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1 Psicopedagogia e Neurociências DIFICULDADES, TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM E OUTRAS ALTERAÇÕES DO DESENVOLVIMENTO Unidades I a VIII Talita de Cassia Batista Pazeto Edna Barberato Genghini PAZETO, Talita de Cássia Batista GENGHINI, Edna Barberato Dificuldades, Transtornos de aprendizagem e outras Alterações do Desenvolvimento (Livro-texto – Unidades I a VIII) / Talita de Cássia Batista Pazeto; Edna Barberato Genghini – São Paulo: Pós-graduação Lato Sensu – UNIP, 2019 164 p. il. I.1 Dificuldades de Aprendizagem. 2 Transtornos de Aprendizagem. 3 Transtornos Globais do Desenvolvimento. 4 Neurodesenvolvimento. 5 Síndromes Cromossômicas. 6 Psicopedagogia II. Talita de Cássia Batista Pazeto; Edna Barberato Genghini. – III. Dificuldades, Transtornos de aprendizagem e outras Alterações do Desenvolvimento (Livro- texto – Unidades I a VIII). São Paulo: Pós-Graduação Lato Sensu - UNIP, 2019. DIFICULDADES, TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM E OUTRAS ALTERAÇÕES DO DESENVOLVIMENTO APRESENTAÇÃO DO PROFESSOR-AUTOR Talita de Cassia Batista Pazeto possui graduação em Pedagogia pela Universidade Bandeirante de São Paulo (2009), pós-graduação em Psicopedagogia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2011), Mestrado (2012) e Doutorado (2016) em Distúrbios do Desenvolvimento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Possui experiência e realiza atendimento psicopedagógico na área de avaliação e intervenção em dificuldades e Transtornos Específicos de Aprendizagem. Palestrante e professora convidada do curso de pós-graduação em Psicopedagogia na Universidade Presbiteriana Mackenzie. Experiência como Professora nos cursos de Pedagogia, Psicologia, Letras e História e na pós em Psicopedagogia nas Universidades: Anhanguera; Faculdade das Américas e FMU. Pesquisa na área de desenvolvimento infantil, com foco em habilidades pré- escolares, leitura, escrita, linguagem e funções executivas. Professora Colaboradora: EDNA BARBERATO GENGHINI, Professora Universitária desde 2002. Atualmente no exercício da função de Coordenadora para todo o Brasil de cinco cursos ao nível de Pós Graduação Lato Sensu: em PSICOPEDAGOGIA E NEUROCIÊNCIAS, PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL, DOCÊNCIA PARA O ENSINO SUPERIOR, FORMAÇÃO E GESTÃO EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA e em FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA, pela UNIP - UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP/EaD, onde também atua como Professora Adjunta, nas modalidades SEI e SEPI. É Diretora e Psicopedagoga da MENTOR ORIENTAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA LTDA. ME desde 1991. Possui graduação em Economia Doméstica - Faculdades Integradas Teresa D'Ávila de Santo André (1980), graduação em Pedagogia pela Universidade Guarulhos (1985), Pós-graduação em Psicopedagogia pela Universidade São Judas (1987), Mestrado em Ciências Humanas pela Universidade Guarulhos (2002) e pós-graduação Lato Sensu em Formação em Educação a Distância pela UNIP - Universidade Paulista (2011). É autora e coautora de livros Textos para os cursos de Pós-Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia Institucional, Docência para o Ensino Superior e Formação em Educação a Distância da UNIP - EaD. Áreas de Interesse: Neurociências - Educação Inclusiva - Psicopedagogia Clínica e Institucional - Formação e Gestão em Educação a Distância - Formação de Docentes para o Ensino Superior. DIFICULDADES, TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM E OUTRAS ALTERAÇÕES DO DESENVOLVIMENTO SUMÁRIO INTRODUÇÃO 005 UNIDADE I – DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E OS MANUAIS MÉDICOS 006 1.1) Aprendizagem 006 1.2) Dificuldades de Aprendizagem 009 1.3) DSM-5 e CID: conhecendo os manuais médicos 015 UNIDADE II – DIFICULDADES E TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM 020 2.1) Transtornos Específicos de aprendizagem 020 2.2) Critérios Diagnósticos dos TEAs 023 2.3) Diferenças entre as dificuldades e os TEAs 032 UNIDADE III – TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM E O TDAH 037 3.1) TEAs: dislexia 037 3.2) TEAs: disgrafia e disortografia 047 3.3) TEAs: discalculia 050 3.4) Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade 054 UNIDADE IV– TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO E TRANSTORNO DO ESPECTRO DO AUTISMO 064 4.1) Transtornos Globais do Desenvolvimento 064 4.2) Transtorno do Espectro do Autismo 065 UNIDADE V – ALTERAÇÕES E TRANSTORNOS DO NEURODESENVOLVIMENTO (PARTE 1) 083 5.1) Transtornos de comportamento 083 5.2) Deficiência visual 086 5.3) Deficiência auditiva 088 5.4) Deficiência motora 091 5.5) Dispraxia infantil 093 5.6) Paralisia cerebral 094 UNIDADE VI – ALTERAÇÕES E TRANSTORNOS DO NEURODESENVOLVIMENTO (PARTE 2) 103 6.1) Alterações no PAC 103 6.2) Alterações nas Funções Executivas 105 6.3) Deficiência intelectual 11 6.4) Deficiências múltiplas 115 UNIDADE VII– SÍNDROMES CROMOSSÔMICAS 122 7.1) Síndrome de Down 122 7.2) Síndrome do X Frágil 130 7.3) Síndrome de Williams 133 7.4) Síndrome de Rett 136 7.5) Síndrome de Turner 138 7.6) Síndrome de Klinefelter 140 UNIDADE VIII – O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO DIANTE DAS DIFICULDADES, TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM E OUTRAS ALTERAÇÕES DO DESENVOLVIMENTO 147 8.1) Atuação do psicopedagogo diante dessas alterações 147 8.2) Reflexões sobre avaliação e intervenção psicopedagógica 151 REFERÊNCIAS 162 5 INTRODUÇÃO A disciplina “Dificuldades, transtornos de aprendizagem e outras alterações do desenvolvimento” tem como foco capacitar o profissional das áreas da educação e da saúde em compreender os processos de aprendizagem com objetivo de entender a diferença entre dificuldades e transtornos específicos de aprendizagem assim como de conhecer as características básicas dos transtornos de aprendizagem e dos principais transtornos do neurodesenvolvimento. Veremos a caracterização e diferenciação entre dificuldades de aprendizagem, Transtorno Específico de Aprendizagem (TEAp) e Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), com base nos manuais de classificação de transtornos do neurodesenvolvimento (DSM-5) e no CID 10. Apresentaremos as principais causas das dificuldades e outros fatores que interferem na aprendizagem, assim como conheceremos os transtornos específicos de aprendizagem: Dislexia, Discalculia, Disgrafia e Disortografia. Refletiremos sobre fatores que impactam a aprendizagem assim como os critérios diagnósticos desses transtornos e a importância da avaliação interdisciplinar em casos de suspeitas. Caracterizaremos os Transtornos Globais do Desenvolvimento e outros transtornos físicos e mentais que interferem na aprendizagem: TEA (Transtorno do Espectro Autista), Transtornos do Comportamento, Deficiência Visual, Deficiência Auditiva, Deficiência Motora, Dispraxia Infantil, Paralisia Cerebral, Alterações no PAC, Deficiências nas Funções Executivas, Deficiência Intelectual e Deficiências Múltiplas. Apresentaremos as principais Síndromes Cromossômicas que afetam a aprendizagem, encontradas nos meios escolares brasileiros (da Educação Infantil ao Ensino Superior): Síndrome de Down, X Frágil, Willia8u9ums, Rett, Turner, Klinefelter. A proposta é apresentar ao profissional e embasá-lo com os principais transtornos e alterações que ele pode encontrar em sua prática, lembrando que tudo aqui apresentado é apenas uma base de por onde o trabalho deve começar. O seu papel de aluno é o de pesquisar, realizar as leituras obrigatórias, investigar o saiba mais, assistir as aulas e se aprofundar muito além do que está aqui explanado!Vamos lá?! 6 I. DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E OS MANUAIS MÉDICOS Olá, aluno(a)! Nesta Unidade de Ensino vamos conhecer um pouco sobre o conceito de Dificuldades de Aprendizagem e como os mesmos são localizados nos manuais médicos: a forma de apresentação dos sintomas e os critérios que devemos utilizar para inclusão de casos de forma a prepara-lo(a) para elaborar sua avaliação diagnóstica. Preparado(a)? Vamos lá, pois temos uma longa jornada e muitas definições pela frente! 