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JAQUES LACAN O INCONSCIENTE COMO LINGUAGEM E OUTRAS CONTRIBUIÇÕES B I B L I O G R A F I A • COSTA, Teresinha. Psicanálise com crianças. Coleção P sicaná lise passo-a-passo — 3.ed. Zahar: Rio de Janeiro, 2010. • DIATKINE, Gilbert. Jacques Lacan. Tad.Francisco Franke Settineri. Artes Médicas Sul: Porto Alegre, 1999. • Jorge, Marco Antonio Coutinho. Fundamentos da psicaná lise de F reud a Lacan, vol.2: a clínica da fantasia. Zahar: Rio de Janeiro, 2010. • ONS, Silvia. Tudo que você precisa saber sobre psicaná lise. Trad. Sandra Matha Dolinsky. Planeta Brasil: São Paulo,2018. • ROUDINESCO, Elisabeth; PLON, Michel. Dicionário de psicaná lise. tradução Vera Ribeiro, Lucy Magalhães; supervisão da edição brasileira Marco Antonio Coutinho Jorge. Zahar: Rio de Janeiro, 1998. • ZIMERMAN, David E. Manual de técnica psicana lítica: uma re-visão. Porto Alegre : Artmed, 2008. Sites: • https://febrapsi.org/publicacoes/biografias/jacques-lacan/ https://febrapsi.org/publicacoes/biografias/jacques-lacan/ “SEM LACAN, FREUD NÃO SERIA O QUE É HOJE” . Silvia Ons U M P O U C O D E H I S T Ó R I A P A R A C O M P R E E N D E R M O S . . . A psicanálise, desde os tempos de Freud sofreu uma grande quantidade de ataques na forma de desvios nas premissas básicas de sua doutrina; Esses “desvios” a descaracterizavam totalmente da sua essência; O próprio Freud combateu ferrenhamente esses desvios teóricos sofridos pela psicanálise; Numa tentativa de levar o pensamento de Freud a cabo, a IPA monopolizou a formação do psicanalista; Entretanto, esta postura acabou por “atrapalhar” o desenvolvimento psicanalítico, que viu ser retirado de si, elementos preciosos da elaboração freudiana. “ UM RE T O RNO A F RE UD. . . ” • Coube a Lacan denunciar essa desfiguração do pensamento Freudiano; • Lacan era um forte crítico da situação; • Ele empreendeu uma releitura da obra de Freud; • Propôs um retorno ao “sentido de Freud”; • Mas quem foi Lacan? Q U E M F O I L A C A N ? ? ? • Nascido em 13 de abril de 1901, em Paris; • Filho de uma família de fabricantes de vinagres de Orléans (os Dessaux) de sólida tradição católica e conservadora. • Lacan é o primogênito de 4 irmãos. • Seu pai é descrito como sendo de aparência fraca e sua mãe como sendo intelectual. • A figura dominadora na família era a do avô com quem Lacan não nutria bons vínculos. O J O V E M L A C A N • Diatkine (1999), descreve Lacan como sendo um homem da cultura, que frequentava livrarias ainda adolescente; • Cursou medicina, na mesma época colaborou com a revista ‘Minotaure” (no mesmo período que Salvador Dali); • Data desse período também uma paixão pelo trabalho de Nietzsche; • Fez psiquiatria; • Era leitor de Hegel e Heidegguer e amigo de George Bataille, Sartre, Merleau Ponty, Lévi-Strauss e Jakobson. • Descrito ainda como dono de uma curiosidade insaciável. L AC A N E A P S I C A N Á L I S E Lacan iniciou sua análise pessoal em 1932 com Rudolph Loewenstein; Essa análise durou seis anos e meio, tendo sido interrompida em função de forte desentendimento entre ambos; Era reconhecido como brilhante intelectual (fora da sociedade psicanalítica de Paris, a qual não era muito simpatizante do seu trabalho); Em 1934, entra para a mesma (Sociedade Psicanalítica de Paris- SPP); A partir de 1936, após iniciar-se na filosofia hegeliana e participar de importantes grupos de grande riqueza cultural e teórica, concluiu que a obra freudiana devia ser relida “ao pé da letra” e à luz da tradição filosófica alemã. Lacan denominou o começo de seu ensino de “retorno a Freud”. Apoiando-se na filosofia hegeliana, na lingüística saussuriana e nos trabalhos de Lévi-Strauss, L AC A N E A P S I C A N Á L I S E • Devido a uma certa quantidade de desavenças, Lacan “deixa” a SPP; • Junto com outros psicanalistas, Lacan funda a Sociedade Francesa de Psicanálise (SFP); • Esta ultima é incorporada a IPA (Associação Internacional de Psicanálise), os profissionais que não concordaram com tal junção, fundaram, juntamente com Lacan, a Escola Freudiana de Paris; • Esta também acabou se dissolvendo em janeiro de 1980. • Lacan morreu no ano seguinte (1981) após a retirada de um tumor maligno no cólon. “Sou freudiano. A voce ̂s cabe ser lacanianos”. “ B A S E S ” P A RA A O B RA D E L A C A N 1) Linguística: inspirado no linguista Saussure 2) Antropológica: essa vertente foi baseada na “antropologia, de enfoque estruturalista”, concebida e divulgada por Levi-Strauss. 3) Filosófica: Lacan sofreu uma forte influência da obra Fenomenologia do espírito, do filósofo Hegel. 