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Este livr~ estuda a TRANSFERÊNCIA segundo Freud, Melanie Klein, Lacan, Movimento Institucionalista e segundo as noções filosófi- cas de Repetição e Diferença. Ele remete às origens da noção de Transferência na psicaná- . lise, à sua existência em outros campos do saber, às concepções freudiana, kleiniana e lacaniana, aos novos horizontes que se abriram nas experiências institucionais e aos questiona- mentos que emergem no diálogo com a filoso- fia que emergem no diál?go com a filosofia. O autor realiza a difícil tarefa -'- fruto de vasta experiência - de apresentar a problemática de maneira didática e ao mesmo tempo crítica. EDITORA HUCITEC Copo: f Cinco Lições sobre a Transferência GREGORIO BAREMBLITI 3." edição EDITORA HUCITEC SÉRIE ··SAÚDELOUCURA" (TEXTOS) 5 direção de Antonio Lancetti Série "SAÚDELOUCURA" TÍTULOS EM CATÁLOGO SaúdeLoucura 1, Antonio Lancetti et ai SaúdeLoucura 2, Félix Guattari, Gilles Deleuze et ai Hospital: Dor e Morte como Ofício, Ana Pitta Cinco Lições sobre a Transferência, Gregorio Baremblitt A Multiplicação Dramática, Hernán Kesselman e Eduardo Pav- lovsky Lacantroças, Gregorio Baremblitt Saúdel.oucura 3, Herbert Daniel, Jurandir Freire Costa et ai Psicologia e Saúde: Repensando Práticas, Florianita Coelho Braga Campos (org.) Mario Tommasini: Vida e Feitos de um Democrata Radical, Franca Ongaro Basaglia Saúde Mental no Hospital Geral, Neury J. Botega e Paulo Dal- galarrondo Manual de Saúde Mental, Benedetto Saraceno, Fabrizio Azioli e Gianni Tognoni Saúdel.oucura 4, François Tosquelles, Enrique Pichon-Riviere, Robert Castel et alo A RELAÇÃO DAS DEMAIS OBRAS DA COLEÇÃO "SAÚDE EM DEBATE", DA QUAL FAZ PARTE A SERIE "SAÚDELOUCURA", ACHA-SE NO FIM DO LIVRO. ~ CINCO LIÇOES SOBRE A TRANSFERÊNCIA GREGO RIO BAREMBLITT .- CINCO LIÇOES SOBRE A TRANSFERÊNCIA TERCEIRA EDIÇÃO EDITORA HUCITEC São Paulo, 1996 © Direitos autorais, 1990, de Gregorio Baremblítt. Direitos de publi- cação reservados pela Editora de Humanismo, Ciência e Tecnologia HUCITEC Ltda., Rua Gil Eanes, 713 - 04601-042 São Paulo, Brasil. Telefones: (011)240-9318,543-0653. Vendas: (011)530-4532. Fac- símile: (011)530-5938. ISBN 85-271.0140-8 Foi feito o depósito legal. SUMÁRIO .-\gradecimento 8 rrodução 9 prcscntação 11 _-\ concepção Ircudiana 12 A concepção anglo-saxônica 39 .-\ concepção lacaniana 66 .-\ concepção institucional 89 Reflexão filosófica sobre a transferência 113 A transferência. Considerações finais provi- sórias 131 Bibliografia 139 AGRADECIMENTOS , A equipe do Sindicato dos Psicólogos de Minas Gerais, que encampou o desafio de or- ganizar este Curso. À Psicóloga Elizabet Dias de Sá, que, através de pacientes horas de datilografia, soube ouvir meus intuitos e não "ver" meus erros. À Psicóloga Rosângela Montandon, que teve a seu cargo gestionar a publicação, e à Psicóloga Ci- bclc Ruas de Meio, que corrigiu, datilografou e fez contribuições ao texto. Aos participantes do Curso, que aportaram sua atenção e suas inteligentes perguntas. A todos os meus amigos de Belo Horizonte, que me ajudaram a sonhar com a Pátria que perdi. o Autor \ -INTRODUÇAO No meu entender, nestes tempos acc- rados, todo escrito deveria ser datado. Cada um Ies tem uma marcada conjunturalidadc que, quan- _ não é levada em conta, adquire sentidos e va- s necessariamente diversos dos que teve na sua asião inaugural. O texto que se vai ler é produto de uma iniciativa .o preendida junto a uma equipe do Sindicato dos J icólogos de Minas Gerais, em circunstâncias nas ,uais era conveniente impulsar as atividades for- ativas da organização. Devido à urgência do evento é que se poderá entender tanto a abrangência, demasiado ambiciosa, como a sua velocidade. Muito se tem dito e escrito sobre a transfc- ência. Esse termo, como tantos outros, não é oriundo da Psicanálise, mas é bem verdade que , no campo psicanalítico onde ela adquire seu enrido mais inspirador. O mesmo já tem sido adotado e redefinido por outras disciplinas cien- tíficas, inscrito como categoria filosófica contem- porânea e utilizado como noção em diversos âm- bitos da cotidianidade. 10 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA Mas, antes de tudo, trata-se de um fato, um acon- tecer real, cujos efeitos incidem nos sujeitos e nas sociedades que os desfrutam ou padecem, aprovei- tam ou desperdiçam. Estas rápidas e modestas aulas nada poderão di- zer de original ou profundo ao "expcrt" na matéria. Apenas pretendem ser sintéticas e acessíveis. Contudo, elas levam um propósito central: mos- trar que nem a Psicanálise, nem nenhuma corrente psicanalítica em particular, são "proprietárias" des- se "descobrimento", e que ninguém falou a "última palavra" sobre o tema. As idéias, como a terra, são de quem as trabalha. Freud costumava dizer que é perigoso transplan- tar os conceitos para longe do seu chão nativo, mas cabe acrescentar que quando tal coisa acontece, e eles sobrevivem, novas espécies maravilhosas nascem. Gregorio F. Baremblitt APRESENTAÇAO A MIGOS e colegas, sinto-me muito fe- liz de poder iniciar, com vocês, esta breve série ~ aulas. Este tipo de iniciativa, como a que empreende- os agora, no seio de um Sindicato, de um orga- aismo representativo de classe, me é essencialmen- c grato e afim. Antes de começar, quero agradecer à ex-presi- ente do Sindicato, Elizabet Dias de Sá, e à equipe ue trabalhou comigo na realização do Curso. Ela anifestou grande dedicação e especial tolerância om algumas dificuldades que tive durante o trans- urso da organização. Muito obrigado pelo convite, o trabalho realizado e a tolerância de meus incon- -enientes. -A CONCEPÇAO FREUDIANA A exposição não vái ser fá~qUe resumir a questão da Itransferêné} em Freud em uma aula é um desafio o qual ignoro que alguém seja capaz de resolver. Pessoalmente, não me sinto em absoluto certo de consegui-Io. Então, toda a exposição será centrada em torno dos Quadros: 1 e 2. Terei de valer-me deste recurso p ra expor melhor. \1\ ..1 Transferê~cia não é um termo exclusivo da psi-Yt r~canálise, como, seguramente, e ObVIOpara vcces./(y. O termo, fora das práticas psicológicas, refere-se ~ ,f ao deslocamento, a~raslado de qualquer !i.I20 de ~ ~ mãtena: ransfcrência de capital, transferência de funciônários, transferência de c1ementos, de recur- sos etc. EmG-p-s-ic-o-l-o-g~tem sido muito usada na 2~/a pren Izage para desi nar transp-orte ue sepo e azer as ca aciqadcs ad ujridas..Qe a render~\/ em relação a um~J~!9~~ento, Jara o 1( o conhecimento de um novo objeto. .-=--- --- Em psiquiatria e psicoterapia, antes de reud., --J!.!i~va-se o te~mõ "transfcrt"-para referir-se a um y'A,f experimento hip~óticõ que c~nSlSiCC'm trasladar, . A CONCEPÇÃO FREUDIANA 1 3 m estado hipnótico, a paralisia de uma paciente istérica d~ um laQQ do ~Õrpo-:-p-araoutro, .0 _ ..J./ -:ue é possível - como e sabido - por melo~' ca sugestão hipnótica.Qcomeçou a trabalhar, _ roximadamentesI.IL.l895, utilizando o famoso~ .....Jt.Q.Ç!Q.~ár(~o, que já se empregava bas- nte em Paris. (Çharc2!>praticava a hipnose s)n- mática na escola da a petricr , enquanto que -~a deU anel. ra pr'aticado o método hi - zocatártico. Todos esses investigadores já.uuili- ~am o termo 'transferência. Freud era um neu- - logista que resolveu dedicar-se à psicoterapia as enfermidades mentais. Inicialmente, ele pra- icou hipnose de maneira supressiva. ~omo ou:..... ~os investigadores, hipnotizava paciente~llÍs- 'ricoScObsessi'Vos e, no estado de hipnose, uti- zandosu CStao su eria-=Ihes _ue seus SiI1iOmas m desaparecer. Este método teve sucesso du- nte muito tempo e ainda continua tendo, eni gumas ocasiões. Mas seus resultados não são uradouros. A artir do uso desse rocedimento começou a r ou.!!º-iLue consistia em, no estado de hipnose, - ~LI2acientes Ql-ICrevivcssern as snuaçoes m que seus sintomas agare~ram. Mais tarde, pediu para revivcrern e relatarem urras situações mais arcaicas que, supostamente, eriarn a ver com aquela na qual os sintomas apa- ::-cerarn pela primeira vez. Isto geravanos pa- cientes uma rcvivência e uma forte descarga de tos, uma intensa descarga de emoções, e ainda 14 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA de movimentos corporais, que produziam uma "melhora" do sintoma, cuja permanência e estabi- lidade eram maiores do que com o método hip- nótico suprcssivo. Durante o uso do método, especialmente com I2.a~ientes histéncas, 9 foL comprovando ~e muitas destas pacientes não tinham disposição para serem hipnotiza as. sto o levou paulatinamente a '-~----~--~ abandonar o método hipnocatártico e limitar-se a sugerir aos pacientes que fossem falando de tudo aquilo que Ihes parecia importante, de tudo aquilo que Ihes vinha à mente. Durante este procedimento,~~----.~----ins irado em parte por algumas de suas pacientes, ~~EcamTi1ha~a as assõc~0es dessas enferm~s na direção da explicação dos sintomas e no~ntido .de lembrar situações assadas ue tivesse a ver com os sintomas. Posteriormente, foi célebre a rea- ção de uma das pacientes de Freud, que disse que não apenas não queria hipnotizar-se, como não que- ria falar daquilo que Freud achava importante que fosse falado. Ela ueria falar somente do ue ELA queria falar, especialmente relatar seus sonhos, suas fantasias... reud teve o om senso de aceitar essas exigências. Mas, durante o exercício desse procedimento,----~---------.~--~-.~reu percebia que, em determinados momentos, a paciente não podia co~inu;r relatando ~i--~ -- -----nh-::a--;::-a-s::-°l":"":la"---:m=e_=-n-;::te.Acontecia uma interrupção do fluxo associativo. Nesses momentos, Freud, con- servando ainda algumas manobras do método hip- nocatártico, que já havia abandonado, costumava A CONCEPÇÃO FREUDIANA 15 genr as pacientes que, quando ele tocasse em a testa com a mão, elas conseguiriam continuar ando sobre o que se havia interrompido. Teriam, - im, a possibilidade de conseguir lembrar situa- que não estavam atingindo. Posteriormente, udando O fenômeno da interru _ -o d l.XQgs- iativo, nesse momento de im asse, depois de ':'-10 vencido muitas vezes or m2io da sug~tão _ da inipãSiçãõClas ITIãQ..sna testa, reu foi com- -rccndcndo que o que acont'ecia nesse instante é cue havia a arccido na consciência d,º-paci~nte .