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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE FARMÁCIA Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado Profissional em Ciência e Tecnologia Farmacêutica MAYRA LEAL CHRISÓSTOMO BODART Desenvolvimento e estudo de estabilidade de solução oral magistral de L-Carnitina para tratamento de doenças metabólicas RIO DE JANEIRO 2019 MAYRA LEAL CHRISÓSTOMO BODART Desenvolvimento e estudo de estabilidade de solução oral magistral de L-Carnitina para tratamento de doenças metabólicas Dissertação de Mestrado Profissional apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciência e Tecnologia Farmacêutica, Faculdade de Farmácia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciência e tecnologia Farmacêutica. Orientadora: Profª. Drª. Elisabete Pereira dos Santos Coorientadora: Profª. Drª. Ana Lúcia Vazquez Villa Rio de Janeiro 2019 CIP - Catalogação na Publicação Elaborado pelo Sistema de Geração Automática da UFRJ com os dados fornecidos pelo(a) autor(a), sob a responsabilidade de Miguel Romeu Amorim Neto - CRB-7/6283. B666d Bodart, Mayra Leal Chrisóstomo Desenvolvimento e estudo de estabilidade de solução oral magistral de L-Carnitina para tratamento de doenças metabólicas / Mayra Leal Chrisóstomo Bodart. -- Rio de Janeiro, 2019. 125 f. Orientadora: Elisabete Pereira dos Santos. Coorientadora: Ana Lúcia Vazquez Villa. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Farmácia, Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, 2019. 1. Carnitina, . 2. Erro inato de metabolismo. 3. Formulação líquida. 4. Estabilidade. 5. Farmácia Magistral. I. Santos, Elisabete Pereira dos, orient. II. Villa, Ana Lúcia Vazquez, coorient. III. Título. Dedicatória Dedico esse trabalho a todos os pacientes da Farmácia Universitária AGRADECIMENTOS Agradeço principalmente a Deus por me dar forças e por me impulsionar nos momentos mais difíceis. Eu senti Sua presença em vários momentos desse projeto ao colocar anjos no meu caminho a cada vez que uma dificuldade aparecia! Ao meu marido que entendeu toda a minha ausência, que me mandava dormir quando eu virava noites estudando ou escrevendo, ou por me dar apoio e chocolate nas inúmeras vezes que eu chegava desesperada com as diversas dificuldades que encontrei no caminho. Sem você, eu não teria conseguido! Aos meus pais que sempre acreditaram em mim, que me ensinaram a ser o que sou hoje e que comemoraram cada pequena vitória encarada nesse projeto, sem nem ao menos entender o que significava! Se eu consegui essa conquista hoje, é porque vocês me apoiaram desde o início! Obrigada por tudo! Essa conquista é nossa! À minha irmã, afilhada, minha “filhinha” e amiga, que tanto me deu apoio durante esse período, que mandava mensagens carinhosas e fotos malucas tentando me animar quando eu mais precisava de um carinho! À professora Elisabete Pereira dos Santos pela orientação e confiança para realização desse trabalho. À professora Ana Lúcia Vazquez Villa por acreditar mais em mim do que eu, pela paciência, contribuições, incentivos, broncas e amizade. Às professoras Mariana Sato de Souza de Bustamante Monteiro e Zaida Maria Freitas, pela contribuição e cuidado com a orientação na Banca de Acompanhamento. À Banca examinadora por aceitar o convite e fornecer preciosas contribuições para o trabalho. À professora Helena Keiko pela ajuda, contribuições e disponibilidade em realizar os testes microbiológicos da formulação. A imensa ajuda que recebi de todos do Laboratório de Imunofarmacologia, chefiado pela Bartira Rossi Bergmann, que abriu as portas do laboratório para mim. Agradeço especialmente ao Douglas e Maria Paula, pela amizade, ajuda, por não me deixarem com fome quando eu não almoçava para ganhar tempo; à Ariane por todas as dicas, contribuições, avaliações e orientações; à Ariele, Felipe e Izabelle por toda torcida, ajuda e amizade! Eu me senti parte do laboratório de vocês! Vocês foram fundamentais à realização do projeto! Aos queridos Aline e Jonatas da Central Analítica. Ao LabTIF, especialmente à Letícia Coli, Paloma Wettler, Mariani Grillo e Fernanda Locatelli por me ajudarem com algumas análises. Ao Marco Antonio que disponibilizou o HPLC e tempo para me ajudar. À todos do LabCQ, especialmente ao Pedro e Luis que tanto me ajudaram. Às grandes amigas Cláudia, Fernanda e Elaine. Vocês acompanham meu crescimento pessoal e profissional e me ajudaram e ajudam sempre! Eu não teria conseguido sem vocês! Obrigada pelos maravilhosos momentos de diversão, de ajuda e de incentivo! À Érika, da Seção de Referência da Biblioteca Central do CCS, que tanto me ajudou com a busca de Referencial Bibliográfico. À Sarah Noslien que desde o começo me ajudou, me incentivou e me ajudou! À Larissa Rodrigues, minha amiga e aluna de iniciação científica, que me alavancou e fez com que o projeto desse certo. Você foi essencial nos momentos em que mais precisei! À Ana, Fernanda Cardoso e Valery que me tanto me ajudaram. Aos meus amigos da “Panela” Ana Elisa, Sarah, Felippe e Walter, que sempre escutaram minhas reclamações, medos e sempre me incentivaram! Aos amigos feitos no Laboratório de Desenvolvimento Galênico (LADEG): Priscila, Ana Paula, Luciana, Fiammeta, Tatiele, Márcio, Raphaela, Mirella, Deise, Bruna, Leide. Vocês fizeram meus dias mais leves, felizes e animados! À todos do meu setor que seguraram as pontas quando eu precisava resolver algum problema ou realizar alguma análise! Muito obrigada a todos! Em especial à amiga Tatiana Zanela que tanto me apoiou, me incentivou, me deu forças e segurou o setor quando eu mais precisava! Muito obrigada! Com certeza sem seu apoio e ajuda, eu não teria conseguido! Às queridas Cleonice Marques e Letícia Dysarz que escutavam meus momentos de desespero, que me apoiaram, me incentivaram e muitas vezes me tranquilizaram! À todos os amigos da Farmácia Universitária, que me apoiaram e me incentivaram tanto durante esses anos de mestrado. À todos, os meus mais sinceros agradecimentos! Muito obrigada! “A persistência é o caminho do êxito” (Charles Chaplin) RESUMO BODART, Mayra Leal Chrisóstomo. Desenvolvimento e estudo de estabilidade de solução oral magistral de L-Carnitina para tratamento de doenças metabólicas. Rio de Janeiro, 2019. Dissertação (Mestrado em Ciência e Tecnologia Farmacêutica) – Faculdade de Farmácia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019. Erros inatos do metabolismo (EIM) são distúrbios genéticos que levam a falhas enzimáticas causando interrupção de vias metabólicas, o que pode comprometer diversos processos celulares. O rápido diagnóstico e tratamento das patologias associadas aos EIM evitam danos irreversíveis neurológicos e cognitivos, fornecendo uma melhor qualidade de vida aos pacientes. A administração de L- carnitina é amplamente utilizada nesse perfil de tratamento e no Brasil, apenas suplementos voltados para o público esportivo pode ser encontrada sob a fórmula líquida, não existindo formulação medicamentosa de L-carnitina voltada para o público alvo. Na Farmácia Universitária, é usualmente dispensada sob a forma de sachê, porém apresenta alta higroscopicidade o que dificulta sua pesagem e manipulação. A necessidade de multidoses diárias a pacientes pediátricos e com problemas cognitivos evidenciou a necessidade do desenvolvimento de uma solução magistral de L-carnitina. Todavia, a escolha dos excipientes a serem utilizados para esse público alvo,que apresenta uma serie de restrições e alterações metabólicas, se torna um desafio e, além disso, a L-carnitina é um excelente substrato para microrganismos, apresentando problemas em sua estabilidade. Diante disso, esse trabalho teve como objetivo desenvolver uma formulação líquida oral de L-Carnitina, com excipientes que atendam ao público alvo garantindo boa estabilidade físico- química e microbiológica. Foram desenvolvidas oito formulações com duas concentrações de L-carnitina (10 e 20%) e diferentes combinações de agentes de viscosidade, acidulante e conservantes. Duas dentre as oito formulações apresentaram melhores características físico-químicas, organolépticas e microbiológicas, sendo conduzidas ao estudo de estabilidade completo. O estudo de estabilidade realizado foi do tipo “em uso”, onde alíquotas diárias foram retiradas das embalagens multidoses para mimetizar as condições de uso. As amostras foram armazenadas em condições controladas de temperatura (5ºC, 25ºC e 40ºC) e em diferentes materiais de embalagem primárias (vidro âmbar e plástico PET leitoso). As amostras foram analisadas nos tempos 0, 15, 30 e 45 dias após suas manipulações. Elas foram analisadas em relação as suas características organolépticas e físico-químicas como aspecto, odor, pH (Brasil, 2005) e teor do princípio ativo (EUA, 2018), utilizando a cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE), essa metodologia passou por uma validação parcial e teve a adequabilidade do sistema verificada. Para análise microbiológica, os testes foram determinados pela farmacopeia brasileira para soluções orais não estéreis (contagem total de bactérias aeróbias, contagem de leveduras e fungos e presença de Escherichia coli) (Brasil, 2005). Para a observação de produtos de degradação, as formulações foram expostas a condições de estresse como aquecimento, solução ácida, básica e oxidativa e apenas apresentou degradação quando mantida sob meio fortemente ácido e básico com aquecimento a 70ºC. A melhor formulação apresentou boa estabilidade físico-química e microbiológica durante os 45 dias de estudo de estabilidade quando mantida sob temperatura ambiente. Portanto, podemos concluir que