado, por sua vez, tinha a alcunha de agir no sentido de prestar proteção em relação às suas economias dentro da seara da competição global. Com o avanço da globalização, houve uma diminuição muito incisiva no que diz respeito à capacidade (e à legitimidade) do Estado em continuar a agir dentro dessa linha (PAES, 2014). Na tabela a seguir, destacam-se alguns dos fatores responsáveis pela eclosão da crise do Estado que culminou no debate sobre a reforma da administração pública. https://i2.wp.com/capacreative.co.uk/wp-content/uploads/2018/10/shutter 11 O primeiro destaque se dá no âmbito da economia, em que, a partir da década de 1970 e ganhando mais força na década de 1980, muitos países se veem em meio a um cenário de retração econômica e também de endividamento. Em muitos países, aferiu-se uma lógica de estagflação, ou seja, redução da demanda agregada somado a altos índices inflacionários. Merece destaque a crise fiscal que se caracteriza pela data de capacidade por parte dos governos de financiarem as dívidas públicas. Nesses cenários, o Estado fica sem a possibilidade de criar forçosamente a elevação de tributos, o que levou muitos dos Estados a investirem maciçamente na retração de investimentos públicos. Nesse cenário, criou-se um tipo de paralisia, em que o Estado foi engessado, estando assim improdutivo na formulação e implementação de políticas voltadas ao crescimento da economia, o que, por sua vez, colaborouainda mais para a estagnação econômica. Dito de outra forma, tanto os investimentos do Estado na economia quanto no welfare state (estado de bem-estar social) foram aqui seriamente comprometidos. O terceiro ponto que deriva dos dois pontos anteriores reside na ingovernabilidade por parte dos Estados, o que se deve também a um excesso no que tange às atividades em face de falta de recursos. Essa crise de governabilidade pode ser considerada como “mitigada”, apenas quando existe equilíbrio entre a capacidade do governo de fornecer respostas à sociedade e de outro lado às demandas que emanam dela. Destaca-se aqui que o comprometimento da receita do Estado somado à redução de seu poder fez minguar a qualidade dos serviços públicos, levando eles a um nível muito aquém dos anseios da sociedade. Por fim, destaca-se a hipertrofia em forma e importância do capital privado, considerando tanto o escopo financeiro quanto a seara produtiva, levando, por consequência, a reflexos na diminuição do poder do Estado no que diz respeito à definição (autônoma, sem interferências) da política econômica. Fonte: adaptado a partir de SANO, 2003, p.22-23. No Brasil anterior à década de 1970, é possível falar em duas reformas, como se destaca a seguir, sendo uma a reforma burocrática de 1936 (que ganha corpo com Getúlio Vargas) e a segunda se dá no âmbito do governo militar (1967) e tem cunho desenvolvimentista (SANO 2003, p.26-28): ➢ Inicialmente destaca-se que a reforma burocrática do Estado levada a cabo por Vargas em 1936 tem como marco mais relevante a criação do DASP, em 1938. No eixo das inovações e dos avanços, chama a atenção às iniciativas voltadas à superação da administração patrimonialista, até então, presente ao mesmo tempo em que se tem cuidado em introduzir conceitos advindos da burocracia clássica; 12 ➢ Ainda no que diz respeito à reforma burocrática de 1936, é válido elencar que houve, no seio da administração pública, a inclusão de um sistema baseado em meritocracia para o ingresso e também para as promoções dentro do serviço público. Isso se deu com a formação de um corpo burocrático profissional e também com a criação da primeira autarquia junto com a introdução do axioma da administração indireta, que previa, sobretudo, a descentralização dos serviços públicos; ➢ Em geral, a reforma de 1936, como características, traz consigo grande ênfase tanto no controle quanto na centralização (excessiva) e também na rigidez tanto das normas quanto dos procedimentos; ➢ Quanto à reforma desenvolvimentista, que tem início em 1967, destaca- se como marco o Decreto-Lei de número 200 (do mesmo ano). Quanto às inovações aqui fomentadas destacam-se as iniciativas voltadas à superação da rigidez vinculada às normas burocráticas, ao mesmo tempo em que se promove a introdução de axiomas advindos da racionalidade administrativa, dentre eles, se destacam: controle de resultados; orçamento e planejamento; ➢ Ainda no que tange à reforma desenvolvimentista de 1967, a ênfase maior se dá em um sentido oposto ao da centralização de Vargas, ou seja, se almeja a descentralização, com foco na autonomia da gestão para as empresas do Estado e também aos órgãos que indiretamente atuam na administração; ➢ Em geral, a reforma de 1967 se dá em meio a um período amplamente marcado pela falta de concursos públicos, ao mesmo tempo em que se vê um intransponível insulamento burocrático por parte das empresas do Estado; ➢ Nessa perspectiva, a reforma de 1967 se deu em face do enfraquecimento do núcleo estratégico do Estado, de um lado, somado à existência de resquícios de práticas patrimonialistas do passado, como, por exemplo, a 13 possibilidade de contratação ao serviço público sem prévio concurso público. Como define Olsen Henrique Bocchi (2013), a ascensão do terceiro setor guarda uma relação profunda com a hipertrofia e o enraizamento do neoliberalismo. O neoliberalismo, por sua vez, tanto enquanto ideologia política como enquanto prática, tem alguns objetivos identificáveis, dentre eles, destaca- se: (a) a promoção da austeridade fiscal que, por sua vez, se dá por meio da implementação e fiscalização do controle de gastos públicos; (b) a gradual desregulamentação no que diz respeito à atividade privada; (c) a liberalização massiva tanto do comércio como também dos fluxos de capital; (d) promoção da privatização tanto das empresas estatais como dos meios de produção de forma geral; (e) a perseguição do controle (estabilização) tanto das contas nacionais quanto também dos preços (inflação). Curiosidade Natália Aurélio Vieira (2020) ensina que o contexto neoliberal no Brasil é incorporado, a princípio, na década de 1990, pela ortodoxia da política macroeconômica e também por outros fatores que são incorporados pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, mas que já estavam em curso desde a agenda de Fernando Collor. Dentre esses fatores, destaca-se a privatização de empresas públicas, que se deu junto com a promulgação do fim do direito de monopólio estatal por parte de setores de comunicações e também do petróleo. Nesse cenário, deu-se tratamento diferenciado (especial) no que diz respeito ao capital estrangeiro, ao mesmo tempo em que se buscou um saneamento do sistema financeiro. Aqui, se aferiu uma reforma parcial da previdência social, ao mesmo tempo em que houve a renegociação de dívidas estaduais, algo que se tornou ainda mais relevante frente à aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal e também a consequente busca do ajuste fiscal, a partir do ano de 1999. Como resposta adaptativa a este cenário, foram criadas agências reguladoras diversas para os serviços de utilidade pública e também o estabelecimento mais incisivo de um sistema de metas da inflação lastreado pelo modelo de política monetária. É possível traçarmos algumas diferenças entre o liberalismo clássico e o neoliberalismo. De um lado, o liberalismo promove o combate às restrições pré- capitalistas. De outro lado, o neoliberalismo empenha esforços contra o goula Realce goula Realce 14 capitalismo, enquanto ato sujeito ao “sindicalismo” e ao welfare state (estado de bem-estar social). Do mesmo modo, o liberalismo, de um lado, entende a necessidade do desmantelamento das zonas agrícolas autossuficientes, enquanto, por outro lado, o neoliberalismo entende que o Estado pode promover muitos prejuízos em relação à indústria nacional, seja ela pública ou privada. No mesmo sentido, em sua raiz, o liberalismo promoveu a abertura de