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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO 
 
DIOGO PEREIRA DA SILVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO ORÇAMENTO PÚBLICO ATRAVÉS DO IMPOSTO 
DE RENDA: uma análise comparativa entre Brasil e Estados Unidos 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2016 
 
DIOGO PEREIRA DA SILVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
Participação social no orçamento público através do imposto de renda: uma análise 
comparativa entre Brasil e Estados Unidos 
 
 
 
 
 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao 
Instituto COPPEAD de Administração, da 
Universidade Federal do Rio de Janeiro, 
como parte dos requisitos necessários à 
obtenção do título de Mestre em 
Administração 
 
 
Orientadora: Ariane Cristine Roder Figueira 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2016 
 
 
 
 
 
CIP - Catalogação na Publicação
Elaborado pelo Sistema de Geração Automática da UFRJ com os
dados fornecidos pelo(a) autor(a).
P586p
Pereira, Diogo
 Participação social no orçamento público através
do imposto de renda: uma análise comparativa
entre Brasil e Estados Unidos / Diogo Pereira. --
Rio de Janeiro, 2016.
 94 f.
 Orientador: Ariane Cristine Roder Figueira.
 Dissertação (mestrado) - Universidade Federal
do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de
Administração, Programa de Pós-Graduação em
Administração, 2016.
 1. Participação social. 2. Imposto de Renda. 3.
Gestão pública. 4. Incentivos �scais. 5.
Administração - Teses. I. Cristine Roder Figueira,
Ariane , orient. II. Título.
 
DIOGO PEREIRA DA SILVA 
 
Participação social no orçamento público através do imposto de renda: uma análise 
comparativa entre Brasil e Estados Unidos 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao 
Instituto COPPEAD de Administração, da 
Universidade Federal do Rio de Janeiro, 
como parte dos requisitos necessários à 
obtenção do título de Mestre em 
Administração 
 
 
Aprovada por: 
 
 
 
 
 
 
Prof.ª Dr.ª Ariane Cristine Roder Figueira (Orientadora) - COPPEAD/UFRJ 
 
 
 
 
Prof.ª Dr.ª Elaine Maria Tavares Rodrigues - COPPEAD/UFRJ 
 
 
 
 
Prof.ª Dr.ª Monica de Maria Santos Fornitani Pinhanez – EBAPE/FGV 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2016 
 
AGRADECIMENTOS 
 
É chegada a hora. 
Enfim! 
Mas toda essa conquista não seria possível sem a ajuda de pessoas e instituições que me 
apoiaram ao longo desses dois anos e meio de mestrado no COPPEAD. 
Fica registrado aqui, para o público, a importância de cada um de vocês. 
Em primeiro lugar, devo dedicar essa conquista à minha família, em especial, 
aos meus pais. Afinal, foram eles que, desde criança, fizeram de tudo para que eu tivesse 
a melhor educação possível. Sem esse apoio e privilégio, nada disso seria possível ou 
imaginável. 
Agradeço muito também à CNEN por me conceder essa oportunidade. Três 
pessoas dessa instituição foram de essenciais para a consecução desse trabalho. Obrigado, 
Teo, por todo o apoio, ajuda e, acima de tudo, por ser meu exemplo. Fiquei muito feliz 
de te conhecer e poder entender o que é ser realmente um servidor público. Obrigado 
também à Fabi que apoiou todo esse processo e, inclusive, me mandava dicas de como 
aguentar a pressão, especialmente, nessa etapa final. E agradeço à Beth que sempre me 
ajudou em tudo o que podia e demonstrou que acredita no meu potencial. 
Agradeço ao Deco, que me aturou muito, ouviu muita reclamação, em especial 
nesses últimos meses. Muito obrigado mesmo! Isso sem falar na generosidade de me 
receber na sua casa, abrir seu espaço, para que eu pudesse ter um teto. Sem todo esse 
apoio, nem a dissertação, nem nada teria fluido como fluiu. 
Ariane – ou Arilove, para alguns de seus orientandos – muito obrigado por 
aceitar me orientar e apoiar a doideira que foi fazer este trabalho. Ninguém esperava que 
saísse o que saiu, e eu achei muito bacana. Seu papel foi fundamental! Muito obrigado! 
Agradeço também às iniciativas oficiais e extraoficiais de democratização do 
acesso à informação. Sem elas, seria impossível fazer esse trabalho. Espero que muitas 
pessoas possam usufruir de mais ferramentas a cada dia. Acesso aberto na veia! 
E, por fim, não poderia deixar de agradecer à sociedade brasileira como um todo. 
Desde a graduação estudo gratuitamente em uma das melhores universidades do Brasil e 
sei da importância e do valor disso para o meu futuro. Não é só mérito meu. É nosso! Por 
isso, prometo que sempre guiarei minha vida tendo isso em mente, buscando retribuir 
tudo o que recebi do Estado brasileiro, seja como servidor público, seja como cidadão 
brasileiro. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
No taxation without representation participation1 
Adaptado de Jonathan Mayhew 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1 A frase “no taxation without representation” é considerada o principal slogan do sentimento 
da população das Treze Colónias em relação à imposição de tributos pelo governo inglês sem a devida 
representação da colônia no parlamento, que deu origem à guerra de independência. Desde a década de 
1990, podem sem encontradas referências à versão com a palavra participation em artigos de periódicos, 
jornais ou blogs, dentro de um contexto de busca por mais participação direta da população nas decisões de 
governo, portanto, em linha com o objeto desta dissertação. 
 
RESUMO 
 
PEREIRA, Diogo. Participação social no orçamento público através do imposto de 
renda: uma análise comparativa entre Brasil e Estados Unidos. 2016. 95f. Dissertação 
(Mestrado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade 
Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016. 
 
 
Este trabalho busca estudar os incentivos fiscais a doações através do IRPF como 
mecanismos de participação na gestão pública. Para tal, procura-se descrever os casos do 
Brasil e dos EUA, em perspectiva histórica, a fim de obter dados que permitam analisar 
comparativamente os países a partir de modelo desenvolvido com base na escada de 
participação de Arnstein (1969) e nas reflexões acerca de democracia de Dahl (2005). 
Concluiu-se que, nos dois países, os incentivos fiscais podem ser considerados 
mecanismos de democracia participativa por concederem poder de deliberação ao 
cidadão. Contudo, não são intrinsecamente democráticos tendo em vista que apenas uma 
pequena parcela das populações tem acesso a esse mecanismo e o tamanho da 
participação varia conforme a renda dos cidadãos. Além disso, contatou-se que a 
legislação dos EUA permite um maior grau de participação (potencial) comparada à 
legislação brasileira, entretanto, em ambos os casos, a efetiva utilização dos mecanismos 
pelos cidadãos é muito baixa. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
PEREIRA, Diogo. Participação social no orçamento público através do imposto de 
renda: uma análise comparativa entre Brasil e Estados Unidos. 2016. 95pp. Thesis 
(Master) – COPPEAD Graduate School of Business. Federal University of Rio de Janeiro, 
Rio de Janeiro, 2016. 
 
 
 
This study aims to investigate if tax incentives to donations under income tax laws can 
be considered participatory mechanisms in the public administration. Brazilian and 
American cases were described in a historical perspective in order to obtain data that 
would enable a comparative analysis of both countries using a framework developed by 
the author based on Arnstein’s ladder of participation (1969) and on Dahl’s reflections on 
Democracy (2005). It was found that tax incentives can be considered participatory 
mechanisms since they provide deliberation power to citizens. However, they are not 
intrinsically democratic because only a small portion of the population has access to this 
mechanisms and the size of participation varies according to the income of citizens. 
Furthermore, it was observed that US laws grant more (potential)participation than 
Brazilian’s, yet in both cases the actual use of these mechanisms by citizens are very low. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sumário 
 
1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 1 
1.1. Objetivos do estudo ....................................................................................... 2 
1.2. Delimitação do estudo ................................................................................... 3 
1.3. Relevância do estudo ..................................................................................... 4 
1.4. Organização do estudo ................................................................................... 5 
2. REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................ 7 
2.1. Origens do Estado .......................................................................................... 7 
2.2. Estado frente à globalização .......................................................................... 9 
2.3. Democracia e tomada de decisão: consentimento e participação ................ 12 
2.4. Design institucional e administração pública .............................................. 18 
2.5. Frameworks de participação na tomada de decisão .................................... 21 
3. METODOLOGIA ............................................................................................... 25 
3.1. Questões de pesquisa ................................................................................... 25 
3.2. Método de pesquisa ..................................................................................... 25 
3.3. Coleta dos dados .......................................................................................... 27 
3.4. Análise dos dados ........................................................................................ 29 
4. DESCRIÇÃO DOS CASOS ............................................................................... 36 
4.1. Imposto de Renda e incentivos fiscais ......................................................... 36 
4.2. Incentivos fiscais através do IRPF no Brasil ............................................... 37 
4.2.1 Regulação e evolução do IRPF .................................................................... 37 
4.2.2 Evolução da capilaridade das instituições beneficiadas e da participação 
orçamentária dos projetos incentivados ................................................................ 39 
4.3. Incentivos fiscais através do IRPF nos EUA ............................................... 48 
4.3.1 Regulação e evolução do IRPF .................................................................... 49 
4.3.2 Evolução sobre a capilaridade das instituições beneficiadas ....................... 53 
4.3.3 Evolução da participação orçamentária das instituições incentivadas ........ 55 
 
