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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE 
FACULDADE DE FARMÁCIA 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS 
 
 
 
 
 
 
MARIANNE GRILO REZENDE 
 
 
 
 
 
 
 
Síntese e Avaliação Biológica de Tioureias Piperazínicas e Análogos da 
Fluoroamodiaquina para o Tratamento da Leishmaniose e da Malária 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2019 
MARIANNE GRILO REZENDE 
 
 
 
 
 
 
Síntese e Avaliação Biológica de Tioureias Piperazínicas e Análogos da 
Fluoroamodiaquina para o Tratamento da Leishmaniose e da Malária 
 
 
 
 
 
Relatório apresentado à Banca de 
Acompanhamento do Programa de 
Pós-Graduação em Ciências 
Farmacêuticas da Faculdade de 
Farmácia da Universidade Federal 
do Rio de Janeiro, como requisito 
parcial à obtenção do título de 
Mestre em Ciências Farmacêuticas. 
 
Orientadores: Prof. Dr. Lucio 
Mendes Cabral 
Dr. Gil Mendes Viana 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2019 
 
 
 
Rezende, Marianne Grilo 
R467s Síntese e Avaliação Biológica de Tioureias 
Piperazínicas e Análogos da Fluoroamodiaquina para o 
Tratamento da Leishmaniose e da Malária / Marianne 
Grilo Rezende. -- Rio de Janeiro, 2019. 
379 f. 
 
Orientador: Lucio Mendes Cabral. 
Coorientador: Gil Mendes Viana. 
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do 
Rio de Janeiro, Faculdade de Farmácia, Programa de 
Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, 2019. 
 
1. antimaláricos. 2. leishmanicida. 3. núcleo 
piperazínico. 4. tioureias. 5. fluoroamodiaquina. I. 
Cabral, Lucio Mendes, orient. II. Viana, Gil 
Mendes, coorient. III. Título. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CIP – Catalogação na Publicação 
Elaborado pelo Sistema de Geração Automática da UFRJ com os dados fornecidos 
pelo(a) autor(a), sob a responsabilidade de Miguel Romeu Amorim Neto - CRB-
7/6283. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A Silvéria, Marina, Fellipe e 
Carlos Alberto (in memoriam). 
AGRADECIMENTOS 
 
A Deus que por ter me proporcionado tantas oportunidades e por ter me 
sustentado em todos os momentos difíceis, contribuindo para que eu 
alcançasse essa importante etapa da minha vida. 
À minha família, minha mãe, Silvéria, minha irmã, Marina, e meu namorado, 
Fellipe, por todo apoio depositado em mim, por todo amor, incentivo, 
compreensão e, principalmente, por acreditarem em mim e nos meus sonhos. 
Aos meus orientadores, Professor Doutor Lucio Mendes Cabral e Doutor Gil 
Mendes Viana pela oportunidade, apoio, paciência, confiança e contribuições 
fundamentais para que este trabalho pudesse ser realizado. 
Aos amigos do Laboratório de Tecnologia Industrial Farmacêutica da 
Faculdade de Farmácia da UFRJ pelo apoio e amizade, em especial a 
Dandara, Paloma, Priscila, Raphael e Raquel por todo apoio ao longo do 
desenvolvimento deste trabalho. 
Aos alunos de Iniciação Científica Filipe Fernandes e Mateus Fonseca, por 
toda ajuda, paciência e risadas mesmo nos momentos difíceis. 
Ao CNPq, CAPES e FAPERJ pelo apoio financeiro que foi fundamental para a 
realização deste projeto. 
E, em especial ao Dr. Gil Mendes Viana e a Dra. Ana Carolina Corrêa, que 
desde a minha Iniciação Científica vêm me proporcionando muito 
conhecimento e aprendizado ao longo de sete anos, se tornando verdadeiros 
amigos. 
RESUMO 
 
REZENDE, Marianne Grilo. Síntese e avaliação biológica de tioureias 
piperazínicas e análogos da fluoroamodiaquina para o tratamento da 
leishmaniose e da malária. Rio de Janeiro, 2019. Dissertação (Mestrado) – 
Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, Faculdade de 
Farmácia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019. 
 
A leishmaniose e a malária são consideradas problemas de saúde pública no 
mundo, afligindo principalmente países subdesenvolvidos, sendo responsáveis 
pelo comprometimento da qualidade de vida e morte de milhares de pessoas 
por ano. Os efeitos adversos dos fármacos preconizados para o tratamento, 
além do aumento da resistência dos protozoários aos mesmos, demonstram a 
necessidade do desenvolvimento de novas alternativas terapêuticas. Dessa 
forma, o presente trabalho tem como objetivo a síntese e a caracterização de 
40 derivados de tioureia e 5 novos derivados da fluoroamodiaquina, visando a 
obtenção de novas moléculas com potencial atividade leishmanicida e 
antimalárica. Além disso, este trabalho visa à avaliação da atividade destes 
compostos frente às formas promastigota e amastigota de Leishmania 
amazonensis, avaliando também a toxicidade em macrófagos somada a 
avaliação da atividade antimalárica frente à cepa de Plasmodium falciparum 
sensível e resistente à cloroquina, bem como a inibição da formação da β-
hematina e avaliação da citotoxicidade em células de ovário de hamster. As 
diferentes tioureias foram sintetizadas a partir de reações entre os 
isotiocianatos de fenila, benzila, feniletila ou trimetoxifenila com diferentes 
piperazinas. As reações foram conduzidas à temperatura ambiente utilizando 
CH2Cl2 como solvente sem purificação adicional dos produtos. Os análogos da 
fluoroamodiaquina foram obtidos partir de uma rota sintética, cuja 4-amino-2-
(hidroximetil) fenol, foi obtida a partir da redução do álcool 2-fluoro-5-
nitrobenzílico. Em seguida, tratou-se o 4-amino-2-(hidroximetil)fenol com 
quinolina, para se obter o {5-[(7-cloroquinolin-4-il)amino]-2-fluorofenil} metanol. 
Este intermediário foi submetido a refluxo, originando o 7-cloro-N-[3-
(clorometil)-4-fluorofenil] quinolin-4-amino, o qual foi acoplado com diferentes 
piperazinas, obtendo-se os novos análogos. Todas as moléculas sintetizadas 
foram caracterizadas por RMN de 1H e 13C, IV, EMAR e ponto de fusão. As 
tioureias foram obtidas com excelentes rendimentos (67-99%), porém os 
análogos da fluoroamodiaquina apresentaram baixos rendimentos (37-77%). 
As atividades leishmanicida e antimalárica foram avaliadas por ensaios 
conduzidos in vitro, bem como os ensaios de citotoxicidade em macrófagos e 
em células de ovário de hamster. De uma forma geral, os compostos 
sintetizados apresentaram bons resultados de atividade biológica e baixo perfil 
de toxicidade, além dos análogos da fluoroamodiaquina apresentarem valores 
de inibição da formação da β-hematina semelhante à amodiaquina. Sendo 
assim, os resultados demonstraram que as moléculas sintetizadas são 
promissoras para o desenvolvimento de novas terapias para o tratamento da 
leishmaniose e da malária. 
 
Palavras-chave: antimaláricos, leishmanicida, núcleo piperazínico, tioureias, 
fluoroamodiaquina. 
ABSTRACT 
 
REZENDE, Marianne Grilo. Synthesis and biological evaluation of 
piperazine thioureas and fluoroamodiaquine analogs for the treatment os 
leishmaniasis and malaria. Rio de Janeiro, 2019. Dissertação (Mestrado) – 
Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, Faculdade de 
Farmácia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019. 
 
Leishmaniasis and malaria are considered public health problems in the world, 
afflicting mainly underdeveloped countries, being responsible for the quality of 
life and death of thousands of people per year. The adverse effects of the drugs 
recommended for the treatment, besides the increase of the resistance of the 
protozoa to the same, demonstrate the necessity of the development of new 
therapeutic alternatives. Thus, the present work aims to synthesize and 
characterize 40 thiourea derivatives and 5 new fluoroamodiaquine derivatives, 
aiming at obtaining new molecules with potential leishmanicidal and antimalarial 
activity. In addition, this work aims to evaluate the activity of these compounds 
against the promastigote and amastigote forms of Leishmania amazonensis, 
also evaluating the toxicity in macrophages together with the evaluation of the 
antimalarial activity against the sensitive and resistant chloroquine Plasmodium 
falciparum strain, as wellas the inhibition the formation of β-hematin and 
evaluation of cytotoxicity in hamster ovary cells. The different thioureas were 
synthesized from the reactions between the isothiocyanates of phenyl, benzyl, 
phenylethyl or trimethoxyphenyl with different piperazines. Reactions were 
conducted at room temperature using CH2Cl2 as the solvent without further 
purification of the products. Fluoroamodiaquine analogs were obtained from a 
synthetic route, which 4-amino-2-(hydroxymethyl) phenol was obtained from the 
reduction of the 2-fluoro-5-nitrobenzyl alcohol. The 4-amino-2-(hydroxymethyl) 
phenol was then treated with quinoline to give {5-[(7-chloroquinolin-4-yl) amino]-
2-fluorophenyl} methanol. This intermediate was refluxed to give 7-chloro-N-[3-
(chloromethyl)-4-fluorophenyl] quinolin-4-amine, which was coupled with 
different piperazines to give the new analogues. All the synthesized molecules 
were characterized by 1H and 13C NMR, IR, HRMS and melting point. Thioureas 
were obtained in excellent yields (67-99%), but the fluoroamodiaquine analogs 
presented low yields (37-77%). Leishmanicidal and antimalarial activities were 
evaluated by in vitro assays as well as the cytotoxicity assays in macrophages 
and hamster ovary cells. In general, the synthesized compounds presented 
good biological activity and low toxicity profile. In addition fluoroamodiaquine 
analogs showing inhibition values of β-hematin formation similar to 
amodiaquine. Thus, the results demonstrated that the synthesized molecules 
are promising for the development of new therapies for the treatment of 
leishmaniasis and malaria. 
 
