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51 REPÚBLICA VELHA Unidade II 5 DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO Neste momento, o Brasil estava passando por inúmeras mudanças econômicas: sofria as consequências da Primeira Guerra Mundial e uma diminuição do consumo apesar do grande crescimento da produção. Nosso maior produto de exportação era o café. Desde o início, a produção dessa cultura visava à exportação. Temos que lembrar que no início da industrialização, os operários europeus viviam em uma situação de miserabilidade. Assim, os industriais precisavam de um “estimulante” para mantê‑los ativos no trabalho. O café veio atender a essa necessidade. Entretanto, a produção mundial necessitava de outros produtos, logo, a cana‑de‑açúcar, a borracha e até mesmo o fumo sempre tiveram como foco a exportação. Apesar de independente, em um sistema político que tinha como pressuposto a necessidade da sociedade, o Brasil permaneceu submetido economicamente às necessidades das grandes potências econômicas. 5.1 O café: processo e crise Na nova ordem republicana, política, sociedade e cultura se entrelaçam com os cafezais. Ao longo da Primeira República (1889‑1930), especialmente, conjugam‑se o surto econômico advindo daquela monocultura e a construção de uma classe dirigente, que abraçou modelos políticos e projetos de hegemonia nascidos à sombra dos cafezais (MARTINS, 2008, p. 187). O café foi introduzido no território nacional em 1760, na região da Capitania do Grão‑Pará, mas durante muitos anos sua produção era pequena, apenas para atender a necessidades particulares dos produtores. Ao longo dos anos, a cultura atraiu a atenção de fazendeiros do Sudeste, em especial do Rio de Janeiro e São Paulo. As necessidades internacionais motivaram a cultura no sudeste brasileiro, em especial na região do Vale do Paraíba. Devemos lembrar que nessa época, nos países do primeiro mundo, estava ocorrendo a expansão da Revolução Industrial. O café era o estimulante dos operários, muitos destes trabalhadores recebiam parcos salários e possuíam péssimas condições de vida. As indústrias forneciam o café como fonte de energia e, assim, mantinham ativas as linhas de produção. Também no Brasil, o consumo de café foi difundido. Tornou‑se hábito. Na época, o governo fazia uma grande propaganda dos benefícios do consumo do café. 52 Unidade II A produção do café passou por várias fases. Como vimos no começo deste livro‑texto, a queda da produção nas regiões tradicionais ocorreu principalmente pelo aumento do custo da mão de obra, imposta pela abolição, e da falta de investimentos em novas tecnologias pelos barões do café. Recordando, os barões ficaram aguardando uma indenização, por parte do Império, pelo fim da abolição. A expectativa não foi atendida, o que ocasionou um rompimento entre os barões do café e o Império, esse foi um dos motivos do fim do regime, pois estes senhores, até então defensores da monarquia, passaram a apoiar a República. Essa realidade contrastou com o Oeste Paulista e a região do Vale do Paraíba. Os fazendeiros daquela região, desde o início, investiram na mão de obra livre; por possuírem um perfil mais moderno, investiram na tecnologia trazendo novos recursos: estradas de ferro, telefone, fotografia etc. Essa modernização destacou São Paulo das demais regiões do país, impondo uma liderança política e econômica para a burguesia cafeeira. Como se sabe, da empresa cafeeira concentrada no Oeste paulista nasceria uma nova classe assentada em relações capitalistas de produção, com consciência de seus interesses e um projeto de estruturação política do país. Esta classe teria um caráter acentuadamente regional, tanto pela vigência de relações capitalistas restritas à área de São Paulo, como por sua conexão direta com os diferentes grupos externos (FAUSTO, 1975, p. 199). O sentido de modernidade da República harmonizou com os interesses do novo grupo de cafeicultores. Desde o início, eles buscaram participar do Governo Provisório através de lideranças como: Francisco Glicério, Campos Sales, Bernardino de Campos e também Prudente de Moraes (FAUSTO, 2008, p. 273). A configuração política se constituiu conforme a composição econômica dos Estados. Para compreendermos essa composição vamos analisar as oligarquias. Segundo Fausto (2008, p. 261): Oligarquia é uma palavra grega que significa governo de poucas pessoas, pertencentes a uma classe ou família. De fato, embora a aparência de organização do país fosse liberal, na prática o poder foi controlado por um reduzido grupo de políticos em cada Estado. A República nasceu representando os interesses de cada Estado, não havia um sentimento de unidade. Cada estado possuía seu próprio partido republicano, não havia um partido nacional. Assim, a administração da União passava pelos acordos entre os partidos estaduais, havia troca de favores, interesses. Segundo Fausto (2008, p. 261‑262), a configuração era a seguinte: 53 REPÚBLICA VELHA 1. São Paulo – a elite oligárquica ligada à econômica cafeeira e à indústria. Organizou o Estado de São Paulo com eficiência para atender aos interesses da sua elite. 2. Rio Grande do Sul – Partido Republicano Rio‑grandense, o PRR. Impôs os interesses da sua elite, com uma política forte e autoritária positivista, na defesa da imigração e demais interesses econômicos. 