Prévia do material em texto
Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o Editora CRV Curitiba – Brasil 2019 Luis Saboga-Nunes Rosane Aparecida de Sousa Martins Marta Regina Farinelli Cláudia Helena Julião (Organizadores) O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 2019 Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004 Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV Todos os direitos desta edição reservados pela: Editora CRV Tel.: (41) 3039-6418 - E-mail: sac@editoracrv.com.br Conheça os nossos lançamentos: www.editoracrv.com.br ESTA OBRA TAMBÉM ENCONTRA-SE DISPONÍVEL EM FORMATO DIGITAL. CONHEÇA E BAIXE NOSSO APLICATIVO! DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP) CATALOGAÇÃO NA FONTE Copyright © da Editora CRV Editor-chefe: Railson Moura Diagramação e Capa: Editora CRV Revisão: Os Autores P213 O papel da literacia para a saúde e educação para a saúde na promoção da saúde / Luis Saboga-Nunes, Rosane Aparecida de Sousa Martins, Marta Regina Farinelli, Cláudia Helena Julião (organizadores) – Curitiba : CRV, 2019. 198 p. Bibliografi a ISBN 978-85-444-3475-8 DOI 10.24824/978854443475.8 1. Saúde pública 2. Promoção da saúde 3. Literacia para a saúde 4. Educação para a saúde I. Saboga-Nunes, Luis. org. II. Martins, Rosane Aparecida de Sousa. org. III. Farinelli, Marta Regina. org. IV. Julião, Cláudia Helena. org. V. Título VI. Série. CDU 614 CDD 614 Índice para catálogo sistemático 1. Saúde pública 614 Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o Este livro foi avaliado e aprovado por pareceristas ad hoc. Comitê Científico: Ana Rosete Camargo Rodrigues Maia (UFSC) Carlos Leonardo Figueiredo Cunha (UFRJ) Cristina Iwabe (UNICAMP) Evania Nascimento (UEMG) Fernando Antonio Basile Colugnati (UFJF) Francisco Jaime Bezerra Mendonca Junior (UEPB) Janesca Alban Roman (UTFPR) José Antonio Chehuen Neto (UFJF) Juliana Balbinot Reis Girondi (UFSC) Jose Odair Ferrari (UNIR) Karla de Araújo do Espirito Santo Pontes (FIOCRUZ) Lucas Henrique Lobato de Araujo (UFMG) Lúcia Nazareth Amante (UFSC) Lucieli Dias Pedreschi Chaves (EERP) Maria Jose Coelho (UFRJ) Milena Nunes Alves de Sousa (FIP) Narciso Vieira Soares (URI) Orenzio Soler (UFPA) Samira Valentim Gama Lira (UNIFOR) Thiago Mendonça de Aquino (UFAL) Vânia de Souza (UFMG) Wagner Luiz Ramos Barbosa (UFPA) Wiliam César Alves Machado (UNIRIO) Conselho Editorial: Aldira Guimarães Duarte Domínguez (UNB) Andréia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR/UFRN) Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ) Carlos Alberto Vilar Estêvão (UMINHO – PT) Carlos Federico Dominguez Avila (Unieuro) Carmen Tereza Velanga (UNIR) Celso Conti (UFSCar) Cesar Gerónimo Tello (Univer. Nacional Três de Febrero – Argentina) Eduardo Fernandes Barbosa (UFMG) Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL) Élsio José Corá (UFFS) Elizeu Clementino de Souza (UNEB) Fernando Antônio Gonçalves Alcoforado (IPB) Francisco Carlos Duarte (PUC-PR) Gloria Fariñas León (Universidade de La Havana – Cuba) Guillermo Arias Beatón (Universidade de La Havana – Cuba) Jailson Alves dos Santos (UFRJ) João Adalberto Campato Junior (UNESP) Josania Portela (UFPI) Leonel Severo Rocha (UNISINOS) Lídia de Oliveira Xavier (UNIEURO) Lourdes Helena da Silva (UFV) Marcelo Paixão (UFRJ e UTexas – US) Maria de Lourdes Pinto de Almeida (UNOESC) Maria Lília Imbiriba Sousa Colares (UFOPA) Maria Cristina dos Santos Bezerra (UFSCar) Paulo Romualdo Hernandes (UNIFAL-MG) Renato Francisco dos Santos Paula (UFG) Rodrigo Pratte-Santos (UFES) Sérgio Nunes de Jesus (IFRO) Simone Rodrigues Pinto (UNB) Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA) Sydione Santos (UEPG) Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA) Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA) Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o SUMÁRIO APRESENTAÇÃO 11 Luis Saboga-Nunes Rosane Aparecida de Sousa Martins CAPÍTULO 1 LITERACIA PARA A SAÚDE: origens e implicações do conceito 13 Luis Saboga-Nunes Rosane Aparecida de Sousa Martins Marta Regina Farinelli Cláudia Helena Julião Edna Aparecida de Carvalho Pacheco CAPÍTULO 2 ENVOLVIMENTO & COMPROMISSO: reflexões acerca da implementação de um projeto em Literacia para a Saúde nos Açores (Portugal) 33 Carmen Maria Silva Maciel Andrade Luis Saboga-Nunes Helder José Alves da Rocha Pereira Helena Margarida Oliveira da Silva Maria da Piedade Lima Lalanda Gonçalves Mano Lúcia de Fátima Mota Ferreira Freitas Alberto Carlos Marques Duarte CAPÍTULO 3 PERFIL DA LITERACIA PARA A SAÚDE DE UMA POPULAÇÃO URBANA DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA 47 Otília Maria da Silva Freitas Maria Clementina de Freitas Nóbrega Morna Isabel Maria dos Santos Carvalho Gomes da Silva Gregório Magno de Vasconcelos de Freitas Gilberta Maria França Sousa Rita Maria César Sá Fernandes Vasconcelos Luis Saboga-Nunes CAPÍTULO 4 LITERACIA PARA A SAÚDE: revisitando o estado da arte com enfoque nos países da América do Sul 65 Ana Luiza Braz Pavão Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o CAPÍTULO 5 TENDÊNCIAS DE PESQUISAS SOBRE LITERACIA EM SAÚDE À PESSOA IDOSA: estudo bibliométrico 79 Terezinha Nunes da Silva CAPÍTULO 6 EDUCAÇÃO POPULAR: diálogos sobre promoção em saúde 93 Kéllen Campos Castro Moreira Marta Regina Farinelli Celeste Aparecida Pereira Barbosa CAPÍTULO 7 O OLHAR INTERDISCIPLINAR NA FORMAÇÃO NA RESIDÊNCIA INTEGRADA MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE DA UFTM 105 Priscila Maitara Avelino Ribeiro Marta Regina Farinelli Rosane Aparecida de Sousa Martins Josiani Julião Alves de Oliveira Isadora Catananti Ardenghi CAPÍTULO 8 EDUCAÇÃO PERMANENTE NO CENTRO REGIONAL DE REFERÊNCIA DE UBERABA, MG: contribuições para a atuação interdisciplinar e intersetorial 121 Ailton de Souza Aragão Andrea Ruzzi Pereira Cláudia Helena Julião Erika Renata Trevisan Regina Maura Rezende Rosimár Alves Querino CAPÍTULO 9 ABORDAGEM FAMILIAR: experiência de formação multiprofissional pela integração ensino-serviço na Estratégia Saúde da Família 131 Fernanda Carolina Camargo Bianca Nakamura Henrique Ciabotti Elias Jordana Moreira de Almeida Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o CAPÍTULO 10 A FORMAÇÃO CONTÍNUA DO PROESASUL COM PROFESSORES: a perspectiva da Literacia para a Saúde 149 Darclé Cardoso Roselita Sebold POSFÁCIO A LITERACIA PARA SAÚDE POR VÁRIAS MÃOS! 159 Cacildo Teixeira de Carvalho Neto Priscila Maitara Avelino Ribeiro Edilaine Dias Lima Denise Dilma da Silva Jaine Oliveira Rodrigues Miriam dos Santos Mirna Nunes da Silveira Souza APÊNDICES APÊNDICE I VERSÃO PORTUGUESA AUTORIZADA DO QUESTIONÁRIO EUROPEU DE LITERACIA PARA A SAÚDE (HLS-EU-PT).......................167 APÊNDICE II VERSÃO PORTUGUESA AUTORIZADA DO QUESTIONÁRIO EUROPEU DE LITERACIA PARA A SAÚDE EM PORTUGUÊS DO BRASIL (HLS-EU-BR)............................................................................169 APÊNDICE III MARCOS DA HISTÓRIA DO PROJECTO PROLISA E PROLISABR (PROMOÇÃO DA LITERACIA PARA A SAÚDE NA LUSOFONIA).........................................................................173 SOBRE OS AUTORES 187 Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o APRESENTAÇÃOEsta obra nasce da imposição da translação do conhecimento no campo da promoção da saúde, especificamente focando o tema da literacia & saúde. Várias escolas de pensamento podem ser referidas nos últimos anos que se centraram na exploração do que é literacia no campo da saúde, como é que esta pode ser adquirida, implementada, promovida e até considerada como estruturante do desenvolvimento humano. Entre estas está a que se desenvolveu particularmente com sede na Universidade de Maastricht a partir de 2007, designada por HLS-EU (Health Literacy Survey, Europena Union) a qual pretendeu estabelecer o maior consenso alguma vez conseguido nesta aglutinação de saberes entre a literacia e a saúde. A partir de um vasto grupo de peritos que se reuniu em Zurique na Suíça em 20 de Abril de 20071 a reunião de kick-off deste projeto iria dar origem a um projeto único, até hoje ainda irrepetível. Na verdade, embora muitas outras visões já existissem sobre literacia & saúde, todas elas eram o reflexo do pensamento de um ou alguns poucos autores, centrados em realidades locais únicas, focando muitas vezes perspectivas verticais e parcelares do campo da saúde. Com o projeto HLS-EU, no entanto, pela primeira vez, é conseguida a ambição de superar as fronteiras entre os estados, ultrapassar as barreiras da língua e das culturas e explorar o potencial da literacia & saúde num espaço geográfico mais abrangente. Assim foi proposto, neste desejo de melhor compreender o que de único faz o ser humano – esteja ele onde estiver como membro da grande família humana – uma visão holística do campo da saúde e potenciadora do bem-estar. Este aspeto transnacional, de base alargada de competências e saberes, procurando uma visão integradora do estado da arte neste cruzamento entre literacia & saúde, está na origem desta publicação. Com ela pretende-se partilhar alguns dos desenvolvimentos que o projeto HLS-EU teve na lusofonia, de um lado e do outro do Atlântico, em territórios como Angola, Brasil e Portugal. Sujeita à mesma matriz de pensamento, que visa olhar para além das barreiras geográficas, culturais, linguísticas ou sociais, para o mais profundo do que promove o bem- estar e qualidade de vida da pessoa humana, os projetos sucedâneos HLS-EU-PT (Portugal) HLS-EU-BR (Brasil) HLS-EU-AN (Angola) deram origem a várias explorações, algumas das quais serão aqui partilhadas. Neste contexto a literacia para a saúde é definida como a conscientização da pessoa aprendente e atuante 1 2007-04-20: tem lugar em Zurique o primeiro encontro que viria a dar origem ao projeto HLS-EU re- presentando a Alemanha – Manfred Dickersbach (coordination) Landesinstitut für den Öffentlichen Gesundheitsdienst; Katrin Engelhardt; Suiça: Jee Wang; Holanda: Mariel Droomers; Polónia: Barbara Niedzwiedzka Sofia Slonska; Itália: Paola Mosconi; Noruega: Tore Sørensen; Espanha: Albert Jovell; Maria Dolores Navarro; Grécia: Barbara Kondilis; Áustria: Juergen Pelikan; Inglaterra: Rachel Wells; Gill Rowlands; Portugal: Luis Saboga-Nunes. O objetivo desta reunião é lançar The „European Health Literacy Survey“ (HLS-EU) no contexto do Programme of community action in the field of public health” (public health programme) – European Union (call for proposals 2007). O dinamizador é o Institute of Public Health (lögd), Bielefeld, Northrhine-Westphalia em cooperação com a University of Zurich (Dr. Jen Wang). O projeto será submetido pela Universidade de Maastricht sendo Luis Saboga-Nunes, de Portugal um dos collaborative partners do projeto. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 12 no desenvolvimento das suas capacidades de compreensão, gestão e investimento, favoráveis à promoção da saúde (SABOGA-NUNES, 2014). Em Portugal, é criada a rede lusófona para a PROmoção da LIteracia para a SAúde (ProLiSa) construída por mais de 60 investigadores/instituições. Alguns dos resultados do seu envolvimento e esforço conjunto pode ser vislumbrado nos primeiros três capítulos desta obra: o primeiro focando o espaço lusófono em geral, o segundo o desenvolvimento do projeto na região Autónoma dos Açores, o terceiro explorando a visão HLS-EU-PT na região Autónoma da Madeira. Estes territórios, plantados no Atlântico a meio caminho entre Portugal continental e o Brasil, revelam como desde o planeamento, à advocacia com os governos regionais ou nacionais, ao estabelecimento de parcerias, se constrói uma abordagem estruturante da promoção da literacia no campo da saúde. É dado particular destaque à criação do ProLiSaBr no Brasil, o grupo de estudos e pesquisas PROmoção em comunicação, educação e LIteracia para a SAúde no Brasil – ProLiSaBr, inscrito junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), agência do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). Estabelecido em 2014, o ProLiSaBr tem como estratégia fomentar o debate, reflexões e a produção de conhecimentos no âmbito da promoção da literacia & saúde. A partir do 4º capítulo o olhar perspectiva-se a partir das terras do Sul, em que o Brasil desempenha um destaque de relevância. Assim, neste capítulo 4 é colocado o estado da arte com enfoque nos países da América do Sul sendo este secundado, no capítulo 5, com um aprofundamento sobre as pessoas de idade maior. Com o capítulo 6, pretendemos lançar um desafio sobre a promoção da saúde que olha para a construção do sentido humano na sua base popular. De modo a conseguir melhor explicitar este esforço seguem-se 4 capítulos que visam olhar para elencados na carta de Otawa e que são a base da promoção da saúde. Assim o capítulo 7 olha para a interdisciplinaridade na formação na residência integrada multiprofissional em saúde, da Universidade Federal do Triângulo Mineiro. No capítulo 8 o foco é a educação permanente no Centro Regional de Referência de Uberaba, em Minas Gerais. O capítulo 9 a abordagem é centrada na família e na experiência de formação multiprofissional pela integração ensino-serviço na Estratégia Saúde da Família. Por fim, o último capítulo desta obra, parte da experiência da formação contínua do Programa de Educação em saúde de Rio do Sul, com professores. Pretendem os autores desta obra robustecer o debate no contexto lusófono, do modus faciendi da promoção da saúde, com o qual depois de se olhar para o que é comum ao ser humano no exercício da sua cidadania, nos podemos voltar para o particular naquilo que é o reconhecimento do que caracteriza o individual. O objectivo é que ninguém fique para trás, mas num vasto movimento de promoção da equidade em saúde sejam lançados os alicerces para o desenvolvimento humano sustentável. Para isto corresponderá grandemente a literacia no campo da saúde. Luis Saboga-Nunes Rosane Aparecida de Sousa Martins Lisboa/Uberaba 2019. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o CAPÍTULO 1 LITERACIA PARA A SAÚDE: origens e implicações do conceito Luis Saboga-Nunes Rosane Aparecida de Sousa Martins Marta Regina Farinelli Cláudia Helena Julião Edna Aparecida de Carvalho Pacheco Introdução A Literacia para a saúde (LS) é um campo de investigação recente que se desen- volve mais acentuadamente na primeira década deste milênio, , mas que é reconhecida no topo da agenda da promoção da saúde (BRODER, et al., 2018). O termo literacy foi inicialmente utilizado pelos países anglo-saxónicos, o que explica o fato de terem sido estes países os que primeiro se preocuparam com os níveis de literacia da sua população. O termo literacia reflete muito mais que a capacidade de ler, escrever, usar a linguagem e a comunicação. De acordo com a definição da UNESCO: Literacia é a capacidade para identificar, compreender, interpretar, criar, comunicar e usar as novas tecnologias, de acordo com os diversos contextos (UNESCO, 2003). A literacia envolve um processo contínuo deaprendizagem que capacita a pessoa no alcançar dos seus objetivos, a desenvolver o seu potencial e o seu conhecimento, de modo a poder usufruir do seu máximo potencial de qualidade e bem-estar. No campo da saúde, a Organização Mundial da Saúde, ressalta que a literacia para a saúde (LS) representa o conhecimento e as competências que determinam a motivação e a capacidade dos indivíduos em terem acesso, compreenderem e usarem informação de modo a promover e a manter a saúde (OMS, 1986). A rede PROmoção da LIteracia para a SAúde (ProLiSa) (www.literacia-saude. info) (2012) e o grupo de estudos e pesquisas PROmoção em comunicação, educação e LIteracia para a SAúde no Brasil – ProLiSaBr (criado em 2014), inscrito junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), agência do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), são es- tratégias que foram desenvolvidas para fomentar o debate, reflexões e a produção de conhecimento no âmbito da promoção da saúde e literacia para a saúde. A partir da sua atividade baseada na intensa troca de ideias entre os membros dos grupos ProLiSa e ProLiSaBr, constatou-se que o uso do conceito literacia para a saúde ainda é bastante restrito no contexto acadêmico lusófono. Um exemplo disto está patente na ausência deste conceito entre os descritores de saúde da Biblioteca Virtual Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 14 em Saúde (BVS) – Brasil, sendo os termos alfabetização em saúde ou letramento em saúde, utilizados para a tradução para o português de health literacy. Nesta direção, este capítulo focaliza-se na análise dos termos usados no âmbito lusófono para traduzir health literacy e enfatiza os aspectos que determinam a relevância do uso do termo “literacia para a saúde” como foco de estudo, importante na área de saúde pública, quer no Brasil, Portugal ou Angola. O grupo de estudos e pesquisa ProLiSaBr e a aproximação ao termo literacia para a saúde A assistência à saúde no Brasil e em Portugal caracteriza-se em grande me- dida pelo modelo biomédico estando ausente de modo significativo a promoção da saúde (WILBERG, A., SABOGA-NUNES, L.; STOCK, C, 2019). Tal “opção” pelos serviços de saúde tem impacto direto na assistência à saúde da população e consequentemente para as respostas às demandas e necessidades da sociedade em termos de qualidade de vida e estilo de vida saudáveis. O modelo Biomédico tem-se caracterizado pela explicação unicausal da doença, pelo biologicismo, fragmentação, mecanicismo, nosocentrismo, recuperação e reabilitação, tecnicismo, especialização. A unicausalidade pressupõe o reconhe- cimento do agente etiológico, é este que deverá ser identificado e combatido. A simplicidade da unicausalidade reside em trabalhar apenas a relação causa- -efeito imediata. [...] O biologicismo pressupõe o reconhecimento da natureza biológica das doenças; se justifica na compreensão que a doença é causada por agentes biológicos (químicos e físicos estão incluídos), em corpos biológicos, com repercussões biológicas. No primeiro caso, associa-se à unicausalidade; no segundo, confere dimensão estritamente biológica ao ser humano, descontex- tualizando sua posição biográfica, familiar e social; e por último, ocupa-se da valorização da entidade estrutural patológica. [...] A especialização repercutiu positivamente na verticalização do conhecimento, o que permitiu um aprofun- damento das questões relacionadas aos aspectos diagnósticos e terapêuticos dos indivíduos doentes (CUTOLO, 2006, p. 17). O modelo Biomédico não inclui normalmente os determinantes sociais em saúde e as determinações sociais, como elementos que podem interferir no processo saúde e doença da população. Estabelece antes, uma proposta de assistência à saúde desconectada da realidade social. Assim a complementaridade do paradigma salu- togénico revela-se pertinente no contexto da promoção da saúde das populações (SABOGA-NUNES, 2019). Vários profissionais têm trazido um questionamento a este posicionamento, sa- lientando se não faria sentido perceber o ser humano para além do modelo biomédico. Vários