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PROJETO INTEGRADOR: ARTES APLICADAS Elisabete Castanheira 2 SUMÁRIO 1 A ARTE, A OBRA E O PROCESSO ............................................................... 3 2 FORMAS DE ARTE .................................................................................. 23 3 DIVERGÊNCIA ENTRE ARTE E CIDADE .................................................... 43 4 ARTE E ARQUITETURA ........................................................................... 65 5 ARTE E DESIGN DE PRODUTO ................................................................ 80 6 CONTEXTO E ESTRUTURA ...................................................................... 97 3 1 A ARTE, A OBRA E O PROCESSO O primeiro Bloco da disciplina Projeto Integrador: Artes Aplicadas, busca discutir a Arte como produto e também como processo, numa abordagem preliminar, que faça sentido para uma posterior discussão sobre outro âmbito da arte: a arte aplicada. Há muitas definições para o conceito “Arte” e diversas perspectivas também, por isso, não há uma única definição que abarque toda a sua abrangência. Entretanto, o senso comum afirma que o papel da arte é promover uma reação, uma resposta, que, não necessariamente, é positiva ou negativa, sendo apenas uma reação. Além disso, veremos ainda a diferença entre “Belas Artes” e “Arte Aplicada”, pois queremos entender “O que é considerado Belas Artes? ” e “O que é considerado Arte Aplicada?”. Em alguns momentos, a arte não é apenas uma, sua personalidade é múltipla, podendo até se sobrepor. Em outros, apresenta uma dualidade: um pouco arte, um pouco técnica. Portanto, é sobre isso que queremos refletir. Vamos? 1.1 A arte, a obra e o processo A arte é parte integrante do universo humano, da essência do indivíduo. Por meio das mais distintas linguagens, plasticidades criam materialização e se consolidam enquanto obras de arte. O processo artístico promove uma ligação entre o mundo interior e o mundo exterior e, na medida em que facilita a compreensão desses dois mundos, permite maior flexibilidade no olhar, no criar e um direcionamento aprimorado dos pensamentos e atitudes. A dimensão estética do homem sempre o acompanhou ao longo da história fazendo-o se expressar de diferentes maneiras em relação ao universo reconhecido e valorizado 4 das produções artísticas e culturais, mas também em relação as suas ações cotidianas mais simples. No processo de transformações históricas, o homem iniciou a elaboração de objetos e passou a criar utensílios que, inicialmente, serviam apenas para auxiliar na superação de suas dificuldades, mas que, posteriormente, passaram a ser criados também com a finalidade de expressar suas potencialidades. Figura 1.1 - Objetos pré-históricos Um excelente exemplar é a criação do arco e da flecha, que a princípio eram apenas objetos utilitários, porém, gradualmente, tornaram-se objetos ornamentados, carregando consigo, além de uma preocupação estética, uma preocupação simbólica. O homem esculpiu a lâmina, mas também dedicou tempo à sua decoração, como uma forma de acrescentar à utilidade do instrumento: uma crença, uma reverência à divindade, por meio de algo belo. Dessa forma, assim está materializada o princípio da expressão estética do homem, pois “o facto de se falar em origens, não deve induzir em 5 um erro: não se trata de balbucios infantis ou da inexperiência dos primórdios, mas de um sistema completo e adequado de comunicação significativa” (FORMAGGIO, 1973 p. 18). Na Grécia Antiga, a arte deveria ser perfeita, uma verdadeira cópia e, enquanto obra, próxima da realidade. Logo, era teoria primeira da arte, a imitação. Havia a busca formal da representatividade da natureza, da harmonia. Este era o sentido da arte. A arte é obra da imaginação criadora, e a insistência de Platão no caráter imitativo da música afasta a ideia da mimese como mera cópia “fotográfica”. Trata-se, antes, de simbolismo imaginativo, razão por que a imitação artística não pode comportar em si verdade nem falsidade: “a arte serve ao verdadeiro ou ao falso, tertium non datur” (NOUGUÉ, s/d, p. 7). Figura 1.2 - Arte grega Durante a Idade Média, os artistas encaravam as suas obras de arte como a expressão de um louvor a Deus, o único e efetivo criador. Assim, a obra de arte persegue o ideal de beleza do criador, sendo o seu objetivo a procura pelo “belo”, feito à sua imagem e semelhança. 6 Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Meister_der_Schule_von_Nowgorod_001.jpg> Figura 1.3 – Arte: Idade Média O Renascimento, no entanto, devolveu o protagonismo do homem enquanto ser criativo, porém, a ideia de imitação e proximidade da realidade perdura. 7 Fonte: <https://artsandculture.google.com/asset/the-birth-of- venus/MQEeq50LABEBVg?hl=pt- BR&ms=%7B%22x%22%3A0.5%2C%22y%22%3A0.5%2C%22z%22%3A8.986231844672 309%2C%22size%22%3A%7B%22width%22%3A1.5957116449998494%2C%22height% 22%3A1.2375000000000007%7D%7D> Figura 1.4 – Arte: Renascimento Durante o século XIX e o início do século XX, com o advento da fotografia e depois do cinema, ocorreu uma progressiva desvalorização da dimensão imitativa da obra de arte, devido a sua dimensão expressiva. Nesse contexto, uma obra de arte só podia ser reconhecida como tal se exprimisse os sentimentos e as emoções do artista. Enquanto Kant (1974), atribui à obra de arte o desinteresse e o sentimento estético da universalidade como resultado, para Hegel (1835 apud FORMAGGIO, 1973), o belo transforma-se em ideia, sendo a manifestação da individualidade imediata, adequada a esta criação do espírito, e não apenas um conceito absoluto. Logo, a obra de arte é, na perspectiva de Jung (1964), o resultado da energia psíquica, transformada em imagens, cujos símbolos sobressaem os seus conteúdos mais internos e profundos. https://artsandculture.google.com/asset/the-birth-of-venus/MQEeq50LABEBVg?hl=pt-BR&ms=%7B%22x%22%3A0.5%2C%22y%22%3A0.5%2C%22z%22%3A8.986231844672309%2C%22size%22%3A%7B%22width%22%3A1.5957116449998494%2C%22height%22%3A1.2375000000000007%7D%7D https://artsandculture.google.com/asset/the-birth-of-venus/MQEeq50LABEBVg?hl=pt-BR&ms=%7B%22x%22%3A0.5%2C%22y%22%3A0.5%2C%22z%22%3A8.986231844672309%2C%22size%22%3A%7B%22width%22%3A1.5957116449998494%2C%22height%22%3A1.2375000000000007%7D%7D https://artsandculture.google.com/asset/the-birth-of-venus/MQEeq50LABEBVg?hl=pt-BR&ms=%7B%22x%22%3A0.5%2C%22y%22%3A0.5%2C%22z%22%3A8.986231844672309%2C%22size%22%3A%7B%22width%22%3A1.5957116449998494%2C%22height%22%3A1.2375000000000007%7D%7D https://artsandculture.google.com/asset/the-birth-of-venus/MQEeq50LABEBVg?hl=pt-BR&ms=%7B%22x%22%3A0.5%2C%22y%22%3A0.5%2C%22z%22%3A8.986231844672309%2C%22size%22%3A%7B%22width%22%3A1.5957116449998494%2C%22height%22%3A1.2375000000000007%7D%7D https://artsandculture.google.com/asset/the-birth-of-venus/MQEeq50LABEBVg?hl=pt-BR&ms=%7B%22x%22%3A0.5%2C%22y%22%3A0.5%2C%22z%22%3A8.986231844672309%2C%22size%22%3A%7B%22width%22%3A1.5957116449998494%2C%22height%22%3A1.2375000000000007%7D%7D 8 Para referenciar essa multiplicidade de possibilidades Plaza, se vale de Umberto Eco e da sua teoria da Obra Aberta, na qual o autor define a arte como uma mensagem fundamentalmente ambígua, uma pluralidade de significados em um só significante. Se por um lado, este conceito de obra de arte inaugura a chamada abertura de primeiro grau. Por outro lado, a noção de poética como programa operacional proposto pelo artista corresponde ao projeto de formação de determinada obra. Os graus de abertura da obra servirão para equacionar a participação (PLAZA, 2000 p.3). Aquilo a que chamamos obra de arte não é fruto de uma atividade misteriosa, mas um conjunto de objetos feitos por seres humanos e para os seres humanos (GOMBRICH, 1961). Cada uma dassuas características é o resultado de uma decisão pessoal do artista, expressa por meio de sua linguagem, de sua assinatura visual. Para Heidegger (1936 apud FORMAGGIO, 1973), há um aspecto lúdico na obra de arte, na medida em que se configura como um exercício projetual dos significados, ou seja, ela consolida um projeto da verdade e da luta original, através do qual a verdade se integra à obra num constante embate entre o que está visível e o que está oculto. Dessa forma, a arte como forma de expressão permite desenvolver a sensibilidade estética e a criatividade. A atividade criadora ou criatividade foi definida por Vygotsky (1982) como qualquer realização humana que concretize o novo, seja em relação ao reflexo de algum objeto do mundo exterior ou em relação a determinadas construções do cérebro ou do sentimento, que vivem e se manifestam apenas no próprio ser humano. Segundo este autor, existem dois tipos básicos de impulsos na conduta humana: 1) o impulso reprodutor ou reprodutivo; 2) o impulso criador ou combinador. O primeiro estreitamente vinculado à memória e o segundo intimamente ligado à imaginação. Vygotsky (1982), demonstra que é exatamente a atividade criadora dos indivíduos que faz com que a espécie humana possa se projetar no futuro, transformando a realidade e modificando o presente. A atividade do cérebro humano que se baseia na combinação é por ele denominada como imaginação e fantasia. 9 Na nossa mente existe um reservatório de imagens (imaginário) capaz de tornar sensível e material o lado imaterial da vida (GOMES, 2009). O processo de elaboração que permite a tangibilização desse contingente resguardado, ou seja, quando somos capazes de transferir essa “ideia” para algo tangível, a expressão visual configura uma forma de apropriação do mundo por meio de uma leitura pessoal. Nessa perspectiva, podemos dizer que criatividade é a capacidade que o indivíduo tem de concretizar algo novo, com a qual o seu imaginário contribui de forma relevante, logo, a fluidez do pensamento e o contingente criativo são complementares e se potencializem mutuamente. A expressão plástica, durante o seu processo de produção, transita entre a sensibilidade e a razão e é passível de inúmeras leituras. A produção artística é um processo de autoconhecimento e, até mesmo, de reconhecimento, acontecendo por meio de complexas operações que o indivíduo é capaz de realizar como conectar, relacionar, entender, ordenar, entre tantas outras. O indivíduo participa ativamente desse processo, percebendo a realidade e transformando, renovando, recriando, entre tantas outras possibilidades. Enquanto a obra de arte se processa, é estabelecido um diálogo entre o mundo afetivo e o cognitivo, que se complementam no desenvolvimento da sensibilidade estética e da criatividade, promovendo a estruturação da vida interior e a integração sociocultural. Nas palavras de Dondis (2007), Trata-se da subestrutura, da composição elementar abstrata, e, portanto, da mensagem visual pura. Anton Ehrenzweig1 desenvolveu uma teoria da arte com base num processo primário de desenvolvimento e visão, ou seja, o nível consciente, e, num nível secundário, o pré-consciente (DONDIS, 2007 p. 21). O nível de pré-consciência é o que Dondis (2007) define como energia visual pura, ao passo que o nível consciente é aquele passível de adquirir competência para a elaboração da composição, através do entendimento dos elementos visuais e suas técnicas de manipulação, logo, trata-se do entendimento do aspecto técnico. 1 Anton Ehrenzweig – Teórico da arte moderna e autor dos livros “A Ordem Oculta da Arte” e “Psicanálise da Percepção Artística”, entre outros. 10 Este nível se, por um lado, é mais “informado”, no sentido de ser “contagiado” pelo ambiente externo, por outro lado, é exatamente isto que pode deturpa-lo. No entanto, o que isto quer dizer? Nesse contexto, deturpar está no sentido de alterar, uma vez que este nível pode ser contaminado por “estereótipos visuais”, imagens pré-concebidas, que, supostamente, teriam qualidade, mas, na realidade, não apresentam consistência de forma ou conteúdo. A visão inconsciente provou-se capaz de coletar mais informações que um escrutínio consciente durante um tempo cem vezes mais longo a estrutura indiferenciada da visão inconsciente exibe poderes de escaneamento superiores aos da visão consciente (EHRENZWEIG, s/d apud Gray, 2005 p. 79). A obra avança, não a partir de um projeto previamente estabelecido, mas de acordo com um processo. A formulação em processo significa que a obra é um processo de formação, isto é, ela acaba por ser o processo de formação levado a termo e cada passo neste processo de construção contém em si todo o movimento. A obra, ao questionar os sentidos, funciona como um agente ativo na construção ou desconstrução de significados, podendo ainda ativar um rearranjo daquilo que já está estabelecido. Dessa forma, finalizamos, assim, o primeiro subtema deste bloco. Espero que essa discussão sobre arte tenha sido interessante. Até o próximo encontro! 1.2 Âmbito da Arte Para definirmos o conceito de arte, é fundamental delimitarmos o seu âmbito, ou seja, as suas muitas derivações. Segundo Dondis (2007), um dos principais obstáculos para o entendimento em profundidade da arte, consiste numa classificação que coloca o conceito de belas artes em oposição ao de artes aplicadas. Mas, afinal, o que são belas artes e artes aplicadas? 11 O termo belas artes está diretamente relacionado ao que se convencionou denominar artes superiores, a qual contempla as manifestações artísticas de ordem plástica ou visual. Diametralmente oposto a essa denominação, há o termo arte aplicada que, como o próprio nome indica, tem em sua essência uma aplicação prática. Essa noção é incorporada ao vocabulário da história e da crítica de arte com o auxílio da obra Les Beaux-Arts Réduits à un Même Principe, 1746, de autoria de Charles Batteaux (1713-1780). Batteaux defende ser a "imitação da beleza natural" o princípio comum e definidor da poesia, da pintura, da música e da dança, consideradas, por isso mesmo, belas-artes, distintas daquelas que combinam beleza e utilidade (a arquitetura, por exemplo) (BEAUX ARTS, 2017). Essa distinção entre arte maior e arte menor tem relação com a antiguidade clássica e a diferenciação entre as atividades “intelectuais” e “braçais”, respectivamente, as artes liberais e as artes mecânicas. De modo similar, os gregos distinguem as artes superiores (que dizem respeito aos sentidos considerados superiores, visão e audição) das menores, de modo geral associadas aos ofícios manuais e ao artesanato. "Artes nobres", porque mais "perfeitas" (século XVI); "artes memoriais", que mantêm a memória das coisas e acontecimentos (século XVI), "artes pictóricas", que trabalham com imagens (século XVII); "artes agradáveis" (Giambattista Vico, 1744), todos esses são termos empregados para classificar e hierarquizar as várias formas de criação artística (BEAUX ARTS, 2017). Essas ideias convergem com a perspectiva de Vasari2, para quem, o desempenho artístico estaria diretamente relacionado a capacidade intelectual do indivíduo e a sua potencialidade em empreender reflexões, resultando na obra artística. Esse é o caráter de “superioridade” da arte e, consequentemente, do artista, além da evidente divisão entre as “grandes artes” (pintura, escultura e arquitetura) e as demais artes, que estariam associadas à manufatura, ou seja, ao artesanato, colocando este último como uma atividade meramente braçal. Temos aqui a cisão entre artes e ofícios (BEAUX ARTS, 2017). O aprendizado da arte não ocorre mais no âmbito das associações (guildas), na qual artistas consagrados admitiam aspirantes à artistas, e o compartilhamentode saberes 2 Giorgio Vasari (1511-1574), arquiteto e pintor do Renascimento italiano. http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo3178/cr%C3%ADtica-de-arte http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo3637/renascimento 12 acontecia na prática. Há o surgimento das academias de arte, por meio de formações científicas e humanistas, o que contribuiu para o aprofundamento dessa cisão. Na perspectiva de Dondis (2007), no Renascimento, o diagrama do posicionamento de todas as artes poderia ser o que segue abaixo, no qual é possível notar uma divisão muito clara entre Belas Artes e Artes Aplicadas. É notável que, a Arquitetura se encontra muito mais próxima das Belas Artes do que da pintura ou da escultura. Além disso, os demais ofícios são todos agrupados e tomam um posicionamento extremo ao das Belas Artes firmando o seu caráter “prático”. Fonte: Dondis, 2007, p. 9. Gráfico 1.1 – Diagrama: Artes, Renascimento Ao longo do século XVIII, as academias ganham protagonismo na formação dos artistas e começam a dominar os padrões artísticos vigentes, uma vez que também começam a promover competições, premiações e