a estabilidade foi garantida mesmo com a abertura subsequente da embalagem primária para mimetização das condições de uso pelo paciente, tendo essa formulação um perfil seguro para o público alvo e será comercializada pela Farmácia Universitária da UFRJ. Palavras chaves: Carnitina, estabilidade, formulação líquida, erro inato de metabolismo. Resumo em Língua estrangeira BODART, Mayra Leal Christóstomo. DEVELOPMENT AND STABILITY STUDY OF MAGISTRAL ORAL SOLUTION OF L-CARNITIN FOR TREATMENT OF PATHOLOGIES ASSOCIATED TO INBORN ERRORS OF METABOLISM (IEM). Rio de Janeiro, 2019. Dissertation (MsC in Science and Pharmaceutical Technology) – Faculdade de Farmácia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019. Inborn errors of metabolism (IEM) are genetic disturbs witch can be correlated with enzymatic defects; these defects are able to cause interruption of several metabolic paths compromising many cellular processes. A fast diagnosis and treatment of these pathologies associated to IEM allows to avoid irreversible neurological and cognitive damages, therefore the patients could have an improvement in their quality of life. The supplementation with L-carnitine is widely use in this treatment. Commonly dispensed in sachet, it has a high hygroscopic that makes difficult the process of weighing and manipulating. The requirement of multiple daily doses of pediatric patients with cognitive issues manifested the haste to develop a magistral solution of L-carnitine. However, the excipient selection to use it in this public, which has an enormous series of restriction and metabolic alterations, became a challenge, furthermore, L-carnitine is an excellent substrate for microorganisms that shows stability problems. For that reason, this work aims to develop an oral solution formulation of L-carnitine with excipients that fulfill the public needs, warranting a good physics-chemistry and microbiological stability. To this end, eight formulations were developed, containing two distinct concentration of L-carnitine (10% and 20%), and different combinations of thickening agent, acidifiers and preservatives. Two of them presented better organoleptic characteristics and were piloted to the fully stability study. The stability study method applied was “in use”; in witch, daily samples were taken from the multidose bottles to mime the use conditions of the patient. To run the stability study, the samples were kept in dissimilar controlled temperature levels (5ºC, 25ºC e 40ºC) and different sorts of primary packaging (amber glass and plastic PET). The analysis were performed along 0, 15, 30 and 45 days after the manipulation. The samples were analyzed by their organoleptic and physic-chemistry characteristic as aspect, odor, pH (Brazil, 2005) and content of active (USA, 2018) using high performance liquid chromatography (HPLC) which had an initial validation process to adequate to the system. The microbiological assay was made as described in Brazilian Pharmacopoeia 5nd edition for oral solution non- sterile (aerobic bacteria total count, yeast and fungus count and presence of Escherichia coli). In order to evaluate the degradation products, the formulations were exposed to stress conditions as heat, acid, basic and oxidative solutions. The oral solution that exhibited the better stability physic-chemistry, microbiological and organoleptic along 45 days was the stocked in shelf at ambient temperature. Thus, we can conclude that even opening the primary packaging everyday to mime the use condition of the patient, the oral solution maintained the stability condition, presenting a safe profile to the patient and will be commercialized by the Farmácia Universitária of UFRJ. Key words: carnitine, stability, liquid formulation, Inborn errors of metabolism LISTA DE FIGURAS Figura 01. Metabolismo dos aminoácidos de cadeia ramificada e a sinalização das etapas interrompidas pelas acidemiaspropiônica, metilmalônica, isovalérica e glutárica. 34 Figura 02. Via principal do catabolismo da leucina e bloqueio da enzima isovaleril-CoAdesidrogenase. 35 Figura 03. Vias metabólicas alternativas do isovaleril-CoA em caso de interrupção da via principal. 36 Figura 04. Metabólitos secundários produzidos quando ocorre o bloqueio enzimático da PCC. 36 Figura 05. Transporte dos ácidos graxos do meio extramitocondrial para a matriz mitocondrial com auxílio de enzimas. 41 Figura 06. Estrutura da L-carnitina. 42 Figura 07. Estrutura química das isoformas de carnitina: levógira e dextrógira. 43 Figura 08. Estrutura do sal cloridrato de L-carnitina. 43 Figura 09. Ilustração do processo de manipulação durante o processo de mistura. 46 Figura 10. Representação esquemática de um sistema de cromatografia líquida. 58 Figura 11. Metabólitos possiveis da L-carnitina quando consumida por microrganismos 59 Figura 12. Espectro referente à análise de IV-TF do padrão de L-carnitina 79 Figura 13. Espectro referente à análise de IV-TF da matéria-prima de L- carnitina 79 Figura 14. Principais bandas presentes no espectro IV-TF representadas na estrutura da L-Carnitina. 80 Figura 15. Cromatograma do solvente (água ultrapurificada). 82 Figura 16. Cromatograma da Fase Móvel 82 Figura 17. Cromatograma da L-carnitina padrão a 2,0 mg/mL 83 Figura 18 Espectro UV/VIS do pico cromatográfico da L-carnitina padrão a 2,0 mg/mL 83 Figura 19. Cromatograma da solução com padrão de L-carnitina e padrão interno. 83 Figura 20. Cromatograma de solução com matéria-prima de L-carnitina e padrão interno. 84 Figura 21. Cromatograma dos excipientesusados no desenvolvimento da formulação em presença do padrão interno. 84 Figura 22. Cromatograma da L-carnitina em presença do padrão interno e excipientes usados no desenvolvimento da formulação: ácido cítrico e benzoato de sódio. 85 Figura 23. Comparação entre o espectro de varredura do pico cromatográfico correspondente à L-carnitina na solução padrão e na solução com os excipientes. 85 Figura 24. Curva padrão da L-carnitina a partir da média de valores encontradas no primeiro dia de análise 87 Figura 25. Curva padrão da L-carnitina a partir da média de valores encontradas no segundo dia de análise 87 Figura 26. Curva padrão da L-carnitina a partir da média de valores encontradas no terceiro dia de análise 87 LISTA DE QUADROS Quadro 01. Níveis de variações aceitáveis de DPR para precisão 89 Quadro 02. Resultado das análises de pH no estudo de estabilidade completo das formulações a 20% (p/v) 102 Quadro 03 Resultado das análises de teor no estudo de estabilidade completo das formulações a 20% (p/v) 105 Quadro 04 Resultados do estudo de estabilidade microbiológico da formulação 6 acondicionada em vidro e em plástico 108 Quadro 05 Resultados do estudo de estabilidade microbiológico da formulação 7 acondicionada em vidro e em plástico 109 Quadro 06 Resultados do estudo de estabilidade microbiológico da formulação controle acondicionada em vidro e em plástico 110 LISTA DE TABELAS Tabela 01. Principais características de identificação da Carnitina 42 Tabela 02. Principais características dos materiais comumente usados para embalagem 54 Tabela 03. Principais resistências dos materiais comumente usados para embalagem 54 Tabela 04. Descrição dos excipientes utilizados nas formulações testadas e suas proporções 68 Tabela 05. Densidade da água de 20 a 30°C 69 Tabela 06. Características de incubação dos testes microbiológicos 76 Tabela 07. Esquema das condições de exposição das amostras para avaliação da estabilidade 77 Tabela 08. Principais bandas encontradas em espectro de IV-FT de L- carnitina 80 Tabela 09. Parâmetros aplicados no teste de linearidade 86 Tabela 10. Valores obtidos para LD e LQ. 88 Tabela 11. Resultado encontrado para o teste de precisão. 89 Tabela 12. Resultados obtidos para o teste de exatidão. 90 Tabela 13. Composição das formulações testes a 10% (p/v) 94 Tabela 14. Resultado da análise FIQ inicial das formulações a 10% (p/v). 94 Tabela 15. Resultado das análises microbiológicas no estudo de estabilidade prévio 95 Tabela 16. Resultado das análises físico-químicas no estudo de estabilidade prévio 96 Tabela 17. Composição das formulações testes a 20% (p/v) 97 Tabela 18. Resultado FIQ inicial da estabilidade prévia das formulações a 20% (p/v) 97 Tabela 19. Resultado das análises FIQ das formulações a 20% (p/v) 98 Tabela 20. Resultado das análises MIC das formulações a 20% (p/v) 99 Tabela 21. Resumo do estudo de estabilidade completo em uso 101 Tabela 22. Análise estatística dos valores de pH avaliando cada formulação nas diferentes embalagens 104 Tabela 23. Resultado da análise estatística do teste de teor realizado em comparação com as embalagens para cada formulação 106 Tabela 24. Teor de L-carnitina da Formulação 6 sob soluções degradantes dez vezes menos concentrada 112 Tabela 25. Resumo do estudo de degradação forçada sob diferentes condições. 112 Tabela 26. Tempos de retenção dos picos encontrados no estudo de estabilidade. 113 Tabela 27. Áreas dos picos encontrados no estudo de degradação. 