Key-words: antiplasmodial, leishmanicidal, piperazinic nucleus, thioureas, 
fluoroamodiaquine. 
 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
Figura 1. Distribuição geográfica da leishmaniose ........................................ 21 
Figura 2. Ciclo Biológico da leishmaniose ..................................................... 23 
Figura 3. Estrutura molecular dos principais fármacos utilizados no tratamento 
da leishmaniose .............................................................................................. 27 
Figura 4. Mecanismo de ação e de resistência dos antimoniais pentavalentes 
em formas amastigotas de Leishmania............................................................ 28 
Figura 5. Mecanismo de ação e resistência da miltefosina, pentamidina e 
anfotericina B ................................................................................................... 30 
Figura 6. Mudanças na incidência de malária pelo mundo entre os anos de 
2000 – 2015 ..................................................................................................... 31 
Figura 7. Casos confirmados de malária por Plasmodium vivax e Plasmodium 
falciparum no Brasil em 2016 .......................................................................... 32 
Figura 8. Ciclo de vida do Plasmodium no hospedeiro humano 
.......................................................................................................................... 34 
Figura 9. Perfil de ação dos principais fármacos utilizados para o tratamento da 
malária ............................................................................................................. 36 
Figura 10. Alguns fármacos antimaláricos disponíveis comercialmente ......... 37 
Figura 11. Estrutura química da quinina e de alguns derivados quinolínicos . 40 
Figura 12. Exemplos de derivados quinolínicos com conhecida atividade 
leishmanicida ................................................................................................... 41 
Figura 13. Estrutura 2D do heme e estrutura 3D do heme obtida por 
cristalografia e difração de raios-X .................................................................. 42 
Figura 14. Representação gráfica da orientação de ligação da AQ na melhor 
solução obtida pela simulação de docking molecular ...................................... 43 
Figura 15. Biotransformação do paracetamol e da amodiaquina (AQ) em 
quinonaiminas pelo citocromo P450 ................................................................ 45 
Figura 16. Estrutura química da fluoroamodiaquina (FAQ) sintetizada por 
O’Neill e colaboradores e dos análogos da amodiaquina sintetizados por 
Guglielmo e colaboradores .............................................................................. 45 
Figura 17. Derivados de tioureia previamente descritos como agentes 
antiprotozoários ............................................................................................... 48 
Figura 18. Esquema geral para obtenção de tioureias ................................... 48 
Figura 19. Compostos com promissora atividade leishmanicida e antimalárica 
contendo o núcleo piperazina em suas estruturas .......................................... 49 
Figura 20. Principais alvos terapêuticos para o tratamento da malária .......... 50 
Figura 21. Estrutura química dos compostos propostos por Sousa, 2012 ..... 52 
Figura 22. Estrutura de compostos contendo o anel piperazínico na cadeia 
lateral ............................................................................................................... 53 
Figura 23. Configuração da placa para o ensaio de pLDH ........................... 102 
Figura 24. Fluxograma para o ensaio de avaliação da inibição da formação da 
β-hematina ..................................................................................................... 105 
Figura 25. Gráficos obtidos no teste para verificação da inibição da formação 
da β-hematina ................................................................................................ 154 
Figura 26. Gráficos obtidos no teste para verificação da inibição da formação 
da β-hematina ................................................................................................ 157 
 
 
 
 
 
LISTA DE ESQUEMAS 
 
Esquema 1. Composto lead que apresentou atividade antiplasmódica e 
inibitória da proteína bomba de efluxo série de análogos quinolínicos proposta 
por Gemma e colaboradores ........................................................................... 51 
Esquema 2. Síntese de tioureias a partir de isotiocianatos .......................... 108 
Esquema 3. Mecanismo reacional proposto para obtenção das tioureias 
........................................................................................................................ 110 
Esquema 4. Obtenção das novas tioureias 3aa-aj a partir do BITC (1a) ..... 110 
Esquema 5. Obtenção das novas tioureias 3ba-bl a partir do PITC (1b) ..... 114 
Esquema 6. Obtenção das novas tioureias 3ca-ck a partir do PEITC (1c) .. 116 
Esquema 7. Obtenção das novas tioureias 3da-dj a partir do TMPITC (1d) .118 
Esquema 8. Esquema retrossintético para obtenção dos novos análogos da 
FAQ (9a, 9b, 9c, 9d, 9e) ................................................................................ 124 
Esquema 9. Rota sintética para obtenção dos análogos da FAQ (9) ........... 125 
Esquema 10. Redução do álcool 2-fluoro-5-aminobenzílico (5) ................... 126 
Esquema 11. Reação de obtenção do {5-[(7-cloroquinolin-4-il)amino]-2-
fluorofenil} metanol (7) ................................................................................... 129 
Esquema 12. Mecanismo reacional proposto para obtenção do intermediário 7 
........................................................................................................................ 130 
Esquema 13. Reação de obtenção do intermediário 7-cloro-N-[3-(clorometil)-4-
fluorofenil] quinolin-4- amino (8) .................................................................... 133 
Esquema 14. Mecanismo reacional proposto para obtenção do intermediário 8 
........................................................................................................................ 134 
Esquema 15. Reação de obtenção dos novos análogos da FAQ (9a-e) ......136 
Esquema 16. Mecanismo reacional proposto para obtenção dos análogos da 
FAQ 9a-e ....................................................................................................... 138 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE TABELAS 
 
Tabela 1. Rendimentos das reações para obtenção dos derivados da FAQ (9a-
e) e seus respectivos pontos de fusão .......................................................... 143 
Tabela 2. Valores de atividade antipromastigota de L. amazonensis (CI50), de 
atividade antiamastigota de L. amazonensis (CI50) e de toxicidade frente a 
macrófagos (CC50) ......................................................................................... 144 
Tabela 3. Estrutura dos 10 derivados de tioureia no teste de triagem frente à 
forma promastigota ........................................................................................ 146 
Tabela 4. Taxa de sobrevivência dos parasitas de P. falciparum (cepa CQS 
NF54) utilizando a concentração de 10 μg/mL dos derivados piperazínicos de 
tioureias ......................................................................................................... 150 
Tabela 5. Atividade antiplasmódica (CI50, μM) dos derivados de tioureia e da 
cloroquina (CQ) .............................................................................................. 152 
Tabela 6. Atividade antiplasmódica (CI50, μM) frente às cepas de P. falciparum 
NF54 sensível à CLQ e K1 resistente à CLQ dos análogos da FAQ (9a, 9b, 9c 
e 9e), da cloroquina (CQ), da amodiaquina (AQ), o Índice de Resistência (IR) 
calculado, os valores de CC50 (μM) obtidos para teste de citotoxicidade em 
Células de Ovário de Hamster (CHO) e o Índice de Seletividade (IS) calculado 
........................................................................................................................ 155 
Tabela 7. Valores de CI50 (μM) obtidos para teste de inibição da formação da β-
hematina ........................................................................................................ 157 
 
 
 
 
LISTA DE QUADROS 
 
Quadro 1. Exemplos de esquemas terapêuticos preconizados para o 
tratamento da malária ...................................................................................... 38 
Quadro 2. Piperazinas utilizadas para obtenção das tioureias 3 .................. 109 
Quadro 3. Piperazinas utilizadas para obtenção dos análogos da FAQ 9a-e 
........................................................................................................................ 137 
Quadro 4. Deslocamentos químicos dos derivados da FAQ 9a-e (RMN 1H) 
........................................................................................................................ 141 
Quadro 5. Deslocamentos químicos dos derivados da FAQ 9a-e (RMN 13C) 
........................................................................................................................ 142 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE SIGLA E ABREVIATURAS 
 