4) Psicanalítica: A quarta vertente de Lacan, naturalmente, é a psicanalítica, fundamentada unicamente numa releitura da obra de Freud. P R I N C I PA I S C O N T R I B U I Ç Õ E S D E L AC A N À P S I C A N Á L I S E P R I N C I PA I S C O N T R I B U I Ç Õ E S D E L A C A N À P S I C A N Á L I S E • Segundo Diatkine, Lacan tentou resolver problemas que Freud deixou pendentes; • Segundo Jorge, com a leitura Lacaniana de Freud, viu-se surgir um pensamento inteiramente novo, embora este não deixasse de ser o de Freud. Para Ele, “Lacan trouxe de volta a originalidade implicada no pensamento freudiano”. • Lacan deu abertura, para que outros analistas também denunciassem os reducionismos sofridos pelas teorias psicanalíticas no interior das “associações”; • “Refundou” a prática psicanalítica; P R I N C I P A I S C O N T R I B U I Ç Õ E S D E L A C A N À P S I C A N Á L I S E • Resgatou, no texto de Freud, algumas considerações teóricas nunca antes aprofundadas por outros estudiosos (ex. verneinung=denegação, tr ieb=pulsão, verwerfung=foraclusão); • Nomeou algumas conceituações implícitas nos textos de Freud (ex. a lógica do significante, real, simbólico e imaginário); • Pensando na forma de como transmitir a psicanálise, Lacan elaborou os ‘matemas’; • Lacan também foi o responsável por fazer a diferenciação entre Pulsão e Instinto na obra freudiana, aspecto muito importante para as teorizações psicanalíticas; • Se aprofundou nos estudos sobre Psicose, tornando esta uma condição analisável via psicanálise. P R I N C I P A I S C O N C E I T O S “Inconsciente como linguagem” “Desejo” “Castração” “Falo” “Função Paterna” “Estádio do espelho” “Tripartição estrutural” “Matemas” “Ética em psicanálise” T R I PA RT I Ç Ã O E S T RU T U R A L Real Simbólico Imaginári o • REAL – é apresentado como “aquela parte dos sujeitos que nos escapa na análise”, como aquilo que “constitui os limites de nossa experiência”. O real remete a falta originária. • SIMBÓLICO – o simbólico tem a ver com o saber em jogo na própria experiência psicanalítica, ele é responsável pelas “transformações tão profundas para o sujeito”. É aquele registro que vem ocupar no sujeito o lugar da falta real, primordial de seu imaginário. • IMAGINÁRIO – Apresenta uma falta originária; uma hiância que será preenchida pelo simbólico. Segundo Roudinesco, designa uma relação dual com a imagem do semelhante. I N C O N S C I E N T E C O M O L I N G UA G E M Com o objetivo de resgatar a cientificidade da psicanálise, Lacan recorreu aos conceitos da linguística estrutural de Saussure; A linguagem preexiste ao sujeito; Isso significa, de acordo com Costa, que desde que a criança vem ao mundo, antes mesmo dela nascer, já estaria mergulhada na linguagem, porque há um discurso que a precede; Para Lacan, o inconsciente é o campo da linguagem e o inconsciente estaria então estruturado como tal (“o inconsciente está estruturado como linguagem”); para ele a “palavra” tem tanto ou mais valor do que a imagem visual, a ponto de Lacan declarar que o ser humano está inserido em um universo de linguagem. Para Lacan, o que nos tornaria sujeitos seria a linguagem, é necessárioser sujeito para fazer uso desta. I N C O N S C I E N T E C O M O L I N G UA G E M Os sujeitos, diferente dos animais, não nascem prontos; Ele é um sujeito assujeitado a fala, como aponta Costa; Para se tornar sujeito do inconsciente, ele precisa de um outro; É a partir da fala desse outro que o sujeito do inconsciente vai se constituir, ou seja, através da linguagem; Importante: a linguagem aqui não deve ser vista como mero aparelho de comunicação, significa ir além, ter acesso ao desejo, como aponta Costa. Para Lacan, o sujeito é então efeito, produto, da linguagem, mas é necessário submeter-se ao significante para que possa falar. I N C O N S C I E N T E C O M O L I N G U A G E M • A formulação lacaniana do sujeito do significante implica pensar o sujeito pela sua relação com a fala e com o Outro. • A linguagem é soberana e preexiste ao sujeito. • Se, logo após o nascimento, o bebê grita, este grito é descarga e é a resposta do Outro que transforma o grito em apelo, em demanda. • A partir daí, a criança entra no mundo da linguagem, entra no campo da fala, mesmo que ela ainda não fale, e até mesmo que seja surda. • [...] • Portanto o que é enfatizado por Lacan na constituição do sujeito é a linguagem em que a demanda se articula. • A passagem do biológico (real) para o simbólico é realizada pela intervenção do Outro, introduzindo a demanda na criança que é demanda de amor. • A necessidade é