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Centro Universitário Ritter dos Reis – Direito da Administração Pública – 2022/2 ATIVIDADE PRÁTICA SUPERVISIONADA DECISÕES JUDICIAIS NO ÂMBITO DA INVALIDAÇÃO E CONVALIDAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS Na esfera da administração pública e nas palavras de Di Pietro, o ato administrativo é a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário. Além disso, até prova em contrário, presume-se que os atos foram emitidos de acordo com a lei, ao passo que decorrem de presunção de legitimidade, até mesmo porque, caso não existisse o referido princípio, todos os atos seriam questionáveis e, consequentemente, a supremacia do interesse público não se tornaria alcançável. Contudo, embora o supracitado, a Administração Pública, por meio da autotutela pode reconhecer que praticou um ato administrativo em desacordo com a lei. Para tanto, utiliza-se da invalidação, que nada mais é que o desfazimento do ato com base na ilegalidade dele. Não obstante, a anulação também pode ser realizada pelo Poder Judiciário. Fato é que, como regra, a Administração tem o dever de anular o ato ilegal, de modo que poderá deixar de realizar quando o prejuízo resultante da anulação for maior que o da manutenção deste ato, levando em consideração a supremacia do interesse público, da segurança jurídica e da boa-fé, e por tais razões poderá anular ou convalidar o ato. Resumindo, conforme a disposição legal, quando eivados de vício de legalidade a Administração deverá anular seus próprios atos, enquanto, na decisão que não evidenciar acarretar lesão ao interesse público e nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração. Portanto, diante da possibilidade de os atos afetarem o interesse de terceiros e o interesse público, o que se extrai é que não pode o Poder Público ficar dependente da provocação do interessado para declarar a nulidade do ato, razão pela qual é incumbido do poder-dever oriundo do poder de autotutela. Ocorre que existem outros vícios que podem atingir os atos administrativos, os quais estão previstos no Código Civil e relacionam-se com as nulidades absolutas e relativas, correspondentes aos elementos de sujeito, objeto e forma. Outrossim, no Direito Administrativo, os vícios podem atingir os elementos do ato, quais sejam: competência (quando o ato é praticado por sujeito que não é detentor das atribuições ou este pratica de forma exorbitante), capacidade, forma (omissão ou inobservância de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato), objeto (quando o resultado do ato importa em violação da lei), motivo (quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido) e finalidade (quando o agente pratica o ato visando o fim diverso daquele previsto). Assim, pode-se dizer que os atos nulos são aqueles que a lei assim declare e aqueles em que a convalidação é impossível, os quais se relacionam com a nulidade absoluta. Já os atos anuláveis são aqueles que a lei assim declare e podem ser praticados sem vícios, os quais se relacionam com a nulidade relativa. Neste ponto, quando o vício for sanável, estamos diante de uma nulidade relativa, utilizando-se da convalidação para o suprir o vício existente no ato administrativo. Em regra, a convalidação é realizada pela Administração, mas pode ser realizada pelo administrado nas hipóteses em que dependia da sua manifestação de vontade. Além disso, a convalidação é ato discricionário da Administração Pública, ao passo que é possível tão somente quando os atos inválidos não causarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros. Outrossim, nas demais hipóteses se trata de situação obrigatória, dependente do vício do ato. Quando o vício do ato atingir o sujeito, admite-se a convalidação, com exceção das matérias de competência e matéria exclusivas. Quanto à forma, a convalidação é possível quando ela não for essencial à validade do ato. Já no cerne do motivo, finalidade e objeto jamais será possível a convalidação. Diante todo o exposto, em seguida cabe analisar algumas decisões proferidas pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tanto sobre a invalidação, quanto pela convalidação dos atos, segue abaixo os colacionados: Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. EDITAL DE CONCORRÊNCIA Nº 25/2014. AUSÊNCIA DE DISCRIMINAÇÃO DOS QUANTITATIVOS POR MATERIAL E MÃO DE OBRA NA PLANILHA ORÇAMENTÁRIA. VÍCIO INSANÁVEL. PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO AO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO. ANULAÇÃO DA LICITAÇÃO. PODER DE AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER. 1. Diante do vício constatado no edital e do princípio da estrita vinculação ao instrumento convocatório, mostra-se devidamente motivado o ato que anulou a licitação. 2. Não há falar em qualquer abusividade no ato do administrador, que buscou cumprir os princípios estabelecidos no art. 3º da Lei 8.666/93, e também o disposto no art. 7º, §2º, inc. II, da mesma lei, procedendo conforme o seu poder de autotutela, matéria que já foi objeto da Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal. 3. Em se tratando de certame, ressalvados os casos de manifesta ilegalidade ou abuso de poder da administração, é defeso ao Poder Judiciário invalidar ato do administrador, porque praticado em consonância com o seu poder de autotutela, sob pena de extrapolar sua competência. RECURSO DESPROVIDO.