exposições. Posteriormente, há uma nova cisão, mas, em relação às formações acadêmicas, pois as Academias de Arte passam a ser Escolas de Belas Artes e o ensino das artes aplicadas fica a cargo dos Liceus de Artes e Ofícios (ARTES, 2017). Se as academias separam artistas e mestres de ofícios, fazendo das belas- artes sinônimos de arte acadêmica, é possível notar ao longo da história da arte ocidental - e, sobretudo, no interior da arte moderna - aproximações entre as conhecidas como belas-artes e as chamadas artes aplicadas. Lembrando, entre outros, o exemplo do Arts and Crafts inglês, quando teóricos e artistas reafirmam a importância do trabalho artesanal diante da mecanização industrial e da produção em massa; o art nouveau europeu e http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo349/academicismo http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo355/arte-moderna http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo4986/arts-and-crafts http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo909/art-nouveau 13 norte-americano que esmaece as fronteiras entre arte e artesanato pela valorização dos ofícios e trabalhos manuais; a experiência da Bauhaus, ancorada na associação entre arte, artesanato e indústria; ou ainda o art déco, ou "estilo anos 20", que aproxima arte e design (ARTES, 2017). Logo após a Revolução Industrial, o movimento Arts and Crafts reitera o seu posicionamento contrário a divisão entre Belas Artes e Artes Aplicadas, sob pena de haver uma completa destruição do padrão estético para atender o padrão industrial. Para Ruskin, o porta-voz do movimento, esta divisão seria destrutiva e artificial uma vez que a manufatura guarda uma beleza incompatível com os processos fabris (DONDIS, 2007). Com o surgimento da Bauhaus, aparece também uma nova perspectiva acerca do âmbito das muitas artes. Walter Gropius, responsável pela escola, tinha como objetivo primeiro suprimir a fronteira entre as “oposições” - Belas Artes e Artes Aplicadas - que, na sua perspectiva impunham uma distinção entre as classes, que não concordava com os princípios sociais da Bauhaus. A transversalidade da proposta do movimento propunha um sistema sem hierarquias, no qual não havia maior ou menor importância de atividades, mas sim uma complementaridade de possibilidades. Tal abordagem, para Dondis (2007), se resumiria no diagrama abaixo, no qual várias artes estariam em um ponto médio entre as polaridades Belas Artes e Artes Aplicadas. Fonte: Dondis, 2007, p.9 Gráfico 1.2 – Diagrama: Artes, Bauhaus A proposta pedagógica da Bauhaus era reflexo da sua premissa conceitual enquanto movimento, ou seja, a formação deveria ser ampla e transversal: os alunos experimentavam distintos materiais, os mais diversos processos de fabricação, as http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo352/art-d%C3%A9co http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo352/art-d%C3%A9co http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo3179/design 14 muitas possibilidades plásticas e, sobretudo, refletiam sobre o contexto social, econômico e industrial emergente no pós Primeira Guerra Mundial. A racionalidade da Bauhaus pressupunha associar o conhecimento tecnológico adquirido até então ao campo da arte e do artesanato, o que fatalmente resultaria em produtos onde a forma (estética) e a função estariam integradas. A concepção contemporânea da “divisão” das artes visuais, Avançou para além da mera polaridade entre as artes “belas” e “aplicadas”, e passou a abordar questões relativas à expressão subjetiva e à função objetiva, tendendo, mais uma vez, à associação da interpretação individual com a expressão criadora como pertencente às “belas artes”, e à resposta à finalidade e ao uso como pertencente ao âmbito das “artes aplicadas” (DONDIS, 2007 p.10). Assim sendo, seria natural para Dondis (2007) que o diagrama contemporâneo das Belas Artes e das Artes Aplicadas tivesse a seguinte configuração: Fonte: Dondis, 2007, p.9. Gráfico 1.3 – Diagrama: Artes, Contemporaneidade A autora levanta ainda a questão da subjetividade e da objetividade na projetação. Exemplificando: quando um artesão elabora uma peça, supostamente, está presente o seu gosto pessoal, a sua visão e linguagem, ou seja, sua perspectiva subjetiva. Já, no projeto de arquitetura ou de design, por exemplo, há a necessidade de haver uma objetividade para se responder, de forma eficaz e eficiente, a uma demanda inicial. 15 Talvez na atualidade o artesanato não esteja apenas circunscrito ao âmbito da subjetividade, pois há um resgate dos saberes e fazeres que constituem a identidade de uma localidade, a cultura de um povo. A ideia que afirma que o artesanato é uma arte menor ou menos elaborada começa a tomar outro rumo, já que não poderia estar mais equivocada e distante da real importância e profundidade do artesanato. Se pensarmos um pouco, é possível dizer que o artesanato está presente desde sempre. A desvalorização sofrida pelo artesanato diante da Revolução Industrial está relacionada a valorização da perfeição imposta pelos processos industriais, contrária a “imperfeição” que a manualidade imprimia e continua a imprimir. O passar do tempo trouxe uma visão distinta da perfeição versus a imperfeição, pois afinal, o que é perfeição? E o que é imperfeição? Em oposição a essa ideia de artesanato como elemento identitário, de resgate cultural, o produto elaborado de forma artesanal tem surgido como mais valia no mercado de luxo. Marcas como Louis Vuitton, por exemplo, seguiram na produção de produtos manufaturados, e hoje se distinguem da concorrência justamente pela assinatura inigualável que seus produtos apresentam. Diante dessa reflexão sobre o artesanato, chagamos ao fim desse subtema unidade. Até a próxima! 1.3 Arte Aplicada A definição de arte pode ser complexa e não apresentar consenso, mas, definir a palavra aplicada (o) é mais simples e, num certo sentido, até literal. De acordo com a definição do dicionário para aplicada (o), trata-se de utilização, de empregar alguma coisa, pode-se definir ainda como adaptação, acomodação ou manipulação. Mas haverá sempre um sentido, um objetivo determinado. Portanto, se estamos falando de arte aplicada estamos considerando uma arte com objetivo prático 16 e que responda a determinada meta, intenção. O escopo é amplo. Estão incluídos aqui as construções, os objetos, as vestimentas, entre tantas outras coisas. Nessa perspectiva, estamos falando da arquitetura, do design, do mobiliário, da comunicação visual (design gráfico) e muitas outras formas de expressão, sempre voltadas para o desempenho de determinada função. No século XIX, o aspecto decorativo do mobiliáriocomeçava a ceder lugar à funcionalidade, de acordo com um contexto histórico cujos objetivos comerciais despontaram em virtude do êxodo para as grandes cidades na busca de oportunidades profissionais e das diferenças sociais que desse processo resultaram. A Revolução Industrial alterou não apenas os modos produtivos, mas, também, os hábitos, as necessidades, as formas de consumo, a relação com os objetos, entre tantas coisas. O artesanato não atende mais uma sociedade em desenvolvimento. Logo, Na segunda metade do século XIX, na Inglaterra, teóricos e artistas reunidos no Arts and Crafts reafirmam a importância do trabalho artesanal diante da mecanização industrial e da produção em massa. Liderado por John Ruskin (1819 - 1900) e William Morris (1834 - 1896), o movimento tem grande inclinação pela reforma social e pelas questões político-econômicas, o que o impele à junção entre arte e vida social (ARTES, 2017). Em meados do século XIX, o carpinteiro e o entalhador alemão Michael Thonet inicia a produção de móveis utilizando uma técnica, até então inovadora, de moldagem de madeiras à vapor. Para além da introdução dessa técnica, que Alvar Aalto e Charles Eames retomariam posteriormente, Thonet introduziu também a produção em série, através da padronização das peças envolvidas no projeto, o que influenciariam de forma determinante a produção industrial do século XX. 17 Na segunda metade do século XIX surge o movimento Arts & Crafts (Artes & Ofícios) liderado por William Morris e, para fazer frente ao processo mecanizado de produção, defende a produção artesanal. Na sequência, inspirado no movimento Arts & Crafts, surge o Art Nouveau que, através de formas orgânicas e curvilíneas, buscou retratar a expressão artística da natureza. Movimento bastante abrangente, o Art Nouveau viria a influenciar a manufatura de objetos, a arquitetura, as artes plásticas e as artes gráficas. Figura 1.5 - Entrada de oficina no estilo Art Nouveau, Dortmund, Alemanha 18 Figura 1.6 – O Beijo Artista: Gustave Klimt Figura 1.7 – Cartaz Art Nouveau Designer: Alfonse Mucha Figura 1.8 – Cadeira Argyle Figura 1.9 – Cadeira Hill House Arquiteto: Charles Mackintosh 3Arquiteto: Charles Mackintosh Coleções do Museu Nacional De Etnologia, Osaka ³Fonte:<https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Furniture_by_Charles_Rennie_Mackintosh#/me dia/File:National_Museum_of_Ethnology,_Osaka_-_Chair_%22Ladder-back_chair%22_- _Glasgow_in_United_Kingdom_- _Made_by_Charles_Rennie_Mackintosh_in_2006_(originally_1903).jpg> https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Furniture_by_Charles_Rennie_Mackintosh#/media/File:National_Museum_of_Ethnology,_Osaka_-_Chair_%22Ladder-back_chair%22_-_Glasgow_in_United_Kingdom_-_Made_by_Charles_Rennie_Mackintosh_in_2006_(originally_1903).jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Furniture_by_Charles_Rennie_Mackintosh#/media/File:National_Museum_of_Ethnology,_Osaka_-_Chair_%22Ladder-back_chair%22_-_Glasgow_in_United_Kingdom_-_Made_by_Charles_Rennie_Mackintosh_in_2006_(originally_1903).jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Furniture_by_Charles_Rennie_Mackintosh#/media/File:National_Museum_of_Ethnology,_Osaka_-_Chair_%22Ladder-back_chair%22_-_Glasgow_in_United_Kingdom_-_Made_by_Charles_Rennie_Mackintosh_in_2006_(originally_1903).jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Furniture_by_Charles_Rennie_Mackintosh#/media/File:National_Museum_of_Ethnology,_Osaka_-_Chair_%22Ladder-back_chair%22_-_Glasgow_in_United_Kingdom_-_Made_by_Charles_Rennie_Mackintosh_in_2006_(originally_1903).jpg 19 Ruskin reflete sobre o papel social do design, ao mesmo tempo que compreende a necessidade que este tem de recuperar o seu viés artístico, por meio da convergência entre forma, função, política e estética. Morris, ainda que fortemente influenciado pelo socialismo, não vê o design como um produto de massa, mas como um processo criativo e fator de reforma social, uma vez que ele tem um papel reflexivo no processo de concepção de produtos. Dessa forma, a arte alça a categoria de utilidade. Bauhaus, escola alemã que uniu arquitetura, arte e artesanato, teve forte relação com as ideias de De Stijl, que se deram por meio de Walter Gropius e tinham como objetivo final a integração entre artista e artesão, sempre sob a perspectiva da produção industrial e do funcionalismo. Com a mudança da escola para Dessau em 1925, a relação entre arte e indústria se fortalece e consolidam-se as marcas características do "estilo bauhaus" expressas na série de objetos confeccionados - mobiliário, tapeçaria, luminárias etc. - como as cadeiras e mesas em aço tubular criadas por Marcel Breuer (1902 - 1981) e Ludwig Mies van der Rohe (1886 - 1969), produzidas em larga escala pela Standard Möbel de Berlim e pela Thonet (ARTES, 2017). No Brasil, o artista italiano aqui radicado Eliseu Visconti, desenvolveu extensa obra no campo das artes visuais, sendo considerado o primeiro designer gráfico nacional. É de sua responsabilidade a introdução do impressionismo no Brasil, e a extensão de sua obra é tão grande quanto a abrangência do design: pinturas, cartazes, selos, capas de revistas e design de interiores. 20 Figura 1.9 – Cartaz Figura 1.10 – Cartaz Designer: Eliseu Visconti Designer: Eliseu Visconti Dois momentos históricos no Brasil contribuíram para a consolidação das artes aplicadas: A Semana de 22 e o Movimento Concreto. No primeiro momento estavam em pauta, entre outros temas, a valorização da identidade e da cultura brasileira, a liberdade de expressão, a ruptura com a tradição artística e acadêmica, além de experimentações estéticas. No segundo momento, houve o distanciamento do expressionismo, a busca por precisão da forma e da racionalidade. Em relação a literatura, o Movimento Concreto valorizou o conteúdo visual, a sintaxe visual se sobrepôs ao discurso, pois, de acordo com este movimento, o escritor está para o papel assim como o artista está para a tela, ou seja, há uma preocupação visual na elaboração textual. No Brasil, as artes aplicadas têm lugar no interior do modernismo de 1922 com os trabalhos - pinturas, tapeçarias e objetos - de John Graz (1891 - 1980) e dos irmãos Regina Graz (1897 - 1973) e Antonio Gomide (1895 - 1967). No interior do grupo concreto paulista, na década de 1950, o nome de Geraldo de Barros (1923 - 1998) se destaca pela sua proximidade com o desenho industrial e com a criação visual, sobretudo a partir de 1954, quando funda a cooperativa Unilabor e a Hobjeto móveis, dedicadas à produção de móveis. A Form-inform, também criada por ele, destina-se à criação de marcas e logotipos (ARTES, 2017). Portanto, finalizamos, assim, este bloco. Até o próximo encontro! javascript:void(0); javascript:void(0); javascript:void(0); javascript:void(0); javascript:void(0); javascript:void(0); javascript:void(0); javascript:void(0); 21 Conclusão Afinal, o que é arte? É obra? É processo? Pode parecer estranho uma conclusão começar com uma pergunta ao invés de uma resposta, mas, a Arte é isso. É provocação! É indagação! É questionamento! Ela está e, sempre esteve, presente em todos os períodos da História da humanidade e, seu desenvolvimento também sempre esteverelacionado aos mais diversos contextos sociais, econômicos e técnicos de cada um desses períodos. Teóricos, ao classificarem a Arte, buscaram identificar e alinhar objetivos que pudessem agrupar suas múltiplas possibilidades artísticas, dessa forma, a mesma se apresentou como atividades intelectuais e atividades braçais, contemplativas e práticas, “belas” e “aplicadas”, como afirma Dondis (2007). No entanto, será que, na contemporaneidade, é possível atribuir essa denominação de Arte à Arquitetura? E à Fotografia? E ao Design? São campos que articulam a técnica e o sentido estético, sim, e, justamente, por esse motivo, muitas vezes não se coadunam com classificações inflexíveis e fechadas, devido suas características híbridas. REFERÊNCIAS ARTES Aplicadas. ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 23 fev. 2017. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo908/artes-aplicadas>. Acesso em: 10 Jun. 2019. Verbete da Enciclopédia. BEAUX ARTS. ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 23 fev. 2017. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo6177/beaux-arts>. Acesso em: 09 Jun. 2019. Verbete da Enciclopédia. 22 DONDIS, D. Sintaxe da Linguagem Visual. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2007. FORMAGGIO, D. Arte. Editora: Coleção Dimensões, 1973. GRAY, J. 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Dessa forma, não cabe mais a Arte uma organização classificatória fechada ou inflexível, mas sim uma reflexão aprofundada a respeito dos modos de produção da forma. Além disso, este bloco presenta, ainda, de forma sucinta, a perspectiva da estudiosa Donis Dondis, diante de um panorama das formas de expressão artísticas que, nas palavras da autora, recebe o nome de estilo. São apresentadas cinco grandes categorias (Primitivo, Expressionista, Clássico, Ornamental e Funcional), que não configuram uma classificação cronológica, mas, antes, agrupamentos por afinidades conceituais e, consequentemente, formais. Vamos entender um pouco mais sobre as variadas formas de expressão? 2.1 Formas de Arte Para Dondis (2007), é evidente que a forma como apreendemos o cotidiano, o que nos rodeia e, sobretudo, a maneira como expressamos reações diante desses estímulos, está diretamente relacionada a experiência visual. Desde sempre, o homem encontra na linguagem visual um caminho para atender a uma necessidade intrínseca: a de se comunicar. Diante disso, ele busca formas distintas de materializar a comunicação por meio da pintura, da ilustração, da escultura, do design gráfico, do artesanato, do design industrial, da fotografia, entre outras expressões. 