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FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DE UNAÍ CURSO DE DIREITO AMANDA DA COSTA SADY BARBOSA EMBRIAGUEZ HABITUAL NO TRABALHO COMO EXCLUDENTE DA JUSTA CAUSA DO EMPREGADO UNAÍ – MG 2022 AMANDA DA COSTA SADY BARBOSA EMBRIAGUEZ HABITUAL NO TRABALHO COMO EXCLUDENTE DA JUSTA CAUSA DO EMPREGADO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito pela Faculdade de Ciências e Tecnologia de Unaí, como requisito para aprovação na disciplina de TCC lI. Orientador: Professor Me. José Lucas Júnior. UNAÍ- MG 2022 AMANDA DA COSTA SADY BARBOSA EMBRIAGUEZ HABITUAL NO TRABALHO COMO EXCLUDENTE DA JUSTA CAUSA DO EMPREGADO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado junto à Faculdade de Ciências e Tecnologia de Unaí, em 23 de novembro de 2022, para obtenção do título de Bacharel em Direito. ____________________________________________________ Orientador Prof. Me. José Lucas Júnior ______________________________________________________ 1° Examinador(a): Prof. Esp. Rafael Lopes Lorenzoni UNAÍ- MG 2022 É com muito carinho e amor que dedico esse trabalho a meus pais, que me ensinaram o caminho da justiça e que vibraram por cada pequena conquista até que esse momento chegasse. AGRADECIMENTOS Gostaria de iniciar agradecendo a Deus pela oportunidade de estar concluindo o curso de Direito com saúde e determinação, mesmo mediante tantas dificuldades e provações, como a covid-19 que tirou tantas vidas de pessoas amadas e queridas e foi durante muito tempo uma incerteza de futuro. À minha maravilhosa família que esteve ao meu lado em todas as provações vividas nesses 5 anos e durante a elaboração da minha pesquisa, servindo de base e apoio em todos os momentos que o desanimo me dominou e me tornou menos crente no sucesso do processo que a todo instante me moldava para o futuro dos meus sonhos. Aos meus amigos e colegas de faculdade que tornaram minha jornada mais leve e prazerosa e que hoje desfrutam comigo dos resultados da nossa persistência e determinação em fazer dar certo mesmo quando tudo parece não colaborar. Ao meu querido amor, João Lucas Monteiro que esteve esses 5 anos segurando a minha mão e sentado ao meu lado me dizendo a todo instante o quanto eu era capaz de chegar até aqui e ser a mulher dos meus sonhos, moldada pelo Direito, e por último aos meus professores e orientadores Dra. Juliana Lacerda Machado e Mestre José Lucas Junior que me auxiliaram a tornar minha pesquisa real. Muito obrigada pelo apoio. A todos que fizeram parte da minha jornada heroica e colaboraram para que a menina Amanda de 17 anos que se matriculou na faculdade, saísse pronta para a sua maior jornada, chamada vida. No veneno sempre estará o antídoto. (José Roberto Marques). LISTA DE QUADROS Quadro 01 – Casos selecionados na pesquisa .................................................... 32 Quadro 02 – Tipos de casos analisados na pesquisa ......................................... 33 LISTA DE SIGLAS CID – Classificação Internacional de Doenças CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool CLT – Consolidação das Leis do Trabalho FACTU - Faculdade de Ciências e Tecnologia de Unaí OMS – Organização Mundial de Saúde TRT 3 – Tribunal Regional do Trabalho da 3º Região SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................10 2 REFERENCIAL TEÓRICO..................................................................................13 2.1 JUSTA CAUSA COMO PENALIDADE MÁXIMA ............................................ 13 2.1.1 Causas do encerramento contratual por justa causa .............................14 2.1.2 Diferenças entre embriaguez habitual e no trabalho .............................. 16 2.2 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE E O ALCOOLISMO ......................... 19 2.2.1 Alcoolismo dentro das organizações ...................................................... 20 2.3 CONFLITOS ENTRE CLT E JURISPRUDÊNCIA........................................... 21 2.3.1 Como as organizações devem agir diante de casos de embriaguez habitual ................................................................................................................ 23 2.3.2 Reformulação do art. 482 da CLT ............................................................. 25 2.3.3 Projeto de Lei nº 83/2012 ........................................................................... 26 3 METODOLOGIA................................................................................................. 28 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............................................... 32 4.1 ANÁLISE DAS CONSEQUÊNCIAS DA DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA DO COLABORADOR ALCOÓLATRA ....................................................................... 33 4.2 AVALIAÇÃO DAS DIVERGÊNCIAS ACERCA DO ALCOOLISMO E A DESÍDIA NO TRABALHO .................................................................................................... 42 4.3 A EMBRIAGUEZ NO ÂMBITO DE TRABALHO, APÓS O RECONHECIMENTO DA MESMA COMO DOENÇA, PODE SER CONSIDERADA COMO DISPENSA DISCRIMINATÓRIA? ............................................................................................ 46 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................... 55 REFERÊNCIAS..................................................................................................... 59 10 EMBRIAGUEZ HABITUAL NO TRABALHO COMO EXCLUDENTE DA JUSTA CAUSA DO EMPREGADO BARBOSA, Amanda da Costa Sady1 LUCAS JUNIOR, José2 RESUMO: A justa causa é considerada pela legislação trabalhista brasileira uma conduta atípica, devendo ser revestida de normas específicas e limitadoras. O presente trabalho tem como objetivo geral abordar a temática da embriaguez habitual nas relações de trabalho, dando foco ao consumo excessivo e constante de álcool pelo empregado, se tornando um motivo para ocorrência da rescisão contratual com aplicação de justa causa. O trabalho justifica-se pelo fato da lei e a jurisprudência brasileira tratar de forma divergente os casos de alcoolismo no âmbito de trabalho, sendo assim, o intuito da pesquisa foi analisar a forma que o ordenamento jurídico brasileiro vem julgando os casos de alcoolismo no direito do trabalho, levando em vista as mudanças sociais trazidas pelo art. 482 alínea “f” da CLT e do reconhecimento dela como doença pela Organização Mundial da Saúde. O trabalho foi dividido em três seções, a primeira aborda a justa causa e suas vertentes, analisando todas as possibilidades de dispensa por justa causa. Na sequência, discutiu-se a definição do alcoolismo como doença pela Organização Mundial da Saúde. Por último abordou-se os conflitos de interpretação entre jurisprudência e CLT. Quanto à metodologia utilizada, esta apresenta abordagem qualitativa e tipo exploratório, método dedutivo, uso de fontes secundárias, foi utilizada a técnica teórica conceitual e normativa e a técnica de pesquisa empírica foi a análise jurisprudencial. Os dados foram coletados no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região - 2021, sendo analisados através da análise de conteúdo. Conclui-se que, a jurisprudência tem mostrado que o trabalhador alcoolatra deve ser tratado como uma pessoa doente, devendo ser afastado dasatividades laborais, mas sem extinção do seu contrato de trabalho e encaminhado a tratamento médico, por meio da Seguridade Social, ou quando se tratar de casos mais graves, ser readaptado ou até mesmo, aposentado por invalidez. Palavras-chave: Alcoolismo. Embriaguez no trabalho. Justa causa. 1 INTRODUÇÃO A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) surgiu em 1943 (BRASIL, 1943), e foi criada uma comissão para dar início a esse projeto de consolidação das leis trabalhistas. Após a criação dessas normas, muitas coisas foram sendo alteradas e adicionadas com o passar do tempo e o surgimento da necessidade por meio da própria evolução histórica da humanidade. 1Acadêmica do curso de Direito da Faculdade de Ciências e Tecnologia de Unaí – FACTU. 2Professor orientador. Mestre em Educação. Professor universitário. 