Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
AULA 1 DIREITO DIPLOMÁTICO E CONSULAR Prof. Arthur Augusto Garcia 2 TEMA 1 – RELAÇÕES INTERNACIONAIS E RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS 1.1 Relações diplomáticas A diplomacia, em seu desenvolvimento, se confunde com a atividade internacional que os Estados, ao longo dos séculos, promoveram na consecução dos interesses nacionais, principalmente no âmbito da política externa, sempre realizada por seus cônsules e diplomatas. Desde a mais remota antiguidade, a diplomacia foi – e é até hoje – um importante instrumento de promoção dos interesses dos Estados, consolidando- se como relevante mecanismo que tem como objetivo a solução pacífica de controvérsias nas relações internacionais. Dessa forma, desempenha um papel significativo no desenvolvimento das atividades comerciais, que originalmente, constitui o objeto de proteção diplomática. Essa proteção encontrou na doutrina clássica as primeiras delimitações, como, por exemplo, na obra de Emer de Vattes (1758) intitulada O direito das gentes. Ali, é fácil identificar as primeiras referências em relação à matéria de proteção diplomática, que é essencial como direito do Estado. Essa perspectiva, no âmbito moderno da doutrina, perdurou por séculos e se incumbiu de colocar o indivíduo como objeto da proteção diplomática, e não vice-versa. No decorrer do século XX, a doutrina e a jurisprudência ajustaram o conceito tradicional de proteção diplomática à realidade do mundo pós-moderno, visto que a maior parte dos investimentos estrangeiros estava ligada à atividade desenvolvida por pessoas jurídicas. Passou-se também a questionar o papel do indivíduo como objeto de tal proteção. Baseando-se nesses novos questionamentos e visões, surgiram as teorias que defendem o indivíduo como destinatário do direito internacional, as quais veremos mais adiante. O direito diplomático tem como premissa básica a soberania dos Estados, o que acarreta maior dificuldade na aplicação das normais jurídicas. Ao contrário do que ocorre no ordenamento interno dos países, em que os indivíduos estão subordinados a regras constitucionais e ao poder estatal, na ordem internacional não há força superior que determine tais condutas. Dessa forma, é possível dizer que os Estados soberanos se encontram no mesmo nível hierárquico e que as relações entre eles são manifestadas conforme a coordenação que advém de acordos de vontade. 3 Como não existe um poder supranacional que detenha poder para definição de regras e aplicação de sanções sem a concordância dos indivíduos envolvidos, o direito diplomático tem sido, ao longo dos anos, objeto de diversas críticas, uma vez que a ausência de normas abrangentes e coercitivas poderia trazer uma invalidade a essa grande área do direito internacional. Posto isso, os Estados soberanos são submetidos apenas às obrigações que tiverem assumido dentro dos parâmetros que considerem razoáveis. A ausência de uma força externa e superior exige que o direito diplomático tenha algum evento de vinculação entre as partes e que este seja capaz de atribuir obrigações e conferir direitos recíprocos entre elas. Um dos princípios que garantem a coerência do tecido normativo internacional é conhecido como pact sunt servanda, que pode ser traduzido como “o pacto deve ser observado e cumprido”. Esse princípio está inteiramente ligado à boa-fé, mediante a qual uma parte se compromete a cumprir as regras que aceitou, considerando a expectativa de que a outra parte proceda da mesma forma. Assim, o vínculo formado entre os Estados normalmente é consolidado com a celebração de um tratado, documento que representa o acordo de vontades soberanas e que se destina a estabelecer parâmetros recíprocos de ação conforme os desejos dos signatários. Há também, como efetivação desse princípio, a aceitação de costumes dotados de validade jurídica e que possuem grande relevância em razão do baixo nível de codificação do direito internacional. Portanto, o direito diplomático pode ser definido como um conjunto de princípios e regras, pautados na boa-fé e na soberania, reunidos em normas escritas e não escritas voltadas a regular as relações entre os Estados soberanos e os organismos internacionais. 1.2 Relações internacionais As relações internacionais são conceituadas como o ramo do direito cuja finalidade é regulamentar as relações jurídicas existentes entre os sujeitos do direito internacional dentro de uma sociedade internacional. A relação internacional é constituída pelos fluxos produzidos pelos humanos que atravessam as fronteiras entre os Estados e os espações considerados comuns, como a Antártida, os oceanos, o espaço sideral etc. 4 Tais fluxos podem ser materiais e imateriais, legais e ilegais, abrangendo todas as relações de poder, trocas comerciais, finanças, turismo, tráfico de drogas, pessoas, culturas, notícias, esportes, infraestrutura etc. Nesse sentido, as relações internacionais são consideradas como um campo de estudo interdisciplinar o qual analisa esses fluxos. 1.3 Diferenciações Um dos fluxos mais importantes é o relacionamento formal e informal, regular ou esporádico, que os Estados possuem entre si e que se dá por meio da diplomacia (direito diplomático). Tal direito envolve a acreditação de representantes oficiais dos Estados soberanos, como embaixadores, funcionários etc., bem como o relacionamento com as organizações internacionais que promovem as relações pacíficas e os canais de diálogo, conforme estabelecido pela Convenção de Viena, firmada em 19611. Nesse sentido, o direito diplomático traz uma dimensão da política externa dos Estados, manifestando-se por meio de negociações, representação e informação lícita. Por esse motivo, desde 1961 há uma clara separação entre direito diplomático e relações internacionais, ficando vedado aos diplomatas, por exemplo, realizarem atividade de espionagem e/ou o controle de fontes humanas nos países nos quais estão acreditados. São instrumentos diplomáticos arbitragem, conferências, mediações e negociações, tendo como resultado direto a formação de regimes internacionais. TEMA 2 – AS ORIGENS E FONTES DO DIREITO DIPLOMÁTICO Estruturado e desenvolvido durante séculos, desde a mais remota antiguidade, o direito diplomático se confunde com seu tempo histórico. Há registros de sua existência desde o surgimento da história escrita, manifestando- se por meio de tratados ocorridos nas mais diversas partes do mundo. O tratado mais antigo do mundo do qual se tem registro surgiu na Mesopotâmia, realizado entre Eannatum (soberano da cidade de Lagash) e a cidade de Umma. Ele foi escrito em língua suméria e fixava os limites de fronteiras. Há também registros de práticas diplomáticas na China, funcionando como um 1 No Brasil, a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados está formalizada desde 2009, com a promulgação do Decreto n. 7.030. 5 dos meios mais eficazes de diálogos e contenção de conflitos entre os povos vizinhos. Há que se destacar aqui a influência confuciana entre os povos vizinhos do império do meio, que desenvolveram importantes institutos diplomáticos, como a criação de carreiras públicas mediante concursos periódicos de recrutamento, conforme registros da Dinastia Lý, no atual Vietnã. Além desses aportes, houve também, no desenvolvimento histórico da diplomacia, influência dos povos islâmicos, que contribuíram para os institutos que norteiam a diplomacia em sua totalidade, por exemplo a inviolabilidade dos embaixadores e respeito ao cumprimento das obrigações convencionais. Já entre os gregos, se encontram as instituições conhecidas até hoje como direito dos agentes, como tratados, arbitragem e inviolabilidade dos arautos. A partir do século XV, houve a necessidade de institucionalizare criar uma convivência pacífica entre os estados italianos. Foi assim que nasceu o interesse no desenvolvimento da diplomacia, com o surgimento da figura do embaixador, o que possibilitou uma relevante instauração institucional e um consequente fortalecimento do instituto, desenvolvendo um papel crucial no período de instabilidade na península italiana. Esse fortalecimento do direito diplomático e de suas instituições influenciou diversos pequenos Estados – que não dispunham de muita força militar – a empregarem técnicas diplomáticas na resolução de conflitos e barganhas internacionais. Um exemplo disso foi o domínio de Veneza sobre a República de Ragusa (atual Dubrovnik), que contribuiu para o desenvolvimento do direito e instituições diplomáticas. Vale lembrar que, no século XIII, a Ragusa já detinha cortes especializadas, uma cível e outra criminal, adquirindo então, por meio da diplomacia, certa independência em relação aos impérios que a cercavam, tal como o Império Otomano. Dessa forma, a influência entre os estados italianos, no que diz respeito ao direito diplomático institucionalizado foi essencial para a implementação dos embaixadores residentes em toda a Europa e tornou-se um parâmetro de organização diplomático no decorrer dos séculos. 