(Apelação Cível, Nº 70076914910, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sergio Luiz Grassi Beck, Julgado em: 11-04-2018) Conforme extraído do caso supracitado, a apelante buscava reverter a anulação da licitação que participou e que tinha como objeto a construção de uma Unidade de Pronto Atendimento - UPA, sob o fundamento de que apresentou sua proposta de maneira regular e houve observação do art. 7º, inciso II, da Lei nº 8.666/93 que apenas exige que a planilha orçamentária expresse a composição de todos os seus custos unitários. Ocorre que no respectivo caso, o entendimento do TJRS é de que se constatou o vício oriundo da ausência de discriminação dos quantitativos de material e mão de obra na Planilha Orçamentária do Edital, fato motivador do ato que anulou o procedimento licitatório. Isto porque a Administração Pública buscou efetivar os princípios do arts. 3º e 7º, §2º, inciso II, ambos da Lei n.º 8.666/93, exercendo o seu poder de autotutela. Ou seja, no caso, o administrador atuou conforme a sua discricionariedade, de acordo com a conveniência e oportunidade, de maneira que a atuação do Poder Judiciário tão somente poderia atuar se verificada algum abuso de poder na decisão da Administração Pública. Nesse sentido, o TJRS considerou que a Administração Pública atuou de forma concisa no seu certame, visto que reconheceu a ilegalidade do procedimento licitatório. No que diz respeito ao vício existente, o que se extrai da situação é que este foi oriundo da forma e objeto do ato, uma vez que formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato e o resultado do ato importa em violação da lei, tendo em vista que poderia ter induzido os licitantes a erro. Por outro lado, passa-se analisar sobre decisão acerca de convalidação do ato administrativo: Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE IMBÉ. REMOÇÃO. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DO ATO PELA ADMINISTRAÇÃO. MOTIVAÇÃO POSTERIOR. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. DEVOLUÇÃO DE VALORES DESCONTADOS POR FALTAS. PRETENSÃO CONDENATÓRIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 1. A impetrante, servidora municipal, não possui agarantia da inamovibilidade. A sua lotação e posterior remoção, seguem critérios administrativos considerados a partir de certa margem de conformação normativa. 2. O ato de remoção dever ser motivado, ou seja, impõe-se que o administrador demonstre as circunstâncias fáticas e jurídicas que o levaram a praticar o ato. 3. Na situação dos autos, a Administração apresentou a motivação em momento posterior ao ato, convalidando a remoção da servidora. 4. Consoante orientação do Eg. Superior Tribunal de Justiça, “...ainda que não se tenha motivado adequadamente o ato, no momento oportuno – o ato faz menção ao art. 18, II, do Decreto 93.325/86 e à Lei 11.440/2006 – , houve a justificativa, por parte da Administração Pública, a respeito da necessidade de remoção do servidor, o que é admissível, nos termos da jurisprudência do STJ. Com efeito, "mesmo que se trate de discricionariedade do administrador público, a jurisprudência do STJ tem reconhecido a necessidade de motivação, ainda que a posteriori, do ato administrativo que remove o servidor público. Precedentes: AgRg no RMS 40.427/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 10/9/2013. REsp 1.331.224/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 26/2/2013" (STJ, RMS 42.696/TO, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/12/2014). No mesmo sentido: "os atos de remoção ex officio dos servidores restam convalidados pela demonstração, ainda que postergada, dos motivos que levaram o agente público à prática daqueles atos. Nesse sentido, mutatis mutandis: MS 11.862/DF, Rel. p/ Ac. Min. LUIZ FUX, Primeira Seção, DJe 25/5/09; REsp 1.331.224/MG, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma, DJe 26/2/13" (STJ, AgRg no RMS 40.427/DF, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 10/09/2013)”. 5. É totalmente incabível deduzir pedido condenatório de devolução dos valores descontados por faltas ao serviço na via estreita do mandado de segurança. Inteligência das Súmulas nº 269 e 271 do STF e do art. 14, §4º, da Lei nº 12.016/09. 6. Precedentes do TJ/RS. APELO DESPROVIDO.(Apelação Cível, Nº 50030913120208210073, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em: 26-05-2022) No caso supracitado, a apelante alegou que a Administração Pública realizou descontos em seu salário de maneira arbitrária e ilegal, sem que a jamais tivesse autorizado, e havendo determinação expressa de que não fosse descontado seu salário. Além disso, postulou pela nulidade do ato que determinou a sua transferência de local de trabalho. Como sabido, a remoção é ato administrativo que deve ser motivado, ao passo que o administrador deve trazer à tona as circunstâncias fáticas e jurídicas que o levaram a praticar. Ocorre que a Administração apresentou a motivação em momento posterior ao ato, convalidando a remoção da servidora, circunstância esta que já é admitida pelo Superior Tribunal de Justiça, excepcionalmente. Portanto, diferentemente do que alegou a apelante, a convalidação está nos moldes da disposição legal, de maneira que não há que se falar em nulidade e, consequentemente, invalidá-lo. Nesse ponto, considerando que o ato atingiu o sujeito, a sua convalidação é válida, razão pela qual se extrai que a ausência de motivação era sanável. Por todo o exposto, analisando as jurisprudências colacionadas, o entendimento firmado é de que a Administração Pública realiza aquilo que a lei determina e, com seu o poder-dever, invalida os atos administrativos que estejam em desacordo com a legalidade. De outro modo, por meio da convalidação poderá preservar os efeitos dos atos que estejam viciados, possibilitando a concretização do princípio da segurança jurídica e boa-fé do administrado.
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