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Economia Industrial Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Fabio Sousa Mendonça de Castro Revisão Textual: Prof. Esp. Claudio Pereira do Nascimento Inovação e Política Industrial • Inovação e Política Industrial. · Apresentar um arcabouço teórico, a partir da contextualização his- tórica, sobre o processo de inovação, determinando seus funda- mentos e expressões; · Discutir o papel do Estado na organização industrial e as ferramen- tas de defesa e estimulo ao desenvolvimento da indústria. OBJETIVO DE APRENDIZADO Inovação e Política Industrial Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você também encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Inovação e Política Industrial Inovação e Política Industrial Bem-vindo à unidade IV do curso de Economia Industrial. Após estudar como a Economia Industrial está disposta no pensamento econômico e discutir as estrutu- ras de mercado que conjeturam a concentração industrial, pautada pelo capital fi- nanceiro e pela internacionalização do capital, vamos encerrar este curso partindo da concepção do processo de destruição criativa, o motor da evolução capitalista: o desenvolvimento tecnológico. Não nos limitaremos a abordar o desenvolvimento tecnológico sob a forma es- tática, vamos buscar sua compreensão no processo evolutivo histórico, apontando certa aproximação à escola evolucionista da economia industrial, porém indicando a dimensão crítico-social para compreender sua dinâmica e suas perspectivas. Para tanto, vamos observar brevemente o movimento dos longos ciclos de acu- mulação dispostos pelas revoluções industriais, buscando dispor os elementos que transformam as estruturas de mercado que só são possibilitadas por elas. Por fim, no intuito de completar a estrutura complexa da economia industrial proposta desde a primeira unidade, buscando fornecer ferramentas para uma com- preensão mais próxima da realidade, vamos verificar o papel do Estado em toda essa construção. O Processo de Destruição Criativa Joseph Schumpeter escreve sua obra Capitalismo, Socialismo e Democracia ainda no fim da Segunda Guerra Mundial. Observando o caminho que tomava a sociedade em meio à barbárie, indaga que a estrutura do capitalismo não é desfa- vorável ao máximo desempenho da produção, mesmo quando caracterizado pela concorrência monopolística e oligopolística. Sua crítica à escola neoclássica é explicita e não se limita a uma forma concei- tual. Para o autor, todo o ferramental da concorrência perfeita é, e sempre foi, inadequado à interpretação da economia. A análise proposta por tal escola não passa da imaginação de uma era de ouro da concorrência perfeita: “a concorrên- cia perfeita nunca chegou a ser mais real do que é no presente” (SCHUMPETER, 2017, p. 117). Esta crítica se estabelece na ideia de que a escola neoclássica propõe uma análi- se estacionária e fragmentada da economia. Ou seja, os neoclássicos retiram frag- mentos do funcionamento da economia a fim de interpretar sua estrutura, sem delimitar de onde vem e para onde vai levar tal condição. Como estão apenas preocupados com a Maximização dos Lucros, cometem o equívoco de acreditar entender tudo o que há para entender, como se a situação não tivesse passado e nem futuro. 8 9 Normalmente se vê o problema de como o capitalismo administra as estruturas existentes, enquanto o relevante é saber como ele cria e destrói (SCHUMPETER, 2017).Ex pl or É a partir dessa crítica e dessa ideia de criação e destruição que Schumpeter (2017) constrói sua análise da economia. Sua construção teórica parte da concep- ção de que o capitalismo é um processo evolutivo e orgânico. Portanto, não pode ser interpretado de forma estacionária e fragmentada. Para ele, o capitalismo é uma forma ou método de transformação econômica que se estabelece em um ambiente social e natural em constante transformação. Entretanto, o impulso fundamental que movimenta a máquina capitalista é a cria- ção de novos bens de consumo, novos mercados e novas formas de organização industrial, realizados pela empresa capitalista. Ou seja, o capitalismo está inserido na sociedade que se transforma incessan- temente, porém, o que dá o impulso para o movimento das transformações é a interferência criativa do homem de negócios. As transformações no processo