24 Pintura É provável que a pintura seja a forma mais comumente associada ao conceito de arte. Uma grande tela, pintada com tinta à óleo, tinta acrílica ou técnica mista, que repousa sobre uma parede podendo ou não conviver com obras similares, é claramente entendida como arte. Essa forma última das artes visuais derivou de muitas fontes, começando pelas primeiras tentativas feitas pelo homem pré-histórico para criar imagens, desenhadas ou pintadas, até chegar ao cenário da arte contemporânea, com seu “establishment” de críticos, museus e critérios para o reconhecimento e o sucesso (DONDIS, 2007 p.198). Desde a presença da pintura nas cavernas até a pintura contemporânea as temáticas se alteraram. Num primeiro momento, a pintura surge por motivações cotidianas, como uma forma de consolidar registros de propriedades, por exemplo; ou pela crença, pois acreditava-se que por meio da imagem seria possível dominar os animais. Na sequência, por um enorme período, a pintura foi responsável por materializar a intangibilidade da religião. Apenas posteriormente, ela adquiriu autonomia por meio da mão do artista e começou a expressar conceitos e ideias. A Revolução Industrial permitiu a produção em série de objetos e a reprodutibilidade que, segundo Benjamim (1955), nos fez refletir sobre a autenticidade e a unicidade da arte. 25 Fonte: < https://www.wikiart.org/pt/alfredo-volpi/catedral-1973> Figura 2.1 – Catedral, 1970, Alfredo Volpi Ilustração O tema levantado por Benjamim (1955), o da reprodutibilidade da obra de arte, torna possível a emancipação do design gráfico e dos elementos figurativos na construção de sua mensagem, pois, antes do desenvolvimento dos processos gráficos era possível pensar no design gráfico apenas por meio da tipografia. A partir do momento que a utilização da cor e da imagem se popularizou em função dos avanços técnicos, houve uma verdadeira revolução na forma de interagir, do ponto de vista visual, com o receptor da comunicação. A ilustração demanda, invariavelmente, um grande poder de síntese. O ilustrador deve estar imerso no universo da obra para compreender claramente os pontos relevantes e captar a linguagem mais adequada no processo de mediação, entre o conteúdo e o leitor. 26 Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Nina-Pandolfo-Rivington-Wall.jpg> Figura 2.2 – Nina Pandolfo Escultura A escultura é a forma de arte que se caracteriza pela volumetria, ou seja, pela “tridimensionalização” de uma ideia. Dessa forma, apresenta 3 dimensões: largura, altura e profundidade. Por meio dela, a construção dos sentidos da obra se faz presente de forma importante. As pontas dos nossos dedos colocados sobre uma foto ou pintura não nos dariam nenhuma informação sobre a configuração física do tem representado, mas, a evolução da representação bidimensional de objetos tridimensionais nos condicionou a aceitar a ilusão de uma forma que, na verdade, é apenas sugerida. Na escultura, porém, a forma ali está; pode ser tocada, lida ou compreendida pelos cegos. (DONDIS, 2007 p.189) Nesta forma de concretização da arte, o material éum elemento de importância fundamental. Não apenas pelas qualidades e especificidades que apresenta, as quais estão diretamente relacionadas às reações promovidas no interlocutor, mas, também, pelos aspectos logísticos de sua manipulação. Entretanto, o que isso quer dizer? 27 Estamos nos referindo às características dos materiais, como a dureza do mármore, por exemplo, comparado à maleabilidade da argila. Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Monumento_Tomie_Ohtake.jpg > Figura 2.3 – Tomie Ohtake Arquitetura Além da escultura, a arquitetura também apresenta como atributo a dimensão, ou seja, a volumetria. Ela apresenta como finalidade essencial, a oferta de abrigo, de acolhimento, de proteção. Porém, o desenvolvimento social e econômico demandou da arquitetura novas formas de proteção, que visam os interesses do indivíduo, como a religião, a política, o lazer, o bem-estar, o saber, entre outros. À medida que as culturas se tornaram mais desenvolvidas, a arte e a técnica da construção passaram a servir também às atividades e aos interesses do homem: a sua religião, com igrejas, santuários e monumentos; a seu governo, com edifícios administrativos, câmaras legislativas e palácios da justiça; a seu lazer, com teatros, auditórios, ginásios de esporte e museus; a seu bem-estar e sua educação, com hospitais, escolas, universidades e bibliotecas. (DONDIS, 2007, p.194) 28 O mesmo avanço social e econômico também propiciou o desenvolvimento de técnicas construtivas e materiais disponíveis que influenciaram, de forma direta, a transformação do ofício da arquitetura. Segundo Dondis (2007), a transformação da forma edificada, tem estreita relação com a cultura, a localidade e os padrões estéticos, o que influencia novos estilos e novas soluções arquitetônicas. Fonte:<https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5e/Walt_Disney_Concert _Hall%2C_Los_Angeles_%285592139283%29.jpg> Figura 2.4 – Walt Disney Concert Hall, Frank Gehry Artesanato É comum associarmos o artesanato a uma produção de objeto com qualidade técnica ou estética inferior, uma vez que o mesmo é fruto de uma manufatura e, portanto, não apresenta a precisão e o rigor que, supostamente, um objeto industrializado apresentaria. No entanto, o artesanato é capaz de materializar os saberes e fazeres de determinadas regiões tornando-se responsável por traduzir a cultura daquele local. De acordo com https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5e/Walt_Disney_Concert_Hall%2C_Los_Angeles_%285592139283%29.jpg https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5e/Walt_Disney_Concert_Hall%2C_Los_Angeles_%285592139283%29.jpg 29 Lina Bo Bardi (1994), as opções culturais no campo do Desenho Industrial poderiam ter sido outras, mais aderentes às necessidades reais do país. Entretanto, ela ressalta que isso só seria possível se houvesse um panorama de artesanato brasileiro, de raiz, e não somente uma herança esparsa da artesania e manufatura europeia recebida no século XIX, que constituiu o que Lina denomina de pré-artesanato. Para ela, o Brasil deveria ter elaborado um artesanato próprio, que fosse capaz de imprimir a identidade brasileira, e direcionado à produção industrial em série, entretanto, o país decidiu “importar” a estética europeia, considerada pela elite como mais elegante, porém, totalmente desvinculada dos saberes e fazeres brasileiros. Figura 2.5 – Artesanato Logo, levantamos um questionamento, o que isso quer dizer? Para Argan (1998), objeto e sujeito são indissociáveis na medida em que a “realidade" (ou um fragmento dela) se materializa no objeto e "pensada por um sujeito, adquire a singularidade do sujeito" (ARGAN, 1998 p. 252). 30 Admitindo essa indissociabilidade e de acordo com Lina Bo Bardi (1994), o artesanato e o produto brasileiro não refletiriam o valor identitário nacional. De qualquer forma, para além dessa afirmação, há iniciativas que tentam resgatar este contingente de técnicas e linguagens, que estão refletidas em diversos objetos encontrados pelo país. É importante dizer que, no artesanato, mesmo que ocorra a construção de várias peças a partir de um mesmo modelo, cada um dos objetos reproduzidos é único, pois, o fato dele não sofrer um processo de fabricação industrial faz com que sua reprodução não seja rigorosamente igual. Design Industrial Para Dondis (2007), é (quase) possível afirmar que o design industrial é o artesanato materializado por meio da reprodutibilidade em série, ou seja, todos os objetos são exatamente iguais. O desenvolvimento técnico na produção de objetos teve oposição firme do movimento Arts and Crafts, como afirma Dondis (2007), por receio que a reprodutibilidade em série pudesse colocar em risco a qualidade estética. No entanto, o movimento Bauhaus vê na serialidade a possibilidade de uma “democratização” do bom design. Tendo como objetivo a funcionalidade, a Bauhaus traz a questão da síntese e do mínimo indispensável para que o objeto pudesse cumprir o seu objetivo final. Nesse contexto, o profissional do design, o designer, se vê num processo de projetação híbrida, ou seja, que envolve a técnica (ergonomia, pesquisa de materiais, entre outros) e a estética (fatores compositivos, de equilíbrio, cromáticos, entre tantos outros). Em paralelo ao desenvolvimento técnico, surgem novas necessidades, que, por sua vez, devem ser atendidas. Surgem também novos perfis de consumidores que, igualmente, devem ter as suas solicitações atendidas. E, por fim, surgem novas formas de fomentar o consumo como, por exemplo, a obsolescência, que determina que um objeto pode se tornar obsoleto mesmo que ainda esteja em perfeitas condições de uso. Estamos falando de obsolescência percebida, ou a obsolescência programada, que faz com que 31 o produto saia da fábrica com a sua vida útil pré-estabelecida, garantindo, assim, que o círculo do consumo permaneça em movimento. Design Gráfico Embora, segundo Dondis (2007), haja um marco de fundamental importância para o design gráfico - a invenção dos tipos, por Gutenberg - a Revolução Industrial também foi extremamente relevante para o desenvolvimento do ofício. A projetação em design gráfico estava, antes dela, nas mãos de artistas que recebiam a denominação de “artista comercial”. Atualmente, assim como o design industrial, o design gráfico também não é considerado arte, mas sim uma zona híbrida, pois também demanda técnica e estética. Logo, é comum, quando falamos em design, considerá-lo um detalhe, uma espécie de finalização, quase uma “maquiagem”. Quando tudo parece já ter sido pensado “entra” o design “para dar um toque final” “um embelezamento” ou “uma caixa”, quando se fala em design de produto, por exemplo, ou a mera elaboração de cartão de visita ou “flyer”, quando se fala em design gráfico, sem reconhecer, ao menos, a existência de uma identidade visual4 ou conceito5, que tenha norteado as decisões tomadas. Portanto, o design, seja gráfico ou de produto, são de grande importância devido ao seu caráter sistêmico e abrangente. Hoje, o design é entendido como um ofício transdisciplinar, pois cada vez mais os escritórios de design possuem equipes múltiplas com a presença de designers, sociólogos, historiadores, engenheiros, especialistas em marketing, entre outros; e estruturante, o que cria uma convergência fundamental para o entendimento de novos 4 Identidade visual é o nome dado ao conjunto de elementos gráfico-visuais (Representação Gráfica - Símbolo, Logotipo ou Marca, Cor, Tipografia, Aplicações, etc.) que identifica e representa, em termos visuais, um produto ou serviço. Voltaremos a falar deste assunto posteriormente. 5 Conceito: Ideia que está na origem do projeto desenvolvido e que estrutura as opções e decisões tomadas.32 mercados, de novos modos de consumir, de novos formatos de interagir e de possíveis impactos, sejam eles ambientais, sociais ou econômicos. Diante da economia criativa, o design se posiciona como vetor de crescimento sustentável e extrapola o domínio da pequena escala projetual para se instalar como agente ativo na solução de problemas complexos, além de ganhar relevância em termos econômicos. Fotografia Como afirmamos anteriormente, a imagem é um elemento de vital importância para o homem não apenas pela sua relação com o mundo, mas, também como resgate da memória, da história e na forma como o homem empreende a comunicação. Na atualidade é comum realizarmos registros imagéticos por meio dos nossos celulares, equipamentos cada vez mais sofisticados e ao alcance de todos nós, eles garantem uma memória adicional de todos os eventos cotidianos. Como nem sempre foi assim, esse salto qualitativo e representativo da fotografia alterou a forma como estabelecemos, recebemos e interagimos com uma profusão de informações visuais presentes em nosso cotidiano. A fotografia pode ser apenas um registro de um evento banal, mas também pode ser fotografia pensada e elaborada com fins específicos no âmbito da comunicação. Por fim, há ainda a fotografia enquanto expressão de uma linguagem própria que, seja pela temática ou construção formal, materializa um produto de arte, comercializado como uma obra de arte “clássica”. Assim, com o tema fotografia, chegamos ao final de um dos subtemas deste bloco. Espero que tenham gostado, até o próximo encontro! 2.2 Formas de Expressão Ao falarmos em expressão buscamos compreender como uma determinada manifestação, ou seja, um determinado produto, seja ele um desenho, uma pintura, entre outros, será elaborado e se mostrará ao observador, pois a expressão está relacionada à exteriorização, ao mostrar, ao revelar. 33 Na perspectiva de Dondis (2007), essa manifestação é denominada estilo. Por estar associado a outros ofícios como moda, por exemplo, cabe dizer que, na perspectiva da autora, estilo é o ato de sintetizar. No entanto, sintetizar o quê? Tudo que diz respeito à elaboração da forma: elementos básicos, aspectos cromáticos, técnicas, entre outras. Por isso, é correto afirmar que a maneira como acontece a construção visual tem impacto direto no seu resultado e, por consequência, na forma como o observador a percebe. Para Dondis (2007), o “estilo visual” apresenta 5 grandes categorias, são elas: Primitivo, Expressionista, Clássico, Ornamental e Funcional Primitivo Primitivo, enquanto definição, pode estar associado a algo menos interessante e mais básico, uma vez que contempla em seu significado o fato de ser a origem de tudo. Dessa forma, em termos visuais, o primitivo está ligado às pinturas rupestres. Para Dondis (2007), embora sejam as primeiras manifestações visuais do homem, elas apresentam qualidades gráficas e intencionais que caracterizam um estilo que busca, sobretudo, o realismo. É importante não esquecer o contexto de total ausência de qualquer material ou técnica previamente desenvolvida. A única maneira válida de classificar esses desenhos pré-históricos é tentar definir o primitivo como um estilo, com base em uma finalidade e algumas técnicas. A arte e o design primitivos são estilisticamente simples, ou seja, não desenvolveram técnicas de reprodução realista da informação visual natural. Na verdade, trata-se de um estilo muito rico em “símbolos” com forte carga de significado, e, por essa razão, podem ter muito mais a ver com o desenvolvimento da escrita do que com a expressão visual. (DONDIS, 2007 p.168) Ehrenzweig (1953 apud DONDIS, 2007), consegue situar no primitivo um atributo infantil, pois trata-se de uma construção formal que, por si, dispensa os detalhes em detrimento da visão do todo. Por fim, a autora apresenta um conjunto de técnicas visuais que, por suas características, convergem para a síntese formal do primitivo. São elas: 34 Exagero; Espontaneidade; Atividade; Simplicidade; Distorção; Planura; Irregularidade; Rotundidade; Colorismo. Figura 2.6 – Pintura Rupestre Expressionismo Dondis (2007), faz uma interessante analogia entre o expressionismo e o estilo primitivo: enquanto o primeiro busca a realidade e, por vezes, tenta obtê-la por meio do exagero, por exemplo, no segundo há uma intencionalidade na distorção da realidade. A 35 denominação expressionismo já deixa explícito um conjunto de atributos como a gestualidade, o movimento, a dramaticidade e o exagero. Algumas técnicas, por esse motivo, parecem estabelecer uma proximidade com a solução formal do expressionismo. São elas: Exagero; Espontaneidade; Atividade; Simplicidade; Distorção; Planura; Irregularidade; Rotundidade; Colorismo. Figura 2.7 – O grito, Edvard Munch Classicismo Segundo Dondis (2007), o classicismo, como conceito, está apoiado em dois pilares: a influência direta da natureza e a verdade pura. 36 O primeiro está alinhado ao ideal grego de adoração à muitos deuses, e ao amor à natureza. Os gregos procuravam a beleza na realidade. Glorificavam o homem e seu ambiente natural (DONDIS, 2007 p. 174). Já o segundo está diretamente relacionado à busca incessante pela verdade e a elaboração artística que visa à perfeição. Os gregos buscavam a verdade pura em sua filosofia e ciência e aqui se encontra a segunda fonte do estilo clássico. Formalizavam sua arte através da matemática, e criaram a seção áurea, uma fórmula para orientar as decisões no campo do design (DONDIS, 2007 p.174). Na perspectiva da autora, as técnicas a seguir são aquelas que convergem para o conceito clássico na estruturação da forma: Harmonia; Simplicidade; Exatidão; Simetria; Monocromatismo; Profundidade; Estabilidade; Unidade. 