estudos têm sido desenvolvidos neste sentido e a produção do conhecimento, tem vindo a abrir novas perspectivas relativamente à atenção à saúde da população. Portugal destaca na sua Constituição o direito à saúde, como um direito con- sagrado com a instalação da democracia, mas não define o que este direito implica. No Brasil, destaca-se a discussão acerca da concepção da saúde construída durante a VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986, na qual a saúde é vista como Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 15 [...] resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio-ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse de terra e acesso a serviços de saúde. É, assim, antes de tudo, o resultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida [...] (BRASIL, 1986). Nesta direção, há uma vertente de profissionais que reconhecem que as condições de vida e trabalho dos indivíduos e de grupos da população podem determinar a situação de saúde destes cidadãos. Romper com a concepção centrada na doença e na reabilitação e focar em ações de promoção e proteção da saúde ainda é, no entanto, um grande desafio tanto para os trabalhadores da saúde, como para os usuários dos serviços de saúde e comunidade em geral. A resolutividade da assistência à saúde ainda é identificada por alguns profissionais da saúde e pela população, por meio do diagnóstico individual da doença e pelos encaminhamentos para tratamento e cura posteriores a processos de adoecimento, ratificadas pelo poder do saber do médico. Ainda de acordo com a prática biomédica, além da determinação biológica, haveria uma normatização vertical, segundo a qual o médico seria detentor do conhecimento e o paciente visto de forma fragmentada e sem autonomia, sem voz ativa no processo decisório de sua própria propedêutica e terapêu- tica. Desse modo, a prática médica costuma ser prescritiva e autoritária, com predominância de uma visão restrita e curativa das doenças, em grande parte decorrente de um passado recente de um perfil epidemiológico em que preva- lecia doenças infectocontagiosas, muitas delas de elevada mortalidade, mas de baixa morbidade ou passíveis de cura (MORAES, 2012, p. 18). Mesmo no século XXI, com pesquisas, produções de conhecimento e novos olhares para a proposta de assistência à saúde da população, ainda prevalece a visão fragmentada e reducionista do que representa a saúde. Em diversas situações a assis- tência à saúde ainda é subalternizada à determinação biológica das doenças, ao saber médico, com intervenções focadas na especialização. Apesar dos avanços no contexto das pesquisas na área de saúde, do reconhe- cimento da necessidade e relevância do trabalho dos demais trabalhadores da área de saúde no Brasil (considerando as 14 profissões reconhecidas pelo Conselho Nacional de Saúde - Resolução nº 287, de 8/10/98) ainda há vários desafios para o estabelecimento no Brasil de um Sistema Único de Saúde - SUS em detrimento de um “Sistema Único da Doença” ou do “Serviço Nacional de Saúde” perante a realidade de um “Sistema Nacional de Doença” em Portugal (SABOGA-NUNES, 2006). Uma das estratégias para ampliar o debate para além do modelo biomédico na política de saúde pode ser conseguido pela apropriação de conhecimentos pelos cidadãos e o reconhecimento das influências das condições de vida e de trabalho na saúde e qualidade de vida de cada cidadão. A partir do acesso a informação e ao conhecimento é possível a tomada de consciência pelo coletivo sobre a realidade social, as determinaçõesda sociedade, Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 16 as consequências das contradições de interesses entre capital e trabalho e sobre a necessidade de luta e resistência para garantir a efetividade dos direitos sociais, em especial o direito à saúde. Colocar a conscientização na base deste processo, como Paulo Freire⁸ gos- tava de propor, levará cada cidadão a ser um ator decisivo na garantia da sustentabilidade. Esta é uma viagem que não pode ser feita de modo vicário. Mas também não pode ser feita de modo autoritário, nem para satisfazer uma função ou papel social. O envolvimento e o empenho de cada um mostram-se necessários. Para que resulte, para que aconteça, o remo individual terá de ser posto na água, e ir em busca das origens da SAÚDE (SABOGA-NUNES; FREITAS; CUNHA, 2016, p. 15). Para romper com um modelo de atenção à saúde centrado no doente ou na doença é necessário fomentar a participação social da sociedade, em especial dos usuários do SUS ou do SNS, assumindo papel ativo nos processos de tomada de decisão frente às situações vividas no processo saúde-doença. Provavelmente, a primeira etapa seria uma análise consequente do conceito de saúde. No lugar da definição atrás indicada da OMS, que acentua uma perspectiva na qual há lugares marcados (onde o estatuto de ser/estar doente ou saudável são definidos pela organização social atual que estabelece esses lugares marcados com padronizações como a CID10), a saúde deveria ser entendida como um contínuo. Em vez de elementos distintos, a saúde e a doença são integradas num contínuo disfuncionalidade/ funcionalidade máxima (ease-(dis)ease) no qual todos os indivíduos estão incluídos, progredindo ou regredindo nele em relação aos seus polos (SABOGA-NUNES; FREITAS; CUNHA, 2016, p. 10). Neste contexto, o grupo ProLiSa e ProLiSaBr identificou a literacia para a saúde como um modelo operacional que possibilitaria conseguir esse movimento e reconhecer competências para acessar, compreender, avaliar e aplicar as informações relacionadas à saúde a partir das demandas dos indivíduos e dos grupos de modo a progredir rumo ao polo de máxima funcionalidade (SABOGA-NUNES, et al., 2019). A literatura indica que a expansão dos níveis de literacia para a saúde pode contribuir para a ampliação das perspectivas de controle social dos cidadãos sobre as políticas públicas e o papel do Estado. Mas também, alargam as possibilidades de controle das pessoas sobre a sua saúde, a sua capacidade para procurar informação e acessar os serviços e a sua autonomia para a construção de um estilo de vida saudável. Na realidade acadêmica brasileira o uso do conceito de Literacia para a Saúde ou Literacia em saúde, teve seu registro pela primeira vez em 1998, segundo Peres et al. (2017, p. 1591). Os grupos ProLiSa e ProLiSaBr tem desenvolvido vários esforços para implementar a socialização deste conceito e apresenta-se no posfácio deste livro o histórico da emergência do conceito e as suas produções científicas a ele agregadas, fruto da atividade dos membros do grupo ProLiSa. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 17 Discussão filológica do conceito de health literacy em português no Brasil Na atualidade enfatiza-se a necessidade de fortalecimento de modelos de atenção à saúde focados nas políticas de promoção da saúde bem como na sua proteção e recuperação. Este é um pressuposto no qual assentam algumas so- ciedades democráticas que olham para a saúde como um direito do cidadão e se organizam para materializar esse direito, por meio de sistemas e de serviços de saúde. Estes sistemas podem intervir a três níveis: ao nível da cura da doença, da sua prevenção ou da sua promoção. A política de saúde implementada no Brasil a partir da efetivação dos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir de 1988, tem apontado a necessidade de aprofundamento de competências no âmbito da promoção da saúde, qualidade de vida e estilo de vida saudáveis para a formação dos profissionais de saúde e também para os usuários. A alocação de recursos e as estratégias usadas em cada um destes níveis con- cretizam o plano de considerar que cada cidadão é merecedor do direito à saúde, como objetivo inalienável da condição humana. O campo da promoção da saúde requer considerar uma multiplicidade de fatores para sua efetivação. No âmbito da organização e planejamento ressalta-se o acesso da população ao conhecimento e informações em saúde, aos cuidados de saúde, à qualidade, à segurança e efetividade da política pública de saúde. Por isso, investimentos em intervenções baseadas na evidência científica e nas melhores práticas, a qualifi- cação e educação permanente dos recursos humanos, entre outros, são elementos fundamentais para fortalecer os princípios da promoção da saúde. Neste âmbito utilizam-se alguns conceitos para tentar explicitar esta capa- cidade dos cidadãos em se apropriarem, de modo autônomo, do conhecimento, transformando-o em subsídios que lhes garantam um papel mais ativo na promoção da sua saúde ou gestão da doença. Uma vasta literatura no campo da promoção da saúde e gestão da doença conduz-nos à necessidade de considerar o contributo da “health literacy”. Na medida em que se pressupõe a sua relevância, também para o bem-estar daqueles que utilizam o Português como sua língua materna, constata-se neste âmbito um estado incipiente de investigação. Entre os conceitos apontados na literatura para designar o desenvolvimento de capacidades e competências para promover a saúde, ou melhor, gerir condições de doença, destaca-se o conceito “health literacy” (World Health Organization [WHO], 2013) em português traduzido por “literacia para a saúde” (LS). De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Literacia em Saúde pode ser entendida como “o grau em que as pessoas são capazes de acessar, compreender, avaliar e comunicar informações, para envolver-se com as demandas de diferentes contextos, a fim de promover e manter boas condições de saúde ao longo da vida” (WHO, 2009). Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 18 Na tradução do conceito “health literacy” para o português, encontra-se uma complexidade filológica que importa analisar, dada a ausência de discussão sobre esta questão. Algumas possibilidades de tradução poderiam ser “alfabetização em saúde”, “literamento¨”, “letramento” ou “literacia” . O conceito health literacy tem sido traduzido no Brasil ou por “alfabetização em saúde” e/ou “letramento em saúde”. No entanto o significado destes termos não apresenta coerência com a compreensão que na língua inglesa (de onde é originário o conceito de health literacy) pode ser encontrado. Com base nestes indicadores serão abordadas a seguir as reflexões acerca das semelhanças e diferenças entre os termos “literacia para a saúde” e “alfabetização em saúde” e/ou “letramento em saúde” bem como a pertinência do seu uso. O vocábulo “alfabetização” apresenta concepções e análises distintas a partir das várias áreas e ciências como a educação, linguística, psicolinguística, psicologia, sociologia. A “alfabetização” é muitas vezes identificada como uma ação focada na aprendizagem da leitura e da escrita. Assim o vocábulo “literacia” tem vindo a ser utilizado para recobrir com um novo conceito áreas que vão além das capacidades de leitura e de escrita: pretende distinguir-se de alfabetização por não ter em conta exclusivamente o grau formal de escolaridade a que esta, tradicionalmente, estava ligada. Enquanto alfabetização refere à condição de se ser (ou não) iniciado na língua escrita, independentemente do grau de domínio que dela se tenha, o conceito de literacia adquire um significadomais vasto, referindo capacidades de utilização da língua escrita e da leitura de forma crítica. Assim, alfabetização refere um conhecimento obtido, estável, enquanto que litera- cia designa um conhecimento processual, em aberto (DELGADO-MARTINS, 2000). O termo literacy foi inicialmente utilizado pelos países anglo-saxónicos, o que se explica pelo facto de terem sido estes os que mais cedo se preocuparam com os níveis de literacia da sua população. Tal como definida, a literacia é então um conceito mais geral do que ler e escrever, incluindo não só a competência e os usos da leitura e da escrita mas também as funções que a leitura e a escrita desempenham na formação e na acumulação de procedimentos, leis e textos que constituem o corpo principal da cultura histórica (OLSON, 1999). O grau crítico nesta exploração é que o ser humano só pode sentir-se totalmente realizado quando se assume como ser autónomo. Para conseguir-se ser autónomo não basta “saber ler ou escrever” (alfabetização). É preciso mais do que isso: é ne- cessário ter capacidade crítica sobre o que se lê e escreve. Capacidade para integrar, mudar ou manter atitudes, comportamentos e valores. A isto chama Paulo Freire conscientização. Assim a autonomia precisa da conscientização como a emancipação precisa de autonomia (algo tão bem explorado com a Pedagogia Crítica de Paulo Freire). Deste modo a literacia seria esse estágio de desenvolvimento, que depois da alfabetização em saúde ter sido conseguida, cada ser humano se emancipa e com a sua autonomia, uma busca salutogênica (salus: saúde + génesis: origens) da sua realização de vida é estabelecida (SABOGA-NUNES, 2019). É interessante reparar que já nas suas publicações, Freire (1990) sente neces- sidade de transformar o conteúdo associado ao conceito de alfabetização, talvez Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 19 porque nenhuma outra palavra/vocábulo estivesse acessível, para fazer a ruptura que ele preconizava. Deste modo no lugar de introduzir um novo conceito (deixando o conceito de alfabetização prosseguir com a sua noção original) Paulo Freire lança o repto de re-definir alfabetização afirmando que a “alfabetização não é um jogo de palavras; é a consciência reflexiva da cultura, a reconstrução crítica do mundo humano, a abertura de novos caminhos”. Nesta direção, pensamos que completaríamos o desafio lançado por Paulo Freire, se em vez de continuar a usar um vocábulo que remete para um significante próprio e estabilizado, utilizássemos um novo vocábulo ainda com o seu significante por construir, especialmente no Brasil, transportando consigo uma nova ambição para a explicitação que é necessária ser conseguida. Utilizando um outro conceito (literacia em vez de alfa- betização) estaríamos seguros de que a ambiguidade se esbateria e a ruptura necessária se estabeleceria. Assim ficaria saliente que cada pessoa ao se apropriar das informações e conhecimentos acerca da promoção da sua saúde e da prevenção ou cura da doença, poderá transformá-los em instrumentos para fomentar um projeto pessoal que garanta a efetivação de ações comprometidas com o atendimento das demandas sociais das pessoas. Para além de alfabetização também o vocábulo “literamento” aparece esporadica- mente, embora ele não tenha significado pois não é um conceito que esteja plasmado nos dicionários de língua portuguesa no Brasil ou em Portugal. Parecido com este, o vocábulo letramento – mais usado no seio dos especialistas da educação e linguística – começou a ser utilizado no Brasil a partir da segunda metade da década 1980. Segundo Soares (2004, p. 8), no Brasil a discussão do letramento surge sempre enraizada no conceito de alfabetização, o que tem levado, apesar da diferenciação sempre proposta na produção acadêmica, a uma inadequada e inconveniente fusão dos dois processos, com prevalência do conceito de letramento. O termo letramento tem as suas raízes nas palavras “letra” - littera (latim) - e o termo “cy” - aponta qualidade, condição ou estado. A partir daí o vocábulo “letramento” corresponde à condição de ser letrado. Não se questiona aqui, que fique claro, a relevância da aprendizagem da língua escrita para ampliar a participação dos sujeitos em atividades sociais. O que se questiona é que isso não inclua outras perspectivas de conhecimentos, relevantes para a formação de sujeitos cidadãos, críticos. A proposta de leitura do mundo ampliada pela leitura da palavra, de Paulo Freire, se coaduna melhor com o que se constrói aqui. Não concordamos com a aproximação entre a noção de letramento e a proposta de leitura do mundo de Freire. A noção de letramento tem sido associada a práticas sociais de leitura e escrita; a leitura de mundo extrapola estas práticas em natureza e caráter, especialmente pelo viés filosófico que envolve (GOULART, 2014, p. 48). Ao contrário de “literamento”, a expressão “literacia”, que também tem a sua ori- gem na mesma raiz, consta dos dicionários de língua portuguesa, de edições recentes em Portugal. Este conceito instalou-se, acomodando-se à prática da língua escrita e falada, sendo aplicado às diferentes variantes e campos do saber. Assim, a sua apropriação pelo campo da saúde, constituir-se-ia na expressão “Literacia da Saúde”, “Literacia em Saúde” Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 20 ou “Literacia para a Saúde” (LS). Tais expressões começaram a ser assim usadas nos países da lusofonia. Ressalta-se ainda, segundo Peres (2017, p. 1596) que no Brasil as publicações científicas abordando o conceito de literacia em saúde surgiram efetivamente como tema de interesse dos pesquisadores brasileiros após a implementação da Política Nacional de Promoção da Saúde. Significados e significantes dos conceitos de literacia e saúde Além das diferenças na tradução do termo health literacy para o português, atrás discutidas, há ainda outra questão importante que nos obriga a repensar no conceito: para aglutinar o termo literacia a saúde, a língua portuguesa exige uma preposição “em” ou “da” etc. Conforme explorado por Saboga-Nunes (SABOGA-NUNES 2014), preferir a composição filológica “literacia” para exprimir em Português “literacy” não elimina a complexidade da caracterização do conceito “health literacy”. Assim, abordar o construto que agrega “literacia” e “saúde” levar-nos-á a uma análise filológica personalizada quando, a partir do agregador, iremos estabelecer perspectivas diferenciadas entre “literacia em saúde” e “literacia da saúde”. “Literacia em saúde” remeter-nos-á para uma externalidade ao sujeito da saúde, um locus externo ao indivíduo, que está para além de si próprio, e em relação ao qual ele pode desenvolver maior ou menor grau de apropriação. Por outro lado, “literacia da saúde” colocar-nos-á perante a internalidade da saúde, como uma componente intrínseca ao indivíduo. Aqui, o locus da discussão centrar-se-á no próprio ator, que se relaciona com o tema como algo que lhe é intrínseco, pertencente a si mesmo (SABOGA-NUNES 2014). Continua Saboga-Nunes explicitando que a adoção de uma ou de outra perspectiva não é necessariamente desprovida de consequências. O foco na “literacia em saúde” poderia levar a supor que a saúde, que se constrói fora do indivíduo, pode ou não ser por ele apropriada. Alguém/entidade superior/estado teria a função de determinar os parâ- metros que caracterizam a saúde, cabendo ao indivíduo a sua apropriação (no campo da saúde mental, por exemplo, o consumo de bebidas alcoólicas pode ser determinado pelo Estado que regula o seu consumo e/ou teores da sua concentração). Esta posição poderia implicar uma supervisão (mais ou menos determinista e paternalista) sobre os níveis da aquisição de “literacia em saúde” de cada cidadão. O outro contexto,“literacia da saúde”, poderá remeter-nos para a conscientização