AM – Antimoniato de Meglumina 
AQ – Amodiaquina 
AQQI – amodiaquinaquinonaimina 
ASQI - semiquinonaimina 
BITC – Isotiocianato de benzila 
CC50 – Concentração citotóxica para 50% da população 
CCF – Cromatografia em camada fina 
CCDP – Cromatografia em camada preparativa 
CI50 – Concentração de inibidor necessária para inibir 50% de um parâmetro 
CQ - Cloroquina 
CYP 450 - enzimas do complexo enzimático hepático citocromo P450 
d – dupleto 
dd – duplo dupleto 
DMSO – dimetilsulfóxido 
DMSO-d6 – dimetilsulfóxido deuterado 
DNDi – Drugs for Neglected Diseases initiative 
DSC – Calorimetria exploratória diferencial 
DTN – Doença Tropical Negligenciada 
EMAR – Espectrometria de Massas de Alta Resolução 
FAQ – Fluoroamodiaquina 
HEPES – Ácido (4-(2-hidroxietil)-1-piperazinoetanossulfônico) 
HIV – Vírus da Imunodeficiência Humana 
HM – Hibridação Molecular 
IV – infravermelho 
J – constante de acoplamento 
m – multipleto 
MMV – Medicines for Malaria Venture 
MS – Ministério da Saúde 
LC – Leishmaniose Cutânea 
LM - Leishmaniose Mucosa 
LV – Leishmaniose Visceral 
OMS – Organização Mundial da Saúde 
P&D – Pesquisa e Desenvolvimento 
PEITC – Isotiocianato de feniletila 
p.f. – ponto de fusão 
PfCRT - P. falciparum chloroquine resistance transporter gene 
PfMDR1 - P. falciparum resistance transporter 1 
PITC – Isotiocianato de fenetila 
q – quarteto 
qt - quinteto 
RMN de 13C – ressonância magnética nuclear de 13C 
RMN de 1H – ressonância magnética nuclear de 1H 
s – simpleto 
SAR – Relação Estrutura-Atividade 
sl – sinal largo 
sx - sexteto 
SUS – Sistema Único de Saúde 
t - tripleto 
t.a. – temperatura ambiente 
TMPITC – Isotiocianato de trimetóxifenila 
TMS – trimetilsilano 
VD – Vacúolo Digestivo 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 18 
1.1 LEISHMANIOSE ........................................................................................ 19 
1.1.1 Vetores ................................................................................................... 20 
1.1.2 Epidemiologia ....................................................................................... 20 
1.1.3 Ciclo Biológico ...................................................................................... 22 
1.1.4 Manifestações Clínicas ........................................................................ 23 
1.1.4.1 Leishmaniose Cutânea ........................................................................ 24 
1.1.4.2 Leishmaniose Mucosa ......................................................................... 25 
1.1.4.3 Leishmaniose Visceral ......................................................................... 25 
1.1.5 Tratamento ............................................................................................ 26 
1.2 MALÁRIA ................................................................................................... 30 
1.2.1 Epidemiologia ....................................................................................... 31 
1.2.2 Ciclo Biológico ...................................................................................... 32 
1.2.3 Manifestações Clínicas ........................................................................ 34 
1.2.4 Tratamento ............................................................................................ 35 
1.2.4.1 Derivados Quinolínicos ........................................................................ 39 
1.2.4.1.1 Mecanismo de Ação dos Derivados Quinolínicos ............................. 41 
1.2.4.1.2 Resistência do plasmódio aos derivados quinolínicos ...................... 43 
1.2.4.1.3 Metabolismo e Toxicidade dos derivados quinolínicos ..................... 44 
1.3 NOVAS ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS .............................................. 45 
1.3.1 Compostos com Potencial Atividade Leishmanicida ........................ 45 
1.3.1.1 Tioureias .............................................................................................. 47 
1.3.2 Compostos com Potencial Atividade Antimalárica ........................... 49 
1.3.2.1 Análogos da Amodiaquina ................................................................... 50 
1.3.2.2 Derivados da Fluoroamodiaquina ........................................................ 52 
1.3.2.3 Tioureias .............................................................................................. 54 
2 OBJETIVOS ................................................................................................. 55 
2.1 OBJETIVO GERAL .................................................................................... 55 
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...................................................................... 55 
3 MATERIAL E MÉTODOS .............................................................................56 
3.1 OBTENÇÃO DAS TIOUREIAS .................................................................. 57 
3.1.1 Procedimento representativo geral para obtenção das tioureias .... 57 
3.2 Obtenção dos novos análogos da FAQ ................................................. 90 
3.3. AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE LEISHMANICIDA DOS DERIVADOS 
SINTETIZADOS ............................................................................................... 99 
3.3.1 Avaliação da atividade antipromastigota dos derivados sintetizados 
.......................................................................................................................... 99 
3.3.2 Avaliação da toxicidade in vitro dos derivados em macrófagos ..... 99 
3.4. AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTIMALÁRICA, CITOTOXICIDADE E 
AVALIAÇÃO DA INIBIÇÃO DA FORMAÇÃO DA β-HEMATINA DOS 
DERIVADOS SINTETIZADOS ....................................................................... 100 
3.4.1 Avaliação in vitro contra cepas de Plasmodium falciparum sensível e 
resistente à cloroquina ................................................................................ 100 
3.4.1.1 Cultivo dos parasitas .......................................................................... 100 
3.4.1.2 Ensaio de Lactato Desidrogenase do Plasmodium falciparum (pLDH) 
........................................................................................................................ 101 
3.4.2 Ensaio de Citotoxicidade utilizando Células de Ovário de Hamster 
(CHO) (Ensaio MTT) ..................................................................................... 103 
3.4.3 Avaliação da inibição da formação da β-hematina .......................... 103 
3.4.3.1 Fração Hb .......................................................................................... 103 
3.4.3.2 Fração Heme ..................................................................................... 104 
3.4.3.3 Fração Hz .......................................................................................... 104 
3.4.3.4 Contagem celular utilizando Citometria de fluxo ................................ 104 
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................. 106 
4.1 SÍNTESE DAS TIOUREIAS PIPERAZÍNICAS (3) ................................... 107 
4.2 SÍNTESE DOS NOVOS DERIVADOS DA FAQ (9) ................................. 123 
4.3 AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE LEISHMANICIDA DOS DERIVADOS DE 
TIOUREIA E DA FAQ SINTETIZADOS ......................................................... 143 
4.4 AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ANTIMALÁRICA DOS DERIVADOS DE 
TIOUREIA E DA FAQ SINTETIZADOS ......................................................... 149 
5 CONCLUSÕES ........................................................................................... 158 
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 160 
APÊNDICE A - SEÇÃO DE ESPECTROS .................................................... 173 
 
18 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
 As doenças parasitárias ou parasitoses são doenças infecciosas 
causadas por protozoários ou metazoários. Atualmente atingem principalmente 
países subdesenvolvidos, afetando de forma negativa a qualidade de vida da 
população e o desenvolvimento econômico de muitos países (FRANÇA, 
SANTOS & FIGUEROA-VILLAR, 2008; NEVES, 2016). 
Fatores como clima, urbanização, desigualdades sociais, guerras, 
conflitos e pouco investimento no desenvolvimento de novas tecnologias que 
facilitem o diagnóstico e proporcionem um tratamento mais eficaz e seguro, são 
razões para ainda no século XXI as parasitoses serem objeto de tantos 
estudos. Entre os anos de 1990 e 2016 foi possível observar diminuições 
significativas em algumas doenças parasitárias, como por exemplo, a 
esquistossomose e a tripanossomíase africana humana, que tiveram quedas 
de 3% e 89% em suas prevalências, respectivamente. Por outro lado, a malária 
e a leishmaniose cutânea apresentaram aumentos de 15% na incidência e 
117% na prevalência, respectivamente, enquanto que a leishmaniose visceral 
apresentou queda de 75% em sua incidência. Esses dados se tornam ainda 
mais substanciais quando consideramos que a população mundial teve um 
aumento de aproximadamente 5 para 7 bilhões durante os últimos 26 anos 
(HOTEZ, 2018). 
No Brasil, a malária e a leishmaniose são ainda problemas graves de 
saúde pública, sendo responsáveis pelo comprometimento da qualidade de 
vida e morte de milhares de pessoas por ano. Atualmente somente a 
leishmaniose é considerada como uma doença negligenciada, se enquadrando 
numa subdivisão feita pela Organização Mundial da Saúde (OMS) denominada 
de Doenças Tropicais Negligenciadas (DTN), grupo no qual são agregadas 
doenças transmissíveis que predominam nas regiões tropicais e subtropicais, 
acometendo mais de um bilhão de pessoas em 149 países. A malária por sua 
vez foi retirada desse grupo, pois vinha recebendo incentivos maiores em 
pesquisa e desenvolvimento (P&D) quando comparada às outras (WHO, 2018). 
A severidade dessas duas doenças está associada às condições 
socioeconômicas, políticas e ambientais (WHO, 2010). Somado a isso, as 
insuficientes terapias de alto custo ainda dependem da resposta imune do 
19 
 
hospedeiro e da suscetibilidade do agente causador, o qual já apresenta 
resistência a muitos fármacos de escolha (VOULDOUKIS et al., 2006; ZAULI-
NASCIMENTO et al., 2010, WHITE, 2008; CUNICO et al., 2008). Sendo assim, 
o desenvolvimento de novas alternativas terapêuticas e novas formulações 
farmacêuticas visando à vetorização de fármacos se faz necessário. 
Programas de incentivo ao desenvolvimento de novas alternativas 
terapêuticas vêm sendo criados para contribuir com a P&D, como, por 
exemplo, o programa Drugs for Neglected Diseases (DNDi) e o Medicines for 
Malaria Venture (MMV), que buscam novas alternativas terapêuticas seguras, 
eficazes e acessíveis para milhões de pessoas acometidas por essas doenças 
(DNDi, 2018; MMV, 2018). 
 
1.1. LEISHMANIOSE 
 
A leishmaniose é considerada um conjunto de doenças causadas por 
protozoários unicelulares e digenéticos (heteróxenos) do gênero Leishmania, 
pertencentes à ordem Kinetoplastida e à família Trypanossomatidae. Cerca de 
20 diferentes espécies de Leishmania podem ser transmitidas a hospedeiros 
mamíferos através da picada de insetos hematófagos infectados conhecidos 
como flebotomíneos. A multiplicidade de agentes etiológicos, vetores, 
reservatórios e fatores ambientais proporcionam à doença características 
individuais em cada caso (ALTAMIRANO et al., 2003; RAMOS, et al., 2011; 
REY, 2008). É considerada também uma antropozoonose, pois o homem, 
quando entra no ciclo de transmissão do parasita, é hospedeiro acidental 
(BRASIL, 2006). 
Esses parasitas podem ser encontrados nas formas promastigota ou 
paramastigota flageladas livres ou aderidas ao trato digestório de hospedeiros 
invertebrados. A forma infectante para os hospedeiros invertebrados é a 
promastigota metacíclica, que possui flagelos com duas vezes o comprimento 
de seu corpo, permitindo uma alta mobilidade. Além disso, existe ainda a forma 
amastigota que pode ser encontrada no interior das células fagocitárias ou 
livres, possuindo também flagelo, porém sem exteriorização para além do 
corpo do parasita (NEVES, 2016). 
20 
 
O gênero Leishmania pode ser dividido em dois subgêneros, o 
Leishmania e o Viannia e sua diferenciação se dá através do seu 
desenvolvimento no vetor (WHO, 2010). Com isso, acredita-se que 
aproximadamente 14 espécies de Leishmania pertencentes a um desses dois 
subgêneros estão relacionadas à potencialidade de causar a doença 
(SILVEIRA et al., 2009). Dentre as espécies encontradas no Brasil temos a 
Leishmania (Leishmania) amazonensis e a Leishmania (Viannia) braziliensis. 
Na Europa, África e Ásia prevalece a Leishmania major (FELIZARDO et al., 
2007). 
 
1.1.1 Vetores 
 
Osvetores responsáveis pela veiculação da leishmaniose são insetos 
denominados flebotomíneos, pertencentes à ordem Díptera, família 
Psychodidae, subfamília Phlebotomine, gênero Lutzomyia, conhecidos 
popularmente como mosquito-palha, birigui, entre outros (BRASIL, 2007; 
NEVES, 2016). O desenvolvimento do vetor desde o ovo até o inseto ocorre 
em um período de aproximadamente 30 a 40 dias. As fêmeas são hematófagas 
obrigatórias, com atividade crepuscular e noturna, podendo realizar o repasto 
sanguíneo em várias espécies de animais vertebrados, inclusive em humanos, 
tendo um ciclo de vida de aproximadamente 20 dias (BRASIL, 2006). 
As principais espécies relacionadas à transmissão da leishmaniose 
Visceral (LV) são a Lutzomyia longipalpis e Lutzomyia cruzi, enquanto que as 
responsáveis pela transmissão da leishmaniose cutânea (LC) são L. 
flaviscutellata (vetor da L. amazonensis), L. whitmani, L. migonei, L. pessoai, L. 
intermedia, L. carrerai, Psychodopysgus wellcomei (vetores da L. braziliensis) e 
a L. umbratilis, L. anduzei, L. whitmani (vetores da L. guyanensis) (BRASIL, 
2007). 
O vetor mais comumente encontrado nas regiões domiciliares e em 
abrigos de animais domésticos de áreas endêmicas é a L. intermedia, sendo 
rara sua presença no ambiente florestal (BRASIL, 2000). 
 