~ma associação, idéia, afeto ou impulso ue ji- - ~a a vcrComa pessoa c!Q_m6dico, doo e rai<.? r, que essa idéia ou impulso_ era con~do -- de rma consciente ou não pelo paciente -- incon- niente, inadequado a uma s·tlJ.aç.ão de relação -rofissional como a que acontecia. Então, o pa- TIte já a tinha clara, e não podia comunicá-Ia rque a julgava imprópria, ou acabava por não ~r nenhuma idéia, isto é, a idéia desaparecia de _ a mente. 6. rofundando mais no fenômeno reud - ega à concllisão de ue nesse mo me to de irn- se. a inca acidade de continuar associando deve-se :: mp~~a revivescên.9'l de aI. uma situa ão an- o rior em gue pessoa üv. tiI2Q de afeto, de--- m~ulso, de emoção similar, mas com outra pessS! em uma situação especialmente, intcnsa c !cral- . ,)( ente relacionada com a sexualidade. Ao retorno des- {Y!; situação anterior, passÍvc de rcConstituição ue~- S reitera, que se renova na situa ão terapêutica Freud _-hamou de(TRANS~ERÊNCrA. 16 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA tj'Neste momento altmnsre,ência~m uma ],epetisã2) j e vamos encontrá-Ia no item ue chamamos "ponto . de vista clínico". Repetição de vivências, de expe- riências, d~itua ões _Qeatitudes, <tecomportaIl!.en- tos, de imagens de pçssoas, de interlocutores. Isto CStrdito de~aneira bastante vaga e descritiva. Na interrupção do fluxo associativo, reud descobriu a [repetiçao compl~ múlti Ia, ~e todos ~s ~Ie- me~t~s que I22diam~stal intCJ:vindo.nestas_~i.!~- ções traumáticas anteriores ~e o pacientc je etia no ambiente terapêutico de maneira in~oluJ!tária e ~em supostamente inteirar-se de gue_0ajsto sue estava acontecendo. Esta é a primeira, a mais simples, a mais ingênua definição de transferência que podemos encontrar em Freud. Nesta defini ão tão elementa é ossível .L.l.,l( compreender gue a forma como a transferência a a- f:t" rece na situação analítica é como obstáculo como rJ':J.r lnconvenie_nte.,: rcud propõe às suas pacientes dizer?tudo que lhes venha à mente, comentar tudo o que estão pensando e sentindo. As pacientes empe- nham-se em cumprir esta indicação. Chega um mo- mento em que isto se Ihes torna impossível e não sabem por quê. Há, então, um obstáculo, uma di- ficúldade ara levar em frente o t aumento para cumprir um dos re uisitos exigidos ara Rossibili- tá-lo. A isto Freud (mesmo nessa época)~amou ./ ,~ \'resistência"\ -- .P (RêSTStencia", como vocês sabem, tem signifi- rY:~",~-.:ado político e târrib"énleÍ6tnco. ~e re- fere-se Uuta_que um povo ou uma classe exerce vy~ rr;)JJ A CONCEPÇÃO FREUDIANA 17 18 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA das ara eliminá-Ia e ermitir que a transferência se manifeste claramente e possa ser verbã1TZãdae d~scarregada e;;;-ci~l~nle e, desta forma, pro- pJc~ar ~ cu~ a desaparição duradoura do sintoria. , A medida que o tempo passa, quando reu vai 1 ~ co~.preendendo mais rofund~me!!!(! qual é _º_si- fr P ~nIflcado da transferência <:. por que ela a arece ~./ como_:esistênci~ ~Ie renuncia à manobra de vencer ~;) sugeslIvan:en~e. a re~is,t,ência e confia no que ele ttYl' chama ~~vInha. a? .(termo também ingênuo) ri' \dos motivos da rcsistcncia para conseguir a propi- ciação de que a transferência seja claramente ma- nifestada, vcrbalizada e descarregada afetivamente . •11 Pode-se dizer que, l!9 momento em 9.!!.!.:: reu tf6: ~ renu~1Cia ao venci~lento sugestivo da resistência e~~0.l"confIa no que sena o começo da ~o" ,'» ~/ 9~ t~ans~erência-resiSiCnciã, começa propriamente .:f"" o pr~cedlmento I2sicanªJítico. A tfãIisTcrencIa continua sendo o conceito central dura.!!.te a obra osterior de Freud, tanto na teoria ~omo no método e na técni~sicanalítiql. Apa- recem, claro, muitos refinamentos do termo trans- ferência. Sabemos que a teoria freudiana não é sim- ples. Ela é uma série de re-versões, de novas ver- sões dos "modelos" com os quais Freud tenta ex- plicar como funciona o psiquismo. Existem muitos modelos. Há aquele utilizado no período da "Psi- coterapia da histeria" (do qual cstarnos falando). Existe o modelo do psiquismo enunciado no capí- tulo 7 de A Interpretação dos Sonhos. Há o cha- mado modelo da "Primeira tópica" (Inconsciente, A CONCEPÇÃO FREUDIANA 19 ~ é-consciente, consciente). Também o modelo do "Complexo de Édipo'', o modelo da "Teoria pu 1- ional", e o modelo da "Segunda tópica" (Id, ego supcrcgo). Em cada um d s.modclos está incluído conceito de transferência como um dos rinei ais ecanismos do ,i uismo. Podemos resumir os vários modelos em uma reposição que Freud formulou nos artigos de 1913 _ 1915, que é a proposta de uma "rnetapsicologia " \ - li seja, uma teoria ue está "além da sicolo ia" . .-\ psicologia seria o método predominantemente -:/ ~escritivo dos fenômenos da conduta e da consciên- L cia manifesta. A &etapsicologialseria a teoria do~"7 iquismo en uanto a uele qu .- , ·siY.el,-..não;Y° ~escritível, aquilo que está além da psicologia. Tal etapsicologia tem quatro pontos de vista: ~ ico, dinâmTCo, tópico e estrutural. Uma forma de atar e de entender como vai evoluindo em Freud conceito de transferência durante a construção c sua obra é tratar de revisar como a transferência adquire novos sentidos teóricos e, portanto, novos os técnicos ou clínicos em cada um dos pontos "c vista (econômico, dinâmico, tópico, estrutural e clínico ). No Quadro 1 há um quadrado, e seus quatro ângulos são pontos referentes à transferência, C011- ratransferên~ia, à resiSl ~ ciae à contra-resistência. Definimos, provisoriamente, a transferência como Frcud o fez no período inicial. A contratransferên- cia / um termo que vai aparecer em Freud a gum cmpo depois em uma série de artigos que vão mais A CONCEPÇÃO FREUDIANA 2120 UÇOES SOBRE A TRANSFERÊNCIA Quadro 2Quadro 1 Princípio da realidade )<princípio do prazer-desprazerPor quê? Princípio de inércia-nirvana )(TransferênciaRecíproca e/ouContratransferênciaCompulsãoderepetiçãoTransferência •.,-------+ Formações do Inconsciente Motor da curaAmistosa Posttiva < ) Erótica =- Qual e ::orno? <Negativa - HostilElaboraçãoRecordaçãoCura (Assinalamento Interpretação Construção) :o (l) "O ~.õ.~.o Resistência Inibições -- Sintomas Na situação analítica :::)onde?< Na vida cotidianaAtuações Ponto de vista econõmico - Energias - Processo primário Pon~o de vista dinâmico _ Forças (. Putsôes <:re Conflttos Defesas ( Contra-Resistência e/ou Resistência Recíproca Resistência •.,-------+ ou menos de 1910 a 1920.Qdiz ue se toda essoa é capaz do fenômeno de transferência, ela / acontece, no procedimento psicanalítico, não ape- ~J nas no paciente como ~~!:!!bémno analista. A pri-- ~_~ melr~ definição de contra transferência é muito si- rJft- métnca porque Freud fala de transferências recí- procas. Depois, sm outro~artigos, reu tenta di- eren ar o ue é a t ansíc ência do analista acor- dado ela incidência, ~ impacto da transferência do paciente, e a transferência do analista ue talvez aconteceria com qual-uer paciente, e que de ende maig da estrutura ps(quica do anafÍsta do ue a uela eculiar do acÍente. Em princípio, a contratrans- ferência ro ..!iamenle_dita ' c.mesrno fenômeno da transferência acontecendo no analista mas tal- 'l;~\ vez possamos dilerenciar uma transferência do.ana-; jJ Instâncias psíquicas ( Ponto de vista / estrutural Ego Superego Id C>Jt---- \ Complexo de Édipo. posições ( Sujetto desejante Objeto desejado Objeto lnterditor ( Sistema inconsciente Representações Afetos Fantasmas Estereótipos Ponto de vista tópico ( Discursos Vivências Experiências Atitudes Comportamentos Situações Ponto de vista clínico 22 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA lista e uma contra transferência propriamente dita, que seria a resposta do analista à pw.liaridade da transferência do aciente. . ---- . Por outro lado temos~~rmo[resistênci4, ue tarn- ú;1'tém definimos rovisoriamente segundo Freud o fa- pri>Pi)a no nodo inici C0jJ10 obstáculo, dificuldade de {fi' cum rir a regWluldamenlal da livre-associa ão. Pela parte do analista existe contratualmente uma exi- gência simétrica. A sua função é a da atenção flutuante, a da possibilidade de ouvir a livre-as- sociação sem selecionar nenhum ponto em espe- cial e também de manter-se abstinentc. Ou seja, não deixar que suas convicções, seus desejos, suas idéias incidam no tratamento e o distanciem -" de seu objetivo fundamental, que é fazer cons- ~ ciente o ue é inconsciente no paciente. A \con- ~ tra-resistência aparece no analista como a difi- ~ ~ culdade para cumprir. com.seu olljetjv e_propó- ~ sito e também em últimª- instância,_com seu de- sej~g~ é Q.eJespeitar a Iivr~associação do ga- .cie~te sem violentar a regra da absli ência e con- §ervar a capacidade de atenção flutuante para po- der.analisar. - A linha que vai da transferência à resistência é óbvia porque dissemos que o fenômeno da resis- tência e o fenômeno da transferência são duas fa- ces do mesmo rocesso - ~ma não sedá sem a õutra. É lógico que a contra transferência e a con- tra-resistência são também du s ces do mes o processo no analista. ~ A linha que vai da transferência à transferência A CONCEPÇÃO FREUDIANA 23 íproca, colocando em relação a transferência do alista com a transferência do paciente, e a linha e vai da transferência à contratransferência e re- iona a contra transferência própria do analista _ m esse tipo de paciente, se corrclacionarn entre _. e são simétricas. Ou seja, transferência do pa- _:cnte/transferência do analista, contratransferência _ ste analista com cste aciente. Poder-se-ia dizer a mesma coisa uanto à re ·s- ência e contra-resistência. A impressão que dá é -;.e~ende a dizer que, no nível das relações e tre resistência e contra-resistência de-se fal r diretamente em resistências recí racas r ue a re- -i tência própria do analista, que se daria com todos pacientes e não com este em particülar, supõe-se ,ue esteja levantada, solucionada pela sua formação órica e eiã análise ~essoal à ual ele esteve sub- etido. No interior do Quadro, delimitado por quatro ntos, temos outra correlação, outra díade: ~- 2Çã~ por um lado, S elaboração, cura, repetição, recordação, lembran a, r outro. Sabemos que ~ ~enos de transferência, resistê~ontratral!.s- rência e contra-resistência têm como caraeterístic ~al ser repetitivo;, reitera tivos, recdi~- r~~, ão a enas de situações tr~ticas S91 mo de todas as situações im ortantcs e si nifiça, iv;;-a-;- vi@ Qsíg}lica de cada sujeito. Freud dis- ~~ crimina dois tipos de repetições: a @petição fiellJl isto é, de um símile idêntico, da traslação do antigo ~ obre o atual sob o signo da igualdade, e outra 24 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA ~dO que seria uma diferença. Em princí ia, a repetiçao é a tentativa d~ repetiç~o do igual, do idêntico, aquela situação exatamente igual a esta. ~ r I Neste sentido é que os fenômenõs, as formas -;7i- ~ dentes, manifestas, da repetição, se milnifestam jio r: seio do tratamento psicanalítico por meio de Isin- I ,/~ toma ou de -atuações.