113 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 3-MMM 3-Metilcrotonil glicinúria ANOVA Análise de Variância ANVISA Agencia Nacional de Vigilância Sanitária BPF Boas Práticas de Fabricação CACT Deficiência de Carnitina/AcilcarnitinaTranslocase CG Cromatografia Gasosa CLAE Cromatografia Líquida de Alta Eficiência CMC Carboximetilcelulose CoA Coenzima A CPT-II Deficiência da Palmitoil Carnitina Transferase CTBA Contagem total de bactérias aeróbicas CTFL Contagem total de fungos/leveduras DAD Detector de Arranjo de Diodos DCP Deficiência de Carnitina Primária DLE Deficiência de Beta-Cetotiolase DP Desvio Padrão DPR Desvio Padrão Relativo EIM Erro Inato do Metabolismo FB Farmacopeia Brasileira FD&C Food, drug and Cosmetics administration FIQ Físico-químico FU Farmácia Universitária GA I AcidemiaGlutária tipo 1 GA II AcidemiaGlutária tipo 2 HGM Acidúria 3-Hidroxi-3-Metilglutárica HUCFF Hospital Universitário Clementino Fraga Filho IC Inclinação da curva de calibração IPPMG Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira IVA AcidemiaIsovalérica IV-TF Espectroscopia de Infravermelho com Transformada de Fourier Lacmac Laboratório de Controle de Qualidade de Medicamentos, Alimentos e Cosméticos LCHADD Deficiência de 3-hidroxiAcil-Coenzima A Desidrogenase de Cadeia Longa LD Limite de Detecção LQ Limite de Quantificação MCAD Deficiência da Desidrogenase das Acil-Coa dos Ácidos Graxos de Cadeia Média MCC Deficiência isolada de 3-metilcrotonil-CoA carboxilase MCM Deficiência da enzima metilmalonil-CoAmutase MIC Microbiológico Milli-Q Água Ultrapurificada MMA AcidemiaMetilmalônica PA AcidemiaPropiônica PAH Fenilcetonúria PCC Deficiência da enzima Propionil-CoACarboxilase PEAD Polietileno de alta densidade PEBD Polietileno de baixa densidade PET Polietilenotereftalato pH Potencial hidrogeniônico PP Polipropileno PS Poliestireno PVC Policloreto de vinila qs Quantidade suficiente qsp Quantidade suficiente para RDC Resolução da Diretoria Colegiada RE Resolução TR Tempo de retenção SCOT Deficiência de SCOT TI Informe técnico T2 Anomalia da Acetoacetil-CoATiolase mitocondrial UFC Unidade Formadora de Colônia UFC/mL Unidade Formadora de Colônia por mL UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro USP Farmacopeia dos Estados Unidos UV Ultravioleta VIS Visível VLCAD Deficiência da Acil-Coenzima A Desidrogenase de Cadeira Muito Longa LISTA DE FÓRMULAS E SÍMBOLOS % Porcentagem ® Registrado °C Grau Celsius °C Graus Celsius µm Micrograma a Coeficiente angular b Coeficiente linear bar Unidade de pressão cm-¹ Número de onda d2020 Densidade relativa g grama h hora H2O Água H3O + Íon hidrônio HCl Ácido clorídrico HO- Íon hidroxila KBR Brometo de potássio L Litro log Logarítmo M Molar mg Miligrama min Minuto mL Mililitro mL/min Mililitro por minuto mm Milimetro NaOH Hidróxido de sódio p/p Peso por peso p/v Peso por volume r Coeficiente de correlação R² Coeficiente de determinação λ Comprimento de onda ρt Densidade de massa SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 26 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ................................................................................ 29 2.1 Erros Inatos do Metabolismo (EIM) ............................................................... 29 2.1.1 Manifestações Clínicas .............................................................................. 29 2.1.2 Diagnóstico ................................................................................................ 30 2.1.3 Classificação dos EIM ................................................................................ 31 2.1.3.1 AMINOACIDOPATIAS ........................................................................ 33 2.1.3.2 ACIDEMIAS ORGÂNICAS .................................................................. 33 2.1.3.3 OUTRAS DOENÇAS DE EIM TRATADAS COM L-CARNITINA ....... 38 2.2 L-Carnitina .......................................................................................................40 2.2.1 Bioquímica ................................................................................................. 40 2.2.2 Características Gerais ............................................................................... 41 2.2.3 Efeitos adversos e precauções .................................................................. 43 2.2.4 Farmacocinética......................................................................................... 44 2.3 Farmácia Universitária da UFRJ ........................... Erro! Indicador não definido. 2.4 Desenvolvimento De Formulações Líquidas ................................................ 48 2.4.1 Forma Farmacêutica Líquida ..................................................................... 48 2.4.2 Excipientes Farmacêuticos Usados Para Soluções Líquidas Orais ........... 49 2.4.2.1 SOLVENTE: ÁGUA PURIFICADA ..................................................... 49 2.4.2.2 CONSERVANTES ............................................................................... 50 2.4.2.3 AGENTE PROMOTOR DE VISCOSIDADE ........................................ 51 2.4.2.4 ACIDULANTE ..................................................................................... 52 2.4.2.5 EDULCORANTES ............................................................................... 52 2.4.3 Embalagens Usadas Para Soluções Líquidas Orais.................................. 52 2.5 Controle De Qualidade De Soluções Orais Magistrais ................................ 55 2.5.1 Densidade de Massa ................................................................................. 55 2.5.2 Determinação potenciométrica do pH ........................................................ 56 2.5.3 Doseamento do princípio ativo .................................................................. 56 2.5.4 Controle microbiológico ............................................................................. 59 2.6 Estudo De Estabilidade .................................................................................. 60 3 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................... 63 4 OBJETIVOS ........................................................................................................... 64 4.1 Objetivo Geral ................................................................................................. 64 4.2 Objetivos Específicos ..................................................................................... 64 5 MATERIAIS E MÉTODOS .................................................................................... 65 5.1 Materiais ........................................................................................................... 65 5.1.1 Matérias-primas e Reagentes .................................................................... 65 5.1.2 Equipamentos e acessórios ....................................................................... 66 5.2 Métodos ........................................................................................................... 66 5.2.1 Análise de identificação da L-Carnitina ...................................................... 66 5.2.2 Desenvolvimento das formulações ............................................................ 67 5.2.3 Metodologia De Análise Físico-Química .................................................... 68 5.2.3.1 Determinação Do Aspecto ................................................................ 68 5.2.3.2 Determinação do odor ....................................................................... 68 5.2.3.3 Determinação do pH .......................................................................... 68 5.2.3.4 Determinação da densidade de massa ............................................ 69 5.2.3.5 Determinação do teor do princípio ativo ......................................... 70 5.2.3.5.1 PREPARO DE CURVA PADRÃO ................................................. 70 5.2.3.5.2 PREPARO DE SOLUÇÃO DE PADRÃO INTERNO ..................... 70 5.2.3.5.3 PREPARO DE SOLUÇÃO PADRÃO ............................................ 70 5.2.3.5.4 PREPARO DE SOLUÇÃO AMOSTRA ESTOQUE ....................... 70 5.2.3.5.5 PREPARO DE SOLUÇÃO AMOSTRA .......................................... 71 5.2.3.5.6 INFORMAÇÕES DE SISTEMA CROMATOGRÁFICO ................. 71 5.2.3.5.7 ADEQUAÇÃO DO SISTEMA ........................................................ 71 5.2.4 Validação Parcial da Metodologia de Análise de Doseamento .................. 72 5.2.4.1 Precisão .............................................................................................. 72 5.2.4.2 Exatidão .............................................................................................. 73 5.2.4.3 Seletividade ........................................................................................ 73 5.2.4.4 Linearidade ........................................................................................ 74 5.2.4.5 Faixa de trabalho ............................................................................... 75 5.2.5 Metodologia de Análise Microbiológica ...................................................... 75 5.2.5.1 Análise microbiológica ..................................................................... 75 5.2.6 Estudo de Estabilidade .............................................................................. 76 5.2.6.1 Estudo Prévio de Estabilidade ......................................................... 76 5.2.6.2 Estudo de Estabilidade Completo Em Uso ..................................... 76 5.2.7 Estudo de Degradação Forçada ................................................................ 77 5.2.8 Análise de dados ....................................................................................... 78 6 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................. 79 6.1 Análise de identificação da L-Carnitina ........................................................ 81 6.2 Validação Parcial da Metodologia de Doseamento ...................................... 81 6.2.1 Determinação da faixa de trabalho ............................................................ 81 6.2.2 Seletividade ............................................................................................... 