1.1.2 Epidemiologia 
 
21 
 
Aproximadamente 12 a 15 milhões de indivíduos estão infectados com a 
doença, com 2,3 milhões de novos casos por ano em todo mundo (RAMOS et 
al., 2011). Segundo uma estimativa da WHO, 20.000 a 30.000 mortes 
ocorrerão em razão da leishmaniose no mundo, ainda que apenas uma 
pequena fração de indivíduos infectados venha a desenvolvê-la (WHO, 2016). 
A leishmaniose é encontrada em quatro continentes, afetando 98 países, onde 
72 são considerados países em desenvolvimento e, destes, 13 estão entre os 
menos desenvolvidos do mundo. Mais de 90% dos casos registrados 
encontram-se em países da África, Ásia e América Latina (DNDi, 2018; 
PAOLUCCI et al. 2012). 
Sendo assim, pode-se dizer que a leishmaniose apresenta uma ampla 
distribuição geográfica, atingindo diversas pessoas em áreas de risco pelo 
mundo, o que torna claro a endemicidade desta patologia (Figura 1). 
 
 
Figura 1. Distribuição geográfica da leishmaniose (Adaptado de DNDi, 2016). 
 
No Brasil, a leishmaniose está presente em todos os estados, 
apresentando peculiaridades quanto aos vetores e espécies de Leishmania, 
devido às diferentes distribuições regionais e seus diversos determinantes 
ambientais, socioeconômicos e políticos (BRASIL, 2007). De acordo com o 
DNDi, o Brasil se encontra entre os 7 países mais afetados pela doença, se 
enquadrando juntamente com Bangladesh, Índia, Etiópia, Quênia, Nepal e 
Sudão, os quais juntos representam apresentando mais de 90% dos novos 
casos (DNDi, 2018). Com um aumento expressivo no número de casos nas 
últimas décadas, a doença constitui alvo de preocupação, não só pelas suas 
manifestações clínicas, mas também pelo reflexo que a mesma impõe no 
22 
 
campo social e econômico, já que, na maioria dos casos, pode ser considerada 
uma doença ocupacional, atingindo indivíduos em idade laboral (GIL et al., 
2007; NAME & SAMPAIO, 2001; GONTIJO & CARVALHO, 2003). 
 
1.1.3 Ciclo Biológico 
 
Quando a fêmea do flebotomíneo realiza o repasto sanguíneo no 
hospedeiro vertebrado infectado, acaba por ingerir macrófagos parasitados 
com as formas amastigotas do parasita. Estes, ao atingirem o tubo digestório 
do vetor, rompem, liberando as formas amastigotas que prontamente iniciam a 
diferenciação para a forma replicativa no hospedeiro invertebrado: a 
promastigota (Figura 2). As formas promastigotas diferenciam-se e colonizam 
o esôfago e faringe do vetor, permanecendo aderidas ao epitélio pelo flagelo. 
Neste local, dão origem a promastigotas metacíclicas, formas infectantes do 
parasita. Este ciclo se completa em aproximadamente 72 horas (BRASIL, 2006; 
REY, 2008). 
A infecção de hospedeiros vertebrados inicia-se quando a fêmea do 
flebotomíneo realiza o repasto sanguíneo, inoculando, juntamente com a sua 
saliva, as formas promastigotas metacíclicas no tecido subcutâneo do 
indivíduo. Essas formas parasitárias são então fagocitadas pelas células do 
sistema fagocitário mononuclear (macrófagos, monócitos, neutrófilos e células 
dendríticas), onde, no interior do vacúolo parasitóforo, diferenciam-se em 
amastigotas. Os parasitas intracelulares se multiplicam intensamente, 
ocasionando o rompimento das células infectadas. Essas formas parasitárias 
liberadas são fagocitadas por outras células, promovendo um ciclo contínuo 
(BRASIL, 2006; REY, 2008). 
23 
 
 
 
Figura 2. Ciclo Biológico da leishmaniose (Adaptado de CDC, 2015). 
 
1.1.4 Manifestações Clínicas 
 
As leishmanioses podem ser transmitidas por aproximadamente 30 
diferentes tipos de vetores flebotomíneos e mais de 20 espécies de parasitas, 
relacionadas ao homem (CHAPPUIS et al., 2007). As principais formas clínicas 
são determinadas pela espécie infectante, podendo ser: leishmaniose visceral 
(LV), leishmaniose cutânea (LC) e leishmaniose mucosa (LM) (OMS, 2010). 
A forma clínica manifestada no indivíduo infectado é determinada pelo 
tropismo da espécie envolvida, podendo ser viscerotropismo, dermotropismo 
ou mucotropismo. Além disso, o sistema imune do hospedeiro possui também 
um papel importante na manifestação clínica da leishmaniose, de modo que 
vários fatores podem afetar o processo durante a infecção por Leishmania, 
como por exemplo: a presença de citocinas no início da diferenciação celular, a 
influência de coestimuladores, ou mecanismos de sinalização diferenciados. 
Isso explica o aparecimento da forma mucosa da doença anos após o 
tratamento do episódio inicial de LC (NEVES, 2016). 
 
 
 
24 
 
1.1.4.1 Leishmaniose cutânea 
 
A LC acomete pele e mucosas, afetando primeiramente outros animais 
que não o homem, o qual é envolvido secundariamente (BRASIL, 2007). 
Apesar de não letal, a doença induz danos aos tecidos acometidos, 
comprometendo a vida social e a capacidade laborativa dos pacientes 
(BRASIL, 2006). 
O sintoma principal associado é a úlcera indolor localizada em áreas 
expostas da pele, com formato arredondado ou ovalado, podendo se 
manifestar de forma localizada, disseminada ou cutânea difusa (BRASIL, 
2006). Apresenta base eritematosa, infiltrada e de consistência firme; bordas 
bem delimitadas e elevadas, fundo avermelhado e com granulações grosseiras. 
Infecções bacterianas associadas podem ser observadas, além da presença de 
eczemas na pele que rodeia a úlcera. Com características similares a outras 
patologias do tegumento, como hanseníase, infecções fúngicas, úlceras 
micobacterianas, entre outras, um diagnóstico diferencial se faz necessário, 
possibilitando uma correta conduta farmacológica e assim tratamento mais 
eficaz e seguro (WHO, 2006). 
Na leishmaniose localizada tem-se uma moderada hipersensibilidade 
gerada por células T, iniciando com uma pápula no local da inoculação, a qual 
cresce no decorrer de uma semana e atinge um tamanho final de 5 cm. Em 
casos de múltiplas lesões, as mesmas estão relacionadas a múltiplas 
inoculações pelo vetor (até 20 lesões), diferente da forma disseminada da 
doença (CAMARA et al., 2011; SILVEIRA et al., 2009; BRASIL, 2007). 
A forma disseminada é considerada rara, ocorrendo em apenas 2% dos 
casos. É caracterizada por lesões múltiplas papulares e de aparência 
acneiforme, envolvendo com freqüência a face e o tronco. Após o 
aparecimento da lesão primária surgem lesões ulceradas e pequenas, cuja 
disseminação pelo corpo se dá de forma hematogênica ou linfática, causando 
lesões distantes do local da picada (BRASIL, 2007). 
A forma cutânea difusa é também uma forma clínica rara, porém grave, 
pois está relacionada a pacientes com deficiências específicas na resposta 
imune celular ao parasita, evoluindo de forma lentacom formação de placas e 
múltiplos nódulos não ulcerados que recobrem grandes extensões cutâneas. 
25 
 
Enquanto que as formas localizadas e disseminadas respondem bem ao 
tratamento farmacológico, a forma difusa possui resposta pobre ou inexistente 
à terapêutica tradicional (CAMARA et al., 2011; SILVEIRA et al., 2009). 
 
1.1.4.2 Leishmaniose mucosa 
 
A LM pode ser secundária à LC, de maneira metastática por 
disseminação hematogênica ou linfática, promovendo extensa destruição das 
cavidades oronasal e faríngea. Nesses casos, a doença pode ser denominada 
de LM tardia. Isso ocorre devido à evolução crônica sem tratamento ou com 
tratamento inadequado da LC. Podem ainda aparecer de forma concomitante, 
denominada forma muco-cutânea da doença. Em geral as lesões apresentam-
se indolores, iniciando no septo nasal anterior cartilaginoso, próximo ao intróito 
nasal. Por ser de fácil visualização, compromete as relações sociais e o bem-
estar dos indivíduos acometidos (BRASIL, 2007). 
Com isso, a LM pode se apresentar em sua forma mucosa tardia 
(secundária à LC), forma mucosa indeterminada (quando se apresenta 
clinicamente isolada, sem evidência de LC prévia), forma concomitante (muco-
cutânea) ou primária (picada do vetor diretamente na mucosa ou semimucosa). 
De maneira geral, a LM está relacionada com as espécies L. braziliensis e L. 
guyanensis, encontradas na América, porém já existem casos registrados na 
África, Ásia e Europa, relacionados às espécies L. donovani, L. major e L. 
infantum, principalmente em pacientes imunodeprimidos (DESJEUX et al., 
2004). 
 
1.1.4.3 Leishmaniose visceral 
 
A LV, conhecida também como Calazar, é uma doença sistêmica e fatal 
se não tratada. O período de incubação pode durar de 10 dias a 24 meses e a 
manifestação dos sintomas da doença está associada a características 
imunológicas específicas de cada indivíduo. A doença é mais freqüente em 
crianças menores de 10 anos, o que é justificado pela imaturidade imunológica 
deste grupo populacional, sendo agravada pelo quadro de desnutrição comum 
nas áreas endêmicas. Em adultos, houve um aumento na incidência da 
26 
 
doença, podendo ser associado ao aumento do número de infecções pelo vírus 
da imunodeficiência humana (HIV) e ao aumento do uso de imunossupressores 
para transplantes e quimioterapia (BRASIL, 2006). 
A LV pode ser dividida em três períodos: inicial, que apresenta como 
sintomas a febre, palidez cutâneo-mucosa e hepatoesplenomegalia; de estado, 
que é caracterizada pela ocorrência de febre irregular, emagrecimento 
progressivo, palidez cutâneo-mucosa e aumento da hepatoesplenomegalia, 
permanecendo com esse quadro clínico em torno de 2 meses; e final, que 
apresenta febre contínua e intenso comprometimento do estado geral, com 
quadro de desnutrição, edema dos membros inferiores, hemorragias, icterícia e 
ascite. Com frequência são relatados quadros de complicação de natureza 
infecciosa microbiana, os quais, se não tratados, podem evoluir para um 
quadro séptico com evolução fatal. As principais espécies envolvidas com a LV 
são: L. donovani e L. infantum (BRASIL, 2006). 
 