produtivo são uma história de revoluções que incessantemente mudam a estrutura econômica. Essas mudanças, de dentro para fora, destroem a velha estrutura e criam uma nova de forma cíclica. Este é o fator essencial do capitalismo: o processo de Destruição Criativa. Portanto, como já discutido na unidade anterior, as relações econômicas entre grandes empresas se estabelecem além da concorrência por preços. Nesse sentido, a lógica da concorrência só pode se perpetuar no sentido da destruição criativa. Não por acaso, a necessidade constante de investimento em pesquisa e desenvol- vimento e o esforço de venda para criação de demanda. A concorrência, dessa maneira, se estabelece de uma forma muito mais dinâmi- ca do que é possível interpretar a partir da teoria neoclássica, pois uma vez que o objeto em disputa das empresas é uma incessante busca por diferenciação, novas tecnologias, novos produtos, nova fonte de energia, novo modelo de organização industrial, o que está em jogo é a própria existência da empresa. Importante! Para Schumpeter (2017), a concorrência, vinculada á ideia de destruição criativa, impõe uma vantagem decisiva em custo e qualidade, o que atinge o alicerce da empresa e não as margens de lucro e produção. Em Síntese É nessa característica que o autor indaga a suposição de baixa eficiência dos mercados com a característica de oligopólio. Uma vez que o que está em jogo é a própria existência da empresa, a busca por eficiência é fundamental e isso explica a tendência à ampliação da economia de escala e redução dos preços. 9 UNIDADE Inovação e Política Industrial Esta concorrência é tão eficaz que mesmo em estruturas em que apenas uma empresa domina o mercado, o caso dos monopólios, ela se estabelece como uma ameaça permanente, “ela disciplina antes de atacar” (SCHUMPETER, 2017, p. 122). leitura do Capítulo 7: “o processo de destruição criativa”, do livro “Capitalismo, Socialismo e Democracia”de Schumpeter.Ex pl or Para Possas (2002), esta concepção de competição de Schumpeter se propõe a interpretar a dimensão ativa da concorrência, em que se busca a criação de novas oportunidade lucrativas através da diferenciação, apontando-a como tão ou mais importante que a dimensão passiva, aquela em que se busca a eliminação de van- tagens ou diferenças entre os agentes. O núcleo duro da ciência econômica, até a contribuição de Schumpeter, estava apenas discutindo esta parte passiva da concorrência, negligenciando a dinâmica das transformações do modo de produção capitalista. A exceção se deu por Karl Marx, que identificava este processo evolutivo do capitalismo e suas forças produ- tivas, como veremos no item a seguir. As Revoluções Industriais e o Desenvolvimento Tecnológico Como apresentado desde o princípio deste curso, nosso objetivo é fazer um mergulho no universo da produção, a fim de compreender seu funcionamento. Tendo em vista a concepção do capitalismo como um processo evolutivo, nesta seção vamos aprofundar o processo histórico que apresenta a trajetória do desen- volvimento tecnológico e conjeturar o debate sobre inovação. As Revoluções Industriais O universo da produção é um processo evolutivo que nem sempre se carac- terizou pela utilização de máquinas. Entretanto, antes mesmo dos primórdios do capitalismo, algumas máquinas já se integravam ao processo produtivo. Máqui- nas estas muito rudimentares, construídas em estruturas de madeira e, em geral, baseadas na energia proveniente do vento, caso do moinho; da água, caso da roda d’água; ou da força animal. As guerras eram o elemento propulsor do de- senvolvimento dessas máquinas. Por volta do século XIII, o mundo principia uma transformação no modo de produção: começa a emergir o capitalismo. Na chamada idade média, uma das principais características da produção era o artesão. Homens que produziam obje- tos com valor de uso a partir da transformação da natureza, portanto, produziam mercadorias vendáveis. Estes homens possuíam conhecimento integral da produ- ção e eram donos dos meios de produção. 