3. Minas Gerais – Partido Republicano Mineiro, o PRM. Constituiu uma máquina de políticos profissionais, tinha nela própria a fonte de poder: nomeava funcionários, legalizava posse de terras, decidia sobre os investimentos em educação, transporte etc. Apesar de a República trazer consigo o direito ao voto, devemos lembrar que na época pouca parte da população podia exercer o direito: 1,4% da população do país votou na eleição de Afonso Pena em 1906 e 5,7% da população do país votou na eleição de Júlio Prestes em 1930 (FAUSTO, 2008, p. 262). O voto não era secreto, os eleitores ficavam sujeitos a ordens das suas lideranças e também ocorriam muitas fraudes, com falsificação de atas, cédulas etc. Portanto, toda a estrutura da República foi criada para garantir e manter os interesses das oligarquias. Cada estado possuía a sua e, portanto, seus próprios interesses; à medida que havia necessidade, ocorria uma composição entre as forças garantindo os interesses de cada. Muito parecido com o que ocorre atualmente, não é? Ou seja, apesar de estarmos em um Estado Democrático de Direito, onde o poder é exercido por meio do voto dos seus cidadãos, voto secreto, o exercício do poder ocorre com negociações e trocas de favores entre os partidos que compõem o parlamento e o executivo. Igualzinho como quando nasceu a República! A primeira fase da República ficou conhecida como República do café‑com‑leite, ou seja, São Paulo e Minas Gerais dominavam a política nacional. Ainda segundo Fausto (2008, p. 265), Rio Grande do Sul também fazia parte desta configuração. São Paulo instituiu a política de valorização do café – na verdade, no período da Primeira República, o preço da saca do café regulava o valor do câmbio da moeda nacional. Conforme oscilava o valor da saca, oscilava também o valor da moeda. Para garantir seus lucros, os cafeicultores paulistas assinaram um acordo com os Estados de São Paulo, Minas e Rio de Janeiro, conhecido como Convênio de Taubaté. Os dois pontos principais eram: um empréstimo de 15 milhões de libras esterlinas para custear a intervenção do Estado no mercado por meio de compra do produto (café) por um preço conveniente à cafeicultura; e a criação de um mecanismo destinado a estabilizar o câmbio, impedindo a valorização da moeda brasileira (FAUSTO, 2008, p. 266). 54 Unidade II Isso nada mais é do que aquilo que hoje conhecemos como subsídio. O governo comprava o café para manter o preço da oferta, e controlava o câmbio para manter o café brasileiro competitivo no mercado externo. Em inúmeras outras situações, o Governo Federal, ou o governo do Estado de São Paulo, atuaram para atender aos interesses da oligarquiapaulista, em algumas situações atuando como avalistas, em outras oferecendo o empréstimo diretamente. Já os políticos mineiros agiam diferente. Em Minas não havia um produto principal, eles diversificavam entre café, gado e indústria. A atuação das elites era mais pelo domínio político. Minas possuía uma cadeira maior de deputados federais e controlava a distribuição de cargos públicos e a maioria dos ministérios. O Rio Grande do Sul possuía a cúpula do Exército. Por questões históricas e regionais, o estado esteve envolvido em vários confrontos, o que fortaleceu a sua configuração militar. Outra grande diferença é que os políticos gaúchos defendiam uma economia voltada para o mercado interno. Seu principal produto era o charque, seus maiores consumidores eram o Distrito Federal (na época o Rio de Janeiro) e o Nordeste. Observação O charque é uma carne salgada e seca ao sol com o objetivo de mantê‑la própria ao consumo por mais tempo. Tem uma salga e exposição solar maiores que outras carnes dessecadas, sendo empilhado como mantas em lugares secos para desidratação. Portanto, a sua economia dependia essencialmente de questões internas, como a inflação e o desequilíbrio da dívida pública: as rebeliões tenentistas da década de 1920, por exemplo, apontaram a inflação e o desequilíbrio orçamentário como males tão graves quanto a fraude e as desigualdades regionais (FAUSTO, 2008, p. 270). A grande diferença que havia é que, para atender aos seus interesses, a oligarquia paulista gerou o endividamento do Estado, e esse desiquilíbrio orçamentário ocasionou a inflação. Com o aumento generalizado dos preços (inflação), o produto produzido pelos gaúchos ficou muito caro, mas a renda dos consumidores não acompanhou a elevação dos preços. Com a queda do consumo, caiu a produção e consequentemente os lucros da elite gaúcha, o que resultou no confronto militar. O Nordeste também possuía influência na política. Contudo, para realmente conseguir impor seus interesses, a região tinha que se coalizar em blocos, pois os estados isolados não possuíam grande 55 REPÚBLICA VELHA representação na Câmara dos Deputados Federais: “a Bahia tinha uma representação de 22 deputados [...] Pernambuco 17” (FAUSTO, 2008, p. 270). Dependendo dos temas de interesses, os Estados se uniam e, assim, conseguiam aprovar as pautas de votação. 