1.1.5 Tratamento 
 
O primeiro grupo de fármacos a serem usados para o tratamento da 
leishmaniose tegumentar (que abrange a LC e LM) foram os compostos 
antimoniais trivalentes, os quais foram utilizados pela primeira vez no Brasil em 
1913, por Gaspar Vianna. Na década de 40 surgiram os derivados 
pentavalentes (Sb+5), os quais são atualmente a primeira escolha para o 
tratamento da doença. No Brasil, está disponível para compra, além de ser 
distribuído pelo Ministério da Saúde e estar presente na Relação Nacional de 
Medicamentos Essenciais (RENAME), apenas o antimoniato de meglumina 
(AM) (N-metilglucamina, Glucantime®) (Figura 3), que deve ser administrado 
por via intravenosa ou intramuscular (BRASIL, 2006; CROFT et al., 2002). 
 
27 
 
 
Figura 3. Estrutura molecular dos principais fármacos utilizados no tratamento da 
leishmaniose. 
 
Esses fármacos são considerados leishmanicidas, pois interferem no 
metabolismo bioenergético das formas amastigotas de Leishmania, inibindo 
mecanismo de glicólise e oxidação de ácidos graxos (Figura 4). Casos de 
resistência dos parasitas a esses fármacos já são relatados, o que determina a 
necessidade do aumento de doses e prolongamento do tratamento para 
alcance da efetividade terapêutica. Isso por sua vez acaba gerando efeitos 
tóxicos indesejados no indivíduo infectado, como complicações 
cardiovasculares, mialgias e artralgias, cefaleia, náuseas, vômitos, dor 
abdominal, dor e edema no local da aplicação, astenia, febre, exantema e 
urticária (BRASIL, 2006; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013). 
28 
 
 
Figura 4. Mecanismo de ação e de resistência dos antimoniais pentavalentes em 
formas amastigotas de Leishmania. Antimônios pentavalentes (SbV) entram tanto nos 
macrófagos como nas formas amastigotas internalizadas no fagolisossomo. A entrada de SbV 
em amastigotas é feita por intermédio de um transportador desconhecido, enquanto que a 
entrada de SbIII ocorre por meio do transportador aquagliceroporina AQP1. No interior do 
parasita o SbV pode ser convertido em SbIII por tióis, ou possivelmente pelas redutases ACR2 
ou TDR1. O SbIII interage provavelmente com alguns alvos celulares, mas também pode 
formar conjugados com vários tióis. O conjugado metal-tiol gerado pode ser seqüestrado em 
uma organela pelo transportador MRPA ou expulso para fora da célula por um sistema de 
efluxo (Adaptado de Ouellette et al., 2004). 
 
Outros fármacos já vêm sendo utilizados como alternativa aos 
antimoniais, como, por exemplo: anfotericina B, miltefosina, pentamidina, entre 
outros (Figura 3). A anfotericina B possui excelente atividade leishmanicida 
frente à promastigotas e amastigotas, sendo considerada de segunda escolha 
aos antimoniais pentavalentes e primeira escolha em caso de pacientes 
grávidas. A anfotericina B interage com os esteróis substituídos na posição 24 
(ergosterol e episterol), comuns na membrana dos parasitas (Figura 5). Os 
efeitos adversos mais comumente reportados são distúrbios renais, 
hipocalemia, disfunção hepática e depressão de medula óssea (MINISTÉRIO 
29 
 
DA SAÚDE, 2013). Devido a esses efeitos adversos, novas formulações foram 
desenvolvidas utilizando sistemas lipídicos capazes de formar micelas que 
seriam capturadas na circulação pelos fagócitos mononucleares, liberando o 
fármaco no interior das células infectadas, sendo um grande avanço no 
tratamento da leishmaniose, principalmente para a forma visceral da doença. 
Entretanto, o custo elevado do tratamento completo impossibilita seu uso nos 
serviços públicos de saúde, sendo indicado apenas para os casos graves de 
LV que desenvolverem toxicidade cardíaca ou insuficiência renal com uso dos 
antimoniais (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013; LUCIA, 2010). 
As diamidinas aromáticas (pentamidina, isotionato de pentamidina e 
mesilato de pentamidina), também administradas por via intravenosa, apesar 
de apresentarem eficácia inferior comparada aos fármacos de primeira escolha 
e muitos efeitos adversos, vêm sendo utilizadas como segunda escolha para o 
tratamento da leishmaniose cutânea (BRASIL, 2007, SUNDAR et al., 2010). 
Ainda não possuem um mecanismo de ação definido, mas estudos indicam que 
essa classe se acumula na mitocôndria afetando a respiração celular. Outros 
estudos por sua vez indicam que a miltefosina atua impedindo a biossíntese da 
parede celular de em espécies de L. donovani, através da diminuição da 
concentração de fosfatidilcolina e aumento de fosfatidiletanolamina (Figura 5) 
(OUELLETTE et al., 2004, PINTO-MARTINEZ et al., 2018). 
O único fármaco oral utilizado no tratamento de todos os tipos de 
leishmaniose é a miltefosina, que atua sobre a membrana celular do parasita, 
alterando sua composição lipídica, permeabilidade e fluidez, induzindo à mortepor apoptose (Figura 5). Apesar disso, o mesmo apresenta variável perfil de 
atividade contra diferentes espécies de Leishmania spp., além de elevado 
tempo de meia-vida, o que acaba por gerar um acúmulo da Miltefosina no 
organismo durante o tratamento contribuindo para o desenvolvimento de 
efeitos tóxicos (náusea, vômitos, diarreia, teratogenicidade, entre outros) e 
resistência por parte do parasita, visto que o fármaco leva um tempo maior 
para ser eliminado do organismo, permanecendo em contato com o parasita 
por mais tempo (COSTA-FILHO et al., 2008; TANABE, 2011; DORLO, et al., 
2012). 
 
 
30 
 
 
Figura 5. Mecanismo de ação e resistência da miltefosina, pentamidina e anfotericina 
B. (A) A miltefosina é absorvida por uma ATPase (oval) e as mutações pontuais neste 
transportador levam a uma diminuição no acúmulo do fármaco e à resistência. (B) A 
pentamidina é absorvida por um transportador (triângulo) não identificado, e se acumula 
somente na mitocôndria de células sensíveis. Pode ser externalizada por um transportador 
ABC (círculo). (C) A anfotericina B interage com esteróis a base de ergostano presente nas 
membranas (Adaptado de Ouellette et al., 2004). 
 
Dessa forma, casos de resistência aos fármacos utilizados para o 
tratamento da leishmaniose, a toxicidade gerada pelo tratamento prolongado e 
o alto custo associado ao tratamento completo levam à busca por novas 
moléculas candidatas a fármacos (SUNDAR & SINGH, 2018). 
 
1.2 MALÁRIA 
 
A malária humana é uma doença tropical parasitária, cujos agentes 
etiológicos são protozoários do gênero Plasmodium, pertencentes ao filo 
Apicomplexa e família Plasmodiidae. As cinco espécies capazes de infectar o 
homem são: P. falciparum, P. vivax, P. malariae e P. ovale (2 espécies). 
Infecções pelo P. knowlesi (espécie que infecta primatas) já vêm sendo 
reportadas em regiões do leste asiático e da Ilha de Bornéu. O vetor biológico 
responsável pela transmissão aos hospedeiros vertebrados é a fêmea 
31 
 
hematófaga de insetos do gênero Anopheles. Dentre as espécies que infectam 
os seres humanos, o P. falciparum é a de maior importância clínica, por ser 
responsável pela malária severa, sendo muita das vezes fatal (REY, 2008; 
NEVES, 2016; FRANÇA, SANTOS & FIGUEROA-VILLAR, 2008, MMV, 2018). 
 
1.2.1 Epidemiologia 
 
Entre os anos de 2001 e 2012, a malária foi responsável por 
aproximadamente três milhões de mortes em todo o mundo (WHO, 2013). 
Crianças menores de 5 anos de idade são as mais afetadas em regiões 
endêmicas, porém medidas preventivas vêm sendo adotadas ainda na 
gravidez, promovendo uma diminuição significativa no número de mortes de 
crianças, passando de 440.000 em 2010 para 285.000 em 2016 (WHO, 2016). 
Ainda no ano de 2016, foram confirmados 216 milhões de casos de malária e 
445 mil óbitos, número semelhante ao obtido em 2015 (446.000 óbitos). A 
malária aflige 103 países no mundo, distribuídos pela África subsaariana, 
sudeste da Ásia e América do Sul (WHO, 2016) (Figura 6). 
 
 
Figura 6. Mudanças na incidência de malária pelo mundo entre os anos de 2000 – 
2015 (World Malaria Report, 2015). 
32 
 
 
No Brasil, em 2016, foram registrados aproximadamente 125 mil casos, 
sendo a espécie P. vivax responsável por aproximadamente 89% e o P. 
falciparum por 11% dos casos notificados. A região Amazônica é considerada 
endêmica para malária, onde os estados que a constituem são: Acre, Amapá, 
Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins 
(Figura 7). A maioria dos casos ocorre em áreas rurais, mas há registros da 
doença também em áreas urbanas (WHO, 2016). 
 
 
Figura 7. Casos confirmados de malária por Plasmodium vivax e Plasmodium 
falciparum no Brasil em 2016 (Adaptado de http://www.who.int/malaria/publications/country-
profiles/profile_bra_en.pdf?ua=1). 
 