11 O contrato de trabalho é um negócio jurídico e, nasce da necessidade de mão de obra por parte do empregador, sendo firmado pela livre motivação de ambas as partes e podendo ser finalizando por diversos motivos, inclusive pelo descontentamento de uma das partes ou até mesmo, por ambas. Quando se fala em extinção do contrato de trabalho é necessário entender que esta pode acontecer com justa causa, que é quando o empregado comete uma falta considerada grave e, sem justa causa, que é quando a empresa não precisa prestar informações do que de fato a levou a demitir o colaborador. Mas devido à implantação da CLT, surgiu a legislação jus trabalhista, visando estruturar a legislação, sendo responsável ainda, por regularizar as formas de extinção do contrato de Trabalho, em seu artigo 482, onde traz uma das formas de extinção de contrato chamada de justa causa (CARVALHO, 2021). A demissão por justa causa é motivada, na maioria das vezes, pela temática embriaguez habitual no trabalho do empregado. É importante entender que dentro da embriaguez em trabalho existe grandes diferenças entre a embriaguez habitual e o alcoolismo. As duas modalidades possuem características diferentes para fins de extinção contratual, onde o artigo 482, “f” da CLT considera a embriaguez habitual ou em serviço como falta grave passível de justa, mesmo tendo a embriaguez habitual já sido considerada pela Organização Mundial de Saúde – OMS, como doença sob os códigos 10, 291,303, e 305 (CID – Classificação Internacional de Doenças). O alcoolismo por sua vez, é considerado uma é doença incurável, progressive e fatal. Diante disso, o trabalhador que se apresentar bêbado ou com sintomas de embriaguez na empresa deverá ser encaminhado ao INSS e, não ser dispensado com justa causa (SOMMER, 2016). A presente pesquisa partiu da seguinte problemática: Quais as consequências de não ser reconhecido em lei o tratamento especial e o reconhecimento de doença para os casos de alcoolismo no âmbito de trabalho? E seu objetivo geral é analisar como o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região - TRT 3 está intervindo nos casos de embriaguez habitual seguida de justa causa, visto que a CLT permite tal ato, porém, essa já foi considerada doença pela Organização Mundial da Saúde (1967). Os objetivos específicos tiveram a finalidade de analisar a justa causa como modalidade de cessão do contrato de trabalho; verificar se de fato a embriaguez 12 pode ser definida como doença; identificar as principais diferenças entre embriaguez habitual e em serviço; avaliar as divergências entre o entendimento da lei e da jurisprudência acerca da embriaguez habitual; analisar as consequências da demissão por justa causa do colaborador alcoólatra; investigar os critérios jurídicos que as empresas devem usar para reconhecer a embriaguez no âmbito de trabalho; avaliar a importância da reformulação do art. 482 da CLT através da aprovação do Projeto de Lei nº 206/2003, que acrescentou um parágrafo que trata especificamente dos casos de embriaguez habitual ao art. 482 da CLT e a análise das jurisprudências consolidadas a respeito da embriaguez habitual, avaliando os julgados do TRT 3 (2021) em relação à embriaguez no âmbito de trabalho, após o reconhecimento dela como doença. O direito trabalhista é um campo muito extenso de estudo e entendimento da lei, que como qualquer outra área do direito, não se limita apenas a lei seca. Dessa forma, jurisprudência e lei seca acabam conflitando no tocante ao tema embriaguez habitual no ambiente de trabalho, gerando transtornos na sua aplicação dentro das organizações brasileiras e consequências para empregado que se encontra vivendo essa realidade (SOUZA, 2000). Este trabalho justifica-se uma vez que a embriaguez habitual no ambiente de trabalho é uma realidade que precisa ser tratada de forma mais assertiva pelas lei e consequentemente pelas organizações, a fim de proteger efetivamente pessoas que sofrem com essa doença de perderem sua única forma de sobrevivência, levando a perderem seus bens, famílias e consequentemente, suas vidas em situações desumanas nas ruas. Sendo assim, verifica-se a necessidade de adequação do artigo 482 da CLT que trata a embriaguez habitual como causa para demissão por justa causa, não trazendo em seu texto qualquer flexibilização mesmo após ser considerada doença pela Organização Mundial da Saúde. Quanto à metodologia aplicada no presente trabalho, esta apresenta abordagem qualitativa, tipo exploratório, método dedutivo, uso de fontes secundárias e foi utilizada a técnica teórica conceitual e normativa para a elaboração do referencial teórico, sendo que a técnica de investigação empírica foi a análise jurisprudencial. Os dados foram coletados no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, no período entre 01.01.2021 a 31.12.2021, sendo encontados 11 (onze) julgados e foram analisados por meio de análise de conteúdo. 13 O referencial teórico foi desenvolvido em três seções: na primeira, foi abordado “JUSTA CAUSA COMO PENALIDADE MÁXIMA”. Essa primeira seção teve como subseções: “Causas do encerramento contratual por justa causa” e “Diferenças entre embriaguez habitual e no trabalho”. A segunda seção foi “ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE” e teve como subseção: “Alcoolismo dentro das empresas”. A terceira seção foi “CONFLITOS ENTRE CLT E JURISPRUDÊNCIA”, e apresentou a seguinte subseção: “Como as organizações devem agir diante de casos de embriaguez habitual”, “Reformulação do art. 482 da CLT” e “Projeto de Lei 83/2012”. Em seguida, foram apresentadas a metodologia e a análise e discussão dos resultados. Por fim, apresentaram-se as considerações finais e as referências utilizadas na elaboração do trabalho. 2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 JUSTA CAUSA COMO PENALIDADE MÁXIMA Assim como qualquer contrato, o trabalhista existe com a finalidade de assegurar direitos e deveres a ambas as partes envolvidas (contratante e contratado) e, caso uma das partes esteja insatisfeita com as condições contratuais, este pode ser desfeito. No entanto, caso um dos contratantes não cumpra com as condições acordadas, a parte lesada pode solicitar a extinção desse contrato com perda de direitos contratuais, afinal, a outra parte quebrou os acordos contratuais, não deixando outra opção a não ser o fim deste. A justa causa é considerada pela legislação trabalhista brasileira uma conduta atípica, devendo ser revestida de normas específicas e limitadoras. Como dito por Barros (2011, p. 878) “[...] a justa causa é uma circunstância peculiar no pacto laboral. Ela consiste na prática de ato doloso ou culposamente por uma das partes e pode ser o motivo determinante da resolução do contrato”. Quando essa falta grave é cometida pelo empregado, a parte prejudicada pode realizar sua dispensa com justa causa o que significa que este perderá seu direito a receber algumas de suas verbas rescisórias, sendo elas: FGTS, seguro desemprego e multa rescisória como previsto no art. 482 da CLT, e quandoa falta 14 grave é cometida pelo empregador, pode o empregado optar pela rescisão indireta, que irá lhe assegurar o recebimento de todas as suas verbas rescisórias, sem prejuízo na sua remuneração. A justa causa é o motivo pelo qual se justifica a extinção do contrato de trabalho, estando devidamente regulada pelo art. 482 da CLT que trata das faltas graves. Nas palavras de Alice Monteiro de Barros: “1 A justa causa é uma circunstância peculiar ao pacto laboral. 2 Consiste na prática de ato doloso ou culposamente grave por uma das partes e pode ser determinante para a resolução do contrato” (BARROS, 2011, p. 702). Deste modo, evidencia-se que, a justa causa pode ser aplicada por qualquer umas das partes que celebram um contrato de trabalho e quando se fala em empregador, este deve realizar essa dispensa observando o disposto no art. 482 da CLT, respeitando suas hipóteses de aplicação que deixam claro a necessidade de existência de proporcionalidade, ou seja, deve existir proporcionalidade entre a falta cometida e a penalidade recebida. 2.1.1 Causas do Encerramento Contratual por Justa Causa Pode-se conceituar a justa causa como a consequência de atos cometidos pelo empregado que firam diretamente a fiel execução do contrato de trabalho estipulado entre as partes e que causem danos consideráveis ao empregador, deixando a relação contratual abalada e podendo ser rescindida de forma justificada. Delgado (2016) afirma que segundo as normas do direito brasileiro, a demissão por justa causa deve ocorrer por força de um motivo relevante, que carece estar previsto na legislação e, que permite a extinção do contrato de trabalho por culpa do trabalhador que comete a infração, ou seja, trata-se de uma conduta tipificada em lei que permite a rescisão do contrato de trabalho por culpa exclusiva do trabalhador. É importante frisar que não é necessário provar a falta grave, a não ser que esta seja discutida na justiça do trabalho, nesses casos, para o empregador possuir o poder da aplicação da justa causa, é necessário que se tenha prova da falta grave cometida, cabendo a ele (empregador) o ônus da prova, sendo necessário a sua 15 devida comprovação para que o ato possua validade legal e passe a ser passível de aplicação (CARVALHO, 2021). Além disso, por ser uma dispensa por justa causa, a mesma deve ser realizada com a explicação dos motivos que a ensejou, para que não existam outras alegações em juízo, não devendo ser realizado o registro do motivo da dispensa por justa causa na CTPS do empregado. Já o autor Martins (2006, p.510) diz que: Nossa legislação não prevê a forma da comunicação da dispensa por justa causa. Há normas coletivas que estabelecem que o empregador deve comunicar os motivos pelos quais o empregado foi dispensado. Da CTPS do empregado, porém, não poderá constar o motivo indicador da cassação do contrato de trabalho. Deveria a lei estabelecer que o empregador comunicaria por escrito as causas da ruptura do pacto laboral, justamente para quem, em juizo, não fizesse outras alegações ou modificasse as causas anteriores da dispensa (MARTINS, 2006, p.510). Segundo o autor supramencionado, na legislação vigente, não há previsão da forma da comunicação da dispensa por justa causa. No entanto, existem normas coletivas que afirmam que o empregador precisa comunicar as faltas ou motivos que o levou a dispensar o empregado. As faltas que podem causar a justa causa de um colaborador estão estabelecidas no artigo 482 da CLT, in verbis: Art. 482. Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador: a) ato de improbidade; b) incontinência de conduta ou mau procedimento; c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço; d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena; e) desídia no desempenho das respectivas funções; f) embriaguez habitual ou em serviço; g) violação de segredo da empresa; h) ato de indisciplina ou de insubordinação; i) abandono de emprego; j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; l) prática constante de jogos de azar. m) perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado. 16 Parágrafo único: Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional (BRASIL, 1943). Fazendo a análise do art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, que trata da dispensa por justa causa, é possível verificar que se trata de rol taxativo, que permite o empregador realizar a dispensa por justa causa do colaborador que cometer qual (is) infrações. Conclui-se que, essas infrações são consideradas faltas graves, levando o empregador a aplicação da penalidade máxima permitida por lei (justa causa) dentro da organização. 2.1.2 Diferenças entre embriaguez habitual e no trabalho O intuito dessa pesquisa é analisar especificamente a dispensa por justa causa movida pela embriaguez habitual, hipótese citada na alínea “f” do artigo 482 da CLT. Esse artigo deixa claro que tanto a embriaguez em serviço que é caracterizada pela não habitualidade do cometimento da falta, quanto a embriaguez habitual que é identificada pela sua repetição por parte do empregado que ingere bebida alcoólica, são consideradas faltas graves que podem ser penalizadas com a dispensa por justa causa (BRASIL, 1943). No sentido literal da palavra, embriaguez em serviço é caracterizada pelo trabalhador que se embriaga em serviço, ocorrendo no ambiente laborativo, na execução do contrato, ainda que poucas vezes, observando-se que para ocorrer o enquadramento do empregado na embriaguez em serviço, é necessário que a ingestão da bebida tenha causado ao empregado efeitos negativos que dificultaram ou impossibilitaram a realização de atividades laborais, afinal, “ingestão frequente de bebidas sem efeitos negativos, mesmo que ostensivas, não equivale a embriaguez” (MARTINS, 2010, p.14). A CLT, em seu artigo 482, alínea “f” traz a demissão por justa causa motivada pela embriaguez em serviço ou embriaguez habitual e afirma que não apenas as bebidas ingeridas no local de serviço, mas, também a embriaguez que trás consequências negativas para o bom desenvolvimento das tarefas diárias pelo colaborador pode motivar a dispensa por justa causa. Nesse sentido, a jurisprudência afirma que: 17 Embriaguez em serviço. Contumácia. Perdão tácito l. O art. 482, alínea “f” da CLT autoriza a dispensa do empregado por justa causa em duas hipóteses distintas: embriaguez habitual ou em serviço. Habitual é quando o trabalhador, fora do serviço, se serve rotineiramente de bebidas alcoólicas e se embriaga, por vício, expondo-se à admiração pública e expondo negativamente o nome da empresa que o mantém como empregado. Neste caso, exige-se a contumácia, conforme é o fundamento da sentença. Mas a embriaguez em serviço, ao contrário, não exige contumácia. Uma vez só já é suficiente, sobretudo na profissão de vigilante, com uso de arma de fogo. Por outro lado, o fato da dispensa ter ocorrido dez dias depois da comprovação da embriaguez não tem relevância jurídica. O empregador não é obrigado a dispensar o empregado no dia seguinte. Pode apurar os fatos em prazo razoável, se a estruturada empresa assim o exigir, sem que isso importe em perdão tácito, conceito doutrinário sem respaldo legal. Cabe ao juiz caso a caso, verificar se a dispensa foi oportunista, quando o fato já estava no esquecimento do empregado, o que não é o caso sub judice. A recurso a que se dá provimento." (TRT/SP 00430200706102005 RO Ac. 6 T 20090109435 Rel. LUIZ EDGAR FERRAZ DE OLIVEIRA 06/03/2009). Confome leciona a jurisprudência, a embriaguez habitual é quando o colaborador, fora do expediente do trabalho, costuma se servir de bebidas alcoólicas, de forma rotineira, se embriagando e, expõe negativamente o nome da empresa em que trabalha. Sendo que, na embriaguez em serviço, o uso de bebidas alcoólicas ocorre dentro da empresa e no horário de trabalho. Para Wagner D. Giglio (2000), a rescisão por justa causa em decorrência da embriaguez habitual, exige a repetição do ato para sua configuração, pois se não houver habitualidade, será apenas embriaguez ocasional. E, para melhor configurar o quadro de embriaguez habitual, é imprescindível que o empregador apresente os comprovantes das punições anteriores, de forma a demonstrar a conduta do faltoso. Percebe-se que, a embriaguez habitual não precisa ocorrer no local de trabalho, o ato faltoso ocorre quando o uso habitual da bebida começa a trazer sérias consequências para a produtividade do empregado, afinal, a ingestão de álcool fora das dependências do trabalho traz atrasos no desenvolvimento das tarefas laborais, gerando interferências especificamente causadas pelo uso do álcool. Após o alcoolismo ser considerado uma doença pela Organização Mundial da Saúde - OMS (1967), vários entendimentos começaram a surgir vindos dos tribunais, com o intuito de amparar aquele que sofre com a doença do alcoolismo e garantir uma maior precaução por parte das empresas que lidam com esse tipo de 18 situação, como no caso do Relatora Juiza Maria Lucia Cardoso Magalhaes, no recurso nº 0010260-04.2017.5.03.0012, in verbis: ALCOOLISMO. DISCRIMINAÇÃO. INVALIDADE DA DISPENSA. REINTEGRAÇÃO. Considerando que o autor era portador de alcoolismo crônico (doença formalmente reconhecida pelo Código Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial de Saúde - OMS), caberia à reclamada proceder à suspensão do contrato de trabalho, seguida de encaminhamento do empregado ao INSS. Contudo, a empresa ré tratou a referida doença como desvio de conduta justificador de rescisão do contrato de trabalho, impondo-se, assim, o reconhecimento da invalidade da dispensa. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego. Precedentes deste E. Regional e do C. TST" (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010260-04.2017.5.03.0012 (APPS); Disponibilização: 26/2/2018, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 719; Órgão Julgador: Quarta Turma; Relator: Maria Lucia Cardoso Magalhaes). Analisando o entendimento do tribunal, fica claro que a empresa deveria proceder à suspensão do contrato de trabalho e, seguida encaminhar o empregado ao INSS e não aplicar a justa causa. A aplicação da penalidade máxima depende de uma análise profunda do caso e do histórico daquele colaborador, afinal, se a empresa não faz aplicação de advertências ou outras penalidades antes da aplicação da penalidade máxima, fica claro a não existência de mal comportamento habitual. Para Garrijo (2020) a advertência no trabalho funciona como forma de educar o colaborador que descumpriu com normas contratuais e regulamentos internos da empresa. Os tribunais adotam o entendimento de que cabe a empresa provar a reincidência de determinada falta cometida pelo colaborador, afim de evitar dupla punição do empregado, como por exemplo na decisão da Relatora Juíza Maria Berenice, no Reg. RO nº 4.03/1996, in verbis: JUSTA CAUSA EMBRIAGUEZ HABITUAL PROVA- Compete à empresa provar de forma cabal e inconteste a reincidência da falta pelo empregado, vez que não se admite que a dispensa tenha ocorrido em razão do mesmo fato que já ensejara a pena de advertência, sob pena de se caracterizar dupla punição. (TRT 23" Reg. RO n° 4.031/1996, ac. do TP n320/1997, rel. Juiza Maria Berenice, in DJ-MT de 17/03/1997). Analisando o entendimento desse tribunal, fica claro que a embriaguez habitual precisa ser provada, ou seja, a empresa precisa provar que o empregado já havia sido advertido em face da quebra desse regulamento, não podendo receber 19 uma punição verbal ou escrita seguida de justa causa, sob pena de se caracterizar uma punição dupla. Os tribunais formaram uma linha de decisão se baseando nas definições da Organização Mundial da Saúde (1967) e deixando totalmente de lado o entendimento apresentado pelo alínea “f” da CLT, como no exemplo da decisão do Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa, no Ag-AIRR - 10821-43.2015.5.03.0062, in verbis: AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014. ALCOOLISMO CRÔNICO. DISPENSA POR JUSTA CAUSA AFASTADA. MULTA PELA INTERPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO MANIFESTAMENTE PROTELATÓRIOS. MATÉRIA FÁTICA. A reclamada não consegue desconstituir a decisão agravada, porquanto o recurso de revista não comprovou pressuposto intrínseco de admissibilidade recursal. No caso concreto, o Tribunal Regional firmou a sua convicção à luz das provas produzidas, no que se refere à impossibilidade de dispensa do reclamante, por justa causa, em face de alcoolismo crônico. A multa em embargos protelatórios foi aplicada de acordo com a subjetividade que informa esse tipo de decisão. Reafirmado o óbice da Súmula nº 126 do TST à admissibilidade de recurso de revista para o reexame de fatos e provas. Agravo a que se nega provimento. (Ag-AIRR - 10821- 43.2015.5.03.0062, Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, Data de Julgamento: 29.08.2018, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31.08.2018)". Analisando o entendimento do tibrunal, fica claro que o alcoolismo crônico é uma doença e, impede que o trabalhador seja dispensado com justa causa. Afinal o empregado que sofre de alcoolismo precisa de tratamento e reabilitação, não devendo ser aplicado a ele as previsões feitas pelo art. 482 da CLT. Após dissertar sobre a justa causa como penalidade máxima, as causas do encerramento contratual por justa causa e as diferenças entre embriaguez habitual e no trabalho, na próxima seção, discorrer-se-á em relação a organização mundial de saúde e o alcoolismo. 