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1. Introdução Entender a questão da Governança Corporativa (GC) é, antes de tudo, entender a necessidade da sua existência, os desenvolvimentos históricos que levaram à criação de mecanismos que, aperfeiçoados ou não, constituem a base dos princípios e práticas de boa governança que estudamos hoje no mundo corporativo. Intrinsecamente relacionada nas últimas décadas ao mundo corporativo, é válido dizer que, ainda que os mecanismos e práticas de Governança sempre tenham existido, e possuam ligações históricas com organizações governamentais, com a Igreja ou mesmo entidades sem fins lucrativos, o grande impulso para sua evolução se deu a partir do desenvolvimento da sociedade capitalista e, principalmente, com o surgimento dos conflitos de agência, oriundos da separação entre propriedade e capital, processo oriundo (ou amadurecido) da primeira metade do século XX. Essa ligação entre o mundo corporativo e o desenvolvimento dos sistema de Governança nos obriga a entender um pouco mais da formação do primeiro, seus fenômenos mais impactantes e os desdobramentos para o tema nos modelos atualmente discutidos. Se a Governança e o mundo corporativo têm, de fato, laços entre si, é possível também apontar que a própria formação do sistema capitalista como um todo influenciou boa parte da estrutura que discutimos atualmente. 2. A formação do sistema capitalista moderno Os livros de história fazem a sua parte e são pródigos em apontar as raízes para o surgimento do modelo capitalista na forma que conhecemos atualmente: as grandes navegações marítimas, que objetivavam uma expansão de mercados e o acesso à matérias primas de baixo custo. De forma mais detalhada, o capitalismo é marcado por três grandes fases: 1) Capitalismo Comercial: também chamado de pré-capitalismo, é considerado o ponto de partida para o modelo que conhecemos atualmente, tendo início no século XVI com as grandes navegações e as explorações além-mar dos países europeus. Foi o período responsável pela geração e acúmulo de riquezas que permitiriam a formação das bases para a expansão alcançada nas fases seguintes do sistema capitalista. 2) Capitalismo Industrial: considerado o período inicial para o surgimento do modelo corporativista, teve seu marco inicial na Revolução Industrial, responsável pela produção em série de riqueza através do comércio de produtos industrializados em centros de produção europeus. Uma grande capacidade de acesso e acúmulo de recursos básicos, somada ao avanço tecnológico que permitiu a implementação de diversas ferramentas e maquinários nas empresas e um consequente aumento da produção e nas estruturas de apoio, multiplicou os lucros e ampliou ainda mais a geração e acúmulo de riqueza. 3) Capitalismo Financeiro: teve como momento inicial o fim da Segunda Guerra Mundial, sendo conhecido também como Capitalismo Monopolista. É um período marcado pela forte concentração de capital, pelo crescimento dos GOVERNANÇA CORPORATIVA Prof Renan Barabanov mercados de valores e de ações, além da expansão e proliferação de empresas de diversos setores e segmentos, capazes de se moverem rapidamente entre diversos mercados e nações, extinguindo as antigas fronteiras nacionais que separavam as corporações. Além da ampliação da concorrência, essa fase também tem como fator característico o aumento nos processos de fusões e aquisições entre essas organizações, acirrando o fenômeno da monopolização de alguns segmentos econômicos. Ainda que todas as fases tenham a sua importância e contribuição para a formação do mundo corporativista moderno e do modelo que conhecemos atualmente, vamos no ater principalmente à Revolução Industrial. Iniciada na Inglaterra, antes de espalhar-se para toda a Europa e os Estados Unidos, o fenômeno, fruto do acúmulo de capital e da evolução tecnológica, econômica e social, impactou e transformou de forma significativa praticamente todas as populações dos países diretamente e indiretamente envolvidos no processo. Mais do que isso, a Revolução iniciada nos primeiros anos do século XIX transformou todo o mercado, os modelos, os sistemas de produção e os postos de trabalho disponíveis, bem como as relações de troca no mundo profissional. O fim do modo de produção artesanal foi apenas o reflexo mais agudo de uma mudança profunda que concentrou matéria-prima, ferramentas e processos de produção nas mãos de indústrias e organizações capazes de baratear de forma significativa seus bens e serviços, obtendo o controle do mercado e iniciando o processo de econômico- político que hoje conhecemos como Capitalismo. 3. O agigantamento das corporações, suas influências e poder A concentração de recursos nas mãos de algumas organizações ou um grupo delas teve como efeito imediato a possibilidade de redução nos custos de aquisição de matéria-prima e maquinário, o barateamento de seus processos de produção e a contratação de uma quantidade cada vez maior de mão de obra barata disponível, resultando, por sua vez, no domínio do mercado e no crescimento de sua influência e poder. A partir do momento em que tais organizações passaram a dominar seus mercados, controlar fluxos de produtos, trabalhadores e recursos, passaram também a exercer papel vital no direcionamento de políticas e na definição de normas e leis, tornando-se personagens importantes e essenciais para políticos expansionistas em um cenário à época pautado pela expansão e controle de colônias e mercados de consumo/fornecimento. As ligações de poder e influência das grandes corporações estiveram por trás ou foram o foco principal da grande maioria dos conflitos, revoluções e movimentos que impactaram a político e o mundo (não apenas) corporativo em boa parte dos séculos XIX e XX. Como reflexo da Revolução Industrial, o mundo corporativo registrou um crescimento expressivo durante o século XIX e no início do século XX, em processo duramente interrompido pela Crise de 1929, que estancou a alavancagem econômica de diversos mercados, interrompendo esse momento de ouro durante alguns anos. Antes do fim dos anos 1940, contudo, esse movimento expansionista foi retomado e manteve o poder das corporações, em momento caracterizado por fatores como: - Avanços tecnológicos - Expansão demográfica - Fortalecimento da classe média - Ganho em escala e produção em série - Crescimento do mercado de capitais - Amadurecimento e fortalecimento do mercado de capitais - Proliferação de pequenos e médio negócios (empreendedorismo) - Aumento dos investimentos públicos - Globalização - Internacionalização das corporações - Aumento no número de fusões e aquisições - Estreitamento das relações entre poderes políticos e econômicos Esse fortalecimento dos mercados resultou numa concentração de capital sem precedentes, com as maiores empresas ocupando uma posição de destaque no cenário econômico, políticos e social, muitas delas com movimentações financeiras maiores que o Produto Interno Bruto (PIB) de diversas nações. A preocupação com o domínio de certos mercados, a formação de monopólios e extrema dependência de poucas organizações resultaram em diversos movimentos sociais, críticas e no surgimento de leis e atos tendo como objetivo incentivar, coibir ou regulamentar o fenômeno. Alguns movimentos sociais, de fortes ligações operárias, ficaram conhecidos, como o Movimento Ludista e o Movimento Cartista, em busca de melhores condições para trabalhadores industriais. Diversas outras ações e medidas tiveram como objetivo justamente combater o crescimento exponencial dessas grandes corporações. 4. Dispersão do capital e separação entre propriedade e gestão: conflitos de agência Se a Inglaterra (e a Europa Ocidental) foram os pioneiros da Revolução Industrial e do movimento capitalista, o papel norte-americano ganha importância pelo seu crescimento e predomínio a partir de meados de século XIX, com os EUA assumindo adianteira no cenário econômico, social, militar e político como um todo, uma posição que seria ainda mais exacerbada no início do século XX. Entretanto, a necessidade de manutenção da captação de recursos financeiros fez surgir uma nova figura no cenário corporativo: os acionistas. Se os primeiros séculos de transformação, iniciada ainda na era da grandes navegações, ficaram marcados pala concentração de capital e propriedade nas mãos de poucos empreendedores e industriais, o amadurecimento dos mercados de títulos negociáveis (Bolsas de Valores) resultou na ampliação do número de títulos negociados e na dispersão da propriedade das grandes organizações. Esse fenômeno de dispersão da propriedade das empresas é um dos mais significativos e fundamentais para o entendimento do tema da Governança Corporativa. Ele foi motivado por diversos fatores, entre eles: - O modelo de formatação e organização das empresas em sociedades anônimas - A busca das empresas por financiamento oriundo da subscrição de ações em mercados de títulos organizados - O movimento de abertura do capital de empresas fechadas - O crescimento no número de empresas listadas nas bolsas de valores - O amadurecimento do mercado, o aumento de sua fiscalização e regulamentação - A ampliação no acesso ao mercado de capitais aos investidores, não apenas para empresas, como também para investidores individuais - A diversificação das carteiras de ações dos investidores - O fracionamento na propriedade das grandes empresas - Os processos sucessórios ocasionados pelo falecimento de donos, fundadores e responsáveis pelo surgimento e/ou fortalecimento e expansão de grandes empresas - Os processos de fusão e aquisição entre empresas nos mercados corporativos Esse processo teve grande destaque no mercado norte-americano, principalmente em seu setor de infraestrutura, nos