-~: parali~as his~ I-)P' cas, problemas sensoriais histéricos, crises de an- gústia, idéias obsessivas, rituais, enfim, tudo quanto seja sintoma e seja registrado pelo paciente como !~l. Também inclui ~, que consistem em comportamentos, atitudes condut~creJa$,-1:or- .20rais e sociais em ue se vai repejir.a.rcação que ~oi requisitada ou 9};le_nãoconseguiu ser praticada na si tuação traumática. - A repetição manifesta-se como sintomas e como atuações, como fenômenos sofridos, indesejáveis, incômodos, dos sentidos ou do pensamento, ou co- mo passagem à ação repetitiva descontextualizada. •.1;" No pólo contrário, uando a repetição realizada ~.,.,. no contexto do tratamento é interpretada.mma....r.e- ~; sistência, como tentativa de deslocar o Rassado so- Vbre o presente, quando se consegue discriminar pre- ,/" sente e passado, ela mesma provê a força necessária l para realizar uma operação que se chama @abo- ~ lembrança ou cura, cuja definição é um pou- co com licada. Vamos apelar a certo recurso, para ter uma vaga idéia do processo. Grosso modo, po- de-se reconhecer que a repetição como tal é im- possível; com reender e aceitar que a reedi ão 'á tem uma diferença, dissolver os sintomas e atua ões A CONCEPÇÃO FREUDIANA 25 transformá-Ios em verbaliza ão-com reensão, em _ue se juntam as idéias com as descargas de afeto -: rres ondcntcs. Em uma palavra: ~- & _ do. Os recursos de ue o analist dispi'ie para' /' "'?r;Segl~iresse objet"vosão rcdorninantcmcnte re- ~~vf/ :ursos verbais, relacionados com o uso da palavra /. // u o silêncio. ~s recursos de uso da palavra são vJ:!~ aStiDaT~escrição do que está acon- ~.if . cendo), a mter eta ã uma tentativa de corre- tfV·, .acionar dados do presente com dados do passado) u uma ~.ique é uma cdificação complexa que conSZgue correlacionar, em sentido amplo, todo período da vida do paciente, uma série de situa- ~ões que se retém, com a situação atual). Em realidade, estas caract('(íslicas--d(.~~sso e transferência-r;;isíência-contra-transferência- ontféHcslstência, cuj9 miolo é a repetição e s~u ontrário~ que éa elaboração, cura, lembrança, têm Ido revisadas e recorridas or nós rinci almente om base no ue Freud diZia du ante o eríodo inicial da psicanálise, que vai mais ou menos de 1895 a 1905. Tenllo fei to isto por razões pedagó- gicas porque parece que é acessível, muito claro, porém vai se tornando cada vez mais complexo na medida em que os "modelos" de como funciona o . iquismo vão se tornando cada vez mais refinados c sofisticados e o comportamento técnico, a mani- pulação destes fenômenos, também varia. Acom- panhar isto detalhadamente é um objetivo que tal- vez transcenda em muito nosso propósito aqui. Mas, passo um pouco por cima do acompanha- 26 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA mento histórico, pretendendo suplantá-Io ou solu- cionar o problema pedagógico com o Quadro 2, que é uma tentativa de síntese de uma questão mui- to difícil de sintetizar.Baseio-me em perguntas pro- cedentes para qualquer problemática: Por quê? Qual? Como? Que e quem? Quando e quanto? Onde? Por quê? É claro que se pode responder a partir de todos os recursos teóricos de cada modelo. Mas, na tradição psicanalítica Ircudiana, usa-se com fre- qüência para se explicar f!.~ lIe os ..!incíl2ios das l2ulsôes. cpmo dctcrrninantes último .ão as.Iorças que movem o psiquismo. Haveria entãQ (e sempre q-;:Ie falo de- transferência refiro-me também à re- sistência) transfcrôncia-rcsistência a serviço do rincípio do prazer e da realidade (que são dois princípios que regem o funcionamento da pulsão de vida), e uma transferência-resistência a serviço da chamada compulsão de repetição (um tipo de repetição, que não está a serviço do prazer nem .~da realidade), que não traz prazer a nenhuma ins- ~ tância do psiquismo (Ego, ld e Superego). Ela e<:!i ..• a serviço do repetir or re12etir está c mpromeÜ.da s. 7com uma te~vil.. de retornar a um estado ainda jJ prévio à existência do si uismo, como Freud de- , fine miticamente. É o que se chamayulsão e mor-Ir::~ Assi~ co~o, (~s princípios ~e ...@?-e-,:-~e rca- O}lda~e sao pr~ncl \(:s. q.ue org~nIzam_~namlca d~ )1t!.rUl~ de VIda, dirigindo seu funcl~na~~~~o, o ! p:i~cípio de iné~cia, d~ ~ui~tude abs~.luta, é o prin- t ~ c!E1o jue organiza a dinâmica da pulsão de morte. jJ. A CONCEPÇÃO FREUDIANA 27 -::uste, então, uma repetição-transferência causada Ia pulsão de vida, pela procura do prazer e a _ .itação do dcsprazcr, adequação à realidade para - Ihor satisfação e logro do princípio de prazer, _ outra relativa ao repetir por repetir, despido, "de- oníaco", relacionado à idéia de eliminar toda ten- _âo no aparelho psíquico e voltar à situação de _ r orte. "~ Quando se pergunta ~e '\.Ç{)mo'l referimo-~~~~ s a uma divisão ue Freud faz em um arti _o decfr 'cnica em 1915 onde a~é divididaj. ositiva e negativa. T~ divisão sc dCI! pelo ip<) de afeto e de investimentos que estão em jogo. ~ importante esclarecer que é assim porque habi- ualmcntc se faz confusão quando se afirma que a ransfcrôncia positiva é a que propicia a realização a cura e da elaboração, e a negativa é sinônimo. dlY"/ e resistência. Não é assim, porque a positiva -t~ disse rcud - divide-se em amistosa e erótica.·~.ÍtP Obviamente, amistosa é aquela na qual se cstabc- L 11"" Ieee um vínculo de colaboração, um investimento ublimado sobre o analista-:c:~qu;;;to que a erótica~ é a transferência de pulsôes. desejos, fantasmas do . tipo amoroso-erótico sobre o analista. A ~- rência n~gativ( é a repeti~ão de todos os elementos hostis. E importante compreender que a trans- ferência amistosa é o rnot(~ da cura, enqu~le- \ \ a transferência erótica e a hostil funcionam como resistência. A transferência positiva, amistosa, pode ~elacionada com a tendência à repetiçã.Q..f.Q- .!!lº-diferença. Em todo caso é uma repetição de 28 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA impulsos, sentimentos, fantasmas, ,'s de serem usados ara dissolver a transfe ê cia, estando mais próxima da diferença do que da re- peti ão. rn! '" ,I~ " ,vT" O ue e liuem]. As coisas ai complicam-se ,~1,..n' um pouco e temos de passar rapidamente, Agru- 9'T de vi A , I parnos o ponto e vista cconornrco e o onto de , J'i>'~ vista dinâmico, O ponto de vis!!1 econômico diz ~./ que o que se transfere s~.Q_q.uan1Ldadc· íscrcias, /- ':..atexias,qu~ explicam_o f~lncionamento d(~siquis- mo como sistema no qual se roduzem, se distri- ~ e scdcscarregam en~rgias, Repete;:;;e dis- r/ tribuiçôcs cncrgéticas, c~te~ ~odalidades deV descarga. Do ponto de vls,ta(dtnamlqJ, reg,etem-se jogos de força e conflitos entre as ulsões de vida e de mo e, O conflito estabeleceu-se em dctcrrni- ' nado momento e repete-se como jogo de forças, Poder-se-ia acrescentar aqui defesas, impulsos, de- sejos, Repetem-se como processos. Na primeira tó- ica, diferencia-se rocesso primário e processo se- cundá 'o. O que vai se repetir é uma articulação peculiar que se dá entre o processo primário e o secundário que historicamente tende a reiterar-se no presente. Repetem-se desejos, Repetem-se vín- culos e suas escolhas de objeto (objeto libidinal). I Repetem-se "rela ões ob'et is". ~~ Do ponto de vistaLestruturiJ] podemos dizer que rY o que se reitera na situação terapêutica são todas estas coisas ordenadas segundo o complexo ~e é fundante e constitutivo do aparelho psí :ico: o~;-- - ~ o, E o conjunto de impulsos, pul-- A CONCEPÇÃO FREUDIANA 29 - ,desejos, fantasmas, escolhas de ob'etos rc- ""csentações etc. ue confi Juram o famosíssimo .:onjunto constitutivo da "p-ersonalidade" ou da "na- ureza" ~o sujeito, com9., também as instâncias gue J.i! com poe!E.:. ••1"'~; O ponto de vista tópico já o antecipamos. Vamos ~ pctir: fantasmas inconscientes ,ue ~ão ce~ifka-I"-y õcs -=-~xtos em que os desejos inconscientes 'r parecem con~ realizado~, Claro que do ponto de 'ista consciente e, segundo Freud, também incons- lente, repetem-se afetos cujos sinônimos são sen- timentos, paixões, emoções, Esses termos não são inônimos precisos. E por isto a transferência cos- luma ser um fenômeno intensamente vivido. epresentações são as marcas que detalha~os antcnorrncntc. Têm~a característica, segundo disse Freud nos primeiros trabalhos, de que a idéia ou a significa 'ão ue a arece no momento de repro- dução da transferência é um elemento Q,llç se presta tanto à emergência do re rimido inconsciente ua - to à defesa cont ele. Sua transformação é devida à exigência de torná-Ias mais toleráveis para as ins- tâncias superiores do psiquisrno. Esta representação, ~ mista - por um lado, repetição inconsciente, e~ll.J> por outro, um "ajcitarncnto", uma solução de com- Jp;JP prornisso com o presente e os sistemas pré-cons- ciente e consciente - é o que se chama .:.9RM~- ~. Sel~ssin.0_n~mos~ãº: f~r- ma ão t' .. . I 'lmbem denvados do 1Il- consciente, cuja principal expressão é o sintoma. Na transferência, aparecem como a representação 30 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA intolerável que não pode ser cornunicada. Freud fala ainda em estereótipos, ou seja, modelos, esque- mas, cngramas, que se repetem exatamente assim como são e se mostram deformados . •~.