5. DISCUSSÃO DOS CASOS ................................................................................ 57 
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 68 
6.1. Implicações gerenciais ................................................................................. 69 
6.2. Limitações do estudo ................................................................................... 70 
6.3. Trabalhos futuros ......................................................................................... 71 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 73 
REFERÊNCIAS LEGAIS ........................................................................................... 81 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Lista de ilustrações 
 
Figura 1. Dimensões teóricas de democratização ............................................ 15 
Figura 2. Escada de participação dos cidadãos de Arnstein (1969) ................. 23 
Figura 3. Framework de participação de Wilcox (2004) ................................. 24 
Figura 4. Framework de participação na gestão pública orçamentária ............ 32 
Figura 5. Quantidade de declarações originais de IRPF recebidas, no Brasil, nos 
exercícios de 1924 a 2013 .............................................................................................. 38 
Figura 6. Quantidade de declarações originais de IRPF recebidas, nos EUA, nos 
exercícios de 1913 a 2010 .............................................................................................. 51 
Figura 7. Comparação entre participação efetiva nos incentivos fiscais do IRPF 
no Brasil e nos EUA. ...................................................................................................... 60 
Figura 8. Comparação entre participação potencial e efetiva nos incentivos 
fiscais do IRPF no Brasil e nos EUA ............................................................................. 63 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Lista de tabelas 
 
Tabela 1. Comparação entre dedução da renda bruta e do imposto devido ..... 41 
Tabela 2. Recursos aplicados por pessoas físicas através de incentivos fiscais em 
2013 ................................................................................................................................ 45 
Tabela 3. Principais modificações na legislação de dedução por doação através 
do IRPF no Brasil ........................................................................................................... 45 
Tabela 4. Principais modificações na legislação de dedução por doação através 
do IRPF nos EUA ........................................................................................................... 54 
Tabela 5. Recursos aplicados por pessoas físicas através de incentivos fiscais em 
2013 ................................................................................................................................ 55 
Tabela 6. Quantidade de controle potencial no IRPF no Brasil em 2013 ........ 59 
Tabela 7. Quantidade de controle potencial no IRPF nos EUA em 2013 ........ 59 
Tabela 8. Diversidade de opções no Brasil em 2013 ....................................... 59 
Tabela 9. Diversidade de opções nos EUA em 2013 ....................................... 59 
Tabela 10. Quantidade de controle efetivo no IRPF no Brasil em 2013 .......... 62 
Tabela 11. Quantidade de controle efetivo no IRPF nos EUA em 2013 .......... 62 
Tabela 12. Declarações do IRPF no Brasil e nos EUA (2013) ........................ 66 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 1 
1. INTRODUÇÃO 
A globalização e a consolidação do ideal democrático, evidenciados desde o 
final do século XX, provocaram diversas implicações sobre a sociedade, levando a 
reconfigurações de estruturas sociais e a instauração de novos paradigmas em diversos 
âmbitos da contemporaneidade. Dentre esses aspectos, o Estado foi uma das instituições 
que vem sofrendo grandes impactos desse movimento, com seu papel e estruturas sendo 
postas em cheque devido a características desse cenário, como a porosidade das fronteiras 
físicas, combinada à emergência e consolidação do espaço virtual; e a grande 
disseminação de informação em escala global e em tempo real; juntas, incorrendo em 
novas dinâmicas na relação entre cidadãos e instituições, e exigindo novas formas de 
resposta às suas demandas. 
Contudo, o Estado ainda está fundamentalmente arraigado à ideia de 
representação como princípio norteador do seu processo decisório. Isso ocorre mesmo 
diante de um contexto de percepção de descolamento entre as demandas sociais e a 
agenda de governo, e de busca por mais formas de participação dos cidadãos, para além 
do processo eleitoral, conforme mostram os estudos de Bobbio (1997), Held (2006), 
Mainwaring (2006) e Tormey (2014). 
Além disso, os principais modelos de gestão presentesna administração pública 
também têm contribuído para a perpetuação da sensação de falta de responsividade do 
Estado, na medida em que tanto a burocracia quanto o gerencialismo buscam 
relativamente pouco suporte dos cidadãos no desenvolvimento dos serviços públicos, 
conforme apontado por Bresser-Pereira (2001), Secchi (2009), Homburg (2004) e Moote, 
Mcclaran e Chickering (1997). 
Percebe-se que, apesar alguns mecanismos de participação existirem e estarem 
previstos inclusive nas constituições dos países, muitas vezes, eles não são utilizados ou 
conferem pouco poder discricionário ao cidadão, conforme pode ser observado em 
diversas iniciativas no Brasil, como a plataforma Participa.br e as experiências com o 
Orçamento Participativo, ou em outros países como a elaboração participativa da 
Constituição da Islândia e o planejamento urbano coletivo nos EUA (BANI, 2012; 
COELHO et al., 2015; MOOTE; MCCLARAN; CHICKERING, 1997). 
Um desses mecanismos que parece conferir poder de decisão sobre a gestão 
pública para o cidadão é o incentivo fiscal. Afinal, o Estado poderia decidir sozinho, de 
maneira centralizada, o destino dos recursos orçamentários, contudo, prefere incentivar a 
 2 
presença de outros atores na consecução das políticas públicas. Apesar disso, estudos que 
busquem estudar a relação entre participação na gestão pública e incentivos fiscais são 
escassos na literatura, motivando a elaboração desta dissertação. 
 
1.1. Objetivos do estudo 
Sob esse pano de fundo, este trabalho busca adentrar na esfera da participação 
dos cidadãos nas decisões de governo. Em geral, quando se trilha por este caminho, 
recorre-se à análise de mecanismos que assegurem a responsividade do governo às 
demandas dos seus cidadãos – ou seja, o nível de correspondência entre preferências da 
sociedade e as prioridades da agenda de governo – representada, para Dahl (2005), por 
dois pilares fundamentais: participação e competição política. Portanto, meios que 
estimulem a permeabilidade das instituições e a liberdade de contestação são essenciais 
para o pleno desenvolvimento desses dois pilares. 
Nesse sentido, através do estudo comparativo dos casos do Brasil e dos EUA, 
esta dissertação terá como objetivo principal, avaliar: 
 
 Os incentivos fiscais para doações através do Imposto de Renda da 
Pessoa Física (IRPF) como mecanismos de democracia participativa 
aplicados à gestão pública. 
 
Assim, para subsidiar a análise da problemática central, buscar-se-á responder 
às seguintes perguntas adjacentes: 
 O incentivo fiscal da dedução do IRPF por doação foi utilizado, ao longo 
da história do Brasil e dos EUA, como mecanismo institucional de 
estímulo à participação na distribuição desses recursos? 
 Os cidadãos têm algum tipo de poder de decisão sobre o destino dos 
recursos de renúncia fiscal, com base no modelo de participação na 
gestão pública proposto? Se sim, em que medida as pessoas efetivamente 
participam? 
 O estímulo dos incentivos fiscais para pessoas físicas é um modelo 
democrático de participação, ou seja, se são mecanismos inclusivos e 
igualitários de participação? 
 
 3 
1.2. Delimitação do estudo 
Benefícios fiscais2 podem ser classificados como compensatórios, quando o 
Estado considera que não atende a população adequadamente em relação a determinados 
serviços de sua responsabilidade, ou como incentivadores, quando se tem o intuito de 
estimular determinado comportamento, como desenvolver algum setor ou região 
(MANTEGA et al., 2014). Partindo dessa caracterização, este trabalho analisará somente 
os benefícios fiscais de caráter incentivador – incentivos fiscais – pois são os únicos que 
visam encorajar comportamentos particulares. Além disso, o escopo do trabalho volta-se 
exclusivamente àqueles incentivos que podem ser utilizados por pessoas físicas, já que se 
pretende transitar pela esfera da participação dos cidadãos nas decisões de governo. 
Nesse sentido, a nível federal, os gastos tributários incentivadores relacionados 
a pessoas físicas estão restritos ao Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), já que este 
é atualmente o único imposto direto da União. Portanto, esta dissertação versará sobre os 
incentivos fiscais presentes no IRPF, que se resumem às deduções de imposto por 
doações, de acordo com as leis de incentivo vigentes. Além disso, em termos de montante 
financeiro, esses gastos são o principal instrumento de incentivo fiscal para a pessoa física 
tanto no Brasil, quanto nos Estados Unidos. 
A escolha dos EUA como objeto de análise comparativa e não de países mais 
próximos histórica e culturalmente ao Brasil deu-se, em primeiro lugar, porque o Estado 
americano é considerado referência em termos de democracia (poliarquia) e, portanto, de 
participação política dos seus cidadãos, de acordo com o modelo de Dahl (2005), que 
subsidiou o presente estudo. Apesar dos EUA serem a maior potência do mundo e o Brasil 
ter a si reservado o espaço de potência média, e as sociedades americana e brasileira 
apresentarem trajetórias históricas e culturas políticas distintas, essas diferenças, embora 
evidentes e impactantes diretamente na conformação das instituições, não devem impedir 
nem limitar estudos comparados de base institucional que busquem identificar paralelos 
entre essas duas realidades. Trabalhos como o de Limongi e Figueiredo (1998) que 
compara os sistemas políticos brasileiro e americano, de Mainwaring (1999) que compara 
instituições democráticas de ambos os países, além de Gilman (2016) que analisa a 
introdução do modelo de orçamento participativo brasileiro no contexto americano são 
alguns exemplos de estudos que optaram por trajetórias semelhantes. 
 