segmentos de construção e indústria de base. A formação desse sistema acionário, ao mesmo tempo que permitiu o crescimento e a expansão do mundo corporativo, com concentração econômica e financeira, também resultou no aumento do número de acionistas dessas corporações e na pulverização do controle e da propriedade dessas empresas. Essa despersonalização da propriedade, contudo, não resultou necessariamente em maior controle para os novos acionistas. Ainda que a propriedade tenha sido dispersa, surgiu a figura do proprietário passivo, marcada por diversos pequenos investidores (ou fundos de investimento) que possuíam quotas ou parcelas da empresa, sem, contudo, ter o controle ou capacidade de influenciar significativamente as mesmas. Essas alterações resultaram em significativas alterações nas formas de administração, gestão e prestação de contas dessas organizações. Uma vez que sua propriedade não mais pertencia somente a um ou a poucos grupos, surgia a necessidade de informar e prestar contas para todos os proprietários das mesmas. Algumas mudanças profundas do período foram o desligamento entre propriedade e administração, a substituição dos proprietários que fundaram a organização por executivos do mercado, a ampliação dos objetivos da entidade que não somente a maximização do lucro e, principalmente, o aumento nos conflitos de interesses entre diversos tipos de acionistas e partes interessadas de uma corporação, os chamados conflitos de agência. Nessa mesma época, cresceram em importância diversos movimentos sociais, alçando os funcionários, por exemplo, à uma posição de negociação mais importante nas discussões acerca de melhores condições de emprego e de remuneração. Outros grupos, como sociedade, comunidade ao redor da organização, governo, entidades, entre outros, passaram a disputar espaço na mesa de negociações como partes interessadas nas grandes corporações, já que os rumos tomados por essas últimas impactariam de forma direta ou indireta os seus caminhos. 5. O vácuo e a oportunidade para a Governança Corporativa Dentro desse cenário de ebulição econômica, fortalecimento dos mercados e ampliação dos conflitos internos das grandes corporações, surge a figura das boas práticas de Governança Corporativa (GC). Inicialmente pelo afastamento entre propriedade e controle, e no surgimento da figura do proprietário passivo, e depois pelo crescimento na importância de diversas partes relacionadas às corporações, os diversos interesse dentro de uma mesma entidade por vezes entram em conflitos, nem sempre passíveis de resolução por parte dos agentes, muitas vezes interessados em maximizar sua própria riqueza e trabalhando em prol do benefício próprio. Entre as razões essenciais por trás do avanço e da proliferação da GC estão: a necessidade de mediar os relacionamentos entre acionistas e organizações; a necessidade de mediar as relações entre as diversas partes interessadas dentro de uma organização; e a definição de estruturas básicas e formas de atuação de organismos como conselhos, órgão administrativos, etc. Esse pontos estão inseridos no contexto interno das corporações. Externamente, mudanças no ambiente macroeconômico, evolução do ambiente de negócios e alterações institucionais e sociais também fazem parte no apelo por ferramentas e estratégias de Governança Corporativo que auxiliem na resolução de conflitos corporativos e em outros desalinhamentos nas organizações. Muito além de um modismo ou algo passageiro, as práticas de Governança Corporativa e sua assimilação tornaram- se um dos movimentos mais importantes dentro do sistema capitalista, do mundo corporativo e das ciências sociais aplicadas que cuidam da administração das empresas, não importando o país, continente, mercado ou nível de amadurecimento dos mesmos. E fazem cada vez mais parte do dicionário de negócios do mundo corporativo. ATENDIMENTO SEMANAL 13/09/2022 PROF DALTON VIESTI DIVÓRCIO ENTRE PROPRIEDADE E GESTÃO O divórcio entre a propriedade e a gestão acarretou mudanças profundas nas companhias: a) a propriedade desligou-se da administração; b) os “capitães de industria”, fundadores – proprietários, foram substituídos por executivos contratados; c) os objetivos corporativos deixaram de se limitar à maximização dos lucros; e d) várias inadequações e conflitos de interesse passaram a ser observados no interior das corporações. Entre acionistas e gestores passaram a ocorrer e a se aprofundar com o correr do tempo conflitos decorrentes da pulverização do capital e do divórcio propriedade-gestão. A teoria já consagrada de governança corporativa denomina-os de conflitos de agência. MERCADO FINANCEIRO MERCADO FINANCEIRO 1. MERCADO CAMBIAL 2. MERCADO MONETÁRIO 3. MERCADO DE CRÉDITO 4. MARCADO DE CAPITAIS Este ultimo se refere ao Mercado de Valores Mobiliários que são para alavancar as S.A.s. Muito dinheiro. Credito para Giro, Fixos e investimentos. De que trata a Lei 6.404/76. GRUPOS DE INTERESSE • STAKEHOLDERS – Acionistas, gestores, clientes, fornecedores, bancos e publico que vivem em parte desta empresa próxima (comércios locais, etc.) • SHAREHOLDERS – Apenas os acionistas • Os maiores conflitos de interesse acontecem destes públicos, mas principalmente entre gestores e acionistas COMPLIANCE • CONFORMIDADE LEGAL • AGIR CONFORME REGRAS O papel do compliance é estabelecer regras, processos e procedimentos para garantir que a lei seja cumprida e orientar a conduta de todos para que persigam os princípios éticos que regem os negócios, sem jamais buscar vantagens pessoais indevidas ou envolver- se em situações de conflito ou risco QUAL A DEFINIÇÃO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA • Governança corporativa é o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas. • As boas práticas de governança corporativa convertem princípios básicos em recomendaçõesobjetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para a qualidade da gestão da organização, sua longevidade e o bem comum. • Governança Corporativa é o sistema de regras, práticas e processos pelo qual uma empresa é dirigida e gerenciada – Investopedia. • Qual a sua? GOVERNANÇA CORPORATIVA AULA 1 PROF DALTON VIESTI O QUE É GOVERNANÇA? • Governo/ Governabilidade – Regras do jogo e o controle sobre todas as ações de uma empresa de acordo com o mercado; • Desde números e índices, até relações interpessoais e ações para decisões estratégicas; • Gestão de relacionamento de pessoas e busca de convergência de interesses; • Complexidade de decisões; GOVERNANÇA CORPORATIVA • Associa-se aos princípios éticos básicos; • Códigos das melhores práticas de governança corporativa do IBGC: transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa; • A 6.404/76 destaca a obrigatoriedade de informar; não a obrigação e sim o desejo de informar deveria ser a intenção. • Que culminou na promulgação, no Brasil em 2013, na Lei nº 12.846, chamada Lei Anticorrupção, que veio para fechar uma lacuna no ordenamento jurídico do país ao tratar diretamente da conduta dos corruptores e responsabilizar e punir as corporações que de alguma forma praticaram atos contra a administração pública; MODELOS DE GESTÃO • Grandes navegações; • Participação de investidores e gestores; • Mediação de interesses; • Conflito de interesses x acesso privilegiado; • Altos e baixos lucros – tomada de decisão; • Convergência, lucros? • Criar valor para stakeholders - equilíbrio Sustentabilidade • Garantir a sobrevivência das fontes, das novas gerações e consequentemente das empresas; • Ganhar hoje e sempre; • Responsabilidade social das organizações; • Proteger o meio em que se vive, pra si e para os próximos; • Garantir ganhos econômicos e de valor para todos: públicos interno e externo. GOVERNANÇA CORPORATIVA AULA 2 PROF DALTON VIESTI CONCEITO DE GOVERNANÇA - IBGC • É o sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas a crescer. • É como os acionistas (sócios), que não fazem parte da gestão, monitoram as empresas. • É converter princípios (Transparência (Disclosure), Equidade (Fairness), Prestação de contas (Accountability) e Responsabilidade Corporativa (Compliance)) em práticas. UMA CONSTRUÇÃO HISTÓRICA • Governança nasceu em 1992 na Inglaterra; • Em 1994 nos EUA; • Em 1999 no Brasil como IBGC com o autêntico desejo de informar e ter as melhores práticas; • Prega que a responsabilidade corporativa é zelar pela sustentabilidade da organização visando a longevidade, incorporando definições de ordem social e ambiental. PRINCÍPIOS E PILARES DA GOVERNANÇA • OCDE, ICGN, IFC, EFPC (Entidades Fechadas de Previdência Complementar) E IBGC: • Transparência; • Equidade; • Prestação de Contas; • Responsabilidade Corporativa; • O objetivos de todos sempre foram as boas práticas, equilibrar forças e, mais do que criar valor, foi evitar destruir valor. MODELOS DE GOVERNANÇA • As práticas da Governança podem superar visões personalíssimas; • Não há um único modelo de governança, mas cada empresa pode ter seu modelo; • Planejamento, objetivos claros, informações corretas e um CEO que dê o tom da Governança. ESTRUTURAS E PRÁTICAS DE GOVERNANÇA • Assembleia Geral; • Conselho de Administração; • CEO/Diretorias • Conselho Fiscal • Esta estrutura contribui para que as decisões colegiadas sejam mais produtivas que as individuais, agreguem valor econômico, reduza riscos de atitudes equivocadas e evita conflito de interesses em empresas familiares, além de preparar a sucessão. MECANISMOS DE GOVERNANÇA CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO CONSELHO FISCAL DIRETORIA EXECUTIVA PROPRIETÁRIOS Auditoria Interna e Externa TRIPÉ E QUADRILÁTERO DO PROCESSO DE GC PROPRIETÁRIOS CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DIRETORIA EXECUTIVA CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DIRETORIA