mercados convertendo camponeses em proletários. Por outro lado, o neoliberalismo propõe uma mudança do mercado interno ao externo, a fim de atender a demanda do mercado internacional. Nesse panorama, o neoliberalismo tende a converter os trabalhadores em assalariados autônomos ou informais. O liberalismo entende a necessidade de se aceitar tanto a legislação trabalhista como a previdência, e também a existência de empresas públicas, mas, ainda assim, promoveu o estímulo ao crescimento das cidades e também dos complexos urbanos e industriais. De outro lado, o neoliberalismo tende a comprometer tanto o movimento trabalhista quanto a legislação social e trabalhista. Não obstante, o neoliberalismo, em algum nível, prejudica as cidades, aumentando a proliferação das favelas e o escopo de divisão entre ricos e pobres (BOCCHI, 2013). Podemos, dentro dessa rota, exprimir que o ideal neoliberal se plasmou de maneira material e isso se configura, por exemplo, pela privatização das estatais, por meio de uma austeridade lastreada em cortes fiscais, a fim de se galgar a estabilização econômica, mesmo que isso coloque em xeque a manutenção dos empregos, do poder de compra e também da efetivação de direitos sociais e culturais. Como um tipo de contrapeso, têm havido alianças entre o poder público e a iniciativaprivada (terceiro setor) para a execução de projetos diversos. Trata-se de um tipo de política de desagregação da iniciativa estatal, que é levada a cabo por instituições diversas, seguindo aqui os anseios delineados pelo legislador na Constituição de 1988 (BOCCHI, 2013). De um lado, aquilo que entendemos como Estado é o que se materializa na forma do setor público e sua diversa ramificação e segmentos. No Caso brasileiro, essa figura jurídica se divide em governo municipal, estadual e federal. Aqui, de maneira geral, se tem o primeiro setor. Quanto ao segundo setor, tem- se um tipo de constituição que se dá por meio do âmbito privado, lastreada por atividades econômicas que são reguladas pelo Código Civil. Nesse segmento se 15 encontram sociedades mercantis, empresas comerciais e outras pessoas jurídicas e físicas empenhadas em atividades lucrativas. Podemos dizer que no vácuo formado entre o primeiro e o segundo setor, existe o surgimento de atividades solitárias ou sociais, desprovidas da busca de lucro. Tem-se, nesse bojo, o terceiro setor, constituído por meio de organizações não governamentais, fundações e associações da sociedade civil. Verifica-se que isso não é uma prerrogativa do Brasil, ao contrário, toda nação, em seu nível mais básico, suporta esses três diferentes setores: social político e econômico; ou seja, esses setores coexistem em um cenário comum. Cada setor, nesse eixo, detém diferentes responsabilidades ligadas a suas atividades, contudo, podemos declarar que esses três níveis estão interconectados (os setores somam esforços entre si). Nesse mesmo sentido, cada um destes setores tem instituições que o constituem e o distinguem dos demais, sendo elas projetadas para demandas específicas que, em geral, envolvem a direção das atividades humanas (BOCCHI, 2013, p.14-15). Ana Cristina Gomes (2015) é otimista ao afirmar que contemporaneamente vivemos a ascensão da democracia no Brasil, de um lado; nosso país nasce em um império de gestão colonial que, por sua vez, foi amplamente marcada pela exploração. A República aqui só se constitui em 1889, experiência republicada que passa a ser marcada no período de 150 anos, por períodos extensos ditatoriais, que, por sua vez, influenciaram de maneira muito significativa todo o corpo da produção legislativa, levando o sistema jurídico pátrio a se transformar em um instrumento político tanto de repressão quanto de controle. Como um legado não tão positivo disso, afere-se, em alguma medida, haver no Brasil um tipo de descaso moral no que diz respeito ao uso não legítimo das fontes orçamentárias dentro do âmbito da administração pública, que, por sua vez, passa a ser largamente marcada pela utilização ruim dos recursos que são gerenciados pelo Estado. Não obstante, destaca-se também o emprego de funções públicas, como as estatutárias, as comissões eletivas ou mesmo os cargos de confiança, que, tomados em conjunto, não raro, são empregados em proveito próprio. De maneira generalizada, é trágico afirmar, mas o prejuízo é quase sempre repassado de maneira compulsória para a sociedade, que se vê direta e inteiramente afetada de maneira coletiva com os danos colaterais da corrupção. 16 Dentro dessa seara, não é exagero indagar que a sociedade tende a pagar um elevado preço no que diz respeito aos desmandos e abusos perpetrados por aqueles que têm a prerrogativa de zelar pela administração pública. Aqui se fala, sobretudo, em desvios, tanto éticos quanto morais, que, por sua vez, são acompanhados de custos inexoráveis às cores públicas, que ajuda a hipertrofiar ainda mais a falta de capacidade do Estado e promover justiça e cidadania. O primeiro grande exemplo de reforma administrativa se deu na Inglaterra, com uma reforma que levou à redução de custos e alguma melhoria no próprio sistema, representando um tipo de modelo aos demais países durante as décadas seguintes, sobretudo no que tange à mudança do papel do estado enquanto único provedor de desenvolvimento econômico. Podemos afirmar que a crise do modelo burocrático que impulsionou a reforma na Inglaterra e, posteriormente, em outros países, teve alguns motivos inteligíveis, conforme bem destaca Natália Aurélio Vieira (2020, p.100-102): ➢ A crise econômica em âmbito global que ganha corpo a partir da década de 1970 e se hipertrofia (se enraizando pelos demais países em desenvolvimento) durante toda a década de 1980 (no Brasil, o período ficou conhecido como a “década perdida”); ➢ Destaca-se também que a crise fiscal de dívida se hipertrofiou ainda mais com a recusa dos contribuintes em arcar com os tributos, levando muitos governos a serem mal-sucedidos no financiamento de seus déficits, o que, por sua vez, fez ruir o estado de Welfare State (Estado de Bem-Estar Social); ➢ Nesse cenário, destaca-se uma crise de governabilidade, em que os governos passam a ter dificuldade em lidar com seus problemas, o que agrava ainda mais as demais crises que se somam; ➢ Destaca-se, por fim, o surgimento de diversas configurações em uma nova dinâmica globalizada, que diz respeito à prática de excessiva carga tributária, o que se dá somado a elevados custos tanto trabalhistas quanto previdenciários, nesse diapasão, o mercado se colocou como saúde aos goula Realce 17 excessos do estado, nesse caso, houve pressão para que a presença do Estado fosse diminuída, gradualmente, dentro da seara do mercado de trabalho. Nesse panorama, as ações da Inglaterra durante o governo de Thatcher mudaram de maneira básica em um único problema, o Estado, considerando-se a necessidade de constrição orçamentária, que, por sua vez, trouxe consigo a imposição de regulação dos cursos, que deveria se dar somada à melhoria da eficiência; ➢ Nesse novo cenário, houve como axioma a ideia de que as definições das responsabilidades dos funcionários e das agências governamentais deveriam se dar de forma clara, assim como o delineamento dos objetivos organizacionais que deveriam se dar contemplando sua própria substância e não apenas o processo administrativo; ➢ É necessário dizer também que houve uma mudança de consciência no que diz respeito aos valores de recursos públicos, em que se buscou a maximização da relação entre o recurso inicial, de um lado, e os atos realizados do outro, no que diz respeito à execução das políticas públicas, ou seja, houve a incorporação da ideia de eficiência dentro do bojo da burocracia do Estado; ➢ É importante destacar, também, que ao longo de toda a década de 1990 houve a incorporação de outras demandas, mirando-se na qualidade dos serviços, ou seja, o modelo passa a buscar tanto eficiência quanto a