2 Ao longo deste trabalho, as expressões benefício fiscal, gasto tributário e renúncia fiscal serão 
utilizadas com o mesmo sentido. 
 4 
Naturalmente, poder-se-ia também buscar relações com países europeus, tendo 
em vista que esta região tem mais tradição de participação política do que os Estados 
Unidos. Todavia, o presente trabalho tem como objetivo central comparar modelos 
institucionais, ou seja, analisar um movimento parte do Estado para a sociedade, portanto, 
não tratando de elementos relacionados à cultura política que vão em direção contrária, 
da sociedade para o Estado. 
Por fim, vale ressaltar também que a própria constituição do Estado brasileiro – 
republicano, federalista e presidencialista – foi fortemente inspirada no modelo 
estadunidense (MAIDA, 2003; CUNHA, 2007), o que se configura como mais um 
fundamento da importância de se comparar as realidades institucionais brasileira e 
americana. 
 
1.3. Relevância do estudo 
Ao longo do tempo, os estudos e as experiências práticas relacionados à 
participação dos cidadãos no governo têm-se focado prioritariamente nos mecanismos 
tradicionais de democracia direta, como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular – 
os três mecanismos presentes na Constituição Brasileira de 1988 –, ou em formas 
manifestação de pressão pública, como audiências públicas, fóruns de debate e 
participação em movimentos sociais, conforme pode ser visto em Benevides (1994), 
Gomes (2005), Bobbio (2007), Barber (2007), Bevir (2010), Reilly (2010), Bani (2012) 
e Roberts (2015). 
Recentemente, algumas experiências inovadoras de participação têm sido 
realizadas no mundo, como a elaboração colaborativa do Marco Civil da Internet 
brasileiro, entre 2009 e 2011, e da proposta de Constituição da Islândia entre 2010 e 2011, 
ambos considerados modelos mais participativos e democráticos que as tradicionais 
formas de criação de legislação. Contudo, esses movimentos de participação direta dos 
cidadãos nas escolhas políticas são ainda excepcionais dentro da administração pública, 
além de atuarem exclusivamente na esfera consultiva, não permitindo aos cidadãos um 
efetivo poder de deliberaçãosobre as matérias (BANI, 2012; SAMPAIO; BRAGATTO; 
NICOLÁS, 2013, 2015). 
Já quando se adentra no orçamento público, o Brasil inovou no quesito 
participação no final da década de 1980 com a implementação do Orçamento 
Participativo na prefeitura de Porto Alegre, iniciativa que foi aplicada em diversos outros 
 5 
municípios e, mais recentemente, também a nível federal. Contudo, hoje, apesar desta e 
de outras iniciativas de participação estarem espalhadas pelo Brasil, em nenhuma há 
poder decisório direto do cidadão que confira à população a palavra final sobre a política 
pública (COELHO et al., 2015). 
Ao mesmo tempo, o poder público dispõe da faculdade de conceder benefícios 
fiscais a pessoas físicas e jurídicas, medida que é contabilizada pelo governo dentro do 
orçamento público como gasto tributário, já que reduz a arrecadação potencial e aumenta 
a disponibilidade econômica do contribuinte (MANTEGA et al., 2014). Ou seja, em 
certos casos, o Estado julga ser importante contar com a participação de cidadãos ou 
organizações na consecução de políticas públicas através do direcionamento, por parte 
desses atores, de capital para determinadas áreas, recursos esses que iriam originalmente 
aos cofres públicos. 
Diversos estudos podem ser encontrados relativos aos gastos tributários do 
orçamento público, entretanto, a ênfase costuma ser na avaliação da eficiência desse 
instrumento na promoção de políticas públicas (BEGHIN; CHAVES; RIBEIRO, 2010; 
TODER; BANEMAN, 2012; MARTINS, 2013; MOUTINHO, 2015). Outras pesquisas 
focam-se em avaliar a percepção pública dos benefícios sociais oriundos dos gastos 
tributários (FARICY; ELLIS, 2013) ou na análise dos contextos institucionais, culturais 
e históricos por trás de sua criação (ALT, 1983; STEINMO, 1989). Não foram 
encontrados estudos, porém, que busquem analisar os gastos tributários do orçamento 
como um mecanismo que permite a participação direta de atores alheios ao governo nas 
decisões de alocação de recursos públicos. 
 
1.4. Organização do estudo 
Assim, com vistas a conduzir a discussão do tema proposto, este trabalho foi 
organizado em mais cinco capítulos. 
O segundo buscará inicialmente transitar pela literatura que aborda conceitos 
clássicos de Estado, a partir dos pensamentos de autores como Weber (1967), Rousseau 
(s.d), Hobbes (1974) e Locke (1764), com objetivo de compreendê-los melhor para, em 
seguida, analisá-los à luz do contexto contemporâneo das novas tecnologias e da 
globalização, com base nos estudos de Castells (2001, 2005, 2009, 2015), Held e McGrew 
(1999, 2004), Giddens (2000) e Sassen (2000). Diante do panorama trazido por esta 
discussão, o capítulo tem sequência com a análise de como evoluíram os entendimentos 
 6 
de democracia e participação e quais as implicações geradas para esse novo cenário, com 
ênfase nas perspectivas de Dahl (1994, 2005), Held (2006) e Bobbio (1997, 2007). 
Posteriormente, procura-se vislumbrar de que maneira os preceitos da gestão pública 
evoluíram temporalmente diante desses dois fatores –democracia e globalização –, e 
buscaram se apropriar de inovações políticas, sociais e tecnológicas com intuito de 
permitir novas formas de relação entre governo e sociedade. Esta seção fundamenta-se 
principalmente nos estudos de Dunleavy (1994), Bresser-Pereira (1998, 2002a, 2002b), 
Homburg (2004) e Margetts e Dunleavy (2013). Por fim, serão apresentados modelos de 
avaliação de participação que fornecerão subsídios para a análise dos casos propostos. 
O terceiro capítulo tem como objetivo descrever a metodologia utilizada para a 
construção deste trabalho. Serão apresentadas as principais questões que norteiam este 
estudo, assim como as razões que levaram à escolha do estudo de caso como método de 
pesquisa e instrumento para análise comparada dos dados coletados através de pesquisa 
documental e bibliográfica. 
O quarto capítulo procurará entender, em perspectiva comparada, de que 
maneira o imposto de renda da pessoa física foi utilizado como um mecanismo de 
incentivo à participação dos cidadãos na alocação de recursos em determinadas áreas 
consideradas como prioritárias pelos governos ao longo da história do Brasil e dos EUA. 
Esta seção busca relatar a experiência brasileira e americana a partir de três eixos: a 
evolução das políticas regulatórias, compreendendo apenas os principais marcos 
históricos; o montante de participação orçamentária, a distribuição desses recursos e o 
engajamento dos contribuintes; e a capilaridade dos projetos e instituições beneficiados. 
O quinto capítulo buscará analisar comparativamente os estudos dos casos 
brasileiro e americano à luz da literatura discutida no referencial teórico com vistas a 
debater se os incentivos fiscais a doações através do IRPF são mecanismos institucionais 
de democracia participativa. 
Esta seção será, então, seguida pelo sexto capítulo, que conterá as considerações 
finais relativas à pesquisa, as implicações gerenciais deste estudo, bem como as 
recomendações de trabalhos futuros. 
 
 
 
 
 
 7 
2. REFERENCIAL TEÓRICO 
Este capítulo busca inicialmente transitar pela literatura científica que estuda o 
Estado com objetivo entender suas concepções para, em seguida, analisar seus 
desdobramentos à luz do contexto contemporâneo das novas tecnologias e da 
globalização. Diante do panorama trazido por esta discussão, o capítulo tem sequência 
com a análise de como evoluíram os entendimentos da participação democrática nas 
decisões de governo ao longo do tempo e quais as implicações geradas para esse novo 
cenário. Por fim, procura-se vislumbrar de que maneira os preceitos da gestão pública 
evoluíram temporalmente e buscaram se apropriar das inovações tecnológicas e sociais 
com intuito de democratizar as instituições. 
 