37 Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:David_-_(Michelangelo).jpg> Figura 2.8 – Davi, Michelângelo Estilo Ornamental Claramente distante da realidade, o estilo ornamental, para Dondis (2007), busca estruturar a forma por meio da dramaticidade, da fantasia, do exagero. Por estas características, devido a exuberância desse estilo, para ela ele está associado ao poder, à riqueza. Ao longo do panorama da história da arte, existiram muitos movimentos nos quais é possível encontrar tais características. Além do Art Nouveau, estilo vitoriano e romano tardio, Dondis (2007) destaca que o Barroco é, sem dúvida, o período da arte que mais se aproxima da essência da exuberância ornamental. O ornamento aqui é entendido como um elemento “decorativo”, que tem como característica formal a atenuação dos ângulos agudos, aliado a uma busca “decorativa” na sua utilização, que torna a composição exagerada, de acordo com a teórica. As técnicas que convergem para o estilo ornamental, segundo Dondis (2007), são as que seguem: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:David_-_(Michelangelo).jpg 38 Complexidade; Profusão; Exagero; Rotundidade; Ousadia; Fragmentação; Variação; Colorismo. Figura 2.9 – Alphonse Mucha Funcionalidade Para discorrer sobre o estilo da Funcionalidade, Dondis (2007) faz uma referência interessante que, obviamente, se relaciona ao advento da Revolução Industrial, mas, também a satisfação das necessidades básicas do homem. O que em si já guarda, aparentemente, um paradoxo: 39 Embora a funcionalidade costume ser fundamentalmente associada ao design contemporâneo, ela é na verdade tão antiga quanto o primeiro recipiente para água criado pelo homem. É uma metodologia de design estreitamente ligada à regra da utilidade e a considerações de ordem econômica. (DONDIS, 2007p.178) A autora afirma que movimentos cujas premissas conceituais assentem na funcionalidade, trabalham com o desenvolvimento projetual focado nas necessidades do usuário aliado à uma síntese formal. A Escola Bauhaus é o mais emblemático exemplo desse conceito, que via na Revolução Industrial e seus novos processos produtivos, múltiplas possibilidades de solucionar as necessidades básicas do indivíduo, além de demandas decorrentes de um contexto em mudança. Há aqui um caminho que se distancia de qualquer ornamento, de qualquer aspecto formal que seja dispensável na busca da essência do objeto: a função. Walter Gropius, no pós Primeira Guerra, empreende a Bauhaus pautada na criação de novas formas e novas soluções. Predecessor da Bauhaus, o Deutscher Werkbund (Associação Alemã de Artesãos – que incluía designers, arquitetos, entre outros), entendia ser de fundamental importância a projetação da habitação de forma integrada, ou seja, edificação e objetos numa interação estética e funcional. Segundo Dondis (2007), esse grupo tinha como premissa conceitual, uma consciência mais profunda do significado interior e da natureza das coisas, que concebiam através da busca da Sachlichkeit (DONDIS, 2007 p. 178), o conceito de perspectiva realista e objetivo. Nesse contexto, Dondis (2007) associa funcionalidade com as seguintes técnicas: Simplicidade; Simetria; Angularidade; Previsibilidade; Estabilidade; Sequencialidade; Unidade; 40 Repetição; Economia; Sutileza; Planura; Regularidade; Agudeza; Monocromatismo; Mecanicidade. Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:LC4,_chaise_longue.png> Figura 2.10 – Chaise, Le Corbusier Dessa forma, com a Bauhaus, chegamos ao final deste bloco. Espero que tenham gostado, vejo vocês no próximo encontro! https://commons.wikimedia.org/wiki/File:LC4,_chaise_longue.png 41 Conclusão Segundo Dondis (2007), as razões básicas e inerentes encontradas na elaboração visual, seja ela qual for, são sempre uma resposta a uma necessidade. Portanto, se considerarmos que, as necessidades do indivíduo são amplas, teremos também uma amplitude na forma como elaboramos essas respostas. Tal amplitude está, obviamente, como afirma a autora, relacionada ao contexto, aos objetivos, as identidades, e tantas outras condicionantes que definem como o processo de comunicação ocorre. Diante disso, apresentamos, neste bloco, um panorama sintético das formas de arte e seus respectivos âmbitos. Formas artísticas clássicas como, pintura e escultura, sofreram alterações ao longo da história, em função de contextualizações sociais, econômicas e técnicas. A Arquitetura, por exemplo, abandonou sua função, exclusivamente, de abrigo para adotar soluções múltiplas e complexas em prol do indivíduo contemporâneo. Já o artesanato permeia a construção da identidade de um povo e, muitas vezes, sem acolhimento afetivo, dispersa uma possibilidade de difusão cultural. Anteriormente apresentadas, as definições de Design Gráfico e Design Industrial - também conhecido como Design de Produto - são entendidas, na atualidade, como especialidades híbridas, ou seja, que contemplam a técnica e a estética. A Ilustração e a Fotografia, assim como as demais formas, também sofreram alterações devido ao desenvolvimento técnico e estético, porém sempre com a intenção de responder a maior das necessidades humanas: a de se comunicar. Dessa forma, este bloco não tem como objetivo realizar um panorama cronológico das distintas formas de expressão ou estilo, porém, buscou, sobretudo, dar um panorama das características que incidem, de forma direta, na construção e na percepção da mensagem visual. Para Dondis (2007), considerando a aplicação prática de determinada linguagem na construção de uma mensagem, o agrupamento de categorias de estilo facilita a compreensão da interpretação e elaboração visual. 42 Entender que o primitivo está relacionado a um realismo menos técnico, o expressionismo está assente na gestualidade e na força do movimento, o classicismo está diretamente associado à perfeição, o estilo ornamental tem como premissa a exuberância na composição e, que, por fim, a funcionalidade está apoiada na síntese da forma, certamente configura um panorama transversal de atributos que colaboram na elaboração assertiva da mensagem visual. REFERÊNCIAS ARGAN, G. C. História da Arte como História da Cidade. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1998. BARDI, L. B. Tempos de grossura: O design no impasse. São Paulo: Instituto Pietro e Lina Bo Bardi, 1994. BENJAMIN, W. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica, 1955. Disponível em: < https://philarchive.org/archive/DIATAT>. Acesso em: 06 jun. 2019. DONDIS, D. Sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2007. https://philarchive.org/archive/DIATAT 43 3 DIVERGÊNCIA ENTRE ARTE E CIDADE O terceiro Bloco da disciplina Projeto Integrador: Arte Aplicada, discutirá, de forma ampla, as manifestações artísticas que utilizam a cidade como suporte. Manifestações como, por exemplo, o grafite e a pichação, coexistem nas metrópoles e, mais recentemente, se consolidaram como expressões artísticas, pois estão cada vez mais engajadas e compõem as cidades contemporâneas. Nesse caso, a cidade é, ao mesmo tempo, suporte e produto final, pois altera e é alterada. Há ainda a Arte enquanto elemento da paisagem urbana que, ao mesmo tempo em que rende homenagem, também se constitui como um marco na cidade. Mas o que quer dizer essa afirmação? Sabe aquele ponto que todos conhecem, mas, que muitas vezes, desconhecem o seu real significado ou o que homenageia? Então, isto é arte pública! Portanto, vamos entender um pouco melhor como a arte é, simultaneamente, suporte e produto artístico? 3.1 Divergência entre arte e cidade Segundo Sevcenko (2001), atualmente a arte atravessa uma desmaterialização dos suportes que, na perspectiva do autor, se deve ao impacto das grandes mudanças tecnológicas e a supervalorização da exposição como exibição, que dilui o valor inerente à expressão artística e distancia o público da arte. Entretanto, o que isso quer dizer? Ao contrário de outros momentos da história da humanidade, atualmente a arte se encontra sob outras formas de expressão além das formas clássicas, pintura, escultura, etc. Mais do que isso, a arte empreendeu uma expansão que ultrapassou a fronteira dos espaços destinados à apreciação, como galerias e museus. Mas, afinal se a arte não está apenas nas galerias ou museus, aonde mais ela está? A arte também está na cidade. É evidente que as galerias e os museus também estão nas 44 cidades, e continuam abrigando a arte, na forma clássica de exposição, entretanto, estamos falando da cidade não apenas como localização, mas como suporte da arte. Fonte:<https://pt.wikipedia.org/wiki/Beco_do_Batman#/media/Ficheiro:Grafites_na_ Alameda_Tim_Maia,_em_S%C3%A3o_Paulo-SP.jpg> Figura 3.1 - Beco do Batman, São Paulo Dessa forma, discutir sobre arte e cidade é, sobretudo, discutir sobre aquilo que é público e aquilo que é privado. Espaço público é o ambiente que pode ser utilizado por todos os cidadãos, trata-se, por exemplo, da rua, do viaduto, entre outros. Mas, a cidade é muito mais do que apenas os espaços de trânsito dos cidadãos, ela também contempla lugares que materializam o convívio, a interação, o encontro. Ao falarmos sobre arte e cidade, sendo a cidade suporte direto da arte, é possível destacar formas de intervenção que ocorrem nela como, por exemplo, o grafite e a pichação. Tratam-se de intervenções gráficas urbanas, produtos comunicacionais na sua vertente cultural, social e simbólica, abarcam um diálogo, no qual a cidade é causa e, ao mesmo tempo, consequência, cujainteração altera todos os medianeiros do processo: emissores e receptores. https://pt.wikipedia.org/wiki/Beco_do_Batman#/media/Ficheiro:Grafites_na_Alameda_Tim_Maia,_em_S%C3%A3o_Paulo-SP.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Beco_do_Batman#/media/Ficheiro:Grafites_na_Alameda_Tim_Maia,_em_S%C3%A3o_Paulo-SP.jpg 45 A busca por identidade, territorialidade, hierarquia e tantos outros significados, pode ser evidenciada por meio de dimensões gráficas distintas, cujos processos e técnicas são fundamentais no estabelecimento de fronteiras, se é que esta existe alguma, entre o grafite e a pichação. Figura 3.2 - Pichação O resultado da pluralidade desse gênero discursivo, se materializa por meio da alteração da paisagem urbana, da forma como ela se apresenta ao cidadão e, por consequência, da forma como a interação entre ambos se processa. Pichação A pichação, (pixação ou ainda o pixo) é uma manifestação, essencialmente, tipográfica, ou seja, se materializa por meio de letras e, como afirma Pereira (2010), é uma iniciativa estética que parte da população jovem das zonas periféricas das cidades. Trata-se da grafia estilizada de palavras nos espaços públicos da cidade que se referem, quase sempre, à denominação de um grupo de jovens ou ao apelido de um pixador individual. Essa pixação possui um formato bastante peculiar: com traços retos e angulosos, ela diferencia-se do que seria o estilo norte-americano de pixação, designado tag, cujo formato arredondado lembra mais uma rubrica (PEREIRA, 2010 p.146). 46 Toda manifestação dessa natureza deve ser “assinada” e, por esse motivo, deve sempre ser acompanhada daquilo que é conhecido no meio como “grife”, pois, é dessa forma que o autor e sua procedência serão identificados. A grife, geralmente, é composta por um agrupamento, que pode, inclusive, ter um número enorme de integrantes, e em sua base está os princípios e os deveres a serem cumpridos. A grife, no grafite, também valoriza, pois trata-se de uma modalidade de aliança de grupos de pixadores, por isso não se pixa seu nome por extenso, mas o seu símbolo ao lado da pixação principal (PEREIRA, 2010 p.148). Em São Paulo existe, o que parece ser, uma coexistência entre Pichação e Grafite. Para Pereira (2010), aquilo que na capital paulista é entendido como antagonismo, no exterior, é apenas classificado como um tipo de grafite. Enquanto em outras cidades do mundo o que aqui se denomina pixação é apenas um estilo dentro do grafite, na capital paulistana ela é vista por uns como o seu oposto – o grafite é entendido como arte enquanto ela é considerada sujeira e poluição visual – e, por outros, como um estágio inferior do grafite, que seria o patamar mais alto dessa forma de expressão. Por conta dessa aversão à pixação, principalmente pelo poder público e pela imprensa, os grafiteiros conseguiram adquirir até certa notoriedade junto à mídia e à população (PEREIRA, 2010 p.148). 47 Fonte:<https://pt.wikipedia.org/wiki/Picha%C3%A7%C3%A3o#/media/Ficheiro:Sao_vit o2.JPG> Figura 3.3 - Pichação O senso comum que defende o grafite como expressão ou intervenção artística e o pixo como poluição visual, faz com que estes estabeleçam uma permanente relação com a transgressão. Além disso, há a questão da inserção dos pixos. Você já reparou como muitas pichações estão em locais, aparentemente, impossíveis de serem acessados? Você sabe a razão disso? É porque aquele que realiza a maior proeza e enfrenta os maiores desafios consegue maior reconhecimento (PEREIRA, 2010 p.152). Na perspectiva do pichador, o pixo materializa uma contestação social sendo, portanto, exatamente o seu caráter de protesto, o responsável por relacionar essa manifestação à transgressão. Para Pereira (2010), se por um lado a manifestação muitas vezes está esvaziada de um sentido político, em essência, pois, a motivação não é clara ou explícita, sendo apenas, vaga. 48 Por outro lado, é perceptível que a manifestação pixo é um modo contemporâneo de comunicar a exclusão, por meio de experiências plásticas, sociais e urbanas. Grafite O grafite, segundo Costa (2007), é a designação para vários tipos de intervenção que, ao contrário do que se pensa, existem desde o início da civilização, pois, se pensarmos bem, as inscrições nas cavernas pré-históricas são uma forma de grafite, não? É interessante também notar que, Pompéia (cidade do Império Romano que ficou ocultada, depois da erupção do vulcão Vesúvio, do ano de 79 até o de 1748), quando foi “redescoberta” também apresentou inscrições similares ao grafite como o conhecemos na atualidade. Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Pompeia-ViaAbundancia- propagandaElectoral-5445.jpg> Figura 3.4 - Pichação em Pompéia, Itália Na contemporaneidade, o “resgate” da prática artística do grafite ocorreu na cidade de Nova York, na década de 1970, por meio do designer e artista Keith Haring e, posteriormente, pelo artista Jean Michel Basquiat. No Brasil, ainda na década de 1970, Alex Vallauri extrapola os limites dos espaços de arte para dar início a uma trajetória incrível de intervenção urbana. Em seguida, artistas como Speto, Os Gêmeos, Kobra, Rui Amaral, Crânio, entre tantos outros, se apropriam https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Pompeia-ViaAbundancia-propagandaElectoral-5445.jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Pompeia-ViaAbundancia-propagandaElectoral-5445.jpg 49 da cidade enquanto suporte, e contribuem, até os dias de hoje, para a interação entre arte e cidade. Fonte:<https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Grafite_na_entrada_do_MAM,_osgeme os_(5878026408).jpg> Figura 3.5 - Os Gêmeos 3.2 Convergência entre arte e cidade Quando falamos em cidade qual é a primeira ideia que passa pela sua cabeça? Um complexo de artérias? Um conglomerado de edificações com seus muitos objetivos? Gente apressada? Carros? Poluição? A cidade é tudo isso e muito mais e também é arte. Essa arte surge por meio de assinaturas indecifráveis, como, por exemplo, a pichação, ela também brota em muitas empenas cegas6, alterando a paisagem e identificando a 6 Laterais dos edifícios que, por não apresentarem nenhum tipo de abertura (portas ou janelas) podem servir de zona de interface com as demais construções. https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Grafite_na_entrada_do_MAM,_osgemeos_(5878026408).jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Grafite_na_entrada_do_MAM,_osgemeos_(5878026408).jpg 50 edificação. É apenas isso, certo? Errado. E aquele monumento da praça? Aquela escultura na porta de um edifício? Aquele painel de azulejos? Existem muitas manifestações artísticas, que são comportadas pela cidade e atendem pela denominação de arte pública, ou seja, a arte que está inserida no espaço público. A designação, que não reúne consenso, procura distinguir as formas de arte instaladas no ambiente urbano daquelas que estão instaladas no âmbito do binômio galeria de arte/museu. É, justamente, essa distinção, entre o que está exposto na esfera pública e o que está exposto na esfera privada, que levanta questionamentos. O museu ou a galeria contêm arte (contêm no sentido literal do termo), tornam-se numa espécie de contentor, de depósito, de recipiente que acolhe passiva e indiferentemente uma obra sem ser dela parte integrante, imobilizam a arte e instalam-na quase numa inércia. No espaço da galeria, a arte associa-se a uma espécie de elitismo, pois trata-se de um espaço exclusivo, em que a arte se transforma num comércio de objetos muito dispendiosos economicamente, e, por conseguinte o que a galeria contém é inacessível ao grande público. Numa galeria a obra de arte é um objeto voltado para o interior dos circuitos artísticos (comerciantes de arte, leiloeiros, curadores, críticos, colecionadores), queprocuram criar a ligação entre o artista, a obra, os colecionadores, e o público dessas obras de arte. (CORREIA, 2013 p.24) Muitos autores definem essa incongruência entre a arte, ora como produção para a “elite” (esfera privada), ora aberta para apreciação geral (esfera pública). A primeira estaria relacionada a uma parcela da população que tem acesso a informação e, por isso está mais familiarizada com o assunto; já a segunda, por se tratar de uma produção exposta no âmbito do espaço público, estaria voltada para a apreciação geral e irrestrita. Nesta perspectiva, o público pode ou não estar próximo do assunto e é confrontado com a produção artística de maneira “imposta”, ou seja, não há escolha como na anterior. 