2.2 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE E O ALCOOLISMO Em 1967, o conceito de alcoolismo foi incorporado pela Organização Mundial de Saúde à classificação Internacional das Doenças, visto que é um assunto de saúde pública, porém, apenas nos ultimos 30 anos que a mesma começou a ser vista como uma doença munida de sintomas e sinais definidos. “Ela 20 é uma condição patológica que tira a liberdade do indivíduo de optar pelo consumo ou não de bebida alcoólica”, explica o psiquiatra do Einstein, Drº Sérgio Nicastri (2015). Ao ser avaliado o ponto de vista científico, o alcoolismo é considerado uma doença cheia de aspectos comportamentais e socioeconômicos que se mostra pelo uso incontrolável do álcool, podendo ser comparada com drogas como a cacaína e outras substâncias extremamente viciantes (CISA, 2015). Nesse sentido, o Centro de Informações sobre Saúde a Álcool (CISA, 2015, p.1) afirma que: [...] o uso abusivo de álcool é um dos problemas mais sérios de saúde pública no Brasil e no mundo inteiro. Apesar de estudos científicos destacarem o consumo abusivo do álcool como causa de desemprego, o contrário também tem sido evidenciado de modo consistente; ou seja, o desemprego levando ao aumento do consumo de álcool e o risco de desenvolver abuso ou dependência alcoólica (CISA, 2015, p.1). Com isso, fica nítido que o alcoolismo já não é mais visto como algo corriqueiro, mas, sim como causa para sérios problemas de saúde, e sociaiscomo por exemplo, aumento da taxa de desemprego, problemas familiares, comportamentais e de dependência do álcool, que causa outras doenças como cirrose hepática. 2.2.1 Alcoolismo dentro das organizações O alcoolismo não é um problema que afeta apenas a vida pessoal do alcoólatra, mas, como este sofre com as consequências desse vício no ambiente de trabalho. O Centro de Informações sobre Saúde e Álcool expõe que o alcoolismo não é um problema que afeta apenas a vida pessoal do alcoólatra, mas, sim todas as áreas de sua vida, podendo trazer também prejuízos no ambiente de trabalho, como; falta de produtividade, aumento de absenteísmo, maiores probabilidades de acidentes, entre outros problemas. E nesse sentido CISA (2015, p.1) afirma que: O Alcoolismo não é um problema que afeta apenas a vida pessoal do alcoólatra, mas, como este sofre com as consequências desse vídeo no ambiente de trabalho. O Centro de Informações sobre Saúde e Álcool 21 expõe que: Em termos gerais, o uso abusivo de álcool pode ocasionar não somente prejuízos pessoais e familiares, mas também prejuízos no ambiente profissional, como diminuição na produtividade, aumento de absenteísmo (falta ao trabalho), maior probabilidade de acidentes de trabalho, entre outros. O II LENAD também mostrou que 8% (7,4 milhões de pessoas) admitiram que o uso de álcool teve efeito prejudicial no seu trabalho, enquanto 4,9% (4,6 milhões de pessoas) relataram já ter perdido o emprego devido ao consumo de bebidas alcoólicas. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), agência das Nações Unidas de informação, análise e orientação sobre o trabalho, de 20% a 25% dos acidentes de trabalho no mundo envolvem pessoas que estavam sob o efeito do álcool ou outras drogas. Além disso, os prejuízos do uso de álcool no ambiente de trabalho acarretam custos enormes para a economia do país” (CISA, 2015, p.1). Dessa forma, fica claro que o álcool ataca diretamente a vida profissional do trabalhador, pois, diminui significativamente a performance, qualidade e segurança do seu trabalho, por trazer várias consequências, como: Prejuízo do julgamento e da crítica; Prejuízo da percepção; Diminuição da resposta sensitiva e retardo da resposta reativa; Diminuição da acuidade visual e visão periférica; Incoordenação sensitivo-motora; Prejuízo do equilíbrio e Sonolência. Após discorrer sobre A Organização Mundial de Saúde e o alcoolismo e o alcoolismo dentro das organizações, na próxima seção, dissertar-se-á em relação aos conflitos entre CLT e jurisprudência. 2.3 CONFLITOS ENTRE CLT E JURISPRUDÊNCIA A CLT surgiu com o intuito de proteger o empregado e regular as relações trabalhistas, sendo considerada uma grande conquista da classe trabalhadora por garantir condições mínimas de trabalho através da segurança de direitos básicos devidamente expressos na consolidação das leis do trabalho (SOUZA, 2000). A Consolidação das Leis do Trabalho faz previsão no seu art. 482, alínea “f” que em caso de embriaguez habitual, o empregador poderá fazer a dispensa por justa causa do seu empregado (PANTALEAO, 2020). Com isso fica claro ao empregado que caso compareça habitualmente embriagado para trabalhar, poderá sofrer penalidade máxima. Ainda de acordo com o autor supracitado, a jurisprudência é um conjunto de decisões judiciais sobre um mesmo tema que apresentem entre si similaridade entre suas interpretações jurídicas. Sendo esta importante devido ao fato de apontar 22 uma previsibilidade de resultado do julgador para aqueles que busca a justiça para resolução de uma lide. A importância da jurisprudência ficou definida no Código de Processo Civil, ou seja, Lei nº 13.105/15, que definiu no seu art. 489 que a jurisprudência é parte fundamental de qualquer decisão do julgador, sendo então uma fonte formal do direito brasileiro e não podendo ser ignorada. O art. 489, insiso 1º e 2º, in verbis: Art. 489. […] § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: […] VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento (BRASIL, 2015). De acordo com o artigo 489 do CPC/15, as súmulas e a jurisprudência são partes fundamentais da fundamentação de qualquer decisão do magistrado, seja ela, interlocutória, sentença ou acórdão. Segundo a análise da jurisprudência, a embriaguez habitual é uma patologia que deve ser tratada, sendo assim, não existe motivo para justa causa do empregado. A justa causa é considerada a penalidade máxima permitida na relação de emprego, no entando deve ser aplicada com proporcionalidade e somente mediante o cometimento de uma falta grave, após, o reconhecimento do alcoolismo como doença patologica, fica claro o equívoco cometido pelo empregador que aplica a penalidade diante desses casos. Mediante isso será realizada a análise do seguinte julgado: JUSTA CAUSA OBREIRA. NÃO CONFIGURAÇÃO. ALCOOLISMO CRÔNICO. SUPERAÇÃO DA NOÇÃO DE EMBRIAGUEZ HABITUAL NO SERVIÇO COMO HIPÓTESE DE SANÇÃO DISCIPLINAR. Diante do contexto fático-probatório, encontra-se suficientemente comprovado nos autos o alcoolismo crônico do autor em serviço, revelando-se insustentável, porém, a punição máxima a ele aplicada na situação posta. Isso porque, em razão das transformações sociais, científicas e culturais da sociedade, a embriaguez habitual, antes enquadrada como questão disciplinar sancionável, atualmente, é compreendida como problema de saúde pública, sendo considerada como doença (síndrome de dependência do álcool) pelo Código Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde. Sob tais influxos e com forte inspiração nas diretrizes traçadas pela OIT em seu programa relacionado ao álcool e 23 a drogas no local de trabalho, a jurisprudência majoritária do c. TST vem defendendo que o tipo jurídico consolidado sofreu ancilosamento, já não mais constituindo causa justificadora da ruptura motivada da relação de emprego. Com efeito, defende-se como diretriz geral que a constatação da embriaguez habitual deve abrir espaço para o encaminhamento médico do trabalhador portador desta grave moléstia em detrimento da incidência de sanção disciplinar. Precedentes no c. TST. Destarte, diante da ausência de elementos autorizativos da resolução contratual, prevalece a presunção favorável ao obreiro de ruptura sem justa causa do contrato, razão por que se dá provimento ao recurso para considerar imotivada a terminação contratual. Sentença reformada no item. Jurisprudênciia publicada em 16/02/2016. 9TRT-2-10009376820155020492 SP (TRT-2) Pela análise do julgado acima, verifica-se que, o TRT vem onsiderando que o alcoolismo crônico em serviço ou embriaguez habitual, devido às transformações ocorridas na sociedade, deixou de ser tratada como questão disciplinar sancionável, passando a ser vista como problema de saúde pública. Diante dos julgados analisados até aqui, pode ser observado que a jurisprudência segue uma linha fixa ao apontar que a dispensa por justa causa não pode ocorrer nos casos de embriaguez habitual, no entando, não existe uma linha concreta que se segue com relação a como as organizações devem lidar internamente com esses casos, deixando claro os conflitos entre CLT e jusrisprudência e a grande necessidade da reformulação do artigo 482 da consolidação das leis do trabalho para uma tratativa una e assertiva dos casos de embriaguez habitual. 