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A ÉTICA SOBRE A RATIFICAÇÃO DO PROTOCOLO DE KYOTO Cesar Augusto Della Piazza (PPGEP/UNIMEP) Orientador: Prof. Dr. Paulo Jorge Moraes Figueiredo Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP – Santa Bárbara d’Oeste - SP Resumo O objetivo deste artigo é apresentar uma discussão sobre aspectos éticos envolvendo as decisões relacionadas às mudanças climáticas e a adesão dos países ratificantes e não ratificantes ao Protocolo de Kyoto e aos seus Mecanismos de Flexibilização. O artigo analisa os principais problemas envolvidos na execução do Protocolo de Kyoto perante as mudanças climáticas, com questões pertinentes a sua efetivação e conflitos entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento. É feita uma análise dos motivos que levaram os EUA a não ratificação face as suas emissões de carbono do ponto de vista ético. Analisando os principais motivos relacionados aos conflitos existentes no Protocolo de Kyoto e, particularmente, em relação aos objetivos ambientais nele proposto. Palavras-chave: Protocolo de Kyoto, Mudanças Climáticas, Ética Ambiental. I – Quanto aos Objetivos do Protocolo de Kyoto O Protocolo de Kyoto surgiu como um mecanismo para tentar resolver o problema do aquecimento global causado pelas emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) 1 , decorrente de “ações antrópicas ou induzidas pelo homem”. (CENAMO, 2006) O regime de Mudanças Climáticas é um dos mais complexos e relevantes no cenário atual, porque implica profundas inter-relações entre a economia e o ambiente global. (Viola, 2002) Sendo supervisionado pela Conferência das Partes (COP) 2 . O Protocolo de kyoto surgiu em 1997, no Japão, na terceira edição das Conferências das Partes (COP3) tendo como acordo o comprometimento de um conjunto de nações industrializadas (Anexo I), de reduzir suas emissões em 5,2% (em relação aos níveis de 1990) para o período de 2008- 2012, além de critérios para utilização de mecanismos de mercado. 1 São considerados Gases de Efeito Estufa (GEE): dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), Óxido nitroso (N2O), hezafluoreto de enxofre (SF6), e as famílias de perfluorcarbonos (compostos completamente fluorados, em especial erfluormetano CF4 e perflourcarbono C2F6) e dos hidroflourcarbonos (HFCs) (Rocha, 2003, p.01) 2 1ª Conferência das Partes (COP-01), realizada de 28 de março a 7 de abril de 1995, ocorrida em Berlim, na Alemanha. No Protocolo é indicada uma lista de ações políticas e medidas específicas para os países signatários e para que o Protocolo entre em vigor foi necessário um mínimo de 55 países ratificando suas adesões. Portanto, ele entrou em vigor em 16 de Fevereiro de 2005, sem a assinatura e participação do EUA e da Austrália, entre outros países, porém com a ratificação da Rússia. Ao final da última e 11ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em 2005, o aumento para 157 países signatários do Protocolo de Kyoto deram importantes passos na direção das reduções de emissões dos Gases do Efeito Estufa até 2012. (GREENPEACE, 2005) O Protocolo permite aos países ratificantes, além de “políticas, vários mecanismos internacionais para ajudá-los a atingir seus compromissos de redução” (Sanches, 2003). Tais mecanismos denominados como Mecanismos de Flexibilização tem como meta a redução dos custos colocadas pelo Protocolo e se revelam com características inovadoras como instrumento para lidar com o problema global das mudanças climáticas. Há interesse nos países desenvolvidos face aos custos de implementação que variam consideravelmente em função da produção e emissão de GEE decorrente das fontes de energia utilizadas na produção. Segundo Sanches (2003) “cada entidade obrigada a reduzir suas emissões em uma quantidade fixa supostamente sai ganhando pela possibilidade de fazê-lo fora de suas fronteiras uma vez que os custos diferem entre esta e outras entidades.” Existem três tipos de Mecanismos de Flexibilização 3 proposto pelo Protocolo de Kyoto: Comércio de Emissões entre Países Desenvolvidos: Permite que os países utilizem o comércio internacional de emissões para trocar créditos de carbono 4 , entre os países do anexo I 5 , segundo as regras estabelecidas pelo Protocolo. Portanto, indica que qualquer país desenvolvido que não atingir suas metas de reduções poderá “comprá-la” de outro país desenvolvido que tenha conseguido e superado de sua cota ou, inversamente, 3 Através destes mecanismos, as Partes da Convenção podem desenvolver projetos florestais ou de eficiência energética, visando à redução de emissões de GEE e possibilitando uma comercialização de créditos destes gases, de modo de compensar suas metas. Scarpinella (2002) 4 Créditos de carbono é a forma transacional pela qual os países ricos podem promover a redução da emissão de gases causadores do efeito estufa (GEE) fora de seu território. 