2.1 Fontes As fontes jurídicas, encarregadas pela formação das normas diplomáticas, são de extrema importância para entendermos o direito diplomático em sua 6 totalidade. Elas são a base para toda e qualquer compreensão sobre esse instituto, que é responsável por reger as relações entre os Estados soberanos mundialmente. As fontes do direito diplomático podem ser divididas em: • Próprias – são aquelas que agem diretamente sobre o sistema de normas jurídicas internacionais, ou seja, criam, modificam ou extinguem as regras existentes; estão englobados aqui os costumes, os princípios gerais do direito e os tratados. • Impróprias – consistem em um ponto de referência para que possamos estabelecer as criações, modificações e extinções das normas, seja esta nova, seja antiga; também são utilizadas para verificar qual o alcance jurídico de uma norma já existente, desde que interpretadas corretas. Estão abarcados aqui o estudo da doutrina e a criação de jurisprudências, isto é, em âmbito nacional há as leis internas de cada país. TEMA 3 – OS COSTUMES COMO FONTES DO DIREITO DIPLOMÁTICO Grande parte das regras referentes ao direito diplomático como vemos hoje foi formada progressivamente ao longo dos séculos, especificamente entre o Renascimento e o Congresso de Viena (1815), utilizando-se da prática legislativa, diplomática e jurisprudencial dos estados europeus; ou seja, a fonte originária de tais normas é de natureza costumeira. Esses costumes internacionais, conforme traz grade parte da doutrina, são um comportamento uniforme e que possuem constância entre os Estados, com o objetivo de estabelecer com convicção da obrigatoriedade e da necessidade deles. As fontes desse Direito são caracterizadas entre a diuturnitas e a opinio juris sive necessitatis. A primeira tem natureza material e é prolongada na constante reiteração comportamental, e a segunda é constituída por uma natureza psicológica, ou seja, é a convicção de cumprimento de um preceito jurídico com o objetivo de uma necessidade social. Conforme observa a doutrina, a consolidação dos costumes em matéria diplomática sofreu influência de dois elementos importantes: a rede de convenções bilaterais entre os estados europeus e os outros países, remetendo- se geralmente ao “direito das gentes” ou ao “direito internacional geral” 7 desenvolvendo, entretanto, uma função de especificação a forma escrita de tal direito, e por vezes, até prevendo um tratamento mais favorável ao direito geral. Todavia, em outro viés, a reciprocidade foi um importante elemento na formação das normais baseadas em costumes. Como observa Salmon (1994), é de interesse de todos os membros da comunidade internacional que as próprias missões no exterior gozem de um estatuto favorável para o cumprimento harmonioso de suas funções. Imperioso é destacar que o costume diplomático – de caráter obrigatório – deve ser distinto dos simples usos da cortesia, do protocolo ou de expedientes diplomáticos, conforme salienta Maresca (1969). Dessa forma, não há derivação precisa das obrigações jurídicas comitas gentium ou cortesia internacional, razão por que a inobservância dela não origina os chamados ilícitos internacionais, ou seja, não comprometem os Estados e suas responsabilidades. Entretanto, a cortesia internacional é uma das fontes inesgotáveis de critérios e preceitos utilizados para facilitar o eficaz desenvolvimento das relações internacionais. Com o passar do tempo, essas normas pautadas na cortesia internacional foram ganhando status de regras jurídicas verdadeiras. Um exemplo disso é o caso daquela que define que os chefes e outros membros das missões diplomáticas sejam aprovados (agréement), estabelecido na Convenção de Viena de 1961 (art. 4º, parágrafo 1º): “1. O Estado acreditante deverá certificar-se de que a pessoa que pretende nomear como Chefe da Missão perante o Estado acreditado obteve o Agrément do referido Estado” (Brasil, 2009). Dentro da categoria de normas que podem ser reportadas aos costumes, existem os princípios gerais do direito internacional, que constituem uma categoria sui generis de normas internacionais, as quais são aplicadas por parte dos Estados dos respectivos ordenamentos jurídicos internos. Já em relação a opinio juris sive necessitatis, se encontram particularmente as regras de justiça e lógicas jurídicas consideradas por todos os órgãos dos Estados como tendo um valor universal; portanto, são aplicáveis a qualquer ordenamento jurídico interno ou internacional. Dessa forma, em se tratando de relações diplomáticas, os princípios gerais não desenvolvem um papel primário, e sim os costumes. A norma consuetudinária tem persistente importância, conforme Nascimento e Silva (1978) aduzem que o processo de produção jurídica no sistema diplomático é confirmado, de modo geral, pelas recentes convenções que 8 codificam o direito diplomático, e, de modo particular, pela Convenção de Viena de 1961, citada anteriormente, sobre as relações diplomáticas, cujo preâmbulo determina: “as normas de Direito Internacional consuetudinário devem continuar regendo as questões que não tenham sido expressamente reguladas nas disposições da presente Convenção”. Dessa forma, a doutrina ressalta que o costume tem determinadas vantagens, como a flexibilidade e, por consequência, a possibilidade de adaptação fácil às mudanças das circunstâncias na sociedade internacional onde está inserido. Entretanto, não se pode esquecer que os costumes apresentam alguns importantes inconvenientes, como o fato de serem sempre indeterminados, e sobretudo, a sua reconhecida dificuldade de comprovação existencial. TEMA 4 – TRATADOS Com o passar do tempo, especificamente a partir da metade do século XIX, os Estados soberanos perceberam que havia necessidade de procurar algo que pudesse lhes oferecer garantias maiores em relação à segurança jurídica constantes nas normais consuetudinárias diplomáticas. Dessa forma, o tratado era o instrumento que melhor dava conta dessa tarefa e, corroborava, ao mesmo tempo, buscar o maior número possível de consentimentos. Os tratados estão previstos na Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, especificamente em seu art. 2°, parágrafo 1°, alínea “a”: “tratado significa um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação específica”. Dessa forma, dependendo do número de Estados soberanos participantes, ostratados podem ser divididos em dois tipos: bilaterais e multilaterais. Ambos serão conceituados adiante. É de suma importância que conheçamos os principais tratados de direito diplomático existentes e que embasam toda a legislação moderna sobre o assunto. Entre eles, podemos citar: Regulamento sobre a Classe entre os Agentes Diplomáticos, anexo ao Tratado de Viena de 1815; Convenção de Havana de 1928 sobre funcionários diplomáticos; Convenção de Viena de 1961 sobre relações diplomáticas; Carta das Nações Unidas de 1945; e outros. 9 TEMA 5 – TRATADOS BILATERAIS E MULTILATERAIS NO DIREITO DIPLOMÁTICO Como vimos acima, os Estados soberanos perceberam que, após o século XIX, havia necessidade de positivar as regras inerentes ao direito diplomático. Assim o fizeram, com base nos tratados, que podem ser bilaterais ou multilaterais, dependendo do número de Estados soberanos envolvidos. 5.1 Tratados bilaterais Os tratados bilaterais concluídos, dentro do direito diplomático, têm como objetivo o estabelecimento em primeiro lugar das relações diplomáticas e, consequentemente, a instituição de uma missão diplomática de caráter permanente. Em segundo lugar, podem modificar le rang de uma relação para a de uma embaixada ou, ainda, atribuir um tratamento mais favorável a determinado Estado em relação aos outros que se encontram acreditados em dado território. Um tratado tido como bilateral pode criar uma obrigação para um Estado quando este conceder determinado tratamento às missões diplomáticas estrangeiras que, acreditadas no outro Estado, encontram-se em seu território. Assim, se reconhece que, mesmo numerosos, os tratados bilaterais não possuem tanta importância no que tange às fontes do direito diplomático, em parte porque há recorrente falta de precisão e de detalhes, e a maioria deles se remetem a normas e princípios reconhecidos pelo direito internacional. 5.2 Tratados multilaterais Dentro do sistema de fontes do direito diplomático, o acordo pode ser firmado para cumprir uma função geral e diferente daquela que estabelece normais que regulam questões particulares entre dois estados ou um grupo restrito deles. Assim, dentro de um tratado multilateral há a participação de três ou mais Estados soberanos. É por meio desses tratados que se forma a segurança jurídica na forma escrita, ou seja, os costumes adquirem uma forma escrita com uma roupagem de segurança jurídica. Dessa forma, a função de codificação do acordo pode ser cumprida com base em dois critérios distintos: declarativo e progressivo. O primeiro é formado pela escrita das normas consuetudinárias – derivadas dos 10 costumes. Já o segundo não se limita tão somente a estabelecer os costumes existenciais, mas sim desenvolvê-los, trazendo as exigências mutáveis da comunidade internacional. Ao contrário dos tratados bilaterais, os multilaterais possuem maior relevância dentro do cenário internacional do direito diplomático, menos numerosos. 11 REFERÊNCIAS BRASIL. Decreto n. 7.030, de 14 de dezembro de 2009. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, 15 dez. 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D7030.htm>. Acesso em: 16 nov. 2019. BRASIL. Ministério da Economia, Indústria, Comércio Exterior e Serviços. Acordos dos quais o Brasil é parte. [S.d.]. Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/comercio-exterior/negociacoes-internacionais/796- negociacoes-internacionais-2>. Acesso em: 17 nov. 2019. SALMON, J. Manuel de Droit Diplomatique. Bruxelles: Bruylant, 1994. http://www.mdic.gov.br/comercio-exterior/negociacoes-internacionais/796-negociacoes-internacionais-2 http://www.mdic.gov.br/comercio-exterior/negociacoes-internacionais/796-negociacoes-internacionais-2 12 ANEXO CONVENÇÃO DE VIENA SOBRE RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS Os Estados Partes na presente Convenção, Considerando que, desde tempos remotos, os povos de todas as Nações têm reconhecido a condição dos agentes diplomáticos; Conscientes dos propósitos e princípios da Carta das Nações unidas relativos à igualdade soberana dos Estados, à manutenção da paz e da segurança internacional e ao desenvolvimento das relações de amizade entre as Nações; Estimando que uma Convenção Internacional sobre relações, privilégios e imunidades diplomáticas contribuirá para o desenvolvimento de relações amistosas entre as Nações, independentemente da diversidade dos seus regimes constitucionais e sociais; Reconhecendo que a finalidade de tais privilégios e imunidades não é beneficiar indivíduos, mas, sim, a de garantir o eficaz desempenho das funções das Missões diplomáticas, em seu caráter de representantes dos Estados; Afirmando que as normas de Direito internacional consuetudinário devem continuar regendo as questões que não tenham sido expressamente reguladas nas disposições da presente Convenção; Convieram no seguinte: Art. 1 Para os efeitos da presente Convenção: 1) "Chefe de Missão" é a pessoa encarregada pelo Estado acreditante de agir nessa qualidade; 2) "Membros da Missão" são o Chefe da Missão e os membros do pessoal da Missão; 3) "Membros do Pessoal da Missão" são os membros do pessoal diplomático, do pessoal administrativo e técnico e do pessoal de serviço da Missão; 4) "Membros do Pessoal Diplomático" são os membros do pessoal da Missão que tiverem a qualidade de diplomata; 5) "Agente Diplomático" é o Chefe da Missão ou um membro do pessoal diplomático da Missão; 13 6) "Membros do Pessoal Administrativo e Técnico" são os membros do pessoal da Missão empregados no serviço administrativo e técnico da Missão; 7) "Membros do Pessoal de Serviço" são os membros do pessoal da Missão empregados no serviço doméstico da Missão; 8) "Criado particular" é a pessoa do serviço doméstico de um membro da Missão que não seja empregado do Estado acreditante; 9) "Locais da Missão" são os edifícios, ou parte dos edifícios, e terrenos anexos, seja quem for o seu proprietário, utilizados para as finalidades da Missão inclusive a residência do Chefe da Missão. Art. 2 O estabelecimento de relações diplomáticas entre Estados e o envio de Missões diplomáticas permanentes efetua-se por consentimento mútuo. Art. 3 1. As funções de uma Missão diplomática consistem, entre outras, em: a) representar o Estado acreditante perante o Estado acreditado; b) proteger no Estado acreditado os interesses do Estado acreditante e de seus nacionais, dentro dos limites permitidos pelo direito internacional; c) negociar com o Governo do Estado acreditado; d) inteirar-se por todos os meios lícitos das condições existentes e da evolução dos acontecimentos no Estado acreditado e informar a esse respeito o Governo do Estado acreditante; e) promover relações amistosas e desenvolver as relações econômicas, culturais e científicas entre o Estado acreditante e o Estado acreditado. 2. Nenhuma disposição da presente Convenção poderá ser interpretada como impedindo o exercício de funções consulares pela Missão diplomática. Art. 4 1. O Estado acreditante deverá certificar-se de que a pessoa que pretende nomear como Chefe da Missão perante o Estado acreditado obteve o Agrément do referido Estado. 2. O Estado acreditado não está obrigado a dar ao Estado acreditante as razões da negação do "agrément". 14 Art. 5 a) O Estado acreditante poderá depois de haver feito a devida notificação aos Estados creditados interessados, nomear um Chefe de Missão ou designar qualquer membro do pessoal diplomático perante dois ou mais Estados, a não ser que um dos Estados acreditados a isso se oponha expressamente. b) Se um Estado acredita um Chefe de Missão perante dois ou mais Estados, poderá estabelecer uma Missão diplomática dirigida por um Encarregado de Negócios ad interim em cada um dos Estados onde o Chefe da Missãonão tenha a sua sede permanente. c) O Chefe da Missão ou qualquer membro do pessoal diplomático da Missão poderá representar o Estado acreditante perante uma organização internacional. Art. 6 Dois ou mais Estados poderão acreditar a mesma pessoa como Chefe de Missão perante outro Estado, a não ser que o Estado acreditado a isso se oponha. Art. 7 Respeitadas as disposições dos artigos 5, 8, 9 e 11, o Estado acreditante poderá nomear livremente os membros do pessoal da Missão. No caso dos adidos militar, naval ou aéreo, o Estado acreditado poderá exigir que seus nomes lhes sejam previamente submetidos para efeitos de aprovação. Art. 8 a) Os membros do pessoal diplomático da Missão deverão, em princípio, ter a nacionalidade do Estado acreditante. b) Os membros do pessoal diplomático da Missão não poderão ser nomeados dentre pessoas que tenham a nacionalidade do Estado acreditado, exceto com o consentimento do referido Estado, que poderá retirá-lo em qualquer momento. c) O Estado acreditado poderá exercer o mesmo direito com relação a nacionais de terceiro Estado que não sejam igualmente nacionais do Estado acreditante. Art. 9 f) O Estado acreditado poderá a qualquer momento, e sem ser obrigado a justificar a sua decisão, notificar ao Estado acreditante que o Chefe da 15 Missão ou qualquer membro do pessoal diplomático da Missão é persona nongrata ou que outro membro do pessoal da Missão não é aceitável. O Estado acreditante, conforme o caso, retirará a pessoa em questão ou dará por terminadas as suas funções na Missão. Uma Pessoa poderá ser declarada nongrata ou não aceitável mesmo antes de chegar ao território do Estado acreditado. g) Se o Estado acreditante se recusar a cumprir, ou não cumpre dentro de um prazo razoável, as obrigações que lhe incumbem, nos termos do parágrafo 1 deste artigo, o Estado acreditado poderá recusar-se a reconhecer tal pessoa como membro da Missão. Art. 10 1. Serão notificados ao Ministério das Relações Exteriores do Estado acreditado, ou a outro Ministério em que se tenha convindo: a) a nomeação dos membros do pessoal da Missão, sua chegada e partida definitiva ou o termo das suas funções na Missão; b) a chegada e partida definitiva de pessoas pertencentes à família de um membro da missão e, se for o caso, o fato de uma pessoa vir a ser ou deixar de ser membro da família de um membro da Missão; c) a chegada e a partida definitiva dos criados particulares a serviço das pessoas a que se refere a alínea a) deste parágrafo e, se for o caso, o fato de terem deixado o serviço de tais pessoas; d) a admissão e a despedida de pessoas residentes no Estado acreditado como membros da Missão ou como criados particulares com direito a privilégios e imunidades. 2. Sempre que possível, a chegada e a partida definitiva deverão também ser previamente notificadas. Art. 11 1. Não havendo acordo explícito sobre o número de membros da Missão, o Estado acreditado poderá exigir que o efetivo da Missão seja mantido dentro dos limites que considere razoável e normal, tendo em conta as circunstâncias e condições existentes nesse Estado e as necessidades da referida Missão. 16 2. O Estado acreditado poderá igualmente, dentro dos mesmos limites e sem discriminação, recusar-se a admitir funcionários de uma determinada categoria. Art. 12 O Estado acreditado não poderá, sem o consentimento expresso e prévio do Estado acreditado, instalar escritórios que façam parte da Missão em localidades distintas daquela em que a Missão tem a sua sede. Art. 13 1) O Chefe da Missão é considerado como tendo assumido as suas funções no Estado acreditado no momento em que tenha entregado suas credenciais ou tenha comunicado a sua chegada e apresentado as cópias figuradas de suas credenciais ao Ministério das Relações Exteriores, ou ao Ministério em que se tenha convindo, de acordo com a prática observada no Estado acreditado, a qual deverá ser aplicada de maneira uniforme. 2) A ordem de entrega das credenciais ou de sua cópia figurada será determinada pela data e hora da chegada do Chefe da Missão. Art. 14 1) Os Chefes de Missão dividem-se em três classes: a) Embaixadores ou Núncios acreditados perante Chefes de Estado, e outros Chefes de Missões de categoria equivalente; b) Enviados, Ministro ou internúncios, acreditados perante Chefe de Estado; c) Encarregados de Negócios, acreditados perante Ministros das Relações Exteriores. 2) Salvo em questões de precedência e etiqueta, não se fará nenhuma distinção entre Chefes de Missão em razão de sua classe. Art. 15 Os Estados, por acordo, determinarão a classe a que devem pertencer os Chefes de suas Missões. 17 Art. 16 1) A precedência dos Chefes de Missão, dentro de cada classe, se estabelecerá de acordo com a data e hora em que tenham assumido suas funções, nos termos do art. 13. 2) As modificações nas credenciais de um Chefe de Missão, desde que não impliquem mudança de classe, não alteram a sua ordem de precedência. 3) O presente artigo não afeta a prática que exista ou venha a existir no Estado acreditado com respeito à precedência do representante da Santa Sé. Art. 17 O Chefe da Missão notificará ao Ministério da Relações Exteriores, ou a outro Ministério em que as partes tenham convindo, a ordem de precedência dos Membros do pessoal diplomático da Missão. Art. 18 O Cerimonial que se observe em cada Estado para recepção dos Chefes de Missão deverá ser uniforme a respeito de cada classe. Art. 19 1) Em caso de vacância do posto de Chefe da Missão, ou se um Chefe de Missão estiver impedido de desempenhar suas funções, um Encarregado de Negócios ad interim exercerá provisoriamente a chefia da Missão. O nome do Encarregado de Negócios ad interim será comunicado ao Ministério das Relações Exteriores do Estado acreditado, ou ao Ministério em que as partes tenham convindo, pelo Chefe da Missão ou, se este não poder fazê-lo, pelo Ministério das Relações Exteriores do Estado acreditante. 