2.3.1 Como as organizações devem agir diante de casos de embriaguez habitual Conforme já mencionado anteriormente, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), estabelece que a embriaguez habitual ou serviço é considerada uma falta grave, sendo assim, razão clara para aplicação dajusta causa do empregador. Tal extremismo é motivado pelo fato das leis trabalhistas terem sido criadas no fim da década de 30, uma época onde o alcoolismo não era considerado uma doença. Somente em 1967 que o conceito de alcoolismo foi incorporado pela Organização Mundial de Saúde à Classificação Internacional das Doenças, recendo o CID-8. Nesse CID os problemas relacionados ao uso do alcool foram inseridos dentro de uma categoria que transtornos de personalidade e de neuroses, sendo 24 divididos em: episódio de dependência, episódio de beber excessive e beber excessivo habitual (CISA, 2015). Percebe-se que quando a Organização Mundial da Saúde (1967), classificou o álcool como doença e, a CLT passou a não ser mais eficaz para resolução desses conflitos, afinal, nenhuma atualização foi realizada em seu texto e deixando os julgadores 100% dependentes da análise de julgados para resolução das lides que envolvam dispensa por justa causa de colaboradores dependentes do álcool (PANTALEAO, 2020). Cabe citar que o que é classificado como doença não pode por qualquer razão ser motivo para acometimento de infortúneos gerados pela patologia em questão, mesmo que perante o texto literal da CLT, ainda esteja submetido a penalidade máxima da CLT, conhecida como justa causa do empregado. O Tribunal Regional do Trabalho vem se manifestando a não configurar a embriaguez como motivo para justa causa: DISPENSA. JUSTA CAUSA. EMBRIAGUEZ. REINTEGRAÇÃO. Comprovado que o empregado encontrava-se, na data da dispensa, incapacitado para o trabalho, em face de alcoolismo crônico, reconhecido nos dias atuais como doença pela Organização Mundial de Saúde - OMS -, que o classifica sob o título de -síndrome de dependência do álcool-, não pode o empregado ser dispensado, nem mesmo por justa causa, ainda que decorrente de mau procedimento, sem relação com o estado de embriaguez no momento da falta grave praticada. Torna-se necessário, nesse caso, antes de qualquer ato de punição por parte do empregador, que o empregado seja encaminhado ao INSS para tratamento. Provimento que se dá ao recurso obreiro para determinar a reintegração do autor no emprego com pagamento das parcelas daí decorrentes" (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010821-43.2015.5.03.0062 (APPS); Disponibilização: 2/3/2017; Órgão Julgador: Sétima Turma; Redator: Convocada Sabrina de Faria F. Leão). No mesmo sentido, RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. 1. DEPENDÊNCIA QUÍMICA. ALCOOLISMO CRÔNICO. DISPENSA MERAMENTE ARBITRÁRIA DE EMPREGADO PORTADOR DA DOENÇA, AINDA QUE NÃO OCUPACIONAL. PRESUNÇÃO RELATIVA DE DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. REINTEGRAÇÃO. SÚMULA 443/TST. ATO DISCRIMINATÓRIO E JURIDICAMENTE IMPOSSÍVEL.A Constituição da República veda prática discriminatória no contexto da sociedade política (Estado) e da sociedade civil, inclusive no âmbito empresarial e empregatício (art. 3º, IV, in fine, CF). Não se olvide, outrossim, que faz parte do compromisso do Brasil, também na ordem internacional (Convenção 111 da OIT), o rechaçamento a toda forma de discriminação no âmbito laboral. Nessa linha, o TST editou a Súmula 443, 25 mencionando a presunção de discriminação relativamente à dispensa de trabalhadores portadores de doença grave que suscite estigma ou preconceito. Por sua vez, hodiernamente, o alcoolismo é considerado uma doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS), formalmente reconhecida pelo Código Internacional de Doenças (CID - referência F- 10.2), e se recomenda que o assunto seja tratado como matéria de saúde pública. Com efeito, presume-se discriminatória a ruptura arbitrária do contrato de trabalho, quando não comprovado um motivo justificável, em face de circunstancial debilidade física, psíquica e moral decorrente da síndrome de dependência do álcool, que, regra geral, é vista com preconceito e discriminação no seio da sociedade. Registre-se, entretanto, que a presunção de ilegalidade do ato de dispensa do empregado portador de doença grave, ressoante na jurisprudência trabalhista, não pode ser de modo algum absoluta, sob risco de se criar uma nova espécie de estabilidade empregatícia totalmente desvinculada do caráter discriminatório que se quer reprimir. Assim, além da viabilidade da dispensa por justa causa, é possível também que a denúncia vazia do contrato de trabalho seja considerada legal e não se repute discriminatório o ato de dispensa do empregado dependente químico. Porém, esse não é o caso dos autos. No caso concreto, é incontroverso que o Autor, há muitos anos, é portador da síndrome de dependência de álcool, encontrando-se, à época da dispensa, em fase de reabilitação, com acompanhamento psicoterápico e medicamentoso. Frise-se ainda que a doença era de conhecimento da empresa, que, inclusive, já havia manifestado a intenção de despedir o reclamante em razão da mesma. Consequentemente, presume-se discriminatória a dispensa, nos moldes do entendimento da Súmula 443/TST, sendo devida a reintegração do empregado. Recurso de revista não conhecido no aspecto. [...]" (RR-775-73.2013.5.04.0664 Data de Julgamento: 24/02/2016, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 26/02/2016) Nesse sentido, o Tribunal Regional do Trabalho tem fixado entendimento que, se comprovado que o empregado encontrava-se incapacitado para o Trabalho, na data da sua dispensa, em face de alcoolismo crônico, ele deverá ser reintegrado e encaminhado ao INSS para tratamento, devendo ser desconsiederada a demissão por justa causa, por ser considerada discriminatória. Diante do exposto pela jurisprudência, fica evidenciado que as organizações não devem seguir na íntegra o texto do artigo 482 alínea “f” da CLT, respeitando a definição do alcoolismo como doença patológica e realizando o encaminhamento do colaborador para tratamento da doença em questão. 2.3.2 Reformulação do art. 482 da CLT A justa causa do empregado é considerada a forma mais gravosa de punição do empregado que fere as predisposições do contrato de trabalho, devendo existir proporcionalidade entre a falta cometida e punição aplicada. Existe requisitos 26 essenciais para aplicação da justa causa que não são observados quando ela é aplicada em casos de embriaguez habitual. A possibilidade da justa causa contida no artigo 482 da CLT (BRASIL, 1943) mostra as várias hipóteses de mau procedimentos que podem acarretar a aplicação da penalidade máxima, que nada mais é do que comportamentos incorretos do empregado, cometido através de atos que firam o contrato de trabalho e o regulamento interno da empresa (GIGLIO, 2000). Segundo Sommer (2016), o alcoolismo vem se difundindo de forma lenta e gradual na sociedade, vinculado a fatores sociais, econômicos e culturais que interferem diretamente nas relações de trabalho. Desse forma, percebe-se que o álcool é uma das poucas drogas onde seu consume é totalmente admitido e incentivado socialmente, sendo desconsiderado pela grande maioria seus impactos visíveis na vida do consumidor. Mesmo com sua ampla aceitação social, o consume em excesso é um problema real e alarmante, pois, além da grande quantidade de acidentes de transito causados por pessoas embriagadas, o seu consume diário causa dependência e automaticamente gera a embriaguez habitual em serviço. O álcool é a droga mais amplamente utilizada no mundo, incluindo em local de trabalho, constituindo o segundo transtorno psiquiátrico mais prevalente na atualidade, superado apenas pelas depressões (LACERDA, 2008). Sobre o grande aumento do número de dependentes do álcool, Claret (2000, p. 24) afirma que: As condições de vida impostas pela sociedade moderna têm provocado um aumento sensível do número de alcoólatras. Devido os efeitos físicos e psíquicos do excesso de álcool, 27 eles não conseguem ter uma vida normal tanto no âmbito familiar quantono profissional, comprometendo sua própria segurança e também a daqueles que o cercam (CLARET, 2000, p. 24). Vaissman (2004) afirma que o alcoolismo é um motivo para absenteísmo no trabalho e umas das causas mais precoces de aposentadoria por acidentes de trabalho, ficando também entre as principais causas para benefício de auxílio- doença pela previdência social. Ramos e Bertolote (1997) destacam que o alcool altera de forma progressive o Sistema nervosa e a resistência do trabalhador, sendo grande 27 influenciador da sua condulta social, mental e profissional, deixando claro que o alcool influência diretamente na desenvoltura profissional do empregado que sofre de alcoolismo. Ainda sobre os efeitos nocivos do álcool: O álcool se constitui em uma das maiores causas no envolvimento com acidentes de trabalho, além de prejudicar o desempenho profissional, levando o trabalhador a frequentes atrasos na chegada ao trabalho, baixa produtividade, destruição ou utilização indevida do material de trabalho, descuido e negligência sobre os objetivos do trabalho, incapacidade de assumir a responsabilidade por determinadas tarefas, trabalho mal realizado, excesso de acúmulo de funções, insatisfação, desmotivação, não cumprimento de higiene/ segurança no local de trabalho, tornando-se um risco para quem trabalha em linhas de produção. Diariamente o trabalhador dependente de álcool está colocando em risco não só a sua integridade física, como também a dos demais trabalhadores (BARROS, 2011, p. 50). Sendo assim, em casos de embriaguez habitual, não à que se falar em justa causa do empregado, afinal, os requisitos para aplicação da justa causa não foram feridos. Para Dorval Lacerda (1949, p.24) “atos contrários ao bom viver, à discriminação pessoal, às atitudes físicas corretas, o respeito, à paz e ao decoro de terceiros”. Dessa forma devendo ocorrer a aprovação do projeto de Lei nº 83, de 2012, que visa a reformulação do art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho. 2.3.3 Projeto de Lei nº 83/2012 Devido à necessidade urgente de reformulação do texto infraconstitucional do art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho, foi proposto pelo Senador Eduardo Lopes um projeto de lei que visa desconfigurar a embriaguez habitual como hipótese para dispensa por justa causa. De acordo com o mecionado projeto de Lei, propõe-se que: Artigo. 