efetividade. Nesse quadro, a reformulação focou na descentralização da administração, a fim de facilitar a ideia de proximidade com os “consumidores” em relação ao serviço prestado, não obstante, está envolvida, aqui, também a ideia de competição entre serviços públicos, sobretudo com o incremento de novo modelo contratual, a fim de hipertrofiar o controle a avaliação; ➢ Ao longo da década de 1990, o conceito de cidadão passou a ser uma variável-chave. Nesse sentido, a relação entre cidadãos e serviços públicos passou a ser interpelada como um tipo de relação entre 18 consumidores e prestadores de serviços. Assim, houve o fortalecimento tanto dos regimes democráticos, como também o incremento de ações de accountability, aumentando tanto a transparência como também a equidade, o que, por sua vez, levou à revisão do modelo de relação com cidadãos; ➢ Não resta dúvida alguma de que o Reino Unido foi inspiração direta para a reforma administrativa que é colocada em curso no Brasil durante a década de 1990. Aqui, se fala inicialmente em um formato híbrido, afinal, serviços não exclusivos do Estado, quando ofertados pela iniciativaprivada, poderiam trazer consigo externalidades negativas, o que poderia colocar em risco os direitos humanos, ou seja, o hibridismo é a ideia de que as entidades privadas com finalidade pública não estatal e sem fins lucrativos teriam a possibilidade de atuarem no fornecimento de serviços públicos. No Reino Unido, isso se plasma, a princípio, na gestão de hospitais e universidades, que a princípio trouxeram relativo ganho na forma de gestão dos recursos e também na eficiência esperada; ➢ Os novos formatos trouxeram consigo maior autonomia no âmbito administrativo, ao mesmo tempo em que se abrem possibilidades de contratação de recursos humanos, a partir de atividades que poderiam ser executadas por outros indivíduos que não fazem parte do corpo do funcionalismo público. O que se viu aqui não foi em sentido estrito uma privatização, mas, no lugar disso, houve o repasse por parte do controle do Estado para o controle público, no mesmo cabedal que lastreia a ideia de organizações sociais brasileiras. Conclusão da aula 1 O Estado passou por uma série de mudanças ao longo de sua história e aqui não estamos falando em sentido estrito apenas do Brasil, ao contrário, falamos de uma lógica que se deu em perspectiva globalizada. No Brasil, o estado de bem-estar social ganha corpo a partir da Era Vargas, vindo a mais tarde ganhar um corpo desenvolvimentista nos governos militares. Contudo, 19 gradualmente, o papel do Estado passou a ser questionado. Dentre as razões para tal, denotam-se crises fiscais e de governabilidade, que chamaram atenção para a necessidade de restruturação do papel do Estado. Dentro desse diapasão, o Estado gradualmente deixou de ser o provedor de primeira instância para ser uma espécie de subsidiário, abrindo assim caminho para a participação direta da sociedade civil organizada em decisões administrativas e também na prestação direta de serviços públicos. Destaca-se que o Reino Unido, na figura de Margareth Thatcher, marca o ponto inicial desse tipo de convergência, que brevemente se mundializou, trazendo, assim, maior flexibilidade e autonomia no âmbito administrativo, mirando sempre o aumento de eficácia e eficiência. Atividade de aprendizagem Sabemos que o Estado de bem-estar social no Brasil ganha corpo principalmente com o governo de Getúlio Vargas, que, por sua vez, seguiu uma tendência que era própria em seu tempo de enxergar as veredas do Estado como a provedora central tanto do provimento de serviços sociais quanto do desempenho da atividade econômica. Contudo, com o passar do tempo, essa visão foi sendo alterada, o que levou, por consequência, o Estado a sair da posição de protagonista único no palco da prestação de serviços públicos, sendo que agora passa a ser um tipo de subsidiário que atua em parceria com a sociedade civil organizada. Em sua opinião, no Brasil, a reforma do Estado trouxe ganhos em eficiência e eficácia no que tange à administração pública e prestação de serviços? Aula 2 – Serviços privados de interesse público e serviços públicos Apresentação da aula 2 Olá, aluno. Podemos dizer que na década de 1990 se intensificou o movimento pela reforma do Estado, o que, por sua vez, se fez em consonância com alguns objetivos, dentre eles, a transferência aos entes não estatais de serviços não exclusivos ao Estado, o que caminhou junto com a demanda por maior flexibilidade e também para uma mudança de foco perceptivo, na qual o cidadão passa a ser visto como um “usuário” ou um tipo de “cliente”. Em todo 20 caso, almeja-se nesse bojo a hipertrofia dos laços que unem sociedade civil e Estado. Aqui falamos na ascensão do terceiro setor (compreendendo aqui a sociedade), que, por sua vez, faz sua atuação junto ao primeiro setor (Estado) e também ao segundo setor (iniciativa privado com finalidade lucrativa). No Brasil, merece destaque o chamado sistema “S”, constituído de personalidades jurídicas de direito privado desprovidas de finalidade lucrativas e que são voltadas a serviços sociais ou de assistência e ensino, tendo-se como exemplo o SESC, o SESI, o SENAI e o SENAC. Destacam-se também nessa rota as entidades de apoio, as Oscip’s e as OS’s. De maneira geral, quanto às OS’s, vale a pena lembrar que elas são voltadas a fornecer serviços eficazes e efetivos (com menor custo), ao mesmo tempo em que permitem a participação da sociedade civil nas atividades gerenciais, e a prestação de serviços vai integrar de maneira continuada todos os brasileiros. É importante salientar também que o terceiro setor se desenvolve em um ciclo histórico marcado por, pelo menos, três etapas, sendo a primeira de 1950 a 1967, a segunda de 1968 a 2003 e, por fim, a última inicia-se em 2004 e vai até o presente. A terceirização começa a se tornar o atributo dominante, que traz consigo limites à atuação do Estado, de maneira geral. Contudo, as parcerias entre Estado e sociedade devem assistir parâmetros, como disclosure, compliance e accountability. Do mesmo modo, o terceiro setor deve fornecer meios inteligíveis para o provimento de transparência tanto no que diz respeito ao atendimento quanto aos aspectos legais, à prestação de contas e, principalmente, à gestão de resultados. 2.1 Interesses públicos e prestação de serviços Na década de 1990, não apenas no Brasil, mas no mundo, de forma mais ampla, viu-se um aumento da agenda que pleiteou a reforma do Estado. Nesse sentido, destacam-se na tabela a seguir os principais objetivos vinculados à reforma do Estado na década de 1990 (o que diz respeito aos serviços não exclusivos do Estado), conforme a análise dos diplomas legais. 21 Realizar a transferência aos setores não estatais dos serviços não exclusivos que, por sua vez, estejam ainda em execução por parte da esfera estatal, por meio de programa de publicização, o que, por sua vez, gera meios para absorção de diferentes entidades, que são qualificadas sob a alcunha de “organizações sociais”. O objetivo maior está em fornecer tanto flexibilidade quanto autonomia (e também maior responsabilidade) aos dirigentes privados dos serviços. A ideia é dar foco ao “cidadão-usuário”, que, por sua vez, tem maior controle dos serviços, por meio de conselhos administrativos. É importante aqui o fortalecimento das práticas e também a adição de instrumentos que fornecem privilégios para a participação da sociedade tanto no que diz respeito a formulações quanto na avaliação do desempenho das organizações sociais e no efetivo controle social. O resultado final que se almeja é o fortalecimento dos laços de parceria entre sociedade civil e Estado. O Estado, nesse escopo, continua a financiar atividades públicas, que, por sua vez, são absorvidas pelas organizações sociais, que são qualificadas, sendo elas, por sua vez, responsáveis em apresentar resultados que foram acordados por meio de contratos de gestão. Fonte: adaptado a partir de SANO, 2003, p.40-41. Importante É desse modo que o Estado abre parcerias com entidades privadas, o que, por sua vez, modifica seu campo de atuação, que passa a se centrar na ideia de editor de normas especiais e também instituidor de novos modelos pautados em gestão participativa, o que influencia e molda de maneira geral o repasse de recursos públicos por particulares que se inserem no campo de organizações sociais que preveem contrato de gestão. É imprescindível lembrar aqui que contrato de gestão enquanto instrumento selado entre entidades qualificadas como organizações sociais e o poder público com o objetivo de celebração de parceria para a execução de atividades consiste, de maneira geral, em um tipo de convênio, não se comportando assim a necessidade de processos licitatórios (PAES, 2014). Quando falamos em terceiro setor, nos remetemos a organizações sociais, contudo, conforme sedestaca na tabela a seguir, é preciso que façamos, antes disso, uma diferenciação contemplando-se tanto o terceiro setor quanto o primeiro e o segundo. 