1.1 Aprendizagem A aprendizagem possui uma base neurológica, que se relaciona com a forma como cada cérebro é formado e estruturado, já que cada um se organiza de acordo com as experiências individuais e estímulos de cada pessoa, acontece a partir da junção de fatores genéticos mais a experiência. Diversos componentes afetam o processo de aprendizagem, como o ambiente, o estímulo, a disposição de quem ensina e de quem aprende, o estado emocional e muito mais, porém é no cérebro, principalmente no Sistema Nervoso Central que toda base desse processo acontece. Mesmo tendo essa base neurológica, cada pessoa irá desenvolver seus processos de aprendizagem de forma diferenciada e Cosenza e Guerra (2011, p. 28) exemplificam essa formação ao comparar a estrutura e organização cerebral com uma cidade: É como uma cidade planejada, que à medida que vai sendo construída vai adquirindo características próprias, podendo ocorrer, inclusive, algumas mudanças no plano original. A história de vida de cada um constrói, desfaz e reorganiza permanentemente as conexões sinápticas entre os bilhões de neurônios que constituem o cérebro. Assim como cada cidade é diferente da outra, cada cérebro se organiza e se forma de maneira única e exclusiva, definindo assim a forma e os estilos de aprendizagem de cada um. As pessoas aprendem de forma diferente 7 porque as pessoas são diferentes, na forma como cada cérebro irá se moldando assim como fisicamente, temperamento, personalidade, de onde vêm, no que acreditam, entre diversas outras áreas. Esse desenvolvimento se inicia desde a formação do embrião, tendo o sistema nervoso central um papel fundamental nesse processo, pois é por meio dele e de sua formação que diversas estruturas são formadas, e por isso falhas ou erros ocorridos nesse momento podem gerar alterações e distúrbios que a pessoa carregará por toda sua vida (COSENZA; GUERRA, 2011). Para conhecer mais sobre a base neurológica da aprendizagem leia COSENZA, R. M.; GUERRA, L. B. Neurociência e Educação: como o cérebro aprende. Porto Alegre: Artmed, 2011. É impressionante pensar que os processos de aprendizagem podem ser afetados por algo que ocorreu durante a gestação, e por isso os cuidados pré- natais e o estilo de vida que a gestante leva são tão importantes para o desenvolvimento do bebê. Além de todos esses fatores biológicos a interação com o ambiente exerce grande influência no desenvolvimento dos processos de aprendizagem, pois ela afeta as interações, apresenta modelos e reflete nos comportamentos de cada pessoa. Um ambiente empobrecido não fornece o necessário para um desenvolvimento saudável da criança, assim como não estimula de forma adequada as habilidades em potencial de cada período. 8 Cuidado com o exagero de estímulos na primeira infância, pois assim como foi explicado que um ambiente empobrecido pode afetar de forma negativa o desenvolvimento infantil, ainda não se sabe se a estimulação exagerada pode prejudicar a longo prazo a vida da criança (COSENZA; GUERRA, 2011). Rotta, Ohlweilwe e Riesgo (2016) descrevem que a aprendizagem então é um processo que envolve (Figura 1): Figura 1: Processos envolvidos na aprendizagem Fonte: (ROTTA; OHLWEILWE; RIESGO, 2016 adaptado por PAZETO, 2019). O aprendizado só é possível porque somos capazes de adquirir, manter e de retomar o conhecimento diante de situações que precisam ser resolvidas por meio de informações armazenadas na nossa memória. E é exatamente por uma falha ou dificuldade em algum desses processos que as dificuldades de aprendizagem começam a aparecer. Aquisição Conserva ção Evocação 9 1.2 Dificuldades de Aprendizagem Dificuldades de aprendizagem envolve diversos problemas que alteram a capacidade e as possibilidades da criança de aprender e são percebidas principalmente no ambiente escolar por meio da observação de comportamentos problemáticos, sendo as crianças caracterizadas por apresentarem: Dificuldades para seguir instruções; Imaturidade social; Dificuldade com a conversação; Inflexibilidade; Fraco planejamento e habilidades organizacionais; Distração; Falta de Destreza; Falta de controle dos impulsos; Entre outros. Smith e Strick (2001) além de apresentarem essa lista de comportamentos descrevem que quando a criança não é devidamente atendida e observada visando compreender as causas de suas dificuldades ela é vista como que se não estivesse fazendo esforço para cooperar ou simplesmente não prestasse atenção. Porém ao observar a criança é possível identificar alguns sinais, como por exemplo: Queixas gerais da escola; Queixas de tédio; Recusa em falar sobre a escola; Perda do orgulho pelo trabalho escolar; 10 Baixo desempenho inesperado. Comportamento ou problemas emocionais persistentes. Declínio na confiança e na autoestima. São crianças que apresentam uma discrepância entre o que estão fazendo e o que tem potencial para fazer, apresentando desempenho inconsistente e perdendo o interesse pela aprendizagem. Elas começam a desenvolver diversas estratégias e a apresentar questões comportamentais a fim de evitar a frustração ao realizar tarefas que não conseguem ou que têm dificuldades. Muitos fatores podem estar influenciando negativamente e causando essa dificuldade no aprender que podem ser verificados na figura 2 (SMITH; STRICK, 2001): Figura 2: Fatores que influenciam a aprendizagem Fonte: (SMITH; STRICK, 2001 adaptado por PAZETO, 2019) Tipo de escola Professor Escolarização inadequada Falta de estímulos em relação ao desenvolvimento Meio familiar Meio social Estrutura financeira Alterações do neurodesenvolvi mento Doenças 11 ROTTA, et al. (2016, p.98-99) descreve que as dificuldades de aprendizagem da criança podem estar relacionadas principalmente a fatores escolares, familiares e relativos a própria criança, que podem ser verificados na Figura 3: Figura 3: Fatores escolares e familiares que afetam a aprendizagem FONTE: (ROTTA, et al., 2016 adaptado por PAZETO, 2019) Todas essas áreas precisam ser olhadas quando uma criança começa a apresentar dificuldades de aprendizagem. O mais comum é que o não aprender seja justificado apenas por alguma causa da própria criança, sem considerar que pode ser a metodologia da escola, a estratégia de ensino que o professor está utilizando ou até mesmo alguma mudança que tenha ocorrido em casa, como a perda de um ente querido, um processo de separação ou alguma doença que a criança esteja. Às vezes um simples mudar de período da criança na mesma escola pode fazer com que ela tenha dificuldades de aprendizagem, porque apesar de julgarmos que essa é uma situação simples, para a criança pode não ser, pois Escolares •Condições físicas de sala de aula, que se relacionam com um ambiente seguro, limpo, arejado, com boa iluminação e com um limite aceitável de alunos em cada turma; •Condições pedagógicas, que se relacionam à disponibilidade de material didático adequado para a faixa de idade a que se destina, método pedagógico de acordo com a realidade da criança, otimização da duração do turno escolar e a preocupação de interação escola-família; •Condições do corpo docente, que se referemà motivação, dedicação, qualificação e remuneração adequada. Os problemas emocionais, sociais e econômicos do professor interferem em seu trabalho e em sua interação com o aluno. A baixa remuneração dos professores impede que muitos deles se dediquem a um grupo de alunos de cada vez, pois necessitam trabalhar em dois ou até três turnos, o que interfere em seu desempenho na sala de aula. Familiares •Escolaridade dos pais, principalmente das mães, em diferentes pesquisas, desempenha um papel fundamental na estimulação da criança para um melhor envolvimento com os estudos. •O hábito da leitura na família, sem dúvida, constitui um diferencial na estimulação pedagógica do escolar. •Condições socioeconômicas, na maioria das vezes com renda familiar insuficiente, são relevantes e, com frequência, estão implicadas no fracasso escolar. •História familiar de alcoolismo e de uso de drogas; •Pais desempregados ou com comportamento antissocial costumam fazer parte de uma anamnese completa e, não raro, constituem a única etiologia ou um reforço para o insucesso da criança na escola. •Fatores importantes na desagregação familiar, como pais separados ou em constantes litígios, também podem influenciar negativamente o desempenho escolar da criança. 12 ao mudar ela pode não se adaptar à nova turma, a professora ou ter dificuldades para fazer amigos e todo esse contexto afetar a sua aprendizagem. Em relação a criança é necessário observar então questões relacionadas a alterações físicas, neurológicas, transtornos psiquiátricos e deficiência intelectuais. O processo de aprendizagem é bastante complexo e por isso situações que podemos julgar como simples ou pequenas podem afetar o aprender da criança! Muitos profissionais utilizam de forma incorreta as terminologias, confundindo o uso dos termos dificuldades e transtornos de aprendizagem. As dificuldades de aprendizagem podem ser classificadas em naturais ou secundárias. Rotta, et al. (2016, pp. 86 e 87) diferencia da seguinte forma: Dificuldades naturais: àquelas dificuldades experimentadas por todos os indivíduos em alguma matéria e/ou em algum momento de sua vida escolar. Os fatores causadores dessas dificuldades estão relacionados a aspectos evolutivos ou são decorrentes de problemas na proposta pedagógica, de padrões de exigência da escola, de falta de assiduidade do aluno e de conflitos familiares eventuais. São, em geral, dificuldades naturais, evolutivas e, portanto, transitórias, que tendem a desaparecer a partir de um esforço maior do aluno ou da ajuda de professor particular. Dificuldades secundárias: dificuldades secundárias a outros quadros diagnósticos. Problemas na aprendizagem escolar, decorrentes de transtornos que atuam primeiramente sobre o desenvolvimento humano normal e secundariamente sobre as aprendizagens específicas. Nessa subcategoria, estão incluídos os portadores de deficiência mental, sensorial, e aqueles com quadros neurológicos mais graves ou com transtornos emocionais significativos. Para a 13 caracterização das dificuldades secundárias, é imprescindível o diálogo com outros profissionais, particularmente psicólogos, psiquiatras e neurologistas, visto que o diagnóstico primário é fornecido por eles. Você consegue pensar em mais exemplos que podem afetar a aprendizagem da criança e fazer com que elas apresentem uma dificuldade ou alguma situação que tenha acontecido com você e que durante um tempo gerou uma dificuldade de aprendizagem? Registre a seguir: _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Compreender o conceito de dificuldades de aprendizagem é fundamental para depois entender o conceito de transtornos específicos de aprendizagem, que será abordado na próxima unidade e conseguir assim utilizar de forma correta as nomenclaturas. 