81 6.2.3 Linearidade ................................................................................................ 86 6.2.4 Precisão ..................................................................................................... 88 6.2.5 Exatidão ..................................................................................................... 90 6.3 Desenvolvimento da metodologia de análise ............................................... 91 6.4 Desenvolvimento das formulações ............................................................... 91 6.5 Estabilidade prévia das formulações iniciais ............................................... 95 6.6 Estudo de estabilidade completo em uso ................................................... 100 7 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 116 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 117 26 1. INTRODUÇÃO Os erros inatos do metabolismo (EIM) são distúrbios de natureza genética que representam uma importante causa de morbidade e mortalidade entre a população pediátrica (SHAWKY; ABD-ELKHALEK; ELAKHDAR, 2015). Resultam em anormalidades na síntese de proteínas, normalmente enzimas, alterando suas principais funções. Tal alteração pode levar a bloqueio de uma determinada via metabólica com consequente acúmulo de substratos e derivados, bem como a diminuição da síntese do produto esperado. Dependendo da rota afetada,esse bloqueio repercute de maneira clínica variável, sendo geralmente grave e muitas vezes letal (SCRIVER et al., 2002). Embora sejam individualmente raros, eles possuem uma incidência, em conjunto, estimada em 1/1.000 nascidos vivos (ARAÚJO, 2004). Em muitos casos, as crianças parecem perfeitamente normais ao nascimento e podem demorar a apresentar manifestações clínicas. O rápido diagnóstico é essencial para impedir o agravamento e a irreversibilidade dos sintomas, podendo representar a sobrevivência do paciente em alguns casos (JARDIM; ASHTON-PROLLA, 1996). Mas, a variabilidade de sintomas clínicos, o enorme número de doenças de grande complexidade e o fato de serem considerados extremamente raros pela maioria dos profissionais, pode dificultar o correto diagnóstico clínico (EL HUSNY; CALDATO, 2006). Exemplos de patologias associadas à EIM e que possuem alta incidência, as aminoacidopatias e acidemias orgânicas são ocasionadas por deficiência severa da atividade de enzimas específicas de determinadas vias metabólicas, podendo levar ao acúmulo de substratos que, em concentrações mais elevadas que o normal, se tornam tóxicas. Elas apresentam grande impacto no sistema gastrointestinal e nervoso, podendo apresentar manifestações como: vômito, recusa alimentar, apneia, convulsão, coma, lesão cerebral e retardo mental e cognitivo (BEHRMAN, K, 2014; DEODATO et al., 2006a; GARCÍA et al., 2002a; NADAI; PINHEIRO, 2006). Para a maioria das aminoacidopatias e acidemias, o tratamento é feito a partir de restrição alimentar, administração de cofatores das enzimas deficientes e, principalmente, com a suplementação de L-carnitina. Esta substância é capaz de se conjugar e aumentar a excreção dos ácidos orgânicos acumulados nessas doenças, 27 evitando as indesejáveis manifestações clínicas ou retardando o progresso da doença (BERRY, 1998).Sendo o público alvo composto em sua grande maioria por pacientes pediátricos e, por muitas vezes, com dificuldades de deglutição, a forma farmacêutica mais indicada é a líquida. As soluções de uso oral podem ser administradas a pacientes de diferentes idades e com diferentes necessidades, conferindo maior flexibilidade na administração da dosagem correta (NUNN; WILLIAMS, 2005). O desenvolvimento de formulações orais líquidas possui vários fatores críticos e requer cuidados para garantia da segurança e qualidade do produto. Essas preparações apresentam, em sua maioria, alto teor de água o que pode propiciar a degradação físico-química e contaminação microbiológica(BILLANY, 2005; LACHMAN; LIEBERMAN; KANING, 2001). Além disso, a L-carnitina apresenta estrutura semelhante a de aminoácidos e pode ser utilizada por bactérias como fonte de carbono, nitrogênio e de energia, favorecendo também o crescimento microbiano (MEADOWS & WARGO, 2015).Para isso, substâncias inertes denominadas excipientes podem auxiliar no desenvolvimento de soluções mais estáveis, eficazes e atraentes. Mas diferentes estudos apontam algumas dessas substâncias consideradas inertes como sendo responsáveis por reações adversas relacionadas a medicamentos. Além disso, pacientes com EIM apresentam uma série de restrições e, desta forma, a escolha dos excipientes da formulação não pode ser realizada ao acaso e deve ser feita de maneira criteriosa sendo o mais simples possível, no intuito de diminuir a probabilidade de reações não esperadas, mas garantindo a qualidade e estabilidade da formulação (ANSEL; POPOVICH; ALLEN JUNIOR, 2000; GUERRA, 2012). Para identificar o período de utilização e condições de estocagem, mantendo as mesmas propriedades que possuía no momento de sua fabricação, são realizados os testes de estabilidade onde são retiradas amostras em tempos definidos e encaminhadas para análises. A realização do estudo de estabilidade é projetada para verificar as características físicas, químicas e microbiológicas de um produto farmacêutico durante seu prazo de validade. Além de identificar a degradação química ou mudança física de um produto farmacêutico quando expostos a condições forçadas de armazenamento. Esse resultado é utilizado para 28 estabelecer ou confirmar o prazo de validade e recomendar as condições de armazenamento (BRASIL, 2005). A Farmácia Universitária (FU) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) recebe diariamente muitos pacientes provenientes do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG) e de outros centros de saúde que apresentam alguma patologia associada à EIM. Eles, em sua grande maioria, fazem uso de suplementação de L-carnitina que, atualmente, não possui formulação oral líquida medicamentosa disponível no mercado brasileiro. Iniciando o atendimento desses pacientes, a L-carnitina era dispensada na FU sob a forma de sachê contendo a dose individualizada. Mas a forte característica higroscópica do ativo requer uma manipulação, pesagem e selagem rápidas, além da necessidade de dois funcionários envolvidos para uma boa qualidade do produto final. Esse processo é impraticável com a demanda recebida pela FU e, desta maneira, o desenvolvimento de uma formulação líquida de L-carnitina que atenda as necessidades dos pacientes, foi importante para atendimento de todos os pacientes além de aumentar a adesão ao tratamento. A formulação líquida oral de L-carnitina foi desenvolvida nas apresentações de 10% e 20%, sendo avaliadas quanto às suas estabilidades físico-química e microbiológica e apresentando resultados favoráveis durante 45 dias mantidos a temperatura ambiente. 29 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Erros Inatos do Metabolismo (EIM) Os erros inatos do metabolismo (EIM) são um grupo altamente heterogêneo de distúrbios de natureza genética e representam uma importante causa de morbidade e mortalidade entre a população pediátrica (SHAWKY; ABD-ELKHALEK; ELAKHDAR, 2015). Geralmente, correspondem a defeitos enzimáticos capazes de ocasionar a interrupção de uma via metabólica, podendo causar falhas de síntese, degradação, armazenamento ou transporte de moléculas no organismo. Como consequência, tem-se a ausência de um produto esperado, o acúmulo de substrato da etapa anterior à interrompida ou o surgimento de uma rota metabólica alternativa, o que podem levar ao comprometimento de diversos processos celulares (EL HUSNY & FERNANDES-CALDATO, 2006). O estudo dos EIM originou-se no início dos anos 1900, quando Archibald E. Garrod descobriu e identificou as primeiras doenças metabólicas: alcaptonúria, pentosúria, porfiria e albinismo(SHLOMI, CABILI & RUPPIN, 2009). Desde as primeiras descobertas de Garrod, no início do século XX, diversos novos distúrbios foram descritos, na medida em que novas ferramentas de diagnóstico bioquímico e molecular tornaram-se disponíveis(SHAWKY, ABD-ELKHALEK & ELAKHDAR, 2015). Atualmente, existem cerca de 500 distúrbios conhecidos e, embora sejam individualmente raros, eles possuem uma incidência, em conjunto, estimada em 1/1.000 nascidos vivos. Desta forma, cumulativamente, causam importante agravo à saúde (ARAÚJO, 2004). 2.1.1 Manifestações Clínicas Os sintomas e sinais dos EIM podem abranger diferentes sistemas e podem se iniciar em diferentes faixas etárias, apesar de o distúrbio ter origem genética. Neonatos com EIM são, geralmente, saudáveis ao nascimento, com os sintomas podendo se iniciar desde as primeiras horas até as primeiras semanas de vida. Em alguns casos, podem ser adiados por meses até que algum evento, de natureza exógena, altere o equilíbrio bioquímico mantido pela criança até então (ARAÚJO, 30 2004; EL-HATTAB, 2015; JARDIM & ASHTON-PROLLA, 1996). Embora o quadro clínico possa variar, os sintomas iniciais geralmente são inespecíficos, incluindo letargia, redução da alimentação, vômitos, taquipneia e convulsões. Na medida em que a doença metabólica progride, pode haver estuporprogressivo ou coma, associados com alterações de tônus (hipotonia, hipertonia), de postura (opistótono) e dos movimentos (interposição lingual, estalar dos lábios, mioclonia), bem como presença de ascite (acúmulo de fluido na cavidade peritoneal), síndromes dismórficas (malformações da face) e apneia do sono (EL-HATTAB, 2015; NASSER et al., 2012; RAGHUVEER, GARG & GRAF, 2006). De uma maneira geral, os pacientes portadores de EIM apresentam acometimento de diversos sistemas, sendo as manifestações neurológicas, hepáticas e cardíacas as principais envolvidas. Os sintomas neurológicos incluem quadros de retardo mental, disfunções no desenvolvimento psicomotor, regressão psicomotora e convulsões. Sintomas psiquiátricos costumam estar presentes em quase todos os EIM que acometem o sistema nervoso. Já as manifestações hepáticas incluem hepatomegalia e hipoglicemia, icterícia colestática ou insuficiência hepática com icterícia, transaminases elevadas, entre outros. O quadro cardíaco envolve doenças como cardiomiopatia, falência cardíaca e arritmias(ARAÚJO, 2004; EL-HATTAB, 2015). 