2) Se nenhum membro do pessoal diplomático estiver presente no Estado acreditado, um membro do pessoal administrativo e técnico poderá, com o consentimento do Estado acreditado, ser designado pelo Estado acreditante para encarregar-se dos assuntos administrativos correntes da Missão. 18 Art. 20 A missão e seu Chefe terão o direito de usar a bandeira e o escudo do Estado acreditante nos locais da Missão, inclusive na residência do Chefe da Missão e nos seus meios de transporte. Art. 21 1) O Estado acreditado deverá facilitar a aquisição em seu território, de acordo com as suas leis, pelo Estado acreditado, dos locais necessários à Missão ou ajudá-lo a consegui-los de outra maneira. 2) Quando necessário, ajudará também as Missões a obterem alojamento adequado para seus membros. Art. 22 1) Os locais da Missão são invioláveis. Os Agentes do Estado acreditado não poderão neles penetrar sem o consentimento do Chefe da Missão. 2) O Estado acreditado tem a obrigação especial de adotar todas as medidas apropriadas para proteger os locais da Missão contra qualquer intrusão ou dano e evitar perturbações à tranquilidade da Missão ou ofensas à sua dignidade. 3) Os locais da Missão, em mobiliário e demais bens neles situados, assim como os meios de transporte da Missão, não poderão ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de execução. Art. 23 1) O Estado acreditante e o Chefe da Missão estão isentos de todos os impostos e taxas, nacionais, regionais ou municipais, sobre os locais da Missão de que sejam proprietários ou inquilinos, excetuados os que representem o pagamento de serviços específicos que lhes sejam prestados. 2) A isenção fiscal a que se refere este artigo não se aplica aos impostos e taxas cujo pagamento, na conformidade da legislação do Estado acreditado,incumbir as pessoas que contratem com o Estado acreditante ou com o Chefe da Missão. 19 Art. 24 Os arquivos e documentos da Missão são invioláveis, em qualquer momento e onde quer que se encontrem. Art. 25 O Estado acreditado dará todas as facilidades para o desempenho das funções da Missão. Art. 26 Salvo o disposto nas leis e regulamentos relativos a zonas cujo acesso é proibido ou regulamentado por motivos de segurança nacional, o Estado acreditado garantirá a todos os membros da Missão a liberdade de circulação e trânsito em seu território. Art. 27 1) O Estado acreditado permitirá e protegerá a livre comunicação da Missão para todos os fins oficiais. Para comunicar-se com o Governo e demais Missões e Consulados do Estado acreditante, onde quer que se encontrem, a Missão poderá empregar todos os meios de comunicação adequados, inclusive correios diplomáticos e mensagens em códigos ou cifra. Não obstante, a Missão só poderá instalar e usar uma emissora de rádio com o consentimento do Estado acreditado. 2) A correspondência oficial da Missão é inviolável. Por correspondência oficial entende-se toda correspondência concernente à Missão e suas funções. 3) A mala diplomática não poderá ser aberta ou retida. 4) Os volumes que constituam a mala diplomática deverão conter sinais exteriores visíveis que indiquem o seu caráter e só poderão conter documentos diplomáticos e objetos destinados a uso oficial. 5) O correio diplomático, que deverá estar munido de um documento oficial que indique sua condição e o número de volumes que constituam a mala diplomática, será, no desempenho das suas funções, protegido pelo Estado acreditado. 6) O Estado acreditante ou a Missão poderão designar correios diplomáticos "ad hoc". Em tal caso, aplicar-se-ão as disposições do parágrafo 5 deste artigo, mas as imunidades nele mencionadas deixarão de se aplicar, desde 20 que o referido correio tenha entregado ao destinatário a mala diplomática que lhe fora confiada. 7) A mala diplomática poderá ser confiada ao comandante de uma aeronave comercial que tenha de aterrissar num aeroporto de entrada autorizada. O comandante será munido de um documento oficial que indique o número de volumes que constituam a mala, mas não será considerado correio diplomático. A Missão poderá enviar um de seus membros para receber a mala diplomática, direta e livremente, das mãos do comandante da aeronave. Art. 28 Os direitos e emolumentos que a Missão perceba em razão da prática de atos oficiais estarão isentos de todos os impostos ou taxas. Art. 29 A pessoa do agente diplomático é inviolável. Não poderá ser objeto de nenhuma forma de detenção ou prisão. O Estado acreditado tratá-lo-á com o devido respeito e adotará todas as medidas adequadas para impedir qualquer ofensa à sua pessoa, liberdade ou dignidade. Art. 30 1) A residência particular do agente diplomático goza da mesma inviolabilidade e proteção que os locais da missão. 2) Seus documentos, sua correspondência e, sob reserva do disposto no parágrafo 3 do artigo 31, seus bens gozarão igualmente de inviolabilidade. Art. 31 1) O agente diplomático gozará de imunidade de jurisdição penal do Estado acreditado. Gozará também da imunidade de jurisdição civil e administrativa, a não ser que se trate de: a) uma ação real sobre imóvel privado situado no território do Estado acreditado, salvo se o agente diplomático o possuir por conta do Estado acreditado para os fins da missão. b) uma ação sucessória na qual o agente diplomático figure, a título privado e não em nome do Estado, como executor testamentário, administrador, herdeiro ou legatário. 21 c) uma ação referente a qualquer profissão liberal ou atividade comercial exercida pelo agente diplomático no Estado acreditado fora de suas funções oficiais. 2) O agente diplomático não é obrigado a prestar depoimento como testemunha. 3) O agente diplomático não está sujeito a nenhuma medida de execução a não ser nos casos previstos nas alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo 1 deste artigo e desde que a execução possa realizar-se sem afetar a inviolabilidade de sua pessoa ou residência. 4) A imunidade de jurisdição de um agente diplomático no Estado acreditado não o isenta da jurisdição do Estado acreditante. Art. 32 1) O Estado acreditante pode renunciar à imunidade de jurisdição dos seus agentes diplomáticos e das pessoas que gozam de imunidade nos termos do artigo 37. 2) A renúncia será sempre expressa. 3) Se um agente diplomático ou uma pessoa que goza de imunidade de jurisdição nos termos do artigo 37 inicia uma ação judicial, não lhe será permitido invocar a imunidade de jurisdição no tocante a uma reconvenção ligada à ação principal. 4) A renúncia à imunidade de jurisdição no tocante às ações civis ou administrativas não implica renúncia a imunidade quanto às medidas de execução da sentença, para as quais nova renúncia é necessária. Art. 33 1) Salvo o disposto no parágrafo 3 deste artigo, o agente diplomático estará no tocante aos serviços prestados ao Estado acreditante isento das disposições sobre seguro social que possam vigorar no Estado acreditado. 2) A isenção prevista no parágrafo 1 deste artigo aplicar-se-á também aos criados particulares que se acham ao serviço exclusivo do agente diplomático, desde que: a) Não sejam nacionais do Estado acreditado nem nele tenham residência permanente; e b) Estejam protegidos pelas disposições sobre seguro social vigentes no Estado acreditado ou em terceiro estado. 22 3. O agente diplomático que empregue pessoas a quem não se aplique a isenção prevista no parágrafo 2 deste artigo deverá respeitar as obrigações impostas aos patrões pelas disposições sobre seguro social vigentes no Estado acreditado. 4. A isenção prevista nos parágrafos 1 e 2 deste artigo não exclui a participação voluntária no sistema de seguro social do Estado acreditado, desde que tal participação seja admitida pelo referido Estado. 5. As disposições deste artigo não afetam os acordos bilaterais ou multilaterais sobre seguro social já concluídos e não impedem a celebração ulterior de acordos de tal natureza. Art. 34 O agente diplomático gozará de isenção de todos os impostos e taxas, pessoais ou reais, nacionais, regionais ou municipais, com as exceções seguintes: a) os impostos indiretos que estejam normalmente incluídos no preço das mercadorias ou dos serviços; b) os impostos e taxas sobre bens imóveis privados situados no território do Estado acreditado, a não ser que o agente diplomático os possua em nome do Estado acreditante e para os fins da missão; c) os direitos de sucessão percebidos pelo Estado acreditado, salvo o disposto no parágrafo 4 do artigo 39; d) os impostos e taxas sobre rendimentos privados que tenham a sua origem no Estado acreditado e os impostos sobre o capital referentes a investimentos em empresas comerciais no Estado acreditado. e) os impostos e taxas que incidem sobre a remuneração relativa a serviços específicos; f) os direitos de registro, de hipoteca, custas judiciais e imposto de selo relativos a bens imóveis, salvo o disposto no artigo 23. Art. 35 O Estado acreditado deverá isentar os agentes diplomáticos de toda prestação pessoal, de todo serviço público, seja qual for a sua natureza, e de obrigações militares tais como requisições, contribuições e alojamento militar. 23 Art. 36 1) De acordo com leis e regulamentos que adote, o Estado acreditado permitirá a entrada livre do pagamento de direitos aduaneiros, taxas e gravames conexos que não constituam despesas de armazenagem, transporte e outras relativas a serviços análogos: a) dos objetos destinados ao uso oficial da missão; b) dos objetos destinados ao uso pessoal do agente diplomático ou dos membros da sua família que com elevivam, incluídos os bens destinados à sua instalação. 