do que ajuda a potenciar a saúde do indivíduo, sendo ele não só um conceito (dinâmico), i.e. em desenvolvimento do que é a sua saúde, mas também o modo como encontrará recursos para promovê-la. Neste caso, a pessoa tem, por exemplo, consciência de que ingerir bebidas alcoólicas altera suas funções vitais. Porém, confrontado com um argumento externo tal como o que é fortemente pro- movido pela indústria de que “beber um copo de vinho à refeição faz bem à saúde”, mas consciente dos malefícios do álcool, e conhecendo a alternativa de receber os benefícios apontados aos flavonóides (por meio da simples ingestão de um ou dois bagos de uvas Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 21 pretas), encontraria na sua “literacia da saúde” um argumento para uma adoção de com- portamento emancipador. Teríamos, assim, a emancipação da pessoa aprendente perante determinantes sociais e econômicos, fortalecendo a sua capacidade crítica no que respeita à promoção de sua saúde e a sua autonomia. Embora as propostas anteriormente referidas não se excluam mutuamente antes se completam, a procura de um elemento agregador destes dois conceitos poderia ser conseguida em “Literacia para a Saúde” (LS). A “literacia para a saúde” cobriria as duas dimensões referidas. Assim a literacia para a saúde é definida como a conscientização da pessoa aprendente e atuante no de- senvolvimento das suas capacidades de compreensão, gestão e investimento, favoráveis à promoção da saúde (figura 1) Saboga-Nunes (2014). Esta definição surge da complementaridade entre a definição de “literacia da saúde”, como uma componente intrínseca ao indivíduo, e a definição de “literacia em saúde” que remete para uma externalidade ao sujeito da saúde. Esta definição compreende a agre- gação dos recursos intrínsecos e/ou extrínsecos da pessoa, tendo por base o paradigma salutogênico de Antonovsky e a abordagem da Pedagogia Crítica de Paulo Freire. Deste modo, teríamos a “literacia da saúde”, isto é, a literacia sobre a (sua) saúde, acerca da (sua) saúde secundada pela “literacia em saúde”, perspectivada como o gra- diente de assimilação que apresenta o indivíduo relativamente ao tema da saúde, sendo ou não por si apropriada. Para isto acontecer, no sentido de poder medir literacia para a saúde, o Questionário European Health Literacy Survey foi introduzido no contexto da língua portuguesa fazendo-se aqui a sua apresentação no contexto Brasileiro (European Health Literacy Survey - HLS-EU-BR) e no contexto português (European Health Li- teracy Survey - HLS-EU-PT)(ambos apresentados no posfácio). A operacionalização do conceito de LS aponta uma estratégia para o seu diagnóstico a partir das dimensões/ indicadores a seguir referidos. Figura 1 – Modelo estruturante para a concepção e operacionalização da literacia para a saúde Fonte: Luis Saboga-Nunes, Literacia para a saúde e a conscientização da cidadania positiva (Adaptado de HLS-EU Conceptual Model: Sorensen, K et al.. 2012: Health literacy and public health: A systematic review and integration of definitions and models, BMC Public Health, 12(80)). Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 22 Colocar a tónica na “literacia para a saúde” (LS) poderá impulsionar o indivíduo, de ator secundário na promoção da sua saúde para potagonista deste processo, em que ele ganha poder sobre a sua saúde e persistentemente contribui para a sua melhoria (conceito de Promoção de Saúde, carta de Otawa). Somente deste modo se verifica o modus faciendi da participação social, em que cada cidadão não se limita a ser um ator coadjuvante da sua saúde, mas antes, constitui-se no sujeito da sua construção rumo ao polo de máxima funcionalidade. Comunicação e Literacia para a Saúde Conforme pode ser explicitado anteriormente, a construção da LS está forte- mente ligada à comunicação. Poder-se-á identificar também uma relação direta entre a perspectiva da LS, a educação e comunicação em saúde. A educação para a saúde pode ser vista como resultado de combinações de experiências de aprendizagem, com o uso de diferentes tecnologias e ferramentas, vivenciadas pelos usuários dos serviços de saúde com o objetivo de fortalecer seus conhecimentos e atitudes no contexto da política de saúde, logo fortemente intervindo na criação da literacia para a saúde. A comunicação em saúde é reconhecida como uma estratégia importante no contexto da política de saúde, especialmente no âmbito da promoção da saúde. Abor- dar a comunicação no campo da saúde aponta a necessidade de que se reconheça o papel de todos os sujeitos na efetivação do direito à saúde. Além disso, ratifica a percepção de que é necessário identificar os diversos sentidos, experiências, concep- ções e discursos estabelecidos entre os indivíduos e a vida em sociedade. Com isso, a apreensão do conhecimento e sua apropriação enquanto elemento essencial para que cada cidadão reflita sobre sua saúde e os determinantes e condicionantes para a sua qualidade de vida, também devem considerar a dimensão subjetiva do ser social. Portanto, a LS aponta para a importância do fortalecimento das ações no âmbito da educação para a saúde, bem como no contexto da comunicação em saúde, de modo a alcançar indicadores positivos de saúde e qualidade de vida da população. Esta afirmação obriga a uma reflexão sobre o que se entende por “saúde”. Sem esta análise, e posterior consenso sobre cada uma das suas representações sociais, compromete-se a natureza e a identidade do pilar em referência. Deste modo, um dos riscos assumidos é o de prevalecer a concepção de saúde unicamente pela ausência de doenças. Para isto a LS desempenha um papel crucial. Outro aspecto central é a operacionalização do conceito de literacia para a saúde (HLS-EU) e como se procede à sua avaliação. Neste contexto também o grupo ProLiSa e ProLiSaBr trouxeram o seu contributo através dos estudos que têm envolvido a discussão em torno da tradução, retroversão e validação do questioná- rio que operacionaliza este conceito (HLS-EU-PT, HLS-EU-BR). Um outro livro (no prelo) complementará o que aqui se apresenta analisando detalhadamente as questões de medição e resultados encontrados com a utilização deste questionário. Tal livro apresentará também uma descrição das várias iniciativas de trans- lação do conhecimento que mapeam o percurso percorrido neste esforço seminal. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 23 Em Portugal o instrumento foi designado pela sigla HLS-EU-PT, (Questionário HLS-EU-PT disponível no apêndice 1) depois de adaptado e validado em 2013, no contexto da Rede Lusófona para a Promoção da LS (www.literacia-saude.info) (SABOGA-NUNES; SØRENSEN; PELIKAN, 2014b). Foram ainda realizados estudos adicionais com vista à aferição da LS nacional a partir da aplicação de outras utilizações do mesmo instrumento, ainda que com algumas alterações e em diferentes amostras (COSTA; SABOGA-NUNES; COSTA; 2016). Quando comparando com os outros grupos populacionais na Europa, constata- -se que apresentam níveis mais baixos de literacia para a saúde, sendo que somente 13.8% tem literacia para a saúde excelente e 26.2% tem literacia para a saúde su- ficiente. Assim 61% teria uma literacia para a saúde comprometida, neste estudo realizado com uma amostra de conveniência de 983 habitantes de Portugal. Figura 2 – Resultados da avaliação da literacia para a saúde em oito países europeus (n=7380) e numa amostra de Portugal (n=983) Fonte: Saboga-Nunes L, Sørensen K, Pelikan J. The role of health literacy to prevent/control the global burden ofnon-communicable diseases: results of the validation in the Portuguese context of the European Health Literacy Survey (HLS-EU-PT) [abstract/oral presentation]. In: Congresso Nacional de Saúde Pública, 4, Lisboa, Forúm de Lisboa, 2 e 3 de outubro de 2014. Lisboa: DGS; 2014. Em Angola os estudos desenvolvidos sobre a literacia para a saúde permitiram explorar novos caminhos para a promoção da saúde neste continente Africano. As- sim em Luanda numa amostra de conveniência (SANTOS, 2016) constatou-se 56.8 % dos inquiridos têm um nível de Literacia para a Saúde precário. Num trabalho desenvolvido na província do Huambo, junto da etnia ovimbundu (RICARDO, 2018) constatou-se, também numa amostra de conveniência, que 81.4% apresentam uma literacia para a saúde baixa. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 24 No Brasil, o grupo Prolisabr, vinculado à Universidade Federal do Triângulo Mineiro iniciou estudos acerca da literacia para a saúde e posteriormente, em ar- ticulação com docentes e pesquisadores vinculados à Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio grande do Sul – UNIJUI procedeu à adaptação cultural do Questionário HLS-EU-PT para o português brasileiro. (Questionário HLS- -EU-BR). Responsável por este desenvolvimento o grupo de estudos e pesquisas ProLiSaBr - PROmoção em comunicação, educação e LIteracia para a SAúde no Brasil criado em 2014 a partir de articulações de pesquisadores da Universidade Federal do Triângulo Mineiro e pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) da Universidade NOVA de Lisboa, de modo a promover espaço de discussão e produção de conhecimentos entre os países que compõe a chamada Lusofonia. O ProLiSaBr está cadastrado no grupo de diretório do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, no Brasil. Os membros atuantes são devidamente cadastrados na plataforma do CNPq, nas seguintes categorias: pesquisador (professor universitário), técnico assistente de pesquisa (profissional com graduação) e auxiliar de pesquisa (acadêmico de graduação e pós-graduação). O grupo ProLiSaBr está vinculado ao Instituto de Educação, Letras, Artes, Ciências Humanas e Sociais (IELACHS) da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM, cuja linhas de pesquisa são: Educação, comunicação, tecnologias e literacia; – Interface educação, saúde, políticas públicas e literacia para a saúde e – Políticas e práticas de Educação, Saúde e Serviço Social. O ProLiSaBr é um grupo formado por pesquisadores, discentes da graduação e pós-graduação, profissionais de áreas afins, egressos dos Programas de Gradua- ção e Pós-Graduação na área de Ciências Humanas, Sociais e da Saúde, técnicos e colaboradores convidados de outras IES, no Brasil e no exterior. Ao longo destes 5 anos o grupo de estudos e pesquisas no Brasil, o ProLiSaBr tem realizado atividades no âmbito do ensino, pesquisa e extensão além de produzir conhecimentos em forma de publicação e apresentação de resumos, artigos e capí- tulos de livros. Aliado a tais atividades é importante salientar as articulações com docentes e profissionais de outras instituições e cidades para fomentar as discussões e troca de experiências sobre o tema foco – literacia para a saúde. Desde 2014 destaca-se a articulação em diversos estudos, disponibiliza- ção de material científico e autorização para uso do questionário HLS-EU-BR para pesquisas científicas de práticas cotidianas bem como pesquisas científicas vinculadas a programas de pós-doutorado no Brasil e no exterior. Tais estudos e investigações foram realizados por profissionais da saúde (área de Odontolo- gia) vinculadas à Prefeitura Municipal de Rio do Sul – Santa Catarina, aluna de pós-graduação stricto sensu da Universidade Federal de Santa de Catarina; profissional (área de Enfermagem) vinculada à Universidade Federal da Paraíba; parceria com profissional (área de Medicina) da Fundação Osvaldo Cruz - FIO- CRUZ/Rio de Janeiro e da área de Serviço Social junto à Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho – UNESP/Franca. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 25 Ainda em 2018 foi estabelecida uma articulação entre a Rede Lusófona de Literacia para a Saúde (Portugal) Serviço Nacional da Industria – SESI (Rio Grande do Sul/BR) e Prolisabr (Uberaba/MG) para o desenvolvimento de capacitação e posteriormente a realização de pesquisa junto ao público alvo daquela instituição. Tal pesquisa em andamento será apresentada em publicação posterior. Considerações finais O conceito de literacia para a saúde expressa hoje um campo complexo, am- pliando as perspectivas para adoção de estratégias e políticas de saúde efetivas para a promoção da saúde. Sendo a sua utilização relativamente recente quer em Portugal, no Brasil ou Angola, mais estudos deverão aprofundar a temática nestas e noutras latitudes onde o Português é usado como língua de comunicação. A literacia para a saúde é uma estratégia que contribui para a viabilização de um SUS ou de um SNS mais eficaz e eficiente. O reforço da LS contribuirá para a gestão e o investimento de cada um na sua saúde de modo informado e consciente. Quando cada cidadã/o compreender como pode buscar as origens da sua saúde, constatar-se-á que promover a saúde pode ser bem mais proveitoso do que a profilaxia da doença, custa menos sofrimento e exige menores investimentos (SABOGA-NUNES, 2016). Para isto, o contributo da LS é hoje considerado incontornável perante os determinantes de contexto pessoais, ambientais e sociais. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 26 REFERÊNCIAS ALFERES, M. A. Alfabetização e letramento: Tecendo relações com o pensamento de Paulo Freire. Revista Eletrônica FEATI, Ibaiti, PR, v. 5, n. 1, s/p, 2007. APOLINARIO D. et al. Short Assessment of Health Literacy for Portuguese- speaking Adults. Rev. Saúde Pública, v. 46, n. 4, p. 702-711, 2012. Disponí- vel em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034- -89102012000400015&lng=pt&nrm=iso>. Epub 10-Jul-2012. Acesso em: 20 maio 2014. ISSN 0034-8910. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102012005000047. ARAUJO, I. S.; CARDOSO, J. M. Comunicação e saúde. Rio de Janeiro: FIO- CRUZ, 2007. BARBOSA, C. A. P. et al. Adaptaçâo transcultural e validaçâo do questionàrio europeu de alfabetizaçâo em saúde (HLSUE) para o Brasil (HLS-EU-BR): Estra- tégia para o estudo da alfabetizaçâo em saúde no Brasil. In: XXVI CONGRESSO DELL'ALASS, 2015, Ancona. Anais... Barcelona: Editora da ALASS, 2015. v. 1. p. 134-135. BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Sistema Único de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde. 2007. Disponível em: <http://www.conass.org.br>. Acesso em: 8 maio. 2019. ______. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, 19 set. 1990. ______. Ministério da saúde. VIII CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. Relatório final, Brasília, 1986. ______. Política Nacional de Atenção Hospitalar (PNHOSP). Portaria nº 3.390, de 30 de dezembro de 2013. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/sau- delegis/gm/2013/prt3390_30_12_2013.html>. Acesso em: 8 mar. 2019. ______. Política Nacional de Promoção da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2006a. Disponível em: < http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_na- cional_promocao_saude_3ed.pdf > Acesso em: 8 maio. 2019 BRÖDER J. et al. IUHPE Position Statement on Health Literacy: a practical vision for a health literate world. Global Health Promotion, v. 25, n. 4, p. 79-88, 2018. https:// doi.org/10.1177/1757975918814421 BUSS, P. M. Promoção dasaúde e qualidade de Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 27 vida. Ciênc. saúde coletiva, v. 5, n. 1, 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232000000100014&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 16 out. 2014. CANDEIAS, N. M. F. Conceitos de Educação e de Promoção em Saúde: mudanças indi- víduos e mudanças organizacionais. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 31, n. 2, abr. 1997. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034->. Acesso em: 1 maio. 2019. CARVALHO, G. S.; JOURDAN, D. Literacia em Saúde: A Importância dos Contextos Sociais. In: JÚNIOR, C. A. O. M.; JÚNIOR, A. L.; CORAZZA, M. J. (Orgs.). Ensino de Ciências: múltiplas perspectivas, diferentes olhares. Curitiba: Editora CRV, 2014. p. 99-122. ISBN: 978-85-444-0028-9. CAVACO, A; SANTOS, A. L. Avaliação da legibilidade de folhetos informati- vos e literacia em saúde. Rev. Saúde Pública, v. 46, n. 5, p. 918-922, out. 2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034- -89102012000500019&lng=pt>. Acesso em: 20 maio. 2019. doi: http://dx.doi. org/10.1590/S0034-89102012000500019. COSTA, A. et al. Avaliação do nível de literacia para a saúde numa amostra portuguesa. Observações: Boletim Epidemiológico. v. 17, IIª série, p. 38-40. Disponível em: <http:// repositorio.insa.pt/bitstream/10400.18/4111/1/Boletim_Epidemiologico_Observa- coes_N17_2016_artigo9.pdf>. Acesso em: 10 fev. 2019. CUTOLO, L. R. A. Modelo Biomédico, reforma sanitária e a educação pediátrica. Arquivos Catarinenses de Medicina, v. 35, n. 4, p. 16-24, 2006. FARINELLI, M. R. et al. Permanent education and health literacy: contributions for the training professional. Revista Família, Ciclos de Vida e Saúde no Contexto Social, v. 5. 2017. Disponível em: <http://seer.uftm.edu.br/revistaeletronica/index.php/refacs/ article/view/2263>. Acesso em: 25 abr. 2019. FREIRE, P. Ação Cultural para a liberdade e outros escritos. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981. ______. Conscientização: teoria e prática da libertação, uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Moraes, 1980. ______. Educação e Mudança. Tradução de Moacir Gadotti e Lillian Lopes Martins 27. ed. [S.L.]: Paz e Terra, 1979. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 28 FREIRE, P.; MACEDO, D. Alfabetização: leitura do mundo leitura da palavra. Tradução de Lólio Lourenço de Oliveira. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. GOULART, C. M. A. O conceito de letramento em questão: por uma perspectiva dis- cursiva da alfabetização. Bakhtiniana, São Paulo, v. 9, n. 2, p. 35-51, ago./dez. 2014. INSTITUTE OF MEDICINE (IOM). Health literacy: Improving health, health systems, and health policy around the world: Workshop summary. Washington, DC: The National Academies Press, 2013. JULIAO, C. H. et al. Estratégias para o fortalecimento da literacia para a saúde: a experiência com programas de rádio e vídeos educativos. Suplemento Revista Saúde em Redes, v. 2, n. 1. 2016. Disponível em: <http://conferencia2016.redeunida. org.br/ocs/index.php/congresso/2016/paper/view/3272>. Acesso em: 4 maio 2019. MARTINS, R. et. al. Health promotion through health literacy in Portugal and Bra- zil: the PROLISA (BR) experience. Atención Primaria, v. 48, espec cong 1, n. 10, 2016. World Congress of Health Research, 3, Viseu, Portugal, p. 29-30 sep. 2016. Disponível em <http://www.elsevier.es/es-revista-atencion-primaria-27-articulo- -symposiums-X021265671659362X>. Acesso em: 4 maio 2019. MARTINS R.; SABOGA-NUNES, L. The challenges of epistemological valida- tion to Brazil of the European Health Literacy Survey (HLS-EU-BR)]. Atención Primaria, v. 46, espec cong 1, n. 12, 2014. World Congress of Health Research, 2, Viseu, Portugal, p. 7-8 oct. 2014. Disponível em: <file:///C:/Users/Documentos/ Downloads/S0212656714700691_S300_en.pdf>. Acesso em: 4 Maio 2019. MORAES, G. V. de O. Influência do Saber Biomédico na Percepção da Relação Saúde/Doença/Incapacidade em Idosos da Comunidade. Dissertação de Mes- trado, FIOCRUZ – Belo Horizonte, 2012. p. 18. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Literacia em saúde. 1998. Disponível em: <http://www.insa.pt/sites/INSA/Portugues/AreasCientificas/PSDC/AreasTra- balho/LiteraciaSaude/Paginas/inicial.aspx.>. Acesso em: 10 maio 2019. PERES, P. C. N. et al. Literacia em saúde no Brasil: estudo cienciométrico. EN- CICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, v. 14, n. 25, p. 1589-1599, 2017. RIBEIRO, P. M. A. et al. Promoção em Comunicação, Educação e literacia para a saúde no Brasil: contribuições de um grupo de pesquisa. Revista da Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 29 Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (SOCESP), v. 27, 2017. Disponível em :<http://www.socesp.org.br/publicacoes/revistas.asp?ck=53#. WuEIycgvzIU>. Acesso em: 25 abr. 2019. RICARDO, S. Literacia para a saúde na provínca do huambo. Caracterização da literacia para a saúde através do instrumento HLS-EU-PT® de uma amostra da população ovimbundu e suas Implicações em saúde pública. Dissertação de Mestrado em Saúde Pública: XVIII Curso de Mestrado em Saúde Pública, 2018. ROJO, R. Alfabetização e letramento: sedimentação de práticas e (des)articulação de objetos de ensino. Perspectiva, Florianópolis, v. 24, n. 2, p. 569-596, 2006. SABOGA-NUNES, L. Compreender o cidadão e fortalecê-lo na gestão do stress: introduzindo o conceito do sentido interno de coerência. Revista de Saúde Pública, Portugal, v. 16, n. 4, p. 25-31, 1998. ______. Do SND (Sistema Nacional de Doença) para o SNS (Serviço Nacional de Saúde). Postgraduate Medicine, jun. 2006. ______. Literacia para a saúde e a conscientização da cidadania positiva. Revista Referência, III Série – Suplemento, p. 95-99, 2014. ______. O sentido de coerência: operacionalização de um conceito que influen- cia a saúde mental e a qualidade de vida. Dissertação, Escola Nacional de Saúde Pública, UNL, Lisboa – PT, 1999. SABOGA-NUNES, L. et al. Cross-Cultural Adaptation and Validation to Portu- guese of the European Health Literacy Survey (HLS-EU-PT). Aten Primaria, v. 46, n. 13, 2014a. SABOGA-NUNES, L.; MARTINS, R. A. S. The challenges of epistemological validation to Brazil of the european health literacy survey (HLS-EU-BR). Atención Primaria, Barcelona. ed. impresa, v. 46, p. 12-12, 2014. SABOGA-NUNES, L.; SØRENSEN K. The European Health Literacy Survey (HLS-EU) and its Portuguese Cultural Adaptation and Validation (HLS-PT). Aten- ción Primaria, v. 45, n. 46, p. 1-9, 2013. SABOGA-NUNES, L.; BITTLINGMAYER UH; OKAN, O. Salutogenesis and health literacy: the health promotion simplex! In: OKAN, O. et al. (Eds.). 2019. International Handbook of Health Literacy. Research, practice and policy across the lifes-pan. Bristol: The Policy Press, University of Bristol, England (U.K.). Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 30 SABOGA-NUNES, L.; FREITAS, O. S.; CUNHA, M. Renasceres®: um modelo para a construção da cidadania em saúde através da literacia para a saúde. Revista Servir, v. 59, n. 1, p. 7-15, 2016. SABOGA-NUNES, L.; SØRENSEN, K.; PELIKAN, J. M. Hermenêutica da lite- racia em saúde e sua avaliação em Portugal (HLS-EU-PT). VIII CONGRESSO PORTUGUÊS DE SOCIOLOGIA 40 ANOS DE DEMOCRACIA(S): progressos, contradições e prospetivas, Évora, 2014c. SANTOS, O. O papel da literacia em Saúde: capacitando a pessoa com excesso de peso para o controlo e redução da carga ponderal. Endocrinologia, Diabetes & Obesidade, v. 4, n. 3, p. 127-133, jul./set. 2010. SANTOS, T. Literacia para a saúde nocontexto angolano contributos para a validação do instrumento de avaliação da literacia para saúde - European health literacy survey (hls-eu-pt®): Dissertação de Mestrado em Saúde Pública: XVII Curso de Mestrado em Saúde Pública, 2016. SOARES, M. B. Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, v. 25, p. 5-16, 2004. ______. Letramento: um tema em três gêneros. 2. ed. Belo Horizonte: Autên- tica, 1998. SORENSEN, K. et al. Health literacy and public health: a systematic review and integration of definitions and models. BMC Public Health, v. 12, p. 80, jan. 2012. SORENSEN, K. et al. Health literacy in Europe: comparative results of the Euro- pean health literacy survey (HLS-EU). Eur J Public Health, v. 25, n. 6, p. 1053- 1058, 2015. SORENSEN, K. et al. Measuring health literacy in populations: illuminating the design and development process of the European Health Literacy Survey Questio- nnaire (HLS-EU-Q). BMC public health, v. 13, n. 948, out. 2013. TEIXEIRA, J. A. C. Comunicação em saúde. Relação técnicos de saúde – utentes. Disponível em: <http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/aps/v22n3/v22n3a21.pdf>. Acesso em: 9 jun. 2019. UNESCO. Education in a multilingual world. United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization, 2003. Disponível em: < http://www.unesco. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 31 org/new/en/communication-and-information/resources/publications-and-commu- nication-materials/publications/full-list/education-in-a-multilingual-world-unesco- -education-position-paper/ >. Acesso em: 10 mar. 2019. UNESCO. Literacy: a UNESCO perspective. 2003. Disponível em: <http://unes- doc.unesco.org/images/0013/001318/131817eo.pdf>. Acesso em: 26 nov. 2018. WORLD HEALTH ORGANIZATION. European health care reforms: citizens’ choice and patients’ rights. Copenhagen: World Health Organization, 1996. ______. Health 2020. A European policy framework and strategy for the 21st century, The Regional Office for Europe of the World Health Organization, Co- penhagen. 2013. Disponível em: <http://www.euro.who.int/en/publications/policy- documents/health-2020.-a-european-policy-framework-and-strategy-for-the-21st- century-2013>.Acesso em: 20 nov. 2018. ______. Health for all for the twenty-first century: the health policy for Europe. Copenhagen: WHO Regional Office for Europe, 1997. ______. Health Literacy: the solid facts. Copenhagen: World Health Organiza- tion, 2013. ______. The 7th Global Conference on Health Promotion: promoting health and development closing the implementation gap. Nairobi, Quenia, out. 2009. Dispo- nível em: <http://www.who.int/healthpromotion/conferences/7gchp/Programme. pdf?ua=1>. Acesso em: 15 mar. 2019. WILBERG, A.; SABOGA-NUNES, L.; STOCK, C. Are we there yet? Use of the Ottawa Charter action areas in the perspective of European health promotion profes- sionals. J Public Health (Berl.) 2019. https://doi.org/10.1007/s10389-019-01108-x Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o CAPÍTULO 2 ENVOLVIMENTO & COMPROMISSO: reflexões acerca da implementação de um projeto em Literacia para a Saúde nos Açores (Portugal) Carmen Maria Silva Maciel Andrade Luis Saboga-Nunes Helder José Alves da Rocha Pereira Helena Margarida Oliveira da Silva Maria da Piedade Lima Lalanda Gonçalves Mano Lúcia de Fátima Mota Ferreira Freitas Alberto Carlos Marques Duarte Introdução O potencial da Literacia como dinamizadora do desenvolvimento humano foi amplamente reconhecido e valorizado pelas Nações Unidas e a instituição da “A Década da Literacia” (2003-2012) veio dar expressão pública e global a este movi- mento (UNESCO, 2003). A utilização do conceito aplicado ao campo da saúde é uma realidade mais recente sendo considerada como um dos grandes desafios globais para a Promoção da Saúde no século XXI (NUTBEAM; KICKBUSH, 2000). De facto, esta realidade assume-se como fator crucial no empoderamento em saúde dos cidadãos, com implicações relevantes na equidade em saúde, na redução das desigualdades, no nível de saúde e bem-estar dos cidadãos bem como na diminuição da utilização abusiva dos serviços de saúde (NUTBEAM, 2000, 2008; MITIC; ROOTMAN, 2012; SØRENSEN et al., 2012; WHO, 2013) algo por demais relevante quando o objetivo é o de atingir um nível de literacia crítica e emancipatória. A tradução Health Literacy para a língua portuguesa tem dado lugar a diferentes variações na conexão entre Literacia e Saúde que nos remetem para perspectivas de abordagem distintas e não coincidentes: “literacia em saúde”, “literacia na saúde”, “literacia da saúde” ou “literacia para a saúde”(SABOGA-NUNES, 2014). É esta última designação, Literacia para a Saúde, que este projeto adota como referência uma vez que se coloca a tônica na “[…] capacidade de lidar com a informação sobre saúde, nomeadamente no que diz respeito ao seu acesso, compreensão, in- terpretação, avaliação, aplicação e utilização em diversas situações e ao longo do ciclo de vida” (COSTA et al., 2016, p. 38). Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 34 Neste entendimento o estudo de Sørensen et al. (2012, p. 10) – tendo por ponto de partida o cruzamento das dimensões de literacia para a saúde (acesso, compreen- são, apreciação e aplicação da informação relevante para a saúde) com três domínios fundamentais de saúde (Cuidados de saúde, Prevenção de Doença, Promoção da Saúde) – identificam uma matriz de competências necessárias ao desenvolvimento de um adequado nível de literacia em cada um dos domínios referidos. Esta matriz revela a complexidade da problemática subjacente ao estudo e ao desenvolvimento da literacia, tornando evidente que o desenvolvimento das com- petências necessárias não decorre apenas de um investimento individual, mas, na sua essência, se inscreve no decurso de processos sistémicos, articulados entre os diferentes setores da comunidade/sociedade, assumindo-se os contextos educativos como espaços privilegiados para o desenvolvimento integrado de competências fundamentais para a promoção dos diferentes tipos de literacia (SØRENSEN et al., 2012; WHO, 2013). Por sua vez no que respeita às instituições de saúde, reforçando esta ideia, Brach et al. (2012) sugerem que as organizações de saúde promovam uma cultura na qual toda a equipa, com formação abrangente, ajude a criar ambientes favoráveis de Literacia para a Saúde, tornando-se em Organizações Amigas da Literacia para a Saúde. Mas o foco da promoção da Literacia para a Saúde não se esgota nas instituições de saúde ou nas instituições educacionais e nos seus profissionais. A abordagem intersectorial revela-se como mais ajustada para garantir que os diferentes atores se encontram comprometidos e que cada setor ou parceiro tem uma visão clara da sua responsabilidade. Mitic e Rootman (2012) a propósito do desenho de uma abordagem sistêmica para a promoção da Literacia para a Saúde no Canadá, definem, entre outros aspetos, a necessidade de desenvolvimento de esforços conjuntos de cinco tipos de parceiros-chave: (i) as instituições de governo (quer ao nível nacional, regional ou local); (ii) o setor da Saúde (instituições e profissionais); (iii) o setor da Educação (ao nível básico, pós-secundário ou de aprendizagem ao longo da vida); (iv) os locais de trabalho; (v) as instituições comunitárias (instituições culturais, profissionais, religiosas, etc.). Segundo os mesmos autores cada um dos setores deve possuir uma clara visão do seu papel em três componentes fundamentais: 1) o desenvolvimento do conhecimento; 2) a construção de infraestruturas e parcerias; 3) a conscientizaçãoe capacitação (MITIC; ROOTMAN, 2012). Da conjugação da intervenção dos cinco atores chave em função dos três componentes fundamentais será expectável uma dinâmica sistémica que permita elevar os níveis de literacia para a saúde numa determinada comunidade. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 35 A Literacia para a Saúde de um indivíduo ou de uma comunidade pode ser avaliada com recurso à identificação do nível das capacidades aceder, compreender, apreciar e aplicar informação relevante em relação com diferentes determinantes sociais e ambientais com interesse e impacto para a Saúde sendo definida como “a conscientização da pessoa que aprende e atua no desenvolvimento das suas capacidades de compreensão, gestão e investimento, favoráveis à promoção da saúde” (SABOGA-NUNES, 2014). Esta definição remete para o foco em recursos intrínsecos e/ou extrínsecos da pessoa, tendo por base o paradigma salutogénico de Antonovsky e a abordagem da Pedagogia Crítica de Paulo Freire. No que respeita à população portuguesa, Portugal regista um baixo nível de literacia para a saúde (SABOGA-NUNES 2014), quando este é comparado com vários países europeus (HLS-EU CONSORTIUM, 2012). A este propósito, o relatório síntese “Literacia em Saúde em Portugal” (FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN; CIES/IUL, 2015, p. 7) compara Portugal com oito países euro- peus e conclui, também, que “os valores médios nos índices de literacia em saúde (geral; cuidados de saúde; prevenção de doenças e promoção da saúde) são sempre ligeiramente mais baixos em Portugal do que a média europeia”. A necessidade de aumentar a Literacia para a Saúde nas comunidades tem sido, nas últimas décadas, uma preocupação na definição de políticas de saúde. Portugal reconhece, no seu Plano Nacional de Saúde (2012-2016 - revisão e extensão a 2020), como eixo estratégico para a cidadania em saúde, a necessidade de realização de estudos sobre literacia e comportamentos dos cidadãos, apostando num sistema de saúde centrado no cidadão ativo, integrado nos processos de tomada de decisão em áreas relacionadas com a saúde. A nível nacional, o programa para a saúde do XXI Governo constitucional (2015-2019) estabelece como prioridade promover a saúde através de uma nova ambição para a Saúde Pública, pela criação de um Programa Nacional de Educação para a Saúde, Literacia e Autocuidados (DESPACHO nº 3618-A/2016). No que concerne à Região Autônoma dos Açores (RAA), o Plano Regional de Saúde para 2012-2016 - extensão a 2020 (2012 p. 5, p. 22) valoriza a “literacia em saúde” como “cultura de capacitação dos cidadãos [...] de modo a promover escolhas mais saudáveis como escolhas mais fáceis”, fomentando a participação ativa dos indivíduos na gestão da sua própria saúde. A Literacia para a Saúde tem sido perspetivada como constructo mediador para ganhos em saúde através da educação para a saúde, quer em adultos, quer em crianças (NUTBEAM, 2000; ZARCADOOLAS, 2006; SHARIF , 2010; SØRENSEN et al. 2012). A aquisição da Literacia para a Saúde deve ser vista como um resultado da eficácia da educação para a saúde, quando contribui para aumentar as capacidades dos indivíduos na utilização das informações de saúde, na tomada de decisões apropriadas e na manutenção da sua saúde. Neste âmbito, o Plano Regional de Saúde da RAA (2012, p. 130) preconiza “a melhoria da literacia em saúde da comunidade educativa”, uma vez que pode ser um fator diferenciador das organizações que atuam no domínio da educação, nomeadamente as escolas. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o 36 Interessa, pois, considerando o inadequado nível de Literacia para a Saúde em Portugal e as orientações emanadas nos Planos Nacional e Regional de Saúde, apostar na educação das crianças e jovens, em ambiente escolar, para o desenvolvimento de uma estratégia promotora de uma literacia que contribua para elevar os níveis de saúde. Estratégias de envolvimento & compromisso: a propósito da implementação de um projeto de Literacia para a Saúde A Literacia para a Saúde tem sido área de atenção no âmbito da Saúde Escolar nos Açores enquanto forma de promover a autonomia e responsabilização dos jovens em idade escolar, no que respeita à sua saúde e enquanto fator que condiciona, de forma decisiva, o modo como serão, ou não serão capazes de tomar decisões racionais e acertadas relacionadas com a sua saúde. O Projeto de Investigação CrAdLiSa – Açores, integrado no projeto nacional CrAdLiSa – Incrementando nas Crianças e Adolescentes a Literacia para a Saúde – da Rede Lusófona para a Promoção da Literacia para a Saúde (ProLiSa)2, alinha- -se em termos de objetivos e metodologias com esse projeto nacional, baseado nas orientações técnicas da DGS, (2015). Visa explorar o potencial da salutogénese e a teoria do “sentido de coerência” como base para o desenvolvimento da Literacia para a Saúde em crianças e adolescentes. São objetivos do projeto CrAdLiSa – Açores, avaliar os níveis de Literacia para a Saúde em estudantes do 3º ciclo e secundário da rede escolar pública da RAA e analisar o seu efeito nos estilos de vida e na promoção da saúde desta população. O estudo permitirá o diagnóstico de situação em termos de Literacia para a Saúde na população envolvida, contribuindo para a tomada de decisão estratégica e operacional no que respeita à definição de estratégias de promoção da Literacia para a Saúde no contexto regional e nacional. Centrando-se o estudo na Literacia para a Saúde em comunidades escolares da RAA, importa a implementação de estratégias integradoras que ultrapassem o nível individual de responsabilidade do cidadão e que reforcem o compromisso dos indivíduos e das comunidades em que se inserem de modo a manter-se a coerência entre os princípios derivados do conceito de Literacia para a Saúde e a sua tradução nos procedimentos efetivos do projeto. Para o desenvolvimento do projeto CrAdLiSa – Açores considerou-se determi- nante a assunção de uma metodologia abrangente consonante com princípios como empoderamento, participação efetiva e abordagem intersectorial que designamos como “Envolvimento & Compromisso” (E&C). A metodologia adotada incluiu estratégias de envolvimento dos diferentes parceiros chave da comunidade onde o projeto é implementado e da obtenção de compromissos com eles negociados e consensualizados, situados a quatro níveis: 2 Registo na Rede Lusófona ProLisa em julho de 2017. Ed ito ra C RV - ve rs ão pa ra re vis ão do au to r - P ro ib id a a im pr es sã o O PAPEL DA LITERACIA PARA A SAÚDE E EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE NA PROMOÇÃO DA SAÚDE 37 (i) ao nível das estruturas centrais do governo regional que tutelam a Educação e a Saúde; (ii) ao nível das estruturas intermédias de Gestão no âmbito da Educação (Conselhos Executivos das Escolas) e da Saúde (Unidade de Saúde de Ilha); (iii) ao nível dos professores das escolas e de enfermeiros como elementos chave para a ação, assumindo-os de forma participativa como cocriado- res dos processos a implementar; (iv) ao nível da comunidade de abrangência do projeto. Descreve-se, assim, a abordagem de “Envolvimento & Compromisso” (E&C) na implementação de um projeto no âmbito da Literacia para a Saúde nos Açores junto de jovens em contexto escolar, com especial atenção aos procedimentos e estratégias adotados ou a adotar em cada um dos níveis acima enumerados. E&C: do apoio das estruturas centrais do governo Envolvimento de estruturas de governo O sistema educativo nos Açores é tutelado pela Direção Regional da Educação, serviço dependente da Secretaria Regional da Educação e Cultura do Governo dos Açores, que tem como missão “conceber, orientar, coordenar e avaliar o sistema educativo açoriano, promovendo o seu desenvolvimento