5 Países desenvolvidos que tem o compromisso em baixar suas emissões de carbono aos níveis de 1990. www.onu- brasil.org.br/doc_quioto2.php qualquer país desenvolvido poderá vender o excedente de suas cotas de emissões perante suas metas pré-estabelecidas. Transferências e Aquisição de Redução de Emissões entre Países Desenvolvidos: Estabelecem investimentos de ordem pública ou privada de um país investidor em projetos de redução de emissões ou seqüestro de carbono em outro país, em troca de créditos de redução de emissões que pode ser usado para aumentar a provisão de um país investidor, enquanto que a do país anfitrião é reduzida. (SANCHES, 2000) Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) entre Países Desenvolvidos e em Desenvolvimento: De forma semelhante ao sistema de transferências e aquisição de redução de emissões supra citado, este mecanismo envolve também auxiliar o desenvolvimento sustentável em países anfitriões, não-membros do anexo I 6 , ou seja, que não tem compromisso de redução de emissões de carbono, como no caso do Brasil. Portanto, o Protocolo de Kyoto cria o MDL, onde os países em desenvolvimento terão um grande mercado mundial de carbono. Segundo Rohde e Philomena (2004, p.05) “mediante os Mecanismos de Flexibilização, os países não-membros do Anexo I passam a participar do Protocolo de Kyoto como atores mundiais de seqüestro de carbono, através do banimento de tecnologias sujas, melhoramento na gestão ambiental e eficiência energética.” II – Litígios no Protocolo de Kyoto As emissões antropogênicas globais de gás carbônico são estimadas para crescer aproximadamente 64.2% entre 1990 e 2010. Isto é equivalente a um aumento em torno de 14.2 bilhões toneladas de gás carbônico. Para as emissões dos países em desenvolvimento são estima-se uma elevação mais rápida que nos países do Anexo I . Os aumentos das Emissões dos países do Anexo I são estimados em uma taxa média de 1.2% por ano, no período 1990–2010, enquanto o aumento anual correspondente para os países em desenvolvimento deve ser da ordem de 4.4%. (DAGOUMAS, PAPAGIANNIS, DOKOPOULOS, 2004.) 6 Paises em desenvolvimento que não tem o compromisso em baixar suas emissões de carbono. www.onu- brasil.org.br/doc_quioto2.php Temos então uma discussão aberta sobre a questão de quem deve arcar com os custos da queda nas emissões de carbono, onde estão diretamente ligadas as produções energia de para subsidiar a produção industrial. Segundo Muylaert (2000) “as Partes Países Desenvolvidos devem tomar a iniciativa no combate à mudança do clima e a seus efeitos. As diferenças sócio-econômicas entre países é um assunto que remete diretamente à questão da equidade. A forma como se pretende amenizar estas diferenças é um dos problemas mais importantes a serem enfrentados pelos articuladores de políticas para enfrentar as mudançasclimáticas.” Portanto, os impactos de uma queda na emissão de carbono nos EUA terão as seguintes conseqüências em sua economia: Energia Subida substancial dos preços, apesar da diminuição da procura global; O aumento da procura de gás natural poderá conduzir à duplicação dos preços. Atividade Econômica Aumento dos preços, em especial nos produtos com maiores custos energéticos; Perda de competitividade em relação aos produtos de Estados não abrangidos pelas limitações de emissões; Decréscimo da atividade econômico e impacto negativo no PIB; Desemprego da ordem de 1 a 5 milhões de postos de trabalho, consoante da utilização do ETS. 7 Fonte: Elaborado com base em relatórios da Charles River Associates, Standard & Poor’s, WEFA e US Department of Energy. (apud. Alves, 2002) O governo de Bush, em 2001, anunciou oficialmente que se retirava das negociatas do Protocolo de Kyoto com os seguintes motivos de sua não ratificação: a falta de relevância depositada aos mecanismos de mercado e o não estabelecimento de compromissos para os países de renda média com rápido crescimento de emissões (VIOLA, 7 Sistema de Comércio de Emissões ou Emissions Trading Systems. 