2.1.2 Diagnóstico A quantidade, complexidade e variedade de manifestações clínicas relacionadas aos EIM dificultam o correto diagnóstico clínico dessas doenças, o que pode trazer danos irreparáveis ao organismo da criança. Por outro lado, a detecção e a intervenção precoces levam a medidas terapêuticas satisfatórias, seguidas de evoluções clínicas favoráveis (BURTON, 1998; JARDIM & ASHTON-PROLLA, 1996). Segundo RAO et al., 2009, quando existe a suspeita de um EIM, cinco importantes aspectos devem ser considerados e seguidos: 1- Histórico familiar: observar a existência de consanguinidade entre os pais, casos de familiares falecidos precocemente ou abortos sem causa definida, 31 ou a ocorrência de um irmão ou irmã previamente afetado por um quadro clínico semelhante. 2- Exames físicos: avaliação de aspectos como dermatite, alopecia, dismorfia facial, catarata, entre outros. 3- Testes iniciais de triagem: realização de exames laboratoriais, como hemograma completo, dosagem de eletrólitos, glicose, amônia, lactato, razão lactato/piruvato, substâncias redutoras, ácidos orgânicos, aminoácidos e cetonas. 4- Testes avançados de triagem: realização de ensaios com base no contexto clínico, que podem incluir ácidos graxos de cadeia longa, quantificação de aminoácidos, ácidos orgânicos, carboidratos e outros metabólitos. 5- Testes definitivos de diagnóstico: para confirmar o distúrbio detectado, ensaio enzimático específico em leucócitos, plasma ou células vermelhas, imunoensaios e análises baseadas em mutações gênicas serão realizados(RAO et al., 2009). Cabe ao pediatra, portanto, se familiarizar com os sinais e sintomas característicos dos EIM e com os exames laboratoriais necessários para se chegar a um diagnóstico preciso. A clínica que alia a história da doença e um bom exame físico é capaz de conduzir para a realização de exames confirmatórios mais adequados, para a terapêutica precoce, bem como para o importante aconselhamento genético (BURTON, 1998; EL HUSNY & FERNANDES-CALDATO, 2006). 2.1.3 Classificação dos EIM Segundo Saudubray & Charpentier (1995), os EIM podem ser divididos em duas categorias, conforme suas características fisiopatológicas e fenótipo clínico: Categoria 1, que corresponde às alterações que afetam um único órgão ou sistema orgânico, e que são normalmente mais facilmente diagnosticadas; e Categoria 2, que engloba doenças onde a alteração bioquímica compromete vias metabólicas comuns a diversos órgãos e, por isso, os relatos clínicos são muito diversificados, tornando difícil o diagnóstico pelo profissional da saúde. A fim de facilitar o estudo 32 dessas doenças, a Categoria 2 foi dividida em três principais grupos: Grupo I, Grupo II e Grupo III. As doenças do Grupo I afetam a síntese ou o catabolismo de moléculas complexas. Os sintomas são permanentes, progressivos com o passar do tempo, podem apresentar-se em todas as idades, não estão relacionados com a ingesta alimentar e também não possuem relação com eventos intercorrentes, como infecções. Entre os distúrbios enquadrados neste grupo estão as doenças com alterações de depósitos lisossômicos, doenças dos peroxissomos, alteração no metabolismo de lipídios, alteração na síntese de purinas e pirimidinas e alteração no transporte de metais. As principais manifestações clínicas desse grupo de doenças são: hidropsia fetal, hepato e/ou esplenomegalia, alterações esqueléticas, convulsões, hipotonia (não sustentar cabeça e membros), fácies grotesca, neurodegeneração subaguda, mieloneuropatia subaguda, deficiência auditiva, achados dismórficos, alterações oculares e da pele, limitações e deficiências articulares (EL HUSNY & FERNANDES-CALDATO, 2006; SAUDUBRAY et al., 2002). As doenças enquadradas no Grupo III são doenças resultantes de deficiência na produção ou utilização de energia por erros inatos do metabolismo intermediário no fígado, miocárdio, músculo ou cérebro. Algumas manifestações clínicas comumente encontradas são: hipoglicemia, miopatia, insuficiência cardíaca, retardo de crescimento e até morte súbita (EL HUSNY & FERNANDES-CALDATO, 2006; EL-HATTAB, 2015). Já as doenças enquadradas no Grupo II são erros inatos do metabolismo intermediário que culminam em intoxicação e a maioria das doenças são tratadas com suplementação de L-carnitina. As intoxicações podem ser decorrentes do acúmulo de substrato tóxico por conta do bloqueio de rotas do metabolismo intermediário e podem se tornar agudas ou crônicas. Apresentam relação evidente com o aporte alimentar e com as intercorrências (infecções), podendo permanecer sem manifestação clínica por grandes intervalos de tempo. Substâncias exógenas podem desestabilizar o equilíbrio e ocasionar uma descompensação metabólica, levando a uma intoxicação aguda e recorrente ou crônica e progressiva. Grande parte de patologias desse grupo apresentam como tratamento suplementação de L- carnitina associada com cofatores enzimáticos. Os principais distúrbios 33 caracterizados neste grupo são as aminoacidopatias, acidemias orgânicas, defeitos do ciclo da ureia e intolerância aos açúcares (SAUDUBRAY et al., 2002). 2.1.3.1 AMINOACIDOPATIAS As aminoacidopatias são causadas por mutações de genes que codificam proteínas específicas. Tais mutações podem alterar a estrutura primária de uma proteína ou a quantidade de proteína sintetizada. Essa alteração pode comprometer a capacidade funcional da proteína, podendo levar ao bloqueio de determinadas vias metabólicas e ao acúmulo de substratos que, em concentrações mais elevadas que o normal, podem ser tóxicas (BEHRMAN, KLIEGMAN & JENSON, 2013). O sistema nervoso é, normalmente, muito impactado pelo acúmulo dos substratos, podendo desencadear manifestações clínicas como coma (em fase aguda). Em algumas aminoacidopatias, a intoxicação somente se manifesta depois de vários meses, até mesmo anos (SAUDUBRAY et al., 2002). A patogenia mais conhecida nesse grupo de EIM é a fenilcetonúria, que é causada pela deficiência completa ou quase completa da fenilalanina hidroxilase (PAH). Esta enzima atua sobre a conversão de fenilalanina a tirosina, e por conta da deficiência enzimática, ocorre o acúmulo do substrato no organismo. Tal situação perturba os processos essenciais no cérebro, como a mielinização e a síntese de proteínas, resultando em lesão cerebral e retardo mental (GARCÍA et al., 2002b). As crianças afetadas podem nascer livres de sintomas, mas se não tratadas no período pós-natal, eles surgem tardiamente nos primeiros meses e o retardo se torna progressivamente pior. O tratamento consiste em uma dieta pobre em fenilalanina e suplementação com L-carnitina (NADAI et al., 2006). 2.1.3.2 ACIDEMIAS ORGÂNICAS As acidúrias ou acidemias orgânicassão normalmente causadas por deficiência severa da atividade de enzimas envolvidas no metabolismo de aminoácidos ramificados, o que resulta em acúmulo tecidual de ácidos carboxílicos (SCRIVER et al., 2002). As acidemias orgânicas mais comuns são as acidemiaspropiônica (PA), metilmalônica (MMA), isovalérica (IVA) e glutárica Tipo 1 (GA I) e Tipo 2 (GA II). Elas são assim classificadas a partir dos ácidos orgânicos 34 que se acumulam em decorrência do bloqueio na via metabólica, como mostrado na Figura 1 (WAJNER et al., 2001). Figura 1. Metabolismo dos aminoácidos de cadeia ramificada e a sinalização das etapas interrompidas pelas acidemiaspropiônica, metilmalônica, isovalérica e glutárica (Adaptado de WAJNER et al., 2001). Três aminoácidos de cadeia ramificada – leucina, isoleucina e valina – são quimicamente similares e a primeira etapa para o metabolismo deles é uma transaminação, formando os alfa-cetoácidos correspondentes. Após esta etapa, através de um complexo multienzimático, ocorre uma descarboxilação oxidativa e as vias seguem de forma independente(PAMPOLS & RIBES, 1994; SANJURJO & BALDELLOU, 2006). A IVA é causada pela deficiência da enzima isovaleril-CoAdesidrogenasena via de degradação do aminoácido leucina. De uma forma geral, a enzima transforma o substrato isovaleril-CoA em 3-metilcrotonil-CoA. No entanto, ao haver falha enzimática, ocorre o acúmulo intracelular do substrato isovaleril-CoA, como mostra a Figura 2. 35 Figura 2. Via principal do catabolismo da leucina e bloqueio da enzima isovaleril-CoAdesidrogenase (1) (Adaptado de VARGAS & WAJNER, 2001) O substrato isovaleril-CoA, quando descompensado, desencadeia a formação de metabólitos alternativos (Figura 3), que podem ser encontrados no sangue e na urina. Do mesmo modo, pode-se encontrar nos fluidos biológicos o próprio isovaleril- CoA, que se encontra em excesso devido ao seu acúmulo. Essas alterações são acompanhadas dos seguintes sintomas clínicos: acidose, cetose, acidose lática, hiperamonemia, hiperglicinemia e níveis diminuídos de carnitina durante as crises metabólicas (PAMPOLS & RIBES, 1994; SANJURJO & BALDELLOU, 2006). Também pode ocorrer uma via secundária, que é a via endógena de excreção da isovaleril-CoA, através da sua conjugação com a glicina. O produto formado é excretado na urina e os níveis de isovaleril-CoA nos fluidos biológicos são diminuídos. Esta via é a base dos principais tratamentos de suplementação com glicina. Outra suplementação importante é a de L-carnitina, que remove o excesso de ácido isovalérico. Com a suplementação destes dois componentes, associados a uma dieta com baixa quantidade de proteína, a possibilidade de desenvolvimento de retardo mental é baixa, porém, o déficit de atenção e de aprendizado ainda assim podem aparecer (COWETT, 1998). 