1º A alínea f do art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, passa a vigorar com a seguinte redação: f) embriaguez em serviço; Art. 2º O art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, passa a vigorar acrescido do seguinte § 2º, renumerando-se o parágrafo único para 1º: § 2º. “Em relação ao alcoolista crônico, cuja condição seja comprovada clinicamente, a ocorrência do fato arrolado na alínea f somente permitirá a rescisão do contrato de trabalho 28 se o empregado se recusar a se submeter a tratamento para sua condição” (LOPES, 2012). Na visão do autor do presente projeto de lei, Senador Lopes (2012), a própria legislação deve identificar a necessidade de recuperação da pessoa que sofre com o alcoolismo, propondo então a reformulação do artigo já citado afim de excluir conjecturas de penalidade para os casos de embriaguez habitual. O projeto já mencionado também deixa claro que em caso de alcoolismo comprovado clinicamente, onde o próprio empregado se nega a realizar o tratamento, será permitida a demissão desse colaborador, afinal, se torna inviável a manutenção dele no ambiente organizacional. De acordo com Martins (2010), a patologia é um problema para o empregador que deve ser encarado pelo Estado, afinal, este é o responsável pela saúde do indivíduo. Utilizando deste contexto, foi feito um relatório do Projeto de lei, realizado pelo Senador Paulo Bauer que menciona: [...] A legislação social evoluiu e as relações de trabalho não podem mais ser visualizadas apenas no contexto do ambiente estrito em que se realizam as atividades. Há, em toda a conjuntura, direitos humanos e sociais a serem respeitados. Para que isso ocorra, Estado e empresas devem atuar em conjunto em prol da manutenção da saúde pública, da inserção social dos cidadãos e da produtividade. Sendo o alcoolismo um problema médico, nada justifica que o alcoolista seja abandonado à própria sorte (BAUER, 2012). Claro que, tanto o Estado quanto as organizações são responsáveis pela saúde e bem estar do empregado, devendo juntos adotarem medidas para enfrentarem mutuamente problemas que surjam no ambiente organizacional. Dessa forma, Melo (2013) estabelece que o ambiente de trabalho seguro é um direito fundamental do empregado, não tendo relação apenas com o contrato de trabalho, mas, também com a proteção da sua saúde, bem estar e segurança no meio onde realiza suas atividades laborais em prol da organização. Melo (2013) também deixa claro que os empregados também tem obrigação no cumprimento das normas de segurança, podendo em caso de descumprimento, ocorrer punição com advertência, suspensão das atividades e em ultimo caso dispensa por justa causa. Respeitando a coerencia entre falta cometida e punição aplicada. 29 Dessa forma, fica evidente que existe um dever de proteção do empregador para com seus empregados, onde este também é responsável pela manutenção do bem estar do seu colaborador durante todo o período de relação trabalhista, ficando clara a importância do posicionamento de prevenção da saúde e bem estar do empregado que vier a sofrer de embriaguez habitual dentro das organizações, posição que ficará mais evidente após a reformulação do artigo 482 da CLT. 3 METODOLOGIA Este estudo buscou demonstrar o posicionamento da jurisprudência e da CLT (Consolidação das leis do trabalho) acerca da embriaguez habitual, buscando entender o posicionamento do TRT 3 (2021) em relação à embriaguez no âmbito de trabalho após o reconhecimento dela como doença. Para tanto foi necessária a definição precisa da metodologia a ser utilizada neste projeto. A pesquisa teve como problemática: Embriaguez habitual no trabalho como excludente da justa causa do empregado, no período compreendido entre 01.01.2021 a 31.12.2021, sendo encontados 11 (onze) julgados, uma vez que a CLT passou a não ser eficaz na resolução desse problema. E para que ela e todos os demais objetivos do trabalho fossem respondidos foi necessária a descrição da metodologia usada. De acordo com Severino (2007) a metodologia é uma gama maior de métodos, possuindo diversas fases de pesquisa com o objetivo de explicar os fenômenos mais abstratos e, dessa forma, ser mais restrita. Sendo assim, o método que o pesquisador irá utilizar dependerá do objeto de pesquisa e incluirá várias etapas que requerem planejamento e execução cuidadosos para o sucesso do trabalho. Desta forma, baseado nos resultados obtidos, espera-se que toda e qualquer dúvida seja sanada e que fique claro no que diz respeito a embriaguez habitual, qual o posicionamento correto a ser tomado pelas empresas e a necessidade de atualização da CLT no que tange a embriaguez habitual. O estudo foi realizado através da abordagem qualitativa e tipo exploratório. A abordagem qualitativa, segundo Gil (2019) é mais familiar a problemática, fazendo sua explicação. Podendo ser desenvolvida através de entrevistas com pessoas, levantes bibliográficos e geralmente assumindo forma de pesquisa bibliográfica. 30 O método qualitativo é mais regido pelo universo dos significados, analisando ambições, crenças e valores, sendo uma busca mais intensa dos processos e fenômenos, não tendo foco apenas em variações por serem de natureza subjetiva (MINAYO,2001). O tipo exploratório é visto como mais flexível no que se refere ao seu planejamento,visto que leva em consideração variados pontos relativos ao assunto estudado (GIL, 2019). A pesquisa exploratória foi utilizada em razão de que ela tem a finalidade de tornar o problema mais nítido. No decorrer da pesquisa foi utilizada fonte secundária que conforme o entendimento de Bittar (2014) a fonte secundária pode ser definida como dados coletados e registrados por outros pesquisadores, sendo então referências para o desenvolvimento bibliográfico da pesquisa. Foi utilizado nessa pesquisa o método dedutivo para buscar chegar a uma regra geral, através de casos específicos. O método dedutivo, segundo Freitas; Lima (2010), é uma forma de raciocínio que visa explicar o conteúdo das premissas, utilizando uma cadeia de raciocínio organizado de forma descendente, indo da análise geral para a particular. As técnicas de investigação teórica são fontes indiretas que possuem a finalidade de possibilitar ao pesquisador a transmissão dos dados coletados, de acordo com Bittar (2014), elas possuem classificação técnica, histórica, conceitual e normativa. As técnicas de investigação teórica utilizadas nessa pesquisa serão conceitual e normativa, realizando o desenvolvimento conceitual para tratamento do problema e a revisão detalhada da literatura com relação a temática. Segundo Bittar (2014), a técnica conceitual adota-se um referencial teórico, modelo de análise, sistema de ideias, ou problemática lógico-conceitual, que passa a construir a logicidade interna e o desenvolvimento conceitual para o tratamento do problema e a técnica normativa como revisão detalhada da literatura a respeito da temática, ensejando a produção de argumentos com base em grandes preceitos e princípios que informam a matéria. A respeito das técnicas normativas, é notório que há uma revisão de tudo que está sendo tratado no trabalho, como a literatura e acerca do tema. Com base nisso, é possível justificar os argumentos e o posicionamento propostos pela matéria que está sendo alvo de análise (BITTAR, 2014). 31 A investigação empírica buscará entender os estudos científicos realizados, a fim de compreender e observar, usando como técnica de pesquisa empírica a análise jurisprudencial. A análise de Jurisprudência permite a identificação da posição dos decisores e, relação ao problema e suas eventuais inclinações em relação às demais possibilidades de solução que porventura não tenham sido adotadas (FREITAS; LIMA, 2010). A pesquisa foi realizada no TRT 3, a fim de analisar julgados desse tribunal no período de 01.01.2021 a 31.12.2021, sendo coletado 11 (onze) julgados. A análise de dados foi realizada através da análise de conteúdo, que pode ser utilizada, segundo a perspectiva de Bardin (2016) como técnica metodológica aplicável em discursos e qualquer forma de comunicação. Para Bardin (2016, p. 47), o termo análise de conteúdo designa: “um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando a obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens”. Bardin (2016) mostra que a utilização da análise de conteúdo prevê três fases fundamentais: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados - a inferência e a interpretação. Ainda de acordo com o auto supracitado, a primeira fase, a pré-análise, pode ser identificada como uma fase de organização, é o primeiro contato com os textos, apreendendo o conteúdo de modo genérico, sem grandes preocupações técnicas. Inicia-se o trabalho escolhendo os documentos a serem avaliados. Já na segunda fase, ou fase de exploração do material, são escolhidas as unidades de codificação. E, a terceira fase do processo de análise do conteúdo se chama tratamento dos resultados – a inferência e interpretação (BARDIN, 2016). É importante que durante a análise mantenha-se o foco no referencial teórico relativo à investigação, o qual é responsável por dar embasamento à pesquisa empírica realizada. 