2.1. Origens do Estado 
Pensar o Estado e sua relação com a sociedade exige revisitar algumas de suas 
concepções mais proeminentes, com vista a refletir sobre suas possíveis funções. Afinal, 
apesar do Estado ser hoje uma instituição onipresente (MORRIS, 2004) – já que em 
praticamente todos os locais é possível notar sua influência –, sua caracterização é 
controversa (MORRIS, 2010) e está sujeita à variação de acordo com os valores de 
determinada sociedade (WEBER, 1967) 
A discussão em torno das origens do Estado deriva de diferentes visões. De um 
lado estão os teóricos que empregam uma perspectiva historicista, em que sua 
constituição estaria demarcada no tempo como passagem para a Modernidade e estaria 
relacionada ao processo de centralização do poder. Nesta linha, o Estado é entendido 
como uma forma de ordenamento político que surgiu na Europa entre os séculos XIII e 
XIX que, posteriormente, prosperou para todo o mundo (BOECKENFOERDE apud 
SCHIERA, 1998). A conceituação dessa corrente perpassa principalmente pelos 
pensamentos de Weber (1967) que buscava analisar o Estado a partir de uma perspectiva 
sociológica e acreditava que, para tal, não poderia partir das suas finalidades para 
compreendê-lo, mas de seus meios. Nesse sentido, descreve o processo de constituição 
do Estado como um fenômeno de expropriação das armas (força física) por parte do poder 
público (BOBBIO, 2007) e centralização do poder sobre o princípio da territorialidade da 
obrigação política (SCHIERA, 1998), acontecimentos característicos do continente 
europeu naquele período. O Estado é visto, por Weber (1967), como uma instituição que 
deteria o monopólio da força – sendo esta um meio específico a ele – circunscrito a uma 
 8 
determinada localidade. Seria, portanto, uma dominação de homens sobre homens, a 
partir da violência legítima, ou seja, da percepção pelos dominados de que devem 
obediência aos detentores do poder (WEBER, 1967). Depreende-se, assim, a clássica 
definição de Estado como uma “comunidade humana que pretende, com êxito, o 
monopólio legítimo do uso da força física dentrode um determinado território” (WEBER, 
1967, p.56). 
Observa-se, então, que os pensamentos derivados das ideias weberianas são uma 
sociologia política da dominação, tendo em vista que se sustentam sobre a percepção da 
força e da violência como momentos essenciais do processo político e inerentes à 
existência e ao funcionamento das instituições políticas (BIANCHI, 2014); ou seja, o 
Estado visto como uma forma de organização da dominação (WEBER, 1967). 
Em contraste a essa abordagem, quando se recorre às concepções hipotético-
dedutivas, encontra-se o Estado como uma instituição que representaria a passagem da 
barbárie para a civilização; um momento de transição entre o isolamento hipotético ou 
selvagem em direção ao estado civil (BOBBIO, 2007). Por trás desse movimento, está a 
ideia de que haveria um contrato, tácito ou expresso, entre os indivíduos que demarcaria 
a passagem do estado natural para o estado social e político (SCHIERA, 1998). 
De acordo com esta concepção, o Estado surge como uma entidade jurídica 
derivada de um ato jurídico (SCHIERA, 1998): um acordo contratual entre os indivíduos 
daquela sociedade que se baseia na ideia de consentimento (D'AGOSTINO; GAUS; 
THRASHER, 2014; LOCKE, 1764). Ou seja, quando o homem adentra na “Idade do 
Consentimento”, ele passaria a dispor do poder de fazer certos tipos de acordos 
vinculativos entre si (D'AGOSTINO; GAUS; THRASHER, 2014), renunciando ao 
direito à liberdade total (LOCKE, 1764; HOBBES, 1974; ROUSSEAU, s.d.) a partir do 
vislumbre de ganhos oriundos da interação social e da cooperação (CUDD, 2013), como 
sobrevivência interna (sustento) e externa (defesa) (BOBBIO, 2007). Portanto, da 
afirmação do contrato social, derivaria a legitimidade da autoridade do Estado (CUDD, 
2013; SCHIERA, 1998). 
Apesar dessas abordagens partirem de concepções diferentes para responder ao 
questionamento da origem do Estado, pode-se também constatar algumas convergências 
dos pensamentos dos autores, que assinalam características comumente percebidas ao 
longo da história. 
Ambas as perspectivas destacam que a existência do Estado pressupõe a 
legitimação da sua autoridade, ou seja, que sua vontade é reconhecida como máxima para 
 9 
o agir da coletividade (BOBBIO, 2007). Em outras palavras, o cumprimento da vontade 
estatal originaria-se de uma atitude minimamente voluntária oriunda do interesse em 
obedecer (WEBER, 1978). Nesse sentido, a conceituação weberiana de dominação 
legítima baseada no paradigma racional-legal – decorrente da crença na racionalidade do 
comportamento conforme as normas estabelecidas (WEBER, 1978) – dialoga com a 
perspectiva contratualista da legitimidade como proveniente do acordo (jurídico) 
consensual entre os indivíduos com vista a benefícios comuns. 
Além dessa abordagem do consentimento como característica inerente ao 
Estado, tanto Weber, com sua concepção historicista, quanto os autores contratualistas 
abordam a territorialidade como fator essencial à sua consolidação institucional. Se de 
um lado o território é explicitamente descrito como elemento necessário e constituinte do 
Estado (WEBER, 1967; Idem, 1978), pode também ser entendido como um limite 
espacial de atuação do poder estatal, dentro de onde as leis são executadas (LOCKE, 
1764); e como a reunião das terras dos indivíduos entendida, em sua totalidade, como 
espaço público, na medida em que o contrato social permite sobrepor o direito da 
comunidade ao direito particular – o que reforçaria o laço social e a soberania –, ao mesmo 
tempo em que diferencia os residentes do território (cidadãos) dos não residentes 
(estrangeiros) (ROUSSEAU, s.d.). 
 
2.2. Estado frente à globalização 
Todavia, apesar dessas conceituações de Estado possuírem alguns elementos 
convergentes – mesmo vindo de autores e épocas diversas –, sua caracterização tende a 
sofrer influência dos valores da sociedade, conforme já evidenciado por Weber (1967). 
Portanto, fenômenos que proponham novas dinâmicas sociais podem provocar 
modificações nesses entendimentos, influenciando os pensamentos de determinada época 
acerca do Estado. E a globalização parece ser uma dessas tendências capazes de provocar 
reestruturações profundas em vários aspectos da sociedade (GIDDENS, 2000). 
Apesar das concepções de globalização e sua influência na percepção do papel 
do Estado estar amplamente difundida nos discursos público e acadêmico, o entendimento 
acerca da extensão desse fenômeno não é homogêneo (HELD; MCGREW, 1999; 
GIDDENS, 2000). Em geral, quando se busca compreender a globalização como um 
movimento que influi sobre a sociedade contemporânea, recorre-se à avaliação de que o 
mundo tem vivenciado um processo de intensificação e aceleração da interconexão 
 10 
global, oriundo de forças tecnológicas e econômicas em direção a um ambiente 
compartilhado (HELD; MCGREW, 1999; LIPSCHUTZ, 2010; CASTELLS, 2001). 
Entretanto, enquanto alguns estudos apontam para as particularidades da globalização em 
relação ao contexto contemporâneo, outras discussões caminham para análises mais 
céticas quanto à sua magnitude. 
De um lado, os hiperglobalistas buscam-se reforçar a ideia de que os Estados 
têm perdido força na medida que a atual dinâmica de fluxos de troca imposta pela 
globalização econômica permitiu ao capital corporativo intervir decisivamente na 
distribuição do poder econômico e da riqueza. Afinal, como a autoridade do Estado é 
circunscrita ao seu território, tentativas de regulação da economia nacional, poderiam ser 
contornadas com mais facilidade. E, em conjunção a esse fato, a consolidação das 
instituições multilaterais representariam, então, um vislumbre de uma civilização de 
mercado global (HELD; MCGREW, 2004). 
In this 'runaway world' nation states are becoming 'transitional modes 
of economic organization and regulation' since they can no longer 
effectively manage or regulate their own national economies […] In 
effect, the hyperglobalists hold, the autonomy and sovereignty of 
nation-states have been eclipsed by contemporary processes of 
economic globalization (HELD; MCGREW, 2004). 
Nesse ‘mundo em descontrole’, Estados-nação estão tornando-se 
modos transitórios de organização e regulação econômica já que eles 
não podem mais gerir e regular efetivamente suas próprias economias 
nacionais. [...] Na realidade, os hiperglobalistas sustentam que a 
autonomia e soberania dos Estados-nação têm sido eclipsadas pelos 
processos contemporâneos de globalização econômica (HELD; 
MCGREW, 2004, tradução minha). 
Em contraponto a essa visão, os céticos costumam-se argumentar que o aumento 
nos fluxos em escala mundial não é particular da atualidade e foi experimentado de forma 
semelhante no início do século XX (LIPSCHUTZ, 2010). Já a livre circulação de capital 
e o declínio do Estado de bem-estar social estariam sendo superestimados, tendo em vista 
que as nações mais fortes, na realidade, teriam consolidado sua dominância global, que 
as trocas restringir-se-iam ao nível regional e que ainda haveria continuidade da primazia 
da soberania e do poder nacional (GIDDENS, 2000; HELD; MCGREW, 2004). 
Em comparação à belle époque de 1890-1914, a intensidade da 
interdependência global contemporânea é consideravelmente 
exagerada. [...] Ao invés de uma nova ordem mundial, o sistema global 
 11 
pós-Guerra Fria tem testemunhado um retorno à velha geopolítica e ao 
neoimperialismo, por onde os Estados e forças sociais mais fortes 
consolidaram sua dominância global (HELD; MCGREW, 2004, 
tradução minha). 
By comparison with the belle époque of 1890-1914, the intensity of 
contemporary global interdependence is considerably exaggerated. 
[…]Rather than a new world order , the post Cold War global system 
has witnessed a return to old style geo-politics and neo-imperialism, 
through which the most powerful states and social forces have 
consolidated their global dominance(HELD; MCGREW, 2004). 
Uma terceira via busca transitar por esses dois polos explicativos, avaliando que, 
de fato, a globalização não é um acontecimento único do presente e tem suas origens em 
fluxos globais desde a pré-modernidade. No entanto, seus contornos contemporâneos 
fazem-na induzir uma reorganização e rearticulação espacial nos âmbitos políticos, 
econômicos, militares e culturais (HELD; MCGREW, 2004) que demarcariam a 
emergência de configurações diversas à tradicional antítese entre global e nacional 
(SASSEN, 2000). 
Nesse sentido, a ideia de território como container dos processos sociais e local 
de exercício exclusivo da autoridade estatal, conforme abordada pelas definições 
clássicas de Estado, estaria sendo redesenhada (SASSEN, 2000). A virtualização das 
atividades econômicas, políticas e sociais somada ao processo de desregulação da 
economia favorecido pela competição internacional poderia representar, de certa forma, 
uma diminuição da capacidade do Estado de controlar seu território. Todavia, essas 
mesmas atividades estão concentradas nos territórios nacionais, particularmente nas 
cidades (globais3) – mesmo que sua expressão ultrapasse esses limites espaciais –, 
dependendo assim de diversas infraestruturas e garantias estatais, como a manutenção dos 
contratos e dos direitos de propriedade, necessários à implementação do sistema 
econômico global (SASSEN, 2000). 
Portanto, a globalização passa a ser entendida não somente por seus aspectos 
econômicos, mas de forma holística, como uma transformação na escala de organização 
social que aumenta o alcance das relações de poder pelas principais regiões do mundo 
(HELD; MCGREW, 2004). 
 