5.2 Café com leite Novamente é Fausto (2008, p. 271) que nos socorre com seus ensinamentos. Conforme verificamos, São Paulo saiu na frente da consolidação de sua hegemonia econômica e política. O termo “locomotiva” vem dessa época. Nos primeiros anos, o estado manteve um acordo com Minas Gerais, realizando uma alternância na presidência. Entre 1894 e 1902, o país teve três presidentes paulistas: Prudente de Morais, Campos Sales e Rodrigues Alves. Em 1909 rompeu‑se o acordo. Minas Gerais se aliou ao Rio Grande do Sul e ambos lançaram a candidatura do Marechal Hermes da Fonseca. São Paulo, em aliança com a Bahia, lançou na oposição Rui Barbosa. Venceu o candidato Hermes da Fonseca. O grande articulador político da época era o senador Pinheiro Machado. Ele controlava a Comissão de Verificação de Poderes do Senado e a Câmara dos Deputados. Manejava a representação do Nordeste e controlava também o Partido Republicano Conservador (FAUSTO, 2008). Contudo, por questões pessoais (era filho de paulista, casado com uma paulista) e estratégicas, não confrontava diretamente a oligarquia paulista, pelo contrário, defendia planos de valorização do café. Sua atuação acabou prejudicando os outros estados e facilitando uma nova união entre São Paulo e Minas Gerais, que se concretizou em 1913. Foi assassinado em 1915, no Rio de Janeiro. Apesar disso, o Rio Grande do Sul permaneceu atuando na política nacional. Até 1930 permaneceu a política do café com leite, quando tomou posse o paulista Júlio Prestes, na vez em que deveria ter sido eleito um mineiro para a presidência. 5.3 Voltando para o café Toda esta explicação sobre o cenário nacional foi com o intuito de demonstrar como a cultura do café propiciou o fortalecimento das oligarquias, que passaram a manejar a República conforme os seus interesses. Do latim res publica, “coisa pública”, mas de pública não tinha nada. Toda a estrutura política econômica visava atender aos interesses da elite, o público estava fora dos interesses e das preocupações. Na Primeira República, o café era o principal item da economia, representava 72,6% das exportações. Ele fornecia a maior parte das divisas necessárias para importações e o atendimento da dívida externa (FAUSTO, 2008, p. 273). 56 Unidade II E, sem sombra de dúvida, o estado de São Paulo era o principal produtor: Em suma, a concorrência das terras virgens do oeste de São Paulo, com seus magníficos solos, sua topografia regular que proporciona boas facilidades para o transporte, e com seu clima a que o trabalhador europeu se adaptou fácil e admiravelmente, desviou para elas os melhores esforços e recursos do país; e lá se concentrou a maior e melhor parcela da lavoura cafeeira do Brasil; mais da metade do número total de seus cafeeiros, com uma produção que ultrapassa 60% da produção global do país. É sobretudo com esta considerável parcela paulista que o Brasil contará para colocar‑se tão esplendidamente, como vimos acima, no comércio internacional do café (PRADO JUNIOR, 1981, p. 171). Entretanto, o ciclo do café também gerou inúmeras crises. Prado Junior (1981, p. 172) ensina que o cafeeiro é uma planta cuja produção se inicia aos quatro ou cinco anos de idade. Dessa forma, após cinco anos são colhidas as primeiras safras. Com o passar dos anos, a quantidade colhida aumenta, ocasionando o seguinte fenômeno econômico: + oferta – demanda = – preço. Para elevar os preços, os produtores seguravam o produto no estoque, criando grandes estoques impossíveis de serem vendidos. “Eles serão, em 1905, de 11 milhões de sacas de 60 kg que representavam 70% do consumo mundial de um ano” (PRADO JUNIOR, 1981, p. 172). O maior responsável da crise era sem dúvida o aumento das culturas. No período de 1890 a 1900 as plantações de São Paulo tinham duplicado (220 e 520 milhões de cafeeiros respectivamente). Procura‑se remediar o mal restringindo as culturas, e estabelecer‑se‑á em São Paulo (1902) um imposto sobre novas plantações. Aliás, a própria queda de preços e dificuldades de venda tinham, já por si, reduzido muito o ritmo de crescimento. No decênio seguinte ao citado (1901‑1910), os cafeeiros paulistas aumentarão apenas de 150 milhões. Aliás, o mesmo fato observar‑se‑á nos demais países concorrentes do Brasil, onde se verifica mesmo um decréscimo da produção. Mas tudo isto não impedirá um desequilíbrio crônico entre a produção e o consumo mundiais. Alcançara‑se nitidamente um teto de produção cafeeira pela saturação dos mercados consumidores (PRADO JUNIOR, 1981, p. 172). Com isso houve um grande desequilíbrio da economia; o país produzia mais, mas o consumo externo havia diminuído. Assim, as vendas caíram e o preço do produto também. Para não irem à falência, os produtores de café contavam com os subsídios do governo. Esses financiamentos aumentavam ainda mais a dívida do governo e a economia ficava desequilibrada: queda de arrecadação (com a diminuição das vendas, o governo arrecada menos impostos) e aumento da dívida (pelos subsídios oferecidos). 57 REPÚBLICA VELHA A primeira consequência é a inflação: aumento generalizado de preços. Para controlar a inflação, o governo tem que aumentar os juros e retirar o papel do mercado (dinheiro). Contudo, naquele período, o governo emitiu mais papel‑moeda para pagar as suas dívidas. Pela ausência de reservas, esse papel chegava ao mercado desvalorizado, aumentando ainda mais a dívida interna. Para poder pagar as dívidas, o governo contraiu empréstimos com bancos estrangeiros, como a Casa de Rothschild, um importante agente financeiro. São Paulo recebeu por seu intermédio mais 3.000.000de libras (PRADO JUNIOR, 1981). Além disso, havia a especulação comercial: as sacas de café eram negociadas na bolsa de valores. Essas negociações eram realizadas por agentes financeiros que lucravam com a especulação. Assim, manobravam o preço da saca conforme os interesses econômicos. Em muitas situações, para não terem um grande prejuízo, os fazendeiros eram obrigados a vender a saca do café pelo preço do custo. Toda essa situação determinou a intervenção do Estado no mercado de café: Optar‑se‑á por um expediente oportunista que consistirá em intervir no mercado com compras maciças para forçar a alta. É difícil averiguar hoje até onde