14 ROTTA, N.T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R.S. (Org.). Transtornos da Aprendizagem. Abordagem Neurobiológica e Multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2016. Quando a criança apresenta a dificuldade, quando ela não consegue aprender da forma que precisa nem no ritmo para acompanhar os pares da mesma idade e o profissional já investigou e verificou todas ás áreas que descrevemos anteriormente, assim como já realizou intervenções focadas na dificuldade que estava observando e mesmo assim a criança não responde de forma adequada, ou está respondendo mas muito devagar, começamos a investigar a possibilidade de um transtorno específico de Aprendizagem. Os transtornos específicos de aprendizagem (TEAs) são avaliados por meio de dois manuais médicos, o DSM-5 e a CID-10 (Figura 4). Figura 4: Manuais médicos para diagnóstico dos TEAs FONTE: https://books.google.com.br 15 1.3 DSM-5 e CID: conhecendo os manuais médicos No prefácio do DSM-5 eles descrevem que o Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM), da American Psychiatric Association, é uma classificação de transtornos mentais e critérios associados elaborados para facilitar o estabelecimento de diagnósticos mais confiáveis desses transtornos. Com sucessivas edições ao longo dos últimos 60 anos, tornou-se uma referência para a prática clínica na área da saúde mental. Devido à impossibilidade de uma descrição completa dos processos patológicos subjacentes à maioria dos transtornos mentais, é importante enfatizar que os critérios diagnósticos atuais constituem a melhor descrição disponível de como os transtornos mentais se expressam e podem ser reconhecidos por clínicos treinados. O DSM se propõe a servir como um guia prático, funcional e flexível para organizar informações que podem auxiliar o diagnóstico preciso e o tratamento de transtornos mentais. Trata-se de uma ferramenta para clínicos, um recurso essencial para a formação de estudantes e profissionais e uma referência para pesquisadores da área. Embora esta edição tenha sido elaborada, acima de tudo, como um guia para a prática clínica, tratando-se de uma nomenclatura oficial, o Manual deve funcionar em uma ampla gama de contextos. O DSM tem sido utilizado por clínicos e pesquisadores de diferentes orientações (biológica, psicodinâmica, cognitiva, comportamental, interpessoal, familiar/sistêmica) que buscam uma linguagem comum para comunicar as características essenciais dos transtornos mentais apresentados por seus pacientes. As informações aqui resumidas são úteis para todos os profissionais ligados aos diversos aspectos dos cuidados com a saúde mental, incluindo psiquiatras, outros médicos, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros, consultores, especialistas das áreas forense e legal, terapeutas ocupacionais e de reabilitação e outros profissionais da área da saúde. Os critérios são concisos e claros, e suaintenção é facilitar uma avaliação objetiva das apresentações de sintomas em diversos contextos clínicos – internação, ambulatório, hospital-dia, consultoria (Inter consulta), clínica, consultório particular e atenção primária –, bem como em estudos epidemiológicos de base comunitária sobre transtornos mentais. 16 O DSM-5 também é um instrumento para a coleta e a comunicação precisa de estatísticas de saúde pública sobre as taxas de morbidade e mortalidade dos transtornos mentais. Por fim, os critérios e o texto correspondente servem como livro-texto para estudantes que precisam de uma forma estruturada para compreender e diagnosticar transtornos mentais, bem como para profissionais experientes que encontram transtornos raros pela primeira vez. Felizmente, todos esses usos são compatíveis entre si. Já na CID-10 - A Classificação Internacional de Doenças – CID 10 (International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems) tem como objetivo fornecer códigos relativos à classificação de doenças e de uma grande variedade de sinais, sintomas, aspectos anormais, queixas, circunstâncias sociais e causas externas para ferimentos ou doenças. A cada estado de saúde é atribuída uma categoria única à qual corresponde um código, que contém até 6 caracteres. Tais categorias podem incluir um conjunto de doenças semelhantes. A CID é publicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e é usada globalmente para estatísticas de morbilidade e de mortalidade, sistemas de reembolso e de decisões automáticas de suporte em medicina. A introdução da CID-10 descreve que uma classificação de doenças pode ser definida como um sistema de categorias atribuídas a entidades mórbidas segundo algum critério estabelecido. Existem vários eixos possíveis de classificação e aquele que vier a ser selecionado dependerá do uso das estatísticas elaboradas. Uma classificação estatística de doenças precisa incluir todas as entidades mórbidas dentro de um número manuseável de categorias. Esses dois manuais serão a nossa base de definição e compreensão dos transtornos específicos de aprendizagem que serão abordados na proxima unidade. Análise o estudo de caso a seguir e descreva se a criança possui dificuldades de aprendizagem naturais ou secundárias e justifique: 17 A professora de Joana tem percebido que ela não está conseguindo acompanhar os colegas de classe como o esperado, que ela demonstra dificuldades em compreensão de texto e principalmente na matemática em tarefas que exigem maior compreensão e atenção. Joana tem 10 anos e é aluna dessa escola particular na região central de sua cidade desde o começo do ano. Quando entrou nessa nova escola, seus responsáveis explicaram para a coordenação que a escola que ela estudava até o ano anterior era uma escola com uma metodologia bem diferente da atual, e que ela estava naquela escola desde a educação infantil, porém por conta da mudança de serviço da mãe, eles precisaram mudar ela de escola. _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Gabarito: A Joana possui dificuldades naturais, que são àquelas dificuldades experimentadas por todos os indivíduos em alguma matéria e/ou em algum momento de sua vida escolar. Os fatores causadores dessas dificuldades estão relacionados a aspectos evolutivos ou são decorrentes de problemas na proposta pedagógica, de padrões de exigência da escola, de falta de assiduidade do aluno e de conflitos familiares eventuais. São, em geral, dificuldades naturais, evolutivas e, portanto, transitórias, que tendem a desaparecer a partir de um esforço maior do aluno ou da ajuda de professor particular. Como no estudo de caso a escola atual apresenta uma metodologia muito diferente da anterior pode ser que Joana esteja apresentando dificuldades para se adaptar à nova metodologia e por isso está apresentando dificuldades de aprendizagem, porém com o olhar e intervenção adequados ela pode superar e se ajustar as novas expectativas. 18 Caro(a) aluno(a): Nessa unidade vimos que: A aprendizagem possui uma base neurológica, que se relaciona com a forma como cada cérebro é formado e estruturado e acontece a partir da junção de fatores genéticos mais a experiência; O aprendizado só é possível porque somos capazes de adquirir, manter e de retomar o conhecimento; As dificuldades de aprendizagem envolvem diversos problemas que alteram a capacidade e as possibilidades da criança de aprender e são percebidas principalmente no ambiente escolar por meio da observação de comportamentos problemáticos; As dificuldades de aprendizagem da criança podem estar relacionadas principalmente a fatores escolares, familiares e relativos a própria criança; As dificuldades de aprendizagem podem ser classificadas em naturais ou secundárias; Os transtornos específicos de aprendizagem são avaliados por meio de dois manuais médicos, o DSM-5 e a CID-10; O DSM-5 (Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais) é uma classificação de transtornos mentais e critérios associados elaborada para facilitar o estabelecimento de diagnósticos mais confiáveis desses transtornos; A CID-10 (Classificação Internacional de Doenças) tem como objetivo fornecer códigos relativos à classificação de doenças e de uma grande variedade de sinais, sintomas, aspectos anormais, queixas, circunstâncias sociais e causas externas para ferimentos ou doenças. 