ÓJ- Do,ponto de vista \~línic(u falamos em tudo isto ~ q~ já mencionaml~s: vivências, experiências, si- ~.;JI tuaçõcs, atitudes ... ~laro que tudo que seja des- crição da repetição não é muito valorizado na psi- canálise or ue a transfer6ncia não é um fenômeno-:<:---"..-...,----- . Çjue 120ssa ser descr~ E um fenômeno que deve ser entendido, decifrado com todo o instrumental teórico de que a psicanálise dispõe e abordado com todos os recursos técnicos que lhe são caracterí- sticos: interpretação, construção. Não se pode ca- racterizar a transferência pela repetição de atos, pensamentos ou afetos conscientes e dcscritívcis porque a repetição transfcrcncial - é claro - tem muitos aspectos de repetição cmpírica. O sujeito vai apresentar, frente ao analista, uma série de ati- tudes, idéias etc. que já teve antes. ~ transferência, digamos, tem uma repetição visível, dcscritívcl, consciente. Mas ela é predominantemente incons- ciente e deve ser reconstruída. <; gue se IÇiSte deve ser "descoberto" como tal. A. Ji}, ~nte, a última pergunta: "onde'?" Isto é ~ importante explicar para concluir.~insiste que ,vepetição transferencial é um fenÔmeno universal. Onde há su'eito sí uico, em todas as atividades humanas, há transferência., O sujeito psíquico é "movido a transferência", como se diz de um carro que é movido a álcool ou gasolina. A situação ana- A CONCEPÇÃO FREUDIANA 31 lítica é uma das tantas situações em que a trans- ferência também vai aparecer. Só que a situação psicanalítica estaria especialmente de~enhad~ par~1 ..•,0 que a transferência a are -a com maIOr rapIdez C6yP'y intensidade (j.QJlroseà~r.illJBcrência) e com majQr ~.~~ possibilidade de ser dife~encia~la ou distinguida..s;o-~ mo tal e correta me te dissolVida s~rerada ou l2er- laboral a. Por isso, Frcud insiste muito nos artigos sobre técnica em que uma série de fenômenos,ren- dimentos, produtos da transferência não devem ser considerados como absurdos, ridículos e exclusi- vamente criados elo tratamento sicanalítico, por- que as mesmas forças 9.ille... roduziriam rendiment s similares' fora da análise são as ue . uoduzcm dentro. As pessoas apaixonam-se, excitam-se se- ~ente, irritam-se, agridem pelos mesmos "mo- tivos" transfcrcnciais. Igual acontece na situação psicanalítica, embora o analista julgue que ele não dá pretextos "reais", "naturais", para que estas rea- ções lhe sejam encaminhadas. Por isso deve-se dar garantia de que a transferência não será corres- pondida, não será utitizada. Apenas nos serviremos de uma parte dela, da amistosa, para perlaborar, dissolver, marcar a condição de mec.íl.D·s caico s!S2. re.àll,l. Por último, isso não quer dizer que não existam situações na vida em que a perlaboração da trans- ferência Iam bérn seja possível. Não devemos nos esquecer de que os homens amavam, adoeciam e curavam-se antes de existir psicanálise. Evidente- mente, parece que este procedimento está desenha- 32 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA do para conscgui-lo com maior propriedade e fa- cilidade. Infelizmente, é impossível aprofundar e insistir mais nesta questão. Mas, se for revisada cuidadosamente, pelo menos servirá para levantar alguns dos preconceitos que costumamos ter em relação ao tema. INTERVENÇÕES E PERGUNTAS - Pedido de aclaração acerca da repetição e a diferença na tral1.\ferência. Resposta: Tentarei dar uma explicação provi- sória. Talvez seja esclarecido nas exposições se- guintes. Quando Frcud fala em transferência po- sitiva e a divide em amistosa e erótica, deixa claro gue a transferência erótica é da orde-;;da tentativa de e etir o i_Tual. ~petir uma situas.,ão de aixão causada por desejos e investimentos arcaicos. Reconhece também na força, nos im- pulsos, nos fenômenos da transferência um efeito amistoso em que, pode-se dizer provisoriamente, o que se re ete é' lilo gue já foi diferente de---~--- ----- outras situações na situação J2asgd(~ gue se repete é uma capacidade de distinguir a.di Icrcnça. Isto será melhor entendido talvez nas próximas aulas, quando poderei falar das implicações filo- sóficas na transferência. Em qualquer processo temporal, se tudo se re- pete, não há processo. Se nada se repete, não há A CONCEPÇÃO FREUDIANA 33 '/ csso. ~a tran::.fç.rência amistosa, o que se repete ~p~ _ Q..uecada..Yez é diferente. O que retoma, não-- igual._Retoma o diferente. - Se a transjerência implica a repetição do su- '0 e de situações vivenciais, em que medida o texto econômico, social, político de sociedade erjere na vida do sujeito? Existe o risco de se ir em um reducionismo porque se ele vive uma Ilação de repetição, seguramente tem uma so- edeterminação de múltiplas causas. É possível criminá-las? Resposta: Em rigor, este é um problema parti- cular de uma questão mais geral que consiste em mo incidem as determinações de natureza não- íquica ou de natureza psíquica consciente para odclar, transformar, modular o funcionamento, as crcrminaçõcs e as formas inconscientes. Respon- er a isto não é brincadeira ... É um problema de Icna atualidade em psicanálise. Afeta não apenas transferência, mas a todos e a cada um dos me- anismos do funcionamento psíquico. A psicanáli- , tanto a Ircudiana quanto a atual, não tem um acordo concludcn te a este rcspci to. Existem posições que vão desde uma afirmação e que a psicanálise não tem recursos teóricos nem mctodológicos ou técnicos para tomar em conta essa . ibrcdctcrminação e interferência dos outros fatores da realidade nos processos psíquicos. Assim como não se pode fazer feijoada com um coador, não se 34 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA .v pode ~l~l.rco~t? de.stes fenÔ~enos com a psicanálise. V'\V A \ps,canahs4 ~erve estritamente para Isto _. dar ~ j ~Olll'~ d.as ~lete~mlOações "ígu~ca~ inco s "CJ1J~<;-- ~..,o;p e,pa~d l,ncl~lr, ~~)m :ecursos ~SlqlllCOS: predoml~an- V temente verbais e IOterpretatIvo~. EXIste a posição diametralmente contrária que diz que a psicanálise é um procedimento cujos recursos para isolar outras variáveis incidentes, intcrvcnicntcs, que não sejam as propriamente do psiquismo são insuficicnrcs. Serve apenas para TRADUZIR a interferência den- tro do si uismo das var;iíveis não-!2&.CLuic~. E um procedimento que acontece imcrso nesta realidade e está permanentemente sujeito a todas estas de- tcrrninaçôcs. Tanto do ponto de vista do paciente, quanto do ponto de vista do analista, como do ponto de vista do contrato, da situação que se cria no dispositivo analítico, iLpsicanálise (para realmente dar conta de seu objeto) tem de se articular com outras leituras e outros rocedimentos. Caso con- trário, arrisca-se a não resolver a robIcmática ue scf..preten e transformar, porque só dará conta de ~ma de suas determina~.QQi. Se se -;)~pr~u mais ou menos qual é esta problemática muito am- pla da disciplina e sua articulação com outras dis- ciplinas, de sua condição de fato social-histôrico- político-ideoI6gico, multiplamente determinado, estará claro que a transl"crência é um dos preces- sos-Icnôrncnos que se dá neste marco. Há quem diga que a transferência é um fenÔmeno determi- nado por estereótipos inconscientes e que as situa- çõcs reais, concretas, podem dar um pouco mais _b A CONCEPÇÃO FREUDIANA 35 ou um pouco menos ocasião para que os estereó- tipos se repitam. Mas, sua natureza inconsciente e repetitiva vai acontecer sempre - fatalmente - por uma dinâmica própria que não é incidida, cor- rígida ou piorada por nenhuma outra determinação (histórica, política, social etc.). Existem os que afirmam que não é assim. Na transferência, quando se constitui, tudo aquilo que vai ser repetido, e quando se repete, o faz em estrei- ta conexão com a vida biológica, social, política ctc, A magnitude, a intensidade da repetição não se deve estritamente às determinações psíquicas e sim à confluência de todos os fatores. É por isso, por exemplo, que Freud dividia as famosas séries complementares em série disposicional e série de- scncadcantc, sendo que talvez se possa pensar que essas séries são obviamente situações histórico- social-biológica complexas, embora deva cscla- rccer que esta é uma questão em plena discussão dentro da psicanálise. Diria que escolher uma pc- sição a esse respeito é uma decisão não apenas psicanalítica e cpistcrnológica, como também uma escolha política. Levantando o problema de maneira menos ampla do que você colocou, ele está concctado com outras questões circunscritas. Por exemplo, as definições que dizem sobre o que se repete não têm igual adesão entre os analistas. Para alguns, falar de al- gumas das coisas que se repetem e que figuram no nosso quadro não tem o. menor sentido, porque não são questões que tenham sido enfatizadas pelo 36 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA A CONCEPÇÃO FREUDIANA 37 deciframento, orientação psicanalítica que certos psicanalistas subscrevem. Para alguns analistas, por exemplo, o que importa é que o que se repete são representações, fantasmas ou, por exemplo, rcla- çõcs objetais. Que se repitam distribuiçües econô- micas da libido não interessa demasiadamente. Me- nos ainda que se repitam atitudes, condutas, com- portamentos, porque alguns analistas são drásticos nesse sentido. Comportamentos, condutas, atitudes não nos interessam ... Isto é objeto da psicologia. Não é objeto da psicanálise. Dito de forma um pouco grosseira, o que interessa é que se repitam palavras, ou seja, sentidos, significados Ou signifi- cantes, como se queira chamá-Ios. Por outro lado, isto está conectado com a famo~a questão de que, se a transferência é um fenômeno exclusivamente psíquico, inconsciente e objeto da psicanálise, é mais factível afirmar que é no seio do tratamento psicanalítico onde poderá ser enten- dida, interpretada e pcrlaborada. Se a transferência é um fenômeno complexo, resultante de múltiplas determinações, podem existir numerosas situaçôes vitais que sejam capazes de desencadear a transfe- rência e resolvê-Ia. - O quevocê colocou faz pensar nas diferentes orientaç6es teâricas da psicanálise. Até