teriam as manobras de interesses ocultos contribuído para uma solução tão precária e de caráter especulativo. Os grandes proveitos que dela tirarão grupos financeiros que nada tinham de comum com os produtores autorizam‑nos, contudo, suposições verossímeis. Os produtores propriamente serão beneficiados, não há dúvida, embora momentaneamente apenas; mas a parcela maior dos proveitos não irá para eles (PRADO JUNIOR, 1981, p. 173). Ou seja, o governo comprava grandes quantidades de café, para assim conseguir elevar o preço do produto no mercado (menos produto a venda, maior a valorização). Com esse plano, os fazendeiros conseguiam repor o seu custo, mas, na verdade, quem ganhava era o mercado financeiro: primeiro porque vendia o produto, depois porque, com a venda, o preço do produto era elevado. Assim, o governo aumentou ainda mais a sua dívida. Para consolidar os empréstimos anteriores e levar a cabo a operação, serão obtidos mais 15 milhões; e continuar‑se‑á a intervir no mercado até 1910 quando, cessada a tensão e firmados os preços, se interrompem afinal as compras. No período de 1906 a 1910 tinham sido retirados do mercado livre cerca de 8.500.000 sacas. Os interesses financeiros envolvidos na operação venciam assim a partida. E serão eles, muito mais que os produtores em cujo nome se agira, que colherão seus melhores frutos (PRADO JUNIOR, 1981, p. 173). 58 Unidade II Ocorre que essa dívida tinha que ser paga. Os produtores arcariam com o ônus dela. Foram criados impostos, o que aumentou ainda mais o custo da produção do café. Aumento de preços, aumento da dívida, inflação. Figura 11 – A Plebe, 9 de junho de 1917, primeira página: Igualdade e Fraternidade [imagem meramente ilustrativa] Logo em seu primeiro número, A Plebe traz uma charge na qual demonstra a situação de exploração e miséria sofrida pelos operários. Sob o título “Igualdade e Fraternidade”, a imagem deixa evidente a extrema exploração pela qual os operários passavam. O burguês aparece em uma dimensão desproporcional aos demais, sentado sobre sacos de dinheiro e, entre eles, a figura de dois trabalhadores esmagados pelos sacos. O povo está de joelhos e maltrapilho, em um misto de súplica e revolta. O burguês está de fraque e cartola, vestimenta clássica na representação da burguesia, reforçada pela condecoração que revela a sua superioridade e pelo fato de estar sentado sobre sacos de dinheiro. Fuma charuto, outro adereço que demonstra riqueza. Do outro lado, uma fila de centenas de trabalhadores famélicos tem à frente duas mulheres ajoelhadas. A primeira apresenta o seu filho que pende morto em seus braços e a outra abraça de forma protetora seu rebento, com outra criança logo atrás. Elas são seguidas por uma multidão de operários famélicos, que com os braços estendidos apontam para uma manifestação de revolta, carregando pás, enxadas e bandeiras. A imagem enseja a representação da desigualdade social, onde poucos lucram muito com a exploração e a miséria de muitos. Deixa evidente a situação vivida pelos operários e a necessidade de mudança para garantir a sobrevivência: a fome de muitos garante a riqueza de um único burguês. 59 REPÚBLICA VELHA Aparentemente, a situação das lavouras do café era promissora – aumento da produção combinada com aumento do consumo –, mas não podemos esquecer que dependíamos das oscilações do mercado externo. O desenlace fatal virá com a quebra da Bolsa de Nova Iorque, em outubro de 1929. O curso do café não resistiu ao abalo sofrido em todo mundo financeiro e declinou bruscamente em 30%. Ao mesmo tempo estanca‑se o crédito externo, suspende‑se o financiamento do café retido e processa‑se a liquidação dos débitos contraídos. Lazard Bros. ainda lançam na fogueira mais 20 milhões de libras para tentar a salvação dos últimos restos do desastre. Mas isso de pouco serviria: os novos preços do café não eram suficientes para fazer face aos débitos anteriormente contraídos pelos lavradores. A ruína era completa (PRADO JUNIOR, 1981, p. 173). A crise econômica mundial custou um alto preço à economia brasileira. Diminuíram as exportações e a moeda desvalorizou, o que gerou a elevação dos preços e a diminuição do consumo interno. Caindo o consumo, cai a produção, gerando desemprego; sem produção/consumo, sem arrecadação. Sem arrecadação, não havia como pagar a dívida, aumentando o valor da dívida externa pela falta de pagamento e queda do valor da moeda, pela falta de credibilidade. Naquele momento a dívida era impagável: A dívida pública externa do Brasil (governos federal, estadual e municipal) era em 1930 de 253 milhões de libras esterlinas. Suspendeu‑se depois daquele ano o serviço de juros, que somente por momentos esporádicos se retomou depois. A dívida efetiva do Brasil já somaria, no pós‑guerra, talvez o dobro daquela importância, não fossem as reduções impostas aos credores cujo crédito oficialmente reconhecido se reduziu a apenas 130 milhões, que com mais outros cortes posteriores se foram liquidando por entendimentos parciais com os diferentes credores, através de compensação com créditos brasileiros provenientes de exportações não pagas que se efetuaram durante a guerra, e que tinham sido congelados (PRADO JUNIOR, 1981, p. 280). A saída foi investir no mercado interno. Se o mundo estava em crise e não podia comprar, por outro lado a população brasileira precisava ver atendidas suas necessidades básicas. A produção passou a visar ao consumo interno, assim parte dos produtores começou a plantar os “produtos de mesa”: Assim, a produção de frutas de mesa (laranja, abacaxi, banana). Mas sobretudo do algodão, como foi assinalado no capítulo anterior. Também de minérios e produtos extrativos vegetais (oleaginosos, a cera de carnaúba etc.). A de laranja em particular alcançará certo vulto já antes, mas sobretudo depois de 1930. Um presidente eleito do Brasil, parecendo ter consciência do que se passava, afirmará (1930) na sua forte convicção conservadora que “a laranja salvará o café” (PRADO JUNIOR, 1981, p. 280). Com idas e vindas, a economia do Brasil foi se adaptando à nova realidade. O mercado internacional teve que deixar de ser o foco, a produção cresceu visando atender as necessidades da população nacional. 