3 Para Sassen (2000), as cidades globais são os locais onde os processos da globalização 
assumem formas concretas, funcionando como infraestruturas condutoras das trocas internacionais. Isso 
acontece devido ao contexto de enfraquecimento da autoridade formal exclusiva dos Estados sobre o 
território nacional que favoreceria a ascensão de atores e espaços sub e transnacionais nos processos 
políticos. 
 12 
Os transformacionistas argumentam que a globalização está criando 
novas circunstâncias econômicas, políticas e sociais, que, entretanto, 
estão servindo para transformar os poderes do Estado e o contexto em 
que ele opera de forma desigual. [...] A política não é e não pode mais 
ser simplesmente baseada em Estados-nação (HELD; MCGREW, 
1999, tradução minha). 
The transformationalists argue that globalization is creating new 
economic, political and social circumstances which, however unevenly, 
are serving to transform state powers and the context in which states 
operate. […] politics is no longer, and can no longer simply be, based 
on nation-states (HELD; MCGREW, 1999). 
Ou seja, na medida em que os avanços nas tecnologias de informação e 
comunicação diminuem virtualmente as fronteiras, cria-se um ambiente propício para a 
contestação de imperativos políticos, sociais e econômicos, já que acontecimentos, 
instituições ou pessoas de uma determinada localidade podem mais facilmente influenciar 
o destino de regiões geograficamente distantes (GIDDENS, 2000; HELD; MCGREW, 
2004). Assim, essas características contribuiriam para uma maior politização da vida 
social (HELD; MCGREW, 2004), bem como levariam a uma modificação no papel do 
Estado e do contexto em que ele opera, não mais podendo restringir-se única ou 
primeiramente ao ambiente nacional (CASTELLS, 2005; HELD; MCGREW, 1999). 
Dessa maneira, fica evidente que as novas dinâmicas propostas pela globalização 
e pelo novo paradigma tecnológico permitiram maior integração das redes de capital, 
bens, serviços, comunicação, informação, ciência e tecnologia, favorecendo o 
desenvolvimento de novas visões acerca das instituições, em linha com esse novo cenário 
(CASTELLS, 2005). 
 
2.3. Democracia e tomada de decisão: consentimento e participação 
Portanto, cabe analisar também como essas novas visões estão sendo apropriadas 
pelo Estado em relação à sua forma de governar. Ou seja, de que maneira o 
questionamento de imperativos originários do fenômeno da globalização e as 
possibilidades trazidas pelo avanço tecnológico podem incentivar modificações na 
relação governo-cidadão e nos processos decisórios de gestão pública. 
Historicamente, nas primeiras experiências democráticas da Grécia, a principal 
instituição responsável pelas deliberações de governo era a Assembleia, onde todos os 
 13 
cidadãos4 daquela cidade-estado poderiam participar (DAHL, 1994). Essas comunidades 
eram demarcadas social e geograficamente e possuíam poucos milhares de pessoas 
vivendo ao redor do centro urbano ou no campo, fatores que facilitavam e aceleravam a 
comunicação e o impacto de arranjos sociais e econômicos. A política era entendida como 
uma forma de expressão e realização da natureza humana, com todos os cidadãos 
debatendo, decidindo e aprovando as leis, sem a perspectiva moderna de distinção entre 
Estado e sociedade (HELD, 2006). Dessa maneira, o princípio da governança grega era a 
participação direta nos assuntos de Estado, com todos os cidadãos tendo amplo e 
facilitado acesso às funções públicas e aos gabinetes, e com as deliberações públicas 
baseadas no consenso, ao invés dos costumes ou do uso da força (RAAFLAUB, 1998; 
HELD, 2006). Origina-se desse modelo, a demokratia, ou seja, a forma de governo 
fundada na ideia de que o povo detém o poder nas decisões políticas (RAAFLAUB, 
1998). 
Na modernidade, o entendimento de democracia começa a consolidar algumas 
modificações em decorrências de alguns acontecimentos históricos. Entre essas duas 
épocas, a confluência do cristianismo com a política deslocou o centro de autoridade dos 
cidadãos para os representantes da vontade de Deus, reformulando os processos de 
decisão política. Posteriormente, a influência dos pensamentos de Maquiavel e Hobbes 
ajuda a construir a noção de separação entre Estado e sociedade, consequentemente, entre 
o governo e as pessoas (HELD, 2006). Além disso, a emergência dos Estados Nacionais 
a partir da ação unificadora e centralizadora do príncipe suplanta e absorve as cidades-
estados, transformando-as em unidades subordinadas (DAHL, 1994; BOBBIO, 2007). 
Ao longo desse processo, as decisões de governo afastam-se da influência direta dos 
cidadãos e, gradativamente, configura-se um novo conjunto de práticas e instituições 
políticas com objetivo de abarcar esses novos contextos: a representação passa a ser uma 
das essências das democracias modernas (DAHL, 1994) Afinal, parte-se do pressuposto 
de que seria impossível reunir frequentemente o povo para tomar as decisões de interesse 
público devido à grande população e extensão dos territórios (ROUSSEAU, s.d.; 
BOBBIO, 2007). 
Assim, uma das principais inovações da democracia representativa, em 
comparação à democracia direta dos antigos, refere-se ao controle das decisões 
 
4 Eram considerados cidadãos somente homens adultos, o que resultava na exclusão de 80 a 90% 
da população – mulheres, crianças, escravos e estrangeiros – do processo político (RAAFLAUB, 1998, 
p.34; HELD, 2006, p.13). 
 14 
governamentais, que passa a ser realizado por representantes escolhidos pela população 
através do voto, os quais agem como fiduciários dos eleitores (DAHL, 1994; HELD, 
2006). Logo, para que o cidadão possa participar diretamente das deliberações, é 
necessário concorrer ao cargo público eletivo e ganhar as eleições (DAHL, 1994). 
Para Dahl (2005), umas das características centrais da democracia como sistema 
de governo é sua contínua responsividade às preferências de seus cidadãos, considerados 
como politicamente iguais. Assim, para que essa situação se mantenha ao longo do tempo, 
todos os cidadãos plenos têm de ter garantidos os direitos de: formularsuas preferências; 
expressar suas preferências através de ação individual e coletiva; e tê-las igualmente 
consideradas na conduta do governo. Para o autor, essas três condições necessárias à 
democracia configuram-se como oportunidades de exercer oposição (competição 
política), logo, uma escala que refletisse a variação dessas garantias aos cidadãos entre 
países permitiria uma análise comparativa quanto ao processo de democratização. 
Entretanto, esses direitos poderiam ser restritos a um pequeno ou grande grupo de 
pessoas, portanto, variando a proporção da população que pode participar do sistema 
político (participação) (DAHL, 2005). A partir dessas duas dimensões – participação e 
competição política), segundo Dahl (2005), seria possível classificar regimes de acordo 
com sua posição em relação aos eixos (Figura 1). Dessa maneira, um regime localizado 
no canto inferior esquerdo seria uma hegemonia fechada. Ao se deslocar pelo trajeto I, o 
regime estaria vivenciando um movimento de liberalização, mas com pouca participação, 
tornando-se uma oligarquia competitiva. Já o trajeto II indicaria um movimento de 
inclusividade do regime, logo, tornando-se uma hegemonia inclusiva. O trajeto III 
representaria um movimento de democratização, contudo, o autor reforça a opção por 
utilizar a expressão poliarquia tendo em vista que nenhum sistema no mundo seria 
plenamente democratizado, mas, ainda assim, regimes fortemente inclusivos e 
amplamente abertos à contestação pública (DAHL, 2005). 
 15 
Figura 1. Dimensões teóricas de democratização 
 