22 Primeiro setor É aquilo que se plasma na figura de governo e que fornece instrumentos às diferentes searas estatais, funcionando como um provedor coletivo frente às diversas demandas sociais. Segundo setor Se constitui a partir da iniciativa privada, que, por sua vez, tem a prerrogativa de zelar pelos meios de produção que se colocam como voltados a atender tanto demandas individuais quanto anseios particulares. Terceiro setor Traz uma seara de participação da sociedade que se integra, por sua vez, na forma de organizações sem fins lucrativos (não governamentais) e que são inclinadas à resolução dos mais diversos problemas sociais, por meio de diversos sopros de serviços públicos. Fonte: adaptado a partir de SILVA; COSTA; MORAES, 2019, p.114. Em um esforço didático de ampla relevância, José Sérgio da Silva Cristóvam, Mateus Stallivieri da Costa e Arthur Bobsin de Moraes (2019, p.114- 117), a fim de definir os diversos tipos de OS’s: ➢ Primeiramente, vale a pena chamar atenção para os serviços sociais autônomos que compõem o Sistema S, basicamente, entidades que são constituídas por lei e que têm personalidade jurídica de direito privado, sem haver, contudo, finalidade lucrativa. Aqui, se fala de entidades que têm como fim a prestação de serviços sociais correlatos à assistência ou ensino, e que se ligam a categorias profissionais ou sociais específicas; como exemplo, podemos destacar o SENAC, o SENAI, o SESI e o SESC; ➢ Na mesma esteira, verifica-se a importância das entidades de apoio, que podem ser compreendidas como pessoas jurídicas (de natureza privada), que nessa circunstância exercem sem finalidade lucrativa atividades sociais relacionadas ao âmbito da educação, da saúde ou, ainda, ciência e pesquisa. Dentro desse hall, estão incluídas as fundações de apoio que goula Realce 23 se dedicam à colaboração com instituições, sejam de pesquisa ou de ensino, por via de convênio ou contratos com faculdade e universidades; ➢ Já as Oscip’s foram reguladas pela lei federal de 1999, de número 9.790, e também por decreto do mesmo ano, de número 3.100, pela portaria do Ministério da Justiça de 1999, número 361. As Oscip’s foram definidas como sendo pessoas jurídicas (de direito privada) desprovidas de finalidade lucrativa, que, por sua vez, são instituídas por meio de iniciativas particulares, a fim de prestar serviços sociais que não são exclusivos do Estado; ➢ De maneira geral, a figura das OS’s surge no âmbito da reforma da administração pública brasileira, mais precisamente durante a segunda metade de 1990, o que, por sua vez, esteve previsto no Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, que teve como objetivo a busca de alternativas para elevar a evidência dos serviços públicos prestados (não exclusivos do Estado) e que são identificados como serviços sociais. As OS, em geral, são enquadradas como o tipo de entidades de colaboração, todavia, é importante destacar que em muitos casos existe uma particularidade que exerce distinção: essas entidades prestam serviço público a partir de delegação promulgada por parte do poder público, ou seja, aqui elas literalmente substituem a administração pública no que diz respeito a um tipo de atividade. As OS’s prestam atividades por meio de bens públicos, não raro, essas entidades contam com serviços públicos em seus quadros e, no geral, são entidades sustentadas por meio dos recursos públicos. Conforme se destaca na tabela a seguir, os principais resultados almejados (vislumbrando as OS’s) no que tange a forma do Estado são: Fornecer aos cidadãos serviços eficazes, efetivos e eficientes, contemplando-se menor custo e maior impacto quanto aos anseios da sociedade. Participação da sociedade no que diz respeito aos gerenciamentos das entidades que fazem uso de recursos públicos para a prestação de serviços. 24 Prestação de serviços íntegra, de maneira continuada a todos os cidadãos do Brasil. O poder Público nesse horizonte se compromete a acompanhar a gestão levada a cabo pelas OS, com base em resultados. Para a resolução dos mais diversos problemas da área social, em âmbito nacional, espera-se a consagração de parcerias diversas entre sociedade e Estado. *** Fonte: adaptado a partir de SANO, 2003, p.41-42. Como se destaca a seguir de maneira didática e esquemática, a dra. Natália Aurélio Vieira (2020, p.79-85) compreende as atuais parcerias entre sociedade civil e Estado, como resultado da sequência de pelo menos três ciclos históricos distintos, conforme se elenca a seguir: ➢ Um primeiro ciclo vai compreender o período de 1950 a 1967. Em um primeiro momento, de 1950 até 1962, afere-se um tipo e período desenvolvimentista, em que houve diferentes medidas intervencionistas, sendo que a maior parte delas levou à hipertrofia do tamanho do Estado. Houve aqui também a busca da industrialização por meio da substituição de importações e também o estabelecimento de planos de metas. Como resultado esperado, teve-se crescimento e contenção da inflação em algum nível. De 1963 a 1964, tem-se a ruptura institucional, com crise política e o desencadeamento da ditadura militar, tendo-se, a princípio, menor deslocamento, maior inflação e desemprego. Por fim, de 1964 a 1967, tem-se o período de reformas estruturais, a princípio no âmbito econômico e também reforma administrativa, por meio do decreto de Lei n. 200/67. Apesar do desemprego, tem-se algum nível de contenção da inflação; ➢ O segundo ciclo corresponde a um período de 1968 a 2003. Na primeira fase, conhecida como desenvolvimentista, tem-se um caminho percorrido de 1968 a 1980, marcado por medidas intervencionistas, aumento do tamanho do Estado e também pelo Plano Nacional de Desenvolvimento, nesse sentido, aferiu-se nesse caminho a contenção da inflação e impulso ao crescimento econômico. De 1981 a 1993, tem-se um período de ruptura institucional, com o fim da ditadura e com a redemocratização com 25 o impeachment de Collor. Fora um período marcado por inflação elevada, desemprego e crescimento econômico muito baixo. Por fim, de 1994 a 2003, evidenciou-se um período de reformas estruturais, que se plasmou em reformas econômicas com a reforma administrativa, envolvendo tanto as privatizações quanto a criação das agências executivas e também a Lei das OS. Foi um período marcado por alguma redução de desemprego e contenção da inflação; ➢ Por fim, tem-se um terceiro ciclo, que vai de 2004 até o presente. Em um marco inicial, de 2004 a 2013, tem-se um tipo de caminho desenvolvimentista, marcado por medidas intervencionistas, pelo aumento do Estado e pela lógica do social-desenvolvimentismo, em um cenário marcado por um crescimento sustentável, em alguma medida, e controle inflacionário. De 2014 a 2017, assistiu-se a uma ruptura institucional, marcada por crise política e pelo impeachment de Dilma Rousseff. Aqui, se