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Retrovírus são vírus RNA que, pela enzima DNA polimerase RNA-dependente (transcriptase reversa – RT), são capazes de copiar seu genoma de RNA em uma dupla fita de DNA, e de integrarem-se ao genoma da célula hospedeira. Lentivirus (HIV-1 e HIV-2). HIV é um vírus envelopado, apresentando em sua superfície uma membrana lipídica oriunda da membrana externa da célula do hospedeiro e duas glicoproteínas (gp41 e gp120). Dentro dessa membrana, está a matriz proteica, formada pela proteína p17 e pelo capsídeo viral de forma cônica composto pela proteína p24. O material genético, o RNA transportador (tRNA) e as enzimas necessárias para os primeiros eventos da replicação viral encontram-se no capsídeo viral. O genoma do HIV, contém nove genes e duas regiões denominadas LTR (long terminal repeats), onde estão presentes elementos de controle para integração, transcrição e poliadenilação dos RNA mensageiros. Os genes podem ser divididos em dois grupos: os que codificam as proteínas estruturais (gag, pol e env) e os que codificam proteínas não estruturais (tat, rev, nef, vif, vpu, e vpr). O gene gag (antígeno de grupo) codifica a matriz proteica (MA ou p17), o capsídeo viral (CA ou p24) e as proteínas nucleares (NC ou p6 e p7). O gene pol (polimerase) codifica as seguintes enzimas virais: transcriptase reversa que também possui atividade de RNase H, protease e integrase. O gene env (envelope) codifica uma proteína inicial que é clivada, dando origem à proteína de transmembrana (TM ou gp41) e à proteína de superfície (SU ou gp120). CICLO VIRAL A infecção pelo HIV inicia-se com a entrada do vírus na célula, através da ligação da proteína de superfície (gp120) com o receptor da célula (molécula CD4). A entrada ocorre através da fusão do vírus com a membrana da célula, reação mediada por gp41. A molécula de CD4 não poderia ser o único receptor do HIV. Existiam células suscetíveis à infecção viral que não apresentavam a molécula de CD4 em sua superfície. Indivíduos com deleção no gene CCR-5 são resistentes à infecção pelo HIV, e os indivíduos heterozigotos evoluem de forma mais lenta para a aids. Após entrar na célula, o vírus precisa desarmar a proteína APOBEC3G, hipermutação durante a transcrição reversa. A proteína viral Vif se liga a APOBEC3G levando a sua degradação. RNA viral é convertido a DNA pelas enzimas transcriptase reversa e ribonuclease H. Essa reação ocorre no citoplasma da célula nas primeiras 6 horas de infecção. A dupla fita de DNA, assim formada, é integrada de forma randômica ao genoma do hospedeiro pela enzima integrase. O funcionamento da integrase depende da sua ligação com um cofator celular denominado LEDGF/p75. Uma vez integrado, o DNA viral permanece na célula enquanto ela estiver viva. Inicialmente, apenas as proteínas Tat, Rev e Nef são sintetizadas. O acúmulo da primeira no núcleo da célula aumenta a transcrição da segunda, que regula a expressão do RNA mensageiro, levando a produção das proteínas estruturais. Após a síntese da proteína precursora do Gag, esta é direcionada a membrana celular para montagem da partícula viral. A liberação do vírus é por brotamento; durante esta fase, a enzima protease processa as proteínas precursoras dos genes pol e gag, tornando a partícula viral madura e capaz de infectar uma nova célula. O conhecimento do ciclo viral permitiu que fossem desenvolvidas drogas antirretrovirais, que atualmente podem ser divididas em: a) inibidores da transcriptase reversa: atuam na fase inicial do ciclo, impedindo a formação do DNA a partir do RNA. b) inibidores da protease: atuam no final do ciclo impedindo a maturação da partícula viral. c) inibidores da fusão: impedem a fusão da membrana viral com a celular impedindo a entrada do vírus. d) inibidores da entrada: atuam impedindo a ligação do vírus ao receptor (CD4) ou aos correceptores (CCR5 ou CXC4). e) inibidores da integrase: impedem que o provírus recém-produzido pela RT integre-se ao genoma da célula hospedeira. f) inibidores da maturação viral: ligam-se a regiões específicas da proteína precursora do gene gag impedindo a sua clivagem. TRANSMISSÃO SEXUAL DO HIV Estimativas indicam que de 75 a 85% das infecções por HIV no mundo ocorreram por práticas sexuais. O sexo anal receptivo desprotegido é identificado como a prática que apresenta o maior risco de infecção para ambos os sexos. Vários estudos demonstraram o efeito protetor da circuncisão na transmissão do HIV. Homens circuncidados apresentam chances até 60 vezes menores de se infectar, quando comparados com os que não foram submetidos à circuncisão. A presença de doenças sexualmente transmissíveis (DST), especialmente as que causam ulcerações na região genital, como sífilis, cancroide e herpes, está fortemente associada à transmissão do