10 11 Por volta do século XV, esse processo de produção entra em crise devido a uma importante transformação no modo de organizar a produção. Os homens passa- ram a dividir as tarefas da produção de uma mercadoria, surge a era da chamada manufatura. A grande transformação proveniente dessa forma de organizar a produção se dá pela especialização da força de trabalho em etapas da elaboração do produto. O clássico exemplo da manufatura é a produção de agulhas. Um artesão aquecia o metal, dava forma, moldava o buraco e afi ava a ponta. Com a manufatura, cada trabalhador exerce de forma especializada essas tarefas. Passando a produção de agulhas a ter pelo menos quatro homens. Ex pl or Esta especialização acelerou rapidamente a produtividade do trabalho, porém não se nota nenhuma importante transformação nos meios de produção. Portanto, a transformação da manufatura se dá na organização da produção. É importante notar que nessa fase já se inicia a característica da propriedade capitalista, ou seja, o trabalho cooperado entre homens especializados começa a ser regido pela lógica da alienação, podia haver um dono dos meios de produção que pagava salários aos trabalhadores. Durante quase dois séculos, o desenvolvimento da manufatura se espalha pela Europa, as empresas passam a ser grandes e complexas, e a produção se torna cada vez mais distante do trabalho do artesão. Entretanto, chega a um esgotamen- to da capacidade de expansão ainda em fins do século XVI. O volume de capital acumulado nesse período, proveniente entre outras coisas da expansão marítima, proporciona as bases do avanço do modo de produção ca- pitalista. Na Inglaterra é onde se processou a transformação seguinte na produção, a chamada Revolução Industrial. A Revolução Industrial inglesa tem sua característica na mecanização da produ- ção. Nessa fase, a novidade se dá pela invenção de máquinas que transformaram os meios de produção. O homem passa a ser inserido na produção como parte, apêndice, da máquina, sem nenhuma autonomia, estando sujeito ao ritmo de tra- balho imposto pelo dono da empresa intermediado pela máquina. Essa etapa da produção se estabelece no mercado da indústria têxtil, sendo característico o uso da energia do vapor proveniente da combustão do carvão mi- neral. Além disso, a siderurgia aparece como um setor estratégico na produção do aço, tanto para construção das máquinas quanto para a expansão do transporte ferroviário, que configura o sistema de distribuição desse período. A mecanização da produção possibilitou à Inglaterra, já no século XVIII, cons- tituir um Império no mundo, com dimensões jamais observadas, logrando que a força da classe burguesa esmagasse, por fim, o feudalismo. As cidades passam a ser o centro da economia e o trabalho assalariado se estabelece como hegemônico onde a mecanização insere sua influência. 11 UNIDADE Inovação e Política Industrial Os limites da expansão da mecanização começam a surgir ainda no fim do século XIX, com uma grande crise na década de 1870, entretanto, sua supressão só é pos- sível após duas grandes guerras que puseram fim à sua hegemonia (BACCHI, 2008). É em meio à crise da mecanização, na ex-colônia inglesa, nos Estados Unidos da América, que principia a segunda revolução industrial. Sua característica se es- tabelece na utilização de meios de produção muito similares à fase da mecanização, porém aproximando a organização do trabalho da ciência. Alguns autores denomi- nam essa fase de técnico-científica, por esta aproximação da ciência, outros até a denominam neomanufatura, mas o termo mais comum para determinar esta fase da evolução do processo produtivo é o fordismo-taylorismo. Na organização da produção, a grande inovação se dá pelo estabelecimento das linhas de produção e do controle rígido do trabalho. O homem integra a linha de produção como órgão vivo da máquina, executando tarefas ainda mais especiali- zadas. Um operário “[...] devia seguir estritamente um procedimento nos mínimos detalhes de seus movimentos para contribuir com sua parte na produção de um objeto acabado” (BACCHI, 2008, p. 17). O objeto central dessa fase da indústria é a produção de automóveis, que se esta- beleceu como centro nervoso da economia dos Estados Unidos da América e teve grande relevância nas duas Guerras Mundiais que se seguiram. Outro fator prepon- derante é a quantidade de inovações que se estabelecem a essa época, principal- mente vinculadas à utilização do petróleo e da eletricidade como fontes de energia. Interessante notar que apesar de revolucionar o modo de produção à sua época, o fordismo-- taylorismo não proporcionou transformações profundas nas máquinas