aferiu um menor deslocamento econômico, somado à elevação tanto da inflação quanto do desemprego. Por fim, de 2018 em diante, evidencia-se um esforço de promoção de reformas estruturais, sobretudo na área econômica e também por via de propostas de novas formas administrativas. Ainda aqui se aferem níveis indesejáveis tanto de inflação quanto de desemprego. Conforme se destaca na tabela a seguir, o Plano Diretor que surge na década de 1990, no contexto de reforma do Estado, tendo, então, como Ministro Bresser Pereira (que foi quem inclusive mais precocemente levantou bandeiras em prol de reformas administrativas no estado brasileiro), traça uma distinção significativa no que diz respeito a quatro setores doestado brasileiro. Núcleo estratégico Em sentido maior, se refere ao governo, de maneira geral. Trata-se do lugar em que tanto as leis como o delineamento e planejamento de políticas públicas e de decisões estratégicas são talhadas. A princípio, tem-se um corpo que se constituiu a partir do poder executivo, 26 contemplando-se tanto o presidente como seus ministros, assim como o corpo judiciário, legislativo e o Ministério Público. Atividades exclusivas São as que dizem respeito às prerrogativas que só podem ser vinculadas ao próprio Estado, como é o caso, por exemplo, do fomento, das regulações e também da fiscalização, de maneira geral. De maneira ampla, observa-se aqui a ideia de poder de política, assim como a capacidade de executar a cobrança de tributos e também o controle no que diz respeito ao meio-ambiente. Serviços não exclusivos São aqueles que o Estado pode atuar de maneira conjunta e/ou simultânea, com entidades do âmbito privado. Trata-se de um tipo de atuação que pode se dar em concomitância, por se tratar do interesse público, nesta recensão, o fomento por parte do estado almeja fornecer garantias que levem aos direitos humanos a serem assistidos e que trazem, assim, externalidades positivas para a sociedade. O setor privado, em outro diapasão, pode lidar com a oferta em parceria do Estado, sem haver, contudo, finalidade lucrativa e assim aos princípios gerenciais da administração. Produção de bens e serviços ao mercado Contempla áreas em que o Estado atua, mas que poderiam ser assistidas exclusivamente por parte do setor privado. Aqui se enquadram atividades que têm escopo lucrativo e que nessa condição poderiam ser em alguma medida objeto de privatização, como é o caso, por exemplo, de setores de infraestrutura. Fonte: adaptado a partir de VIEIRA, 2020, p.103-104. As OS’s representam um tipo de parceria entre os entes jurídicos de direitos privados desprovidos de fins lucrativos e entes públicos. Para se tornar uma OS, contudo, é necessário obter uma qualificação, que, por sua vez, se caracteriza como um tipo de ato em que se promulga um título a uma entidade privada para 27 que ela possa receber dotação orçamentária voltada para a efetivação de objetivos de atuação. As entidades qualificadas podem, nessa condição, assinar contratos de gestão com o poder público tendo em contratos como este caracterizadas as diretrizes, assim como os objetivos estratégicos, o orçamento que fora previsto e também o quadro de indicadores e metas (QIM), que, por sua vez, estabelece aquilo que deve ser entregue por parte das OS’s, indo na mesma ideia do controle, por meio de resultados em que o foco maior é a eficiência. A experiência empírica mostra, até o presente, que as OS’s encontraram na seara da saúde o seu maior campo de atuação. Aliás, em nível subnacional, existe uma parcela dos estados significativa que realiza regulamentações de modelos locais que foram aplicados à gestão de serviços de saúde e hospitais. Esse fenômeno parece ganhar corpo após a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal, que trouxe limites quanto aos gastos da administração pública. Não resta dúvida, nessa conjuntura, de que a LRF é, antes de tudo, um instrumento voltado à redução do Estado (tamanho), o que, por sua vez, incentiva a adoção de modelos voltados a organizações sociais. Se, por um lado, os instrumentos se modernizaram, por outro, novos constrangimentos legais foram impostos. Vale mencionar que parece contraintuitivo, mas não houve uma efetiva redução da intervenção do Estado, considerando que o teto se aplica aos estados, não se aplicando aos gastos de terceiros, depois do repasse dos recursos públicos. A soma dessa lógica levou à caracterização do que se entende como gasto fiscal, em que a relação privada serviu (e serve) como um tipo de instrumento, a fim de se burlar a legislação impositiva de teto de gastos (VIEIRA, 2020, p.105-107). De acordo com essa lógica, conforme se destaca na tabela a seguir, podemos asseverar que os órgãos de controle, sobretudo, o Tribunal de Contas da União (TCU), têm dificuldades em aferir nas auditorias a produtividade e a economicidade dentro do modelo OS, havendo pelo menos três lacunas em aberto. Os indicadores, que em geral são pactuados, não conseguem fornecer inteligibilidade, tampouco mensurar de maneira adequada as singularidades envolvidas no modelo “OS”. Os órgãos de controle, em parte, ainda não internalizaram a ideia do modelo “OS”, sendo que as maiores partes destes órgãos ainda estão ancoradas de 28 algum modo nas formas tradicionais de burocracia e controle da atividade administrativa. Uma hipótese que se pontua é que o modelo OS pode não ter conseguido oferecer um salto de qualidade como esperado, em termos de gestão pública. Fonte adaptado a partir de VIEIRA, 2020. Definimos como fundação toda pessoa jurídica que, nessa condição, foi concebida por um único indivíduo. Destaca-se que o que distingue a fundação está na existência de um arcabouço de bens que são qualificados como patrimônios personalizáveis e destinados, desse modo, a um tipo de finalidade que, por sua vez, é especificada por Lei Civil. Não obstante, destaca-se que o Ministério Público é o curador das fundações, de acordo com o Novo Código Civil. Ou seja, cabe ao Ministério Público fiscalizar as fundações que estiverem em sua circunscrição, nessa significação, é esta instituição que realiza a aprovação dos estatutos (em um prazo de 15 dias), como também, cabe a ela deliberar acerca de eventuais reformas ou alterações no estatuto, dando prioridade às práticas da boa administração. As fundações podem ser classificadas, no Brasil, como privadas ou públicas, no que tange à natureza jurídica do instituidor, ou seja, se durante a criação ou manutenção, de forma indireta ou direta, a participação estatal for inexistente, a fundação em questão será considerada como privada, logo, suscetível a todas as balizas promulgadas pela Lei Civil. É interessante destacar, todavia, que existe um entendimento doutrinário que compreende a criação de fundações privadas por parte do poder público, sendo essa uma tendência quando o patrimônio fundacional não se mostra adequado para a completude de seus objetivos. É válido preceituar que tal entendimento é, contemporaneamente, parcialmente acatado por parte do tribunal de Contas da União, quando as fundações de apoio às universidades em âmbito federal estabelecem distinção quanto à origem do patrimônio de destino (BOCCHI, 2013). Dentro desse arcabouço, existem dois caminhos: (a) quando tais recursos públicos são empregados por uma instituição, ela deve ser considerada como pública em seus efeitos, estando nessa condição atrelada à administração (indireta), devendo realizar a prestação de contas ao mesmo tempo em que se empregam procedimentos licitatórios para viabilização de seus gastos, buscando, sobretudo, assistir os princípios basilares da administração pública; 29 (b) Mas, se os recursos empregados pela instituição forem privados de maneira integral, a instituição, por sua vez, será considerada como privada, para todos os efeitos (BOCCHI, 2013). Na tabela a seguir, ilustra-se um exemplo importante, no Brasil, de fundações privadas