HIV. INFECÇÃO EM MULHERES E TRANSMISSÃO PERINATAL De acordo com o Relatório Global do Unaids, cerca de 200 milhões de mulheres ficam grávidas a cada ano no mundo, das quais 2,5 milhões são infectadas pelo HIV. Em todo o mundo, a transmissão do HIV de mãe para o filho representa a forma mais comum de aquisição do HIV pelas crianças. Pode ocorrer intraútero, durante o trabalho de parto, ou por amamentação, afetada por diversos fatores, como o estágio de infecção da mãe, idade materna, duração e tipo de parto. De acordo com o Relatório Global do Unaids, a cobertura de antirretrovirais entre gestantes HIV positivas alcançou proporção de 62% em 2012. TRANSFUSÕES DE SANGUE E DE HEMODERIVADOS A contaminação pelo HIV por transfusão sanguínea foi detectada logo no início da epidemia. Até 1985, antes da disponibilidade dos testes de detecção da infecção por HIV, a transmissão sanguínea desse vírus foi responsável por grande número de casos de aids. A transmissão pelo sangue é a via de transmissão mais eficiente. O uso de drogas injetáveis por via endovenosa é um dos grandes potenciais de disseminação. ALTERAÇÃO DA SÍNTESE E CITOCINAS Durante a progressão da infecção causada pelo HIV, até atingir o quadro típico de aids, os pacientes apresentarão queda progressiva da função e do número de células T helper (Th), acompanhada de hipergamaglobulinemia. É proposto que, após a infecção pelo HIV, os linfócitos dos pacientes que evoluem para aids apresentam produção menor de interleucina-2 (IL-2) e interferon-gama (INF-γ) em resposta ao antígeno, com subsequente aumento de produção de IL-4 e IL-10. APOPTOSE É caracterizada pela condensação da cromatina, fragmentação do DNA em um padrão específico de 200 pares de base e ruptura da membrana celular. Células T maduras são mais resistentes ao sinal de morte pela ativação do receptor das células T (TCR). Entretanto, a infecção pelo HIV ou a interação entre CD4 e gp120 (com ou sem formação de complexos antígeno-anticorpo) diminui o limiar da apoptose induzida por antígenos em células T maduras. A interação entre gp120 do HIV e CD4 interrompe a atividade de ligação do NF-AT e da proteína NF-kB, reduzindo a proliferação e a produção de citocinas, e é relacionada com a queda da liberação de Ca2+ induzida pelo TCR e a ativação do PKC. Devido à diminuição do limiar necessário para a morte celular induzida pelo TCR, a resposta ao antígeno fica seriamente comprometida porque as células T de memória transformam-se em alvos particularmente suscetíveis a apoptose em indivíduos infectados pelo HIV. Além disso, o gp120 pode, por si só, induzir esse efeito em células não infectadas pelo HIV. No entanto, vários estudos mostram resultados conflitantes a respeito da relação entre a progressão da doença e a intensidade de morte celular programada de linfócitos. A apoptose induzida pela infecção com o HIV acontece especificamente em células infectadas, uma vez que, sobre a ingerência do LTR do vírus, o gene Bax é ativado e, na presença de Tat, leva à morte celular. INFECÇÃO AGUDA infecções agudas acontecem pela via sexual (80% por exposição de mucosas). O coito anal receptivo é a forma com maior probabilidade de adquirir infecção, pois no canal anal há grande quantidade de células dendríticas e linfócitos. A interaçãomais provável acontece com as células dendríticas, por receptores de manose (C-Lectina) que interagem com gp120 (glicoproteína de superfície do HIV), iniciando o processo de entrada viral. A via vaginal é a segunda forma mais frequente de transmissão. Após duas horas do contato do vírus. O HIV atravessa a barreira mucoepitelial protetora e pode entrar em contato com macrófagos teciduais, linfócitos e células dendríticas, estas com a capacidade de apresentar antígenos, carreando o vírus até o grupamento linfoide mais próximo. Esse processo ocorre em até 24 horas após o contato e, como não houve integração do genoma viral com o DNA de uma célula hospedeira, ainda há chance de evitar a infecção. O vírus é apresentado ao linfócito T CD4+ virgem e entregue ao seu alvo sem ter sido reconhecido pelo sistema imune (mecanismo chamado de “cavalo de Troia”). Começa então a replicação viral no linfonodo, atingindo toda subpopulação de linfócitos CD4+ presente. “fase eclipse”, com duração aproximada de 7 a 21 dias, período no qual o RNA viral geralmente não pode ser detectado no plasma do paciente. Com o tráfego celular (cell traffic king), esses linfócitos carrearão o vírus pelas próximas 2 a 3 semanas a todas as partes do organismo, principalmente os linfócitos do tecido associado a mucosa (MALT) intestinal. O MALT intestinal representa o maior grupamento linfoide de todo o organismo; tem a função de proteger o hospedeiro de translocações intestinais, além de papel importante na regulação e tolerância do sistema imune. Os