Fonte: DAHL, 2005. 
Nas últimas décadas, a democracia, sob os princípios da representação, passa a 
ser vista como familiar e torna-se a principal forma de governo no mundo, atingindo a 
marca de 122 países em 2013 (DAHL, 1994; AVRITZER, 2002, PLATTNER, 2014), e 
sendo inclusive considerada atualmente como um valor universal (SEN, 1999). Contudo, 
paralelamente a esse aumento na presença de Estados democráticos no mundo, a 
democracia representativa tem sido colocada em cheque pelos cidadãos: baixas taxas de 
participação nas eleições, redução nos números de filiados aos partidos políticos, pouca 
confiança nos políticos, votos em novos partidos ou outsiders e baixo interesse geral na 
política são alguns dos fenômenos crescentes que têm assolado diversas democracias nas 
últimas décadas (MAINWARING, 2006; TORMEY, 2014). Portanto, mais do que uma 
crise da democracia representativa, o que tem sido observado por pesquisadores de 
diversos espectros ideológicos é uma contestação das práticas e instituições de 
representação, com efeitos limitados sobre a hegemonia do ideal democrático (TORMEY, 
2014). 
Dessa maneira, constata-se que o conceito de democracia como um sistema de 
governo que tenha, como uma de suas características, a qualidade de ser responsivo às 
 16 
demandas de seus cidadãos a partir da participação e competição política (DAHL, 2005) 
fica fragilizado no momento em que cresce a percepção de que partidos e políticos não 
representam as vontades e necessidades dos eleitores e afastam-se da ideia de serviço 
público como a expressão dos interesses coletivos à frente de necessidades individuais 
(TORMEY, 2014), sentimento esse potencializado por escândalos de corrupção 
(MAINWARING, 2006). Afinal, na medida em que uma grande quantidade de pessoas 
passa a integrar democracias pelo mundo e, consequentemente, participam do processo 
de escolha de seus representantes, as eleições tornam-se uma das maneiras de demonstrar 
a insatisfação com os resultados das decisões estatais, favorecendo a percepção de crise 
de representação (MAINWARING, 2006). 
Além disso, os efeitos da globalização, conforme evidenciado anteriormente, 
atingem diretamente as bases do modelo de Estado sobre o qual a democracia 
representativa consolidou-se. As complexidades impostas ao Estado-nação e sua 
territorialidade evidenciam que o destino dos cidadãos é também bastante influenciado 
por agentes externos e transnacionais, como organismos de cooperação internacional e 
organizações da sociedade civil de caráter global, sob os quais a população, muitas vezes, 
tem pouco ou nenhum poder de escolha (TORMEY, 2014). Ao mesmo tempo, as 
tecnologias de informação e comunicação (TIC) favorecem modelos mais horizontais de 
interação e participação baseados nas redes que permitem um novo tipo de ação coletiva 
para além das tradicionais formas de associação política. 
Na verdade, estamos vendo uma revolução em termos das maneiras e 
estilos da mobilização política, longe de pessoas ou partidos que 
representam, em direção a estilos e formas de política que buscam 
chamar atenção e contestar injustiças. [...] Novas ferramentas, novos 
repertórios de ativismo, engajamento e mobilização mostram que 
cidadãos podem organizar-se para além ou fora do mainstream 
(TORMEY, 2014, p.5, tradução minha) 
In effect we are seeing a revolution in terms of the manner and style of 
political mobilisation away from people and parties that represent 
towards styles and forms of politics that seek to draw attention to and 
contest injustices. […] New tools, new repertoires of activism, 
engagement and mobilisation mean that citizens can organise beyond 
or outside the mainstream (TORMEY, 2014, p.5) 
Observa-se, assim, que os questionamentos de algumas características da 
democracia representativa derivam das novas dinâmicas de poder e política que 
 17 
emergiram frente ao novo contexto contemporâneo (CASTELLS, 2015; TORMEY, 
2014). 
Por trás desse quadro de crise de representação e busca por mais democracia, 
BOBBIO (1997) afirma que há, hoje, a exigência de que a democracia representativa seja 
complementada ou até mesmo substituída pela democracia direta, pois, como Rousseau 
(s.d.) já ponderara, tem-se entendido que a soberania não pode ser representada. Afinal, 
uma das características da democracia representativa é sua capacidade de se perpetuar 
independente da participação da totalidade da população, seja porque exige pouco do 
demos, seja porque o percentual de eleitores que realmente votam não invalida a sanção 
da maioria. (BOBBIO, 1997; TORMEY, 2014). 
Ao se sentir pouco representado ou marginalizado, o povo tenderia a não ver o 
processo democrático como justo, encontrando poucas razões para participar de decisões 
que afetam sua vida e as considerando, muitas vezes, autoritárias. A solução passaria pela 
existência, conhecimento e incentivo a mais oportunidades de efetiva participação da 
população na tomada de decisão, já que, dessa maneira, haveria maior propensão ao 
engajamento, à percepção da participação como importante e a considerar as decisões 
coletivas como vinculatórias (HELD, 2006). Afinal, a participação também teria uma 
função educativa, conforme pontua Pateman (1970), de ensinar as pessoas a participarem, 
ganhando experiência em habilidades e procedimentos democráticos. 
A democracia participativa seria, então, uma derivação da democracia direta em 
que a sociedade cultiva uma preocupação pelos problemas coletivos e contribui para a 
formação de cidadãos bem informados com interesse contínuo nos processos de governo 
através de: 
 Participação direta dos cidadãos na regulação das instituições fundamentais 
da sociedade, incluindo local de trabalho e comunidade local; 
 Reorganização do sistema partidário, fazendo os representantes dos partidos 
prestarem contas diretamente aos membros dos mesmos; 
 Operação dos “partidos participativos” em estrutura de parlamento; 
 Manutenção de um sistema institucional aberto visando garantir a 
experimentação de novas formas de fazer política (HELD, 2006). 
Portanto, mais do que propor um novo caminho, a democracia participativa 
busca conciliar o consentimento com a deliberação, na medida em que une institutos dos 
sistemas representativos e diretos de participação popular na tomada de decisão de 
 18 
governo.Ou seja, a busca por mais democracia, evidenciada por Bobbio (1997), passaria 
mais pela penetração dos mecanismos democráticos de ambos os modelos nas diversas 
instituições da sociedade, do que por um rompimento com o sistema representativo. 
Logo, o caminho é transcender a corrente democratização do Estado em direção 
à democratização da sociedade, num processo de expansão do poder ascendente para a 
esfera das relações sociais, como a família, a escola e as organizações públicas e privadas, 
a partir da percepção de que as decisões políticas fazem parte da sociedade civil e, 
consequentemente, não há decisão política que não seja condicionada pelo que acontece 
dentro dela (BOBBIO, 1997). Assim sendo, ao deslocar o foco do Estado para a 
sociedade, percebe-se que as sociedades não são monocráticas, mas policráticas, ou seja, 
além do Estado, existem outras instituições de poder que, por esta razão, também devem 
estar sujeitas a procedimentos que garantam a prestação de contas das suas ações para 
toda a sociedade (BOBBIO, 1997; HELD, 2006) 
Outras teorias acerca da democracia foram elaboradas ao longo do tempo, em 
geral, bastante influenciadas pelo contexto do período. Bobbio (2007) menciona que, para 
autores gregos como Aristóteles e Platão, por exemplo, a democracia não tinha a 
conotação positiva como tem hoje. Ao povo eram atribuídos inúmeros vícios que os 
impediria de ter as qualidades necessárias a tomada de decisões políticas. Hoje, em geral, 
o debate sobre sistemas de governo considera que a democracia é parte integrante e 
necessária do Estado. Além disso, pontua o autor, há também a noção comportamental da 
democracia, que indica as regras que determinam como se deve chegar à decisão política, 
sem considerar seus fins. Em contraste a esse pensamento de democracia formal, haveria 
a democracia substancial que prioriza um certo conjunto de fins, em especial a igualdade 
jurídica, social e econômica, independente dos meios a serem adotados para alcançá-los 
(BOBBIO, 1997). 
Dentre essas inúmeras possibilidades de abordagem do tema democracia, 
priorizou-se a conceituação de Dahl (2005) tendo em vista que, assim como este trabalho, 
o autor busca observar características institucionais que poderiam influir no processo de 
democratização de uma sociedade. 
 