que regiam a produção. Ou seja, assim como na passagem do trabalho do artesão para a manufatura, a mudança da mecanização para o fordismo-taylorismo se dá, em síntese, na forma de or- ganização da produção, intensificando a especialização do trabalhador em cada operação (BACCHI, 2008). Ex pl or Essa fase da indústria possibilita a expansão da produção em escala como discu- timos na unidade 3 deste curso. As empresas se tornam gigantes e espalham sua produção pelo mundo através de sua forma multinacional. Outros países passam a integrar o sistema industrial de produção, com a Alemanha, os Estados Unidos da América e o Japão, os chamados países de capitalismo atrasado. As Guerras Mundiais esmagam, por fim, a hegemonia inglesa e emerge como resultado desse processo o império dos Estados Unidos da América, tornan- do os grandes conglomerados industriais a mola mestra do sistema capitalista. O produto e o sonho americano, o carro e a liberdade de consumo, passam a reger as relações sociais no mundo capitalista, assim como o modelo de produção do fordismo-taylorismo. O sistema colonial é suprimido e uma nova forma de con- trole se estabelece nas relações entre os países ricose pobres, o neocolonialismo, fundamentada no papel das empresas multinacionais (BACCHI, 2008). 12 13 No pós segunda guerra mundial, o mundo capitalista viveu seus anos dourados, sob a égide do modo de produção da segunda revolução industrial e do consumo de massas. Entretanto, o esgotamento desse sistema não tardou a dar seus sinais. Já nos anos de 1970, a terceira revolução industrial expõe sua força e transforma mais uma vez o sistema de produção capitalista. A terceira revolução industrial emerge sob uma transformação profunda na maquinaria em relação à mecanização, surge órgão de controle da máquina, os computadores, a microeletrônica, a possibilidade de programação. Esse processo estabelece na produção um sistema de automatização do trabalho, o que reduz drasticamente a quantidade de trabalho vivo necessário à produção. Para Marx (apud BACCHI, 2008), toda máquina consiste em três partes essenciais e distintas: o Motor, que é o órgão encarregado de distribuir energia para toda a máquina; a Transmissão, que é o órgão responsável por modifi car o movimento rotatório do motor de diferentes maneiras para entregar a força necessária para a máquina ferramenta; e a Máquina Ferramenta, que é órgão inserido na máquina similar às ferramentas utilizadas pelo homem artesão e na manufatura. Ex pl or O órgão de controle, disposto pela terceira revolução industrial, se insere como o quarto órgão da máquina, aquele que executa os comandos programados em um algoritmo, permitindo a automação industrial (BACCHI, 2008). Esta profunda transformação no modo de produção possibilitou uma acelera- ção na integração industrial mundial, a globalização. O processo de automação somado ao avanço da eletrônica, das telecomunicações e da tecnologia da infor- mação, permitiu ao sistema de produção atingir um nível global, sob a égide da empresa transnacional. A chegada ao século XXI traz consigo a intensa corrida por inovações que se estabelecem na concorrência à la Schumpeter, levando alguns autores a postula- rem a emergência de se discutir uma possível quarta revolução industrial: a era da automação total. A discussão passa à questão da Internet das Coisas (IoT, sigla em inglês) tendo como elementos: nanotecnologias, robôs, inteligência artificial, biotecnologia, sistemas de armazenamento de energia, drones e impressoras 3D. Acesse o portal BBC Brasil, https://goo.gl/QSWjY9 para ler o artigo “O que é a 4ª Revolução Industrial – e como ela deve afetar nossas vidas”.Ex pl or O fato é que o caminho do desenvolvimento tecnológico se estabelece na busca por aumento de produtividade e diferenciação do produto. Entretanto, esse sistema promove intensas contradições nas relações sociais, pois o trabalho humano parece se tornar cada vez mais supérfluo, levando alguns autores como Mészaros (2011) e Sérgio Bacchi (2008) a discutirem a crise estrutural ou final do capitalismo. 