1.2.2 Ciclo Biológico 
 
A malária humana inicia-se quando o anofelino infectado realiza a 
hematofagia no indivíduo saudável, inoculando as formas infectantes 
(esporozoítos) que estavam acumuladas em suas glândulas salivares (VALE, 
MOREIRA & GOMES, 2005; PRUDÊNCIO et al., 2006; NEVES, 2016). Os 
esporozoítos inoculados no tecido subcutâneo atingem os capilares 
sanguíneos, alcançam o fígado e invadem as células hepáticas, onde realizam 
o ciclo pré-eritrocítico. Nos hepatócitos, os esporozoítos se diferenciam em 
trofozoítos pré-eritrocíticos, que se multiplicam por reprodução assexuada 
(esquizogonia), dando origem aos esquizontes teciduais e posteriormente a 
milhares de merozoítos. Os merozoítos então rompem os hepatócitos e se 
direcionam às hemácias, em seguida as invadem, iniciando assim o ciclo 
eritrocítico. Alguns esporozoítos ficam em estado de latência no interior do 
http://www.who.int/malaria/publications/country-profiles/profile_bra_en.pdf?ua=1
http://www.who.int/malaria/publications/country-profiles/profile_bra_en.pdf?ua=1
33 
 
hepatócito, ao invés de se multiplicar rapidamente. Com isso, são denominados 
hipnozoítos, sendo responsáveis pela reincidência tardia da doença (REY, 
2008; NEVES, 2016) (Figura 8). 
No interior do eritrócito, os merozoítos se desenvolvem para as formas 
multinucleadas trofozoíto e esquizonte, que possuem um intenso ciclo 
metabólico. Após intensa reprodução, os esquizontes maduros rompem a 
membrana da hemácia liberando, na corrente sanguínea, numerosos 
merozoítos, encerrando o ciclo eritrocítico. Essas formas podem ainda invadir 
outros eritrócitos, completando, desta forma, o ciclo assexuado (CUNICO et al., 
2008; NEVES, 2016) (Figura 8). 
À medida que a doença evolui, alguns merozoítos se diferenciam em 
estágios sexuados (gametócitos) no interior das hemácias, e com isso 
contaminam outros anofelinos. Estes, por sua vez, ao realizarem a hematofagia 
em pessoas infectadas, ingerem formas sanguíneas do parasita, como os 
gametócitos, que darão origem ao ciclo sexuado. Este se inicia no intestino 
médio do vetor, onde os gametócitos se transformam em macrogameta 
(feminino) e microgameta (masculino), e consequentemente tem-se a formação 
do zigoto. Após intensa replicação, ocorre a ruptura do mesmo e os 
esporozoítos são liberados, atingindo as glândulas salivares do inseto, de onde 
serão injetados durante o repasto sanguíneo infectante. Desta forma, garantem 
a continuidade do ciclo de contaminação e que a espécie se perpetue (REY, 
2008; NEVES, 2016; MENÁRD, 2005) (Figura 8). 
 
34 
 
 
Figura 8. Ciclo de vida do Plasmodium no hospedeiro humano (Adaptado de 
http://www.cdc.gov/malaria/about/biology/). 
 
O ciclo eritrocítico ocorre sucessivas vezes, logo, essa constância é a 
responsável pelas crises febris e pela evolução da doença, sendo este 
processo um reflexo da resposta imunológica do paciente frente à infecção. 
Dependendo da espécie de plasmódio e da carga parasitária presente no 
indivíduo, a manifestação clínica da doença se dá de maneira diversa, sendo 
que quanto menor o intervalo da crise febril, maior a gravidade da doença 
(NEVES, 2016). 
 
1.2.3 Manifestações Clínicas 
 
Os sintomas gerais apresentados inicialmente são cefaleia, mialgia, 
cansaço, náusea, vômito, diarreia e febre alta intermitente e irregular, 
acompanhada de calafrio e sudorese (NA-BANGCHANG & KARBWANG, 2009, 
NEVES, 2016), sintomas esses muito comuns em outras infecções, o que 
acaba por dificultar o diagnóstico clínico seguro. O ataque paroxístico agudo 
(acesso malárico), coincidente com a ruptura das hemácias ao final da 
esquizogonia, é geralmente acompanhado de calafrio, sudorese e febre. Após 
esse período incial a febre assume um caráter intermitente relacionado 
http://www.cdc.gov/malaria/about/biology/
35 
 
diretamente com o tempo de ruptura das hemácias envolvidas no ciclo 
biológico. Dessa forma, a periodicidade dos sintomas está intimamente 
relacionada com a duração dos ciclos eritrocíticos de cada espécie de 
plasmódio (48 horas para P. falciparum,P. vivax e P. ovale, e 72 horas para P. 
malarie) (NEVES, 2016). 
Em infecções por P. falciparum, mais conhecida como malária grave ou 
complicada, a doença pode evoluir para uma forma mais nociva, apresentando 
manifestações como malária cerebral, acidose metabólica, anemia grave, 
hemoglobinúria, hipoglicemia, icterícia, insuficiência renal e edema pulmonar 
agudo, podendo até mesmo culminar com o óbito do paciente (MILLER et al., 
2002, NEVES, 2016). 
 
1.2.4 Tratamento 
 
Atualmente, a quimioterapia antimalárica é baseada em fármacos 
sintéticos ou naturais, os quais são divididos em: esquizonticidas teciduais, que 
atuam sobre o ciclo esquizogônico hepático; os eritrocíticos, que atuam nas 
formas presentes nas hemácias; os fármacos gametócitos que combatem as 
formas sexuadas no indivíduo infectado; e, por fim, os fármacos esporonticidas, 
que são eficazes contra as formas esporozoítas. Para o tratamento da malária, 
devem ser levados em conta fatores como: gênero infectante, idade e peso do 
paciente, história de infecção anterior, condições associadas como a gravidez e 
a carga parasitária presente no indivíduo (Figura 9) (FRANÇA, SANTOS & 
FIGUEROA-VILLAR, 2008; REY, 2008). 
 
36 
 
 
Figura 9. Perfil de ação dos principais fármacos utilizados para o tratamento da malária 
(Adaptado de Kumar et al., 2018). 
 
Os fármacos utilizados para o tratamento da malária podem ser divididos 
em três grupos de acordo com a sua estrutura química: os compostos aril- 
aminoálcoois, que compreendem a quinina, quinidina, halofantrina, 
lumafantrina, cloroquina, amodiaquina, mefloquina, cicloquina, entre outros; os 
antifolatos, a exemplo do proguanil, pirimetamina, trimetropim, entre outros; e 
compostos de artemisinina (Figura 10) (KUMAR et al., 2018). 
 
37 
 
Figura 10. Alguns fármacos antimaláricos disponíveis comercialmente. 
 
Devido à complexidade da doença e suas manifestações clínicas, 
geralmente são utilizadas terapias combinadas. No Brasil, o Ministério da 
Saúde (MS), por intermédio da Funasa, editou em 2001 o Manual de 
Terapêutica da malária, contendo dez tabelas com esquemas terapêuticos 
padronizados de acordo com a faixa etária do paciente (Ministério da Saúde, 
2006). De uma maneira geral, os mais utilizados no Brasil são: o esquema ACT 
(terapia combinada à base de artemisinina), cloroquina, primaquina ou a 
quinina associada a antibacterianos (como por exemplo, a clindamicina ou 
38 
 
doxicilina) (Quadro 1) (BRASIL, 2010; WHO, 2015). Através da Política 
Nacional de Tratamento da malária e do Guia Prático de tratamento da malária, 
os profissionais da saúde são orientados quanto à terapêutica, sendo os 
medicamentos antimaláricos utilizados em todo o território nacional distribuídos 
gratuitamente em unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) (Ministério da 
Saúde, 2010). 
 
Quadro 1. Exemplos de esquemas terapêuticos preconizados para o tratamento da 
malária. 
Exemplos Esquemas Terapêuticos de Primeira 
escolha preconizados pelo MS 
Espécie(s) envolvida(s) na(s) 
infeccção(ões) 
Cloroquina + Primaquina P. vivax ou P. malarie 
Artemeter + Lumefantrina + Primaquina 
ou 
Artesunato + Mefloquina + Primaquina 
P. falciparum 
Artemeter + Lumefantrina + Primaquina 
ou 
Artesunato + Mefloquina + Primaquina 
Mista 
 
As condutas terapêuticas preconizadas têm um tempo de tratamento 
muito prolongado, o que acaba culminando na não aderência ao tratamento e 
consequente recrudescência da doença. Somada a isso, a resistência 
desenvolvida pelo parasita e a toxicidade gerada pelos fármacos dificulta a 
erradicação da malária. Todos esses fatores se agravam em áreas endêmicas, 
onde esses mesmos medicamentos são utilizados como quimioprofilaxia para a 
malária (NEVES, 2016). 
Para evitar o desenvolvimento de resistência aos principais 
medicamentos preconizados para o tratamento da doença, são utilizadas 
sempre terapias combinadas, o que dificulta mutações genéticas no parasita 
que culminem na ineficácia ao tratamento. Além disso, o uso de dois ou mais 
medicamentos permite um espectro mais amplo de ação, abrangendo mais 
espécies infectantes e atingindo as diferentes formas parasitárias de uma única 
vez. Sendo assim, a terapia combinada é mais efetiva, reduz a transmissão, 
minimiza a toxicidade gerada e previne a resistência do parasita (WHO, 2015). 
 
39 
 
1.2.4.1 Derivados Quinolínicos 
 
A casca da Cinchona sp., planta nativa da América do Sul, já era utilizada 
como tratamento para a febre pelos índios americanos. Os jesuítas então 
levaram algumas cascas dessa planta para a Europa em 1639, e somente em 
1820 os químicos franceses Pierre Joseph Pelletier e Joseph Bienaime 
Caventou identificaram o alcaloide quinina como a substância ativa contra a 
malária presente na casca da Cinchona. Através dessa descoberta, a quinina 
passou a ser o principal quimioterápico utilizado no combate à malária 
(RUSSEL, 1955; FRANÇA, SANTOS & FIGUEROA-VILLAR, 2008). 
Com o tempo, a sua alta toxicidade e desenvolvimento de cepas 
resistentes promoveram uma redução em seu uso, e então começaram a surgir 
análogos sintéticos desta substância. Como a quinina pertence à classe das 
quinolinas, a grande maioria de antimaláricos desenvolvidos posteriormente, 
foram baseados nesse núcleo quinolínico (4-aminoquinolinas e 8-
aminoquinolinas) presente na estrutura química da quinina (FRANÇA, SANTOS 
& FIGUEROA-VILLAR, 2008; VALE, MOREIRA & GOMES, 2005; NA-
BANGCHANG & KARBWANG, 2009). 
O mais antigo do grupo das 8-aminoquinolinas é a pamaquina, sintetizada 
na Alemanha na década de 1920. Posteriormente surgiu a primaquina, a qual é 
utilizada até os dias de hoje em terapias combinadas. Com o passar dos anos 
outros derivados quinolínicos foram descobertos e sintetizados, como a 
cloroquina (CQ) (1930), amodiaquina (AQ) (1940) e mefloquina (1970) (Figura 
11) (BURCKHALTER et al., 1948; O’NEILL, 1998; CUNICO et al., 2008; 
FRANÇA, SANTOS & FIGUEROA-VILLAR, 2008). 
 