2.4. Design institucional e administração pública 
Diante deste contexto, é natural pensar que a administração pública também é 
influenciada pelas dinâmicas da sociedade. Ou seja, assim como as revoluções liberais do 
 19 
século XVIII, ainda sob o manto do autoritarismo, tiveram implicações sobre a modelo 
de organização do Estado dos anos seguintes; as duas grandes forças que delineiam a 
sociedade contemporânea – a globalização e a democracia – exigem também novas 
respostas às demandas oriundas desse novo cenário (BRESSER-PEREIRA, 2002, p.31). 
O Estado burocrático, baseado no paradigma weberiano racional-legal, que se 
consolidou entre o final do século XIX e o início do XX, caracterizou-se pela criação de 
mecanismos que trouxeram para a administração pública a separação entre público e 
privado, com objetivo de combater a corrupção e o nepotismo, dois aspectos da 
administração patrimonialista. Para tal, buscou-se organizar o aparato estatal em torno de 
três princípios – formalidade, impessoalidade e profissionalismo – visando consolidar um 
poder estatal que prezasse pela eficácia, mas relegando a segundo plano atributos como 
eficiência e desempenho (BRESSER-PEREIRA, 1998, p.26, BRESSER-PEREIRA, 
2001, p.2; SECCHI, 2009). Contudo, estes aspectos produziram um alto grau de 
hierarquização e controle procedimental de tarefas, da onde derivaram disfunções como 
o engessamento das organizações e um descolamento dos interesses dos cidadãos 
(SECCHI, 2009). 
Assim, com a consolidação do Estado de Bem-Estar Social na segunda metade 
do século XX e o consequente aumento das demandas por serviços públicos, bem como 
a ascensão do neoliberalismo, começa-se a buscar um modelo de administração pública 
que concentre esforços em tornar o Estado mais eficiente (BRESSER-PEREIRA, 1998, 
p.27). Ao invés de se falar em uma administração pública concentrada somente na eficácia 
do poder do Estado, característico do modelo burocrático, propõe-se uma Gestão Pública 
que, além de assumir sua eficácia, busca principalmente torná-lo mais eficiente 
(BRESSER-PEREIRA, 2001). Para isso, o modelo gerencial fundamenta-se em três 
princípios: descentralização, competição e incentivos (DUNLEAVY et al., 2005). Em 
termos práticos, diante desse novo paradigma, os servidores públicos adquirem mais 
autonomia e são estimulados a trabalhar por desempenho, ao mesmo tempo em que são 
desenvolvidos mecanismos de controle a posteriori das atividades públicas – em 
detrimento do controle passo-a-passo –, visando minimizar os riscos de corrupção e 
clientelismo favorecidos pela maior independência. Como consequência dessa maior 
autonomia, os gerentes públicos tornam-se mais responsabilizáveis pelos atos da 
administração pública e, portanto, mais suscetíveis à exigência de prestação de contas dos 
seus resultados pela sociedade (BRESSER-PEREIRA, 2002; BRESSER-PEREIRA, 
2001). 
 20 
Em outras palavras, a inovação do modelo gerencial, também chamado de Nova 
Gestão Pública (NGP), é a tentativa de reduzir as diferenças estruturais entre os setores 
público e privado, buscando neste setor mecanismos que tragam maior eficiência à 
administração pública, portanto, estimulando que o comportamento dos servidores 
públicos, agora denominados gerentes públicos, seja semelhante ao dos gerentes de 
empresas (LYNN, 2006). Como extensão desse conceito, o modelo propõe que os 
cidadãos sejam vistos como consumidores de serviços públicos, na medida em que a 
expansão do escopo dos mercados dificultou a diferenciação entre produtos públicos e 
privados, sob a ótica do cidadão (HOMBURG, 2004). Portanto, da mesma forma que a 
empresa tem mecanismos de responsabilização visando a prestação de contas para os 
proprietários e instrumentos de avaliação dos produtos pelos consumidores, a 
administração pública seguiria o mesmo exemplo, com o objetivo de garantir a prestação 
de contas e o feedback dos serviços públicos para a sociedade. Dessa maneira, garante-se 
que a avaliação dos serviços não ocorra somente pelos superiores hierárquicos, mas 
também possibilita que os consumidores/cidadãos possam participar de forma mais direta 
através dos mesmos instrumentos utilizados pelas empresas. Ou seja, caminha-se da 
orientação pelo processo, característico do modelo burocrático de administração pública, 
para a orientação para o produto, no modelo gerencial (HOMBURG, 2004). 
Entretanto, o modelo de organização do Estado proposto pela NGP tem sofrido 
críticas de diversas correntes de pesquisadores em administração pública por ter 
acarretado em algumas disfunções. Primeiramente, argumenta-se que a NGP favoreceu o 
pensamento de prazo mais curto e foco em metas estreitas e específicas, em detrimento 
do planejamento de longo prazo – principalmente devido ao processo de fragmentação 
das atividades –, diminuindo a coerência entre as ações da própria administração pública 
(DUNLEAVY, 1994, p.12; CHRISTENSEN; LAEGREID, 2007, p.11). Além disso, 
questiona-se também a ênfase única da NGP nos princípios de gestão do setor privado, 
portanto, deixado de lado peculiaridades setor público, como a ênfase no interesse 
público, ao mesmo tempo em que vislumbra-se maiores possibilidades de corrupção e 
dissociação dos interesses dos cidadãos, já que, na ausência de pressões contrárias, pode 
ser favorecida a influência de servidores públicos em cargos elevados na condução do 
processo de mudança, de acordo com seus interesses pessoais (ROBINSON, 2015, p.9; 
DUNLEAVY, 1994, p.12). Por fim, no tocante à participação dos cidadãos, observa-se 
que, embora haja essa preocupação na prestaçãodos serviços públicos, ela parece ainda 
incipiente diante da concepção de participação proposta pela democracia participativa e 
 21 
pelo contexto contemporâneo. Mais do que uma participação efetiva que pressuporia 
envolvimento, empoderamento e compartilhamento de responsabilidades no 
desenvolvimento e consumo dos serviços públicos, o modelo gerencial enfatiza o poder 
de sair, ao invés do poder da voz, levando a questionamento e críticas da população 
quanto à forma como são abordados os interesses públicos (HOMBURG, 2004; MOOTE; 
MCCLARAN; CHICKERING, 1997). 
Como alternativa, na última década, sugiram diversas correntes de pesquisadores 
de administração pública e ciência política que tem se dedicado a construir alternativas e 
aperfeiçoamentos para a gestão do setor público que transpassem os preceitos advogados 
pela NGP. Em geral, o conjunto desses pensamentos diversos costuma ser enquadrado 
sob a denominação de modelos pós-Nova Gestão Pública (MARGETTS; DUNLEAVY, 
2013, p.2; ROBINSON, 2015, p.4). O principal elemento de convergência entre essas 
abordagens é identificação dos cidadãos como drivers da reforma, através da ênfase na 
coparticipação na formulação e produção de políticas e serviços públicos. Além disso, os 
modelos pós-NGP também dedicam espaço para a necessidade de se retomar e aprofundar 
a coerência no âmbito da administração pública através de uma visão holística – em 
contraposição à fragmentação resultante da NGP –, e para o papel central da tecnologia 
como instrumento de aumento da responsividade aos cidadãos na administração pública, 
e não somente como um ambiente (virtual) de replicação das estruturas formais existentes 
desde a burocracia clássica (ROBINSON, 2015, p.11; LODGE; GILL, 2011, p.143; 
HOMBURG, 2004). 
 
2.5. Frameworks de participação na tomada de decisão 
A partir dessas considerações, fica evidente que a participação dos cidadãos nas 
instituições pode ser considerada, de certa forma, expressão de poder. Conforme pontua 
Arnstein (1969), a participação é uma maneira de redistribuição de poder que permite 
àqueles que estão excluídos dos processos políticos e econômicos correntes de 
assegurarem que serão incluídos no futuro e compartilharão os benefícios da sociedade 
afluente. 
É a estratégia pela qual os excluídos participam da determinação de 
como a informação será compartilhada, metas e políticas serão 
definidas, recursos de impostos serão alocados, programas serão 
operados e benefícios como contratos e patrocínios serão distribuídos. 
Em suma, é o meio pelo qual eles podem induzir reforma social 
 22 
significativa que lhes permita compartilhar dos benefícios da sociedade 
afluente (ARNSTEIN, 1969, p.1, tradução minha). 
It is the strategy by which the have-nots join in determining how 
information is shared, goals and policies are set, tax resources are 
allocated, programs are operated, and benefits like contracts and 
patronage are parceled out. In short, it is the means by which they can 
induce significant social reform which enables them to share in the 
benefits of the affluent society (ARNSTEIN, 1969, p.1). 
Contudo, naturalmente, nem toda participação é igual, podendo representar 
intensidades diferentes de influência sobre as instituições detentoras de poder. Afinal, há 
uma grande diferença entre o ritual vazio da participação e o verdadeiro poder de interferir 
nos resultados do processo (ARNSTEIN, 1969). Nesse sentido, a autora propõe a 
elaboração de uma escala de participação (Figura 2) que busca analisar o real poder de 
influência dos cidadãos no processo de decisão. Parte-se da manipulação, como a 
expressão do menor grau de participação – ou, efetivamente, a não-participação – até o 
controle dos cidadãos, a expressão máxima da participação. Com a simbologia de uma 
escada, a autora argumenta que, nos primeiros degraus – manipulação e terapia – não há 
participação, enquanto que os três degraus seguintes são classificados como tokenismo5, 
o momento em que os cidadãos começam a ganhar voz, mas não tem poder de assegurar 
que suas demandas serão atendidas. Somente a partir do sexto degrau o cidadão começa 
a realmente influenciar o processo de tomada de decisão (ARNSTEIN, 1969). 
Dessa forma, a escada de participação representaria uma disputa de poder entre 
os cidadãos que, ao tentarem subir os degraus, buscariam ter mais voz e as instituições 
controladoras que, intencionalmente ou não, acabam por limitar sua ascensão ao topo 
(COLLINS; ISON, 2006). 
 
5 De acordo com os dicionários Oxford e Merrian-Webster, tokenismo é a prática de fazer 
concessões simbólicas em relação a alguma coisa, com objetivo prevenir críticas e transmitir a aparência 
de que há um tratamento justo. 
 23 
Figura 2. Escada de participação dos cidadãos de Arnstein (1969) 
 
Fonte: ARNSTERN, 1969, p.217. 
Na mesma linha, Wilcox (2003) adaptou o modelo desenvolvido por Arnstein 
(1969), mas incluiu também outras duas dimensões (Figura 3). Além do nível de 
participação, para o autor, seria importante também considerar o estágio da participação 
e os diferentes stakeholders envolvidos no processo. Afinal, níveis de participação 
diversos seriam adequados para situações diferentes (WILCOX, 2003, p.8). Dessa 
maneira, observa-se que, contrastando com o pressuposto de Arnstein (1969) de que a 
participação em si é um objetivo a ser perseguido através da subida pelos degraus da 
escada, Wilcox (2003) avalia que cada caso deve ser analisado individualmente, de 
acordo com suas circunstâncias particulares. Quanto à escala de nível de participação, o 
autor elimina os degraus que representariam a não-participação e reconfigura a 
participação em cinco estágios (informação, consulta, decidindo juntos, agindo juntos e 
apoiando), conforme o grau de controle dos indivíduos envolvidos, sendo os três últimos 
considerados aqueles em que há efetivamente uma participação substancial. 
 24 
 Figura 3. Framework de participação de Wilcox (2004) 
 
Fonte: Wilcox, 2004, p.12 
Diversos autores têm revisitado os frameworks de Arnstein e Wilcox em estudos 
sobre a participação dos cidadãos: em governos locais (BERNER; AMOS; MORSE, 
2011); na análise do planejamento comunitário de cidades (STOUT, 2010); em países em 
desenvolvimento (CHOGUILL, 1996); nas decisões de políticas públicas em geral 
(BISHOP; DAVIS, 2002); e de desenvolvimento de mecanismos de participação 
(STEWART, 2007); e inclusive fora da administração pública como nas decisões de 
empresas quanto ao impacto ambiental de seus projetos (GREEN; HUNTON-CLARKE, 
2003). 
Assim como esses trabalhos, esta dissertação também buscará subsídios nesses 
frameworks de participação para o desenvolvimento de seu objetivo. O framework de 
participação dos cidadãos de Arnstein (1969) será explorado para analisar os objetos de 
estudo, ao lado da fundamentação de poliarquia de Dahl (2005). Além disso, a 
bibliografia revisitada acerca de democracia e dos modelos de gestão pública 
complementarão análise dos casos assistindo na construção de hipóteses explicativas para 
as reflexões advindas deste exercício. 
 