onde Freud foi neste sentido? O que é reelaboração ou' relei- tura de Freud? mitaçõcs, é uma tentativa (pelo menos) não de ana- lisar, e sim de lemhrar as características polirnorfas, as numerosas versões que a transferência tem em Freud. Dizer até onde foi Freud, o que é de Freud e o que é rcclaboração posterior de outros autores é praticamente o tema de nossas próximas cxpo- siçõcs, ainda que muito simplificadamente. Para responder à sua pergunta em termos muito gerais, diria que todos os autores e analistas que têm co- locado posições novas - digamos, invenções -, com relação à definição de transferência, reconhe- cem que nenhuma delas surge do nada. Todas têm pinçado, selecionado algumas definições Ircudianas da transferência. Todas elas têm hipertrofiado, cx- clusivizado, e trabalhado produtivamente posições frcudianas para desenvolver aspectos novos. Pode- mos dizer que nenhuma das rcclaboraçôcs parte de uma base inexistente. Todas escolheram diferentes momentos da obra de Frcud, diferentes tratamentos que ele deu à transferência no transcurso de sua obra tão com plcxa e divcrsificada. A pergunta que caberia aqui, talvez, seria a seguinte: Frcud deu uma versão final, um fechamento de todo este polimorfismo do fenômeno transfcrcncial? Não que eu saiba. Haverá talvez um autor que dirá (e isso é freqüente): "Aqui está o fechamen- to: esta é a última versão frcudiana. Por isso eu a tomei para cdificar minha teoria". Isso é ca- ractcrfstico dos analistas. Cada um diz isso. Eu, por uma questão de ignorância ou de originali- dade, direi que não sei qual é a versão definitiva.Resposta: Esta exposição, com todas as suas li- 38 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA Por isso, limito-me a transmitir a maior quantidade de versões freudianas da transferência que conheço. A CONCEPÇAO ANGLO-SAXÔNICA - Você disse que estaria imbuído um conceito de transferência em cada modelo do aparelho psí- quico. Poderia fazer a exposição do modelo do aparelho psíquico da histeria e do complexo de Édipo com relação à transferência? HO.lE pretendemos repassar o concei to e transferência tal como apareceu na obra de Me- lanie Klcin, Em rigor, tratar deste tema em Melanie Icin é um pouco diferente de tratá-Ia em Freud. O conceito de transferência em Mclanic Klein não tem, em nenhuma parte da obra, um tratamento teórico exclusivo ou deliberado. Pelo contrário, a técnica em Melanie Klein tem dado grandes con- iribuiçõcs à abordagem opcracional e instrumental da transferência. Teremos, então, de lembrar um pouco mais as contribuições gerais da teoria de Mc!anie Klcin, situando uma ou outra conseqüência teórica que tais contribuições têm sobre o conceito de transferência. Trataremos de enfatizar as "me- didas práticas" de manejo da transferência que ela inventou e que realmente ocasionaram uma espécie de pequena revolução no procedimento psicanalí- tico. O primeiro caso de análise de criança que se conhece na história da psicanálise foi a peculiar análise feita por Freud sobre o famosíssimo Hans, o "Joãozinho". O garoto apresentou uma quantida- de de fobias, e seu pai, que havia sido analisado Resposta: Deus nos dê longa vida ... Realmente, neste momento, já estava a ponto de encerrar esta exposição. No entanto, a forma mais simples, mais econômica e menos sofrida de pelo menos abordar a questão será ler o verbete TRANSFERÊNCIA no Vo- cabulário da Psicanálise, de Laplanche e Pontalis, onde foi feita uma explicação breve, certamente muito clara, da transferência no período da histeria, da transferência em A Interpretação dos Sonhos, da transferência nos casos clínicos, ela transferência nos artigos técnicos (1910-1920), da transferência em "Inibição, sintoma e angústia". E, digamos, os pseudofechamentos com a transferência no "Esboço de psicanálise". Nessa obra póstuma, em duas ou três páginas, dará mais ou menos para fazer a di- ferenciação. De qualquer maneira, esta exposição serve para que saibamos que as diferentes exposi- ções de transferência não fazem senão cnfatizar al- guns destes elementos. Se aceitamos a idéia de que não há nenhuma versão definitiva, será um grande estímulo para continuarmos estudando a transfe- rência. 40 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA A CONCEPÇÃO ANGLO-SAXÕNICA 41 Freud e era interessado pela psicanálise, resol- veu empreender uma espécie de análise familiar - ele mesmo (o pai de Hans) atuando como psi- canalista de seu filhinho sob a supervisão de Freud. Esta primeira análise concreta de uma crianca teve caráter um tanto esdrúxulo. O terapeuta era' o pai do paciente e Freud - o terapeuta do pai - era o supcrvisor. Felizmente a ortodoxia ainda não esta- va em moda nessa ~poca, o que permitiu abrir um capítulo interessante da psicanálise. Não houve uma análise direta de um paciente infantil. Anos depois, algumas terapeutas, especialmente analistas mulheres, estavam cientes da existência da "doença mental" nas crianças, não apenas pela observação como também porque as obras teóricas de Freud já haviam colocado o fato de que a neu- rose e outras doenças começam na infância e não apenas ocorriam na maturidade. Estas psicanalistas tentaram aplicar a psicanálise em crianças. Uma delas foi Sofia Morgenthal e outra F. Helmuth, que fizeram ensaios simultaneamente com Anna Freud. As tentativas das duas primeiras não deram muito certo, o que as desanimou, enquanto Anna Freud desenvolveu um método sistemático de análise de crianças. Afirmava ela que as crianças não estavam em condições de ser diretamente analisadas porque não possuíam o aparelho psíquico totalmente cons- tituído. O superego não estava inteiramente implan- tado. A capacidade de simbolização e de compre- ensão das interpretações e de aceitação da regra fundamental sobre a qual se edifica () contrato psi- canalítico eram limitadas. Anna Freud propunha que, para analisar crianças, elas deveriam passar num primeiro momento por um processo educativo, informativo, em que o terapeuta deveria reunir-se com elas em várias oportunidades e explicar-Ihes em que consiste o trabalho psicanalítico, observar o grau de desenvolvimento intelectual, moral etc. Só- depois desse período é que se poderia propor um tratamento mais ou menos similar ao modelo do adulto. Na mesma época mais ou menos, apareceu a célebre psicanalista Mclanic Klein, que era paciente de Abraharn, um' dos principais colaboradores de Frcud, que afirmava o contrário. Dizia que as crian- ças são perfeitamente passíveis de análise e que a análise de crianças é mais fácil e direta do que a análise de adultos em muitos sentidos: na medida em que estão mais "próximas de seu inconsciente", dispõem de defesas secundárias menos consolida- das etc. Deve-se, é claro, tomar consciência de que a atividade expressiva da criança - aquilo através de que a vida psíquica da criança se manifesta -, predominantemente, em sua vida cotidiana, era a brincadeira, o jogo. O erro de Anna Frcud consistia em querer aplicar à criança um procedimento próprio do adulto, exi- gindo dela material verbal associativo, o que não 6 o modo prcvalcntc de expressão da criança, em- bora seja capaz de fazê-h O que se devia fazer era colocar a criança em condições as mais "na- turais" possíveis e simplesmente sugerir-lhe ou dar- .. 42 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA lhe elementos para que brinque, para que jogue. O jogo espontâneo da criança é, nela, um material tão expressivo, significativo e representativo das formações inconscientes como o discurso verbal livrc-associativo do adulto, Eis o que Melanie Klcin começou a fazer. Depois de alguns anos de expe- riência foi selecionando e rcclaborando na teoria freudiana os aspectos da doutrina que lhe pareciam mais inteligíveis e úteis na compreensão e inter- pretação do jog« da criança, Aí é que se cdificou a teoria ou tendência klciniana em psicanálise. Me- lanie Klcin, como todos os continuadorcs de Frcud . , não toma a teoria freudiana completa, in totum, e sim seleciona aspectos da mesma, queextrai e ar- ticula à sua maneira, introduzindo outros recursos provenientes sobretudo de correntes lingüísticas e filosóficas anglo-saxónicas da sua preferência. O sujeito psíquico, para Melanie Klein. com- põe-se de uma unidade que ela chama de sar, que compreende aproximadamente todas as instâncias psíquicas anunciadas por Freud em sua segunda tópica. O sclf constitui-se desde o começo por relações com os objetos significativos no desenvolvimento de uma criança, A etapa anterior à constituicão do self é um período de total dispersão e fragme~tação do psiquismo, que lembra muito o que Freud cha- mava de auto-erotismo, situação em que o aparelho psíquico não está constituído e compõe-se de uni- dades eróticas que funcionam ao acaso e geram impulsos parciais que podem satisfazer-se em qual- A CONCEPÇÃO ANGLO·SAXÔNICA 43 quer outra zona crógcna ou na mesma que a origina, Cria-se um universo anárquico, disperso, fragmen- tado. quc os alcrnâcs chamavam schpaltung ou zcr- sclrpaltung (fragmentação), O scl I constitui-se quando o universo anárquico organiza-se. unifica-se em uma entidade coerente. Isto acontece tendo co- mo prccondiçáo uma relação complexa e indispcn- sávcl com os objetos que são os outros sujeitos responsáveis pela criança. por sua criação, Existem forças que movem esse organismo psíquico; estas forças são o que Mclunic Klci n chama de instinto de vida e instinto de morte, Vocês podem perguntar se em Mclanic Klcin existe a diferença tão co- nhecida entre "iusti nto" c "pulsâo". Esclarecemos que tal diferença. para Mclunic Klcin, é irrclcvantc. Ela lula cru instinto algumas vezes e em outras, de pulsâo. Náo é uma di [crença que lhe interesse dcmusiado. Neste caso, o instinto de morte é exatamente o mesmo quc em Frcud - responsável pela quietude, irnprodutividadc, dcstruiçào, fragmentação -, en- quanto o instinto de vida é responsável pelo movi- mente. atividade, junção, uniâo, organização, dirccio- narncnto das forças cic. Segundo Mclanic Klcin, para que esse organismo disperso. em estado de splilfillg. tenda ,I organizar-se, o