51 Figura 3.6 – Qingdao, China A arte pública apresenta, segundo Abreu (2013), uma série de especificidades cuja finalidade é levar a arte para todos os cidadãos o que, por si só, já define sua condição de inclusão por estar disponível para a apreciação de todos. No entanto, justamente por essa condição, ela está sujeita a todo o tipo de manifestação, positiva ou negativa, incluindo as de teor físico como depredação, vandalismo, entre outras. Além disso, esse tipo de construção artística ainda considera as condicionantes de uma permanente exposição externa, sendo constantemente afetada pelas condições de tempo, o local, entre outros fatores, o que, de certa forma, pode condicionar o trabalho do artista. Outra especificidade da arte pública é o seu caráter comemorativo. Para Correia (2013), ao contrário da arte pública contemporânea, a arte pública tradicional tem como motivação uma comemoração. Como comemoração, a arte pública tradicional constitui um meio de expressão à semelhança de outros implantados no espaço público em épocas mais remotas, tais como o obelisco, o arco triunfal, a coluna, e o monólito. A comemoração é uma evocação de determinados acontecimentos do passado, a que se atribui valor, de caráter sagrado ou profano (CORREIA, 2013 p. 63). 52 Fonte:<https://pt.wikipedia.org/wiki/Obelisco#/media/Ficheiro:Louxor_obelisk_Paris_ dsc00780.jpg> Figura 3.7 - Obelisco Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Arco_do_triunfo#/media/Ficheiro:Arco_Triunfal_da_Ru a_Augusta_September_2014.jpg> Figura 3.8 - Arco do Triunfo https://pt.wikipedia.org/wiki/Obelisco#/media/Ficheiro:Louxor_obelisk_Paris_dsc00780.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Obelisco#/media/Ficheiro:Louxor_obelisk_Paris_dsc00780.jpg 53 A arte pública pode ainda ser a expressão de uma homenagem, uma honraria, o marco de uma data de relevante. Se distingue da comemoração, na medida em que se destina a alguém cujos feitos merecem destaque. Geralmente, se trata de um produto artístico individual, embora possa acontecer uma homenagem ao coletivo. Figura 3.9 - Monumento George Washington, Massachusetts (EUA) Há ainda um outro tipo de homenagem, que está relacionada à devoção. Nas palavras de Correia (2013), a veneração está intimamente ligada ao simbolismo da religião e à força da religiosidade que se move por meio de uma vasto potencial de símbolos e figuras sagradas, que merecem homenagens. A veneração está associada ao culto de um santo, mas um não crente pode apenas homenageá-lo (considerá-lo uma figura de alto valor humano, do ponto de vista filantrópico, por exemplo). Além da homenagem, em relação a um santo pode também comemorar-se o seu nascimento ou a sua morte, por isso as atitudes que estão presentes na celebração em torno das grandes personalidades (veneração, homenagem e comemoração), podem-se por vezes associar-se (CORREIA, 2013 p. 64). 54 Figura 3.10 - Cristo Redentor Por fim, existe a homenagem ao que é abstrato. Valores e princípios, segundo Correia (2013), também são passíveis de serem homenageados embora sejam abstratos. Sabemos o que é, mas, não existe uma única forma que os defina. Existem diversas interpretações. É o caso da Estátua da Liberdade, em Nova Yorque, ou do Monumento dos Direitos Humanos, em Paris. No que diz respeito aos valores e princípios que orientam normativamente e idealmente a sociedade, do ponto de vista da sua representação abstrata (a liberdade, a igualdade, a justiça, etc.), também existe arte pública a eles dedicada (por exemplo a estátua da liberdade, em Nova Iorque). Não se comemoram (não são acontecimentos), não se homenageiam (a não ser em sentido figurado), nem se veneram (no sentido religioso), pelo que a melhor designação é a de honrar, reverenciar ou exaltar. (CORREIA, 2013 p. 64) 55 Figura 3.11 - Estátua da Liberdade Fonte:<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Human_Rights_Monument_2,_Paris _23_June_2013.jpg> Figura 3.12 - Monumento dos Direitos Humanos https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Human_Rights_Monument_2,_Paris_23_June_2013.jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Human_Rights_Monument_2,_Paris_23_June_2013.jpg 56 Em termos históricos, é possível dizer que a produção de arte pública, até metade do século XX, aproximadamente, apresentava, de maneira geral, características acadêmicas se regendo pelos padrões estéticos das escolas de Belas Artes e/ou Artes e Ofícios, como afirma (Alves, 2008). Parte considerável desses artistas era de origem europeia, onde haviam recebido rígida formação acadêmica, e emigraram para o novo continente em busca de uma vida melhor. Foram eles que realizaram significativos conjuntos comemorativos, esculturas decorativas e trabalhos funcionais (fontes e chafarizes) (ALVES, 2008 p. 6). Posteriormente, a arte pública, assim como a arte em geral, que está inserida em seu contexto social, histórico e econômico, passou a integrar a paisagem urbana enquanto elemento compositivo. Pode, claro, haver uma motivação para acontecerem homenagens específicas ou comemorações de datas relevantes, mas, na contemporaneidade, o espaço urbano passa a ser suporte e, ao mesmo tempo, elemento dessa manifestação, na qual a linguagem do artista é protagonista juntamente com o simbolismo que a obra carrega. 3.3 Arte e Cidade/Lugar Articular arte e cidade é discutir sobre uma produção artística inserida em um determinado espaço, um lugar. Pode parecer óbvio, mas, discutir a arte pública na contemporaneidade é dialogar também com o papel que o lugar desempenha na elaboração do produto artístico, podendo ser outro além da cidade. No entanto, o que isso quer dizer? Significa que, considerar o espaço no qual a obra de arte será inserida é fundamental, pois este também interferirá na obra e, portanto, é parte integrante. Assim sendo, uma obra, quando concebida para determinado lugar, só faz sentido enquanto produto de arte se colocada no local para o qual foi pensada, concebida. A arte ambiental é uma dessas manifestações. 57 A arte ambiente ou ambiental não faz referência a um movimento artístico particular, mas sinaliza uma tendência da arte contemporânea que se volta mais decididamente para o espaço - incorporando-o à obra e/ou transformando-o -, seja ele o espaço da galeria, o ambiente natural ou as áreas urbanas. Diante da expansão da obra no espaço, o espectador é convocado a se colocar dentro dela, experimentando-a; não como observador distanciado, mas parte integrante do trabalho (AMBIENTE, 2018). Fonte: <http://michaelmcgillis.com/wake-1> Figura 3.13 - Arte Ambiental: Michael Mcgillis Na arte ambiental, a paisagem não é mais tema, é obra. Não é mais “retratada” e sim elemento que, incorporado à obra, faz fusão com o lugar e se integra ao produto artístico. Artistas vinculados ao movimento, utilizam distintos espaços como territórios para intervenções e interfaces artísticas por meio de diversas linguagens. É o caso de Walter Maria (1935/2013), artista americano que, na década de 1970, realizou a instalação Lightning Field, dispondo 400hastes de metal, numa área do Novo México que, ao atrair descargas elétricas, promovia vários espetáculos efêmeros e diversos, de luz e som. http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo354/arte-contemporanea http://michaelmcgillis.com/wake-1 58 Trata-se de uma relação distinta com a natureza, que promove até mesmo discussões acerca da sustentabilidade e da utilização dos recursos naturais. Os trabalhos - grandes arquiteturas ambientais - transformam a natureza e são por ela transformados, já que eles mesmos são modificados pela ação dos eventos naturais (AMBIENTE, 2018). Além disso, o movimento, cujas obras têm como principais características a escala e a relação temporal, abriga artistas como Christo e sua esposa Jeanne-Claude. A primeira característica, a escala, está relacionada a dimensão dos projetos desenvolvidos, por exemplo, num primeiro momento, o artista, ainda sozinho, trabalha a pequena escala por meio de “pacotes” de dimensão reduzida, pois a ideia inicial era recobrir pequenos objetos, possíveis de serem identificáveis, uma vez que se o “pacote fosse desembrulhado” a obra de arte se perdia. Posteriormente, a escala aumenta de forma progressiva e passa a recobrir prédios, pontes, entre outros. Em dupla com a esposa, Jeanne-Claude, Christo recobre o Parlamento Alemão, a Pont Neuf, em Paris, além da materialização de instalações em vários países. Na perspectiva dos artistas, o acondicionamento das edificações propõe uma nova arquitetura: os prédios e os monumentos, ao serem recobertos são, obviamente, facilmente reconhecíveis (assim como os pacotes de pequena escala), mas, propõe a experiência coletiva de um novo olhar sobre a forma e, assim, a redescoberta desta nova possibilidade arquitetônica. 59 Fonte:<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Human_Rights_Monument_2,_Paris _23_June_2013.jpg> Figura 3.14 - Parlamento Alemão Fonte:<https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Pont_Neuf_emball%C3%A9_par_Christo _(1985).jpg> Figura 3.15 - Ponte Neuf, Paris https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Human_Rights_Monument_2,_Paris_23_June_2013.jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Human_Rights_Monument_2,_Paris_23_June_2013.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Pont_Neuf_emball%C3%A9_par_Christo_(1985).jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Pont_Neuf_emball%C3%A9_par_Christo_(1985).jpg 60 A segunda característica, a temporalidade, está relacionada ao caráter efêmero das obras, que, por vezes, podem demandar mais tempo para a sua produção do que para sua exibição. Dessa forma, uma outra questão importante é suscitada, a sustentabilidade. O que fazer com todo o material depois da mostra? Eles sempre são reciclados. A arte ambiente está relacionada a outra denominação contemporânea para a produção artística inserida nos espaços públicos, trata-se do Site Specific ou Sítio Específico. Site ou Sítio, nesse caso, diz respeito ao lugar, a um determinado espaço. Está também, portanto, ligado à Arte Ambiental. O termo sítio específico faz menção a obras criadas de acordo com o ambiente e com um espaço determinado. Trata-se, em geral, de trabalhos planejados - muitas vezes fruto de convites - em local certo, em que os elementos esculturais dialogam com o meio circundante, para o qual a obra é elaborada. Nesse sentido, a noção de site specific liga-se à ideia de arte ambiente, que sinaliza uma tendência da produção contemporânea de se voltar para o espaço - incorporando-o à obra e/ou transformando-o -, seja ele o espaço da galeria, o ambiente natural ou áreas urbanas (AMBIENTE, 2018). Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Berlin-Richard_Serra-curves-05.jpg> Figura 3.16 - Richard Serra http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo351/ambiente http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo351/ambiente https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Berlin-Richard_Serra-curves-05.jpg 61 Um dos nomes mais relevantes do Site Specific é Richard Serra. O artista trabalha a escala da monumentalidade em suas obras, além de um aspecto importante na sua construção: a autosustentação. É condição imprescindível para a elaboração das obras a respectiva autonomia em relação à sua estabilidade, ou seja, não há nenhum outro elemento de ligação ou estrutural. Apenas a obra. O projeto da intervenção considera esta premissa conceitual. No Brasil, quando se fala em arte e espaço urbano, é inevitável não falar de Hélio Oiticica. Para o artista, a obra de arte é mais do que um objeto contemplativo, ela é, sobretudo, um objeto participativo, da qual o observador torna-se parte integrante, modificando-a, ao mesmo tempo em que por ela também é modificado. Wisnik (2017), afirma que Oiticica denomina a própria produção artística como antiarte, que: Só pode existir com a participação dinâmica do “espectador”, considerado, desse modo, um “participador”. Assim, apropriando-se de elementos da realidade, não apenas recolhe objetos da vida comum para declará-los obras de arte - como já haviam feito os dadaístas e surrealistas -, mas também estende o sentido de apropriação a tudo aquilo que não fosse transportável, como “terrenos baldios, campos, o mundo ambiente”, numa operação que dependeria, essencialmente, da participação do público. O que viria a significar, assim, segundo suas palavras, “um golpe fatal ao conceito de museu, galeria de arte etc., e ao próprio conceito de ‘exposição’”, completando o raciocínio com uma frase que ficou famosa: “Museu é o mundo; é a experiência cotidiana”. (WISNIK, 2017, p. 103) No entanto, é importante destacar que Oiticica não se enquadra, especificamente, na “categoria” Site Specific, tendo em vista que, para o artista, os espaços são lugares que possibilitam novas “ordens ambientais”, por meio da experimentação e da interação. As obras não são desenvolvidas de acordo com determinados espaços, mas servem, antes, para promover uma interação com ele, uma vez que o espaço não está finalizado a espera de ser observado, mas sim em constante mudança e a espera de ser construído. 62 Fonte:< https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Inhotim_Oiticica_04.jpg> Figura 3.17 – Hélio Oiticica: Instituto Cultural Inhotim, Brumadinho (BR) Saiba Mais Para conhecer mais sobre a obra de Christo acesse: https://christojeanneclaude.net/index.shtml http://www.ideafixa.com/oldbutgold/a-arte-efemera-de-christo-e-jeanne-claude https://noholodeck.blogspot.com/2012/09/environmental-art-christo-e-jeanne.html Para saber mais sobre a obra de Richard Serra acesse: https://www.fronteiras.com/entrevistas/richard-serra-la-era-das-estrelas-da- arquitetura-esta-em-declinior Para saber mais sobre a obra de Hélio Oiticica acesse: https://nararoesler.art/artists/40-helio-oiticica/ https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Inhotim_Oiticica_04.jpg https://christojeanneclaude.net/index.shtml http://www.ideafixa.com/oldbutgold/a-arte-efemera-de-christo-e-jeanne-claude https://noholodeck.blogspot.com/2012/09/environmental-art-christo-e-jeanne.html https://www.fronteiras.com/entrevistas/richard-serra-la-era-das-estrelas-da-arquitetura-esta-em-declinior https://www.fronteiras.com/entrevistas/richard-serra-la-era-das-estrelas-da-arquitetura-esta-em-declinior https://nararoesler.art/artists/40-helio-oiticica/ 63 Conclusão Acabamos de refletir sobre duas manifestações artísticas urbanas e, muito cotidianas para os cidadãos da grande metrópole, trata-se da Pichação e do Grafite. Ambas não contemplam unanimidade, pois podem ser entendidas como poluição visual, como sujeira, como manifestos sociais e como arte. No entanto, essas manifestações integram a cidade contemporânea, servem como suporte para manifestações visuais, alteram a cidade e por ela são alteradas. Embora a arte pública faça parte da paisagem urbana, muitas vezes a sua relevância é desconhecida. É importanteperceber que as manifestações artísticas deste grupo integram momentos relevantes, constituindo, assim, um grande arquivo e, sobretudo, um resgate da memória e do simbolismo que integram a história de todos. REFERÊNCIAS ABREU, J. G. Arte Pública: Origens e condições históricas. Porto: Atas do Colóquio Internacional, 2013. Disponível em: < https://www.academia.edu/22115992/Arte_P%C3%BAblica._Origens_e_condi%C3%A 7%C3%B5es_hist%C3%B3ricas> Acesso em: 12 jun. 2019. ALVES, J. F. Experiências em arte pública: Memória e atualidade. Porto Alegre: Artfolio e Editora da Cidade, 2008. Disponível em: < https://www.ufrgs.br/napead/projetos/abarca/textos/Experiencias_ARTEPUBLICA_do wnload.pdf>. Acesso em: 12 jun. 2019. AMBIENTE. ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 10 abr. 2018. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo351/ambiente>. Acesso em: 20 de Jun. 2019. https://www.academia.edu/22115992/Arte_P%C3%BAblica._Origens_e_condi%C3%A7%C3%B5es_hist%C3%B3ricas https://www.academia.edu/22115992/Arte_P%C3%BAblica._Origens_e_condi%C3%A7%C3%B5es_hist%C3%B3ricas https://www.ufrgs.br/napead/projetos/abarca/textos/Experiencias_ARTEPUBLICA_download.pdf https://www.ufrgs.br/napead/projetos/abarca/textos/Experiencias_ARTEPUBLICA_download.pdf 64 CORREIA, V. Arte pública: Seu significado e função. Lisboa: Editora Fonte da Palavra, 2013. Disponível em: <https://www.academia.edu/6095811/Arte_p%C3%BAblica_- _seu_significado_e_fun%C3%A7%C3%A3o> Acesso: 12 jun. 2019. COSTA, L. P. Grafite e pixação: institucionalização e transgressão na cena contemporânea. Campinas: IFCH Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, 2007. Disponível em: < https://www.ifch.unicamp.br/eha/atas/2007/COSTA,%20Luizan%20Pinheiro%20da.pdf >. Acesso: 06 jun. 2019. PEREIRA, A. B. As marcas da cidade: a dinâmica da pixação em São Paulo. São Paulo: Lua Nova, Revista de Cultura e Política, 2010. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/ln/n79/a07n79.pdf/ >. Acesso: 06 jun. 2019. SEVCENKO, N. A corrida para o século XXI: No loop da montanha russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. WISNIK, G. T. Dentro do labirinto: Hélio Oiticica e o desafio do “público” no Brasil. São Paulo: ARS – Universidade de São Paulo, 2017. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/ars/v15n30/2178-0447-ars-15-30-00095.pdf>. Acesso em: 22 de jun. 2019. https://www.academia.edu/6095811/Arte_p%C3%BAblica_-_seu_significado_e_fun%C3%A7%C3%A3o https://www.academia.edu/6095811/Arte_p%C3%BAblica_-_seu_significado_e_fun%C3%A7%C3%A3o https://www.ifch.unicamp.br/eha/atas/2007/COSTA,%20Luizan%20Pinheiro%20da.pdf https://www.ifch.unicamp.br/eha/atas/2007/COSTA,%20Luizan%20Pinheiro%20da.pdf http://www.scielo.br/pdf/ars/v15n30/2178-0447-ars-15-30-00095.pdf 65 4 ARTE E ARQUITETURA A intersecção entre arte e arquitetura está para além do ornamento, do detalhe. Por um lado, conceber essa intersecção é estar diante de uma simbiose, na qual os elementos integrantes resultam em um produto híbrido capaz de perceber a intenção conceitual por meio da elaboração compositiva. Esta pauta está diretamente relacionada à moderna arquitetura brasileira, e as obras de Athos Bulcão e Cândido Portinari são exemplares extremamente relevantes. Por outro lado, a intersecção entre arte e habitação é responsável por compor elementos considerando dois fatores: a harmonia e a integração. Além disso, há também a capacidade do artista de traduzir o valor estético e as preferências por meio de um projeto que mais do que fazer sentido, seja capaz de construir um sentido. O sentido do habitar. Vamos tentar entender um pouco mais sobre Arte, Arquitetura e Design de Interiores? 4.1 Arte e Arquitetura Arquitetura é antes de mais nada construção, mas, construção concebida com o propósito primordial de ordenar e organizar o espaço para determinada finalidade e visando a determinada intenção. E nesse processo fundamental de ordenar e expressar-se ela se revela igualmente arte plástica, porquanto nos inumeráveis problemas com que se defronta o arquiteto desde a germinação do projeto até a conclusão efetiva da obra, há sempre, para cada caso específico, certa margem final de opção entre os limites - máximo e mínimo - determinados pelo cálculo, preconizados pela técnica, condicionados pelo meio, reclamados pela função ou impostos pelo programa, - cabendo então ao sentimento individual do arquiteto, no que ele tem de artista, portanto, escolher na escala dos valores contidos entre dois valores extremos, a forma plástica apropriada a cada pormenor em função da unidade última da obra idealizada. (COSTA, 1995, p.12). 66 Segundo Lúcio Costa, a arquitetura não pode ser concebida sem a intenção plástica, sem os atributos que, nas palavras do arquiteto, distanciam a construção da arquitetura enquanto qualidade formal, pois “(...) a intenção plástica que semelhante escolha subentende é precisamente o que distingue a arquitetura da simples construção” (COSTA, 1995). Esta premissa está presente na cidade de Brasília, por exemplo. A iniciativa de Juscelino Kubitschek se materializou por meio da invenção de Lúcio Costa e do traço leve de Oscar Niemeyer. As edificações que integram o conjunto arquitetônico de Brasília trazem a escala daquilo que é monumental e o refinamento de seu interior traz, igualmente, o apuro formal da capital construída. A materialização de Brasília, quer seja pela qualidade plástica das edificações, quer pela escala de sua implantação ou pela visão sistêmica do projeto, condensa, sobretudo, a responsabilidade de traduzir o simbolismo de uma nação. A singularidade do conjunto arquitetônico de Brasília faz dela o único bem contemporâneo a ser distinguido com a chancela da UNESCO, reconhecida em 1987 como Patrimônio Cultural da Humanidade pela instituição, ao mesmo tempo em que consolidou um marco no panorama da arquitetura mundial. Pode-se então definir arquitetura como construção concebida com a intenção de ordenar e organizar plasticamente o espaço, em função de uma determinada época, de um determinado meio, de uma determinada técnica e de um determinado programa (COSTA, 1995). 67 Figura 4.1 - Catedral em Brasília Portanto, falar de Brasília é falar de plasticidade, não apenas em relação ao contorno desenhado pela volumetria das edificações, mas pela confluência entre a arte e arquitetura. Logo, entre as formas de convergência está a nova leitura acerca das possibilidades formais e cromáticas aplicadas aos tradicionais azulejos portugueses, que imprimiram a assinatura de Athos Bulcão de forma ímpar na cidade de Brasília. Segundo Pinto Júnior (2007), para Lúcio Costa, a utilização do azulejo resgata um elemento do passado colonial brasileiro, que legitima a tradição por meio de um atributo formal que se configura como o grande protagonista visual da edificação. A interface primeira com o observador, seja na qualidade de usuário ou transeunte. De todos os elementos advindos da arquitetura colonial selecionados por Costa, o emprego decorativo proporcionado pela azulejaria parece ter sido o recurso que mais profundamente marcou a produção arquitetônica das décadas de 1930-1940. Entendido como elemento responsável por sublinhar os ambientes onde se insere a azulejaria, o emprego desta representou a recuperação da ideia de uma ornamentação inserida numa ótica essencialmente moderna (PINTO JÚNIOR, 2007). 68 Fonte:<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Painel_de_azulejos_- _Athos_Bulcao_-_Brasilia.jpg> Figura 4.2 - Painel de azulejos: Athos Bulcão – Brasília Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Athos_Bulc%C3%A3o#/media/Ficheiro:Athos_bulcao_ mercado_flores.JPG> Figura 4.3 - Painel de azulejos no Mercado das Flores, em Brasília https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Painel_de_azulejos_-_Athos_Bulcao_-_Brasilia.jpghttps://commons.wikimedia.org/wiki/File:Painel_de_azulejos_-_Athos_Bulcao_-_Brasilia.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Athos_Bulc%C3%A3o#/media/Ficheiro:Athos_bulcao_mercado_flores.JPG https://pt.wikipedia.org/wiki/Athos_Bulc%C3%A3o#/media/Ficheiro:Athos_bulcao_mercado_flores.JPG 69 Fonte:<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Obra_sem_t%C3%ADtulo,_Athos_Bu lc%C3%A3o_(5877742449).jpg> Figura 4.4 - Obra sem título, Athos Bulcão Embora o artista Athos Bulcão transitasse por muitas linguagens distintas (pintura, desenho, fotomontagens, entre outras), foi por meio da integração de sua produção à arquitetura, como refere Oliveira (2018 apud IPHAN, 2018), que a relevância do seu fazer artístico ficou, de forma definitiva, ligado a capital. De acordo com Oliveira (2018 apud IPHAN, 2018), Athos Bulcão estabeleceu contato com a azulejaria, enquanto elemento gráfico, em 1945, quando estagiou no atelier de Cândido Portinari durante a realização do painel da Igreja de São Francisco de Assis, no bairro da Pampulha, em Belo Horizonte. Portinari executa para a Igreja de São Francisco na Pampulha, além dos diversos afrescos importantes no interior, diversos azulejos. Naturalmente que de todos os azulejos concebidos para o edifício, o tour de force seria reservado ao painel frontal com a imagem do santo que dá nome à igreja. Entretanto, diferentemente de como fizera nos painéis do Ministério, Portinari se afasta do abstracionismo e se aproxima da figuração. (PINTO JÚNIOR, 2007) https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Obra_sem_t%C3%ADtulo,_Athos_Bulc%C3%A3o_(5877742449).jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Obra_sem_t%C3%ADtulo,_Athos_Bulc%C3%A3o_(5877742449).jpg 70 Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Igreja_de_São_Francisco_de_Assis_- _Belo_Horizonte.jpg> Figura 4.5 - Igreja de São Francisco: Belo Horizonte. Oscar Niemeyer Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Edif%C3%ADcio_Gustavo_Capanema#/media/Ficheiro: Gustavo_Capanema_Palace,_Rio_de_Janeiro,_Brazil_(main_entrance,_2004).jpg> Figura 4.6 - Palácio Capanema: Ministério da Educação e Cultura MEC: Rio de Janeiro Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, entre outros. fonte:%20%3chttps://pt.wikipedia.org/wiki/Edif%C3%ADcio_Gustavo_Capanema#/media/Ficheiro:Gustavo_Capanema_Palace,_Rio_de_Janeiro,_Brazil_(main_entrance,_2004).jpg fonte:%20%3chttps://pt.wikipedia.org/wiki/Edif%C3%ADcio_Gustavo_Capanema#/media/Ficheiro:Gustavo_Capanema_Palace,_Rio_de_Janeiro,_Brazil_(main_entrance,_2004).jpg fonte:%20%3chttps://pt.wikipedia.org/wiki/Edif%C3%ADcio_Gustavo_Capanema#/media/Ficheiro:Gustavo_Capanema_Palace,_Rio_de_Janeiro,_Brazil_(main_entrance,_2004).jpg 71 No Palácio Capanema, Portinari elaborou dois painéis: Conchas e Hipocampos e Estrelas- do-mar e Peixes. Ao contrário do esperado, segundo Pinto Júnior (2007), o artista não acompanhou a recomendação formal do ministério, sendo a clássica para escultura e realista para o painel, ambas composições se estruturaram numa trama de linhas curvas envolvendo as figuras como uma rede disposta num espelho d’água que ao se movimentar, geram ondulações discretas de áreas transparentes (PINTO JÚNIOR, 2007). Portinari estrutura o painel de forma distinta o que, nas palavras de Pinto Júnior (2007), seria uma subversão da estrutura ortogonal perpendicular dos elementos, pois os quadrados de azulejo se organizam segundo um grid de linha diagonais que, posteriormente, se tornariam uma marca da produção do artista. De acordo com Pinto Júnior (2007), a utilização recorrente de painéis na organização visual da arquitetura moderna brasileira nas décadas de 1930 e 1940, foi uma forma de enfatizar a construção do sentido dos lugares construídos. A edificação passa a acumular também a função de suporte da obra, constituindo o que, nas palavras de Simon (2006), recebe o nome de arquigrafia. Para o autor, o conceito está relacionado aos edifícios e lugares que incorporam imagens gráficas figurativas, abstratas, geométricas ou tipográficas, cujas funções se relacionam com as expressões ideológicas, lúdicas, publicitárias ou tecnológicas. Essas manifestações ocorrem sobre as superfícies, paredes, pisos e tetos, e incidem, interferem diretamente na forma, no entanto, não acontecem de maneira autônoma ou alheia a outros aspectos inerentes à arquitetura, ao contrário, se expressam em respectiva sintonia com a forma, tempo e contexto. 4.2 Convergência entre Arte e Design de Interiores A arte, num primeiro momento, se consolida como ornamento. Posteriormente, ela converge para distintas dimensões, como elemento difusor de religião, como resgate histórico, como registro imagético, para então, finalmente, se estabelecer como expressão. 72 A princípio, arte é encontrada em templos, em seguida passa a figurar em ambientes restritos e exclusivos, como museus ou residências abastadas. Dessa forma, ela começa a constituir um mercado de investimento, que congrega a apreciação artística e a rentabilidade financeira, que pode ou não estar ligada à preferência, o gosto do comprador. No entanto, é certa a busca pela lucratividade decorrente do valor estabelecido pelo mercado de arte. Na transição do século XIX para o século XX, ocorreram duas circunstâncias que promoveram a proximidade com a arte. A produção artística se amplia incrementando o mercado e ofertando mais possibilidades no sentido plástico e econômico, ou seja, vários artistas começaram a produzir, por meio de variadas linguagens, opções estéticas e valores. Ao longo do século XX, o desenvolvimento de novos materiais e de novas técnicas de reprodução gráfica permitiram a multiplicação das formas de expressão artística, contribuindo para a disseminação da arte e reforçando a sua estreita relação com a habitação. Dessa forma, reforçou-se a estreita relação da expressão artística com a habitação. Logo, é nesse contexto que o design de interiores começou a integrar a arte e o projeto. Figura 4.8 - integração arte e projeto Figura 4.9 - integração arte e projeto 73 No entanto, nos ocorre perguntar: Como realizar tal integração? Uma rápida pesquisa pela Internet pode apresentar uma ideia superficial desta empreitada, afirmando que, em alguns casos, a inserção da arte no projeto de design de interiores, quer seja um quadro, uma gravura, um desenho, por exemplo, possui, como único critério, a “combinação” cromática do quadro com os elementos do espaço. Figura 4.10 - Combinação cromática Portanto, quando falamos da arte inserida no âmbito do projeto, nos referimos a outra dimensão, trata-se da relação que estabelecemos com a arte. Para Read (1968), uma das falhas mais recorrentes é fato de utilizarmos como sinônimos as palavras arte e beleza. Tudo o que é arte é belo? Tudo o que é belo é arte? Tal questionamento, não é uma questão feiura ou beleza, é preciso entender a relação estabelecida entre a obra e o observador, entre o conteúdo e a mensagem. Por exemplo, observe as duas imagens que serão apresentadas logo em seguida. Do lado esquerdo temos uma obra de Jean Michel Basquiat e do lado direito uma obra de Pierre- Auguste Renoir. São formas gráficas distintas. É possível que você goste das duas da mesma forma ou tenha preferência por uma delas, é uma questão de gosto pessoal, portanto. Independente da qualidade técnica-artística, é possível apreciar ou preferir mais uma do que outra. 74 Dessa forma, essa relação preferencial, do cliente e não do designer, é fundamental para entendermos o desenvolvimento de um projeto de design de interiores. Repare que, é possível termos a mesma temática, mas a maneira de construir, ou seja, as expressões gráficas são distintas. Figura 4.11 - Jean Michel Basquiat7 Figura 4.12 - Pierre-Auguste Renoir Observe as imagensque virão a seguir, ambas retratam o que em artes visuais é denominado natureza morta, ou seja, uma composição elaborada com objetos cotidianos. Do lado esquerdo, temos uma natureza elaborada por meio de uma técnica que busca o rigor da forma, da cor e da composição; do lado direito, a segunda natureza morta, apresenta um desprendimento formal em relação a construção da luz e sombra, da perspectiva, entre outros. São formas expressivas distintas, que também estão relacionadas a preferências estéticas, que na elaboração projetual devem ser compreendidas. 7 Disponível em: https://www.flickr.com/photos/la_bretagne_a_paris/44803053225 75 4.13 - Natureza morta Figura 4.14 - Natureza morta Mas, então não se deve “combinar” a cor da parede ou do sofá com os objetos artísticos? Nos projetos abaixo, é possível perceber a convergência cromática entre os quadros e os elementos do projeto, mas há variadas maneiras de estabelecer a composição de cor de formas. O mote, ou conceito de um projeto, pode até partir de uma obra de arte, por exemplo, mas não necessariamente. Figura 4.15 - Convergência cromática 76 Figura 4.16 - Convergência cromática Repare na imagem a seguir. Há a predominância da cor verde utilizada na parede e em alguns acessórios. Os quadros, justamente por não integrarem a paleta de cores do projeto, ganham destaque, há, ainda, pequenos objetos na cor dourada, mas é uma presença muitíssimo discreta. Figura 4.17 - Paleta monocromática No projeto abaixo, a paleta monocromática também serve como “moldura” para o único objeto de arte na parede. 