13 UNIDADE Inovação e Política Industrial O Desenvolvimento Tecnológico Dado o panorama sobre o processo de avanço tecnológico a partir das revo- luções, neste tópico vamos abordar como a empresa empreende a “aventura” da inovação, como já dito, em busca da elevação da produtividade e da diferenciação de produto. Seguiremos fundamentando a análise na proposta da destruição cria- tiva para compreender através da dinâmica capitalista como se dá o processo de inovação na indústria. Nesse sentido, “a empresa é concebida como um organismo vivo em perma- nente mutação que recebe influência do seu ambiente (mercado), mas ao mesmo tempo é capaz de transformá-lo ou criar novos mercado [...] a partir da introdução de inovações tecnológicas” (HASENCLEVER & TIGRE, 2002, p. 431). Portanto, não podemos tomar as empresas apenas como um agente passivo que reponde aos estímulos vigentes no mercado, pois ela pode ser o mecanismo da transforma- ção das relações de produção. “As empresas organismos utilizam as inovações para introduzirem variedades na estrutura industrial existente e criarem novas estruturas” (HASENCLEVER & TIGRE, 2002, p. 431).Ex pl or Nesse sentido, podemos identificar na teoria schumpeteriana duas noções de empresa inovadora que podem coexistir: o modelo da pequena empresa e o mo- delo da grande empresa. O modelo da pequena empresa inovadora diz respeito ao ímpeto revolucionário do “gênio criador” do empreendedor e o modelo da grande empresa inovadora diz respeito à introdução de uma rotina de inovação através dos departamentos de P&D (pesquisa e desenvolvimento). Assista à entrevista com Marco Gomes, um empreendedor brasileiro com “gênio criador” que transformou o mercado da propaganda: https://youtu.be/LMgu0btACSU.Ex pl or Tendo em vista esta proposição, Winter (apud HASENCLEVER & TIGRE, 2002) leva ao centro de sua análise a questão do ambiente econômico das empresas. Na mesma linha de raciocínio, propõe que o ambiente das empresas podem ter dois regimes econômicos: o regime empreendedor e o regime tradicional ou rotineiro. No regime empreendedor, o ambiente econômico é favorável às inovações provenientes de empresas que estão ingressando no mercado, ou seja, empresas que surgem com um diferencial competitivo ou com novo produto. Nesse caso, as práticas de inovação em empresas já estabelecidas não têm muita receptivi- dade, tendo em vista que não há barreiras significativas à entrada em ambientes com esta categoria. 14 15 No regime tradicional ou rotineiro, há a hegemonia de grandes empresas ma- duras que controlam os processos de inovação através de um esforço de P&D, estabelecendo barreiras à entrada de novas empresas, principalmente financeiras e de propriedade intelectual, pelo volume de capital necessário para participar desse tipo de concorrência. Portanto, não é um ambiente favorável ao empreendedor. Giovanni Dosi (apud HASENCLEVER & TIGRE, 2002), a partir destes dois regimes de desenvolvimento tecnológico, entende que, no fim, eles representam a evolução ou maturação de uma indústria. O autor propõe que o regime empreendedor se vincula a emergência da indústria e o regime tradicional se vincula à maturidade da indústria. A emergência da indústria se refere à fase em que há uma elevada taxa de risco à empresa, uma vez que os empreendedores se “aventuram” num processo de tentativa e erro que pode interferir nos aspectos técnicos, econômicos e comer- ciais da inovação, inclusive podendo surgir novas empresas que geralmente são as inovadoras. Nesse sentido, uma indústria que está emergindo está rigorosamente conectada a um caráter empreendedor, tendo em vista que as empresas que com- põem o mercado não possuem uma posição sólida na concorrência. Por sua vez, a maturidade da indústria se refere à condição de empresas que já estão consolidadas no mercado, caracterizadas por uma estrutura de oligopólio, em que a inovação tecnológica é uma das principais armas da concorrência (uma das, porque já sabemos que o esforço de venda compõe esta equação). Na maturidade da indústria, as empresas “são capazes de mudar as regras do jogo concor- rencial, derrubar certas barreiras à entrada e criar outras, provocar o desaparecimento ime- diato de certos concorrentes e demandar o aparecimento de outros produtores complemen- tares” (HASENCLEVER & TIGRE, 2002, p. 431). Ex pl or A inovação na maturidade da indústria vai se estabelecer no caminho de uma co- erência tecnológica que se internalize ao processo de pesquisa e desenvolvimento das empresas. O que quer dizer que os mecanismos de inovação tornam-se endó- genos aos mecanismos