EXECUTIVA PROPRIETÁRIOS STAKEHOLDER/ SHAREHOLDERS TRIPÉ BÁSICO DA GOVERNANÇA OTIMIZAÇÃO DE RETORNO DAS EMPRESAS QUADRILÁTERO HARMONIZAÇÃO DE INTERESSES Introdução Como visto nas últimas aulas, o tema da Governança Corporativa (GC) é amplo e envolve diversas áreas de uma organização, tendo como objetivo atender todas as partes interessadas na mesma, direta ou indiretamente a ela conectadas. Mas para além de entender a importância do tema face aos grandes escândalos empresariais e a evolução do mercado corporativo que tornou-se a força motriz por trás do surgimento dos mecanismos e práticas de GC, é preciso conhecermos os conceitos que definem Governança, bem como seus objetivos e valores. O desenvolvimento do modelo capitalista deu origem ao sistema corporativo que conhecemos atualmente, resultando em dois fenômenos já discutidos: o agigantamento e a concentração de poder e influência das grandes corporações e a pulverização de capital com o amadurecimento dos mercados financeiros. Ainda que à primeira vista aparentem tratar-se de fenômenos antagônicos, a simultaneidade de ambos resultou na separação entre propriedade e gestão nas organizações, no surgimento dos conflitos de interesse (e de agência) internos e externos relacionados às partes interessadas e, eventualmente, culminando na importância e no destaque do aprimoramento e na evolução da Governança Corporativa no mercado moderno. Dentro desse contexto, é essencial entendermos de forma detalhada quais os tipos de partes interessadas interagem nas grandes corporações, seus interesses principais e secundários (além dos ocultos), suas formas de relacionamento e como esse conjunto de fatores impacta o sistema de Governança como um todo. É válido destacar que qualquer processo de tomada de decisão dentro de uma organização de uma forma ou de outra invariavelmente irá obedecer determinada lógica e conjunto de interesses. Conhecer e entender essas abordagens lógicas e conjunto de interesses nos permite identificar o foco que uma organização possui desde sua origem até suas transformações sofridas ao longo do tempo. Mais do que isso: conhecendo a lógica, os interesses e o foco de uma empresa nos leva à determinação de valores que a organização segue (ou deveria seguir). A partir daí os processos de tomada de decisão podem ser entendidos em sua essência, bem como ao sistema de Governança Corporativa é permitido se moldar para atender todos os objetivos, interesses e valores contidos em uma corporação, alcançando o grau máximo de eficiência na aplicação da GC. 1. Partes interessadas (stakeholders) Quando se fala em relacionamentos e conflitos dentro de uma empresa, muitas vezes a discussão é reduzida a conflitos de agência entre acionistas (shareholders) e administradores, ou principal e agente, segunda a clássica Teoria da Agência proposta por Jensen e Meckling (1976). Os conflitos e GOVERNANÇA CORPORATIVA Prof Renan Barabanov interesses contidos numa organização, entretanto, são inúmeros e alcançam uma amplitude muito maior. Entender a diversidade interesses dentro de uma organização é o ponto de partida chave para o desenvolvimento e a implantação de um sistema de Governança Corporativa que atenda toda a gama de personagens em qualquer entidade. Uma divisão mais clássica no grupo de stakeholders envolve partes interessadas internas e externas. Entre os internos e seus interesses estão: - Proprietários: aqui tratando-se dos fundadores, acionistas majoritários ou proprietários que detém, de fato, o controle da entidade (já que acionistas minoritários encaixam-se em outro grupo). Contribuem com recursos e capital para a organização, possuem interesses residuais e imediatos, preocupando-se com o retorno à curto, médio e longo prazo; - Administradores: figura clássica do agente, refere-se à alta administração e gerência,contribui com habilidades e conhecimentos para a organização, visando retorno à curto e médio prazo, em geral; - Empregados: grupo de interesse numeroso e influente, contribui com habilidades e conhecimento para a entidade, preocupando-se com o retorno no curto e médio prazo. Já o grupo dos externos abrange, por exemplo: - Acionistas minoritários: trata-se do acionista externo à organização, incapaz de decidir de forma independente os rumos tomados pela entidade, já que não possui o controle individual. Contribui com recursos e capital e possui interesse no retorno à curto, médio e longo prazo; - Clientes: contribui com a receita proveniente da venda de bens e serviços e com a lealdade da marca, tendo interesse no curto prazo; - Fornecedores: contribui com o fornecimento de bens e serviços utilizados na produção da organização, sendo que seu interesse em relação a ela refere-se ao curto e médio prazo, envolvendo a capacidade da entidade em quitar os valores acordados; - Credores: contribui com recursos e capital, sendo por alguns considerados uma espécie de acionista, já que provém capital para a entidade e depende da continuidade da mesma para reaver o investimento (e o juro pelo qual é remunerada). Seu interesse, contudo, em geral é centrado no curto e médio prazo, envolvendo a capacidade da entidade em quitar os valores acordados; - Sociedade: contribui com recursos, financeiros ou não, e possui ligação direta (ainda que por vezes pouco valorizada) com a organização. Em geral, seus interesses envolvem o médio e longo prazo da entidade; - Governo: além de intermediário da parte interessada sociedade, contribui com serviços ou produtos específicos. Dessa forma, também possui interesse nos retornos de curto, médio e longo prazo de uma organização. A distinção relacionada aos interesses de cada um dos grupos (curto, médio e longo prazo), não é uma característica imutável. Certamente um empregado com contrato longevo e de posse de ações da companhia, por exemplo, pode também se preocupar com o retorno no longo prazo. O mesmo vale para um administrador que se preocupa com a sua reputação no mercado. A divisão acima trata-se de uma generalização clássica da teoria e da prática no mundo corporativo. Essa distinção também não é definitiva. Outros grupos importantes de partes interessadas também podem estar envolvidos em uma organização, de forma direta ou indireta, tais como: sindicatos, associações profissionais, ONGs, comunidade acadêmica (universidades, escolas, etc), concorrentes e competidores, entre outros. Somente por essa síntese de classificação é possível ter uma ideia dos interesses, influências e poder envolvidos em uma organização. E é justamente na dificuldade em considerar toda essa gama de interesses que está o grande desafio da Governança Corporativa. Cada um desses grupos de interessados mantém relações entre si e com outras partes e tem interesses legit́imos em jogo nas corporações. Classificar e organizar esses grupos de interesse torna-se um desafio complexo pelo risco envolvido em excluir de tal categorização partes legítimas e interessadas na prestação de contas e na definição dos usuários atendidos pelo sistema de Governança Corporativa. Alguns autores optam por classificar de forma ordinal de acordo com os riscos assumidos (Clarkson, 1994), identificação e saliência (Mitchell, Agle e Wood, 1997) ou grau de dependência da organização (Altkinson e Waterhouse, 1997), enquanto outros autores optam por uma orientação normativa, definindo um grupo de interesse como alvo primordial. Em suma, são duas linhas principais acerca de quais interesses de uma organização devem ser atendidos pelo seu sistema de gerenciamento e administração: a primeira, amparada na Teoria da Agência, propõe como objeto central a maximização do retorno dos acionistas, de forma que os recursos e as estratégias, bem como o núcleo na tomada de decisão, sejam utilizados com essa finalidade principal. Trata-se de um visão orientada aos acionistas (shareholders oriented). Por outro lado, uma segunda linha, embasada pela Teoria dos Stakeholders, visa a organização da entidade de forma a atender múltiplos interesses a ela relacionados, valendo-se de critérios de classificação e ordenamento para os processos de tomada de decisões estratégicas e corporativas. É uma visão orientada aos interesses das partes interessadas (stakeholders oriented). Essas duas visões contam com as seguintes características: - Abordagem dos shareholders (acionistas): - Abordagem dos stakeholders (partes interessadas): O desenvolvimento de uma ou outra abordagem também varia de acordo com o país e o grau de maturidade dos mercados de capitais nele inseridos. Dessa maneira, os modelos de desenvolvidos nos Estados Unidos e no Reino Unido caracterizam-se, primordialmente por uma visão orientada aos acionistas, enfatizando, assim, a protecã̧o aos acionistas contra o oportunismo dos gestores e de outras partes interessadas cooptadas pela gestão . Já em outros países com menor dispersão do capital das corporações, como no caso de Alemanha, Japão e Brasil, prevalece a segunda abordagem, já que, em geral, em tais mercados a principal fonte de capital (e, portanto, de financiamento) não se trata do mercado de capitais, mas de credores, como bancos, instituições financeiras, entre outros. Ainda que grande parte da produção teórica tenha sido direcionada para a primeira, também graças ao movimento expansionista e dominante da economia norte-americana, o risco de excluir as demais partes interessadas dos processos decisórios não parece ser o caminho tomado pela Governança Corporativa nos últimos anos. Ambas compõe boa parte das definições, dos valores e dos objetivos do tema Governança Corporativa e, possuindo suas vantagens e desvantagens, se combinam para formar um corpo mais sólido para estruturas e sistemas de GC maduros no mercados modernos. 