77 Figura 4.18 - Paleta monocromática No projeto a seguir, há uma discreta ligação entre a cor do quadro e a cor da parede, e a cor do móvel de apoio ao sofá. Na imagem seguinte, a cor predominante, o azul, figura nos acessórios da cama e no banco do lado esquerdo. A única ligação cromática com os quadros utilizados é uma manta colocada sobre a cama, quase como um elemento de produção fotográfica e não um objeto fixo. Nem por isso, há um resultado menos interessante em termos formais. Figura 4.19 - Ligação cromática 78 Figura 4.20 - Ligação cromática Logo, dessa maneira terminamos este bloco, até a próxima! Conclusão Para Pinto Júnior (2007), o lugar é um receptáculo da obra de arquitetura. A arquitetura, por sua vez, se constitui como um suporte da obra visual contribuindo para o que, nas palavras do autor, recebe o nome de ambiência. Mas, o que é isso quer dizer? A ambiência está relacionada ao que nos rodeia, a qualidade do que é ambiente, do que rodeia os seres vivos. A arte passou de elemento ornamental à obra exclusiva para apreciação e de posse restrita. Ela emerge no século XX estabelecendo uma proximidade maior com o grande público em função da evolução dos meios de comunicação e do desenvolvimento técnico de processos e produtos. Nessa perspectiva, a obra de arte começa a integrar, além dos espaços expositivos próprios e os espaços públicos, os espaços corporativos e os espaços habitados. Esta 79 integração se, por um lado buscou denotar sofisticação, por outro lado outro, buscou apenas refletir uma relação genuína de ligação entre o objeto de arte e o observador. O objetivo deste conteúdo não é traçar um painel, mas, antes, refletir sobre uma das muitas possibilidades de integração entre Arte, Arquitetura e Design de Interiores. REFERÊNCIAS COSTA, L. Registro de uma vivência. Brasília: Editora UnB – Universidade de Brasília, 1995. IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Inventário da Obra de Athos Bulcão em Brasília. Brasília: Superintendência do IPHAN no Distrito Federal, 2018. Disponível em: < http://portal.iphan.gov.br/uploads/publicacao/athosbulcatilde_menor.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2019. PINTO JUNIOR, R. A. Os azulejos de Portinari como elementos visuais da arquitetura modernista no Brasil. Arquitextos, São Paulo: Vitruvius, 2007. Disponível em: <http://mail.romanoguerra.com.br/revistas/read/arquitextos/08.087/226>. Acesso: 22 jul. 2019. READ, H. O significado da arte. Lisboa: Editora Ulisseia, 1968. SIMON, A. F. B. Arquigrafias: o edifício e o lugar como suporte. Porto Alegre: UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006. Disponível em: <https://lume.ufrgs.br/handle/10183/11040>. Acesso em: 22 jul. 2019. 80 5 ARTE E DESIGN DE PRODUTO Desde sempre, o homem procurou se adaptar ao meio ambiente através da elaboração de objetos que facilitassem o seu cotidiano. Com o desenvolvimento econômico e tecnológico, surgiram novos materiais e técnicas que procuraram responder aos desafios, antes, de uma sociedade artesanal, em seguida, de uma sociedade fabril. Nesse percurso, o design de produto, assim como tantas outras formas de expressão, passou a interagir com a produção artística influenciando e sendo influenciado pela busca de novas construções estéticas e conceituais. O homem sempre buscou, por meio de suas habilidades, desenvolver objetos que permitissem a sua sobrevivência em ambientes inóspitos. Dessa forma, não foi diferente sua relação com a comunicação. Mesmo antes de dominar a fala, o homem já se expressava por meio da imagem. Logo a relação entre visualidade e conteúdo está se aprimorando ao longo do desenvolvimento da humanidade. Nessa perspectiva, há uma estreita relação entre o desenvolvimento da arte e o desenvolvimento da comunicação com objetivos de mercado, assim como a profunda relação entre criatividade pura e criatividade aplicada. Portanto, é sobre isto que vamos conversar neste Bloco. Vamos? 5.1 Arte e Design de produto A origem do design de produto confunde-se com a história da humanidade, com o surgimento da indústria e uma infinidade de inovações tecnológicas surgidas ao longo dos tempos. 81 Sabemos que na antiguidade, os artefatos (em metal e cerâmica) utilizados para caça e demais necessidades, já eram produzidos por meio de um sistema que, guardadas as devidas proporções, estava próximo de uma produção em série. Figura 5.1 - Objetos de ferro históricos Para o engenheiro/construtor romano, Vitruvius (80 a.C. – 1ª.C), toda construção deveria contemplar três categorias: a solidez (firmitas), a utilidade (utilitas) e a beleza (venustas). Na perspectiva de Burdek (2006), essas categorias constituem as bases do que, no século XX, seria conhecido como funcionalismo e consolidaria o design como vetor de transformação. Um salto na história, no Renascimento, segundo Burdek (2006), encontramos aquele que pode ser considerado o primeiro designer: Leonardo da Vinci. Neste artista, inventor, engenheiro e, sobretudo, visionário, reside o designer enquanto inventor. 82 Figura 5.2 - Legado de Leonardo da Vinci Figura 5.3 - Legado de Leonardo da Vinci A observação atenta da natureza permitiu a Leonardo da Vinci a concepção e, em alguns casos, a construção de um número considerável de estudos e modelos de máquinas, que se mostraram absolutamente visionários, ou seja, muito avançados para a época. A extensa produção do artista deixa claro o seu fascínio pela possibilidade de voar. Tal obsessão fez com elaborasse um projeto de máquina voadora. O artista e inventor italiano elaborou ainda vários registros gráficos, fruto da observação intensa da morfologia e da anatomia das aves, sempre como o objetivo de entender como um ser era capaz de voar. Tais estudos anteciparam o que viria a ser, mais tarde, a gênese da aerodinâmica, que permitiria ao homem contemporâneo conceber, materializar e utilizar o meio de transporte aéreo. Por isso, Leonardo é considerado,por muitos estudiosos, o “Pai” da biomimética. No entanto, o que é biomimética? Também conhecida como bioinspiração, a biomimética diz respeito à elaboração projetual, a partir da observação da natureza, ela tem como premissa conceitual elementos naturais. Não podemos esquecer que o Art Nouveau, foi um movimento artístico intrinsecamente relacionado a natureza, que exerceu influência transversal sob a arquitetura, o design de interiores, o design gráfico, o design de produto e, claro, sob as artes visuais. 83 Traçando uma linha cronológica para as Artes, a Revolução Industrial (século XVIII – XIX) foi o momento no qual a produção artesanal cedeu lugar à produção fabril, colocando em pauta a possibilidade de coexistência entre produção em larga escala e estética. Em seguida, nas primeiras décadas do século XX surge o movimento De Stijl e o movimento Bauhaus. É a gênese do design funcionalista que preconiza a síntese da forma em toda a sua expressão e influencia o design de produto e gráfico. Figura 5.4 - Cadeira Rietveld Na década de 1940, no Brasil, o mobiliário adquire características modernas com traços brasileiros pela mão do artista português, radicado no Brasil, Joaquim Tenreiro. O impulso veio da política industrializante da década anterior, no governo Vargas. 84 Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:MCB_mobili%C3%A1rio_02.jpg> Figura 5.5 - Poltrona de embalo, projetada por Joaquim Tenreiro Seguindo o panorama mundial, o excesso de cor e a utilização de novos materiais, que surgiram ao longo do século XX, consolidam um cenário de experimentação formal. Figura 5.6 - Poltrona dos anos sessenta https://commons.wikimedia.org/wiki/File:MCB_mobili%C3%A1rio_02.jpg 85 No final da década de 1960, a conquista do espaço fez com que o design do início dos anos 1970 começasse a repensar o mundo por meio da óptica tecnológica: é o estilo high-tech – utilização de artefatos de cunho industrial. Fonte:<https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Chairs_by_Ron_Arad#/media/F ile:Maxistuhl_Well_Tempered_Chair_von_Ron_Arad_in_Weil_am_Rhein- Altweil,_L%C3%B6rracher_Str._4.jpg> Figura 5.7 - Maxistuhl Well Tempered Chair von Ron Arad Na década de 1970, o tema psicodélico – e toda a sua profusão cromática - embora comece de forma paulatina, persiste e cede lugar aos movimentos artísticos da década seguinte, que privilegiam estéticas mais sombrias como o punk, por exemplo, e se sucedem por períodos efêmeros. Portanto, as décadas de 1960 e 1970 são marcadas por uma série de transformações políticas e econômicas, que se desdobram em muitas formas de expressão, entre elas a Pop Art, que além de discutir aspectos estéticos põe, igualmente em pauta, os posicionamentos sociais e as transformações globais. A década de 1980 trouxe o início da democratização da informática, com a realidade de uma comunicação mais veloz, capaz de reduzir distâncias e acelerar a troca de informações: estamos em uma aldeia global. Nesta década, surgem os movimentos Radical design e Anti-design, cuja premissa comum consiste, sobretudo, na dimensão sociocultural do design. https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Chairs_by_Ron_Arad#/media/File:Maxistuhl_Well_Tempered_Chair_von_Ron_Arad_in_Weil_am_Rhein-Altweil,_L%C3%B6rracher_Str._4.jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Chairs_by_Ron_Arad#/media/File:Maxistuhl_Well_Tempered_Chair_von_Ron_Arad_in_Weil_am_Rhein-Altweil,_L%C3%B6rracher_Str._4.jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Chairs_by_Ron_Arad#/media/File:Maxistuhl_Well_Tempered_Chair_von_Ron_Arad_in_Weil_am_Rhein-Altweil,_L%C3%B6rracher_Str._4.jpg 86 Além disso, o Radical design questiona os aspectos funcionais do objeto em detrimento dos aspectos estéticos, enquanto o Anti-design tem como objetivo final a experimentação formal e não está centrado no mercado. São estes os preceitos que resultaram mais adiante no grupo Memphis. O questionamento da forma, a qual se sobrepõem a função, é premissa conceitual do grupo Memphis - formado na Itália, no início da década de 1980, por Ettore Sottsass -, é o marco do design pós-moderno. O uso de cores vibrantes e uma estética que beira o kitsch são características deste período, que pretendia estabelecer o “caos semântico”, criando uma dinâmica cromática e divertida, tão característica dos anos 1980. A década de 1990 concebeu uma produção do design de produto, cujo resultado tem caráter fortemente sensorial, estético e uma proposta de uso inusitado dos materiais. A partir daí a produção de design começou a promover a aproximação entre aquilo que é global e aquilo que é local: a globalização e a identidade cultural, ao mesmo tempo em que, numa visão contemporânea, alia arte e design. Exemplos significativos desta produção contemporânea, que busca a utilização do objeto como experiência, são as figuras dos designers Philippe Starck e dos irmãos Campana. Figura 5.8 - Espremedor de laranja 87 Fonte:<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Favela_by_Fernando_and_Humbert o_Campana_(Edra),_Salone_Internazionale_del_Mobile_2009_(3477175203).jpg> Figura 5.9 - Favela, Fernando e Humberto Campana Os objetos concebidos pelo egípcio Karim Rashid promovem um renascimento do design com formas orgânicas e forte apelo cromático, além de explorar todas as possibilidades plásticas que os materiais poliméricos permitem. As peças do designer, se por um lado apresentam forte apelo tecnológico, por outro lado, proporcionam uma experiência dos sentidos por meio de uma linguagem fluida e delicada, que é denominada pelo designer como tecno-orgânico. Recentemente surgiu um novo campo: o Design Emocional – uma evolução do design sensorial – que trabalha a partir da ligação entre o utilizador e o objeto, num plano que vai para além da usabilidade e da necessidade. Dessa forma, terminamos mais um conteúdo desta disciplina. Espero que tenham gostado. Até a próxima! https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Favela_by_Fernando_and_Humberto_Campana_(Edra),_Salone_Internazionale_del_Mobile_2009_(3477175203).jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Favela_by_Fernando_and_Humberto_Campana_(Edra),_Salone_Internazionale_del_Mobile_2009_(3477175203).jpg 88 5.2 Arte e Design Gráfico A gênese da comunicação humana está centrada na imagem e no advento da escrita, pois foi por meio delas, que se operou a transmissão de mensagens, cujos conteúdos servem como referência histórica. Com o aparecimento da escrita na Mesopotâmia e no Egito, e a possibilidade de outro suporte de comunicação além da pedra, houve uma grande preocupação com a elaboração do conteúdo a ser transmitido. Figura 5.10 - Hieróglifos egípcios esculpidos em arenito Johann Gutenberg, no século XV, introduziu a forma moderna de impressão gráfica, através de tipos móveis, dando início a uma verdadeira revolução tecnológica, que levou a substituição de manuscritos e da caligrafia pela tipografia. Historicamente, ocorreu a inserção de meios mecânicos no processo produtivo. O crescimento urbano do final do séc. XIX expressa a sua efervescência econômica através do pôster artístico. Paris é o centro artístico do mundo e tem em Toulouse Lautrec um de seus expoentes artístico-gráficos. Já, no século XX, movido pelo desejo de expressar a natureza, a Art Nouveau influenciou de forma definitiva a manufatura de objetos, a arquitetura, as artes visuais e as artes gráficas. 89 Ainda no século XX, no âmbito do movimento De Stijl e da Bauhaus, ocorre uma simplificação formal, na qual não há lugar para o ornamento. A Bauhaus decodifica a comunicação visual por meio de um estudo sistemático dos tipos gráficos, a sua relação com a imagem e os limites da legibilidade. Figura 5.13 - De Stijl Figura 5.11 - JaneAvril, de Henri de Toulouse-Lautrec, 1893 Figura 5.12 - Aristide Bruant, em seu cabaré, por Henri de Toulouse-Lautrec, 1893 90 Enquanto, no Brasil, em 1922, acontece a Semana de Arte Moderna de São Paulo, que renovou o panorama artístico paulistano e reuniu nomes consagrados da cena artística da cidade, influenciados por movimentos artísticos instalados na Europa, como, o cubismo, o expressionismo e o pós-impressionismo. Apesar de efêmera, como projeto, a Semana de 22, que contou com Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Victor Brecheret, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Villa-Lobos entre outros, perdurou como ideia e marcou definitivamente o início do modernismo no Brasil. Figura 5.14 - Semana de 1922 A quietude dos anos 1950 cede lugar ao período explosivo dos anos 1960, no qual a liberdade de expressão e a reflexão sobre um novo posicionamento político e social é expresso nas ruas, mas também em toda a produção artística contemporânea da época. Nos Estados Unidos, o underground – termo usado para descrever a atitude de oposição ao establishment de muitos jovens de classe média, buscou refletir o contexto social através da cultura hippie e o seu movimento pela paz (HOLLIS, 2000, p. 132). Figura 5.15 - Capa da Klaxon de agosto 91 Nessa mesma época, o design gráfico expressa sua indignação diante da guerra do Vietnã, ao mesmo tempo que, no auge da era psicodélica, fica explícita a experimentação visual associada aos novos recursos gráficos. A Pop Art, movimento artístico cujo ápice ocorreu nos anos 1960, discutiu o cotidiano e o consumo em massa como formas de expressão artística. Figura 5.16 - Andy Warhol, um dos artistas notáveis da Pop Art Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Pop_art#/media/Ficheiro:Warhol_exhibition.jpg> Figura 5.17- Pilares de latas Campbell no edifício da Academia Real Escocesa, Edimburgo https://pt.wikipedia.org/wiki/Pop_art#/media/Ficheiro:Warhol_exhibition.jpg 92 Na década de 1960, no Brasil, o design gráfico tem o seu expoente máximo na figura de Aloisio Magalhães. O designer, um dos responsáveis pela implantação do primeiro curso de design no Rio de Janeiro, a ESDI – Escola Superior de Desenho Industrial -, teve uma produção ampla e significativa, entre os seus projetos estão a primeira identidade visual da Rede Globo e de outras empresas importantes como a LIGHT (empresa distribuidora de energia elétrica), Petrobrás, Unibanco, além do projeto gráfico das notas do cruzeiro novo, o que também elucida a importância e a abrangência da atuação do artista. Figura 5.18 - O primeiro logotipo da Rede Globo, criado por Aloísio Magalhães Contemporâneo de Aloísio Magalhães, fortemente influenciado pelo modernismo, o designer Alexandre Wollner também participou da implantação do primeiro curso de design no Brasil, a ESDI, além