econômicos, portanto tem um caráter rotineiro com certa estabilidade a depender das barreiras à entrada de novos concorrentes. A empresa pública brasileira, Petrobrás, é referência no mundo em desenvolvimento de tecnologia para exploração de petróleo em águas profundas. Veja o vídeo institucional da empresa para ter uma ideia da dimensão destas inovações: https://youtu.be/VmUAkMFhM1Q Ex pl or Evidentemente as duas fases da indústria nãosão estáticas, pode ocorrer que em um ambiente de maturidade da indústria, devido à ausência de alguma barrei- ra à entrada, permita-se a emergência de novos concorrentes que transformam a dinâmica do mercado num regime empreendedor. Assim como a tendência de a emergência de uma indústria poder se transformar no caminho da maturidade, 15 UNIDADE Inovação e Política Industrial tendo em vista que a concentração de capital proveniente dos lucros em excesso, auferidos pelas empresas vencedoras, as incentivará a proteger o mercado erguen- do barreiras à entrada. Cabe compreender que no regime empreendedor há uma dinâmica mais “selva- gem” no caminho da inovação, entretanto sua trajetória de crescimento do produto é menos eficaz, tendo em vista sua incapacidade de produção em escala. Por sua vez, no regime rotineiro a criação de inovações é muito mais volumosa, entretanto, tende a se concentrar em inovações incrementais, ou seja, de baixo impacto no sis- tema de produção, dada a busca constante por estabilidade do mercado. Por outro lado, tendo em vista o volume de capital acumulado em empresas deste porte, a produção em escala e a difusão das novas tecnologias são mais eficaz. Como já verificamos, em um mercado marcado pelo oligopólio, a característica fundamental é a interdependência das empresas, o que se formaliza na forma de rivalidade entre as mesmas. Dito isto, cabe compreender que nesse tipo de conjun- tura, muitas vezes a busca por maximização dos resultados tende a ser perseguido por algumas formas de cooperação entre as empresas. Para além do âmbito pro- dutivo, no quesito do desenvolvimento tecnológico, isso fica mais evidente. Nos mercados em que as empresas cooperam entre si, a criação de tecnologia tende a avançar com mais eficiência, tendo em vista que as competências diversas são agregadas ao redor de um objetivo comum. Este dado insere como importante campo de pesquisa da economia industrial os aspectos das estratégias de inovação em cooperação entre as empresas, divididos em dois segmentos: a coordenação vertical das atividades e a padronização ou normatização industrial. “Realizar uma inovação tecnológica significa também poder se apropriar dos benefícios econômicos do progresso técnico[...]”. Porém, “a capacidade do inovador reter em seu benefício as quase-rendas ou sobrelucros gerados através da inovação não está totalmente assegurado pelo sistema de propriedade intelectual” (HASENCLEVER & TIGRE, 2002, p. 443). Ex pl or Para o caso da coordenação vertical das atividades, as empresas tendem a que- rer proteger suas inovações dentro da cadeia produtiva, evitando que no meio do processo haja interferência de concorrentes. Nesse sentido, fazem a fusão ou acordos entre as empresas que compõe a cadeia produtiva, a fim de assegurar com menos riscos que os benefícios econômicos gerados pela inovação se difundam no mercado. O modelo como esta forma de cooperação se apresenta na economia varia bastante, tendo exemplos como parcerias, redes, franquias, joint-venture etc. Entretanto, há limites para esse controle possibilitado pela coordenação ver- tical, pois: O saber tecnológico novo baseado em informação é um bem público: toda a venda de um novo produto revela uma informação a um agente eco- nômico que a utiliza para fazer eventualmente concorrência ao inovador. As formas de implementar esta estratégia são várias: licenciamento, có- pias, imitações, entre outras (HASENCLEVER & TIGRE, 2002, p. 431). 