2. Conceitos de Governança Corporativa Sistema, estrutura, modelo de gestão e administração. Conceituar Governança Corporativa (GC) ainda trata-se de um desafio complexo e de difícil consenso. Por isso, trazer algumas definições de autores com relação à concepção do tema pode ser de grande ajuda no entendimento a nas futuras discussões: - “A governanca̧ corporativa é o sistema e a estrutura de poder que regem os mecanismos através dos quais as companhias são dirigidas e controladas.” (Cadbury, 1992) - “A governanca̧ corporativa trata de justica̧ , da transparência e da responsabilidade das empresas no trato de questões que e nvolvem os interesses do negócio e os da sociedade como um todo .” (Williamson, 1996) - “A governanca̧ corporativa diz respeito a padrões de comportamento que conduze m à eficiência , ao crescimento e ao tratamento dado aos acionistas e a outras partes interessadas, tendo por base princípios definidos pela ética aplicada à gestão de negócios.” (Claessens e Fan, 1996) - “A governanca̧ corporativa é o campo da administracã̧o que trata do conjunto de relacõ̧es entre a direção das empresas , seus conselhos de administracã̧o , seus acionistas e outras partes interessadas. Ela estabelece os caminhos pelos quais os supridores de capital das corporaç ões são assegurados do retorno de seus investimentos.” (Shleifer e Vishny, 1997) - “A governança é o sistema de controle e monitoramento estabelecidos pelos acionistas controladores de uma determinada empresa ou corporacã̧o , de tal modo que os administradores tomem suas decisões sobre a alocacã̧o dos recursos de acordo com o interesse dos proprietá rios.” (Siffert Filho, 1998) - “A governanca̧ corporativa trata dos meios utilizados pelas corporacõ̧es para estabelecer processos que ajustem os interesses em conflito entre os acionistas das empresas e seus dirigentes de alto nível.” (Blair, 1999) - “A governança corporativa éo sistema segundo o qual as corporações de negócio são dirigidas e controladas. A estrutura da governanca̧ corporativa especifica a distribuicã̧o dos direitos e responsabilidades entre os diferentes participantes da corporacã̧ o, tais como o conselho de administração, os diretores executivos, os acionistas e outros interessados, além de definir as regras e procedimentos para a tomada de decisão em relacã̧o a questões corporativas . E oferece também bases atravé s das quais os objetivos da empresa são estabelecidos , definindo os meios para se alcançarem tais objetivos e os instrumentos para se acompanhar o desempenho.” (OCDE, 1999) - “A governanca̧ corporativa é expressa por um sistema de valores que rege as organizacõ̧es, em sua rede de relacõ̧es internas e externas . Ela, então, reflete os padrões da companhia , os quais, por sua vez, refletem os padrões de comportamento da sociedade.” (Cadbury, 1999) - “A governança corporativa é um novo nome para o sistema de relacionamento entre acionistas, auditores independentes e executivos da empresa, liderado pelo Conselho de Administração.” (Lodi, 2000) - “A governança corporativa é um colapso nos mecanismos decisórios normais, em virtude do qual um indivíduo ou grupo experimenta dificuldades na escolha de uma alternativa de ação. Portanto, existe um conflito quando um indivíduo ou grupo se defronta com um problema de decisão.” (Lameira, 2001) - “Como a governanca̧ corporativa nasceu do divórcio entre a propriedade e a gestão das empresas, seu foco é a definicã̧o de uma estrutura de governo que maximize a relacã̧o entre o retorno dos acionistas e os benefícios auferidos pe los executivos . Neste sentido , envolve a estratégia das corporações, as operacõ̧es , a geração de valor e a destinação de resultados .” (Hitt, Ireland e Hoskisson, 2001) - “Governança corporativa é um campo de investiga ção focado em como monitorar as corporações , através de mec anismos normativos, definidos em estatutos legais, termos contratuais e estruturas organizacionais que conduzem ao gerenciamento eficaz das organizacõ̧es , traduzidos por uma taxa competitiva de retorno.” (Mathiese, 2002) - “Governança corporativa é o conjunto de práticas que têm por finalidade otimizar o desempenho de uma companhia ao proteger todas as partes interessadas, tais como investidores, empregados e credores, facilitando o acesso ao capital. A análise das práticas de governança corporativa aplicada ao mercado de capitais envolve, principalmente: transparência, equidade de tratamento dos acionistas e prestação de contas.” (CVM, 2002) - “Governança corporativa é o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitorad as, envolvendo os relacionamentos entre acionistas/cotistas, conselho de administração, diretoria, auditoria independente e conselho fiscal . As boas prat́icas de governanca̧ corporativa têm a finalidade de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para sua perenidade.” (IBGC, 2003) - “O campo em que gravita a governanca̧ corporativa é definido por uma dada estrutura de poder , que envolve questões relacionadas aos processos de tomada de decisões estratégicas , ao exercićio da lideranca̧ , aos métodos com que se atendem aos interesses estabelecidos e aos pleitos emergentes - em sińtese, ele está relacionado à sociologia das elites e por isso mesmo é fortemente influenciado pelos institutos legais e pelos marcos regulatórios de cada paiś.” (Babic, 2003) - “A governanca̧ corporativa trata do con junto de leis e regulamentos que visam: a) assegurar os direitos dos acionistas das empresas, controladores ou minoritários; b) disponibilizar informacõ̧es que permitam aos acionistas acompanhar decisões empresariais impactantes , avaliando o quanto elas interferem em seus direitos; c) possibilitar aos diferentes públicos alcanca̧dos pe los atos das empresas o emprego de instrumentos que assegurem a observância de seus direitos; d) promover a interação dos acio nistas, dos conselhos de administracã̧o e da direcã̧o executiva das empresas .” (Monks e Minow, 2004) - “Governança é o conjunto de mecanismos (internos ou externos, de incentivo ou controle) que visa fazer com que as decisões sejam tomadas de forma a maximizar o valor de longo prazo do negócio e o retorno de todos os acionistas.” (Di MIcieli, 2010) 3. Os 8 Ps da Governança Essa diversidade de conceitos apresentados demonstra que o tema da Governança Corporativa (GC) ainda está longe de alcançar um patamar definitivo. Esse, aliás, talvez nunca tenha disso o objetivo. Governança no mundo corporativo diz respeito justamente ao atendimento de diversos interesses e suas formas de relacionamento. Mais importante até que a conceituação do tema são os mecanismos e forma de aplicações na prática do ambiente corporativo. Uma dessas propostas vem de Rosseti (2001), por meio dos 8 Ps da Governança Corporativa. Trata- se de uma síntese conceitual de algumas dimensões do tema e uma metodologia para aplicação da Governança, sendo agrupadas em: Propriedade, Princípios, Propósitos, Papéis, Poder, Práticas, Pessoas e Perpetuidade. E, como veremos nas próximas aulas, boa parte da produção em Governança gira em torno de princípios e pilares norteadores, enquanto modelos prontos, até pelas particularidades de cada organização, nem sempre são de fácil aplicação pelas entidades. Introdução Quando tratamos do tema da Governança Corporativa (GC), uma das maiores dificuldades encontra-se justamente na adoção de modelos ou formatos padronizados. Corporações são organizações únicas, com suas características e peculiaridades que tornam complexo o processo de padronizar qualquer ferramenta ou sistema que venham a ser utilizados. Da mesma forma, a dificuldade se mantém quando consideramos os mercados. Países e regiões possuem costumes, tradições e culturas diversas, que impactam o ambiente corporativo e o dia a dia das entidades, de forma que as práticas de governança precisam levar em consideração tais aspectos. Em virtude dessas particularidades, um dos tópicos mais importantes quando se discute a Governança Corporativa (GC) passa pela questão dos princípios estruturais. O motivo é claro: se é complexo definir modelos restritos e específicos, bem como ferramentas e práticas a serem adotadas de forma exata por entidades diversas em mercados diferentes, a tarefa é atenuada se passarmos a buscar pilares. A função desses princípios é justamente servir de bases conceituais, atuando como norteadores na formação de estruturas e práticas da Governança empresarial, permitindo que cada organização e/ou mercado defina suas práticas e ferramentas embasadas por um sistema central, uma ordem conceitual, um pilar ou núcleo. 1. Organizações e Associações: uma busca por princípios Pautadas pelo pioneirismo da Comissão Cadbury, que produziu o Relatório Cadbury, de forte impacto no Reino Unido, e influenciou, posteriormente, a divulgação dos princípios da OCDE, diversas organizações internacionais publicaram pilares e estruturas tendo como objetivo promover práticas de boa governança em setores, mercados, países ou regiões. Entre esses organismos, destacam-se três entidades de forte alcance na economia mundial e impacto na formação e estruturação de sistemas de Governança Corporativa (GC) ao redor do globo: a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), a International Corporate Governance Network (ICGN) e a International Finance Corporation (IFC), do Banco Mundial. No Brasil, esse papel de órgão direcionador e formador de princípios e práticas é ocupado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). 