60 Unidade II Toda a crise econômica, essencialmente oriunda da opção do modelo agrário exportador, com foco em um único produto, o café, gerou problemas sociais enormes. Não foram só os produtores, os oligarcas, que sofreram o impacto. Toda a sociedade brasileira de alguma forma foi atingida. Principalmente os mais pobres. Como veremos a seguir, a crise econômica gerou a crise política, cujo resultado direto foi o fim da Primeira República e a instauração de uma nova configuração política. 5.4 O ciclo da borracha Em 1880, a Amazônia viveu o seu maior nível de riqueza, a fonte de tanta abundância era a borracha. Segundo Fausto (2008), a mania da bicicleta, nos anos 1980, e gradativa popularização do automóvel incentivaram ainda mais a produção. Entre 1898 e 1910, a produção da borracha alcançou o 2º lugar na exportação, correspondendo a 25,7%: Tabela 2 – Brasil, principais produtos da exportação, 1889‑1945 (em percentagens) Períodos Café Açúcar Cacau Mate Fumo Algodão Borracha Couros e pele Outros 1889-1897 67,6 6,5 1,5 1,1 1,2 2,9 11,8 2,4 4,8 1898-191052,7 1,9 2,7 2,7 2,8 2,1 25,7 4,2 5,2 1911-1913 61,7 0,3 2,3 3,1 1,9 2,1 20,0 4,2 4,4 1914-1918 47,4 3,9 4,2 3,4 2,8 1,4 12,0 7,5 17,4 1919-1923 58,8 4,7 3,3 2,4 2,6 3,4 3,0 5,3 16,5 1924-1929 72,5 0,4 3,3 2,9 2,0 1,9 2,8 4,5 9,7 1930-1933 69,1 0,6 3,5 3,0 1,8 1,4 0,8 4,3 15,5 1934-1939 47,8 0,5 4,3 1,4 1,6 17,6 1,1 4,4 21,3 1940-1945 32,5 0,6 3,2 0,9 1,2 9,1 2,4 3,6 46,5 Fonte: Fausto (2008, p. 292). O crescimento da exploração da borracha motivou uma grande migração para a região, cerca de 110 mil pessoas, principalmente para Belém e Manaus. A maioria era de pessoas oriundas do Ceará, fugindo das contingências da seca. Inicialmente, a exploração se concentra no Estado do Pará; posteriormente, na região do Estado do Amazonas. Com o passar do tempo, a exploração segue em direção a outros territórios ricos em seringais. Alcançaram os territórios de Purus e Juruá, regiões de fronteira entre o Brasil e a Bolívia: O avanço dos exploradores brasileiros da floresta amazônica irá chocar-se neste território riquíssimo de seringueiras, com os vizinhos bolivianos que 61 REPÚBLICA VELHA o ocupavam nominalmente com alguns postos militares. Surgirá daí um conflito internacional resolvido afinal sem maiores consequências com a cessão, por parte da Bolívia de uma grande área de quase 200.000 km2 pela qual receberá uma indenização de 2.000.000 de libras esterlinas. Formar‑se‑á aí uma circunscrição, sob administração direta do governo federal, e que se denominará Território do Acre (PRADO JUNIOR, 1981, p. 179). Graças à incorporação do Acre ao Brasil, a produção de borracha cresceu. Em 1907, ultrapassou mais de 11.000 toneladas. Sua exploração era extremamente rudimentar e no meio da floresta tropical. O grande problema era o vínculo de emprego, análogo à escravidão. O seringueiro ficava isolado na floresta. Recebia salário, mas era obrigado a adquirir do seu patrão os gêneros alimentícios. Esses produtos, sob a justificativa do difícil transporte, eram vendidos por um preço muito elevado. Assim, o empregado permanecia sempre devendo ao patrão e trabalhava para pagar uma dívida sem fim, que o mantinha vinculado. Sua única diversão era o consumo do álcool, que aumentava ainda mais a dívida. Caso se recusasse a trabalhar, o empregador usava da força. Naquela época não existia preocupação com preservação do meio ambiente. Os seringais eram explorados ao extremo. A consequência era o constante deslocamento, uma vez esgotadas as árvores daquela área, buscavam‑se áreas mais distantes. Todos esses fatores unidos levaram à crise: Precisamente em 1912 a exportação da borracha brasileira alcança seu máximo com um total de 42.000 toneladas. Daí por diante é o declínio. Os preços também atingem seu teto em 1910, valendo então a tonelada quase 10 contos FOB, ou seja, 639 libras. Neste ano a exportação soma 377.000 contos (24.646.000 libras‑ouro), e representa quase 40% da exportação total do país; contra 385.000 contos, ou pouco mais de 40% representados pelo café. Depois, é a degringolada. A borracha brasileira, explorada nas condições que vimos, não resistirá à concorrência do produto oriental que em poucos anos a substituirá quase inteiramente nos mercados mundiais (PRADO JUNIOR, 1981, p. 180). As riquezas cumuladas proporcionaram o crescimento da região. Acre, Belém e Manaus cresceram muito e a riqueza podia ser vista em todos os lugares. Contudo, o crescimento estava baseado em uma exploração que não tinha sustentabilidade. Com a queda, muitas pessoas retornam a sua terra de origem, vilarejos foram abandonados, e os poucos locais que permaneceram mantinham de forma precária a exploração do produto: As tentativas de substituição da simples coleta na mata pelo plantio não foram para a frente, sendo as plantas atingidas com frequência pelas pragas. 