16 17 Nesse sentido, o que vai fazer diferença para a empresa inovadora é o quanto de conhecimento tácito compõe o novo produto, ou seja, o quanto de conhecimento vinculado à particularidade da empresa está embutido na novidade. Assim sendo, quanto maior o grau de conhecimento tácito presente na inovação, maior é a pro- teção que o sistema de propriedade intelectual pode oferecer. A coordenação vertical, assim, tende buscar o caminho de uma concentração cada vez maior, elevando o grau de monopólio dos mercados, o que gera proble- mas na concorrência e pode ser combatido por políticas antitruste. Nesse sentido, outras formas de coordenação se estabelecem para dar eficiência à inovação. É o caso da padronização ou normatização. A padronização ou normatização se insere na concorrência no intuito de possi- bilitar maior amplitude à difusão das inovações. Estes padrões se estabelecem tanto em produção como em uso, o que vai permitir sua difusão, mas ao mesmo tempo impor restrições à sua utilização. Dessa forma, as empresas inovadoras pressionam um aprisionamento ao consumidor e às empresas que compõe a rede interativa de produção, portanto, a palavra chave para esta característica é a conectividade. Os setores em que a conectividade é mais evidente são as telecomunicações e a informação, o que em outros tempos se dispunha nos setores ferroviários e de energia elétrica, por exemplo, pois sem os padrões não há possibilidade de conexão. Ex pl or Estas noções apresentadas sobre o desenvolvimento tecnológico contribuem para pensar como nesse sistema econômico, que se caracteriza pelo poder dos oli- gopólios em escala global, se estabelece a criação de novos produtos e o aumento da produtividade. Fica evidente que, no limite, o interesse das grandes corporações é concentrar o poder inovador e criativo da sociedade sob a égide de seus interes- ses, portanto, o incentivo sempre se dará ao desenvolvimento tecnológico pautado em suas necessidades e aspirações. Esta constatação pressupõe a não neutralidade da tecnologia, pois o potencial criativo não está desprendido dos interesses do capital e, destarte, por mais que a grande empresa não seja completamente capaz de impedir que ambientes com regime empreendedor se apresentem e desenvolvam novas tecnologias que podem ou não lhes interessar, a hegemonia dos departamentos de P&D é evidente. Dado isto, nos resta compreender como o Estado interfere na economia, tanto para ajustar a concorrência, quanto para proteger os interesses dos inovadores, fazendo política industrial. Política Industrial Na ciência econômica não há consenso entre os economistas sobre o papel do Estado na sua contribuição ao universo da produção. Várias tendências, mui- tas vezes ideológicas, interferem no debate sobre política industrial, contudo, aqui 17 UNIDADE Inovação e Política Industrial partiremos da concepção de que se trata do incentivo à produção, evocando seu desenvolvimento a um estágio mais evoluído da capacidade produtiva. Política industrial deve ser entendida como o conjunto de incentivos e regulações associadas a ações públicas, que podem afetar a alocação inter e interindustrial de recursos, influenciando a estrutura produtiva e patrimonial, a conduta e o desempenho dos agentes econômicos em um determinado espaço nacional (KUPFER et al, 2002, p.545). Ex pl or Para Anita Kon (1994), a intervenção do Estado na elaboração de políticas públicas de incentivo à produção se estabelece em três vertentes: 1-) defesa da concorrência, no sentido de corrigir as falhas da proposição do livre mercado; 2-) estimulo à iniciativa privada, no sentido de impulsionar o investimento na socieda- de; e 3-) coordenação do universo produtivo a fim de que a interação industrial seja congruente com os objetivos de política econômica. Para tanto, os instrumentos de política industrial mais comuns são as regulações e desregulações, a privatização e a empresa estatal. Por outro lado, as políticas econômicas, fiscais, monetárias e cambiais, estão indiretamente relacionadas aos objetivos da política industrial, entretanto, aqui vamos focalizar no estudo da inter- venção direta do Estado na produção. No que confere a questão de regulação e desregulação, o Estado interfere no ambiente competitivo para evitar que se estabeleça um nível de poder de mercado, com elevado grau de monopólio, que resulte em perdas ao bem estar do consumi- dor, tendo como horizonte um desempenho proveitoso dos mercados competitivos.Nesse sentido, a regulação tem em seu cerne a administração de três aspectos econômicos básicos: o nível de preços, a estrutura de preços e o objetivo da com- petição. Esses aspectos estão direcionados a estabelecer algum nível de justiça nas relações de mercado, evitando, além do quesito distributivo centrado nos