2. Os princípios da OCDE A OCDE trata-se de uma organização intergovernamental econômica composta de 35 países com sede na França, enquanto aICGN consiste em um grupo liderado por investidores, estabelecido em 1995, com o objetivo de promover padrões de Governança Corporativa (GC) mais efetivos nas empresas. A OCDE, em parceria com o Grupo dos 20 (G20), editou em 2015 a segunda revisão dos seus Princípios de Governo das Sociedades do G20 e da OCDE, publicado pela primeira vez em 1999. Neste, a organização estabelece seis princípios para auxiliar os tomadores de decisão políticos a avaliarem o enquadramento jurídico, regulamentar e DISCIPLINA Governança Corporativa PROFESSOR Renan Barabanov de Assis institucional para o governo das sociedades, oferecendo orientações para as bolsas de valores, investidores, sociedades e outros atores com um papel no processo de desenvolvimento de um governo das sociedades. Fugindo do objetivo de normatizar, os princípios têm como função referenciar as práticas e os modelos estruturais de governança adotados pelas entidades e governos ao redor do mundo. São eles: - Assegurar a base para um enquadramento efetivo do governo das sociedades: promovendo mercados transparentes e justos, e a alocação eficiente de recursos. Deve ser consistente com o estado de direito e apoiar a supervisão e aplicação eficazes; - Os direitos e o tratamento paritário dos acionistas e as funções principais de propriedade: protegendo e facilitando o exercício dos direitos dos acionistas e garantindo o tratamento paritário dos mesmos, incluindo os minoritários e estrangeiros. Todos os acionistas devem ter a oportunidade de obter compensações efetivas em caso de violação dos seus direitos; - Investidores institucionais, mercados de ações e outros intermediários: proporcionando incentivos sólidos através de toda a cadeia de investimento e possibilitando aos mercados acionistas funcionar de modo a contribuir para o bom governo das sociedades; - O papel dos stakeholders no governo das sociedades: reconhecendo os direitos destes estabelecidos por lei ou por meio de acordos mútuos, e estimulando a cooperação ativa entre as sociedades e os seus stakeholders na criação de riqueza, empregos e na sustentabilidade de sociedades financeiramente sólidas; - Divulgação de informação e transparência: assegurando a divulgação de informação atempada e rigorosa de todas as questões relevantes relacionadas com a sociedade, incluindo a situação financeira, desempenho, estrutura acionista e governo da sociedade; - As funções do conselho: garantindo a orientação estratégica da sociedade, o controle eficaz da equipe de gestão pelo conselho e a responsabilização deste perante a sociedade e os seus acionistas. Além disso, em 2015 a organizou publicou a primeira edição do Corporate Governance of Company Groups in Latin America (Governança Corporativa para Grupos de Companhias na América Latina), contendo diretrizes específicas para empresas e entidades de capital aberto da região. 3. Os princípios da ICGN Já a ICGN (Rede Internacional de Governança Corporativa) publica anualmente por meio de seus diversos comitês de políticas uma série de roteiros, códigos e referências para as práticas, servindo de guia para a questão da governança, tanto para investidores quanto para empresas e organizações. Em tais publicações são estabelecidos práticas anticorrupção, de remuneração de executivos e diretores não executivos, de diversidade na composição do conselho de administração, de relatório de negócios integrados, de gerenciamento de riscos, de lobby político e doações, entre outros, incluindo seus princípios de governança globais. Em sua última edição dos Princípios Globais de Administração, publicada pela primeira vez em 2004 e editada em 2014, a entidade lista seus sete princípios fundamentais: - Governança interna: fundações para uma administração efetiva; - Desenvolvendo e implementando políticas administrativas; - Monitoramento da análise de companhias para investimento; - Engajamento na colaboração entre companhias e investidores; - Exercício de direitos de voto; - Promoção da criação de valor a longo prazo, os fatores de integração ambiental, social e de governança (ESG); - Fortalecimento da transparência, divulgação e relatório. 4. Os princípios da IFC Braço do Banco Mundial para tratar de questões corporativas e financeiras, a Corporação Financeira Internacional (IFC), com base nos princípios da OCDE, divulgou em 2011 sua proposta de uma Estrutura de Desenvolvimento de Governança Corporativa, tendo como objetivo integrar Governança Corporativa (CG) nas operações de investimento. Por meio de acordo, os signatários se comprometem a: - Integrar a Governança Corporativa (CG) em suas operações de investimento; - Adotar procedimentos e ferramentas de CG de acordo com a metodologia; - Quando considerado apropriado, realizar avaliações de CG de empresas investidas e desenvolver planos de ação de CG; - Monitorar o andamento da implementação dos planos de ação da CG; - Assegurar responsabilidade interna; - Identificar e atribuir uma função interna que seja responsável pela implementação da estrutura (framework); - Fornecer ou adquirir formação; - Assegurar o reforço das capacidades e a transferência de conhecimentos ao pessoal para o desenvolvimento da estrutura (framework); - Colaborar com outros signatários: compartilhar experiência e recursos em treinamento e implementação; contribuir para o desenvolvimento de estudos de caso e relatórios de progresso sobre o acima exposto; - Apresentar um relatório sobre a implementação; - Informar anualmente os outros signatários sobre a implementação interna da estrutura (framework). 5. Os princípios do IBGC Fundado em 1995, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) é uma organização nacional sem fins lucrativos que tem como objetivo ser a referência no país relacionada ao tema da Governança Corporativa (GC). Ela publica e atualiza o “Código das melhores práticas de governança corporativa”, cuja última edição é datada de 2015. Entre os princípios básicos que permeiam, em maior ou menor grau, as práticas do Código estão: - Transparência; - Equidade; - Prestação de Contas (accountability); e - Responsabilidade Corporativa A organização destaca que a correta utilização de tais princípios, assim como a adoção de práticas neles embasadas, resulta em um clima de confiança tanto internamente quanto nas relações com terceiros. 6. A importância dos princípios para a Governança Corporativa Quando alguns princípios são trazidos à tona e divulgados, levantam-se questões relacionadas principalmente às características abstratas e pouca praticidade dos mesmos. Contra isso, é importante entender que os princípios tratam-se de valores universais, que devem ser adotados por empresas, partes interessadas e qualquer participante de um mercado, em busca de uma competição justa. Algumas corporações, antes mesmo de definir seu código de boas práticas de Governança Corporativa (GC), formalizam seus princípios e pilares, ou seja, um código de conduta consolidado, até mesmo um legado ético de seus fundadores. Entre os valores universais que qualquer lista de princípios toma por base estão: - Senso de justiça e equidade (fairness): tratamento justo e com garantia de imparcialidade com relação aos direitos, deveres e expectativas dos sócios (majoritários e minoritários), administradores e demais partes interessadas (stakeholders); - Transparência (disclosure): apresentação e disseminação abrangente das informações à todas as partes interessadas, não restringindo-se somente aquelas impostas por normas e regulamentações, como também envolvendo desempenho, projeções, fatores gerenciais e qualquer informação capaz de auxiliar os stakeholders em seu processo de tomada de decisão; - Prestação de contas (accountability): agentes (administradores), atores da governança e qualquer parte encarregada da tomada de decisão na organização(incluindo majoritários e conselhos), devem prestar contas de suas ações de forma clara, completa, concisa, compreensível e de maneira tempestiva, assumindo consequências e responsabilidade por seus atos; - Cumprimento das normas (compliance): conjunto de ações e movimentos que objetivam fazer o cumprimento das normas e marcos regulatórios, a conformidade com instituições legais estabelecidas e relacionadas à corporação, às suas partes interessadas ou aos mercados nos quais atua. Esses princípios, tomados em conjunto, compõem uma efetiva aplicação da Responsabilidade Corporativa, fazendo com que os agentes da Governança Corporativa (GC) devam zelar pela viabilidade econômico-financeira das organizações, gerando valor para a entidade em relação aos seus diversos capitais (financeiro, manufaturado, intelectual, humano, social, ambiental, reputacional) no curto, médio e longo prazos. 7. Conclusão Norteadores conceituais e práticos dos sistemas de Governança Corporativa (GC), os princípios e práticas que guiam o tema são a base que mantém o equilíbrio entre os diversos grupos de interesse em uma organização. Dentro do alinhamento conceitual de uma corporação moderna, a GC depende do triângulo básico entre proprietários, conselho e diretoria, sendo os princípios a fonte de segurança dos proprietários na mediação com a sua relação com conselheiros e executivos. Se expandirmos essa visão conceitual para o quadrilátero que engloba as demais partes interessadas (stakeholders), os princípios têm papel de alinhar os propósitos empresariais que permitem conciliar os interesses dos usuários. É importante destacar que os princípios e pilares de um sistema adequado de Governança Corporativa (GC) necessariamente têm de preceder as práticas e mecanismos. Eles são a base de sustentação que não apenas dão origem e guiam a formação das melhores práticas, como também compõe a visão, a missão da organização. Se bem delineados e estruturados, permitem que a entidade finque raízes em procedimentos, práticas, ações e tomadas de decisões éticas. Embasar seus princípios em uma essência ética é, em última análise, fincar as estruturas de uma organização em três objetivos básicos e relevantes para qualquer corporação do ambiente de negócios: - Criação de valor; - Conciliação de interesses; e - Promoção do crescimento econômico. Vale lembrar que, ainda que a adoção desses princípios seja voluntária, ela não se restringe às exigências legais. Pensar as estruturas organizacionais de maneira a respeitar esses pilares e princípios básicos é, também, ir ao encontro do que buscam o mercado, as partes interessadas e os diversos usuários da entidade, ampliando as chances de sobrevivência e a eficiência administrativa. 