19 Então? Você aprendeu bastante do conteúdo desta Unidade? Vamos partir para a Unidade II e aprender mais um pouco para, depois, estarmos prontos para podermos elaborar as avaliações e estabelecermos os critérios de intervenções psicopedagógicas. Pronto(a)? Vamos lá! 20 II. DIFICULDADES E TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM Olá, aluno(a)! Bem-vindo(a) à Unidade II Nesta unidade vamos estudar os Transtornos Específicos de Aprendizagem e aprendermos um pouco sobre as diferenças entre as Dificuldades de Aprendizagem e os Transtornos Específicos de Aprendizagem. Na sequência, vamos falar sobre os Critérios Diagnósticos dos TEAs, preparando você para a próxima disciplina (Avaliação Neuropsicopedagógica) e para o exercício da Psicopedagogia Clínica. Preparado(a)? Então vamos lá! 2.1 Transtornos específicos de aprendizagem Os transtornos específicos de aprendizagem (TEAS) englobam aquelas crianças que apresentam um desempenho abaixo do esperado e que precisam de intervenções direcionadas para conseguirem avançar nos processos de aprendizagem. São crianças que apresentam uma dificuldade de aprendizagem, porém quando avaliados todos os pontos discutidos na Unidade I (dificuldades primárias e secundárias), não são suficientes para justificar o porquê de a criança não conseguir aprender da forma como o esperado para a idade e ano escolar. O transtorno específico da aprendizagem é um transtorno do neurodesenvolvimento com uma origem biológica que é a base das anormalidadesno nível cognitivo as quais são associadas com as manifestações comportamentais. A origem biológica inclui uma interação de fatores genéticos, epigenéticos e ambientais que influenciam a capacidade do cérebro para perceber ou processar informações verbais ou não verbais com eficiência e exatidão (APA, 2014 p.68). 21 Em grande parte, as pesquisas e os manuais sobre os TEAS englobam quatro áreas que precisam ser observadas (FLETCHER et al., 2009): 1. Discrepância entre o que a criança é capaz de realizar e o seu real desempenho; 2. Desempenho abaixo do esperado para a idade e ano escolar; 3. Diferenças intraindividuais (da própria criança); 4. Resposta da criança à instrução. FLETCHER, JM; LYONS, GR; FUCHS, LS; BARNES, MA. Transtornos de Aprendizagem: da Identificação à Intervenção. Porto Alegre: Artmed, 2009. Existem critérios específicos para que uma criança se enquadre dentro de algum dos transtornos e uma forma de avaliação para identificar corretamente, que apresentaremos a seguir de acordo com os dois manuais médicos (DSM-5 e CID-10). Apesar dos dois manuais serem os mais recomendados para a avaliação e identificação de uma criança com um transtorno específico de aprendizagem, o DSM-5 é o mais utilizado na área educacional e por isso será o mais abordado também aqui em toda formação. 22 AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (APA). Manual diagnóstico e estatístico de transtorno mentais: DSM- 5. 5th ed. Porto Alegre: Artmed, 2014 (páginas 66 a 74). Inicialmente descreveremos os TEAS pelo DSM-5, segundo esse manual as características de um transtorno específico de aprendizagem têm como características (APA, 2014 p.32): Ser diagnosticado diante de déficits específicos na capacidade individual para perceber ou processar informações com eficiência e precisão; Manifesta-se, inicialmente, durante os anos de escolaridade formal, caracterizando-se por dificuldades persistentes e prejudiciais nas habilidades básicas acadêmicas de leitura, escrita e/ou matemática; O desempenho individual nas habilidades acadêmicas afetadas está bastante abaixo da média para a idade, ou níveis de desempenho aceitáveis são atingidos somente com esforço extraordinário; O transtorno específico da aprendizagem pode ocorrer em pessoas identificadas como apresentando altas habilidades intelectuais e manifestar-se apenas quando as demandas de aprendizagem ou procedimentos de avaliação (p. ex., testes cronometrados) impõem barreiras que não podem ser vencidas pela inteligência inata ou por estratégias compensatórias; Para todas as pessoas, o transtorno específico da aprendizagem pode acarretar prejuízos duradouros em atividades que dependam das habilidades, inclusive no desempenho profissional. 23 2.2 Critérios diagnósticos dos TEAS O primeiro critério diagnóstico segundo o DSM-5 é (APA, 2014 p. 66): Mousinho e Navas (2016) escreveram um artigo descrevendo sobre como o DSM-5 trata os TEAS e apresentando as principais alterações das versões anteriores. Um dos principais ganhos e contribuições para as crianças foi a mudança de acrescentar que antes de dizer que uma pessoa tem um TEA ela deve passar por intervenção focada por pelo menos seis meses. Essa alteração é fundamental para evitar diagnósticos incorretos que classificavam crianças com dificuldades de aprendizagem nesse grupo com TEAS. Trata-se de um modelo em que o diagnóstico não é dado a priori; inicialmente, pode ser estabelecida uma hipótese diagnóstica, que deve ser confirmada após um período de intervenção eficaz e cientificamente embasada. Tal proposta baseia-se na ideia de que, como há muitas variáveis ambientais que podem promover um falso positivo para um diagnóstico (no caso, de dislexia), a evolução no período de 6 meses de intervenção ou a rapidez e o modo de resposta podem ser aspectos decisivos para confirmar ou não o diagnóstico (MOUSINHO & NAVAS, 2016, p. 39). A figura 5 apresenta um fluxograma explicando essa nova alteração: (A) Dificuldades na aprendizagem e no uso de habilidades acadêmicas, conforme indicado pela presença de ao menos um dos sintomas a seguir que tenha persistido por pelo menos 6 meses, apesar da provisão de intervenções dirigidas a essas dificuldades. 24 Figura 5: Modelo de intervenção FONTE: (MOUSINHO; NAVAS, 2016, p. 39) Essa mudança é fundamental para direcionar o olhar primeiro para a criança e não simplesmente focar em avaliar e dizer se ela tem ou não um tea. Além disso, serve como base para que vocês fiquem atentos com os relatórios que recebem dizendo que uma criança tem um transtorno específico de aprendizagem. Pois, se todos os critérios aqui apresentados não forem seguidos e se a criança não tiver passado por intervenção antes dessa classificação o profissional que a avaliou não está seguindo as recomendações dos manuais. Marta é uma menina de 8 anos que acabou de iniciar o terceiro ano do ensino fundamental. Ela ainda não está alfabetizada, porém os demais colegas do mesmo ano já estão conseguindo ler pequenas frases e avançando no processo de leitura e de escrita. A professora de Marta diz que ela tem um transtorno específico de leitura (dislexia), pois a dificuldade dela para se alfabetizar é muito grande. De acordo com as discussões até o momento a fala 25 da professora de Marta está correta? O que ela deveria fazer em relação a Marta que seguiria o procedimento correto que o DSM-5 indica? __________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Gabarito: Como explicado a grande mudança na última versão do DSM- 5 foi acrescentar que antes de uma criança ser encaminhada ou que seja diagnosticada com um transtorno ela deve passar por pelo menos 6 meses de intervenções direcionadas a sua dificuldade. Então, a professora de Marta deveria retomar a alfabetização dela para primeiro verificar se ela recebeu nos anos anteriores as instruções que precisava, além disso, investigar se existe alguma alteração que justifique essa dificuldade dela em aprender (Unid.1) e, depois desse trabalho feito e caso não obtenha os resultados esperados, então encaminhar para uma avaliação multidisciplinar para confirmar ou não a suspeita de um transtorno. 