de possuir uma produção bastante significativa no campo do design gráfico. O designer continua sendo grande referência do design nacional, e por meio da crítica lúcida em relação à produção contemporânea, contribuiu de forma significativa como pensador da disciplina. Saiba Mais Conheça mais sobre a vida do designer Alexandre Wollner no documentário “Alexandre Wollner e a Formação do Design Moderno no Brasil”. Acesse o link: <https://www.youtube.com/watch?v=s7LOZLMRRO0> https://www.youtube.com/watch?v=s7LOZLMRRO0 93 O entendimento da identidade visual como um sistema de comunicação integrado, tem o seu marco histórico no projeto dos Jogos Olímpicos, de Munique, em 1972, elaborado pelo designer alemão Otl Aicher. Para tal feito, foi necessário trabalhar, sobretudo, com a dissociação do evento anterior (1936) e toda óbvia relação com o nazismo de Hitler. A síntese gráfica alcançada pelo projeto de Aicher fez com que o sistema de pictogramas elaborado sirva, ainda hoje, como referência para a mobilidade de qualquer que seja o grupo de indivíduos, desconsiderando a sua procedência geográfica ou cultural. Figura 5.19 - Logo da Olimpíada de Munique 1972 94 Fonte: <https://en.wikipedia.org/wiki/1972_Summer_Olympics> Figura 5.20 - Pictogramas desenhados para a Olimpíada de Munique Paul Rand foi um designer americano, cuja notoriedade consiste na influência que sofreu da estética do movimento Avant Garde europeu, expressa no trabalho que desenvolveu nos Estados Unidos. Por este motivo, foi considerado o mais influente de sua geração. A síntese gráfica e o dinamismo visual de seu trabalho rompem com o design institucionalizado nos Estados Unidos, devido a sua simplicidade, muito embora, como disse Rand o “Design é tão simples, por isso é tão complicado”. No final do século XX, consolida-se a transformação digital. O acesso, a velocidade, a instantaneidade na troca de informações significou a quebra das barreiras geográficas. Essa alteração social, em termos globais, se manifestou na forma como a comunicação impressa é elaborada e, sobretudo, na forma como se diluiu e se transformou em digital. Saiba Mais Conheça mais sobre as obras de David Carson. Visite o site oficial do designer. http:<//www.davidcarsondesign.com/> https://en.wikipedia.org/wiki/1972_Summer_Olympics 95 Atualmente, a linguagem do design gráfico impresso ganhou a mesma dinâmica presente no universo digital e todas as possibilidades inerentes a esse universo. Com grande empatia pela vanguarda antropofágica brasileira, o designer brasileiro Rico Lins, tem uma produção na área do design gráfico extensa e marcante, que consegue conjugar o melhor da materialidade e da imaterialidade do projeto de design, o desenho a mão e os recursos digitais. Na obra abaixo “Seja Marginal, Seja Herói”, Rico Lins presta um tributo à obra “Bandeira- Poema” de autoria de Hélio Oiticica. Dessa forma, terminamos mais um conteúdo da disciplina. Nos encontraremos em breve. Até lá! Fonte:< http://amparo60.com.br/rico-lins-j-borges-e-h-d-mabuse-marginais-herois/ > Figura: 5.21 - Seja Marginal/Seja Herói: Rico Lins 96 Conclusão A arte permeia a vida de todos nós. Logo, a produção de design de produto não foi diferente. Um excelente exemplo dessa intensa relação consiste no desenvolvimento da Escola Bauhaus que, por meio da reflexão sobre a produção em grande escala e a questão estética, desenvolveu um método pedagógico colocando-o em prática pelas mãos de um corpo docente com vasta produção artística. Nessa perspectiva, procurou-se refletir sobre as muitas possibilidades de integração e consequentes desdobramentos na intersecção entre arte e design de produto. Não há dúvida que, o desenvolvimento técnico significou e continua significando um profundo processo de transformação na concepção de comunicação, que hoje é, predominantemente, digital. O design gráfico, enquanto força de fundamental importância na transmissão de informação, percorreu uma enorme trajetória, que teve início nas cavernas pré- históricas e nos dias atuais se mostra nas telas de pequenos objetos móveis, os celulares, que povoam e, sobretudo, dominam o nosso cotidiano. Nesse percurso, além do desenvolvimento de novas tecnologias, ocorreu também, em termos visuais, a permanente troca entre a arte e as formas de comunicação. Essa intensa interface influenciou e ainda influência a forma como os dados visuais se organizam e se mostram com o objetivo de comunicarem de maneira eficaz e eficiente. REFERÊNCIAS BURDEK, B. Design: História, teoria e prática do design de produtos. São Paulo: Editora Blucher, 2006. HOLLIS, R. Design Gráfico: Uma História Concisa. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000. 97 6 CONTEXTO E ESTRUTURA Este é o último Bloco da disciplina de Projeto Integrador: Artes Aplicadas e ele está dividido em duas partes: o contexto e a estruturação. A primeira parte, o conteúdo, abordaro contexto no qual se desenvolverá o projeto final, e que tem como temática o Design de Superfície. Na segunda parte, a estrutura, vamos tratar da estruturação compositiva. Em qualquer elaboração visual, é necessário considerar a relação estabelecida entre os elementos e o espaço no qual estes elementos serão dispostos. Neste Bloco, em particular, abordaremos a questão da proporcionalidade e, sobretudo, do aspecto compositivo a partir de uma unidade de origem que denominamos módulo. Vamos? 6.1 Design de Superfície O design de superfície, também conhecido como surface design, é toda a intervenção gráfica que tem como objetivo criar uma padronagem. Nas palavras de Ruthschilling (2000), o design de superfície tem como objetivo a elaboração visual e bidimensional, gerando um padrão que, por repetição, se desenvolve de maneira contínua. Entretanto, em quais lugares encontramos o design de superfície? Sabe o azulejo da sua casa? Sabe o papel de parede do quarto? Sabe aquele desenho da toalha de mesa? Então, tudo isso é design de superfície! Pouco conhecido como campo de atuação no Brasil, o design de superfície também atende pelo nome de design têxtil ou design de estamparia. Rubim (2005), ao traçar a linha do tempo desta modalidade de design, remonta ao começo de tudo, justamente, em Lascaux, quando o homem primitivo deu início ao processo de comunicação visual, esboçando figuras nas paredes das cavernas. 98 Em seguida, tanto os egípcios, quanto os gregos e, ainda, outros povos contribuíram para o design de superfície na elaboração de peças e utensílios. Figura 6.1 - Design de superfície na elaboração de peças e utensílios Posteriormente, já com algumas opções de suporte, o design de superfície ganha técnicas distintas, como o desenho por meio de carimbos e o desenho com cera. No primeiro caso, é utilizado um carimbo mesmo, como o que conhecemos hoje, porém o entalhe é realizado sobre madeira como se de uma matriz de xilogravura (gravura cuja matriz é a madeira) se tratasse. O trabalho é feito de forma totalmente artesanal e ainda hoje, em muitos lugares da Índia, o design de superfície é feito desta maneira. Já a técnica do desenho com cera surgiu, de acordo com Silva (2013), Durante o século XVI, no sudoeste da Ásia, estampas foram produzidas sobre tecidos de algodão por meio da técnica conhecida como Batik, que consiste em desenhar com cera sobre o tecido nas partes que não receberão tinta, e em seguida tingi-lo com várias cores. (SILVA, 2013 p. 4) 99 Figura 6.2 – Batik, técnica de tingimento em tecido artesanal No caso específico do Brasil, é possível dizer que parte da tradição do design de superfície nacional consiste na produção do grafismo indígena. Tal manifestação cultural, bastante conhecida por ser realizada em cestarias e cerâmicas, também pode ser realizada sob a pele, como expressão estética, porém carregada de simbolismo, pois, deriva de aspectos que, nas palavras de Vidal (2000), constituiria um idioma-código expresso de forma gráfica. As crianças indígenas convivem com essa construção gráfico/simbólica desde muito jovens e, assim como os processos de transmissão geracional visto em tantas culturas, as técnicas são assimiladas, mantidas e resgatadas cotidianamente. A complexidade gráfica está relacionada também com questões territoriais. Apesar da riqueza do material disponível, o estudo da arte e da ornamentação do corpo foi relegado a segundo plano, durante muitos anos, no que diz respeito às sociedades indígenas do Brasil. As razões para essa recusa se explicam pelo fato de a arte ter sido considerada como esfera residual ou independente do contexto no qual aparece. Com isso, ignorou-se o tipo de evidência que o estudo ela arte aporta à análise das ideias subjacentes a campos e domínios sociais, religiosos e cognitivos ele um modo geral. Apenas recentemente a pintura, a arte gráfica e os ornamentos do corpo passaram a ser considerados como material visual que exprime a concepção tribal de pessoa humana, a categorização social e material e outras mensagens referentes à ordem cósmica. Em resumo, manifestações simbólicas e estéticas centrais para a compreensão ela vida em sociedade (VIDAL, 2000 p.13). 100 Na transição entre a produção manufaturada e a produção industrial, durante a Revolução Industrial, William Morris procurou preservar a questão estética que julgava ser incompatível com a produção em grande escala. O movimento das Artes e Ofícios (Arts & Crafts) contribuiu para a transição entre o artesanal e o industrial, buscando realizar um resgate estético por meio de uma linguagem inovadora. Durante o movimento Art Nouveau, uma infinidade de padronagens inspiradas na natureza se materializaram por meio de tecidos, tapeçarias e papéis de parede. Figura 6.3 - Marigold by William Morris (1834-1896). Original from The MET Museum. No Brasil, o período da arquitetura moderna teve uma produção de design de superfície interessantíssima, totalmente integrado à arquitetura, concebidos pelas mãos de artistas como Athos Bulcão, Emiliano Di Cavalcanti e Cândido Portinari, entre outros. 101 No entanto, ainda que, por definição, o design de superfície esteja vinculado ao plano bidimensional, não podemos deixar de citar um elemento de grande impacto visual, embora tridimensional, que está vinculado à memória afetiva de todos nós: o cobogó. Você sabe o que é um cobogó? Certamente sim, mas não está ligando o nome ao objeto. O cobogó é aquele “tijolo” com furinhos, também conhecido como elemento vazado, que tem como função mediar a entrada de luz e ventilação. O cobogó é da década de 1930, e foi: Invenção de dois comerciantes e um engenheiro radicados no Recife no início do século XX — Coimbra, Boeckmann e Góes, que emprestariam as iniciais de seus sobrenomes para batizar o produto - o cobogó foi concebido como um simples elemento pré-fabricado, próprio a ser construído em série, baseado na vazadura de uma retícula modular sobre uma placa prismática de concreto. Na prática, se utilizado como elemento de composição de septos verticais, permitiria a passagem da ventilação natural, ao mesmo tempo em que reduziria a incidência da luz solar, fatores adequados para projetos em lugares de clima quente e úmido. (BORBA, 2012 apud RODRIGUES, 2012 p. 5) Fonte:<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Conjunto_Nacional_Cobog%C3%B 3s.jpg> Figura 6.4 - Conjunto Nacional Cobogó 102 Dessa forma, com o cobogó, terminamos mais um conteúdo da disciplina. Espero que tenham gostado. Até a próxima! 6.2 Estrutura O projeto de arquitetura (design de interiores ou design gráfico), por exemplo, trabalha, a relação entre os elementos e o espaço disponível. Por exemplo, pode ser um terreno para a construção de um prédio ou a sala de uma residência disponível para um projeto de interiores, ou ainda, uma folha A4 para a elaboração de um cartaz. Em outras palavras, podemos falar da relação estabelecida entre o tamanho do suporte e o tamanho dos elementos nele inseridos. Uma relação de proporção. Repare na relação de proporção apresentada na figura 1 e na figura 2. Uma é muito menor em relação ao tamanho do suporte (área cinza) do que a outra, a figura 2. Podemos falar também, entre outras formas, uma relação de composição, ou seja, a escolha para a inserção dos elementos de uma determinada maneira e não de outra. Figura 6.5 - FIGURA 1 103 Figura 6.7 - FIGURA 2 Figura 6.8 - FIGURA 3 Agora observe as figuras 2 e 3 e a relação estabelecida entre os elementos e o suporte. Enquanto uma composição apresenta três elementos dispostos de maneira igual sobre o suporte (figura 3), a outra apresenta apenasum elemento inserido ao lado direito do suporte, deixando uma área substancial vazia do lado esquerdo. Eis a pergunta: Qual deles está correto? A resposta: Depende do que se pretende. 104 Tipos de estrutura Segundo Wong (2010), ao trabalharmos, mais especificamente, com elaboração gráfica no design de superfície, ou seja, na criação de um padrão gráfico, é possível identificar alguns tipos de estrutura. Estrutura Formal; Estrutura Semi Formal; Estrutura Informal. Estrutura Formal A estrutura formal, como o próprio nome afirma, é uma construção estrutural rígida que orienta a composição e as subdivisões. Figura 6.9 - FIGURA 4 Estrutura SemiFormal Na estrutura semiformal, é possível identificar uma leve irregularidade no padrão estabelecido. 105 Figura 6.10 - FIGURA 5 Estrutura Informal Apresenta uma construção livre, onde não é possível identificar linhas estruturais compositivas. Figura 6.11 - FIGURA 6 106 Elementos e Composição Considerando que cada elemento compositivo é uma unidade, vamos entender algumas possibilidades compositivas. MÓDULO Figura 6.12 - FIGURA 7 TRANSLAÇÃO (movimento + direção) A partir da repetição do mesmo módulo, é possível construir padrões distintos. Um deles é o movimento de translação (movimento de um ponto a outro), como no exemplo abaixo, na mesma direção. Figura 6.13 - FIGURA 8 107 REFLEXÃO (movimento + simetria) É possível ainda, a partir da utilização de vários módulos, dispostos na mesma direção, mas, com sentidos diferentes, construir um padrão de simetria. Figura 6.14 - FIGURA 9 ROTAÇÃO (movimento + ângulo) Outra possibilidade compositiva é obtida por meio da rotação do módulo. Repare que, as unidades, de forma individual, podem ser utilizadas em ângulos diferentes obtendo- se, por conseguinte, composições diversas. Figura 6.15 - FIGURA 10 108 Figura 6.16 - FIGURA 11 Dessa maneira, finalizamos mais um conteúdo. Espero que tenham gostado. Até a próxima! Conclusão Embora possamos não perceber, o Design de Superfície é elemento recorrente em nosso cotidiano. Por exemplo, o padrão repetitivo do azulejo de casa ou do edredom da cama, são denominamos Design de Superfície, Design Têxtil ou Design de Estamparia. Recentemente, os projetos de Design de Interiores estão resgatado um elemento que foi bastante utilizado em diversas épocas ao longo do século XX: o Papel de Parede. Dessa forma, o papel de parede recebeu uma leitura contemporânea e tem sido utilizado como recurso para destacar ou “camuflar” pontos mais (ou menos) interessantes de um determinado espaço. 109 É evidente que há muitas formas de se empreender composições formais, visuais, Neste segundo conteúdo, abordamos apenas algumas formas. Sendo assim, procuramos, por meio das possibilidades apresentadas, demonstrar como a partir de uma mesma unidade/módulo é possível obter resultados e linguagens distintas. REFERÊNCIAS RODRIGUES, J. Cobogó de Pernambuco. Recife: Editora Luminar, 2012. Disponível em: <http://cobogodepernambuco.com/wp-content/uploads/2013/07/Pesquisa-Cobogo- de-Pernambuco.pdf>. Acesso em: 20 Jul. 2019. RUBIM, R. Desenhando a superfície. São Paulo: Editora Rosari, 2005. RUTHSCHILLING, E. A. Protótipo do curso interativo de design de superfície. Porto Alegre: Instituto de Artes - Departamento de Artes Visuais, Núcleo de Design de Superfície – UFRGS, 2000. Disponível em: < https://seer.ufrgs.br/InfEducTeoriaPratica/article/viewFile/6321/3786 >. Acesso em: 20 Jul. 2019. SILVA, D. N. Design Têxtil: Revisão histórica, surgimento e evolução de tecnologias. Florianópolis: Graphica, 2013. Disponível em: <http://wright.ava.ufsc.br/~grupohipermidia/graphica2013/trabalhos/DESIGN%20TEX TIL%20REVISAO%20HISTORICA%20SURGIMENTO%20E%20EVOLUCAO%20DE%20TEC OLOGIAS.pdf>. Acesso em: 04 Ago. 2019. VIDAL, L. O grafismo indígena: Estudos de antropologia estética. São Paulo: Studio Nobel: FAPESP: Editora da Universidade de São Paulo, 2000. Disponível em: <http://etnolinguistica.wdfiles.com/local--files/biblio%3Avidal-2000 grafismo/Vidal_2000_Grafismo_indigena_OCR.pdf> >. Acesso em: 20 Jul. 2019. WONG, W. Desenhando a superfície. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2010.