instituídas por lei do poder público, a fim de fornecer apoio diverso para as universidades públicas Dentro desse escopo, não existe a exigência de concurso público como quesito de ingresso ao quadro de funcionário, mesmo que possa haver a instituição de algum tipo de processo seletivo em âmbito regimental. A partir daqui, tem-se o reconhecimento formal destas fundações como instituições de assistência social ou de ensino. Conforme detalhado no art. 150, IV da Constituição Federal de 1988, as fundações gozam de regimede imunidade tributária. De acordo com o artigo 4, parágrafo 1º da Lei nº 8.958, de 1994, a função de serviço da fundação é reconhecida ao autônomo havendo, aqui, inexistência plena de vínculo empregatício no que diz respeito aos possíveis bolsistas. Fonte: adaptado a partir de BOCCHI, 2013, p.31-32. Pensando no entendimento doutrinário e constitucional, a tabela a seguir delineia-se os conceitos centrais relativos às entidades e fundações no Brasil: Entidades Devem ser compreendidas como entidades criadas a partir de lei específica e que, por sua vez, se estruturam por meio de decreto, independentemente dos demais registros. Fundações Demandam de licitação para que contratos possam ser celebrados. Em comparação com as entidades paraestatais, as fundações possuem um regime orçamentário praticamente idêntico. Dirigentes das fundações São investidos em seus cargos, seguindo os balizamentos promulgados por lei e/ou estatuto, compreendendo, aqui, uma ideia de autoridade delegada, abrangendo também todo o pessoal que é contratado por via de regime próprio da entidade criadora, que, por sua vez, se equipara à lógica de funcionário público, no que tange aos efeitos criminais, podendo ele ser 30 passivo por parte de mandados de segurança e também por ação popular respectiva. Funções geminadas Dentro do âmbito das fundações, existe proibição no que diz respeito ao acúmulo de funções geminadas, na forma de cargo ou emprego (ou mesmo função). Fonte: adaptado a partir de BOCCHI, 2013, p.33-34. É interessante refletir também acerca da finalidade das fundações, de acordo com o Código Civil. O parágrafo único do artigo 62 entende que as finalidades podem abranger fins de assistência: morais, culturais e religiosas. Desse modo, as fundações não podem ser contratadas pelo poder público quando a finalidade dela divergir das finalidades elencadas. Vale advertir que, se uma fundação tiver finalidade diferente das aqui descritas e for contratada pelo poder público, terá a configuração a configuração de ilícita, demandando- se intervenção do Ministério Público, que é por excelência o curador das fundações. Podemos dizer que as associações, assim como as sociedades civis, são tomadas em conjunto por pessoas jurídicas talhadas por parte de união com finalidade voltada a si mesmo. Aqui, destaca-se a questão da “finalidade lucrativa”. Nesse sentido, quando houver ausência de finalidade lucrativa, tem- se um tipo de associação quando existe algum tipo de finalidade lucrativa, tem- se uma sociedade civil, como é o caso, por exemplo, de sociedades de profissões, como arquitetos, contadores, advogados, dentre outras. De acordo com a lei de 1999, de número 9.790, as sociedades civis estão vedadas para a qualificação de Oscip, considerando que elas possuem fins lucrativos, estando, desse modo, antagônica a ideia de terceiro setor ao assumir uma alcunha do segundo setor. Nesse caminho, o que distingue associações civis de fundações é o fato das primeiras contemplarem a união de pessoas para um determinado fim, enquanto que nas fundações, os bens são agrupados para se atingir um objetivo. Nas fundações não há nem associados, nem assembleias, em lugar disso, existem curadores e também um conselho de cuidadores. A maioria das ONGs, nesse entendimento, opta por assumir a forma de associação por conta dela oferecer maior escopo de liberdade de atuação (BOCCHI, 2013, p.38-40). 31 Importante Quanto aos institutos, vale conjecturar que se tem um arcabouço que não corresponde exatamente a um tipo de pessoa jurídica; a terminologia “instituto” pode ser empregada por entidades governamentais ou privadas que se constituam na forma de fundação ou mesmo como associação. Um exemplo quanto ao primeiro caso é o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e estatística) enquanto que em relação ao segundo, podemos exemplificar com o Instituto Ayrton Senna. O termo “instituto”, nesse ínterim, enquanto regra, vai se relacionar às entidades que, por sua vez, dedicam-se à produção científica, à pesquisa ou à educação, de maneira geral (BOCCHI, 2013, p.40). 2.1.1 Terceirização e organizações sociais Hironobu Sano (2003) explica que as OS’s fazem parte de um escopo de estratégias adotadas por parte do Plano Diretor da reforma do Aparelho do Estado, a fim de servir como um meio de promoção e também para flexibilizar a administração pública. Essas entidades foram pensadas no contexto da Reforma do Estado, que, por sua vez, foi levado a cabo pelo hoje extinto Ministério da Administração Federal e Reforma do aparelho do estado (reconhecido pela sigla MARE). Dentro dessa rota, as OS’s compõem um arcabouço de organizações que vão além dos modelos burocráticos tradicionais e que recebem esse nome pois foram pensadas em um período em que se buscou, sobretudo, a superação das principais deficiências (déficits) no que tange à participação da sociedade no controle e gestão social do Estado. As OS’s têm como motivação a necessidade de se investir na publicização dos atos ou, dito de outro modo, das atitudes de gestão que não são exclusivas do Estado e que podem ser veiculadas a entidades da sociedade civil organizada. O Estado, dentro desse hall, era um tipo de “promotor” antigo, no sentido de regular os processos, sendo também responsável por fornecer financiamento e por acompanhar os resultados das OS’s. Para se referir a todo cabedal de reforma administrativa do Estado e à forma como isso incentivou a ação das OS’s, Hironobu Sano (2003, p.19-24) traça uma série de apontamentos relevantes, conforme se explica a seguir: goula Realce 32 ➢ Um ponto inicial reside em observamos as reformas administrativas que se deram inicialmente no Reino Unido, onde, de um modo, apesar das mudanças, ainda existe, até o presente um tipo de luta contra a ineficiência e também incompetência que, em geral, evolui no seio da burocracia do governo. Nos últimos 100 anos, em ciclos que duram aproximadamente 10 anos, houve tentativas de reforma administrativa. Essas reformas tomadas, contudo, tiveram diferentes impactos no que tange ao funcionamento da máquina pública, mas, em geral, os objetivos oscilaram dentro do mesmo plano: (a) a melhoria da funcionalidade do governo; (b) aumento da eficiência das ações do governo; (c) desoneração do Estado; (d) eliminar o “empreguismo” (ou, utilizando termo comumente empregado no Brasil, “cabide de empregos”); (e) mitigar a corrupção, ao mesmo tempo em que se eleva a eficiência das ações governamentais; ➢ Além do Reino Unido, esse tipo de tendência reformista também se reverberou na América Latina, região marcada por fracassos governamentais e desapontamento com práticas políticas; ➢ A terminologia “reforma administrativa” refere-se ao amparo das Nações Unidas e se populariza nessa condição durante os anos 1960 e 1970, trazendo em seu bojo significados que abrangem mudanças nos elementos que constituem a administração pública quando unidade estrutural administrativa, assim como a estrutura do fluxo de processos, de pessoas, dentre outras; ➢ O conceito em questão foi gradualmente sendo ampliado, ou seja, abrangendo cada vez mais atribuições, o que levou, na década de 1990, o conceito a ser empregado como processo de reflexão sobre o papel e também sobre as vias de interação entre sociedade e Estado. Nesse sentido, instituições financeiras multilaterais, como o FMI e Banco Mundial passaram a abranger dentro de seus projetos