26 CUIDADO! Professor não realiza diagnóstico de um transtorno específico de aprendizagem, a avaliação deve ser multidisciplinar e seguir todos os critérios que serão abordados a seguir. O professor deve compartilhar os comportamentos e as dificuldades que observa no dia a dia, mas nunca enquadrar uma criança em alguma alteração simplesmente por essa observação! Os TEAS englobam basicamente dificuldades e alterações nas habilidades de leitura, escrita e matemática,conforme pode ser visualizado na figura 6 (APA, 2014 p. 66): Figura 6: Dificuldades na leitura, escrita e matemática dos TEAS 27 FONTE: (APA, 2014 p.66 adaptado por PAZETO, 2019) Os demais critérios diagnósticos para identificar os teas são (APA, 2014 p.66-67): B – As habilidades acadêmicas afetadas estão substancial e quantitativamente abaixo do esperado para a idade cronológica do indivíduo, causando interferência significativa no desempenho acadêmico ou profissional ou nas atividades cotidianas, confirmada por meio de medidas de desempenho padronizadas administradas individualmente e por avaliação clínica abrangente. Para indivíduos com 17 anos ou mais, história documentada das dificuldades de aprendizagem com prejuízo pode ser substituída por uma avaliação padronizada. C – As dificuldades de aprendizagem iniciam-se durante os anos escolares, mas podem não se manifestar completamente até que as exigências pelas habilidades acadêmicas afetadas excedam as capacidades limitadas do indivíduo (p. ex., em testes cronometrados, Leitura •1. Leitura de palavras de forma imprecisa ou lenta e com esforço (p. ex., lê palavras isoladas em voz alta, de forma incorreta ou lenta e hesitante, frequentemente adivinha palavras, tem dificuldade de soletrá- las). •2. Dificuldade para compreender o sentido do que é lido (p. ex., pode ler o texto com precisão, mas não compreende a sequência, as relações, as inferências ou os sentidos mais profundos do que é lido). Escrita •3. Dificuldades para ortografar (ou escrever ortograficamente) (p. ex., pode adicionar, omitir ou substituir vogais e consoantes). •4. Dificuldades com a expressão escrita (p. ex., comete múltiplos erros de gramática ou pontuação nas frases; emprega organização inadequada de parágrafos; expressão escrita das ideias sem clareza). Matemática •5. Dificuldades para dominar o senso numérico, fatos numéricos ou cálculo (p. ex., entende números, sua magnitude e relações de forma insatisfatória; conta com os dedos para adicionar números de um dígito em vez de lembrar o fato aritmético, como fazem os colegas; perde-se no meio de cálculos aritméticos e pode trocar as operações). • 6. Dificuldades no raciocínio (p. ex., tem grave dificuldade em aplicar conceitos, fatos ou operações matemáticas para solucionar problemas quantitativos). 28 em leitura ou escrita de textos complexos longos e com prazo curto, em alta sobrecarga de exigências acadêmicas). D – As dificuldades de aprendizagem não podem ser explicadas por deficiências intelectuais, acuidade visual ou auditiva não corrigida, outros transtornos mentais ou neurológicos, adversidade psicossocial, falta de proficiência na língua de instrução acadêmica ou instrução educacional inadequada. Nota: Os quatro critérios diagnósticos devem ser preenchidos com base em uma síntese clínica da história do indivíduo (do desenvolvimento, médica, familiar, educacional), em relatórios escolares e em avaliação psicoeducacional. Nota para codificação: Especificar todos os domínios e sub-habilidades acadêmicos prejudicados. Quando mais de um domínio estiver prejudicado, cada um deve ser codificado individualmente conforme os especificadores a seguir. Se uma criança possui alguma das alterações descritas no critério B ela se enquadra em uma dificuldade de aprendizagem secundária e não em um transtorno. Por isso compreender as diferenças é fundamental para identificar corretamente as crianças. Ao realizar o diagnóstico o avaliador deve especificar se o prejuízo (dificuldade) da criança é na leitura, na escrita ou na matemática conforme a figura 7 a seguir (APA, 2014 p.67): 29 Figura 7: dificuldades na leitura, escrita e matemática dos TEAS FONTE: (APA, 2014 p. 67 adaptado por PAZETO, 2019) Nota: Dislexia é um termo alternativo usado em referência a um padrão de dificuldades de aprendizagem caracterizado por problemas no reconhecimento preciso ou fluente de palavras, problemas de decodificação e dificuldades de ortografia. Se o termo dislexia for usado para especificar esse padrão particular de dificuldades, é importante também especificar quaisquer dificuldades adicionais que estejam presentes, tais como dificuldades na compreensão da leitura ou no raciocínio matemático (APA, 2014 p.67). Nota: Discalculia é um termo alternativo usado em referência a um padrão de dificuldades caracterizado por problemas no processamento de informações numéricas, aprendizagem de fatos aritméticos e realização de cálculos precisos ou fluentes. Se o termo discalculia for usado para especificar esse padrão particular de dificuldades matemáticas, é importante também especificar quaisquer dificuldades adicionais que estejam presentes, tais como dificuldades no raciocínio matemático ou na precisão na leitura de palavras (APA, 2014 p.67). Com prejuízo na leitura: •Precisão na leitura de palavras; •Velocidade ou fluência da leitura; •Compreensão da leitura. Com prejuízo na expressão escrita: •Precisão na ortografia; •Precisão na gramática e na pontuação; •Clareza ou organização da expressão escrita. Com prejuízo na matemática: •Senso numérico; •Memorização de fatos aritméticos; •Precisão ou fluência de cálculo; •Precisão no raciocínio matemático. 30 Dislexia e Discalculia apesar de serem muito utilizados são termos alternativos para especificar os transtornos específicos de aprendizagem com prejuízo na leitura e na escrita. E o último ponto que o DSM-5 descreve que o profissional deve especificar é a gravidade atual do transtorno, que é classificada em leve, moderada ou grave (APA, 2014 pp. 67-68): Leve: Alguma dificuldade em aprender habilidades em um ou dois domínios acadêmicos, mas com gravidade suficientemente leve que permita ao indivíduo ser capaz de compensar ou funcionar bem quando lhe são propiciados adaptações ou serviços de apoio adequados, especialmente durante os anos escolares. Moderada: Dificuldades acentuadas em aprender habilidades em um ou mais domínios acadêmicos, de modo que é improvável que o indivíduo se torne proficiente sem alguns intervalos de ensino intensivo e especializado durante os anos escolares. Algumas adaptações ou serviços de apoio por pelo menos parte do dia na escola, no trabalho ou em casa podem ser necessários para completar as atividades de forma precisa e eficiente. Grave: Dificuldades graves em aprender habilidades afetando vários domínios acadêmicos, de modo que é improvável que o indivíduo aprenda essas habilidades sem um ensino individualizado e especializado contínuo durante a maior parte dos anos escolares. Mesmo com um conjunto de adaptações ou serviços de apoio adequados em casa, na escola ou no trabalho, o indivíduo pode não ser capaz de completar todas as atividades de forma eficiente. Na Classificação Internacional das Doenças (CID-10), a nomenclatura já se diferencia do DSM-5, sendo chamados de Transtornos específicos do desenvolvimento das habilidades escolares com o código F.81, divididos em: 31 F81: Transtornos específicos do desenvolvimento das habilidades escolares F81.0: Transtorno específico de leitura; F81.1: Transtorno específico da soletração; F81.2: Transtorno específico da habilidade em aritmética; F81.3: Transtorno misto de habilidades escolares; F81.8: Outros transtornos do desenvolvimento das habilidades escolares; F81.9: Transtorno não especificado do desenvolvimento das habilidades escolares. ROTTA, et al. (2016 p. 88) apresenta um quadro que resume os critérios diagnósticos de acordo com o CID-10, como pode ser visualizado na Figura 8: Figura 8: Transtorno de aprendizagem de acordo com a CID-10 FONTE (ROTTA, et al., 2016p. 88) 32 2.3 Diferenças entre as dificuldades e os TEAS As dificuldades de aprendizagem (naturais e secundárias) e os transtornos específicos de aprendizagem possuem características e formas de serem avaliados bem diferentes e por isso a compreensão dessas características é fundamental para o profissional que atua nas áreas da educação e da saúde com esse público. Infelizmente diversos profissionais utilizam os nomes de forma incorreta e classificam a criança simplesmente por observar comportamentos e potencial de desenvolvimento diferente do que as crianças da mesma idade e ano escolar, porém foi discutido amplamente nessa unidade e apresentado em detalhes o caminho correto para que uma criança seja diagnosticada com um transtorno específico de aprendizagem. Na próxima unidade abordaremos quais são esses transtornos e suas principais características, mas para fecharmos a Unid.2 é fundamental que a distinção entra dificuldade e transtorno esteja clara e compreendida por cada um de vocês, pois vocês lidarão com esses conceitos constantemente durante a prática profissional e devem saber como e quando utilizá-los. Portanto, a Figura 9 resume e fecha essa unidade apresentando as principais diferenças entre as dificuldades e os transtornos específicos de aprendizagem: 33 Figura 9: Diferenças entre dificuldades e TEAS FONTE: (PAZETO, 2019) Leia as afirmações a seguir e escolha ‘D’ para dificuldades de aprendizagem e ‘T’ para transtornos específicos de aprendizagem: _____ A criança deve passar por pelo menos 6 meses de intervenção antes da confirmação; _____ As dificuldades são persistentes e aparecem em todos os contextos que a criança lida com aquela demanda; Dificuldades de Aprendizagem • Criança apresenta uma discrepância entre o seu real potencial de aprendizado e o seu desempenho