 
 
 
 
 
 25 
3. METODOLOGIA 
3.1. Questões de pesquisa 
 Sob esse pano de fundo, esta dissertação busca adentrar na esfera da 
participação dos cidadãos nas decisões de governo. Nesse sentido, através do estudo 
comparativo dos casos do Brasil e dos EUA, este trabalho terá como questão de pesquisa 
central, avaliar: 
 Se incentivos fiscais para doações através do Imposto de Renda da 
Pessoa Física (IRPF) são mecanismos de democracia participativa 
aplicados à gestão pública. 
Assim, para subsidiar a discussão da problemática central, buscar-se-á responder 
às seguintes perguntas adjacentes: 
 O incentivo fiscal da dedução do IRPF por doação foi utilizado, ao longo 
da história do Brasil e dos EUA, como mecanismo institucionalde 
estímulo à participação na distribuição desses recursos? 
 Os cidadãos têm algum tipo de poder de decisão sobre o destino dos 
recursos de renúncia fiscal, com base no modelo de participação na 
gestão pública proposto? Se sim, em que medida as pessoas efetivamente 
participam? 
 O estímulo dos incentivos fiscais para pessoas físicas é um modelo 
democrático de participação? 
 
3.2. Método de pesquisa 
Com vista a responder a essas questões, optou-se pela utilização do método do 
estudo de caso. De acordo com Yin (2008), cada método de pesquisa tem suas vantagens 
e desvantagens e a escolha deve considerar o tipo de pergunta de pesquisa, o controle do 
investigador sobre o evento e a temporalidade do fenômeno. O estudo de caso seria 
adequado para responder perguntas do tipo “como” e “por quê”, quando o investigador 
tem pouco controle sobre os eventos e há foco em um fenômeno contemporâneo. A 
principal vantagem do método do estudo do caso seria sua capacidade de manter uma 
visão holística no estudo de fenômenos complexos. 
Em linha, Goldenberg (1999) afirma que o estudo de caso não é uma técnica 
específica, mas um processo de análise que se propõe a debruçar sobre a unidade social 
estudada em sua totalidade, seja um indivíduo, uma instituição ou uma comunidade, 
 26 
visando compreendê-los em seus próprios termos. Para a autora, esse método busca reunir 
grande quantidade de informação detalhada, através de mergulho profundo sobre um 
fenômeno delimitado, com intuito de descrever a complexidade de um caso 
(GOLDENBERG, 1999). 
Já Merriam (1998) complementa ao afirmar que o estudo de caso pode também 
ser histórico em sua natureza. A autora afirma que uma das características do estudo de 
caso histórico (historical case study) é o emprego de técnicas comuns à historiografia, em 
especial o uso de material de fontes primárias (MERRIAM, 1998). Em consonância com 
o pensamento de Goldenberg (1999) e Yin (2008), Merriam (2009) reforça que este 
método de pesquisa ainda se baseia na descrição e análise holística do fenômeno, porém 
apresentadas sob uma perspectiva histórica. 
Para Amenta (2009), esse viés histórico no estudo de caso pode trazer riqueza 
explicativa por considerar a possibilidade da existência de causalidades e dependências 
históricas e conjunturais. Além disso, com esse método, permite-se ainda analisar, em 
detalhes, as circunstâncias que envolvem transformações estruturais e ocorrências 
extraordinárias. Contudo, conforme pontua o autor, o principal questionamento ao estudo 
de caso histórico advém da possibilidade de mal-entendidos ou da ausência de alguma 
informação básica sobre o caso comprometer todo o estudo (AMENTA, 2009). 
Além disso, este estudo também utilizará o método comparativo para nortear a 
análise dos casos. De acordo com Schneider e Schmitt (1998), a comparação busca 
descobrir regularidades e transformações, assim como construir modelos e tipologias 
através da identificação de continuidades e descontinuidades, semelhanças e diferenças, 
e explicitando as determinações gerais que orientam os fenômenos sociais. Para os 
autores, uma das principais vantagens desse método é trazer objetividade para pesquisa 
social na medida em que se foge da singularidade de um só caso, auxiliando na 
formulação e comprovação de determinadas hipóteses (SCHNEIDER; SCHMITT, 1998). 
Já Ragin (2014) aponta que o estudo comparativo demanda que cada caso seja observado 
em sua complexidade e integridade. Pondera, contudo, que as diferentes partes dos casos 
devem ser analisadas em relação aos outros casos e em termos do todo que eles formam 
e não de forma dissociada, portanto não objetivando generalizações estatísticas. 
Sendo assim, este trabalho terá natureza comparativa e multimétodo, utilizando-
se de ferramentas quantitativas para propor indicadores que comporão um framework que 
permita mensurar a participação política dos cidadãos e de instrumentos qualitativos 
como a análise histórico-normativa em formato longitudinal para avaliar continuidades 
 27 
de descontinuidades nos mecanismos de participação do IRPF. De acordo com Oliveira 
(2015), uma das vantagens do uso de diferentes métodos na mesma pesquisa é permitir a 
compreensão do fenômeno social a partir de diferentes pontos de vista (métodos), 
possibilitando a verificação, validação ou confirmação entre eles. Dessa maneira, 
conforme pontuam Yoshikawa et al. (2008), ao utilizar palavras (método qualitativo) e 
números (método quantitativo) conjuntamente, chega-se mais próximo a complexidade 
do fenômeno pelo fornecimento de dados divergentes ou convergentes entre os métodos. 
 
3.3. Coleta dos dados 
Esta dissertação foi construída, fundamentalmente, a partir de dados coletados 
através de pesquisa bibliográfica em estudos sobre a história do IRPF, e pesquisa 
documental, com a busca das legislações brasileira e americana acerca desse imposto. 
A pesquisa bibliográfica é um tipo de coleta de dados que se debruça sobre 
materiais já elaborados, constituídos principalmente por livros e artigos científicos (GIL, 
2002). De acordo com Gil (2002), uma das principais vantagens desse tipo de pesquisa é 
permitir que o investigador tenha acesso a uma ampla gama de fenômenos que poderia 
não ser acessível a uma pesquisa direta. Além disso, o autor também reforça que pesquisa 
bibliográfica é essencial ao estudo histórico, tendo em vista que alguns fatos passados 
não poderiam ser conhecidos senão por dados bibliográficos. Contudo, essa característica 
também deve ser vista com atenção, pois, a coleta em fontes secundárias pode apresentar 
informações equivocadas ou imprecisas, comprometendo o estudo em questão (GIL, 
2002). No presente estudo, foram utilizados os principais trabalhos que abordam o 
imposto de renda da pessoa física no Brasil e nos Estados Unidos de maneira ampla como 
Nobrega (2014) e Lindsey (2003). 
Já a pesquisa documental refere-se à coleta de dados a partir de materiais que 
não receberam tratamento analítico ou podem ser reestruturados para novos objetivos de 
pesquisa (GIL, 2002). De acordo com Gil (2002), estes documentos podem ser 
classificados como “de primeira mão”, quando se encontram conservados em arquivos de 
instituições públicas e privadas e não receberam tratamento analítico. Ou “de segunda 
mão”, quando já foram, de alguma forma, objeto de análise. A principal vantagem deste 
tipo de pesquisa é que os documentos representam uma fonte rica e estável de dados, 
sendo, portanto, fundamentais para o desenvolvimento de trabalhos de natureza histórica 
(GIL, 2002). Gil (2002, p.4) reforça ainda que pesquisas elaboradas com base em fontes 
 28 
documentais são importantes porque “proporcionam melhor visão desse problema ou, 
então, hipóteses que conduzem a sua verificação por outros meios”. Nesta dissertação, a 
pesquisa documental buscou abarcar as legislações que regeram o IRPF entre os anos de 
1913 e 2013 nos Estados Unidos e entre 1922 e 2013 no Brasil, ou seja, desde a sua 
criação até o último ano em que há demonstração consolidada deste imposto em ambos 
os países. Além disso, dedicou-se ao ano de 2013 para a construção da fotografia de 
participação dos países em perspectiva comparada. Toda a legislação pesquisada, tanto 
do Brasil quanto dos EUA, estava disponível online em páginas dedicadas ao histórico 
legislativo nos sites da Câmara dos Deputados, do Senado e da Presidência da República 
brasileiros, e no site da universidade de Cornell nos EUA. Quanto aos dados utilizados 
para a construção da fotografia de participação, além dos documentos disponíveis nos 
sites da Receita Federal do Brasil e do Internal Revenue Service, dados complementares 
foram obtidos através da Lei de Acesso à Informação (LAI) brasileira. 
Tanto na pesquisa bibliográfica quanto na documental, ateve-se exclusivamente 
aos dados relacionados ao imposto de renda da pessoa física em detrimento

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