diferentes tópicos relativos ao fortalecimento da sociedade e também de diálogo dela com o Estado, 33 com o intuito de disseminar debates sobre a natureza da sociedade e também das novas formas de organização social; ➢ A discussão, aqui, passou a se centrar, sobretudo, no próprio papel do Estado, ao mesmo tempo em queforneceu legitimidade e reconhecimento à sociedade civil e à participação dela dentro do âmbito da prestação de serviços públicos. Esse debate abrange também a criação de diferentes instituições novas para servir de instrumento de flexibilização da administração pública. Dito de outra forma, o Estado passa a perder gradualmente seu papel de protagonista na prestação de serviços públicos, para se converter em regulador e fomentador de atividades; ➢ Ao que parece, o eixo de reforma do Estado frente ao cenário de crise se resume em dois escopos centrais: (a) o da definição do que vem a ser bem público; (b) o debate acerca da oferta de bens públicos, que pode se dar tanto pelas mãos do Estado ou ainda por via de financiamentos, ficando, nesse caso, sob a responsabilidade da iniciativa privada o fornecimento dos bens públicos; ➢ A reforma do Estado teve como meta superar as limitações do modelo burocrático, mas sem, contudo, abrir mão das vantagens da existência de um corpo profissional de burocratas, por esse ângulo, o pensamento inicial se deu no sentido de viabilizar formas de flexibilização, oferecendo maior agilidade aos processos administrativos, o que tende a se reverberar na prestação dos serviços públicos. A alternativa ganhou musculatura a partir do modelo gerencial, que, por sua vez, deriva da administração privada, elencando, sobretudo, a ideia de eficiência e flexibilidade em prol da obtenção de resultados; ➢ Em geral, o movimento de reforma do Estado, que ganha corpo na década de 1970 e 1980, se deu inicialmente em países desenvolvidos vetorizados por algum nível de escassez de recursos, somado ao enfraquecimento do poder do Estado, algo que se deu junto com a hipertrofia da lógica das privatizações. Merece destaque aqui a crise do petróleo, que foi 34 engatilhada em 1973, servindo assim para o “estopim inicial” de contestação do modelo de atuação dos Estados; ➢ Basicamente, podemos definir em três vias o modelo de atuação do Estado: (a) o primeiro tende, em âmbito econômico, para o keynesianismo, que se plasma como um eixo de intervenção por parte do Estado na economia, a fim de elevar a quantidade de empregos (aumentando a demanda agregada de bens e serviços); (b) a dimensão social, por sua vez, se plasma na forma do Welfare State (Estado de Bem- Estar Social), em que a atuação do Estado passa a ganhar inclinações no sentido de promover serviços sociais; (c) por fim, sob a ótica administrativa tende ao modelo burocrático de Weber, que entende que a máquina do Estado deve atuar de maneira racional e que seja ao mesmo tempo neutra e impessoal. Conforme se destaca na tabela a seguir, quando falamos em terceiro setor e, mais especificamente, em transparências nessas entidades, estamos nos remetendo a três conceitos contábeis de elevada importância, sendo eles: disclosure, compliance e accountability. Disclosure Diz respeito à divulgação de informações por parte das organizações. Podemos harmonizar essa questão lembrando que o princípio de transparência se lastreia na ideia de disclosure (ou de evidenciação), que zela pela divulgação ampla das informações contábeis, sendo que tal divulgação deve ser feita da forma mais inteligível possível, ou seja, com ampla compreensibilidade, confiabilidade e, sobretudo, relevância. Chama atenção que, para atingir esse princípio, é preciso que os gestores desenvolvam padrões de informação, que, por sua vez, consigam atingir tanto os beneficiários como também os patrocinadores, que, tomados em conjunto, são os interessados nessa relação. Destaca-se também o papel que a internet tem prestado como plataforma indispensável de divulgação de informações e dados contábeis. Diz respeito ao nível de conformidade legal das organizações. Dentro do âmbito das organizações do terceiro setor, esse conceito de compliance 35 Compliance chama atenção para a necessidade de se observarem as demandas legais deixando explícito para a sociedade tanto quais são essas exigências quanto o modo como a organização está adotando para atender tais preceitos. Nesse aspecto, a organização deve apresentar as partes interessadas nos processos internos, que são executados visando, assim, à conformidade como atributo imprescindível, que passa pelo anseio da organização em ser dotada de maior transparência. Accountability Guarda relação com a ideia de prestação de contas. Por sua vez, a prática de prestação de contas é demasiadamente complexa, sobretudo para as entidades sem finalidade lucrativa, considerando que muitos stakeholders distintos estão envolvidos, e cada um o faz em diferentes camadas. Destaca-se, nesse ponto, que a tecnologia tem oferecido um auxílio fundamental a fim de atender às diferenciadas demandas dos stakeholders. A prestação de contas, no geral, se dá em pelo menos duas dimensões: (a) como um conjunto de padrões de desempenho, podendo tal arcabouço ser subjetivo ou exclusivo e, em geral, fomentado pelo próprio ambiente estratégico da organização; (b) a resposta, nesse caso, pode ser tanto positiva quanto reativa no âmbito interno da organização. De maneira geral, a prestação de contas, nesse eixo, serve tanto para fortalecer a imagem da organização como também para dar legitimidade a ela comprovando para a sociedade por meio de resultados o atendimento das demandas sociais. Fonte: adaptado a partir de TONDOLO et al., 2016. Conforme se elenca a seguir, de maneira didática, Rosana Rosa Portella Tondolo e colaboradores (2016, p.15-17) afirmam que a transparência em organizações do terceiro setor sem fins lucrativos deve abranger quatro escopos distintos: ➢ Transparência em nível inicial de atendimento: o objetivo maior está em identificar se a organização apresenta ou não sinais de transparência (em sua forma mais elementar). Aqui, são importantes se aferir, por exemplo, se a organização presta conta dos recursos e das ações aos financiadores dos projetos, ou mesmo se existem canais para o 36 atendimento à comunidade, como, por exemplo, e-mail ou mesmo uma homepage, rede social ou blog; ➢ Transparência em aspectos legais: basicamente, nessa dimensão, é relevante mensurar se a organização realiza a sua atuação de forma transparente no que diz respeito às demandas legais. Nessa acepção, é preciso verificar se a organização realiza a disponibilização para as partes interessadas dos documentos constitutivos, estatutos, atas e eleições da diretoria e presidência; ➢ Transparência na prestação de contas: quanto a este ponto, é importante aferir os padrões de interação e publicização fomentados pela organização. É importante aferir, por exemplo, se existe a divulgação dos relatórios contábeis dentro dos prazos outorgados por lei, ou mesmo se a organização divulga os gastos e os recebimentos de receitas de forma mensal para a comunidade. No mesmo sentido, é válido mensurar se a organização divulga os relatórios contábeis e complementares nas diversas mídias sociais (assim como se divulga também suas ações nesses meios). Por fim, vale aferir também se a organização é habituada a prestar contas dos recursos, sejam eles humanos, físicos ou financeiros, como também se divulga suas práticas para a sociedade e também se possui algum tipo de canal de ouvidoria para os beneficiários e partes interessadas; ➢ Transparência na gestão de resultados: por fim, quanto a este indicador, destacam-se quatro pontos-chave: – (a) é importante saber se a organização realiza a disposição de algum tipo de espaço para coletar críticas e sugestões da sociedade; (b) é válido também descobrir se a organização cultiva, enquanto prática, o monitoramento das atividades que serão