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1 A PRODUÇÃO DE TEXTO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS 1 Sumário A PRÁTICA DE PRODUÇÃO ESCRITA DOS ALUNOS DA EJA ...................... 5 UM DIÁLOGO COM A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ........................ 9 RECORTES HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS .......... 9 O PERFIL DO ALUNO DA EJA ........................................................................ 13 O PROFESSOR DA EJA ................................................................................. 18 REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA DE PRODUÇÃO ESCRITA DOS ALUNOS DA EJA ......................................................................................................................... 21 O ensino de escrita na educação de jovens e adultos ..................................... 25 A construção do processo de escrita ............................................................... 26 A concepção de escrita do professor da EJA ................................................... 28 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 33 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós- Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 A PRÁTICA DE PRODUÇÃO ESCRITA DOS ALUNOS DA EJA É muito comum o emprego da palavra texto em nosso meio, tanto na escola como fora dela. Frequentemente ouvimos ou emitimos sentenças como “seu texto está ótimo; este texto é muito longo; hoje vamos produzir um texto”. Entretanto o conceito de texto não é tão simples quanto imaginamos. Esta palavra geralmente está colocada no contexto escolar. Contudo, o texto deve ser considerado como instrumento para desenvolver a competência linguística e textual do aluno podendo ser utilizado nas mais diversas situações de interações comunicativas, não só no ambiente escolar, como também, nas diferentes situações sociais, assumindo dessa forma um conceito e função muito amplos. Nesse sentido, este trabalho tem a intenção de compreender e levar o professor, em especial o da EJA, a rever suas concepções em relação ao texto, como também, a repensar seu fazer pedagógico ao desenvolver o trabalho de produção textual, tendo em vista a função social da escrita. Sendo assim, uma oportunidade de reflexão sobre a prática pedagógica da EJA, partindo de um novo olhar, ajustado às necessidades dos sujeitos atendidos. É importante ressaltar que a leitura e a escrita são muito importantes para os alunos, principalmente, os alunos da EJA, por motivos relacionados ao emprego, oportunidade de trabalho, a tarefas ligadas a leitura e a escrita na escola e no cotidiano. A relação entre a leitura e a escrita e sua apropriação são fundamentais no processo educativo favorecendo ao aluno o aprendizado de conhecimentos elaborados ao longo da história da humanidade. Contudo, a aprendizagem da leitura e escrita não ocorre de forma natural ou espontânea, demandando situações pedagógicas específicas, principalmente, na EJA, tendo em vista as características culturais, sociais e econômicas dos grupos atendidos. É preciso destacar que a EJA é parte constitutiva do sistema regular de ensino que propicia a educação básica e deve ser capaz de contribuir para a formação de homens e mulheres dotados de consciência social, implicando, portanto, um caminho 4 que parte da leitura sobre a realidade dos temas sociais de abrangência e urgência nacional e temas de interesse local. O aprendizado da leitura e da escrita, na atualidade, é uma das condições necessárias para o desenvolvimento do ser humano, devendo satisfazer seus desejos e necessidades e, desse modo, possibilitar um maior envolvimento às práticas sociais, podendo se apresentar sob diversas perspectivas, devendo acontecer de modo dinâmico e criativo. Neste sentido, torna-se prioridade desenvolver metodologias educacionais que favoreçam o aprendizado da leitura e da escrita e que se promovam ações pedagógicas que atendam às necessidades de aprendizagem de jovens e adultos, uma vez que está população chega à escola com um saber próprio, elaborado a partir de suas relações sociais e dos seus mecanismos de sobrevivência. Considerando a importância que a leitura e a escrita representam na formação das pessoas, é preciso analisar de modo mais amplo todos os aspectos envolvidos no processo intelectual e cultural dos indivíduos da EJA em relação à aprendizagem e sua especificidade e uma vez que o ensino e a aprendizagem precisam fazer sentido na vida dos sujeitos envolvidos, já que deparamo-nos com jovens e adultos que se encontram fora de sala de aula há vários anos. Estar imerso em um ambiente letrado é fundamental, mas não parece ser suficiente, é preciso que o professor leve seus alunos a refletirem sobre a escrita, a estabelecerem relações entre diferentes tipos de textos e produzirem textos significativos, o mais próximos que for possível de seu uso social. No entanto, é muito comum o trabalho de escrita com textos em sala de aula, sem que o professor possua uma noção exata da importância deste instrumento enquanto objeto de aprendizagem, principalmente em se tratando do perfil do aluno da EJA. Nesse contexto, essa pesquisa visa responder a seguinte pergunta: Como vem se desenvolvendo a prática pedagógica da produção escrita com os alunos do 4º período da EJA? Assim sendo, como lócus de pesquisa foi escolhido a Escola Estadual Lions Clube em Currais Novos – RN, que foi criada em 1977 pela instituição LIONS CLUBE, com o objetivo de atender as crianças do bairro e proximidades, já que não havia nenhuma escola nas proximidades, o que impedia algumas crianças de frequentarem a escola. Ao longo dos anos, a escola foi sendo sufocada pelas demais que foram 5 surgindo em seu entorno, maiores e mais estruturadas. Atualmente é mantida pelo governo do Estado, funcionando com 02 (duas) turmas à tarde (8º e 9º ano) e 04 (quatro) à noite (3º, 4º, 7º e 8º período da EJA). Há algum tempo uma boa parte de sua clientela do vespertino são alunos problemas de outros bairros que são descartados por outras escolas. A escola, no turno noturno, ainda cumpre seu primeiro objetivo: atender alunos das proximidades, que