1) A bagagem pessoal do agente diplomático não está sujeita a inspeção, salvo se existirem motivos sérios para crer que a mesma contém objetos não previstos nas isenções mencionadas no parágrafo 1 deste artigo, ou objetos cuja importação ou exportação é proibida pela legislação do Estado acreditado, ou sujeitos aos seus regulamentos de quarentena. Nesse caso a inspeção só poderá ser feita em presença de agente diplomático ou de seu representante autorizado. Art. 37 1) Os membros da família de um agente diplomático que com ele vivam gozarão dos privilégios e imunidade mencionados nos artigos 29 e 36, desde que não sejam nacionais do Estado acreditado. 2) Os membros do pessoal administrativo e técnico da missão, assim como os membros de suas famílias que com eles vivam, desde que não sejam nacionais do Estado acreditado nem nele tenham residência permanente, gozarão dos privilégios e imunidades mencionados nos artigos 29 a 35 com ressalva de que a imunidade de jurisdição civil e administrativa do Estado acreditado, mencionado no parágrafo 1 do artigo 31, não se estenderá aos atos por eles praticados fora do exército de suas funções; gozarão também dos privilégios mencionados no parágrafo 1 do artigo 36, no que respeita aos objetos importados para a primeira instalação. 3) Os membros do pessoal de serviço da Missão, que não sejam nacionais do Estado acreditado nem nele tenham residência permanente, gozarão de imunidades quanto aos atos praticados no exercício de suas funções, de isenção de impostos e taxas sobre os salários que perceberem pelos seus serviços e da isenção prevista no artigo 33. 24 4) Os criados particulares dos membros da Missão, que não sejam nacionais do Estado acreditado nem nele tenham residência permanente, estão isentos de impostos e taxas sobre os salários que perceberem pelos seus serviços. Nos demais casos, só gozarão de privilégios e imunidades na medida reconhecida pelo referido Estado. Todavia, o Estado acreditado deverá exercer a sua jurisdição sobre tais pessoas de modo a não interferir demasiadamente como o desempenho das funções da Missão. Art. 38 1) A não ser na medida em que o Estado acreditado conceda outros privilégios e imunidades, o agente diplomático que seja nacional do referido Estado ou nele tenha residência permanente gozará da imunidade de jurisdição e de inviolabilidade apenas quanto aos atos oficiais praticados no desempenho de suas funções. 2) Os demais membros do pessoal da Missão e os criados particulares, que sejam nacionais do Estado acreditado ou nele tenham a sua residência permanente, gozarão apenas dos privilégios e imunidades que lhes forem reconhecidos pelo referido Estado. Todavia, o Estado acreditado deverá exercer a sua jurisdição sobre tais pessoas de maneira a não interferir demasiadamente como o desempenho das funções da Missão. Art. 39 1) Toda a pessoa que tenha direito a privilégios e imunidades gozará dos mesmos a partir do momento em que entrar no território do Estado acreditado para assumir o seu posto ou, no caso de já se encontrar no referido território, desde que a sua nomeação tenha sido notificada ao Ministério das Relações Exteriores ou ao Ministério em que se tenha convindo. 2) Quando terminarem as funções de uma pessoa que goze de privilégios e imunidades, esses privilégios e imunidades cessarão normalmente no momento em que essa pessoa deixar o país ou quando transcorrido um prazo razoável que lhe tenha sido concedido para tal fim mas perdurarão até esse momento mesmo em caso de conflito armado. Todavia a imunidade subsiste no que diz respeito aos atos praticados por tal pessoal no exercício de suas funções como Membro da Missão. 25 3) Em caso de falecimento de um membro da Missão os membros de sua família continuarão no gozo dos privilégios e imunidades a que têm direito até a expiração de um prazo razoável que lhes permita deixar o território do Estado acreditado. 4) Em caso de falecimento de um membro da Missão, que não seja nacional do Estado acreditado nem nele tenha residência permanente, ou de membro de sua família que com ele viva, o Estado acreditado permitirá que os bens móveis do falecido sejam retirados do país com exceção dos que nele foram adquiridos e cuja exportação seja proibida no momento do falecimento. Não serão cobrados direitos de sucessão sobre os bens móveis cuja situação no Estado acreditado era devida unicamente à presença do falecimento no referido Estado, como membro da Missão ou como membro da família de um membro da Missão. Art. 40 1) Se o agente diplomático atravessa o território ou se encontra no território de um terceiro Estado, que lhe concedeu visto no passaporte quando esse visto for exigido, a fim de assumir ou reassumir o seu posto ou regressar ao seu país, o terceiro Estado conceder-lhe-á inviolabilidade e todas as outras imunidades necessárias para lhe permitir o trânsito ou o regresso. Esta regra será igualmente aplicável aos membros da família: que gozem de privilégios e imunidades, que acompanhem o agente diplomático quer viagem separadamente. Para reunir-se a ele ou regressar ao seu país. 2) Em circunstâncias análogas às previstas no parágrafo 1 deste artigo, os terceiros Estados não deverão dificultar a passagem através do seu território dos membros do pessoal administrado e técnico ou de serviço da Missão e dos membros de suas famílias. 3) Os terceiros Estados concederão à correspondência e a outras comunicações oficiais em trânsito inclusive às mensagens em código ou cifra a mesma liberdade e proteção concedida pelo Estado acreditado. Concederão aos correios diplomáticos a quem um visto no passaporte tenha sido concedido quando êsse visto fôr exigido bem como às malas diplomáticas em trânsito a mesma inviolabilidade e proteção a que se acha obrigado o Estado acreditado. 4) As obrigações dos terceiros Estados em virtude dos parágrafos 1, 2 e 3 deste artigo serão aplicáveis também às pessoas mencionadas 26 respectivamente nesses parágrafos, bem como às comunicações oficiais e às malas diplomáticas quanto as mesmas se encontrem no território do terceiro Estado por motivo de força maior. Art. 41 1) Sem prejuízo de seus privilégios e imunidade todas as pessoas que gozem desses privilégios e imunidades deverão respeitar as leis e os regulamentos do Estado acreditado. Têm também o dever de não se imiscuir nos assuntos internos do referido Estado. 2) Todos os assuntos oficiais que o Estado acreditante confiar à Missão para serem tratados com o Estado acreditado deverão sê-lo com o Ministério das Relações Exteriores ou por seu intermédio ou com outro Ministério em que se tenha convindo. 3) Os locais da Missão não devem ser utilizados de maneira incompatível com as funções da Missão tais como são enunciadas na presente Convenção em outras normas de direito internacional geral ou em acordos especiais em vigor entre o Estado acreditado. Art. 42 O agente diplomático não exercerá no Estado acreditado nenhuma atividade profissional ou comercial em proveito próprio. Art. 43 As funções de agente diplomático terminarão, inter-alia: a) pela notificação do Estado acreditante ao Estado acreditado e que as funções do agente diplomático terminaram; b) pela notificação do Estado acreditado ao Estado acreditante de que, nos termos do parágrafo 2 do artigo 9, se recusa a reconhecer o agente diplomático como membro da Missão. Art. 44 O Estado acreditado deverá, mesmo no caso de conflito armado, conceder facilidades para que as pessoas que gozem de privilégios e imunidades e não sejam nacionais do Estado acreditado, bem como os membros de suas famílias, seja qual for a sua nacionalidade, possam deixar o seu território o mais depressa possível. Especialmente, deverá colocarà sua disposição se necessário, os meios de transporte indispensáveis para tais pessoas e seus bens. 27 Art. 45 Em caso de ruptura das relações diplomáticas entre dois Estados ou se uma Missão é retirada definitiva ou temporariamente: 1) o Estado acreditado está obrigado a respeitar e a proteger, mesmo em caso de conflito armado, os locais da Missão bem como os seus bens e arquivos; 2) o Estado acreditante poderá confiar a guarda dos locais da Missão bem como de seus bens e arquivos a um terceiro Estado aceitável para o Estado acreditado; 3) o Estado acreditante poderá confiar a proteção de seus interesses e dos de seus nacionais a um terceiro Estado acreditado. Art. 46 Com o consentimento prévio do Estado acreditado e a pedido de um terceiro Estado nele não representado, o Estado acreditante poderá assumir a proteção temporária dos interesses do terceiro Estado e de seus nacionais. Art. 47 1) Na aplicação das disposições da presente Convenção, o Estado acreditado não fará nenhuma discriminação entre Estado. 2) Todavia, não será considerada discriminação: a) o fato de o Estado acreditante aplicar restritivamente uma das disposições da presente Convenção, quando a mesma for aplicada de igual maneira à sua Missão no Estado acreditado; b) o fato de os Estados em virtude de costume ou convênio se concederem reciprocamente um tratamento mais favorável do que o questionado pelas disposições da presente Convenção. Art. 48 A presente Convenção ficará aberta para assinatura de todos os Estados Membros das Nações Unidas de uma organização especializada bem como dos Estados Partes no Estatuto da Corte Internacional de Justiça e de qualquer outro Estado convidado pela Assembleia Geral das Nações Unidas a tornar-se Parte na Convenção, da maneira seguinte: até 31 de outubro de 1961, no Ministério Federal dos Negócios Estrangeiros da Áustria e, depois, até 13 de marco de 1962, na sede das Nações Unidas, em Nova York. 28 Art. 49 A presente Convenção será ratificada, os instrumentos de ratificação serão depositados perante o Secretário-Geral das Nações Unidas. Art. 50 A presente Convenção permanecerá aberta à adesão de todo o Estado pertencente a qualquer das quatro categorias mencionadas no artigo 48. Os instrumentos de adesão serão depositados perante o Secretário-Geral das Nações Unidas. Art. 51 1) A presente Convenção entrará em vigor no trigésimo dia que se seguir à data do depósito perante o Secretário-Geral das Nações Unidas do vigésimo-segundo instrumento de ratificação ou adesão. 