32 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Esta seção tem como escopo a análise realizada a partir dos dados coletados, tendo como premissa basilar apresentar os argumentos vaticinados pela jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, mormente, no que concerne à aplicabilidade do art. 482 alínea “f” da CLT em relação a justa causa em decorrência do alcoolismo. A pesquisa utilizou os seguintes filtros para a escolha dos casos que seriam colocados e analisados: delimitação temática, territorial e temporal. A delimitação temática foi fixada pela seleção da seguinte oração: “Justa causa: alcoolismo”. Já a delimitação territorial encontra-se positivada na escolha do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, tendo em vista, que este órgão abrange o Estado de Minas Gerais, ou seja, a nossa realidade. Por fim, no que versa a delimitação temporal, definiu-se o período de 01.01.2021 a 31.12.2021, por serem estes os meses mais recentes, o que permitiu observar a atualidade das decisões analisadas. A coleta dos dados foi realizada no dia 09 de setembro de 2022, diretamente no site oficial do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região – TRT 3, sendo encontrado um total de 11 (onze) julgados, que são apresentados no quadro 1. Quadro 01 – Casos selecionados na pesquisa Tribunal Pesquisado Número do Processo Caso n.º Tribunal Regional do Trabalho – 3 Região 0010771-85.2020.5.03.0015 (ROT) 01 0010458-44.2021.5.03.0095 (RORSum) 02 0010121-77.2020.5.03.0002 (ROT) 03 0010243-74.2020.5.03.0169 (ED) 04 0010353-55.2021.5.03.0002 (RORSum) 05 0010771-85.2020.5.03.0015 (ROT) 06 0010404-29.2021.5.03.0176 (ROT) 07 0010669-63.2020.5.03.0015 (ROT) 08 0010667-34.2019.5.03.0143 (ROT) 09 0010508-50.2020.5.03.0016 (RORSum) 10 0010274-56.2020.5.03.0020 (RORSum) 11 Fonte: Autoria Própria, 2022. No quadro 2 têm-se os casos que foram analisados na pesquisa, ou seja, recursos referentes à reversão ou descaracterização da justa causa, desídia e dispensa discriminatória devido ao quadro de alcoolismo do empregado, totalizando 11 (onze) julgados proferidos pelo TRT 3 no ano de 2021. 33 Quadro 2 – Tipos de casos analisados na pesquisa Local de pesquisa Tipos de Ações Quantidade Tribunal Regional do Trabalho – 3 Região Reversão da Justa Causa 03 Descaracterização da Justa Causa 02 Justa Causa – Desídia 02 Dispensa discriminatória 04 Total 11 Fonte: Autoria própria, 2022. Em síntese, foram analisados 11 (onze) processos, e, a grande maioria versava sobre dispensa discriminatória em decorrência do alcoolismo, sendo 04 (quatro) recursos no total, podendo ser culminadas com reversão da justa causa. Em segundo lugar, foram os recursos sobre a reversão da justa causa baseados na Organização Mundial da Saúde que dispõe que o alcoolismo é uma doença, que totalizaram 03 (três) processos. E, em terceiro lugar, vieram os recursos sobre a descaracterização da justa causa e os recursos sobre a desídia, totalizando 02 (dois) processos cada. Após essa pequena apresentação dos casos visando uma melhor compreensão dos dados coletados, definiram-se as seguintes categorias para a análise e discussão dos resultados: (4.1) Análise das consequências da demissão por justa causa do colaborador alcoólatra; (4.2) Avaliação das divergências acerca do alcoolismo e a desídia no trabalho; (4.3) A embriaguez no âmbito de trabalho, após seu reconhecimento como doença, pode ser considerada como dispensa discriminatória? Importante ressaltar, que as categorias definidas neste trabalho estão baseadas em análise dos conteúdos contidos nos casos examinados, cujos resultados encontram-se demonstrados ao longo de cada categoria. 4.1 ANÁLISE DAS CONSEQUÊNCIAS DA DEMISSÃO POR JUSTA CAUSADO COLABORADOR ALCOÓLATRA A primeira categoria analisou 05 (cinco) julgados, sendo os casos: 01, 02, 05, 06 e 10, em que se verificou a aplicabilidade da reversão ou descaraterização da justa causa em virtude do colaborador ser alcoólatra, podendo então, a “justa causa” ser convertida em “sem justa causa” ou ainda, o colaborador ser reintegrado 34 à empresa, verificando que a jurisprudência optou pela não aplicabilidade do art. 482 alínea “f” da CLT em relação a justa causa em decorrência do alcoolismo. No caso 01 tem-se um recurso ROT, onde houve a reversão da justa causa, veja-se: EMENTA: JUSTA CAUSA - ABANDONO DE EMPREGO- REVERSÃO. Restando comprovado que o reclamante, no momento de sua dispensa, encontrava-se inapto ao trabalho, com sua capacidade de discernimento totalmente comprometida, internado em clínica para recuperação, não há como ser mantida a justa causa com base em abandono de emprego. RELATÓRIO O Juízo da 15ª. Vara do Trabalho de Belo Horizonte, por meio da decisão de fl. 641/657, proferida pelo MM. Juiz Gastão Fabiano Piazza Júnior, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na exordial. [...]. O que a reclamada deveria ter feito é encaminhado o trabalhador para o INSS, ao invés de dispensá-lo por justo motivo no momento em que ele mais se encontrava fragilizado, pois a dependência química de álcool e drogas é considerada doença, tanto que o reclamante já havia se afastado pelo órgão previdenciário por diversas vezes, inclusive com diversas internações. [...]. A Organização Mundial da Saúde reconhece a dependência alcóolica e química como doenças ("F10.2 - transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - síndrome de dependência" e "F19.2 -Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas - síndrome de dependência"). [...]. Em face disso, mantenho a decisão recorrida que declarou a nulidade da dispensa por justa causa, com consequente reintegração do empregado ao trabalho, haja vista a declaração do perito de que o autor atualmente se encontra apto ao trabalho, com o pagamento de todas das parcelas salariais devidas durante o afastamento, parcelas vencidas e vincendas, tudo conforme estipulado na sentença. [...]. Nego provimento. ACÓRDÃO FUNDAMENTOS PELOS QUAIS, A Segunda Turma, do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão hoje realizada, à unanimidade, conheceu do recurso e, no mérito, por maioria de votos, negou provimento ao apelo, vencida a Exma. Juíza segunda votante. [...]. Belo Horizonte, 14 de dezembro de 2021. LUCAS VANUCCI LINS - Relator No primeiro caso analisado tem-se a aplicabilidade da reversão da justa causa em decorrência de que o colaborador, no momento em que foi dispensado pela empresa, estava inapto ao trabalho em decorrência do alcoolismo, que deixou sua capacidade de discernimento totalmente comprometida e, ainda estava internado em clínica para recuperação, o que ocasionou o “abandono de trabalho”, conforme alegou a empregadora. O conceito de alcoolismo foi incorporado pela Organização Mundial de Saúde - OMS em 1967, levando-o à Classificação Internacional das Doenças - CID, 35 por se tratar de um assunto de saúde pública, afetando milhares de pessoas. A OMS reconhece tanto a dependência alcóolica, quanto a química como doenças, criando o CID: F10.2 - transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - síndrome de dependência" e, ainda o CID: F19.2 -Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas - síndrome de dependência. Portanto, o alcoolismo pode ser definida como uma condição patológica (OMS, 1967; NICASTRI, 2015). Baseando-se nesse entendimento, a Segunda Turma, do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, de forma unânime, negou provimento ao apelo e, reverteu a justa causa. Percebe-se pela análise do recurso que, o TRT (2021) vem optando pela proteção do trabalhador alcoolatra, já que ressaltou que, a reclamada ao invés de demitir por justa causa, deveria ter encaminhado o trabalhador para o INSS, uma vez que ele se encontrava fragilizado, naquele momento, em virtude da dependência química de álcool. No caso 02 tem-se um recurso RORSum, onde houve a descaracterização da justa causa, veja-se: O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão Ordinária Telepresencial da Primeira Turma, hoje realizada, julgou o presente processo e, preliminarmente, à unanimidade, conheceu dos recursos ordinários interpostos por LIDERANÇA LIMPEZA E CONSERVAÇÃO LTDA. e SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL SENAI, [...]. JUÍZO DE MÉRITO. MATÉRIAS COMUNS AOS RECURSOS. DESCARACTERIZAÇÃO DA JUSTA CAUSA. BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. Quanto aos temas em apreço, adoto as razões de decidir da r. sentença e a confirmo por seus próprios fundamentos, nos termos do inciso IV do § 1º do art. 895 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 9.957 de 12.01.2000, negando provimento ao recurso. [...]. Cumpre relevar, que a majoritária jurisprudência trabalhista adota o entendimento de que o alcoolismo deve ser considerado patologia clínica, não mais podendo ser capitulado como falta grave, de forma a ensejar a dispensa motivada do empregado, figurando, inclusive, no Código Internacional de Doenças (CID). [...]. Anote-se que a dependência do álcool ou alcoolismo trata-se de enfermidade catalogada no Código Internacional de Doenças pela Organização Mundial da Saúde - OMS, comprometendo o funcionamento do cérebro e, consequentemente, o desenvolvimento das funções cognitivas do indivíduo, o que compromete a prestação laboral. Por fim, como bem observado pelo d. Juízo de Origem, não foi observada a necessária gradação na aplicação de penalidades ao Reclamante, devendo ser descaracterizada a justa causa aplicada. Nada a prover. [...]. Por todo o exposto, mantenho a r. sentença, negando provimento aos recursos. [...]