62 Unidade II Um exemplo disso foi a experiência realizada pela Ford – a Fordlândia – em fins da década de 1920, que resultou em um imenso fracasso. Da época de ouro, ficaram como marcas mais expressivas os dois belos teatros de Belém e Manaus (FAUSTO, 2008, p. 293). Assim, a riqueza foi efêmera, da mesma forma que entrou, rapidamente saiu. 5.5 Cacau O surto do cacau não foi tão intenso quanto a borracha, nem tampouco como o café, mas teve o seu valor na economia brasileira. A tabela de Fausto (2008) apresentada anteriormente demonstra isso. Entre 1914 a 1918, a produção chegou ao terceiro lugar dos principais produtos importados. Inicialmente sua cultura começou na Amazônia, mas o seu desenvolvimento cresceu na Bahia. Lembra‑se do romance Gabriela, de Jorge Amado? Ele retrata esse período! A Bahia conhecerá então mais uma fase de bem‑estar e progresso depois do longo período de estagnação e decadência que se vinha estendendo desde princípios do século passado, senão dantes. O ciclo do açúcar que no século XVII a elevara a culminâncias — Salvador, a capital, fora então uma das principais cidades da América —, encerrara‑se por completo no século XIX. O cacau proporcionar‑lhe‑á, depois de tão larga espera, uma nova perspectiva; e como dantes se vivera da exportação do açúcar, agora se viverá da do cacau. Para se avaliar o que significaria este gênero na economia baiana, basta lembrar que mais de 20% das rendas públicas do Estado provinham, em princípios do século atual, de um imposto sobre a exportação do produto. Direta ou indiretamente, quase toda a riqueza baiana e a vida dos habitantes repousará nos cacauais. E eles lhe trarão efetivamente um certo bem‑estar e desafogo econômico (PRADO JUNIOR, 1981, p. 183). A produção do cacau visava tanto ao mercado externo como ao interno. Em relação ao mercado externo possuía uma grande concorrência, em alguns momentos esteve em destaque, mas nunca o suficiente para se solidificar no mercado. O enriquecimento do território foi por um curto período, mas o suficiente para deixar suas marcas na nossa história. 6 O SETOR INDUSTRIAL Vamos recordar alguns aspectos. Durante o período da colônia era proibida a instalação de indústrias manufatureiras no Brasil. No período do Império, ocorreu praticamente o mesmo desestímulo. Não podemos esquecer que D. Pedro I era herdeiro do trono de Portugal, e é lógico que ele permaneceu defendendo os interesses da Coroa. Igualmente, seu filho e sucessor D. Pedro II permaneceu defendendo os interesses de Portugal. O que isso significa? 63 REPÚBLICA VELHA Não interessava o desenvolvimento da indústria nacional. Durante séculos, o Brasil permaneceu na dependência dos produtos manufaturados europeus, primeiro de Portugal, depois da Inglaterra. O Império impedia das mais diversas formas a instalação da indústria nacional – um dos casos mais conhecidos é do Barão de Mauá. Como agravante, as indústrias brasileiras enfrentavam uma grande barreira, a falta de infraestrutura. Havia falta de fontes de energia. Além disso, apesar de o Brasil ser abundante em fontes de recursos minerais, não havia siderúrgicas com capacidade para extrair os produtos. Além disso, havia a grande diferença territorial e cultural. Cada região do Brasil possuía um consumo próprio e não existia uma rede de transporte suficiente para interligar os diversos produtos. Por outro lado, exportar era caro, pois além da diferença do câmbio, havia as taxas e os impostos. Contudo, havia dois fatores que favoreciam a indústria nacional, o baixo custo da mão de obra e da matéria‑prima: São estas as circunstâncias principais que condicionarão o desenvolvimento de uma pequena indústria, sobretudo têxtil, na segunda metade do século passado. Ela terá um caráter local limitado a pequenos mercados de curto raio (PRADO JUNIOR, 1981, p. 197). A primeira indústria que cresceu e se destacou na nossa economia foi a indústria têxtil. No último período do Império, o número de indústrias começa a crescer, sendo que o crescimento substancial ocorreu na Primeira República. Em 1907 realiza‑se o primeiro censo geral e completo das indústrias brasileiras.Serão encontrados 3.258 estabelecimentos industriais com 665.663$000 de capital, e empregando 150.841 operários. Quanto à distribuição geográfica da indústria, 33% da produção cabia ao Distrito Federal (capital da República, a que se podem acrescentar os 7% do Estado do Rio de Janeiro, vizinho e formado geograficamente na mesma unidade); 16% a São Paulo e 15% ao Rio Grande do Sul. Nenhum outro Estado alcançará 5%. Com exclusão do Rio de Janeiro, que continuava, como sempre fora no passado, a encabeçar a produção industrial, a transformação desde o tempo do Império fora considerável. Seria particularmente notável o caso de São Paulo, que se tornaria logo o maior produtor do país, com a grande parcela de 40% do total (PRADO JUNIOR, 1981, p. 197). O crescimento industrial em São Paulo se explica tanto pela localização do Estado como por toda a modernidade trazida pela cafeicultura. Devemos lembrar que junto com o crescimento do novo modelo de cafeicultura vieram a energia elétrica, telefonia, energia hidráulica, expansão da via férrea e principalmente a imigração europeia. 