2) Para cada um dos Estados que ratificarem a Convenção ou a ela aderirem depois do depósito do vigésimo segundo instrumento de ratificação ou adesão, a Convenção entrará em vigor no trigésimo dia após o depósito, por esse Estado, do instrumento de ratificação ou adesão. Art. 52 O Secretário-Geral das Nações Unidas comunicará a todos os Estados pertencentes a qualquer das quatro categorias mencionadas no artigo 48: a) as assinaturas apostas à presente Convenção e o depósito dos instrumentos de ratificação ou adesão nos termos dos artigos 48, 49 e 50; b) a data em que a presente Convenção entrara em vigor, nos termos do artigo 51. Art. 53 O original da presente Convenção, cujos textos em chinês, espanhol, francês, inglês e russo, fazem igualmente fé, será depositado perante o Secretário-Geral das Nações Unidas, que enviará cópias certificadas conforme a todos os Estados pertencentes a qualquer das quatro categorias mencionadas no artigo 48. Em fé do que, os plenipotenciários os assinados, devidamente autorizados pelos respectivos Governos assinaram a presente Convenção. Feito em Viena, aos dezoito dias do mês de abril de mil novecentos e sessenta e um. AULA 2 DIREITO DIPLOMÁTICO E CONSULAR Prof. Arthur Garcia 2 TEMA 1 – O ESTABELECIMENTO E AS MODALIDADES DAS RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS PERMANENTES ENTRE OS ESTADOS A Convenção de Viena sobre as Relações Diplomáticas de 1961 estabelece em seu art. 3°, entre outras coisas, as funções das missões diplomáticas. Essas funções consistem em representar o Estado acreditante perante o Estado receptor, proteger os interesses do país e dos seus nacionais no Estado acreditador; negociar com o Estado acreditador; inteirar-se por todos os meios lícitos das condições existentes e da evolução dos acontecimentos no Estado acreditador; promover relações amistosas e desenvolver as relações econômicas, culturais e científicas entre o País e o Estado acreditador. Todavia, antes de estudarmos especificamente essas funções, é necessário ter alguns conceitos básicos em mente. 1.1 O conceito de missão diplomática A expressão missão diplomática pode ser utilizada com vários significados, dependendo da situação, e todos são juridicamente válidos, segundo a doutrina. Alguns são ligados à pessoa física do agente diplomático, já em outros conceitos se referem ao órgão diplomático no qual o agente diplomático é preposto. Inicialmente, o termo missão diplomática é empregado como indicação das várias e complexas incumbências que o Estado acreditante concede ao seu agente diplomático, que é exercida junto ao Estado no qual o agente encontra-se acreditado, indicando o período de tempo no qual o agente diplomático permanece nesse Estado. Em outra visão, a expressão missão diplomática pode indicar um conjunto orgânico de pessoas preposto à função diplomática dentro de um Estado estrangeiro. Esses indivíduos são compostos pelos membros do pessoal da missão diplomática, ou seja, os membros do pessoal administrativo, técnico e do pessoal que está a serviço desta missão diplomática. Há o conjunto de missões diplomáticas que, em um determinado momento estão acreditadas em uma capital, formando o Corpo Diplomático. Já em uma terceira abordagem, a missão diplomática nada mais é que o órgão administrativo formado por uma instituição de caráter permanente, que fica 3 estabelecida no Estado estrangeiro, em que há a contribuição de várias pessoas para sua composição. Importante mencionar que esse órgão administrativo tem como objetivo assegurar e manter as boas relações entre os Estados, bem como tem a função de proteger os direitos e interesses do respectivo país. Isso porque, na instituição diplomática contemporânea, a mais importante modificação foi a constatação que a ação diplomática passou da pessoa do Chefe da Missão para a Missão Diplomática em si. No anteprojeto sobre as relações diplomáticas do ano de 1957, elaborado pela Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas, os trabalhos se orientaram no sentido de dar à missão diplomática a verdadeira importância que era concedida à pessoa do agente diplomático. Com efeito, a Convenção de Viena de 1961 sobre Relações Diplomáticas leva em consideração o pressuposto acima mencionado, tanto é que definiu a missão diplomática como uma entidade distinta, mesmo que para alguns, não o suficiente. 1.2 Como se dá a criação de uma missão diplomática Tradicionalmente e essencialmente, o instrumento para o desenvolvimento e uma vida de relações, e sobretudo a manutenção da paz e segurança internacional entre os membros de uma sociedade internacional, é representado pelo estabelecimento de relações internacionais, que se dá por meio do envio de missões diplomáticas entre um Estado e outro. O doutrinador italiano Giuliano (1983) aduz que, entre outras atribuições, o Estado tem por obrigação excluir cada exercício da sua autoridade sobre o território de outro Estado, e, consequentemente, este Estado é titular da pretensão jurídica (direito subjetivo) correspondente. Tal obrigação é caracterizada por uma qualificação: a penetração e a ação autorizada de agentes diplomáticos de um Estado no território de outro Estado. Desse modo, sempre que uma permanência de um agente diplomático de um Estadoem outro for autorizada, o soberano territorial não pode colocar nenhum obstáculo para que o agente diplomático exerça sua missão diplomática. Neste sentido, é claro o art. 2° da Convenção de Viena de 1961 sobre relações diplomáticas ao afirmar que “o estabelecimento de relação diplomáticas 4 e o envio de missões diplomáticas permanentes se efetuam por consentimento mútuo” (1961). Por esse motivo é que a criação de uma missão diplomática advém de um acordo entre o Estado que envia e o Estado que recebe tal missão. Uma análise dos pressupostos jurídicos necessários para a criação das missões diplomáticas é de extrema importância, pois alguns são pacificados pela doutrina, como, por exemplo, a personalidade jurídica internacional, reconhecimento, acordo dos Estados, entre outros; porém, alguns pontos são extremamente controvertidos entre os doutrinadores da diplomacia, como, por exemplo, o direito de legação. Assim, analisaremos no próximo tópico as contradições e pacificações doutrinárias a respeito destes pressupostos jurídicos. TEMA 2 – OS PRESSUPOSTOS JURÍDICOS NA INSTITUIÇÃO DE UMA MISSÃO DIPLOMÁTICA PERMANENTE Como analisamos anteriormente as missões diplomáticas são conceituadas como a indicação de várias e complexas incumbências que um Estado soberano concede ao seu agente diplomático, que irá aplicá-los em um outro Estado soberano, conhecidos respectivamente como Estado acreditado e Estado acreditante. Todavia, as missões diplomáticas passam por um processo de criação, e neste são analisados alguns pressupostos jurídicos de validade, que veremos abaixo. 2.1 Personalidade jurídica Internacional Seja interno ou internacional, um sistema jurídico tem como característica a existência de um conjunto de normas, e consequentemente, os destinatários dessas normas são considerados como sujeitos de direito. Dessa forma, uma norma jurídica atribui direitos e deveres aos entes aos quais se destina. Assim, ser um sujeito de direito é ter normas atribuídas, adquirindo com isso direitos e deveres. A missão diplomática somente poderá ser criada entre sujeitos de direito internacional, pois nas relações diplomáticas há o atributo de um sujeito de direito internacional. 5 Mas quem são esses sujeitos de direito internacional? Conforme observa Nascimento e Silva (1978), no art. 2° da Convenção de Viena de 1961, sem maiores detalhes, citam-se apenas os “Estados”. Portanto, a questão sobre a determinação dos Estados com direito de estabelecer relações diplomáticas foi debatida na Comissão de Direito Internacional. Muito se debateu que determinadas entidades, como às vezes os chamados protetorados, Estados membros de uma federação, não tinham o direito de instituir missões diplomáticas, conforme suas constituições, e seria errado permitir que tais Estados firmem, simplesmente por mútuo consentimento, relações diplomáticas com outros Estados. A determinação de quais Estados poderiam estabelecer relações diplomáticas sempre foi objeto de controvérsias dentro da doutrina e da prática diplomáticas; todavia, uma expressiva parte da doutrina saliente que apenas a referências “Estados” na Carta das Nações Unidas é a melhor orientação, mesmo que breve, sendo necessária para que seja analisado os diferentes tipos de sujeitos que têm o direito de estabelecer as relações diplomáticas entre si. 2.2 Os Estados Primeiramente é necessário mencionar que todo Estado, soberano ou independente, possui o direito de estabelecer relações diplomáticas, bem como o de trocar missões diplomáticas com os demais sujeitos da comunidade internacional. Esses Estados, compreendidos aqui como uma população que reside de forma estável em um território determinado e está sujeita ao mesmo sistema político, é sem sombra de dúvidas o natural e primeiro titular da qualidade de sujeito diplomático. Fato é que os Estados possuem vários órgãos que tratam das relações internacionais que o direito diplomático engloba, mas nem todos os Estados são titulares das qualidades jurídicas exigidas pela diplomacia. Existem alguns, com raríssimas exceções, que se encontram em um status incompatível com o direito de exercício de suas capacidades jurídicas. Claros exemplos disso, que ocorreram no passado, são os países vassalos que viviam sob uma tutela e mandato de tipo “A”, os protetorados, os Estados tributários em administração fiduciária etc., pois não eram soberanos ou não eram independentes. Assim, nem sempre os Estados possuem a qualidade jurídica de modo pleno, em decorrência de situações de caráter excepcional ou temporário, para 6 exemplificar essa afirmação. Pensemos na condição do Estado sujeito a ocupação bélica (occupatio bellica) por parte de outro Estado. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha ocupou belicamente o território de alguns governos, tais como o da Polônia (atacada em setembro de 1939), a Dinamarca (abril de 1940), a Noruega (abril de 1940), a Bélgica (maio de 1940), a Holanda (maio de 1940), a França (maio de 1940), a Iugoslávia (abril de 1941), a Grécia (abril de 1941) e Luxemburgo (maio de 1940). Tais governos foram obrigados, em virtude do conflito bélico, a deixar o próprio país e se instarem na Grã-Bretanha, passando a serem tratados como governos em exílio. Todavia, a Grã-Bretanha acredita grande parte da doutrina, que por motivações políticas e de modo muito gracioso, os equiparou aos outros Estados concedendo a estes governos em exílio privilégios e imunidades diplomáticas. Assim o desaparecimento de um Estado implica, automaticamente, no fim de suas capacidades jurídicas diplomáticas, e sem ela não é possível estabelecer relações diplomáticas. 2.3 As confederações de Estados A finalidades das confederações é a defesa comum, são uniões internacionais entre os Estados, aglomerados em assembleias, com amplos poderes no que tange a política externa e a representatividade de todos os demais membros, em que cada Estado continua sendo titular das qualidades de sujeito de direito diplomático, assim conservando o direito de representação própria – tanto os Estados membros quantos os demais Estados. Entretanto, é importante mencionar que um órgão da federação pode ter a mesma capacidade diplomática dos Estados. 7 2.4 As federações São compostas pela união perpétua nos quais os integrantes transferem o exercício da soberania externa para um organismo central, porém mantendo a autonomia relativa. Importante mencionar que a situação jurídica dos Estados membros de uma federação, embora o ordenamento constitucional conceda a eles um alto grau de autonomia no âmbito legislativo, administrativo e judiciário, não dá a eles titularidade de personalidade jurídica diplomática, pois tais entes são os Estados, Regiões, Cantões etc. Portanto um Estado Federal é o único sujeito de direito internacional idôneo capaz de estabelecer e conduzir as relações internacionais. TEMA 3 – O RECONHECIMENTO DE UM ESTADO 3.1 Reconhecimento de um novo Estado ou um novo governo O reconhecimento do Estado é um dos pressupostos de existência de uma missão diplomática, e é por meio desse ato, que é unilateral e discricionário, que um Estado admite a existência de outro, permitindo como consequência a manifestação do desejo de realizar as missões diplomáticas. Em direito internacional existem várias teorias sobre o reconhecimento de Estados, entre as quais o efeito atributivo/constitutivo e a do efeito declarativo. A teoria do efeito atributivo declara que um Estado apenas passa a existir para os demais Estados, como uma pessoa internacional, depois de ter sido reconhecido. Já no que tange a teoria do efeito declarativo, que é a teoria reconhecida pela doutrina majoritária, o reconhecimento é o “ato livre pelo qual um ou mais Estados reconhecem a existência, em um território determinado, deuma sociedade humana politicamente organizada, independentemente de qualquer outro Estado existente e capaz de observar as prescrições do Direito Internacional” (Nascimento e Silva; Accioly, 2012). O reconhecimento de um novo Estado ou um novo governo pode resultar na retirada de uma missão diplomática acreditada em outro Estado ou governo. Esse resultado é obrigatório quando um Estado realiza o reconhecimento de um governo revolucionário que luta contra um governo legítimo, ocorrido, por exemplo, durante a Guerra Espanhola (1936 a 1939), na qual diversos Estados 8 reconheceram o governo do General Franco e retiraram as missões diplomáticas acreditadas no governo republicano em Madrid. Importante mencionar que a retirada das missões diplomática não é algo que ocorre automaticamente, uma vez que cabe ao Estado legítimo analisar a julgar o reconhecimento do Estado beligerante, analisando se tal reconhecimento é constituído por um ato não amigável que resulte e justifique o rompimento das relações diplomáticas. A retirada então de uma missão diplomática nem sempre significa a retirada do reconhecimento, da mesma forma que o reconhecimento de um novo Estado ou um novo governo não resulta no estabelecimento de uma missão diplomática: tais atos são analisados caso a caso. 3.2 Consentimento mútuo O envio de missões diplomáticas permanentes entre os Estados como objetivo de estabelecimento das relações diplomáticas é rigorosamente subordinado ao chamado mútuo consentimento. Aqui, significa dizer que o Estado, uma vez formado, adquire a capacidade de concluir acordo internacionais em geral, e como consequência, acordos de estabelecimentos de relações diplomáticas em particular (jus contrahendi). Assim, nenhum Estado é obrigado a estabelecer relações diplomáticas contra a própria vontade, efetivando então o mútuo consentimento. A não obrigatoriedade de firmar acordos internacionais é clara, todavia, mesmo que não sejam os Estados obrigados a tal, são necessárias negociações sobre determinadas questões. Dessa forma, a missão diplomática permanente se torna o principal instrumento dos relacionamentos entre os Estados, ao menos no que diz respeito à manutenção da paz e da segurança internacional. A necessidade e a não obrigatoriedade do estabelecimento de relações diplomáticas consiste em como um Estado, membro da Comunidade Internacional e que pertencesse, como ocorre com quase todos os Estados, às Nações Unidas, agiria de maneira muito estranha se se recusasse a iniciar relações diplomáticas com outro Estado, ressalvados os casos excepcionais e temporários como o de não reconhecimento. Dessa forma, a não obrigatoriedade do estabelecimento das relações diplomáticas é finalmente reconhecida pela Convenção de Viena de 1961 sobre Relações Diplomáticas, cujo art. 2º determina que “o estabelecimento de relações 9 diplomáticas e o envio de Missões Diplomáticas permanentes se efetuam por consentimento mútuo” (1961). TEMA 4 – OS DIFERENTES TIPOS DE MISSÃO DIPLOMÁTICAS As relações diplomáticas entre os Estados não se concretizam apenas por meio do consentimento mútuo, mas também por meio da instituição de um órgão idôneo, ou seja, a missão diplomática permanente. No ponto de vista jurídico, as referidas missões ou representações diplomáticas, que são criadas convencionalmente entre os Estados, podem possuir várias denominações, as quais veremos agora. 4.1 As embaixadas As embaixadas são as missões diplomáticas permanentes com o maior grau de importância dentro do direito diplomático, pois são dotadas da classe mais elevada. O titular de uma embaixada, o chefe da missão, é um embaixador. O embaixador é um agente diplomático que pertence à primeira classe, conforme nos traz o Regulamento de Viena de 1815. As embaixadas, até o final do século XX, eram instituídas apenas entre as grandes potências, conforme o diferente peso político, militar e econômico que representavam dentro da comunidade internacional. Após a Segunda Guerra Mundial houve um crescente número de embaixadas criadas em virtude de vários fatores, entre eles se destaca a intensificação das relações entre os países, que se uniram pela resistência comum contra a Alemanha nazista, e também em virtude da multiplicação do número de novos Estados, consequência do processo de descolonização, que tinham como objetivo único a paridade ou igualdade jurídica relativa aos Estados de antiga formação. 4.2 As nunciaturas Primeiramente é necessário entender que a nunciatura consiste em um órgão diplomático permanente crido pela Santa Sé em outros sujeitos de direito internacional que objetivavam a manutenção das relações internacionais. Da mesma forma que as embaixadas possuem o embaixador como chefe, as nunciaturas possuem a pessoa do núncio, que, de acordo com o Regulamento 10 de Viena de 1961, também faz parte da primeira categoria de agentes diplomáticos. Conforme consta no art. 14 da Convenção de Viena de 1961, a nunciatura pode ter como titular tanto o núncio quanto o pró-núncio, sendo este último uma criação recente, datada de 1965. A Santa Sé se utiliza dessa figura diplomática em países onde a religião católica não é predominante. De forma geral, o núncio é um arcebispo, e de acordo com o Direito Canônico, algumas nunciaturas são conhecidas como “apostólicas cardinalícias” pois ao final da missão seu titular é elevado à dignidade cardinalícia. Em sua atividade, se comparada às demais missões diplomáticas, a nunciatura tem, além da representação da Santa Sé em outros Estados, a prerrogativa de realizar o próprio poder jurisdicional sobre a hierarquia eclesiástica do local, devido ao primado do Romano Pontífice. 