instinto de vida c de morte devem combinar-se entre si, de forma tal quc C) ins- tinto ele vida predomine e coloque () instinto de morte a xcu serviço, aproveitando <1:--características do ins- tinto de morte par,1 cncammb.i-lo. dirccion.i-Io para tl L'rl'Sl'inll'ntn l· l'n1lul:d() li" "r!2dnl:--l1ltl psíquic«. ela· 44 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA ro que tal combinação é precária nos primórdios da vida psíquica, de tal modo que o instinto de morte continua consideravelmente indomável, não controlado, não dominado. Consegue-se, pelo me- nos nas primeiras etapas, organizar o splitting neste universo fragmentário. Mas só alcança Iazê-lo se- parando-o em duas partes mediante o primeiro me- canismo de defesa deste sclf, que é processo de dissociação. Tal dissociação, de certa maneira, or- ganiza o sclf porque evita a dispersão total, mas não consegue uni-Io além da cisão em duas partes. Esses dois setores não têm conexão entre si e vin- culam-se, por sua vez, em separado com seus res- pectivos objetos. Ou seja, os objetos também so- frem a mesma dissociação que o sei f. Esta estranha estrutura partida, que relaciona uma parte do sclf com uma do objeto, e outra parte do sclf com outra do objeto, consegue, desta maneira, que o sclf in- cipiente (que experimenta a ação da pulsão de mor- te com uma vivência muito sofrida que se chama ansiedade) possa combater a mesma e torná-Ia não inteiramente dcstrutiva. Ao contrário, consegue que seja promotora, impulsiva para o desenvolvimento. Ademais da dissociação, que divide o sele e os objetos em maus e bons, existem outras defesas, como por exemplo: os objetos bons e a parte boa do sclf serão idealizados, isto é, todas as excelên- cias scr-lhcs-ão atribuídas, todas as onipotências e maravilhas, enquanto a outra parte do self,que se relaciona com outro objeto parcial, será chamada de ruim, tendo poder de pcrsccução, dano, dcstru- A CONCEPÇÃO ANGLO-SAXÕNICA 45 tividadc. Outras defesas também serão utilizadas. Por exemplo: a negação ou declaração da incxis- tência predominantemente do aspecto ruim. A teoria de Melanie Klcin tem sido muito criticada porque os teóricos perguntam-se como é possível, nesta etapa primária do psiquismo, que se resolva chamar "bom" ou "ruim" aos dois setores do self e dos objetos, quando esta etapa é pré-vcrbal, pré-jul- gativa, pró-ética, e o sujeito primordial não tem a menor capacidade para fazer tais julgamentos. Trata-se de uma crítica injusta, porque Mclanic Klcin esclareceu muito bem que o "bom" e o "ruim" não têm nenhuma conotação moral, obede- cendo à necessidade de denominar de algum modo essas etapas com uma terminologia que, evidente- mente, é mais apropriada ao investigador do que ao sujeito. Como o sujeito chamaria esses momentos e eta- pas, se pudesse falar, ninguém sabe ... Ocorre que este momento é denominado por Mc\anie Klcin de posição, da mesma maneira que pedimos nossa "posição" quando vamos verificar o saldo de nossa conta bancária. A posição de que falamos chama-se csquizoparanóidc. "Esquizo" pela dissociação, por- que há separação. "Paranóidc" porque um lado da posição é profundamente pcrsccutório. Esta posição caracteriza-se porque o sclf e o objeto estão dis- sociados, A" ansiedades muito intensas e predomi- nantes são pcrsecutórias ou paranóicas, O sofrimen- to, o medo, a sensação de destruição são intensos. As defesas que operam no sentido de moderar tais 46 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA A CONCEPÇÃO ANGLO-SAXÕNICA 47 ansiedades são mecanismos de dissociação, ideali- zação, projeção do mau no objeto, negação etc. Teremos formas de "representações mentais" (as- sim denominadas por Nlf11jl,~ieKlein) do estado no qual o psiquismo se encontra. Este estado está composto por um determinado equilíbrio de forças e uma topografia onde se distribuem o self e os objetos, defesas etc. Trata-se de reconstruir como a chamada "mente do sujeito" consegue representar, essa situação e - além de representá-Ia - con-' segue de algum modo "ajeitá-Ia" para torná-Ia su- portável. As representações que faz o sujeito nesta etapa chamam-se fantasmas ou fantasias. Os ingle- ses têm feito uma diferenciação entre "fantasy" e "phantasy". FANTASY refere-se aos devaneios, sonhos diurnos que todos temos. l'Hi\NTASY é re- lativa aos produtos inconscientes aos quais não te- mos acesso direto, devendo ser reconstruídos, de- cifrados. Claro que nos bebês, ainda que existissem fantasmas, não existiria a menor possibilidade de acesso a esses materiais. Existe no adulto, no qual os fantasmas podem ser construídos a partir do dis- curso associativo, e nas crianças, que os manifes- tam no brincar. Tais fantasmas só serão rccons- truídos a partir da sua pcrvivência, subsistência e permanência no sujeito simbolizante, o que nos per- mite supor o que acontece no bebê. À medida que se desenvolve e realiza o processo de desenvolvi- mento psicosscxual da criança, e que a criança tem experiências boas, especialmente com o lado bom, idealizado, em sua relação entre o sclf e os objetos, produzem-se transformações de maneira que dimi- nui a dissociação e tende a produzir uma integração entre o sclf dcstruído, dani ficado, agressivo, pcr- secutório ... e o sclf prazcroso, gratificante. O mes- mo acontece com os objetos. Eles e o sclf vão se integrando, tendendo a transformar 6 self em sclf total e os objetos em objetos totais, integrados. Esse processo faz com que as defesas sejam mais fluidas, de maneira que tendem a diminuir sua rigidez e transformá-Ias em técnicas de manejo das ansieda- des. Em termos dinâmicos, predomina a pulsão de vida, conseguindo-se cada ver. mais colocar a pul- são de morte a seu serviço. Os fantasmas são cada vez mais próximos do que seria o processo secun- dário no adulto. Passa-se, então, para uma nova etapa, que Melanie Klcin denomina "posição de- prcssiva", em que se utilizam provavelmente as mesmas defesas de antes, porém mais atenuadas, acrescentando-se outras novas. Em termosgerais, diminuem a projcção-introjcção do self sobre os objetos, a dissociação, idcalização, negação e per- sccução, tendendo a transformar-se na discrimina- ção e capacidade seletiva do "normal". A proje- ção-introjcção é utilizada para fins de empatia ou capacidade de colocar-se "em lugar de outro" ou incorporar aspectos positivos do outro que enrique- cem a personalidade. A idcalização transforma-se em admiração e respeito pelos objetos reais e assim sucessivamente. Por outro lado, diminui a onipo- tência tanto da maldade quanto da bondade, do su- jeito e dos objetos, de acordo com o princípio de 48 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA A CONCEPÇÃO ANGLO·SAXÕNICA 49 ranóidc, enquanto sentimentos que a acompanham. .r'» Outros sentimentos aparecem com a entrada da~ ~ posição de ressiva) Por exemplo: o CIÚME - von- ~~. ta e de ossuir um ob'eto vaI' o que outro 110s- /;V~y. ~i e não necessariamente vontade de destruí-Io; a ~. CULPA - dor ou~orso pelos danos que se pode (' eventualmente ter causado (real ou imaginariamen- te) ao objeto; o MEDO - não tanto o medo da vingança, da retaliação, do revide do objeto per- secutório, porém o medo de causar-lhe dano peja g.gressividade e ho;-tilidade do sujeito. Surge a AN- GÚSTIA, que não deve ser confundida com ã7n----siedade (característica de todas as posições),~ é própria da posição depressiva ou pós-depressiva. Os ingleses diferenciam "angust" de "anxiety". Aparecem também sentimentos de REPARAÇÃO- vontade de curar, de consertar e construir, tanto no que diz respeito ao self e ao objeto, e ainda o sentimento de NOSTALGIA - capacidade de lem- brar o perdido ou destruído com sentimento de SAUDADE, ao mesmo tempo resignada e relativa- mente gostosa. O idioma português é privilegiado por ser o único que possui a palavra saudade, que é uma nostalgia gostosa. Finalmente, aparece com maior clareza o sentimento de AMOR - anseio do bem absoluto para o objeto e para si mesmo. Para completar o quadro, as posições, com suas respectivas formas de self, objetos, ansiedades, de- fesas, instintos, sentimentos e fantasmas, coincidem relativamente com as etapas que Freud enunciou em sua teoria do desenvolvimento psicossexual das realidade. Modificam-se os sentimentos - questão que acompanhou todo o tcmpo nossa descrição e que, voluntariamente, deixei excluída, para não complicar as coisas, Melanie Klcin atribui muitíssima importância aos sentimentos inconscientes que, em Freud, se- gundo certas leituras, carecem desta importância. Para Frcud os afetos e sentimentos são efeitos e fenômenos que pertencem à ordem do consciente, não tendo, assim, demasiada importância para a investigação mctapsicológica psicanalítica. Para Melanie Klcin, existem sentimentos incons- cientes o tempo todo, desde os prirnórdios do de- senvolvimento até a vida adulta. Alguns desses sen- timentos acompanham as características das posi- ções. São próprios da csquizoparanóidc e da cha- mada posição dcprcssiva e de uma nova etapa que Melanie Klcin não enunciou, e, talvez, poder-se-ia imaginá-Ia, a etapa pós-dcpressiva. Os sentimentos característicos durante a posição csquizoparanóidc são: a A V[[)EZ - vontade de esvaziar, incorporar completamente o objeto e, assim, anulá-to, clirni- ná-lo; a VORACIDADE - que também é um senti- mento de incorporação em que a destruição não está dada porque a incorporação é exaustiva, senão "dcsgarrantc", dcsarticuladora do objeto como se fosse mastigá-lo; o sentimento de INVEJA - von- tadc de colocar todo o mal do sujeito no objeto, porém não com o fim de possuir o bom que o objeto detém. e sim com o fim de dcstruí-ln Estas são as características da posição esquizopa- 50 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA fases crógcnas (fase oral primária e secundária, fase anal retentiva e expulsiva, fase fálica e fase genital). ~ Alpms klcinianos afirmam que a fronteira entre a tYf" slcose e a neurose, o lImIte entre a posição esqui- r,/' zoparanóide e dcprcssiva, é a fase anal secun an v ~. em ue se come a a diferençar o sujeito do objeto, o mundo interno dQ externo o self de seus objêiãS a.!.