64 Unidade II A proximidade com o maior porto do Brasil facilitava a circulação das mercadorias e a entrada dos imigrantes, que vieram com experiência e conhecimento técnico. Também ocorreu a instalação da primeira usina hidrelétrica paulista nas proximidades do centro industrial. Membros da oligarquia paulista tornaram‑se investidores em várias atividades: Um exemplo significativo é o do Senador Lacerda Franco, fazendeiro e fundador de uma empresa corretora de café. Proclamada a República, obteve a concessão para criar um banco de emissão e iniciou uma grande fábrica de tecidos em Sorocaba. Mais tarde, fundou outra menor em Jundiaí, uma companhia telefônica e foi diretor da Companhia Paulista de Estradas de Ferro (FAUSTO, 2008, p. 287). Aproveitando‑se da riqueza acumulada com a produção do café, foi possível diversificar os investimentos e investir na instalação de indústrias e outros ramos de atividade. Na Europa, ocorria a Primeira Guerra Mundial, o que deu maior impulso à indústria nacional. A Europa foi destruída, assim como sua indústria. Eles deixaram de exportar para o Brasil, fomentando o crescimento da indústria nacional, principalmente a indústria têxtil: No primeiro grande censo posterior à guerra, realizado em 1920, os estabelecimentos industriais arrolados somarão 13.336, com 1.815.156 contos de capital e 275.512 operários. Destes estabelecimentos, 5.936 tinham sido fundados no quinquênio 1915‑1919, o que revela claramente a influência da guerra (PRADO JUNIOR, 1981, p. 198). Fugindo das agruras da guerra, vieram para o Brasil empresários e operários europeus. Alguns vieram para trabalhar no campo e se deslocaram para o interior de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Outros, mais empreendedores, iniciaram suas atividades como importadores. Aproveitando os contatos que possuíam em sua terra natal, importavam máquinas e equipamentos, e, pela experiência, sabiam os ramos de atividade onde poderiam lucrar mais. Foi o caso de Francisco Matarazzo e Crespi, os dois maiores industriais italianos de São Paulo. Tabela 3 – Brasil Indústria 1907 e 1920 Ano Número de empresas Capital (contos) Produção (contos) Força motriz Número de operários 1907 3.258 653.555 731.292 109.284 149.018 1920 13.336 1.815.156 2.959.176 310.424 275.512 Fonte: Decca (1991, p. 24). 65 REPÚBLICA VELHA Como podemos verificar, o número de empresas praticamente quadruplicou de 1907 a 1920. O crescimento das grandes indústrias trouxe consigo o crescimento das pequenas também: [...] É incalculável o número de tendas e sapatarias, marcenarias, fábricas de massas, de graxa, de óleos, de tintas de escrever, fundições, tinturarias, fábricas de calçados, manufaturas de roupas e chapéus, que funcionam em estalagens, em fundos de armazéns, em resumo: em lugares que o público não vê. [...] É incalculável o número de pequenas marcenarias, nas quais às vezes trabalha um só homem. Das fábricas de bebidas e de massas, vulgarmente conhecidas por Macarrão, se é certo que elas de muito servem às classes pobres, hoje que a vida é tão cara, não menos certo que causam considerável diminuição na renda das grandes fábricas. Isso, entretanto, não se dá na Capital Federal, que depois de São Paulo é a localidade mais industrial da República, e não se dá porque a maioria da imigração, que lá aflui, é em tudo diversa da italiana, razão pela qual ali o progresso industrial tem sido mais demorado do que aqui (DECCA, 1991, p. 23). O trecho que acabamos de apresentar descreve a situação da indústria nacional no período. O crescimento da indústria em São Paulo foi alarmante e se destacava em relação ao restante do país. Apesar do crescimento, havia uma carência muito grande das indústrias de base: cimento, ferro, máquinas e equipamentos, o que forçava a importação desses itens. Com incentivos do governo, surgiram duas grandes indústrias do ramo: em 1924, a Siderúrgica Belgo‑Mineira, em Minas Gerais, e a Companhia de Cimento Portland, estabelecida em São Paulo, em 1926. Como podemos analisar, fatores externos e internos colaboraram para a revolução industrial brasileira, que embora tardia ocorreu no período da Primeira República, muito mais pelo empenho dos industriais do que com incentivo do governo. Exemplo de aplicaçãoExemplo de aplicação O Censo de 1920 está à disposição no site do IBGE. É um documento que possui gráficos feitos a O Censo de 1920 está à disposição no site do IBGE. É um documento que possui gráficos feitos a mão, fotos e informações preciosas sobre o período. Foi o primeiro censo após a abolição da escravatura. mão, fotos e informações preciosas sobre o período. Foi o primeiro censo após a abolição da escravatura. Faça o seguinte exercício, compare o censo de 1920 com os anteriores e observe a mudança que houve Faça o seguinte exercício, compare o censo de 1920 com os anteriores e observe a mudança que houve na apuração da população brasileira. De que forma se deu essa mudança?na apuração da população brasileira. De que forma se deu essa mudança? 66 Unidade II Observação Apesar das riquezas acumuladas no período, os pobres continuaram alijados das conquistas da elite. Lembrete Segundo o entendimento de Fausto (2008), a mania de andar de bicicleta, que estava se expandindo pelo mundo, influenciou a produção da borracha no Brasil. Saiba mais O filme a seguir pode propiciar uma inter‑relação com os conteúdos da unidade: O CORTIÇO. Direção: Francisco Ramalho Jr. Brasil: Argos Filmes, 1977. 110 min. O filme indicado a seguir é uma famosa animação e conta a história de Campeão, que é filho de ciclistas profissionais e resolve desde cedo seguir os passos dos pais. AS BICICLETAS de Belleville. Direção: Sylvian Chomet. França: Casablanca Filmes, 2003. 