4.3 Os altos comissariados Consiste em uma missão diplomática de um Estado em outro, ambos conectados por vínculos especiais, como é o caso do Commonwealth britânico ou na Comunidade Francesa. O titular desta missão é o chamado alto comissário (high commissioner), sendo este um agente diplomático de primeira categoria, pois nas relações onde era típico haver um país colonizador e suas colônias, o alto comissário representa a figura do governador. Por exemplo, na Commonwealth os Estados membros são representados em Londres pelo alto comissário e, reciprocamente, há na colônia um agente da mesma categoria representando o Reino Unido. Importante não confundir a figura do embaixador e a do alto comissário, já que o segundo não apresenta credenciais, pois o Estado que envia e os que recebem têm o mesmo chefe de Estado. No exemplo da Commonwealth, o chefe de Estado do Reino Unido é o mesmo que o chefe da Commonwealth. 4.4 As legações As legações são missões diplomáticas permanentes que, mesmo desenvolvendo as mesmas funções de uma embaixada, são dirigidas por um ministro ou um ministro residente, sendo que era classificada como de segunda classe. 11 Consoante a igualdade entre os Estados, instituída após a Segunda Grande Guerra, e também em consequência da descolonização, as legações foram transformadas, paulatinamente em embaixadas, alcançando então a primeira classe. 4.5 As internunciaturas Essa missão foi extinta em meados de 1970, transformadas em nunciaturas, que tinham a mesma classe das legações. O titular desse posto era o chamado internúncio, e pertencia à segunda categoria que representava a Santa Sé nos Estados que não possuíam Nunciaturas. TEMA 5 – OS LOCAIS DAS MISSÕES DIPLOMÁTICAS E SUA ESTRUTURA Uma das questões mais debatidas pela doutrina diplomática é a localização, propriedade e dimensão das missões diplomáticas permanentes, o que evidenciou a necessidade de uma regulamentação a respeito. Após o fim da Segunda Guerra Mundial, discussões sobre a obtenção de locais para a sede das missões ou para a residência dos agentes diplomáticos exerceu pressão na adoção, pela Convençãode Viena de 1961, dessas regulamentações. Desse modo, a Convenção de Viena menciona em várias oportunidades a missão diplomática, como por exemplo, no art. 1°, alínea i, consta que “os edifícios, ou parte dos edifícios, e terrenos anexos, seja qual for o proprietário, utilizadas para a finalidade da missão, inclusive a residência do Chefe da missão” (1961). Importante mencionar aqui que, em se tratando de edifício, a expressão abrange também o respectivo terreno e acréscimos, inclusive o jardim e o estacionamento de automóveis. Há também a figura da residência do chefe da missão, que consiste na habitação pessoal do chefe da missão e da própria família; abrange também o apartamento reservado aos hóspedes de honra; e pelo complexo dos locais (salas de representações) destinados às várias manifestações da função representativa da missão diplomática, considerada em um dos seus aspectos mais característicos. 12 Na residência do chefe da missão é possível que seja hasteada a bandeira, pregado o escudo com suas respectivas armas, direito este trazido também pela Convenção de Viena de 1961 em seu art. 20, tendo por objetivo a salvaguarda e da integridade das mesmas nos momentos de agitação ou manifestações populares. A sede da missão e os escritórios, normalmente, localizam-se na capital do Estado acreditado, mas não faltam exemplos de missões instaladas fora da capital, sendo que para isso é necessária a autorização do Estado acreditado (art. 12 da Convenção de Viena de 1961). 5.1 Estrutura das missões diplomáticas permanentes A missão diplomática permanente, como órgão das relações externas de um Estado, é composta por uma pluralidade de seções que correspondem à especialização dos indivíduos que a compõem, as quais veremos a seguir. 5.1.1 A chancelaria Consiste no órgão central e principal da missão, onde é concentrado o trabalho burocrático das demais seções. Aqui são conservados os arquivos gerais, confidenciais, ostensivos, bem como os materiais criptografas, bibliotecas, registros, selos, material de expediente oficial, atos relativos aos nacionais do Estado acreditante, tais como os atos de estado civil, passaportes etc. O administrador direto dessa seção é o chamado conselheiro, seguido hierarquicamente das figuras do primeiro secretário, segundo secretário e terceiro secretário. 5.1.2 O setor econômico-comercial Esse setor tem como principal função o desenvolvimento das relações comerciais entre Estado acreditante e acreditado, ou seja, o conhecimento da situação econômica do país acreditado, o estudo das exigências, dos recursos e das efetivas possibilidades do mercado no que diz respeito à importação e à exportação, à análise da política dos direitos aduaneiros e alfandegários etc. O titular do setor econômico-comercial é o adido comercial, cuja preocupação principal é a coleta e a análise de informações em determinadas 13 matérias. O adido comercial ainda prepara e negocia os tratados de comércio, além de vigiar sua efetiva aplicação. 5.1.3 O setor militar O setor militar pode compreender também o setor naval e do ar, dependendo da importância da missão diplomática na qual o setor militar está inserido. Esse setor é gerenciado pelo adido militar de proveniência dos quadros do exército do Estado acreditante, muito embora tenha contato com o próprio ministro da Defesa, e de possuir um grau superior ao do chefe da missão, o adido militar continua submetido hierarquicamente às instruções deste último. As funções dos adidos militares podem ser divididas da seguinte forma: observação e coleta de informações, por meio lícito, sobre a situação local em matéria de instituições militares e dos armamentos do Estado acreditado; busca contínua por colaboração com as autoridades militares locais em matéria de troca de informações, fornecimento de material bélico e de treinamento especializado; representação do Estado acreditante nas cerimônias oficiais do Estado acreditado por meio da participação em festas nacionais, recepções, paradas, manifestações etc. 5.1.4 O setor cultural Por meio do setor cultural, a missão proporcionalizara um ambiente propício para a difusão da cultura nacional. Este setor é chefiado pelo adido cultural, cujas funções principais são o preparo de acordos culturais entre o Estado acreditado e acreditante, autorizar bolsas de estudo, organização de sistemas de intercâmbio de estudantes dos países interessados e organizar conferências literárias e científicas e de exposições artísticas, bem como a criação de escolas para difundir o ensinamento do idioma nacional. 5.1.5 O setor de imprensa Este é o setor responsável, por meio do adido de imprensa, pela análise das notícias reportadas na imprensa local com ênfase naquelas sobre o próprio Estado, pela redação de um boletim de uso interno da missão sobre a situação política, militar, econômica do Estado acreditado, e é também o centro de relação 14 e de informações para a imprensa local sobre o Estado acreditante. Realiza a redação de um boletim de uso externo à missão, para informar e esclarecer determinas notícias a respeito do Estado acreditante. 5.1.6 A chancelaria consular Por fim, esse é o setor responsável por responder a uma exigência prática e econômica da missão, prevista no art. 3°, parágrafo 2°, da Convenção de Viena de 1961, e foi criado para suprir a falta de um consulado na capital onde a missão se encontra acreditada. A chancelaria consular tem como titular um agente diplomático da missão, que, mesmo desempenhado funções tipicamente de um cônsul, continua gozando dos mesmos privilégios e imunidades diplomáticas. 15 REFERÊNCIAS NASCIMENTO E SILVA, G. E. do. A Convenção de Viena sobre relações diplomáticas. Brasília: IBGE, 1978. NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; ACCIOLY, H. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2002. AULA 3 DIREITO DIPLOMÁTICO E CONSULAR Prof. Arthur Augusto Garcia 2 TEMA 1 – PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES DAS RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS Para que haja um bom funcionamento e execução das missões diplomáticas, são concedidos certos privilégios e certas imunidades aos membros dessas missões, que têm como função subtrair determinadas pessoas da autoridade e da competência judiciária do Estado acreditado, assunto este que trataremos de forma aprofundadas nos tópicos que se seguem. 1.1 Fundamentos jurídicos das imunidades diplomáticas Sem que o Estado acreditado garantisse a liberdade, o decoro e, sobretudo, a independência, não seria possível à segurança da missão diplomática a execução de suas funções pelos membros que compõem aquele complexo diplomático. As imunidades baseiam-se no direito internacional e têm a finalidade de destituir certas competências judiciarias do Estado acreditado sobre membros permanentes de uma missão diplomática que vivem em seu território. Uma parte da doutrina considera como sinônimas as expressões imunidades e privilégios no que tange às missões diplomáticas, contudo outra parte da doutrina as considera expressões distintas. Sob o ponto de vista jurídico de Pellet e Daillet (2002, citado por Sicari, 2007, p. 124), existe distinção entre as expressões, vejamos: Somente as imunidades, por exemplo as imunidades jurisdicionais, se baseariam diretamente no direito internacional; somente elas, constituiriam ataques a soberania dos Estado acreditado e se imporiam como tal a eles. Ao contrário, os privilégios dependeriam exclusivamente do direito interno do Estado acreditado que teria plena competência para “autorizá-los” ao Estado acreditante. Conforme Fauchille, os privilégios variam “segundo o prazer dos diferentes Estados, uns os acordam mais largamente, os outros mais estritamente. Outros autores, como Verdross, recusam cada distinção; eles sustentam que privilégios e imunidades são termos
Compartilhar