executadas pelos colaboradores e pelos voluntários, no que diz respeito ao atendimento das demandas organizacionais;(c) É válido também perceber se a organização mantém como prática o monitoramento da efetividade e dos resultados de suas ações e; (d) é fundamental aferir se a organização tem como modo de operação a 37 implementação das sugestões que são recebidas por parte da sociedade e dos interessados, de maneira geral. Conclusão da aula 2 Ao longo da década de 1990, acelerou-se o ritmo de reforma do Estado, o que trouxe consigo maior flexibilidade, eficiência e também participação da sociedade civil organizada. Aqui, se fala da ascensão do papel de partição do terceiro setor, representado pela sociedade civil organizada, na forma de entidades sem fins lucrativos, o que se dá em um cenário marcado pelo primeiro setor (governo) e segundo setor (iniciativa privada com fins lucrativos). É valido dizer também que esse processo tem como antecedentes três períodos cíclicos, sendo o primeiro equivalente a 1960 até 1967, o segundo corresponde a 1968 até 2003 e, por fim, o terceiro período inicia-se em 2004 e vai até o presente. A atuação do terceiro setor chama atenção para três conceitos contábeis, disclosure, compliance e accountability e também para a ideia de transparência, que deve atender tanto os atendimentos quanto os aspectos legais, a prestação de contas e a gestão por meio de resultados. Atividade de aprendizagem Podemos falar na existência de três setores distintos na sociedade, sendo o primeiro setor correspondente ao Estado, o segundo relativo à iniciativa privada e, por fim, o terceiro setor, que abrange as entidades da sociedade civil sem finalidade lucrativa. Quanto ao terceiro setor, chama-se atenção para a necessidade de prestação de transparência e também de se assistir conceitos contábeis fundamentais. Nesse sentido, explique com suas palavras a diferença entre disclosure, compliance e accountability. 38 Aula 3 – Organizações Sociais (OS) – Lei 9.637/98 Apresentação da aula 3 Como um continuum em relação à Lei 9.637, de 1997, a Lei 9.637/98 é promulgada em um cenário marcado pela demanda de reformulação do Estado, algo que já caminhava, desde o início da década de 1990, por meio do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. É nesse sentido que as organizações sociais se apresentam como um modelo de qualificação não estatal que se configura a partir das necessidades da sociedade civil para que ela, por sua vez, posa absorver as atividades publicizáveis. Quanto às principais características das OS’s, destaca-se que se tratam de organizações não sujeitas às mesmas regras da administração pública e que, por conta disso, acabam por ter maior equidade na estruturação dos quadros produtivos. Ainda no que tange às OS’s, pontua-se que a Lei 8.666, de 1993, fornece maior agilidade no que tange às aquisições de bens e serviços finais, havendo também vantagens que se relacionam à gestão financeira e também que se plasmam na forma de controles finalísticos (não apenas processuais). Em geral, podemos segmentar em três escopos as diferenças entre os padrões praticados pela OS’s e pela administração pública, sendo um o de recursos humanos, o segundo, de compras e contratações e, por fim, o eixo de finanças e orçamento. Nessa mesma esteira, sobressai-se a “Lei das Oscip’s”, algo que se inicia ainda durante o primeiro mandado de FHC. As Oscip’s tendem a lidar com a promoção de assistência social e também com a oferta educacional, sendo um tipo de agente promotor de cultura que também pode se relacionar ao setor da saúde. De acordo com a Lei nº 9.790, de 1999, não podem ser classificadas como Oscip’s empresas que vendem planos de saúde e semelhantes, entidades direcionadas a auxílios mútuos e a serviços voltados a círculos estritos, organizações partidárias (e suas fundações), instituições religiosas, associações de classe, organizações creditícias, instituições hospitalares não gratuitas, escolas privadas não gratuitas, associações e entidades criadas por órgãos públicos, fundações públicas e cooperativas. goula Realce 39 3.1 Lei 9.637/98 – Dando forma para as Organizações Sociais José Eduardo Sabo Paes (2014) nos ensina que a Lei 9.637/98 nasce no contexto em que se demandava a reformulação urgente do Estado brasileiro, algo que ganha corpo desde o início dessa década com o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Nesse sentido, as organizações sociais representam um modelo de qualificação de organizações não estatais que são criadas como resposta à necessidade de reforma do Estado, viabilizando assim que entidades da sociedade civil (desprovidas de fins lucrativos) possam realizar a absorção das atividades publicizáveis, por meio de lei específica. Como antecedente à lei 9.637, destaca-se que, em 1997, foi outorgada uma medida provisória nessa minudência (1.59), que se converteu mais tarde em lei e traz consigo meios para que o poder executivo possa classificar como organização social pessoas jurídicas de direitos privados que não tenham finalidade lucrativa e que tenham atividades claramente voltadas ao campo do ensino, ao campo da pesquisa científica, ao desenvolvimento de tecnologia, ao provimento de saúde e cultura e também à preservação ambiental. Importante É interessante destacar que o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (1995) representou um esforço conjunto do presidente da Câmara da Reforma do Estado, Clóvis Carvalho (Ministro Chefe da Casa Civil) e seus respectivos membros: Luiz Carlos Bresser Pereira - Ministro da Administração Federal e Reforma do Estado; Paulo Paiva - Ministro do Trabalho Pedro Malan - Ministro da Fazenda; José Serra - Ministro do Planejamento e Orçamento; Gen. Benedito Onofre Bezerra Leonel - Ministro Chefe do Estado Maior das Forças Armadas. O documento foi elaborado a priori pelo Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado, sendo posteriormente alvo de ampla discussão no âmbito legislativo, vindo mais tarde a ser aprovada pela Câmara a Reforma do Estado no ano de 1995, no dia 21 de setembro, sendo posteriormente submetido ao então presidente Fernando Henrique Cardoso, que, por sua vez, de maneira oral publicada aprovou ela. Não resta dúvida de que a mobilização, do ponto de vista social e político assim como a reivindicação de direitos e a própria luta pela democracia, é tomada em conjunto pelo terceiro setor que, por sua vez, vê gradualmente ao goula Realce 40 longo do tempo seu protagonismo hipertrofiar em importância, sobretudo, em face do conjunto de crises contemporâneas, que abarca a própria credibilidade do regime, o bem-estar social e os desarranjos fiscais, que, tomados em conjunto, representam eixos para o esvaziamento da confiança na capacidade do Estado de superar deficiências e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Nesse cenário, o que se vê é uma modificação constante da noção de interesse público, considerando que a possibilidade impositiva de participação popular nos processos governamentais e políticos fornece vias para a efetivação e proteção dos interesses públicos, elevando a ideia de Estado subsidiário. De todo modo, é reconhecido que o Estado detém claros limites no que diz respeito ao resguardo tanto da autonomia da sociedade quanto da liberdade, nesse cenário, as pessoas jurídicas sem fins lucrativos atuam no conceito de formular a execução de políticas em áreas sociais das mais diversas, como a saúde, a educação, dentre outros campos de assistência (PAES, 2014). Dentro do mesmo diapasão das Oscip’s, as OS's (organizações sociais) foram criadas do ponto de vista legal em 1998, sob a lei 9.637. Basicamente, tratam-se de entidades privadas, constituídas a partir de pessoas jurídicas de direito privado, sendo desprovidas de finalidade lucrativa e voltadas ao exercício de atividades como ensino, desenvolvimento
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