quando isso não era esperado; •As dificuldades tendem a ser passageiras voltando a criança ao seu potencial de aprendizado depois de receber intervenções direcionadas a sua dificuldade; •Quando investigada encontram a causa dessas dificuldades, que podem ser pela variável escola, família, ambiente e algo com a própria criança; • Existe uma causa que justifica a dificuldade; •Crianças com alterações do neurodesenvolvimento e problemas psicológicos, visuais, auditivos possuem dificuldades de aprendizagem secundárias, pois essas alterações podem estar justificando o não aprender. Transtornos Específicos de Aprendizagem • Criança aprensenta uma discrepância entre o seu real potencial de aprendizado e o seu desempenho constantemente; • As dificuldades são persistentes e aparecem em todos os contextos que a criança lida com aquela demanda; • As dificuldades começam a aparecer nos anos escolares quando essas habilidades em leitura, escrita e matemática,começam a ser exigidas; • Quando investigada não conseguem encontrar a causa dessas dificuldades, pois tudo aparenta estar bem com escola, família, ambiente e com a própria criança; • Alguma alteração que a criança possua, como problemas visuais, auditivos ou outros não são suficientes para justificar tamanha dificuldade; • A criança deve passar por pelo menos 6 meses de intervenção antes da confirmação do transtorno. 34 _____ A criança apresenta uma discrepância entre o seu real potencial de aprendizado e o seu desempenho quando isso não era esperado; _____ As dificuldades tendem a ser passageiras; _____ Alguma alteração que a criança possua, como problemas visuais, auditivos ou outros não são suficientes para justificar tamanha dificuldade; _____ Quando investigada encontram a causa dessas dificuldades. __________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Gabarito: T – T – D – D – T – D Prezado(a) aluno(a): Chegamos ao final da Unidade II, na qual foram apresentados os seguintes conceitos: 35 Os transtornos de dificuldades são percebidos pela discrepância entre: a) O que a criança é capaz de realizar e o seu real desempenho; b) O desempenho abaixo do esperado para a idade e ano escolar; c) As diferenças intraindividuais (da própria criança) e resposta da criança à instrução; Os TEAS englobam basicamente dificuldades e alterações nas habilidades de leitura, escrita e matemática; O Manual mais utilizado na área educacional é o DSM-5 e os critérios diagnósticos apresentados por ele; O primeiro critério diagnóstico envolve dificuldades na aprendizagem e no uso de habilidades acadêmicas que persistiram por mais de 6 meses, mesmo com a provisão de intervenções dirigidas a essas dificuldades; O segundo critério diz que as habilidades acadêmicas afetadas estão substancial e quantitativamente abaixo do esperado para a idade cronológica do indivíduo, o que pode ser verificado por meio da avaliação em testes padronizados e essa alteração causa impacto em todas às áreas da vida da pessoa; No terceiro critério diz que as dificuldades de aprendizagem se iniciam durante os anos escolares quando as habilidades em leitura, escrita e matemática começam a ser exigidas; E o último (quarto) critério diz que quando investigadas não são identificadas a causas dessa dificuldade por questões biológicas, psicológicas, familiares e escolares; Quando avaliada o profissional deve especificar qual a gravidade atual do transtorno da criança, que é classificada em leve, moderada ou grave; Na Classificação Internacional das Doenças (CID-10), a nomenclatura já se diferencia do DSM-5, sendo chamados de Transtornos específicos do desenvolvimento das habilidades escolares com o código F.81; É fundamental que a distinção entra dificuldade e transtorno esteja clara e compreendida pelos profissionais que atuam com esse 36 público para que as nomenclaturas sejam utilizadas de forma adequada e as crianças sejam avaliadas de forma correta. Então? Você aprendeu bastante do conteúdo desta Unidade? Vamos agora para a Unidade III para aprendermos sobre os Transtornos Específicos de Aprendizagem e o TDAH para, depois, estarmos prontos para podermos elaborar as avaliações e estabelecermos os critérios de intervenções psicopedagógicas. Pronto(a)? Vamos lá! 37 III. TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM E O TDAH Olá, aluno(a)! Chegamos à Unidade III, onde vamos conhecer os Transtornos Específicos de Aprendizagem e, entre eles, especificamente vamos tratar dos mais frequentes entre nossos clientes e alunos: a Dislexia, a Disgrafia, a Disortografia, a Discalculia e o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade, tendo sempre em vista que estes são os passos essenciais que preparam você para a próxima disciplina (Avaliação Neuropsicopedagógica) e para o exercício da Psicopedagogia Clínica. Preparado(a)? Então vamos lá! 3.1) TEAs: dislexia Na unidade II foram apresentados todos os critérios diagnósticos para identificar uma criança, adolescente ou adulto com um Transtorno Específico de Aprendizagem. Foi possível perceber oquanto essa avaliação deve ser criteriosa, cuidadosa e realizada de forma multidisciplinar, evitando assim diagnósticos incorretos e o direcionamento da criança para intervenções desnecessárias. Dentre os transtornos, vimos que o Transtorno Específico de Leitura é percebido quando a pessoa apresenta dificuldades na precisão na leitura de palavras, velocidade ou fluência da leitura alterada, assim como compreensão prejudicada. O nome alternativo e bastante comum para esse transtorno é Dislexia (APA, 2014). 38 Dislexia é o termo mais comum e conhecido para o Transtorno Específico de Leitura. O termo foi utilizado pela primeira vez em 1872, por Berlin e o estudo para compreender por que algumas pessoas não conseguiam ler apesar de apresentarem todas as habilidades necessárias para isso começou a partir desse momento. Foi publicado nessa época o caso de um adolescente que não conseguia ler e mesmo depois de ter sido avaliado não foi encontrada nenhuma causa para tal dificuldade, o que foi caracterizado de “cegueira verbal” (ROTTA, et al., 2016a). Somente em 1917 que se cogitou a possibilidade dessas pessoas não conseguirem desenvolver essa habilidade por um funcionamento diferenciado do cérebro, uma forma diferente de lidar com as palavras. Oftalmologistas reforçavam que visualmente esses pacientes não tinham nenhuma alteração, então o problema não era de visão e sim nas áreas cerebrais que se relacionavam com a linguagem (ROTTA, et al., 2016a). O olhar para esse grupo começou a ganhar espaço e as características das dificuldades também. Eram pessoas descritas como “possuem inteligência normal, mas não conseguem aprender a ler e a escrever”, não conseguem reconhecer ou reconhecem e não compreendem as palavras, apresentam dificuldades para ler, soletrar e escrever, assim como espelham e invertem as palavras (ROTTA, et al., 2016a). Rotta et al., (2016a, p.134) descreve o momento em que o termo ficou mais próximo do que temos conhecido hoje: No entanto, só em 1950, Hallgren publica o primeiro estudo clínico e genético do que chamou de “dislexia específica”, em substituição à expressão “cegueira verbal congênita”. A partir daí inúmeros pesquisadores interessados no entendimento da aquisição da linguagem escrita, principalmente psicólogos, colocaram ao lado da origem cerebral maturativa os aspectos psicológicos e a influência das adversidades sociais. Por meio de diversos testes psicológicos, que ainda hoje podem colaborar para o diagnóstico de dislexia, puderam observar também falhas no desenvolvimento da linguagem oral. Foram observadas alterações em outras funções cerebrais superiores, tais como noção de espaço, de tempo e dificuldades visuoespaciais, importantes para o desenvolvimento da leitura e da escrita. 