Çm de todas as outras integrações que vão se realizar. Neste plano, uma diferença importariiC é que Melanie Klcin baseia-se em suas observações •..e acrescenta uma nova etapa intermediária entre a (~J fase anal e a fase fálica - a ETAPA URETRAL1~ -, muito importante para ela, põr uanto as fanta- sias relacionadas com a urina, como urinar den ro do objeto, têm muito a ver com a inveja c vcicu- (ação de iml2ulsos inY..ej.Qso-s,. Outra~tão importante é a~diferen,Ça que eX,iste ~'f.Y\ em M. ~q~nto à concepção freudiana do gdi- ~ QSL Essa diferença deve entender-se em dois sen- "V tidos: o primeiro sentido é ue Freud afirma ue o Édi o instala-se plenamente e resolve-se entre dois e guatro anos de idade, e tudo o que acontece antes - auto-erotismo, narcisismo primário, nar- cisismo secundário etc. - ainda não pode ser con- siderado Complexo de Édipo porque as posições do Complexo de Édipo não podem estar definidas. I Melanie Q<lei~t~falado em ÉDIPO PRECOCE. -b~ ~firma ue o Edi está instaladodcsde o princíw -.nY ~ vid$L. D.!ldas as c?~acterísticas que o s~ost"" obl..etos adquirem, ~ Edipo é uma espéêíê' de dra a surrcalista no qual é difícil reconhecer os persona-- - _:.-.r- A CONCEPÇÃd ANGLO-SAXÕNICA 51 gens e as escolhas do progenitor do sexo contrário c'õmo amado ou a esco a do progenitor do mesiTiõ sexo como odiado e temido. n im, a distribuição <!.os personagens e impulsos que temos no Édipo adulto e maduro é difícil de reconhecer no Édipo precoce, porque estamos falando de ob'etos ar- ciais, nao a enas no sentido de o]),~eJ.Qs.Jlons....e..-Db- js..tos maus. Estarnos falando em objetos parciais enquanto Partes da anatomia fantãsmática dos cor- pos dos pro enitores. Fala-se em seio, em pênis, em fezes, em fluxos, de maneira tal que em uma leitura mais "realista" do Édipo esses objetos se- riam irreconhecíveis. De qualquer maneira, Melanie ~afirma que as fantasias correspondentes aos períodos primários são organizáveis edipianame.rue. Por exemplo, a fantasia clássica cIos ataques inve- josos ou ciumentos que se ode iam.Jazcr.nc 'di o adÜlto ao pai é dirigida ao pênis do pai ou aos bebês, enquanto interiores ao corpo da mãe, e assim sucessivamente. Isto tem dado um verdadeiro ca- tálogo, uma lista telefônica de fantasmas rccons- truídos pelos kleinianos, cada um dos quais mais inacreditávcI do que o outro. Tem dado lugar tam- bém a ironias e piadas e gozações das interpreta- ções kleinianas. Entretanto, é bom lembrar que todos os fantas- mas que Melanie~d~obriu e catalogou são estritamente passíveis de descoberta na clínica, especialmente n~ica de crianças e nãCi'Ínica de psicóticos n~da em gue as c-riançasainçla estariam nestas etapas e que os psicóticos perma- 52 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA necem fixados nelas ou reg!"idem a elas _o mo- mento de catástrofe ou cataclismo do surto. Pode-.:.;..:.:.;:..:;;-.::.;;...==. • - ";;;"os discutir o achado, o deciframento da clínica dos fantasmas, mas estão todos presentes. Para con- cluir, podemos dizer que no momento de saída par- JÁ,,,cial da posição depressiva vai se consolida o ~/~ processo muito importante que Melanic chama de '-J!:',.;f @mb~lizaç[2,listo é,} capacidade de elaborar, cap- -gr\ turar, orde~r os fantasmas, impulsos, instintos, de- fesas, ansiedades e sentimentos em sistemas de [e- wesentação simbólica conscicnjc. Este processo é, por sua vez, causa e efeito d e t e é o que (embora de maneira recária roduz uma. certa" alidadc". Isto fundamenta o que para Melanie Klein é o princípio da cura, não demasiado diferente daquele de Freud quando diz que a cura é a instauração e dominância do processo secun- dário. Ou seja, a capacidade adquirida pelo sujeito por meio da expressão lúdica e sua possibilidade de simbolizar as vicissitudes de seu mundo interno, de dorniná-lo, ordená-Ia, em um sistema de repre- scntações conscientes. Vejo-me obrigado a fazer toda esta passagem pela teoria klciniana, o que deve ser, para alguns,absolutamente supérfluo, redundante e desnecessá- rio, mas que nunca será demais para outros. Só assim poderei referir-me às contribuições de Me- lanie Klein acerca da transferência; é óbvio que todo este devir, este processo evolutivo, tem mo- mentos de estagnaç~ação, progressão e regrcs- são. Para Melanie~.Q que fundamcntalmc~ A CONCEPÇÃO ANGLO·SAXÕNICA 53 incide na progressão são os vínculos gue se es~- b~lecem com os objetos, predominantemente ~m os objetos bons, pcrmitindo quc os sll'citos acu- mulem experiências favoráveis, introjetcm o . o bom c o convertam no núcleo de seu self, conse- guindo assim integrar os instintos, ansiedades etc. ~)Cesso que gera a t[cgr'essãd para Melanie (~; o retroccsso, a fixação, são fundamental~~n- te as ex eriências de frustra 'ão, ..9!!.a.ndo o .~UJCItO sentc-se atacado, privado de amor, imeotente ou abandonas.It!..r.clo OfÜf.tO.Com isto, claro, podemos enumerar nove característica~ .das cont~ibuições \ ...K-I' klcinianas, não sem antes definir o que e &ransfe-~..;;y ~ncia \para Mclanie ~ Não.é nada ~ais n~da ~'.-.y. menos que a repetição gue se vaI prodUZIr, na vIçlar ~ em eral ou na situa 'ão a illili e articu r, dos momcntos de fixa ão nos uais sc ermanece or falta de desenvolvimento ou se. etorna devid à re ressão originada pela frustra.c~o. Estes mo- mentos, que implicam formas de ser do self, for- mas de ser dos objetos, formas de articulação dos instintos, ansiedades típicas, sentimentos tí- picos e fantasmas típicos, tendem a repetir-se pre- dominantementc por efeito da pulsão de morte, c.!J;a natureza, além de imobilizar, desarmar, con.- sistc em re etL As c ntribuições podem resumir-se assim: 1) A t6cnica do j~: ~ criança deve ser co- locada em condições adequadas para desenvolver a ati~idade que lhe é completamente :natucal" e predominante em sua vida, que é ?rincar. Não é 54 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA necessário pedagogia de nenhum tipo. O que se pode fazer é favorecê-Ia por meio de brinquedos e de um ambiente ro ício ao '0 TO. 2) A segunda contribuição klciniana é a proposta de que a inter reta ão não precisa es erar ue a transferência se estabeleça or ue esta se estabelec imediataments... quando há o primeiro contatqçcm. --- a-f.!iança a~sim que começa o jogo, e, por v~, ante~a relação com os pais ue consultam. 3) Se a criança está regredida a um ponto de fixação, e se o ponto de fixação significa predo- minância das posições primárias, quer dizer que haverá um predomínio da pulsão de morte, tendo como efeito a dominância na situação psicanalítica da transferência negativa. ~ interpretações d~em ser reeoces, rápidas e, por outro lado, devem estar eentradas na transferência negativa, no vínculo per- s~cutório, destrutivQ., agressi~ Só quando for com- p~eendido, simbolizado, capturado, é que o proces---- - -. so con eguirá continuar. 4) A transferência deve ser interpretada c2!!l0 um fenômeno quc está a~cendo estritamente aqui e agora na relação entre o aciente e o terª-: ~uta. O que ac;n~ fora, na relação com os pais e com o mundo, só tem importância na medida em que é manifestado para exprimir situações que estão acontecendo entre o paciente e o terapeuta. Por outro lado, a história pessoal que se pode re- construir a partir do decifrarncnto do ui e agora não tem tanta importância. O gue Freud - hamava-- ~ de construções não tem tanto peso, porque o as- A CONCEPÇÃO ANGLO-SAXÔNICA 55 sado só é im ortante na medida em uc está pLe- sente. Se se consegue simbolizar exaustivamente o presente' como transferência entre o paciente e o ànalista, ode-se tornar desneccssáno reconstruir o-assado. S) A quinta contribuição deve ser discutida quan- to a ser considerada uma contribuição ou um erro. Fica em aberto. Cada sessão '0 _o brincadeira, cada instante da rela 'ão contém um fa t . 'aJúas- ma pode e deve ser interpretado ainda ue o sujeito pareça não estar em condições de aceitá-Ia e ainda - ue nãa.o acene. O processo consiste em coiil'ffintar o fantasma com a realidade. Só que a realidade, no caso, devido à formulação anterior, reduz-se fundamentalmente à realidade da pessoa e da tarefa do analista. Em outras palavras, reconstrói-se o fan- tasma em que aparece a vontade de devorar o ob- jeto, consurni-lo com avidez, o medo de ser per- seguido por ele, destruído etc. A simbolização re- sulta da confrontação entre os fantasmas decifrados e a realidade da pessoa e da tare a a al'sta ue naturalmente não é assim e não re' de fa~.e nc- . ~ nhuma de as soisas. $ 6) Lm )rtância do rocesso de simboliza ão ue~');. ~ consiste nec~ssariamente na exposição verba.l~ ~e.:.:.ca do que fOl~nten I 9. onslste. na mudança? da qualidade do jogo, em que os bnnquedos ad- quirem a característica que realmente possuem e são manejados de maneira prazcrosa e criativa. 7) Na interpretação do Édipo precoce é primor- dial a questão da simetria sexual, cujo ponto não 56 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA A CONCEPÇÃO ANGLO-SAXÕNICA 57 foi tratado por nós na parte teórica. Em poucas ,dv-r.' palavras vamos rcsurni-lo. M.~ n!o adn:ite_o rwrrV ue Freud ostula acercaia diSers..n.sa ~...EdipoprnJaSCldino e femininQ. Não aceita o que mode a-r mente se chama a primazia do ltalus. Não con- cõr a com a definição que o ~ujei to faria da con- diçâo feminina como uma espécie de carência do órgão masculino. O modelo de compreensão Ireu- diana do Édipo é o Édipo masculino, enquanto o Édipo feminino se desenvolve como negativo do masculino. Para M.@ sada sexo tem seu Édipo e um conhecimento implícito das características ana- tômicas de seu se O homem sabe que tem pênis, e o pênis entra nas vicissitudes de seus amores edi- pianos como: vontade de possuir genitalmente a mãe, medo de pcrdê-lo pela castração do pai etc. A mulher tem, muito cedo, a plena vivência da existência da sua vagina e da capacidade de cngravidar. Por sua vez sofre um complexo de castração articulado às t}{yicissiiudes do com .lexo ~ ÉdifX~,~a~ aquelZ-vivi~o X-~ em torno de fanta~IjlLsh; destrmçao Interna, e nao ~A~da , rda do ~nis il2!.?gjnári2,. Pode-se dizer q~te f'v- conceito kleiniano do ÉdifX) femi~in() e fXJsitivo, no sentido de que é onglDal, e um iI?