40 
 
 
Figura 11. Estrutura química da quinina e de alguns derivados quinolínicos. 
 
 Além disso, o núcleo quinolínico apresenta ainda outras atividades 
biológicas, como antiviral, antibacteriana, antifúngica, anti-inflamatória e 
antitumoral (COIMBRA et al., 2011). Sitamaquina e tafenoquina, ambas 8-
aminoquinolinas, vêm sendo extensivamente testadas, devido a sua atividade 
leishmanicida (COIMBRA et al., 2016). Ademais, estudos anteriores 
demonstraram que a amodiaquina, um derivado 4-aminoquinolínico, apresenta 
boa atividade leishmanicida frente a diferentes espécies de Leishmania sp., em 
concentração micromolar (Figura 12) (COIMBRA et al., 2011; COIMBRA et al., 
2013). 
41 
 
 
Figura 12. Exemplos de derivados quinolínicos com conhecida atividade leishmanicida. 
 
1.2.4.1.1 Mecanismo de Ação dos Derivados Quinolínicos 
 
Um estudo feito em 1967, por Macomber e Sprinz, demonstrou que essa 
classe é capaz de se ligar a produtos de degradação da hemoglobina que 
surgem devido ao processo de obtenção de energia do parasita, ou seja, o 
grupamento heme (ferriprotoporfirina IX, Fe(III)FPIX). Isto ocorre, pois no ciclo 
eritrocítico, as formas merozoítas fazem intensa replicação, fazendo com que o 
parasita necessite de uma grande quantidade de nutrientes. Para obtenção 
destes, o protozoário degrada a hemoglobina humana, pois possui uma 
capacidade limitada para sintetizar aminoácidos. Essa degradação da 
hemoglobina libera o grupamento prostético heme, o qual é tóxico ao parasita 
por ser altamente reativo e eletrofílico, impedindo seu desenvolvimento e 
resultando em sua morte. Para contornar tal situação, o parasita possui um 
mecanismo de polimerização do heme em hemozoína ou β-hematina, um 
polímero cristalino, insolúvel e não reativo (Figura 13) (O’NEILL et al., 1998; 
EGAN, 2006; DE VILLIERS, MARQUES & EGAN, 2008). 
42 
 
 
N
N N
N
Fe
HO OOHO
 
Figura 13. Estrutura2D do heme e estrutura 3D do heme obtida por cristalografia e 
difração de raios-X (Adaptado de YI, THOMAS & RICHTER-ADDO, 2011). 
 
Sendo assim, o mecanismo de ação dos derivados quinolínicos consiste 
no bloqueio da polimerização do grupamento heme, o qual por sua vez, livre no 
vacúolo digestivo (VD) do parasita, promove a morte celular por estresse 
oxidativo das membranas e biomoléculas do protozoário (SULLIVAN et al., 
1996). A interação entre os fármacos 4-aminoquinolínicos e o heme é do tipo 
empilhamento π-π entre o núcleo quinolina e o anel da porfirina, e apresenta 
interação por ligação hidrogênio reforçada por uma interação iônica com o 
grupo carboxilato do grupo heme. Na Figura 14, podemos observar o resultado 
obtido por docking da AQ que apresentou as interações esperadas como 
reportado anteriormente na literatura (SOUSA, 2012; SOUSA et al., 2015). Os 
modelos analisados indicaram que os complexos apresentam interações 
estéricas e eletrônicas que podem fornecer elementos importantes que devem 
ser considerados no planejamento de novos antimaláricos (O’NEILL et al., 
1998; MOREAU et al., 1985; VIPPAGUNTA et al., 1999, SOUSA et al., 2015). 
 
 
 
 
 
 
 
43 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 14. Representação gráfica da orientação de ligação da AQ na melhor solução obtida 
pela simulação de docking molecular (Fonte: SOUSA et al., 2015). As linhas em azul 
representam as ligações hidrogênio. Os átomos de carbono estão representados em cinza, 
oxigênio em vermelho, nitrogênio em azul, ferro em rosa (os átomos de hidrogênio foram 
removidos para melhor visualização). As distâncias das ligações hidrogênio e interação do tipo 
empilhamento - do anel quinolina com o anel de porfirina estão assinaladas na figura. 
 
1.2.4.1.2 Resistência do plasmódio aos derivados quinolínicos 
 
O principal mecanismo de resistência apresentado pelo parasita se dá 
por meio de mutações espontâneas e devido à pressão seletiva desencadeada 
pelo uso dos medicamentos sobre os parasitas sensíveis. Com isso, as taxas 
de cura sofrem declínio, e cada vez mais a pesquisa investe em novas terapias 
antimaláricas (WHITE, 2008; CUNICO et al., 2008; REY, 2008). 
A CQ possui caráter básico fraco, o que promove sua entrada no VD por 
difusão de gradiente de pH, uma vez que o VD do parasita apresenta pH na 
Ligação de 
Hidrogênio 
Empilhamento do 
tipo π-π entre o 
núcleo quinolina e 
o anel da porfirina 
44 
 
faixa de 5,6. Isso se dá pela atividade da proteína trocadora de Na+/H+. Assim, 
as células infectadas por parasitas resistentes à CQ apresentam um pH 
citoplasmático mais elevado do que os parasitas sensíveis, impedindo a 
entrada do fármaco no VD. Outro provável mecanismo, seria a diminuição da 
atividade da proteína trocadora de Na+/H+, que poderia promover uma 
diminuição do pH citoplasmático do parasita e, consequentemente o aumento 
do pH no VD, diminuindo a concentração de CQ no VD (WÜNSCH et al., 1998). 
Outro mecanismo ocorre pelo gene que confere a resistência ao P. 
falciparum à CQ (PfCRT do inglês, P. falciparum chloroquine resistance 
transporter gene) que decodifica uma bomba de efluxo, que exporta a CQ para 
fora do VD por meio de transporte ativo. A expressão de outra proteína 
transmembrana responsável por mecanismos de resistência é dada pelo gene 
que confere resistência a múltiplas drogas 1 (PfMDR1, P. falciparum resistance 
transporter 1). Genes semelhantes ao PfCRT também foram encontrados em 
outras espécies de plasmódio, como: P. vivax, P. yoelii, P. chabaudi, P. 
knowlesi, P. berghei. Assim, as proteínas decodificadas pelos genes PfCRT e 
PfMDR1 são determinantes para a susceptibilidade in vitro aos principais 
fármacos antimaláricos (VALDERRAMOS & FIDOCK, 2006; PETERSEN, 
EASTMAN & LANZER, 2011). 
 
1.2.4.1.3 Metabolismo e toxicidade dos derivados quinolínicos 
 
Os derivados quinolínicos, como a cloroquina (CQ) e a amodiaquina 
(AQ), apresentam alta hepatotoxidade, podendo, em casos de superdosagem, 
culminar em necrose hepática medicamentosa irreversível. Isso ocorre devido à 
presença do grupo 4-para-aminofenol na cadeia lateral dessas moléculas o 
qual é oxidado metabolicamente à quinonaimina, podendo gerar metabólitos 
reativos como amodiaquinaquinonaimina (AQQI) ou semiquinonaimina (ASQI). 
Essa mesma toxicidade é apresentada pelo paracetamol, devido à oxidação do 
grupo 4-hidroxiacetoanilida a uma quinonaimina eletrofílica por uma reação 
catalisada por enzimas CYP450 (Figura 15). 
 
45 
 
 
Figura 15. Biotransformação do paracetamol e da amodiaquina (AQ) em quinonaiminas pelo 
citocromo P450 (Adaptado de O’NEILL et al., 1998). 
 
Devido a essa toxicidade, decorrente do processo de metabolização do 
grupo 4-para-aminofenol, via enzima citocromo P450, O’Neill e colaboradores 
(2009) sintetizaram análogos da AQ, substituindo o grupo hidroxila por um 
átomo de flúor, obtendo a fluoroamodiaquina (FAQ), composto que apresenta 
um perfil menos tóxico quando comparado à AQ (O’NEILL et al., 1998; O’NEILL 
et al., 2009) (Figura 16). 
 
 
Figura 16. Estrutura química da fluoroamodiaquina (FAQ) sintetizada por O’Neill e 
colaboradores (2009) e dos análogos da amodiaquina sintetizados por Guglielmo e 
colaboradores (2009), respectivamente. 
 