2004). Vemos aqui então o impasse de uma política unilateralista pretexto para que os EUA não assinem o Protocolo e continuem a emitir níveis de carbono por volta de 36% das emissões totais mundiais. Figura 1 - RESPONSÁVEIS PELAS EMISSÕES DE CO2 EM 1990 EUA 36,06% Japão 8,49% EU. 24,28% Outros 0,90% Fed. Russa 17,38% Europa Leste 7,39% Austrália 2,20% Canadá 3,30% Fonte: UNFCCC, 20068. A Figura 1 apresenta a situação dos EUA no quadro geral contribuindo com de 36% do total de emissões, este índice nos remete a necessidade de um acordo muito mais amplo para que se tenha um resultado satisfatório. Mesmo com a atual ratificação da Rússia ao Protocolo há que se encontrar um caminho para que haja um maior efeito significativo nas reduções das emissões de carbono sem os EUA. III – A Questão Ética no Protocolo de Kyoto. Analisando a trajetória do pensamento, desde os gregos, o dilema ético parece estar sendo utilizado com falta de rigor. Em linguagem habitual temos que ter me mente que ética e moral não tem o mesmo significado e são utilizados indiferentemente como sinônimos. No entanto, "moral se refere, mais propriamente, ao julgamento e às ações na busca do que é certo ou do que é bom, e ética se refere ao raciocínio que tais julgamentos e ações requerem.” (MUYLAERT, 2000). Usar Ética como Moral traria dois problemas 8 United Nations Framework Convention on Climate Change. principais, sendo importante separar estes conceitos. O primeiro problema refere-se ao aspecto teórico, já o segundo ao prático. Usar os conceitos de Ética e de Moral como um conceito único representaria o abandono das próprias origens dos mesmos. (MUYLAERT, 2000) Verifica-se que, nos documentos oficiais do clima, não foram analisadas questões referentes à ética, tendo até uma noção confusa a este respeito, induzindo a uma falta de compromisso dos indivíduos e órgãos de governo ao invés de uma responsabilidade mais efetiva, o que indica a uma perpetuação do status quo. Segundo Muylaert (2000) “a noção de responsabilidade de todos produz acomodação individual, pois, todos dependem de todos produzindo a idéia que nada pode ser feito e que a melhor solução é a mais rápida. Deste modo, ao invés de surgir uma responsabilidade efetiva por parte das pessoas, surgem soluções paliativas, tais como o apelo ao consumo de produtos ecologicamente corretos.” Observa-se que o uso da Ética na questão sobre as mudanças climáticas é inadequado nos documentos oficias de acordo internacionais quanto nas suas práticas a esse problema. Sendo a Ética trilhada em duas linhas de análise: uma como sinônimo de Moral e outra como procedimentos tendo assim, duas imensas linhas de estudo. Portanto, o efeito mais imediato desta separação é a tentativa de retirada da palavra Moral o seu caráter ideológico. Segundo Muylaert (2000) “é uma forma de fuga do aspecto militante que está bastante associado ao discurso ambiental como um todo, o que o torna muitas vezes desacreditado na esfera social, e não científico nos meios acadêmicos e em centros de pesquisa.” Assim, temos uma análise indicando, via equidade, uma igualdade de emissões de gases de feito estufa por habitante. Esta análise tenta igualar as nações ricas e pobres referentes ao desenvolvimento no passado e no presente entre os paises desenvolvidos e em desenvolvimento. Isto também tem um resultado nas tomadas de decisões políticas referentes às pressões dos países desenvolvidos quanto à redução das emissões dos países em desenvolvimento. Por outro lado, isto também leva a uma perpetuação dos atuais níveis de emissões de carbono, caso seja, mantidos os atuais níveis de padrões de vida. Mesmo diante de informações ainda superficiais, temos dados científicos que nos permitem tomar decisões para poder amenizar as alterações climáticas e a não adoção de tais iniciativas representa uma total irresponsabilidade de quem as tem. Ou seja, mesmo que as hipóteses venham a não ser confirmadas e os fatos não ocorram, diz-se que é melhor agir como se os mesmos fossem verdadeiros. Isto porque, não se sabendo dos reais riscos, além da possibilidade de serem catastróficos, induz-se a uma "culpa" por não se ter providenciado soluções (MUYLAERT, 2000). III – Conclusão Apesar do Protocolo de kyoto ter