36 Figura 3. Vias metabólicas alternativas do isovaleril-CoA em caso de interrupção da via principal (Adaptado de CAMPISTOL et al., 2007). A PA é causada pela deficiência da enzima propionil-CoAcarboxilase (PCC), enzima mitocondrial que possui a biotina como cofator do catabolismo dos aminoácidos isoleucina, valina, treonina e metioninia, dos ácidos graxos de número ímpar de carbonos e da cadeia lateral do colesterol. Este processo metabólico fornece como produto o propionil-CoA, que é convertido pela enzima PCC em metilmalonil-CoA, e seus produtos entram no ciclo de Krebs e na fosforilação oxidativa, gerando energia. A deficiência da enzima PCC resulta em acúmulo intramitocondrial de propionil-CoA, que passa a ser metabolizado por vias secundárias e produz metabólitos secundários, como mostra a Figura 4 (FENTON, GRAVEL & ROSENBLATT, 2001). Figura 4. Metabólitos secundários produzidos quando ocorre o bloqueio enzimático da PCC (2) (FENTON, GRAVEL & ROSENBLATT, 2001). 37 Existe um grande número de metabólitos decorrentes das rotas alternativas, e a maioria deles são ácidos orgânicos. Eles encontram-se elevados em fluidos fisiológicos e a identificação deles na urina pode levar ao diagnóstico da doença, especialmente o metil-citrato e o 3-OH-propionato. O acúmulo de propionil-CoA intracelular induz a inibição da enzima N-acetilglutamatosintetase e do sistema mitocondrial de transporte de glicina, levando ao aumento dos níveis de amônia e de glicina, comumente encontrados em pacientes com enzima deficiente. O propionil- CoA também pode se conjugar com a carnitina, dando origem à propionil-carnitina. A produção desse metabólito pode ter como consequência a deficiência secundária de carnitina no plasma, sendo necessária a sua suplementação(FENTON, GRAVEL & ROSENBLATT, 2001; SANJURJO & BALDELLOU, 2006). A MMA é um grupo de EIM de aminoácidos que se caracteriza pelo acúmulo de metilmalonil-CoA e de ácido metilmalônico nos fluidos biológicos (FENTON, GRAVEL & ROSENBLATT, 2001; HOFFMAN, 1994). Esse acúmulo pode ser causado pela deficiência da enzima metilmalonil-CoAmutase (MCM), ou pela deficiência de seu cofator cobalamina, ambos essenciais para a produção do substrato succinil-CoA (SANJURJO & BALDELLOU, 2006). Os metabólitos característicos da PA também podem se acumular secundariamente na MMA, tais como o ácido propiônico, o 3-OH-propiônico e o substrato metil-citrato e, por conta disso, as manifestações clínicas de ambas as acidemias são muito semelhantes (NYHAN, BARSHOP & OZAND, 2005). Normalmente, os sintomas clínicos são percebidos nos primeiros dias de vida extra-uterina, já que ocorre a perda da função dialisadora da placenta materna. As manifestações clínicas incluem sintomas gastrointestinais, vômitos, recusa alimentar, desidratação, apneia, hepatomegalia, manifestações neurológicas, hipotonia, letargia e convulsões. A demora no diagnóstico e tratamento podem trazer danos irreparáveis ao sistema nervoso central da criança, podendo progredir para o coma, danos neurológicos permanentes ou morte (DEODATO et al., 2006b). Os achados laboratoriais mais frequentes incluem cetoacidose metabólica, hiperglicemia, hiperamonemia, acidose lática, anemia, trombocitopenia, deficiência de carnitina livre e aumento de acilcarnitinas (GOSEN, 2008; LEHNERT et al., 1994). O tratamento dos pacientes com PA ou MMA deve ser feito com restrição proteica, administração de cofatores das enzimas deficientes (biotina para a PA e 38 hidroxicobalamina para a MMA) e, principalmente, com a administração de L- carnitina. Esta substância é capaz de se conjugar e aumentar a excreção dos ácidos orgânicos acumulados nessas doenças. A enzima carnitina aciltransferase catalisa a formação de ésteres de carnitina como a propionilcarnitina e metilmalonilcarnitina. Além disso, a L-carnitina também pode restaurar a razão acil-CoA/CoA livre intramitocondrial e corrigir a deficiência secundária de carnitina (HOPPEL, 2003; WALTER, 2003). 2.1.3.3 OUTRAS DOENÇAS DO GRUPO II Além das doenças explicadas anteriormente, várias outras doenças apresentam tratamento com L-carnitina. Alguns exemplos resumidos são: 3-Metilcrotonil glicinúria (3-MMM), a Deficiência Isolada de 3-metilcrotonil-CoA Carboxilase (MCC), Acidúria 3-Hidroxi-3-Metilglutárica (HMG) são falhas no catabolismo da leucina que causam hipoglicemia, ausência de corpos cetônicos e acumulo de produtos tóxicos no plasma, urina e tecidos (GRÜNERT et al., 2012); A Deficiência de Beta-cetotiolase (DLE) é uma anomalia da Acetoacetil- CoATiolase mitocondrial (T2) envolvida no catabolismo da isoleucina, geralmente grave, por vezes acompanhados por letargia/coma(GRÜNERT et al., 2012); A Deficiência de Carnitina Primária (DCP) causa deficiência no transportador de carnitina impedindo o transporte de ácidos graxos para o interior da mitocôndria, podendo ocasionar encefalopatia hepática, hipoglicemia e cardiomiopatia (MCGOVERN et al., 2004); A Deficiência de Carnitina/AcilcarnitinaTranslocase(CACT) catalisa a troca da carnitina interna com as acilcarnitinas externas, se apresentam no período neonatal ou na primeira infância e pode causar morte súbita, além de anomalias neurológicas, hipoglicemia, hiperamonemia, hepatomegalia e cardiomiopatia (VITORIA et al., 2015); A Deficiência da Acil-Coenzima A Desidrogenase de Cadeira Muito Longa (VLCAD), enzima voltada na beta-oxidação de ácidos graxos de cadeia muito longa, gera acúmulo dos intermediários reacionais e pode se manifestar ao nascer, na infância ou na fase adulta. Manifestações metabólicas, diarreia, sonolência extrema, 39 mudança de comportamento, hiperglicemia e vômitos, cardiomegalia, hepatomegalia e problemas musculares podem ser observadas(TENOPOULOU et al., 2015); A Deficiência da Desidrogenase das Acil-Coa dos Ácidos Graxos de Cadeia Média (MCAD) é responsável pela quebra de ácidos graxos para obtenção de energia, também impede a formação de reservas energéticas. Os sintomas incluem letargia, hipoglicemia, vômitos e, em casos extremos, convulsões, danos cerebrais, coma e morte súbita (DRENDEL et al., 2015); A Deficiência da Palmitoil Carnitina Transferase (CPT-II), que é responsável pela entrada de ácidos graxos na mitocondria, podelevar à cardiomegalia com batimento cardíaco irregular, hepatomegalia, fraqueza muscular, perda de apetite, sonolência extrema, indícios de descompensação metabólica (MALIK et al., 2015); A Deficiência de SCOT (SCOT)é uma doença recessiva do metabolismo dos corpos cetônicos. A enzima SCOT é responsável pela ativação do acetoacetato, transformando-o em acetoacetil-Coa para a utilização pela mitocôndria. Pode compreender como sintomas a letargia, hipotonia, vômitos e até coma em casos graves (FUKAO et al., 2011); A Deficiência de 3-hidroxi-Acil-Coenzima-A-Desidrogenase de Cadeia Longa (LCHADD), que é responsável pela oxidação dos ácidos graxos de cadeia longa (12 a 16 carbonos), pode desencadear uma cardiomegalia com batimento irregular, hepatomegalia e fraqueza muscular. Costuma se manifestar na faixa dos 15 a 30 anos, em neonatos pode apresentar como sintomas catarata, imperfeições no cérebro e óbito. A escolha da terapêutica adequada dependerá do EIM responsável pela doença e da substância acumulada ou deficiente que está levando ao desequilíbrio bioquímico. Uma das principais abordagens de tratamento para esse perfil de doenças apresentadas é a suplementação de L-carnitina, que evita o acúmulo do metabólito que causa os sintomas apresentados nas patologias acima descritas (EL HUSNY & FERNANDES-CALDATO, 2006; SCHWARTZ, SOUZA & GIUGLIANI, 2008). 40 2.2 L-Carnitina 2.2.1 Bioquímica A L-carnitina é uma amina quaternária com importante função na oxidação de ácidos graxos, principal fonte de energia das células. Ela é um componente de baixo peso molecular, sendo sintetizada de forma endógena no fígado, rins e cérebro a partir de dois aminoácidos essenciais: lisina e metionina. Para esse processo, é necessária a presença de ferro, ácido ascórbico, niacina e piridoxina (HOPPEL, 2003). Além da produção endógena, cerca de 75% da L-carnitina presente no organismo é proveniente da alimentação, sendo as principais fontes a carne vermelha e os laticínios (EVANS & FORNASINI, 2003). Ela é armazenada principalmente nos músculos esqueléticos e cardíacos para fornecer rapidamente energia para as atividades musculares (BREMER, 1983; REBOUCHE & ENGEL, 1984). A L-carnitina atua no processo de produção de energia no organismo. Ela tem importante função no transporte dos ácidos graxos para seu local de destino, onde irá ocorrer a oxidação (produção de energia). Os ácidos graxos são a principal fonte de energia do organismo e são moléculas orgânicas, de caráter lipofílico. Para transitarem pelo sistema sanguíneo, são normalmente associados a proteínas sanguíneas (albumina) para garantir solubilidade em meio aquoso. Entretanto, quando ligados a proteínas, os ácidos graxos não conseguem penetrar na mitocôndria, que é seu local de oxidação. Para atingirem a matriz mitocondrial, uma série de reações enzimáticas deve ocorrer para realizar