1.3 NOVAS ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS 
 
1.3.1 Compostos com Potencial Atividade Leishmanicida 
 
46 
 
 Atualmente vêm sendo alvos de pesquisas os fitoterápicos com 
características farmacológicas relevantes para uso medicinal. Pode-se destacar 
como exemplo a Kalanchoe pinnata, espécie composta principalmente por 
triterpenos, esteróis e flavonóides, que apresenta atividade semelhante ao 
antimoniato de meglumina. A naftoquinona, um metabólito secundário do 
metabolismo das plantas, também vem apresentando atividade frente à 
triapanotiona redutase de L. donovani, induzindo à morte celular (SUNDAR & 
SINGH, 2018). 
 Outro alvo é a pesquisa atrelada à Tecnologia Farmacêutica, 
principalmente ao desenvolvimento de nanossitemas que visem à liberação 
vetorizada do fármaco, diminuindo os efeitos adversos e aumentando sua 
eficácia. A anfotericina B lipossomal é um exemplo de formulação que utiliza a 
nanotecnologia como ferramenta para sua ação. Vacinas utilizando nano-
formulações também vêm sendo extensivamente pesquisadas (SUNDAR & 
SINGH, 2018). 
As vias metabólicas do parasita também possuem importantes alvos 
terapêuticos a serem explorados. Um exemplo é a síntese de tripanotiona, 
componente encontrado exclusivamente no parasita e essencial para o mesmo. 
A tripanotiona redutase, tripanotiona sintase-amidase e a gutationil spermidina 
sintase são consideradas alvos para inibição da produção de tripanotiona. É 
possível citar ainda como promissores alvos terapêuticos a arginase, que atua 
impedindo o crescimento celular do parasita, a biossíntese de poliaminas, que 
promove a morte celular através da regulação da produção de espécies 
reativas de oxigênio, e a oligopeptidase (OPB), uma protease responsável pela 
regulação da produção de enolase do parasita (VIJAYAKUMAR & DAS, 2018). 
Existem ainda pesquisas envolvendo o uso de inibidores de peptidases, 
inibição da síntese de esterol, uso de antimicrobianos, proteossomas, inibição 
da secreção de proteínas, inibição de proteínas cinases, imunoterapias e 
alteração na homeostasia de ferro e cálcio (SUNDAR & SINGH, 2018, 
VIJAYAKUMAR & DAS, 2018). 
Ferramentas da Química Medicinal e estudos computacionais são 
importantes adjuvantes no desenvolvimento de novos candidatos a fármacos. 
Um exemplo é a hibridação molecular (HM), uma estratégia que consta na 
conjugação de estruturas, fragmentos ou grupamentos de compostos bioativos 
47 
 
distintos em uma única molécula, sendo uma alternativa eficaz para o 
planejamento de novos compostos. A HM pode estar baseada na junção de 
fármacos distintos ou degrupos farmacofóricos de fármacos distintos, de modo 
que a nova molécula formada é denominada de híbrido, a qual em geral, 
apresenta maior afinidade e eficácia que os compostos de origem. De uma 
forma geral, a HM tem como objetivo o sinergismo de ação farmacológica; uma 
terapia de dupla ação farmacológica; ou a modulação dos efeitos secundários 
indesejáveis. Com isso, pode-se perceber a importância dessa ferramenta e 
contribuição da mesma para a pesquisa e desenvolvimento de novos 
candidatos a fármacos (BARREIRO & FRAGA, 2008; NEPALI et al., 2014). 
Dessa forma, pode-se observar que muitos estudos vêm sendo 
desenvolvidos na tentativa de desenvolver novas terapias para o tratamento da 
leishmaniose. A combinação de terapias, utilizando diferentes mecanismos, 
para culminar na morte do parasita, vem proporcionando bons resultados, com 
boa tolerância e baixos efeitos adversos. Porém, isso não elimina a 
necessidade da busca por novos alvos terapêuticos, sendo essa a prioridade 
na tentativa de diminuir os índices da doença (SUNDAR & SINGH, 2018). 
 
1.3.1.1 Tioureias 
 
As tioureias, classe de substâncias que contêm enxofre, são moléculas 
amplamente descritas na literatura, com diversas atividades biológicas, e por 
isso, têm sido aplicadas em diversos ramos da química. Graças ao seu grande 
potencial em Química Medicinal, as tioureias têm se mostrado promissores 
candidatos a fármacos, visto seu amplo espectro de atividades, como as 
atividades antimicrobiana (CUNHA et al., 2007), antimicobacteriana 
(PHETSUKSIRI et al., 1999), antialérgica e antiasmática (VENKATACHALAM 
et al., 2003), antagonista de receptores vanilóides (tratamento da dor crônica) 
(LEE et al., 2004) e atividade anti-HIV (VENKATACHALAM et al., 2004). 
Os derivados de tioureia têm sido também identificados como potentes 
agentes antiprotozoários. Alguns derivados já demonstraram suas atividades 
contra Plasmodium falciparum (GREENBAUM et al., 2004; SUNDURU et al., 
2009), Trichomonas vaginalis (BHARTI et al., 2002), Trypanosoma cruzi 
(GREENBAUM et al., 2004; UPADHAYAYA et al., 2013), Leishmania infantum 
48 
 
(UPADHAYAYA et al., 2013) e Leishmania major (RAUF et al., 2015). A figura 
a seguir (Figura 17) mostra alguns exemplos de compostos com essas 
atividades. 
 
Figura 17. Exemplos de derivados de tioureia com atividade antiprotozoários. 
 
A busca pela síntese de moléculas bioativas como as tioureias se torna 
muito importante devido a gama de produtos sintéticos medicinalmente 
relevantes gerados por esse grupo (AGUIAR et al., 2011 e VIANA et al., 2013). 
Diversas metodologias sintéticas já foram descritas na literatura para a 
obtenção de tioureias, reportando inclusive suas vantagens e desvantagens. 
Dentre as principais metodologias, a mais utilizada é a que consiste na 
obtenção de tioureias a partir de isotiocianatos e aminas, sendo este método 
escolhido por apresentar altos rendimentos e a possibilidade de se obter uma 
grande diversidade de tioureias (Figura 18) (SCHROEDER, 1955). 
 
 
Figura 18. Esquema geral para obtenção de tioureias. 
49 
 
 
A incorporação do anel piperazínico se mostra como uma interessante 
alternativa, uma vez que esse anel heterocíclico está presente em moléculas 
com comprovada atividade leishmanicida in vitro para cepa de L. infantum 
(MAYENCE et al., 2004, BAREA et al., 2012), in vitro para L. major 
(TAHGHIGHI et al., 2011), em modelo in vivo contra cepa de L. infantum 
(MOWBRAY et al., 2015), contra a forma promastigota de L. donovani (ASHOK 
et al., 2017 e contra a forma promastigota de L. infantum (CHANDER et al., 
2018), e antimalárica, inclusive com atividade promissora frente à cepa de P. 
falciparum resistente à cloroquina (SINHA et al., 2014, SINGH et al., 2017, 
PRETORIUS et al., 2013). A figura a seguir (Figura 19) mostra alguns 
exemplos de compostos com essas atividades. 
 
Figura 19. Compostos com promissora atividade leishmanicida e antimalárica contendo 
o núcleo piperazina em suas estruturas. 
 
1.3.2 Compostos com Potencial Atividade Antimalárica 
 
Devido ao complexo ciclo biológico do parasita, novos alvos vêm sendo 
investigados na tentativa de contornar a problemática da resistência aos 
fármacos e visando a diminuição dos efeitos adversos. Alguns exemplos de 
alvos são demonstrados na figura a seguir (Figura 20), compreendendo etapas 
bioquímicas e metabólicas fundamentais ao Plasmodium sp. 
50 
 
 
 
Figura 20. Principais alvos terapêuticos para o tratamento da malária (Adaptado de Kumar et 
al., 2018). 
 
 Como visto na Figura 20, diversos são os alvos moleculares que podem 
ser explorados na busca por novos candidatos a fármacos para a malária. 
Apesar disso, os mesmos esquemas terapêuticos são utilizados há anos, e 
poucos fármacos novos são de fato utilizados na terapêutica clínica da doença. 
Com isso, compostos que atuam na interferência da formação da hemozoína, 
como os derivados quinolínicos, são exemplos de fármacos que são ainda 
extensivamente utilizados e pesquisados (KUMAR et al., 2018). 
 
1.3.2.1 Análogos da Amodiaquina 
 
A obtenção de novos derivados de AQ, visando à redução da toxicidade 
e à melhora do perfil terapêutico tornou-se alvo importante de estudos 
(CUNICO, et al., 2008; VALE et al., 2005; DELARUE-COCHIN et al., 2008; 
CASAGRANDE et al., 2008; O’NEILL et al., 2009). 
51 
 
Gemma e colaboradores (2012) realizaram o estudo de Relação 
Estrutura-Atividade (SAR) e metabolismo de compostos híbridos moleculares 
dos farmacóforos da cloroquina e clotrimazol, obtendo um composto com 
propriedade farmacológica e potencial terapêutico, sendo um bom ponto de 
partida para o desenvolvimento de novos candidatos a fármacos (composto 
lead). Nesse trabalho foram realizados estudos in silico, in vitro e in vivo, os 
quais indicaram que compostos com o anel piperazina na cadeia lateral 
apresentam atividade não só antiplasmódica como possível atividade inibidora 
da proteína bomba de efluxo (Esquema 1). 
 
 
Esquema 1. Composto lead que apresentou atividade antiplasmódica e inibitória da proteína 
bomba de efluxo série de análogos quinolínicos proposta por Gemma e colaboradores 
(GEMMA et al., 2012). 
 
A introdução do anel piperazina em moléculas contendo o núcleo 
quinolínico vem sendo investigada, pois estudos demonstram que, além da 
inibição do crescimento do parasita, esses compostos apresentam também 
inibição frente à formação da β-hematina. Sendo assim, novos candidatos a 
fármacos com melhor atividade antimalárica podem ser desenvolvidos 
(RYCKEBUSCH et al., 2003). 
52 
 
Nesse contexto, tendo em vista alternativas terapêuticas utilizando 
estratégias de modificação molecular, Guglielmo e colaboradores (2009) 
desenvolveram novos análogos da AQ que apresentavam o anel piperazina na 
cadeia lateral (Figura 16). Os compostos foram sintetizados e testados em 
duas cepas de P. falciparum: 3D7, uma cepa sensível a todos os fármacos 
antimaláricos, e K1, uma cepa proveniente da Tailândia resistente à CQ e 
pirimetamina. O referido trabalho resultou em compostos com atividade 
superior à amodiaquina contra plasmódios resistentes à cloroquina e 
demonstrou que mais estudos acerca desses novos análogos são necessários 
para o desenvolvimento de fármacos mais eficientes na busca da erradicação 
da malária (GUGLIELMO et al., 2009). 
Sousa e colaboradores (2015) realizaram estudos de modelagem 
molecular com os compostos sintetizados por Guglielmo e colaboradores 
(2009), aplicando a técnica de docking molecular no estudo da interação 
desses compostos com grupo heme. Dessa forma, foram estudados os tipos de 
interações envolvidas nos complexos e o arranjo conformacional entre os 
análogos da AQ e o grupo heme. Foi obtido um modelo robusto de interação 
desses análogos com o grupo heme, no qual o composto com melhor perfil de 
atividade antiparasitária apresentou um modo de interação semelhante

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