1. Introdução Entender o tema da Governança Corporativa (GC), como já vimos nas aulas anteriores, requer a identificação dos usuários e partes interessadas, suas relações e as dinâmicas de funcionamento de uma entidade. Esses fatores em conjunto compõe o chamado grupo de valores, uma herança cultural de determinada empresa ou mercado que precisa necessariamente ser levada em consideração no momento em que se definem princípios e posteriormente estruturas e mecanismos de GC que possam ser, de fato, aproveitadas pelas organizações. Depois de entendermos todo esse ambiente e formularmos os princípios que nortearão a definição do sistema de Governança Corporativa (GC) é hora de decidir qual modelo ou estrutura conceitual será utilizada para a criação e adoção das práticas de GC. Essa decisão, na verdade, é muito pouco perceptível. Trata-se, de fato, de uma consequência da própria forma de atuação e das características culturais, sociais, econômicas e históricas de determinado mercado, país, região, segmento e/ou organização. Se considerarmos que os mecanismos e ferramentas de Governança Corporativa (GC) aplicados às organizações variam de acordo com o contexto onde os atores estão inseridos, bem como a formatação dos negócios escolhidos e as regulamentações legais à disposição ou impositivas, é imprescindível considerar os cenários corporativos, econômicos, ambientais, sociais e regulatórios como base para a eficiência e correta aplicação das práticas de governança. Neste ponto, é importante lembrarmos da aula onde tratamos das visões que as corporações tomam por base para nortear suas gestões e, consequentemente, embasar seus sistemas de Governança Corporativa (GC). Qualquer classificação ou divisão obrigatoriamente aproximará o formato adotado ou da visão orientada aos acionistas (shareholder oriented) ou da visão orientada às demais partes interessadas (stakeholder oriented). É possível, também, que determinados modelos agrupem ou utilizem parcialmente as duas visões. Por isso, entender essas orientações é essencial para entender o tipo de GC adotada. Em suma, o modelo de Governança Corporativa (GC) a ser adotado não é uma escolha, e sim uma consequência da forma de atuação e das características do mercado. Também não se trata de uma classificação definitiva e rígida. Ela varia de autor para autor, organização para organização e até mesmo de estudo para estudo. Sua importância deriva do fato de podermos, com base nessa definição, situar os modelos e características existentes, entender como mecanismos e práticas de GC surgem e se agrupam e realizar estudos e comparações que permitam evoluir o tema da GC no ambiente corporativo e institucional. 2. Insider e Outsider: dois grande modelos DISCIPLINA Governança Corporativa PROFESSOR Renan Barabanov de Assis A primeira forma de classificar os modelos e sistemas de Governança Corporativa (GC) toma por base um agrupamento mais amplo e, de certa forma, genérico. O IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) divide os modelos de governança adotados internacionalmente em dois grandes grupos, categorizando-os de acordo com suas principais características como Outsider System ou Insider System. O primeiro formato tem sido adotado principalmente nos países anglo-saxônicos, com modelo de propriedade composto por acionistas dispersos, distantes do dia a dia das empresas, em uma versão fortemente orientada para o interesse dos acionistas (shareholder oriented), com o sistema de governança exercendo um papel essencial no mercado de ações e no financiamento das organizações, além da maior influência dos investidores institucionais. A categoria Insider System, por sua vez, prevalece nas demais nações europeias e no Japão, caracterizando-se por ser um formato onde os maiores acionistas direta ou indiretamente atuam, de fato, no comando diário das empresas, seguindo um modelo de propriedade concentrado, sendo o controle familiar e a presença do Estado como acionistas as peculiaridades mais presentes e o sistema de governança exercendo um papel importante na possibilidade de crescimento e financiamento das empresas. Ao invés da visão voltada para o acionista, direciona-se para as demais partes interessadas (stakeholder oriented), como clientes, fornecedores, colaboradores, governo, comunidade, entre outros. Os investidores institucionais são menos ativos e de menor porte. Em resumo, os dois modelos podem ser traduzidos da seguinte forma: O modelo Outsider System é amparado em mercados de acionistas pulverizados e tradicionalmente à parte do comando diário operacional da empresa, prevalecendo nos Estados Unidos, no Reino Unido e nos países anglo-saxões. Seus pontos principais são: - Estrutura de capital (propriedade) dispersa nas companhias de grande porte; - Mercado de ações ocupando papel de destaque na economia; - Presença de investidores institucionais de grande porte com forte ativismo; - Foco direcionado para a maximização do retorno aos acionistas (shareholder oriented). Já o modelo Insider System se apoia em mercados tradicionalmente ocupados por grandes acionistasno comando operacional diário das operações corporativas (ou com pessoas por eles indicadas), tendo maior preponderância na Europa continental e no Japão. Entre suas características principais estão: - Estrutura de capital (propriedade) das companhias mais concentrada; - Forte presença e atuação de grandes conglomerados industriais e financeiros; - Menos porte dos investidores institucionais e pouco ativismo; - Maior reconhecimento e prestação de contas as demais partes interessadas (stakeholder oriented). Essa divisão dual recebe fortes críticas principalmente graças ao formato restritivo e reducionista, impedindo que modelos com características semelhantes sejam agrupados ou fazendo com que sistemas com características divergentes sejam incluídos no mesmo conjunto. 3. Expandindo os sistemas de governança: os cinco modelos globais Uma rotulagem um pouco mais abrangente e especializada é dada por outro grupo de autores. Por meio desta, os sistema de Governança Corporativa (GC) são agrupados e distintos em cinco modelos clássicos de governança: além do anglo-saxão, coexistem também os modelos alemão, japonês, latino-europeu (citando, como exemplo, os formatos adotados na Itália, França, Portugal e Espanha) e latino-americano (adotado na Argentina, Chile, Colômbia, México e Peru, além do Brasil). Nessa proposta de ordenamento, enquanto o modelo anglo-saxão corresponde basicamente ao Outsider System, controlado por acionistas, com separação de propriedade e gestão, os demais adotam o formato Insider System. O modelo alemão conta com forte presença das instituições bancárias e gestão compartilhada entre empresa e acionistas, enquanto ao formato japonês acrescenta-se a presença de um único e numeroso conselho administrativo e uma tendência de maior abertura ao mercado de capitais. Já entre os modelos latinos, o europeu conta com propriedade concentrada e organizações controladas por grupos familiares e empresas estatais, com pouca atuação das forças externas e consequente enfraquecimento da proteção aos acionistas minoritários; o americano, por sua vez, ainda se encontra em fase de desenvolvimento, com grande semelhança com o europeu, tanto pelas características quanto pelos desafios enfrentados, mas se diferencia em virtude da presença de fatores como privatização, limitação do mercado de capitais e a atuação de fundos de pensão como investidores institucionais de elevada importância. Em suma, os cinco modelos podem ser definidos e caracterizados da seguinte forma, de acordo com Andrade e Rossetti (2014): - Modelo anglo-saxão: possui financiamento predominantemente por meio de capital próprio; o controle da propriedade é disperso; propriedade e gestão são separadas; os conflitos de agência se dão primordialmente entre acionistas e executivos; existe uma forte proteção legal aos minoritários; os Boards (Conselhos de Administração) são atuantes, com foco em direitos; há uma liquidez muito alta na participação societária; as forças de controle externas predominam; os mecanismos de Governança Corporativa (GC) são bem estabelecidos; e existe uma baixa abrangência dos modelos de governança. - Modelo alemão: possui financiamento predominantemente por meio de capital terceiros; o controle da propriedade é concentrado; propriedade e gestão são sobrepostas; os conflitos de agência se dão primordialmente entre credores e acionistas; há baixa ênfase na proteção legal aos minoritários; os Boards (Conselhos de Administração) são atuantes, com foco operacional; há uma liquidez baixa na participação societária; as forças de controle internas predominam; os mecanismos de Governança Corporativa (GC) possuem adesão crescente; e existe uma alta abrangência dos modelos de governança. - Modelo japonês: possui financiamento predominantemente por meio de capital terceiros; o controle da propriedade é concentrado com cruzamentos de dispersão; propriedade e gestão são sobrepostas; os conflitos de agência se dão primordialmente