o transporte do meio extra mitocondrial para o interior desta organela. Esse processo é de suma importância, principalmente para ácidos graxos de cadeia longa (BROQUIST, 1994). A primeira etapa envolve uma família de isoenzimas presentes na membrana mitocondrial, denominadas acil-CoAsintetases. Nesta etapa, em quehá consumo de ATP, o ácido graxo é ligado à coenzima A (CoA), formando acil-CoA. Com ação da enzima carnitina palmitoiltransferase I, o acil-CoA e a carnitina formam o complexo acil-carnitina, liberando uma CoA. Em seguida, a acil-carnitina é transferida pela carnitina-acilcarnitinatranslocase para a matriz, ao mesmo tempo em que uma molécula de carnitina é transportada para o meio extramitocondrial. Na matriz, a acil- 41 carnitina passa pela enzima carnitina palmitoiltransferase II e libera o grupo acil, que se conjuga com a CoAintramitocondrial, liberando uma molécula de carnitina na matriz intramitocondrial (Figura 5). Essas reações são importantes para manter separadas a CoAextramitocondrial da intramitocondrial, já que estas possuem funções diferentes. A CoA intramitocondrial atua na degradação oxidativa do piruvato, dos ácidos graxos e de alguns aminoácidos, enquanto que a CoA citosólica é normalmente utilizada para a biossíntese dos ácidos graxos. Esse processo mediado pela carnitina regula a oxidação dos ácidos graxos (BROQUIST, 1994; CHAMPE, HARVEY & FERRIER, 2006; NELSON & COX, 2014). Figura 5. Transporte dos ácidos graxos do meio extramitocondrial para a matriz mitocondrial com auxílio de enzimas (Adaptado de NELSON & COX, 2014). 2.2.2 Características Gerais A L-carnitina (Figura 6) é um pó cristalino branco ou quase branco, com odor característico, altamente higroscópico e muito solúvel em água. Por conta disso, é indicado para formulações líquidas (MARTINDALE, 2009). 42 Figura 6. Estrutura da L-carnitina (HOPPEL, 2003). É solúvel em álcool quente e praticamente insolúvel em acetona. Possui peso molecular de 161,2g/mol, seu ponto de fusão é entre 196 e 197ºC, seu ponto isoelétrico é 3,8 e possui densidade aparente de aproximadamente 0,64g/mL. Uma solução a 5% em água apresenta pH entre 6,5 e 8,5 (SWEETMAN, 2009). As principais características de identificação estão apresentadas na tabela 01: Tabela 01. Principais características de identificação da Carnitina Nome químico 3-hidroxi-4-N-trimetilamino-butirato Sinônimos Carnitina, Levocarnitina, L-carnitina base, Vitamina BT, CAS 541-15-1 DCB/DCI 05242 – Levocarnitina A L-carnitina é encontrada naturalmente nos animais, vegetais e microrganismos. Em humanos, a sua biossíntese endógena não é suficiente para as atividades do organismo, sendo necessário adquiri-la exógenamente. A dieta é o principal meio de obtenção de L-carnitina e os alimentos que apresentam abundância em sua composição são as carnes vermelhas, derivados lácteos, peixes e ovos (BREMER, 1983; WALTER & SCHAFFHAUSER, 2000). Na década de 80, a empresa suíça Lonza® desenvolveu e patenteou a técnica para a síntese da L-carnitina em escala industrial, tornando-a acessível à população. O processo de fabricação da L-carnitina era realizado por reações químicas na presença de catalisadores quirais. Inevitavelmente, a síntese química conduzia à 43 mistura racêmica dos isômeros L-carnitina (Figura 7e) e D-carnitina (Figura 7d) (BERNAL et al., 2007; CAVAZZA, 1981; WALTER & SCHAFFHAUSER, 2000). L-Carnitina D-Carnitina Figura 7. Estrutura química das isoformas de carnitina: (e) levógira e (d) dextrógira (HOPPEL, 2003). Diversos estudos sugerem que a D-carnitina não seja biologicamente ativa. Isso porque a substânciapode se ligar ao sistema de transporte da L-carnitina, diminuindo a concentração da isoforma levógira nas células e inibir reações dependentes de levocarnitina, já que a concentração de L-carnitina livre nas células é um importante regulador para a síntese e degradação de ácidos graxos. Diante disso, a companhia suíça Lonza® mais uma vez desenvolveu e patenteou um processo de biotransformação único, estereosseletivo, para a produção de L- carnitina (livre da isoforma dextrógira) (SÁNCHEZ-HERNÁNDEZ et al., 2010; WALTER & SCHAFFHAUSER, 2000). Para contornar o forte odor característico e a alta higroscopicidade da L- carnitina base, a companhia sintetizou o sal cloridrato de L-carnitina (Figura 8), que não teve boa aceitação. Figura 8. Estrutura do sal cloridrato de L-carnitina (C7H15NO3.HCl) (SWEETMAN, 2009). 2.2.3 Efeitos adversos e precauções Após administração oral, alguns efeitos adversos podem ocorrer, tais como náuseas, vômitos, diarreia e cólicas abdominais. Para evitar os distúrbios 44 gastrointestinais, a solução oral deve ser ingerida lentamente, com doses espaçadas e uniformes ao longo do dia. Alguns pacientes podem exalar odor característico, provavelmente devido à formação do metabólito trimetilamina, o que pode ser reduzido ou eliminado com a redução da dose (PATRICK, HINCHCLIFFE & JONATHAN, 2005; SWEETMAN, 2009). Deve-se evitar administrar doses elevadas de L-carnitina oral por longos períodos a pacientes com insuficiência renal grave, pois eles não conseguem eliminar os metabólitos tóxicos trimetilamina e N-óxido de trimetilamina. Além disso, deve-se monitorar a glicemia de pacientes diabéticos que fazem uso de insulina, a fim de evitar crises de hipoglicemia (SWEETMAN, 2009). 2.2.4 Farmacocinética A concentração plasmática de L-carnitina representa a soma do material endógeno e exógeno. As doses orais de L-carnitina são absorvidas lentamente no intestino delgado, através de um sistema de transporte dependente de sódio ou via difusão passiva (LI et al., 1992). Após dose oral de 1 a 6 g de L-carnitina, a biodisponibilidade encontrada é de 5 a 18% da dose administrada, enquanto que a biodisponibilidade da L-carnitina proveniente da dieta é superior a 75%. A concentração máxima é alcançada 3 a 4 horas após a administração oral. A porção não absorvida é degradada pelos microrganismos presentes no intestino grosso, conduzindo à formação de metabólitos (REBOUCHE & ENGEL, 1984). Alguns metabólitos são recuperados na urina (óxido-N-trimetilamina) e nas fezes (γ- butirobetaína). A L-carnitina possui alta eliminação renal, mas sofre intensa reabsorção tubular (98-99%). Ela não se liga às proteínas plasmáticas e seu estado de equilíbrio é alcançado após quatro dias de administração oral (EVANS & FORNASINI, 2003). 45 2.3 Farmácia Universitária da UFRJ A Farmácia Universitária (FU) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) atende cerca de 200 pacientes diários vindos de clínicas especializadas, como as do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF/UFRJ) e do Instituto de Pediatria e Puericultura Martagão Gesteira (IPPMG/UFRJ). Eles são atraídos por medicamentos de qualidade a preço de custo, se tornando um grande benefício principalmente para pacientes de baixa renda (BARROS, 2016). Uma grande parcela dos paciêntes provenientes do IPPMG apresentam alguma doença relacionada a EIM e necessitam de suplementação de L-carnitina para seu tratamento. A FU é uma farmácia escola fundada em 1986 pela necessidade de haver um local que oferecesse estágio em manipulação alopática para os alunos da Faculdade de Farmácia (FF) da UFRJ. A FU recebe mais de 200 estudantes por ano, da Faculdade de Farmácia da UFRJ, UFRJ Macaé e do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) para realização do estágio curricular obrigatório de manipulação alopática, que são orientados por farmacêuticos e docentes. A FU possibilita o contato dos estudantes com a manipulação de formas farmacêuticas e orientação aos pacientes sobre os principais efeitos adversos do medicamento, instruções de administração, uso racional e cuidados no armazenamento (BARROS, 2016; RODRIGUES et al., 2009). Atuamente apresenta inúmeros projetos relevantes e foi classificada pela Pró- reitoria de Extensão da UFRJ como um programa de extensão. Vale ressaltar o caráter multidisciplinar das suas atividades que, ao longos dos anos, vem desempenhando papel estratégico na formação de estudantes não só de graduação, mas também de Pós-Graduação, em áreas carentes de recursos humanos, tais como a busca de novas formulações de medicamentos, assistência farmacêutica, farmacovigilância e projetos que consolidam a pesquisa na área de cosmetologia (RODRIGUES et al., 2009). Com uma grande parcela de pacientes em busca de suplementação de L- carnitina e sem a existência de uma formulação de L-carnitina existente no mercado, 46 a FU buscou atender às prescrições na forma farmacêutica de pó dispensado em sachês. O processo, relativamente simples, consiste em transferir a massa equivalente à dose do ativo para o sachê, proceder com a expulsão do máximo de ar do interior da embalagem e finalizar com completa selagem. Porém, a L-carnitina base, sendo extremamente higroscópica, requer associação com agente dessecante para reduzir a absorção de água durante o processo de manipulação. Os constituintes da formulação devem ser tamisados antes da homogeneização, que deve acontecer em gral e pistilo. A mistura deve ser realizada em progressão geométrica até total homogeneização. O processo descrito, a pesagem e a selagem do sachê, devem ocorrer o mais breve possível para evitar grande exposição da formulação à umidade do ambiente. Com esse objetivo, no máximo vinte sachês eram produzidos a cada manipulação, que contava com a dedicação de dois funcionários dividindo as tarefas de pesar e selar no menor intervalo de tempo possível. Mas, mesmo com esses cuidados, a mistura apresentava grande absorção de água, tornando-se grumosa e, por muitas vezes, líquida, tornando difícil sua