surgido como ferramenta para conter as mudanças climáticas, ainda vemos que há muito para ser discutido e são muitos os valores que então envolvidos nos países signatários. Mesmo considerando os benefícios das atuais diretrizes, temos que, necessariamente, reduzir às emissões de carbono além do que prega o Protocolo como meta para o primeiro período 2008-2012, já que estamos num processo de emissão mundial que lança atmosfera muito mais do que ela pode processar, ou metabolizar. Os Mecanismos de Flexibilização dão margem para que se faça um mercado que pode ser viável, mas vemos alguns entraves onde os países que não tem o intuito de ratificar o Protocolo encontram brechas para suas argumentações, como no caso dos EUA, onde são claros os fatores econômicos envolvidos e o julgam unilateralmente para continuar a manter sua economia tendo um índice de crescimento que abasteça os padrões sociais americanos. A situação que se tem em questão é até que ponto o Protocolo de kyoto terá alcançado nas reduções das emissões de carbono uma margem onde consigamos conter de modo precavido as alterações climáticas, por ser esta a única alternativa até agora discutida de modo global. Trata-se, portanto, de um problema grave já que se não tivermos êxito com o Protocolo de Kyoto estaremos já há muito tempo trabalhando nessa perspectiva e concomitantemente emitindo gases de efeito estufa na atmosfera. Teremos que discutir uma forma de atuação que não se descarte o que já foi feito. O problema ético indica que haja um meio para que os países tentem se organizar neste mercado de troca de carbono ou seqüestro, onde os princípios básicos sejam a preservação da vida atual e das gerações futuras. Este primeiro período de ratificação do Protocolo será de grande valia para o estudo de formas e aprendizados para que ele evolua para uma direção em que a maioria seja beneficiada ambientalmente e economicamente. Referências Bibliográficas: ALVES, Jóse Luiz. O Protocolo de quioto e as políticas ambientais globais. Tendências na Economia Mundial. P. 74-72, jan/ 2002. CENAMO, Mariano Colini. Mudanças climáticas, o protocolo de kyoto e mercado de carbono. São Paulo, CEPEA. Disponívelem: http://www.cepea.esalq.usp.br/pdf/protocolo_Kyoto.pdf. Acesso em: 15 Març. 2006 DAGOUMAS, A.S. PAPAGIANNIS, G.K. DOKOPOULOS, P.S. An economic assessment of the Kyoto Protocol application. Elsevior, Energy Policy 34, p. 26–39, Greece: 2004. GREENPEACE - Protocolo de kyoto sai fortalecido de conferência sobre mudanças Climáticas. disponível em: http://www.greenpeace.org.br/clima/?conteudo_id=2448&sub_campanha=0. Acesso em: 05 de Julh. 06 MUYLAERT, Maria Silvia. Análise dos acordos internacionais sobre mudanças climáticas sob o ponto de vista do uso do conceito de ética. Tese apresentada ao programas de pós-graduação de engenharia da universidade federal do rio de janeiro para a obtenção do título de doutor em ciências em planejamento energético. Rio de Janeiro:2000. ROCHA, Marcelo Theoto. Aquecimento global e o mercado de carbono: uma aplicação do modelo cert. Tese apresentada à Escola Superior Luiz de Queiroz, Universidade São Paulo para obtenção do título de doutor em Economia Aplicada. Piracicaba: 2003. http://www.cepea.esalq.usp.br/pdf/protocolo_quioto.pdf http://www.greenpeace.org.br/clima/?conteudo_id=2448&sub_campanha=0 ROHDE, Geraldo Mario; PHILOMENA, Antonio Liborio. Emissão antropogênica de CO2 e sustentabilidade. Ciência e Cultura. vol.56 nº.4, p.05. São Paulo, Oct./Dec. 2004. SANCHES, Carmen Silvia. Mecanismo de desenvolvimento limpo do protocolo de Kyoto: Há perspectivas para o setor sucro-alcooleiro paulista? Tese apresentada a Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas para obtenção do título de Doutor em Administração de Empresas. São Paulo: 2003. SCARPINELLA, Gustavo D’Almeida. Reflorestamento no Brasil e o protocolo de Kyoto. Tese apresentada ao programa interunidades de pós-graduação em energia da universidade de são Paulo para obtenção do título de mestre em energia. São Paulo: 2002. UNFCCC - United Nations Framework Convention on Climate Change. disponível em http://unfccc.int/2860.php, acessado em 25 Agos. 2006. VIOLA, Eduardo.O Regime Internacional de Mudança Climática e o Brasil. Revista Brasileira de Ciências Sociais - Vol. 17 Nº 50, p. 26, Out. 2002. http://unfccc.int/2860.php
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