39 As dificuldades apresentadas pelas pessoas diagnosticadas com esse transtorno continuaram a ser cada vez mais exploradas, assim como a busca em compreender por que apesar de apresentarem potencial intelectual dentro da média e muitas vezes superior, mesmo assim não conseguiam aprender a ler de forma adequada para o seu potencial de aprendizado e demais habilidades avaliadas. Alguns pontos começaram a ser levantados, como a relação genética com os casos encontrados, maior incidência em meninos do que em meninas e questões ambientais (ROTTA, et al., 2016a). “Transtornos de Aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar”, reúne destacados profissionais da área da saúde e de áreas relacionadas ao tema para compartilhar seus conhecimentos e experiências sobre os aspectos que interferem no aprendizado e também sobre como abordar esses transtornos na prática diária. Para tanto, o livro divide-se em três partes: Em Aprendizagem “normal” são contempladas informações sobre dificuldades da aprendizagem relacionadas à escola, à família e aos aspectos físicos do próprio paciente. Em Transtornos da aprendizagem são abordados problemas como dislexia, discalculia, dispraxias, disgnosias e transtornos da memória e da atenção. Nesta parte, foram incluídos três novos capítulos, os quais discutem aspectos neurobiológicos, clínicos e comorbidades dos transtornos do espectro do autismo. Em Aprendizagem e situações específicas são analisadas as possíveis repercussões que epilepsia, paralisia cerebral, deficiência mental, autismo e problemas emocionais podem ter sobre o processo de aprendizagem. Um capítulo dedicado à plasticidade cerebral e aprendizagem encerra esta importante obra que é referência indispensável para todos os profissionais que atuam na área, sejam eles médicos, psicólogos, fonoaudiólogos, psicopedagogos ou professores. Não deixe de ler! 40 ROTTA, N.T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R.S. (Org.). Transtornos da Aprendizagem. Abordagem Neurobiológica e Multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2016. Crianças com dislexia mostram alguns sinais que já podem ser percebidos, principalmente em sala de aula. O quadro 1 apresenta o que pode ser observado dividido por etapa escolar: Quadro 1: Características de crianças com dislexia Educação infantil Dificuldade (atraso) na aquisição da linguagem oral; dificuldade de memória fonológica; dificuldade em nomear pessoas, cores, objetos e figuras geométricas; representações gráficas aceleradas e pobres; e desinteresse por letras. Primeiro ano Distanciamento radical entre o que os colegas aproveitam do processo lectográfico e o possível aluno disléxico. Não reconhece as vogais com facilidade, apresenta interesse restrito na produção gráfica, esquiva-se de mostrar o que aprendeu (possivelmente não tenha aprendido). Segundo ano Mantém a dificuldade de reconhecimento imediato de letras, e quando está em situação de leitura oral, substitui ou omite partes da palavra de tal modo que fique sem significado. Esse aluno continua sua batalha na decodificação dos grafemas e não consegue dar-se conta de que não está entendendo o que está escrito. “Juntar” as letras e entender o que elas significam é uma tarefa hercúlea e, claro, ele não consegue fazê-lo. A dificuldade também começa a aparecer em matemática, pois sofrem o mesmo processo de entendimento: trata-se mais de uma dificuldade de decodificação linguística do que de cálculo. 41 Terceiro ano Ainda se embaralha com a diferença do /O/ e do /A/ e com o mistério do /p, q, d, b/. Quarto ano As estratégias de compensação entram em ação: uma espiada no trabalho do colega, um olhar mais atento na expressão fisionômica do professor, o balbuciar em voz baixa enquanto escreve passam a ser ferramentas de inestimável valor. FONTE: (ROTTA, et al., 2016b p.231, adaptado por PAZETO, 2019) Além desses sinais descritos acima, algumas dificuldades podem ser observadas na produção textual da criança, como por exemplo, (ROTTA, et al., 2016ª p. 142): Leitura e escrita, muitas vezes incompreensíveis; Confusões de letras com diferente orientação espacial (p/q; b/d; f/t, etc.); Confusões de letras com sons semelhantes (b/p; d/t; g/j, etc.); Inversões de sílabas ou palavras (par/pra; lata/alta); Substituições de palavras com estrutura semelhante (contribuiu/ construiu); Supressão ou adição de letras ou de sílabas (caalo/cavalo; berla/bela); Repetição de sílabas ou palavras (eu jogo jogo bola; bolo de chococolate); Fragmentação incorreta (querojo garbola/ quero jogar bola); Dificuldade para entender o texto lido. 42 O Instituto ABCD e a Associação Britânica de Dislexia (British Dyslexia Association – BDA) desenvolveram um curso livre gratuito para apresentar a dislexia a todos interessados em aprender sobre ela. Com esse curso, você saberá: o que é a dislexia, as principais teorias sobre as suas causas, como identificá-la, quais são os direitos de pessoas com dislexia e muito mais! Basta acessar:https://www.institutoabcd. org.br/curso-entendendo-a- dislexia/ No site do Instituto ABCD, os pesquisadores descrevem alguns sinais que podem ser observados na linguagem oral, na leitura e na escrita de crianças disléxicas. A figura 10 apresenta quais são: Figura 10: Sintomas de dislexia https://www.institutoabcd/ 43 FONTE: https://www.institutoabcd.org.br/o-que-e-dislexia/ adaptado por PAZETO (2019) Compreender e saber identificar esses sinais é fundamental para que essas crianças sejam atendidas o mais precocemente possível, visando o trabalhar com elas estratégias que as auxiliem no dia a dia de sala de aula, com objetivo de não deixar que elas cheguem até quarto ano, como o quadro 1 apresentou, sem conseguir ler e escrever de forma adequada. Vocês já pararam para refletir sobre o porquê é tão importante ler e o escrever na escola? Stanovich (1991) comparou o processo de leitura e escrita da criança com a parábola bíblica de Mateus, a qual diz, que aquele que muito tem, mais ainda lhe será acrescentado, e aquele que pouco tem, esse pouco lhe será tirado. A autora aplicou esse conceito a trajetória escolar da criança associada aos processos de leitura e de escrita. Ela descreveu que a escola tende a progredir em grau de dificuldade os conteúdos trabalhados e a exigência de habilidades sobre o aluno, ou seja, no segundo ano a criança irá aprender conteúdos mais complexos que no primeiro Linguagem Oral •Atraso no desenvolvimento da fala; •Problemas para formar palavras de forma correta, como trocar a ordem dos sons na palavra (popica / pipoca) ou confundir palavras semelhantes (umidade/ humanidade); •Erros de pronúncia, incluindo trocas, omissões, substituições, adições e misturas de fonemas; •Dificuldade para nomear letras, números e cores; •Dificuldade em atividades de aliteração e rima; •Dificuldade para se expressar de forma clara. Leitura •Dificuldade em decodificar palavras; •Erros no reconhecimento de palavras, mesmo das mais frequentes; •Leitura oral devagar e incorreta. Pouca fluência com inadequações de ritmo e entonação, em relação ao esperado para idade e escolaridade; •Compreensão de texto prejudicada como consequência da dificuldade para decodificar palavras; •Vocabulário reduzido. Escrita •Erros de soletração e ortografia, mesmo nas palavras mais frequentes; •Omissões, substituições e inversões de letras e/ou sílabas; •Dificuldade na produção textual, com velocidade abaixo do esperado para idade e escolaridade. https://www.institutoabcd.org.br/o-que-e-dislexia/ 44 ano, no terceiro ano mais complexos que no segundo, no quarto e assim por diante. A escola a cada ano que passa exigirá mais do aluno. Observem a Figura 11 abaixo, ela apresenta como esse processo ocorre na prática. Nela temos duas crianças, o Bernardo e a Valentina. O primeiro ano está exigindo dos alunos nível de conhecimento 1 e Bernardo é um aluno que está se desenvolvendo de forma adequada, que acompanha os conteúdos e que consegue responder a exigência tendo conhecimento 1 também, já a Valentina apesar de conseguir participar, de estar se desenvolvendo, realiza tudo com muita dificuldade, ela está chegando ao final do primeiro ano com o mínimo de conhecimentos necessários, com diversos entraves, porém ambos seguirão para o segundo ano. Figura 11: Efeito Mateus de Stanovich (1991) Fonte: PAZETO, 2019 Agora que chegaram no segundo ano a exigência aumentou, o conhecimento exigido dos alunos não é mais apenas 1 e sim 2. Bernardo continua respondendo bem as demandas escolares e desenvolve ainda mais 45 suas habilidades, já a Valentina continua com os conhecimentos mal desenvolvidos do primeiro ano, ela não consegue responder as demandas do segundo ano. Porém conforme a imagem mostra, agora o nível de exigência é 2 e não mais 1, ou seja, aquele conhecimento que a Maria tinha se tornou menor ainda, e o Bernardo que não tem dificuldades continua a se desenvolver. Perceberam a aplicação do chamado Efeito Mateus? O Bernardo a cada dia agregará mais conhecimento, pois ele tira vantagem do ler e escrever e se desenvolve cada ano mais, já a Valentina, por carregar tantas dificuldades, seu conhecimento vai se tornando menor ao longo dos anos, porque as exigências estão maiores, ou seja, o pouco que ela tinha a cada ano se torna menor porque exigem mais habilidades que ela não consegue responder. A escola se estrutura em torno do ler e do escrever, praticamente todas as disciplinas exigem essas habilidades e por isso é tão importante perceber desde cedo entraves e dificuldades que a criança possa estar apresentando nesses processos. Stanovich, K. E. (1991). Word recognition: Changing perspectives. In R. Barr, M. L. Kamil, P. Mosenthal, & P. D. Pearson (Eds.), Handbook of reading research (pp. 418-452). New York: Longman Atividade de Aplicação 46 O filme “Como estrelas na Terra: toda criança é especial” conta a história de uma criança que sofre com dislexia e não é compreendida pelos professores e pais. Ishaan Awasthi, de 9 anos, já repetiu uma vez o terceiro período (no sistema educacional indiano) e corre o risco de reprovar novamente. As letras dançam em sua frente, como diz, e não consegue acompanhar as aulas nem focar