preços, reduzir os impactos de externalidades negativas, como a poluição, por exemplo. Já no tocante da desregulação, o papel do Estado é reduzir a interferência go- vernamental para que o mercado seja regido pela competição efetiva. Nesse caso, a política industrial deve fortalecer a concorrência entre empresas privadas, prin- cipalmente através da manutenção de barreiras fracas à entrada, e estabelecer políticas antitrustes, a fim de evitar que fusões inadequadas orientem o mercado ao poder de monopólio. Ou seja, cabe ressaltar que fazer política industrial não pode se limitar a discutir a intensidade da interferência do Estado, sua importância se estabelece em definir bem quais seus propósitos. Nesse sentido, é fundamental compreender a particu- laridade de cada país. Segundo Kupfer et al (2002), àqueles que estão em estágio inicial de desenvolvimento, as políticas industriais tendem a ser mais ativas; por outro lado, em estágios superiores, amplia-se a participação do capital privado e o Estado toma o caráter da coordenação. 18 19 A lógica da empresa pública e da privatização se estabelece nesse mesmo senti- do. As empresas públicas tendem a estar estabelecidas em setores estratégicos de geração de excedentes para o país, podendo ser importantes instrumentos para o desenvolvimento. Entretanto, na concepção ideológica liberal, não há espaço para empresas públicas, tendo em vista que geram ineficiência aos mercados, por isso a incessante busca por privatizações. Cabe ao formulador de política industrial compreender a particularidade do país para utilizar os instrumentos de interferência na economia. Um papel ativo do Es- tado em países em que se prospecta o desenvolvimento parece ser de indissociável importância. Por isso, lançar mão de ferramentas de incentivo industrial, como as empresas públicas, e estabelecer uma lógica puramente privada em um país onde não há uma coordenação adequada das forças produtivas parece se distanciar de uma razoabilidade competitiva. Segundo Hunt e Sherman (1977), a postulação dos Estados Unidos da América como a maior potencia mundial, tendo em vista seu complexo industrial, se deu com uma industrialização pautada pela intima associação entre governo e empre- sa. No fim do século XIX, por exemplo, a adoção de políticas protecionistas con- feriu às empresas norte americanas a proteção contra a concorrência externa e o poder de monopólio para cobrar preços elevados. As relações entre governo federal e as grandes empresas tomaram a for- ma de uma simbiose, um processo no qual o governo desenvolvia seu curso de ação em consonância com os desejos das grandes empresas e estas em troca forneciam o dinheiro, a organização e a estrutura de poder através da qual os políticos ascendiam ao poder no âmbito do governo federal (p. 164). 19 UNIDADE Inovação e Política Industrial Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites O que é a 4ª Revolução Industrial – e como ela deve afetar nossas vidas Portal BBC Brasil. “O que é a 4ª Revolução Industrial – e como ela deve afetar nossas vidas”. https://goo.gl/M5ENqg Livros Capitalismo, Socialismo e Democracia Joseph A. Schumpeter. Capitalismo, Socialismo e Democracia. Capítulo 7: O processo de destruição criativa. Vídeos Boo-Box - Uma conversa com Marco Gomes, fundador da empresa CT Entrevista. Boo-Box - Uma conversa com Marco Gomes, fundador da empresa https://youtu.be/LMgu0btACSU Pré-sal: tecnologias pioneiras Petrobrás. Pré-sal: tecnologias pioneiras. https://youtu.be/VmUAkMFhM1Q 20 21 Referências BACCHI, Sérgio. La crisis final del capitalismo. Santiago do Chile: Ernesto Carmona, 2008. HASENCLEVER, L.; TIGRE, Paulo. Estratégias de Inovação. In: KUPFER, D.; HASENCLEVER, L. Economia industrial: fundamentos teóricos e práticos no Brasil. São Paulo: Campus, 2002. HUNT, E. K..; SHERMAN, H. J. Uma introdução à moderna teoria microeco- nômica. Petrópolis/RJ: Vozes, 1977. KON, Anitta. Economia industrial. São Paulo: Nobel, 1994. KUPFER, D. et al. Política Industrial. In: KUPFER, D.; HASENCLEVER, L. Econo- mia industrial: fundamentos teóricos e práticos no Brasil. São Paulo: Campus, 2002. MÉSZÁROS, István. Para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2011. POSSAS, Mario L. A concorrência schumpeteriana. In: KUPFER, D.; HASEN- CLEVER, L. 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