entre credores e acionistas; há baixa ênfase na proteção legal aos minoritários; os Boards (Conselhos de Administração) são atuantes, com foco estratégico; a liquidez baixa na participação societária está em evolução; as forças de controle internas predominam; há baixa ênfase nos mecanismos de Governança Corporativa (GC); e existe uma alta abrangência dos modelos de governança. - Modelo latino-europeu: possui financiamento indefinido, mesclando capital próprio e de terceiros; o controle da propriedade é concentrado; propriedade e gestão são sobrepostas; os conflitos de agência se dão primordialmente entre acionistas majoritários e minoritários; a proteção legal aos minoritários é fraca; os Boards (Conselhos de Administração) enfrentam pressões para maior atuação e eficácia; há uma liquidez baixa na participação societária; as forças de controle internas predominam, ainda que estejam em processo de migração para a predominância das forças externas; há uma ênfase cada vez mais em alta em relação aos mecanismos de Governança Corporativa (GC); e existe uma abrangência mediana dos modelos de governança. - Modelo latino-americano: possui financiamento predominantemente por meio de capital terceiros; o controle da propriedade é familiar e concentrado; propriedade e gestão são sobrepostas; os conflitos de agência se dão primordialmente entre acionistas majoritários e minoritários; a proteção legal aos minoritários é fraca; os Boards (Conselhos de Administração) possuem vínculos com a gestão; há uma liquidez especulativa e oscilante na participação societária; as forças de controle internas predominam; os mecanismos de Governança Corporativa (GC) ainda estão em fase embrionárias; e existe uma abrangência transitória dos modelos de governança. 4. Modelo brasileiro de governança Com base nessas categorizações é perceptível a aproximação do modelo de governança adotado no Brasil aos sistemas de Insider System, com base na classificação do IBGC, e “Latino-Americano”, com base na classificação mais ampla. O predomínio é de concentração proprietária, empresas familiares e controladas pelo Estado, com papel destacado do mercado de dívida e orientado às partes interessadas (stakeholder oriented), sendo que o crescimento do mercado de capitais e o fortalecimento dos investidores institucionais como fonte de financiamento levam à uma aproximação dos modelos Anglo- Saxônico e Outsider System (IBGC). 5. Conclusão Cabe destacar que não existe um modelo único e universal de Governança Corporativa (GC). As diferenças resultam da diversidade social, cultural e institucional dos países. Estabelecem-se vários fatores de diferenciação de GC decorrentes de tais distinções. Uns definem-se no ambiente externo às organizações; outros desenvolvem-se internamente, conforme vimos em aulas anteriores. Entre os mecanismos diferenciais externos estão: sistema e mecanismos de proteção legal aos acionistas e outras categorias de regulação; fontes predominantes de financiamento das empresas; e o estágio em que se encontram, no país, as práticas de boa governança. Já entre os internos, os principais são: a separação entre a propriedade e a administração; o formato dos conflitos de agência encontrados na entidade; e as dimensões usuais, a composição e as formas de atuação do Conselho (Board). Ainda que possa parecer difícil incluir à primeira vista um determinado sistema de Governança Corporativa (GC) em um dos dois grandes grupos, essa classificação permite identificar características que permitam aproximá-lo de um ou outro formato, facilitando o entendimento das forças e mecanismos que atuam no ambiente corporativo específico daquele mercado e/ou organização. Governança: uma construção histórica Nas últimas aulas passamos por tópicos importantes para entender e alcançar o tema da Governança Corporativa (GC): desdeos escândalos que abalaram os mercados financeiros, até os conceitos que norteiam a formação da GC, passando pela evolução das corporações e as visões que norteiam sua forma de atuação. Contudo, entender a questão da Governança Corporativa (GC) vai além de simplesmente entender seus mecanismos de funcionamento e boas práticas disponíveis às organizações. É preciso, também, buscar uma compreensão de como atuam as forças dentro das empresas. Ou seja, não basta somente identificarmos quais os interessados nos rumos e políticas dentro de uma entidade. É preciso entender como eles atuam, de que forma esses grupos se organizam e, principalmente, quais os mecanismos de pressão geram resultado ou não na dinâmica corporativa. Se já tratamos em aulas anteriores das partes interessadas, conhecer sua forma de atuação nos permite alcançar a maneira que interagem nas empresas com outros grupos. Não somente como contribuem para formar o capital da organização, e sim como requisitam sua participação na riqueza por ela produzida, bem como se suas vozes são ouvidas e necessidades atendidas. Esse jogo de poder e influências entre os usuários e grupos de interesse em uma entidade termina por manter a organização em um caminho central, alinhado às boas práticas. Pode ser traduzido como uma força de controle, capaz de manter a empresa harmonizada, atendendo os interesses e direitos de grande parte dos grupos e dividem-se entre forças internas e externas. Conflitos internos e harmonização de interesses Como visto anteriormente, em se tratando de organizações corporativas do mundo moderno, três questões são fundamentais na dinâmica de uma entidade: os conflitos e custos de agência (na relação administradores/acionistas), a assimetria informacional e de direitos (nas relações administradores/acionistas/demais partes interessadas) e a harmonização de interesses (nas relações acionistas/demais partes interessadas). Os conflitos e custos de agência decorrem, principalmente, do movimento de aprofundamento na dispersão do capital das entidades e da separação entre propriedade e gestão nas organizações. Os encarregados da gestão da empresa (agentes), incumbidos de tal tarefa pelos proprietários (principal), precisam de mecanismos de supervisão e punição/incentivo para que hajam garantias de sua atuação em busca do melhor interesse GOVERNANÇA CORPORATIVA Prof Renan Barabanov para os proprietários. O equilíbrio entre os interesses próprios dos administradores e dos acionistas geram os conflitos de agência. Já os mecanismos geram os chamados custos de agência, arcados pela entidade e, em última análise, pelos próprios acionistas. Já a assimetria informacional e de direitos surgem a partir do momento no qual um dos grupos possui maior acesso às informações e dados e, por consequência, maior capacidade e vantagem de influenciar os rumos e a tomada de decisões de uma organização. Num típico ambiente corporativo, os agentes (administradores) possuem vantagem simétrica em relação aos acionistas, enquanto, via de regra, os acionistas majoritários contam com maior acesso informacional do que os minoritários e as demais partes interessadas. Exemplos clássicos de assimetria informacional e de direitos. De uma forma ou de outra, essas duas questões levam à terceira, que trata-se, na verdade, dos grande objetivo de um efetivo sistema de Governança Corporativa (GC): equilibrar os interesses, as necessidades e os direitos de todas as partes interessadas, incluindo os shareholders e os stakeholders, que, de acordo com a visão adotada pela política corporativa, pode terminar privilegiando uma ou outra forma de atuação (ver visões shareholder oriented e stakeholder oriented). A pergunta chave é como harmonizar tais questões e conflitos dentro de uma entidade? É aí que entra a Governança Corporativa (GC). Antes mesmo de qualquer conceito, ferramenta ou prática surgir, esses grupos se organizam de alguma forma para exercer influência. Eles formam uma força. E criam os primeiros controles ou forma de alinhamento estratégico de uma organização. São as forças de controle de uma entidade. Os ambientes e as forças de controle As forças de controle de uma organização também podem ser considerados mecanismos de Governança Corporativa (GC), afinal, um sistema de GC é considerado eficiente e útil quando é composto por uma combinação de diferentes ferramentas internas e externas com objetivo de assegurar a tomada de decisões baseada no melhor interesse e com uma visão de geração de valor de longo prazo para acionistas e demais partes interessadas. Para entender as forças de controle que atuam em uma organização, é preciso compreender os ambientes externos e interno de Governança Corporativa (GC). No primeiro, encontram- se os acionistas e credores, que fornecem, respectivamente, capital próprio e capital de terceiros a serem aplicados no segundo, composto por Conselho de Administração (Board), gestores e os ativos produzidos e/ou aplicados na entidade. As forças de controle, portanto, tratam-se de reações de partes envolvidas na organização e de alguma forma traídas ou prejudicadas em seus interesses, seja por conflitos de interesse, comportamentos oportunistas, juízos gerenciais, etc. São, dessa forma, a síntese de ativismos e buscas pelas boas práticas de Governança Corporativa (GC) Como forma de mitigar as questões apresentadas, é necessário estruturar um sistema de Governança Corporativa (GC) que combine diferentes mecanismos de incentivo ou controle, permitindo que essas forças atuem em conjunto no objetivo de equilibrar interesses, gerar valor e produzir resultados. Mas, afinal, forças de controle se tratam de mecanismos de Governança Corporativa (GC)? A resposta é sim e não. É importante entendermos que as forças de controle existiram e continuaram existindo independente do estabelecimento de um sistema organizado de Governança Corporativa (GC). Em alguns