82 min. 67 REPÚBLICA VELHA Resumo A República trouxe muita riqueza, surgiram as indústrias e, com elas, a modernidade: telefone, energia elétrica, rádio e viagens para o exterior, que se tornaram mais comuns. Entretanto, somente para a elite. A grande população permaneceu excluída dos benefícios do novo sistema. Junto com as mudanças econômicas veio a inflação, ou seja, um aumento generalizado de preços. Isso ocorreu porque, para manter os custos do novo sistema, o governo teve que emitir mais moedas. Por outro lado, a economia brasileira dependia da exportação. Assim, manter uma estrutura sem um lastro econômico gerou problemas sociais que a sociedade brasileira enfrenta até hoje. Houve uma grande expansão da indústria, com novos itens de produção para gerar riquezas para os grandes centros. Contudo, os operários não colhiam estes frutos. A jornada de trabalho era extenuante, as condições de trabalho eram péssimas; com a inflação, os gêneros de primeira necessidade ficaram muito caros, piorando ainda mais as condições de vida dos trabalhadores. Um grande exemplo desse paradoxoocorreu na Bahia com a produção do cacau. A cultura trouxe muita riqueza para os “senhores do cacau”, grandes fazendeiros, líderes da política local. Na região, surgiram teatros e cabarés, e as elites tiveram acesso à cultura, mas a grande população permaneceu desprovida de condições mínimas de qualidade de vida. É importante salientar que a grande expansão industrial ocorreu por mérito dos empresários. Não houve uma preocupação do governo em investir em infraestrutura, incentivos fiscais ou mesmo subsídios. As indústrias surgiram pelos investimentos pessoais dos empresários, mas também cresceram pelo trabalho e esforço dos operários, que vieram para o Brasil com suas experiências e técnicas desenvolvidas em suas terras. 68 Unidade II Exercícios Questão 1. (Enade 2008) A economia brasileira sofre transformações na primeira metade do século XX, conforme se observa nas tabelas a seguir. Tabela 4 – Taxas de crescimento: produção industrial, PIB e importação de bens de capital para a indústria, 1911‑1915 (%) Período Produção industrial PIB Importação de bens de capital para a indústria 1917‑1919 3,6 – –14,8 1920‑1922 6,2 3,2 12,3 1923‑1926 0 1,3 14,0 1927‑1928 8,0 12,4 –7,2 1929‑1932 0 0,3 –31,7 1933‑1936 14,1 7,4 41,0 1937‑1941 8,3 4,5 –5,5 1942‑1945 4,3 1,8 –1,1 Adaptada de: Suzigan (1975, p. 472). Tabela 5 – Distribuição setorial do PIB brasileiro, 1910‑1950 (%) Ano Agricultura Indústria Serviços* 1910 35,8 14,0 50,2 1920 32,0 17,1 50,9 1930 30,6 16,5 52,9 1940 25,0 20,8 54,2 1950 24,3 24,1 51,6 *inclui governo. Fonte: Haddad (1978; IBGE, 1990 apud ABREU; VERNES, 1997, p. 26). A análise das tabelas possibilita identificar que: I – A taxa de crescimento do PIB manteve‑se estável durante as décadas de 1930 e 1940. II – A indústria brasileira se equipou significativamente durante a primeira metade da década de 1920 e o período de 1933 a 1936. 69 REPÚBLICA VELHA III – O setor de serviços, incluindo o governo, ocupou sempre um papel de destaque no PIB durante a primeira metade do século XX. IV – A participação do setor agrícola no PIB manteve‑se estável na primeira metade do século XX, o mesmo não acontecendo com a indústria. É correto apenas o que se afirma em: A) I e II. B) I e IV. C) II e III. D) II e IV. E) III e IV. Resposta correta: alternativa C. Análise das afirmativas I – Afirmativa incorreta. Justificativa: pelas tabelas, é possível verificar uma grande variação no volume do PIB na época mencionada. II – Afirmativa correta. Justificativa: isso se deveu à política de substituição de importações no final da Primeira República, política que implantou a indústria no Brasil. III – Afirmativa correta. Justificativa: isso foi importante na medida em que a indústria ainda era incipiente e o preço do café oscilava constantemente no mercado internacional. IV – Afirmativa incorreta. Justificativa: a participação da indústria cresceu significativamente no período citado, com tendência a uma leve queda da agricultura. 70 Unidade II Questão 2. (Enade 2005) “O navio apita funebremente. Começa a manobra para a saída. Entoemos a “Internacional”, grita um do grupo. E rodeados de passageiros, curiosos de conhecer as personagens esquisitas pelas quais o navio esperou tantas horas, o grupo de deportados rompe com o canto da “Internacional” – e é com essas estrofes vigorosas e impressionantes que o ‘Benevente’ levanta ferro e deixa com lentidão a baía de Guanabara [...].” (Everardo Dias, 1920). Este texto refere‑se à deportação de: A) Imigrantes japoneses considerados doentes. B) Judeus pertencentes ao movimento sionista. C) Imigrantes russos adeptos da Revolução Bolchevique. D) Militantes estrangeiros do movimento operário. E) Brasileiros participantes da Revolta da Chibata. Resposta correta: alternativa D. Análise das alternativas A) Alternativa incorreta. Justificativa: nunca houve no Brasil a deportação de japoneses doentes. B) Alternativa incorreta. Justificativa: nada no texto faz chegar a tal conclusão C) Alternativa incorreta. Justificativa: embora o texto faça menções ao movimento operário de caráter socialista, não há notícia da deportação de russos. No entanto, esta questão é bastante mal formulada. D) Alternativa correta. Justificativa: as greves de 1917 contaram com a participação de militantes estrangeiros, sobretudo anarquistas italianos. O nome do navio sugere que estes italianos estariam sendo devolvidos ao seu país. E) Alternativa incorreta. Justificativa: a Revolta da Chibata ocorrera 10 anos antes deste evento.
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