. Belo Horizonte, 03 de novembro de 2021. ANGELA CASTILHO ROGEDO RIBEIRO - Juíza Convocada Relatora 36 No caso 02, a Primeira Turma do TRT 3, negou provimento ao recurso interposto pela empresa, em virtude do trabalhador se encontrar enfermo, uma vez que, o alcoolismo é catalogado no Código Internacional de Doenças pela Organização Mundial da Saúde, como doença. Na situação analisada, a empresa não poderia ter considerado o alcoolismo como falta grave, ainda mais, configurando a dispensa motivada do empregado, por se tratar de uma patologia já reconhecida, segundo a Juiza Angela Castilho Rogedo Ribeiro. Segundo Teixeira Filho (2012), de acordo com o novo entendimento médico, a embriaguez passou a ser vista como uma patologia clínica, deixando de ser considerada como um desvio de conduta do colaborador. E, isso ocorreu a partir do momento em que a Organização Mundial da Saúde incluiu o alcoolismo, que é uma patologia que causa alterações mentais, no Código Internacional de Doenças. Conclui-se que, a jurisprudência trabalhista tem adotado o entendimento de que o alcoolismo necessita ser analisado como uma patologia clínica grave, que compromete o funcionamento normal do cérebro e, o desenvolvimento das funções cognitivas, o que prejudica a prestação laboral. Com isso, o trabalhador alcoolatra precisa de tratamento, não podendo ser dispensando por justa causa. Já no caso 05, tem-se um recurso RORSum, onde houve a reversão da justa causa. No recurso, os reclamantes pleiteavam a reversão da justa causa aplicada ao colaborador, já falecido, bem como, buscavam o pagamento das verbas rescisórias que não foram pagas em decorrência da dispensa motivada e, a indenização prevista na Convenção Coletiva referente ao seguro de vida. Veja-se: PROCESSO nº 0010353-55.2021.5.03.0002 (RORSum) VOTO [...]. MÉRITO JUSTACAUSA. SEGURO DE VIDA Os reclamantes pleiteiam a reversão da justa causa aplicada ao de cujos, além do pagamento das verbas rescisórias correspondentes à dispensa imotivada e da indenização prevista na CCT referente ao seguro de vida. Afirmam que o trabalhador apresentava transtornos comportamentais devidos ao uso de álcool e que cabia à reclamada afastar o empregado das atividades, o que não ocorreu. Examino. O alcoolismo crônico é considerado doença pela Organização Mundial de Saúde. Diante disso, caso o empregado seja portador da referida doença, é necessário que o empregador proceda ao encaminhamento do trabalhador ao INSS, ao invés de promover a dispensa dele por justa causa se as faltas cometidas estiverem relacionadas com o estado de embriaguez. [...]. Pelo que se observa, as faltas que motivaram a dispensa por justa causa ocorreram em razão do alcoolismo crônico. Ocorre que, no caso, cabia à 37 ré proceder à suspensão do contrato de trabalho, e não punir o trabalhador com a aplicação da penalidade máxima. Diante disso, entendo que foi irregular a justa causa, a qual fica revertida em dispensa imotivada. Consequentemente, condeno a reclamada ao pagamento de 69 dias de aviso-prévio proporcional, 5/12 de férias proporcionais e multa de 40% do FGTS, nos limites solicitados na inicial (ID 71b232d - pág. 10). A data do fim do pacto foi 5/2/2020, dia do falecimento. [...]. Dou provimento ao apelo nesses termos. [...]. CONCLUSÃO Conheço do recurso e, no mérito, dou provimento para reverter a justa causa em dispensa imotivada e condenar a reclamada: a) a pagar aos reclamantes 69 dias de aviso-prévio proporcional, 5/12 de férias proporcionais e multa de 40% do FGTS; b) e a pagar à viúva, 1ª reclamante, o valor de R$ 13.833,31. [...]. ACÓRDÃO O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão Ordinária da Sexta Turma, hoje realizada, analisou o presente processo e, à unanimidade, conheceu do recurso; no mérito, sem divergência, deu provimento para reverter a justa causa em dispensa imotivada e condenar a reclamada: a) a pagar aos reclamantes 69 dias de aviso-prévio proporcional, 5/12 de férias proporcionais e multa de 40% do FGTS; b) e a pagar à viúva, 1ª reclamante, o valor de R$ 13.833,31. Fixou que os advogados dos reclamantes deverão receber a título de honorários sucumbenciais 5% sobre o valor líquido da condenação. Cumprindo o disposto no art. 832, § 3º, da CLT, declarou que possui natureza salarial o aviso-prévio. Declarou que deverão ser aplicados: o IPCA-E e a TR na fase pré-judicial e a taxa Selic (juros e correção monetária) a partir do ajuizamento da demanda, conforme decisão do STF. Os recolhimentos fiscais e previdenciários deverão ser realizados na forma da legislação em vigor e da Súmula n. 368 do TST. Fixou custas pela reclamada no importe de R$ 500,00, calculadas sobre R$ 25.000,00, valor arbitrado à condenação. [...]. Belo Horizonte, 31 de agosto de 2021. CÉSAR MACHADO - Desembargador Relator O TRT 3, em Sessão Ordinária da Sexta Turma, analisou o processo e, por unanimidade, deu provimento para reverter a justa causa em dispensa imotivada, condenando a reclamada a pagar todas as verbas trabalhistas pleiteadas. Segundo o Desembargador Relator César Machado (2021), o alcoolismo habitual deve ser considerado como doença, conforme preconiza a Organização Mundial de Saúde. E, diante dessa situação, o funcionário alcoolatra deve ser encaminhado ao INSS pela empresa, ao invés de ser dispensando por justa causa, desde que, as faltas cometidas estejam vinculdas ao estado de embriaguez. Percebe-se que o TRT 3, diante do provimento do recurso, vem prezando pela continuidade do contrato de trabalho e, não pela aplicação da penalidade máxima, que é a demissão por justa causa. No caso 06 tem-se um recurso ROT, onde houve a reversão da justa causa, veja-se: 38 EMENTA: JUSTA CAUSA - ABANDONO DE EMPREGO- REVERSÃO. Restando comprovado que o reclamante, no momento de sua dispensa, encontrava-se inapto ao trabalho, com sua capacidade de discernimento totalmente comprometida, internado em clínica para recuperação, não há como ser mantida a justa causa com base em abandono de emprego. [...]. ABANDONO DE EMPREGO - JUSTA CAUSA - ALCOOLISMO O Juízo de primeiro grau afastou a justa causa imputada ao autor ao fundamento de que as faltas que motivaram a ruptura do pacto laboral por justa causa (abandono de emprego) decorreram da ausência de capacidade do empregado em razão do transtorno por uso de álcool e de substâncias químicas do qual é portador. Determinou, ainda, a sua reintegração ao serviço, bem como o pagamento dos salários vencidos e vincendos, desde a dispensa até o efetivo retorno ao trabalho. [...]. É fato que a reclamada tinha total conhecimento do estado de saúde do reclamante e de sua dependência ao álcool e drogas, pois já o havia encaminhado, por diversas vezes, a seu programa interno de Prevenção e Atendimento ao Sujeito em relação ao Álcool e às Drogas - PASA (fl. 82). O que a reclamada deveria ter feito é encaminhado o trabalhador para o INSS, ao invés de dispensá-lo por justo motivo no momento em que ele mais se encontrava fragilizado, pois a dependência química de álcool e drogas é considerada doença, tanto que o reclamante já havia se afastado pelo órgão previdenciário por diversas vezes, inclusive com diversas internações. [...]. A Organização Mundial da Saúde reconhece a dependência alcóolica e química como doenças ("F10.2 - transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - síndrome de dependência" e "F19.2 - Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas - síndrome de dependência"). Considerada a ordem constitucional vigente, que consagra o ser humano como o principal destinatário da ordem jurídica, impõe-se a adoção, por parte de todos os integrantes da coletividade, das medidas necessárias à sua proteção e valorização. Neste intuito, o papel das empresas é de extrema relevância, porque é fácil vislumbrar que, estando desempregado, o dependente tem maior probabilidade de ceder ao vício. E, conforme salientado pelo perito, a dependência do álcool é uma enfermidade crônica, com possibilidade de recaídas abruptas. Dessa forma, assim como concluiu o Juízo de origem, o reclamante, no momento de sua dispensa, encontrava-se inapto, com sua capacidade de discernimento totalmente comprometida, o que impede a manutenção da justa causa com base no abandono de emprego. Ademais, os telegramas citados pela ré convocando-o a retornar ao trabalho foram enviados para sua residência, quando este, na verdade, encontrava-se internado em uma clínica no interior do estado. Em face disso, mantenho a decisão recorrida que declarou a nulidade da dispensa por justa causa, com consequente reintegração do empregado ao trabalho, haja vista a declaração do perito de que o autor atualmente se encontra apto ao trabalho, com o pagamento de todas das parcelas salariais devidas durante o afastamento, parcelas vencidas e vincendas, tudo conforme estipulado na sentença. Ressalte-se que o juízo de origem já ressalvou que, na constatação pela empresa de impossibilidade do reclamante de exercer as mesmas funções anteriores, ele deverá ser readaptado ou, se for o caso, encaminhado ao INSS, para fins de concessão de auxílio-doença ou até mesmo aposentadoria por invalidez. Nego provimento. [...]. ACÓRDÃO FUNDAMENTOS PELOS QUAIS, A Segunda Turma, do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão hoje realizada, à unanimidade, conheceu do recurso e, 39 no mérito, por maioria de votos, negou provimento ao apelo, vencida a Exma. Juíza segunda votante. [...]. Belo Horizonte, 14 de dezembro de 2021. Pela análise do recurso, percebe-se que, o reclamante, quando foi demitido, encontrava-se inapto ao trabalho, em decorrência do alcoolismo,
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