pesagem e envase total da dose (Figura 09). Muitas vezes não se conseguia manipular a quantidade de sachês planejada e uma quantidade considerável de mistura tornava-se inutilizada e era descartada. Figura 09. Ilustração da absorção de água durante o processo de manipulação da mistura (D), durante o processo de pesagem (M) e durante processo de envase (E). Além dos problemas relativos à produção da formulação, a dispensação sob a forma de pó leva a problemas na adesão do paciente. Para administração do conteúdo do sache, é necessário que o pó seja disperso em líquidos ou em 47 alimentos durante as refeições. Este tipo de administração, no entanto, apresenta alguns inconvenientes, principalmente pela dificuldade em fazer pacientes infantis ou com dificuldade de deglutição em ingerirem a dose correta em todas as refeições. E o forte odor característico desagradável da formulação pode dificultar ainda mais a correta administração. Além disso, alguns sachês (normalmente os últimos manipulados) podem apresentar conteúdo mais aglomerado (grumado) e apresentar alteração no escoamento do pó, ficando retido na superfície interna da embalagem, podendo levar a redução da dose a ser administrada. Por conta das desvantagens da dispensação da L-carnitina em pó envasada em sachê, o mais indicado para esse público alvo seria a disponibilização de uma formulação líquida oral de L-carnitina. O mercado farmacêutico disponibiliza poucos medicamentos na forma farmacêutica líquida e, até o momento, não existe registro de formulação líquida oral de L-carnitina com finalidade medicamentosa, apenas suplementos voltados para o público desportivo, normalmente associado a diversos componentes vitamínicos e nutrientes energéticos. Por se tratarem de suplementos, não sãoconsiderados como alternativa de tratamento, já que não são produzidos com a qualidade e exigências necessárias para um medicamento, tornando a qualidade e a quantidade declarada duvidosa. Em muitos casos, não necessitam nem de registro em órgão regulatório (VENTURA, 2011). As formas farmacêuticas líquidas são as mais indicadas para uso em pediatria, já que, além de facilitarem a administração e contribuir para a adesão dos doentes à terapêutica, apresentam grande flexibilidade, permitindo o ajuste simples e rápido das doses que, em função da evolução da patologia e do desenvolvimento da criança, podem sofrer ajustes. Estes aspectos são particularmente relevantes nos casos de terapias prolongadas, como no tratamento das doenças relacionadas à EIM (PINTO; BARBOSA, 2008). Esse público apresenta importantes diferenças e alterações fisiológicas, além de apresentarem uma série de restrições. Dessa forma, a formulação deve ser o mais simples possível, com o mínimo de excipientes, mas sem deixar de apresentar a qualidade e segurança necessárias (EL HUSNY; FERNANDES-CALDATO, 2006). 48 2.4 Desenvolvimento De Formulações Líquidas 2.4.1 Forma Farmacêutica Líquida A forma farmacêutica é uma ferramenta fundamental na adesão ao tratamento farmacoterapêutico, principalmente quando se trata de doenças crônicas, onde o medicamento pode ser utilizado por longos períodos, além de assegurar a eficácia e segurança do medicamento. Para pacientes pediátricos, idosos e que apresentem alguma dificuldade de deglutição, a forma farmacêutica líquida é a mais adequada, pois facilita a administração do medicamento e confere grande flexibilidade quanto à dosagem, permitindo ajustes simples e rápidos que podem ser necessários durante o tratamento (PINTO; BARBOSA, 2008; VENTURA, 2011). No entanto, o desenvolvimento de formulações líquidas possui fatores críticos e requer diferentes cuidados para garantia da segurança e qualidade do produto. Por apresentarem elevado teor de água, estão passíveis de degradação físico- química, podem apresentar menor estabilidade dos componentes da formulação e apresentam maior susceptibilidade de proliferação de microrganismos (FERREIRA; SOUZA, 2011a). Além disso, a L-carnitina é sintetisada a partir dos aminácidos essenciais lisina e metionina e, por apresentar estrutura semelhante a de um aminoácido, pode ser usada como substrato para microrganismos. Bactérias Gram-positivas e Gram- negativas podem consumir a L-carnitina como fonte de carbono, nitrogênio e de energia podendo levar à formação de metabólitos indejesados (MEADOWS; WARGO, 2015; SÁNCHEZ-HERNÁNDEZ et al., 2010). Caso o sistema conservante não seja eficiente, a concentração da formulação pode ser comprometida, levando a uma administração de dose subterapêutica, exposição do paciente a produtos de degradação tóxicos ou ingestão de um número inaceitável de microrganismos (BILLANY, 2005). Na tentativa de impedir os problemas apontados, substâncias inertes denominadas excipientes podem auxiliar no desenvolvimento de soluções mais estáveis, eficazes e atraentes. Essas substâncias possuem diferentes funções, sendo comumente usadas para solubilizar, espessar, diluir, estabilizar, conservar ou flavorizar formulações farmacêuticas. As características organolépticas da 49 formulação são importantes fatores de adesão à terapêutica e diferentes opções de excipientes são encontrados no mercado (GLASS et al., 2006). Porém, estudos apontam que essas substâncias consideradas inertes, podem ser responsáveis por algumas reações adversas relacionadas a medicamentos. Além disso, alguns adjuvantes são reconhecidamente desaconselhados para uso em crianças. Os edulcorantes, utilizados para tornar as formulações orais mais palatáveis, podem conter açúcar sendo contra-indicado para pacientes diabéticos e com erros inatos de metabolismo. Os corantes também são utilizados nessas formulações e podem causar reações alérgicas em pacientes com hipersensibilidade (VENTURA, 2011). Desta forma, a escolha dos excipientes da formulação não pode ser realizada ao acaso e deve ser feita de maneira criteriosa sendo o mais simples possível, no intuito de diminuir a probabilidade de reações adversas, mas garantindo a qualidade e estabilidade da formulação (ANSEL; POPOVICH; ALLEN JUNIOR, 2000; GUERRA, 2012). 2.4.2 Excipientes Farmacêuticos Usados Para Soluções Líquidas Orais Os excipientes são substâncias adicionadas aos compostos farmacologiamente ativos para permitir a produção de formas farmacêuticas estáveis, atraentes, eficazes e seguras e, normalmente, representam a maior parte da forma farmacêutica. Os excipientes podem auxiliar na manutenção da estabilidade física, química e microbiológica do produto, interferir na disponibilidade do princípio ativo no organismo, melhorar a aceitabilidade do paciente e manter a efetividade do produto durante a sua estocagem e uso.Cada excipiente tem uma função definida no produto e podem funcionar como conservantes, solventes, edulcorantes, aromatizantes, agentes doadores de viscosiade, veículo, entre outros. Portanto, sua seleção vai depender das características desejadas do produto final farmacêutico(AULTON, 2016; BRASIL, 2012a). Os principais tipos de excipientes utilizados em soluções orais estão descritos abaixo: 2.4.2.1 SOLVENTE: ÁGUA PURIFICADA A água é o solvente mais usado em formas farmacêuticas líquidas por apresentar diversas vantagens como a ausência de toxicidade, compatibilidade 50 fisiológica e baixo custo. A água potável apresenta diferentes contaminantes que podem interferir na qualidade da formulação final. Por isso, a água deve ser tratada por sistemas de purificação como destilação, troca iônica ou osmose reversa, para atender aos requisitos de pureza estabelecidos na monografia da Farmacopeia Brasileira. A água purificada pode ser utilizada na fabricação de soluções não estéreis de uso não parenteral e em formulações magistrais (BRASIL, 2010a). 2.4.2.2 CONSERVANTES As formulações líquidas orais apresentam, em sua grande maioria, alto teor de água em sua composição, o que favorece o crescimento microbiano durante sua manipulação, armazenamento e uso. Os chamados conservantes são substâncias usadas para inibir o crescimento microbiano, com o objetivo de prolongar a estabilidade do produto, principalmente em formulações multidose. Um bom conservante deve apresentar atividade de amplo espectro contra bactérias, leveduras e mofos, ser efetivo em baixas concentrações, ser solúvel em água e, de preferencia, ser incolor e inodoro (AULTON, 2016; PAULO et al., 2013). Dentre os conservantes mais utilizados em formulações farmacêuticas, destacam-se os parabenos, usados desde 1932, sendo o metilparabeno e propilparabeno os mais conhecidos. Eles apresentam amplo espectro de atividade, são ativos contra fungos e bactérias Gram positivas, mas fracos para as Gram negativas. Apesar de só serem efetivos em fase aquosa, não apresentam alta solubilidade em água necessitando de aquecimento prévio. Atuam em uma faixa de pH de 3 a 8, sendo mais ativos em pH baixo e apresentam sabor não muito convidativo. São normalmente utilizados entre 0,015 a 0,2% para soluções ou suspensões orais (SONI et al., 2001). O benzoato de sódio é o conservante mais antigo e utilizado. É um agente bacteriostático e fungicida, bastante utilizado em formulações farmacêuticas orais e considerado seguro quando usado em concentrações inferiores a 0,5%. Possui alta solubilidade em água a 25°C e é pH depentende, apresentando maior atividade em valores baixos de pH, quando é convertido em sua forma ativa, o ácido benzóico. É possível também encontrar o ácido benzóico comercializado como conservante, mas ele não apresenta boa solubilidade em meios aquosos (LACHMAN; LIEBERMAN; KANING, 2001; MARTINDALE, 2009; VILAPLANA; ROMAGUERA, 2003).
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