sua atenção. Inesperadamente, um professor substituto de artes percebe que há algo de errado com Ishaan. Ao descobrir que o garoto era disléxico, o professor coloca em prática um plano para resgatar aquele garoto. (FONTE:http://educamais.com/como-estrelas-na-terra/). Assista ao filme e descreva quais estratégias o professor utilizou para auxiliar o aluno com dislexia: __________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ 47 3.2) TEAs: disgrafia e disortografia O Transtorno de Aprendizagem com prejuízo na expressão escrita pode envolver a dificuldade da criança na ortografia, na precisão na gramática, pontuação, na clareza ou organização da expressão escrita (APA, 2014). ROTTA et al. (2016a, p.205) descreve alguns sinais que podem ser observados em crianças que apresentam esse transtorno: 1. Recusa na realização de temas e trabalhos escolares; 2. Estresse pessoal e familiar, principalmente na hora do estudo; 3. Cadernos incompletos, com rasuras, desenhos aleatórios, excesso de pressão no traçado; 4. Desatenção às solicitações do professor; 5. Queixas escolares frequentes; 6. Desorganização pessoal (roupas, mochilas, quarto); 7. “Omissão” de datas para entrega de tarefas e provas escolares; 8. Letra ilegível; 9. Lentidão, morosidade (tardes inteiras para o tema); 10. Repetênciade séries escolares. Assim como na dislexia, são crianças que apesar de apresentarem nível intelectual adequado e escolaridade não conseguem apresentar uma produção escrita compatível com esse padrão, mostrando dificuldades no traçado, grafismo não diferencia forma e tamanho, escrita irregular, movimentos incorretos, entre demais sinais já descritos. Ciasca (2009) divide a disgrafia em subtipos, conforme pode ser visualizado na figura 12: 48 Figura 12: Subtipos da Disgrafia FONTE: CIASCA (2009, p.188-189) adaptado por PAZETO (2019) Ciasca (2009, p.189) descreve mais alguns sinais que essas crianças podem apresentar em sua produção: a) Má organização da página: ligado à orientação espacial, apresentação desordenada do texto, margens mal feitas ou inexistentes, espaços irregulares entre palavras e linhas, escrita ora ascendente ou descente; b) Má organização das letras: ligada a incapacidade de submeter-se às regras caligráficas, o traçado apresenta qualidade ruim, hastes das letras são deformadas, anéis sobrepostos, as letras são retocadas e irregulares em suas dimensões; c) Erros de formas e proporções: o grau de limpeza do traçado das letras é baixo, dimensão (pequena ou grande), desorganização das formas e, escrita alongada ou comprida. Disgrafia disléxica • Consiste na dificuldade em construir adequadamente a palavra, a escrita espontânea é ilegível, soletração é pobre, mas o desenho e a cópia são relativamente normais. Disgrafia motora • Escrita espontânea e copia são ilegíveis, mas a oralidade é normal, o desenho é pobre. Normalmente este tipo de disgrafia esta associado a um problema puramente motor. Disgrafia visuo- espacial • A dificuldade esta relacionada a distribuição do espaço gráfico, desenho é ruim e escrita pode ser ilegível assim como a cópia. 49 Já a Disortografia é caracterizada pela incapacidade da pessoa em registrar a linguagem oral, ou seja, de transcrever de forma correta a fala. Em sua escrita é possível perceber trocas ortográficas e diversos tipos de confusões entre as letras, não afetando sempre o traçado (CIASCA, 2009). A figura 13 apresenta as principais dificuldades que crianças disortográficas podem apresentar: Figura 13: Características da Disortografia FONTE: CIASCA (2009), adaptado por PAZETO (2019) A Disgrafia envolve a dificuldade focada mais nos aspectos motores e a Disortografia nos aspectos relacionados a expressão escrita. Disortografia Confusão de letras (e.g., trocas auditivas: consoantes surdas por sonoras: f/v, faca/vaca). Confusão de letras (vogais nasais por orais: na/a, en/i, on/o, um/u). Confusão de sílabas com tonacidade semelhante: cantarão/cantaram. Confusão de letras (trocas visuais simétricas: b/d, p/q, semelhantes: e/a, b/h, f/t. Confusão de palavras com configurações semelhantes, exemplo copia pedreiro em lugar de padeiro. 50 CIASCA, S.M. Disgrafia: Transtorno específico da escrita, considerações gerais. In: MONTIEL, J. M.; CAPOVILLA, F. C. Atualização em Transtornos de Aprendizagem. Artes Médicas, São Paulo, 2009. 3.3) TEAs: discalculia A Discalculia é um Transtorno específico de aprendizagem com prejuízo na matemática, no qual a pessoa pode possuir dificuldades com o: senso numérico; memorização de fatos aritméticos; precisão ou fluência de cálculo e precisão no raciocínio matemático. Cerca de 3 a 6% das crianças em idade escolar tem discalculia (APA, 2014). Nota: Discalculia é um termo alternativo usado em referência a um padrão de dificuldades caracterizado por problemas no processamento de informações numéricas, aprendizagem de fatos aritméticos e realização de cálculos precisos ou fluentes. Se o termo discalculia for usado para especificar esse padrão particular de dificuldades matemáticas, é importante também especificar quaisquer dificuldades adicionais que estejam presentes, tais como dificuldades no raciocínio matemático ou na precisão na leitura de palavras (APA, 2014, p.67) Segundo Rotta et. al., (2016ª, p. 178) a discalculia pode ser definida como: 51 ... uma alteração específica em aritmética, não atribuível exclusivamente a um retardo mental global ou à escolarização inadequada. O déficit concerne ao domínio de habilidades computacionais básicas de adição, subtração, multiplicação e divisão mais do que às habilidades matemáticas abstratas envolvidas em álgebra, trigonometria ou cálculo (CID 10). Shalev define a discalculia do desenvolvimento como um transtorno específico que afeta a aquisição normal das habilidades aritméticas. As evidências genéticas, neurobiológicas e epidemiológicas indicam que a discalculia, como outros distúrbios de aprendizado, tem bases cerebrais; entretanto, o ensino inadequado e as privações ambientais podem estar envolvidos na sua etiologia. Apesar de ser um transtorno bastante conhecido, não existem tantos estudos em relação a discalculia quanto a dislexia (ROTTA et al., 2016a). Uma possibilidade para essa diferença seria a aceitação social que a pessoa com dificuldades na matemática enfrenta, afinal é considerado “normal” e aceitável ter dificuldades com os aspectos matemáticos, o que já não se reflete e não acontece em relação as dificuldades com a leitura e com a escrita, que apresentam um grande impacto social. É possível em idades bem precoces, a partir dos 3 anos, realizar avaliações com o foco de identificar possíveis áreas matemáticas que podem já estar alteradas, como (Rotta et. al., 2016a p.178): 1. Desenvolvimento do conceito numérico; 2. Habilidade para contar; 3. Desenvolvimento da aritmética (fatos e procedimentos numéricos); 4. Comutatividade e associatividade; 5. Complementaridade. Rotta et al., (2016a, p.187), apresenta algumas áreas que o professor/terapeuta pode trabalhar com a criança que possui dificuldades em matemática dividindo por habilidades: Percepção de figuras e formas: experiências graduadas e simples, observando detalhes, semelhanças e diferenças. Espaço: localização de objetos em cima, embaixo, no meio, entre primeiro, último, etc. Ordem e sequência: primeiro, segundo, etc., dias da semana, ordem dos números, dos meses, das estações do ano. Representação mental: indicar, com as mãos e os dedos, o tamanho e comprimento dos objetos; preencher espaços com figuras de tamanho específico, escolhidas entre outras de mesma forma, porém com tamanhos diferentes. Conceitos de números: trabalhar correspondência um a um, construir fileiras idênticas de objetos, associar o símbolo e a compreensão auditiva à quantidade por meio de atividades rítmicas. 52 Operações aritméticas: trabalhar adequadamente para que a criança entenda que adição se dá pelo acréscimo; a subtração, pela diminuição; a divisão se dá repartindo; e a multiplicação é uma sucessão de somas de parcelas iguais. Esses são os três tipos de transtornos específicos de aprendizagem, os que envolvem a leitura, escrita e matemática, sendo os demais transtornos e alterações do neurodesenvolvimento enquadrados em outras categorias, assim como o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, que apesar de ser uma comorbidade dos TEAS, ou seja, pode acontecer junto com um transtorno de aprendizagem, não faz parte desse grupo. Atividade de Aplicação O Programa “Todos Aprendem”, do Instituto Abcd, é direcionado para os Professores, sendo um curso de formação complementar para educadores, que tem como objetivo debater sobre o processo de aprendizagem e as suas complexidades. O curso ensina sobre os transtornos de aprendizagem (TEAp), como a dislexia e a discalculia, o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade e outras condições que podem impedir, atrapalhar e atrasar o aprendizado. Direcionado
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