<2. rQQrio. Não precisa calcar-se ou contrapor-se ao outro como sendo um negativo simétrico, }. 8) A importância que os kleinianos dão aos scn- Jl"'f~ ~~entos os t~~"ª-dQ,_ no~ bons casos (existem Y"ti} kleinianos muito ruins), à consideração dQs. s~- Y' ~~ e tem-lhos dado uma peculiar sensibilidade para entender o material, que se aproxima da litc- ratura. Os literatos são os artistas do sentimento, das mudanças, dos pequenos medos, alegrias, espe- ranças, estados de ânimo .. , Pela importância dada aos sentimentos, [luitos kleinianos sã_o capazes de fazer este tipo de interpretação da transferência em"l termos de delicados sentimentos. 9) A importâôc;jj:aãdâ às ansiedades, defesas, r-_~ fantasmas e, talvez_ menos a outros aspectos, Por ()Jf" exemplo, os kleinianos julgam muito negativamente ~s "a tllações" e dão )llCa im[1ortância aos sonhos, ue não sao o seu ~(Qne". Os kleinianos opinam que, na medida em que as ansiedades são registros do jogo instintivo e do sofrimento psíquico, e na medida em que desencadeiam defesas, instintos, an- siedades e defesas, se exprimem nos fantasmas, Analisando os fantasmas, as ansiedades e defesas, consegue-se desmanchar as características adotadas pelo sclf e os objetos em cada posição, o que torna mais manejável a importância que pode ter, even- tualmente, a carga dos instintos em cada uma das posições, especialmente os instintos de morte, Resumir tudo isto não é uma tarefa fácil. Espero, pelo menos, que tenha sido ilustrativo. INTERVENÇÕES E PERGUNTAS - Você poderia explicar mais sobre a transfe- rência negativa? Resposta: Apesar de Mclanic Klcin ter escrito um artigo chamado "Observando a conduta dos be- bês", no qual se abre a ilusão de que também os bebês podem ser analisados (interessante neste mo- mento de crise de mercado que vivemos, pois, já que no Brasil há grande natalidade, a possibilidade deanalisar os bebês é empolgante ... ). Mas 'parece que os bebês não são analisáveis, até um determi nado momento, em torno dos dois anos e meio ~(~. É quando os 5ebês ganham um apa~(~ neuromuscular, sensorial e simbólico suficiente- mente desenvolvido para permitir-Ihes cumprir a atividade que é a base de Icitura do analista - a b~incadeira, o jogo. Supõe-se gue a criança eS,tejã VIvendo, neste eríodo as osi 'ões es uizo ara- nóide e dcpressiva. Como já disse, as posições ca- ~cterizam-se por não existir uma adequada inte- gra 'ão dos instintos. Não existe integração de nada. Nem dos instintos, ncm do self, nem dos objetos, o que faz com gue as ~dadcs sejam muito iin- p~rtantes, bcm como as dcfe~ que ããiTViâa e fA' de s~mbolização!êja .. po~re. Portaniõ,. o que p;e-)f dom ma, ~nLU.IQ.ç.ê.Q.9!§J.9 e a~ nega ti~. ~ Entendemos por transferência negativa o predo- t, mínio da . 'dade e a ersecução na;t - fY"r ana-lítica.:-MeIanie Klcin diz que não adianta educar~ neste momento segundo a proposta de Anna Freud,. pois toda tentativa de informações e educação cairá no campo onde predomina a pulsão de morte, a hostilidade e a persccução. A criança não vai as- similar o ue se ensina. Não adianta interpretar cnlatizando, por exemplo, a transferência erótica, 58 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA A CONCEPÇÃO ANGLO-SAXÔNICA 59 porque não é o erótico que predomina. O que prc.- d.9mina não é o amor, é o ódio não simboliza~o, não capturado no sistema de representações, nio permitindo que o impulso de vida, o erótico, o a!!l0- .!:O:iO, se desenvolva e tome a seu controle 0d1re- d.omínio da tníalidad da-\&Í.Ga-p&Í.Gfuica.Por isto é que ela prescreve que o rimeiro a ser' pr.ç.tado ~ a transferência negativa, ou seja, deve-se trabalhar a invcia a avidez, a voracidade, o ódio, o cifune,--~ a cul a crsecutória etc. O que tcm ocorrido, sem entrar em muitos re- finamentos teóricos, é que a proposta kleiniana tem sido mal interpretada. Mpitas yczes-<t~- ções kleinianas I2arecem uma desaforo, porgue en- {;}tizam tanto a maldade, o ódio, a ~Q~de de cks- tr~lir ue a crianç,a ou o adulto a~ab;m ri!siàJ:lco- lizando-sc cntendcnd2 quc são C!!!~111entc ruins ou ue nada têm de bom .. As interpretações da trans- ferência negativa não são àrticuladas com as siri- \1Is. ão se mostra ao paciente como o predomjnio---- - - - negativo não permite a emergência do positivo, o . - ue às vezes produz incremento da cul a ~ºcutória, da auto unição e, fundamentalmente do desalento. Nas palavras do paciente, seria: "Ah, então é assim ... então não tenho salvação nenhuma ..." Se isto surge necessariamente da concepção kleiniana ou não, é discutível. Em geral, vemos que surge da má com- preensão da teoria e da proposta klciniana. - Você poderia [alar um pouco mais sobre as interpretações qual/do predomina a pu/são de morte? 60 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA A CONCEPÇÃO ANGLO-SAXÔNICA 61 Resposta: Deprccnde-se um pouco da resposta anterior. Melanie Klein tem dois casos famosos, o "caso Dick" e o "caso Richard", sendo um deles descrito de maneira admirável em um livro grande, sessão por sessão, tudo que foi interpretado a Ri- chard - Relato da psicanálise de uma criança. Independentemente de coincidir ou não com a teo- ria kleiniana e com o tipo de intervenção que ins- pira, o que deve ser resgatado com o maior respeito e admiração é a vontade de ob'etivar o trabai110 que e a azo Nao sei se vocês observaram que ul-'-timamente nin ruém ublica casos clínicos. Os psi- canalistas se ocupam em rcanalisar teoricamente os casos de Freud. Mas não se sabe o que cada um faz no consultório o ue é muito negativo· ara Q dcsenvolvimento_de..n.oss<Ld.is.ciplin;I. Todos falam das teorias que adotam, mas não falam como as aplicam e ninguém sabe se dá certo ou não. Melanie Klcin fez lon as exposições de seu jeito de trabal- har. .Nesse livro, isto Rode ser a reciado. A interpretação rápida, de entrada, remete aos primeiros brinquedos que a criança pega, aos pri- meiros movimentos que faz, os quais Melanie Klein já interpreta em termos de relações objetais. Volto a insistir, há muitas críticas a fazer, porém esta é a característica. Assinala predominantemente as fantasias e impulsos destrutivos que atrapalham a liberdade do jogo. Em termos do medo que a crian- ça pode ter de que o que está se repetindo com relação ao analista esteja sendo produto da inveja, que poderia destruir o analista, a vontade de in- corporá-lo, csvaziá-lo, tirar-lhe todas as coisas boas, a vontade de cortá-lo em pedacinhos, de destruí-I o, tirá-lo de outros relacionamentos afetivos com ou- tros pacientes, com seus familiares etc. Esses fan- tasmas arcaico.s...aconl 'cem..com grande predomínio da ulsao de e CQm orussimas e dcsprazcro- sas ansiedades e com defesas rígidas contra a an- ied e Na medida em que se interpreta e se coloca em termos simbólicos, diminui a ansiedade porque diminui o temor de que isto esteja acontecendo na realidade. Localizando tudo isso como fantasma, surge a ocasião de que o lado da pulsão de vida, a transferência amorosa, apareça com mais clareza e a induza ao processo de manifestação do jogo e da expressão mais livre, criativa e compreensível. -J á que a teoria kleiniana dá ênfase ao jogo, ao brincar como forma de expressão, gostaria de saber se ela faz referência à criatividade, à ima- ginação, no caso da criança, e o que faria a res- peito. Resposta: Realmente, sim. Para os kleinianos o 2IQcesso de simboliza a ,com tudo o que implica domínio de todos os aspectos que acabamos de "i'nencionar, seria a base da sublimação e do uso .....criativo da capacidade de pensamento e de imagi- na ão e de toda atividade construtiva, não apenas at.tísüca. Há um artigo de Melanie Klcin que se chama 62 LIÇÕES SOBRE A TRANSFERÊNCIA A CONCEPÇÃO ANGLO-SAXÕNICA 63 "Acerca da importância da formação de símbolos". Há outros autores pós-klcinianos como innicoU por exemplo, que se têm ocupado especialmente disto. Eles afirmall! terminantemente gue a ca a- cidade de bicar (seja espontânea ou adquirida através de uma análise ou outros procedimentos) é o antecedente, o prolcgôrncno de qualquer outra capacidade criativa-construtiva-inventiva-sublima- tória do adulto. Existe um analista klciniano ar- gentino -@driguÇ)- que tem trabalhado sobre uma questão que, segundo me parece, responde à sua pergunta, que é a INTERPRETAÇÃO LÚDICA, no sentido, por exemplo, de que o analista de crian- ças não precisa necessariamente colocar as inter- prctaçõcs de forma verbal ou de maneira "adulta" e "ortodoxa"; §Ie sÓ precisa hrincar, por sua vez, de uma ane· ra ue adote o côdi!o le a crian usa. Se ele brinca de maneira complementar e con-- 'segue transmitir significações com esfe.recurso,..nãô recisa_ interpretar .• Com este recurso não precisa enunciar interpretações em um sentido clássico, o que é um grande desafio, porque os analistas sabem interpretar, mas não sabem brincar. Aí se coloca um desafio, uma prova. Quanto o analista conserva de uma criança brincalhona, e quanto consegue brincar novamente com fins específicos para seu procedimento? Cada sessão tem um fantasma que pode e deve ser intelpretado, independentemente do entendi- mento ou da aceitação do paciente. Em que sentido pode ser um erro e em que sentido pode ser uma contribuição? - Gostaria que você esclarecesse a quinta contribuição, quando afirma que pode ser um er- ro ou uma contribuição a questão da interpretação. Resposta: Esta é uma excelente pergunta. Não é fácil resumir a resposta. A proposta kleiniana é de que cada momento e segmento do que chama- mos "material" (jogo, discurso, sessão, período) tem um fantasma que pode e deve ser decifrado. Uma vez decifrado, eve ser comunicado ao pa- ciente independentemente de estar ou não em con- dições conscientes de assimilá-Io, aceitá-Ia. Isto tem um ~10 positivo: os analistas, sabendo que pode ser assim, que pode haver um fantasma espe- cífico em cada segmento do material, esforçam-se em decifrá-Io, isto é, diminuir aquelayarte do "ma- t~rial" à qual não prestam atenção por
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