lipopolissacarídeos das bactérias gram-negativas intestinais uma vez na corrente sanguínea, funcionam como fortes iniciadores da resposta imune, aumentando a ativação de linfócitos circulantes e facilitando ainda mais a infecção pelo HIV. Nesse momento de grande viremia, surgem os sintomas da infecção aguda: manifestações inespecíficas, como febre, linfadenomegalia generalizada, anorexia, mal-estar ou até mesmo esplenomegalia, hepatomegalia, icterícia, rash cutâneo, plaquetopenia e diarreia. A carga viral plasmática é o determinante crítico da infecção. O risco de transmissão dobra com cada aumento de 1 log na viremia. O HIV destrói o controle imune celular por meio da deficiência de resposta dos linfócitos CD4+ infectados e dos linfócitos CD8+ não infectados, os quais, de forma eficiente, facilitam o escape dos vírus do controle imune. Ele também evade dos anticorpos por meio de mutações constantes. O diagnóstico de infecção aguda por HIV-1 requer um alto índice de suspeita clínica por médicos de todas as especialidades, uma vez que o quadro clínico varia desde febre ao esclarecimento de manifestações gastrointestinais exuberantes, e o uso correto de testes diagnósticos laboratoriais específicos.O diagnóstico de infecção por HIV deve ser inicialmente avaliado por meio de um teste ELISA (enzime linked immuno sorbent assay) ou ensaio imunoenzimático. Se o teste ELISA for positivo, um teste Western-blot é feito para confirmar que o resultado do teste ELISA é específico para o HIV. O vírus pode ser detectado por reação em cadeia da polimerase (PCR), durante os sete primeiros dias após a infecção, tornando esse teste uma ferramenta útil se uma intervenção terapêutica precoce for necessária. Resultados verdadeiros positivos são quase sempre 100.000 cópias/mL ou mais altos. Valores mais baixos, ou seja, menores do que 10.000 cópias/mL devem ser vistos com suspeita, e uma amostra de repetição deve ser colhida; leituras falso-positivas podem ocorrer. A infecção dupla é condição para que ocorra recombinação de subtipos virais. AIDS PEDIÁTRICA A infecção pelo HIV causa destruição de células CD4+, principalmente os linfócitos T CD4 positivos, além de macrófagos e monócitos. A presença de receptores como o CD4 e os receptores de quimiocinas, CCR5 e CXCR4, nas superfícies das células-alvo é imprescindível para ocorrer a ligação do vírus com as células suscetíveis e, consequentemente, a penetração do vírus e a infecção. Na fase inicial da infecção, a replicação do HIV ocorre sem impedimento, a viremia aumenta rapidamente, não raro observamos uma carga viral superior a 30 milhões de cópias de RNA-viral em crianças nos primeiros meses de vida. Estudos recentes observaram que, nas primeiras semanas da infecção, a replicação viral se estabelece principalmente nos linfócitos T CD4-CCR5 da mucosa intestinal e dissemina-se rapidamente para toda a mucosa do tecido linfoide (GALT) e gânglios regionais. Essa fase aguda da infecção pelo HIV causa a rápida e extensiva depleção dos linfócitos T CD4-CCR5+, além da destruição das subpopulações de Th17. A infecção do HIV ocorre 10 vezes mais nos linfócitos T CD4 do trato digestivo do que no sangue periférico. Na fase intermediária da infecção, os pacientes podem não apresentar sinal ou sintoma de imunodeficiência adquirida, ou algumas manifestações clínicas leves como adenomegalias, hepatoesplenomegalia e infecções comuns da infância, como a infecção da via aérea superior. Apesar de apresentação clínica discreta nessa fase, acredita-se que a replicação viral se mantém nos reservatórios: trato digestivo, sistema nervoso central (SNC) e tecidos linfoides. Um dos mecanismos de resistência do sistema imune perante a infecção pelo HIV é a ativação dos linfócitos T CD8 positivos, supressores e citotóxicos, considerados de maior relevância. Outro mecanismo de resistência perante a infecção é a formação de anticorpos, que contribui para conter a replicação do HIV. Lembramos que os indivíduos com resposta imune predominantemente T helper do tipo 1, com nível elevado de IL-2, IL-12 e interferon-γ evoluem de forma mais lenta para a doença; e os que apresentam resposta imune predominantemente do tipo humoral, padrão T helper tipo 2, com maior produção de imunoglobulinas e IL-4, 5, 6 e 10, de forma mais rápida. A ativação precoce do linfócito B pelo HIV leva, inicialmente, a uma produção de imunoglobulinas do tipo monoclonal e com a cronicidade da infecção esta resposta torna-se policlonal. Tal ativação acarreta o aparecimento de hipergamaglobulinemia policlonal e inabilidade funcional das células B em face de novos antígenos, o que leva a um quadro clínico constituído, primariamente, por infecções bacterianas de repetição causadas por agentes comuns à faixa etária.
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