satisfeita pelo alimento e o desejo é produzido pela hiância que se abre entre a necessidade e a demanda. (COSTA, 2010, pág. 63-64.) D E S E J O E C A S T R A Ç Ã O • A criança quando nasce, já nasce marcada pelo desejo, o desejo do Outro, “lugar daquilo que completa a mãe em seu desejo narcísico” (COSTA,2010). • Para Lacan, é pela via do desejo que o humano pode tornar-se sujeito; • O bebê então aliena-se a mãe a partir dessa imagem de um outro, e sua demanda passa a ser “ser desejado pelo Outro” ou “ter o desejo do Outro como seu desejo” . • Nesse momento então, é necessária a entrada do pai para barrar esse desejo e operar a cisão, para retirar a criança desse lugar mortífero (como aponta Costa) entre a mãe e a criança, esse movimento é o que torna a criança um sujeito desejante. D E S E J O N A O B RA D E L A C A N • Para Lacan, o sujeito não nasce pronto como os animais; • É a fala do outro que vai tornar o bebê humano um sujeito do inconsciente, ou seja ele vai se constituir pela linguagem; • Essa linguagem não é mera articulação vocal, aprender a articular palavras, ou simplesmente se comunicar; • A linguagem aqui é o que lança o sujeito numa dimensão desejante, é o que vai tornar o ser humano um sujeito do desejo. O “ F A L O ” • Os autores que antecederam Lacan focaram na díade mãe-criança; • Lacan rompe com essa teorização e postula a entrada de um terceiro elemento: O FALO! • O falo diz respeito ao pênis, mas no seu sentido simbólico. • Segundo Roudinesco, “o falo é um atributo divino, inacessível ao homem, e não o órgão do prazer ou da soberania vir il, Lacan fez dele, a partir de julho de 1956, o próprio significante do desejo, aplicando-lhe uma maiúscula e o evocando, antes de mais nada, como o “falo imaginário”, e depois como o “falo da mãe”, antes de passar finalmente à ideia de “falo simbólico”. A “ L E I D O PA I ” • Voltando a díade mãe-criança, Lacan coloca que as teorizações anteriores não se sustentariam por desconsiderar outros elementos; • Ele recupera então o papel do pai como função para a psicanálise (“a lei do pai”); • Este seria o representante da cultura e da lei; • “O pai irá exercer uma função essencialmente simbólica: ele nomeia, dá seu nome, e, por esse ato, encarna a Lei [...] a função paterna é o exercício de uma nomeação que permite à criança adquirir sua identidade” (COSTA, 2010). • Não diz respeito ao pai da realidade, mas ao seu determinante o “nome-do-pai”, que é a importância que a mãe dá a sua palavra ou a sua autoridade. “ E S T Á D I O D O E S P E L H O ” • Lacan postulou esse estádio/estágio em 1936, para designar um momento psíquico e ontológico da evolução humana; • Para ele, esse seria o momento inaugural da constituição do Eu; • E aconteceria por volta dos primeiros seis e dezoito meses de vida; • Nesta etapa, a criança já supõe uma imagem sua total pelo que vê no espelho; • Mas é a partir do reconhecimento simbólico do Outro que se dará a sua constituição. • Lacan aponta que, para a criança possa se apropriar e interiorizar essa imagem visualizada, ela necessita de um lugar no grande Outro. • Passagem de um “corpo espedaçado” para um “corpo prórpio”. D E S E J O - R S I – E S T Á D I O D O E S P E L H O • Lacan estuda o desejo humano a partir das interações entre o registro imaginário com o simbólico: • Num primeiro momento do estádio do espelho, pelo registro do imaginário, a criança acredita que ela e a mãe são um só; • Em um outro momento, quando essa criança ingressa no registro simbólico, o que é conseguido pela ação interditora daquilo que Lacan chama como “a lei do pai”, ela vai descobrir que “o desejo de cada um deve-se submeter à lei do desejo do outro”. “ M A T E M A S ” • Lacan, procurando dar a psicanálise um fundamento cientifico sólido, se vale da matemática; • Segundo Roudinesco, “Matema” é um “termo criado por Lacan, em 1971, para designar uma escrita algébrica capaz de expor cientificamente os conceitos da psicanálise, e que permite transmiti-los em termos estruturais”. S1 – é o significante mestre; S2 – o saber; $ – o sujeito (barrado); a – o mais- de-gozar É T I C A E M P S I C A N Á L I S E Teorização marcada por uma ambiguidade; Ética radical, do desejo. Ética do analista, relacionada aos papéis na análise e a transferência; Ética dos sujeitos para com o seu desejo: “a ética do juízo final” “Agiste conforme o teu desejo?” Segundo Lacan “Muitas vezes, somos Lacanianos sem o sabermos. É preciso lê-lo para tomarmos consciência de sua influencia sobre nós [...]. É preciso lê-lo para justificar as discordâncias”. Gilberto Diatkine