casos, elas podem até se tratar de um modelo prévio de GC até a aplicação efetiva de um sistema completo. Vamos, a seguir, conhecer algumas delas. Forças de controle externo Tratam-se de forças, movimentos ou grupos de interesse das partes relacionadas a uma organização que se organizam, têm origem e partem de fora para dentro da empresa. Entre elas, podemos destacar: - Definição de mecanismos regulatórios : tratam-se de regras de proteção dos investidores e nível de enforcement (em geral, nos países nos quais as regras são mais rígidas , os mercados de capitais costumam contar com maior desenvolvimento e ambiente estimulante para as companhias, gerando reflexos na economia); - Padrões contábeis exigidos: tendo a harmonização ao modelo IFRS (International Financial Reporting Standards) como grande exemplo, a adoção de padrões contábeis fornece maior segurança aos investidores e aos agentes que atuam no mercado; - Controle pelo mercado de capitais: são ágios e deságios de governança , disputas por procurações de votos (proxy fights) e Take-overs (tomadas de controle) hostis, acoes caracterizadas por um posicionamento do mercado em relação à companhia, que termina por regular e ter impacto nas decisões dos gestores; - Fiscalização dos agentes de mercado: uma fiscalização maior da companhia pelos agentes de mercado; - Proteção legal aos investidores e o enforcement (grau e capacidade de aplicação das leis), e tratamento justo de todos os sócios/acionistas e demais partes interessadas; - Órgãos de controle externo: independentes, justos e ativos, como, por exemplo, auditoria independente ou monitoramento eficaz pelo órgão regulador, de classe ou não; - Pressões de mercados competitivos : pode partir do mercado do setor de atuação da empresa ou do mercado de trabalho de altos executivos; - Ativismo de investidores institucionais: são exemplos os fundos mútuos de investimento,os fundos de pensão e os fundos de private equity, que, por meio de sua influência no mercado de capitais e na avaliação das companhias , contam com a capacidade de exigir a presença boas práticas de governança; - Ativismo de acionistas: podem ser ações individuais ou organizadas; - Agência de ratings (agência de classificação de riscos): entidades que avaliam, atribuem notas e classificam países, governos ou empresas de forma independente, segundo o grau de risco de que não paguem suas dívidas ou cumpram seus compromissos acordados no prazo fixado. Forças de controle interno Tratam-se de forças, movimentos ou grupos de interesse das partes relacionadas a uma organização que se organizam e têm origem dentro da empresa. Entre elas, podemos destacar: - Concentração da propriedade acionária e estrutura de capital: tanto o modelo de dispersão ou concentração de ações podem ser utilizadas como forças de controle, enquanto a estrutura de financiamento da empresa tem impacto nas ações e na tomada de decisão de executivos e conselho em virtude do nível de endividamento, alocação de capital/investimentos, covenants, entre outros; - Constituição de Conselhos de Administradores guardiões : é a representação efetiva dos interesses dos acionistas, concentrando boa parte das atenções , tanto por parte de investidores, quanto das consultorias e da pesquisa acadêmica. Seu modelo de constituição e uma atuação eficaz em suas funções garante o sucesso do Board; - Modelos de remuneração de colaboradores e administradores: o modelo de remuneração do quadro de executivos pode incluir a constituição de comitês, correlação com desempenho (por meio de bonificações ou stock options, por exemplo ), o balanceamento de relações custos/benefícios ou uma r elação com padrões de mercado . A composição adequada dos incentivos em uma organização é uma das principais ferramentas para garantir o alinhamento de interesses e objetivos entre gestão e acionistas (proprietários), dirimindo boa parte das questões relacionadas aos conflitos e custos de agência (entre principal e agente); - Monitoramento compartilhado: um dos principais formatos de controles internos, pode ser feito compartilhando controle com credores ou compartilhando controle com trabalhadores, por exemplo. No primeiro caso, o compartilhamento diminui os riscos de fraudes e desvios por parte dos acionistas, permite maior alavancagem e amplia o acesso à fontes externas de capital. No segundo caso, permite um modelo de gestão mais colaborativa e previne ações e intervenções sindicais e/ou de agentes governamentais relacionados; - Estruturas multidivisionais de negócios: também se encaixam no modelos de controles internos, pois tendem a produzir competição interna (entre gestores das unidades) e busca constante por melhores resultados; - Controles internos, Compliance e gestão de riscos corporativos (incluindo riscos cibernéticos). Conclusão Identificar as questões centrais relacionadas às corporações modernas é um fator imprescindível para entender a dinâmica de atuação dessas empresas no mercado. Por esse motivo, os conflitos e custos de agência, a assimetria informacional e de direitos e a harmonização de interesses são os principais os direcionadores que impactam no surgimento e na evolução das práticas de Governança Corporativa (GC) dentro de uma organização. Dessas questões primordiais surgem as forças de controle internas e externas, que influenciam os mecanismos e práticas de Governança Corporativa (GC), e indo além, existindo na dinâmica corporativa mesmo sem a presença da GC como o conceito que tratamos atualmente. Não à toa, a forma como esses atores e partes interessadas influenciam e se equilibram dentro de uma empresa são a chave não só para a GC, como para o entendimento completo da gestão e geração de valor de uma organi 1. Introdução Governança Corporativa (GC) é um conceito abrangente, amplo e formado por princípios que norteiam o complexo e intricado ambiente corporativo de um mercado onde está localizada uma organização e seus diversos atores. Os fatores motivadores para a existência e a evolução da GC nós pudemos estudar nas últimas aulas. Nosso objetivo hoje é conhecer, na prática, no que consistem, como funcionam e para que servem as diversas ferramentas e práticas de GC disponíveis no contexto empresarial moderno. Dada a relevância da aplicação dos mecanismos de governança na totalidade de segmentos e variados tipos organizacionais, revela-se praticamente inviável separar por completo governança, gestão e administração, que complementam e interseccionam conceitos entre os campos teóricos e práticos. Dessa forma, quaisquer ações, políticas e diretrizes que têm como objetivo aprimorar a administração e o processo de gestão de uma entidade podem se encaixar na descrição de boas práticas de governança. Conhecer algumas práticas e mecanismos de Governança Corporativa (GC) aplicados nas organizações e sua forma de utilização nos diversos sistema de GC espalhados pelo mundo permite entender desde a cultura até o ambiente corporativo onde atuam as entidades. Afinal, uma importante ferramenta como o Board (Conselho de Administração ou CA), por exemplo, pode ter o mesmo conceito e formato, ainda que, certamente, a forma como é gerido, suas relações com as demais partes da corporação e sua composição funcionem de forma distinta em países diferentes. A lista de ferramentas e práticas pelas quais passaremos não é exaustiva, já que é pouco provável uma relação capaz de incluir todas as práticas disponíveis mundialmente. Algumas empresas podem aplicar determinadas práticas de Governança Corporativa (GC) sem nem ter ideia da classificação de tal ação como uma mecanismo de GC. Vale lembrar que as práticas de GC estão em constante evolução e desenvolvimento, passando por mudanças constantes e cada vez mais aceleradas. 2. Organização das práticas de governança Dada a amplitude de mecanismos e práticas de Governança Corporativa (GC) disponíveis em uma organização moderna, uma forma de elencá-los é dividindo sua aplicação entre práticas internas e externas. Um sistema de GC pode ser considerado eficiente quando existe uma combinação de diferentes mecanismos e práticas internas e externas com objetivo de assegurar a tomada de decisões baseada no melhor interesse e com uma visão de geração de valor de longo prazo dos acionistas. É perceptível que essa divisão se assemelha à divisão interna e externa que vimos com as forças de controle interagindo em uma organização. Tal fato não ocorre sem motivo, afinal, as forças de controle de uma organização também podem ser considerados mecanismos de Governança Corporativa (GC). É DISCIPLINA Governança Corporativa PROFESSOR Renan Barabanov de Assis importante entendermos que as forças de controle existiram e continuaram existindo independente do estabelecimento de um sistema organizado de GC. Em alguns casos, elas podem até se tratar de um modelo prévio de GC até a aplicação efetiva de um sistema completo. A formalização, sistematização, junção e conscientização de um modelo amplo é o que transforma efetivamente tais forças em um sistema de GC. A forma como os mecanismos e práticas se organizam em uma entidade depende da forma como os interesses nela interagem, ou como as forças de controle atuam. O objetivo continua sendo manter o equilíbrio entre os diversos grupos de interesse em uma organização. Dentro do alinhamento conceitual de uma corporação moderna, a Governança Corporativa (GC) depende do triângulo básico entre proprietários, conselho e diretoria, enquanto na visão expandida, o quadrilátero também engloba as demais partes interessadas (stakeholders). Vamos, a seguir, conhecer alguns dos mecanismos e práticas: 3. Mecanismos de governança O ambiente onde estão inseridos os atores
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