são jovens, adultos e alguns já idosos, trabalhadores, perseverantes que se sentem valorizados e prestigiados por estarem frequentando a sala de aula, apesar do muito pouco ou quase nenhum contato com a leitura e escrita desde a infância. A professora da turma colaboradora da pesquisa, por sua vez, mantém um forte vínculo afetivo com eles, o que facilita o trabalho em sala. A mesma cursou o magistério; exerce à docência há 26 (vinte e seis) anos, desses, por 11 (onze) anos assumiu funções administrativas; há 05 (cinco) anos está na EJA; e está concluindo o curso de Pedagogia.Na referida turma serão (ou foram) aplicados os questionários (ou que refletem as opiniões) para que sejam analisadas as opiniões expostas pela professora e alunos a respeito da temática pesquisada. O suporte teórico selecionado contempla amplamente a temática investigada. Desse modo, contribuirão para as análises das informações levantadas os seguintes teóricos: Freire (1979, 1980, 1990, 1997, 2000), Proposta Curricular da EJA (2001); Gadotti (2011); PCNs (1997), entre outros. Portanto, este trabalho se apresenta como uma pesquisa de campo e bibliográfica, de cunho qualitativo, no momento em que privilegia a compreensão do tema pesquisado, visto que, discutirá sobre a história e alguns aspectos da EJA. Esta opção metodológica é resultado da necessidade de refletir determinas práticas de escrita na EJA não somente sob ponto de vista positivista, mas também por interpretação de dados coletados através da visita in loco dos questionários. A partir da aplicação e análise das respostas dos questionários, investigaremos o perfil do profissional docente que atua nessa modalidade de ensino, além de conhecer aspectos a respeito das produções escritas dos alunos do 4º período da EJA. Sabemos que o docente necessita de habilidades e competências específicas no que diz respeito às suas práticas em sala de aula, visando um trabalho de produção escrita que venham a atender as diversidades. 6 Quanto à sua disposição estrutural, este trabalho apresenta em seu desenvolvimento uma visão histórica da educação de jovens e adultos, incluindo o perfil do aluno e do professor da EJA, bem como, algumas reflexões sobre a prática da produção escrita dos alunos na escola. Depois trata da análise das respostas dos questionários feitos com os sujeitos investigados e, por último, expõe as considerações finais. UM DIÁLOGO COM A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Trabalhar com EJA exige formas diferenciadas, os alunos não são “crianças grandes”, os métodos e os conteúdos da educação infantil não servem para os jovens e adultos. Deve-se entender que são jovens e adultos com interesses, necessidades e características próprias e específicas de sua faixa etária, que vão além da alfabetização. Daí, os professores precisam lidar com a heterogeneidade das turmas, com a dificuldade de alguns alunos em frequentar as aulas, com o cansaço, com as limitações materiais. Além disso, entre os jovens egressos da escola regular que frequentam a EJA, são comuns as relações de conflito com essa instituição onde muitos experimentaram fracassos. Após muitas transformações, o ensino voltado para jovens e adultos atualmente considera fundamental um tipo de abordagem que aproxime o processo ensino – aprendizado da realidade vivida pelos alunos, considerando sua diversidade social e cultural, a fim de tornar esse ensino mais acessível e significativo. Para tanto, é necessário destacar importantes fatos e fatores que contribuíram e contribuem para atingir esse objetivo. RECORTES HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Para entender a função social e política da educação de jovens e adultos, atualmente, no Brasil, é necessário compreendermos as experiências ocorridas ao longo dos séculos XX e XXI. Com o desenvolvimento indústria do século XX, iniciou-se um processo lento, mas crescente, de valorização da educação de adultos. Em 1920, foram iniciadas mobilizações em torno da educação como dever do Estado, e datam as primeiras 7 escolas brasileiras para adultos, as quais foram criadas com o objetivo de formar mãode-obra que atendesse aos imperativos de urbanização e da industrialização crescentes. As discussões a respeito da educação como dever de Estado se intensificaram nas décadas de 1920 e 1930. A partir das mudanças políticas durante os anos 1930 e o processo de industrialização no Brasil, a EJA começa a marcar seu espaço na história da educação brasileira; surge a ideia da criação de um Plano Nacional de Educação, instituído na Constituição de 1934, em que se estabeleceu como dever do Estado o ensino primário integral, gratuito, de frequência obrigatória e extensiva para adultos. Com a criação da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), em 1945, foi solicitado por essa organização, aos países integrantes (e entre eles, o Brasil) de se educar os adultos analfabetos. O Governo Federal lançou, então, a 1ª Campanha de Educação de Adultos. Segundo Cunha (1999) apud Lopes, (2012, p.13), o adulto analfabeto, nessa época, era identificado como elemento incapaz e marginal, psicológica e socialmente, submetido à minoridade econômica, política e jurídica. Apesar de sua importância histórica, devido, sobretudo ao esforço inédito de promover alfabetização em massa, a Campanha foi extinta no final dos anos de 1950. As críticas apontavam, entre outros aspectos, o fato de não levar em consideração a diversidade cultural brasileira e de suas propostas se mostrarem inadequadas ao público adulto, ao qual se destinava. Ainda assim, sobreviveu a rede de ensino supletivo por meio dela implantada, assumida pelos estados e municípios (Educação de Jovens e Adultos – 1° Segmento). Muitas outras campanhas de massa, de âmbito nacional, ocorreram no país. Todas essas campanhas e mobilizações atenderam a períodos determinados, refletindo momentos de grande otimismo, seguidos, posteriormente, de queda nos índices qualitativos e quantitativos, que foram sendo revitalizadas, substituídas ou incorporadas por outras que se iniciavam no território nacional. A inversão da relação de causalidade entre analfabetismo e pobreza aconteceria com o trabalho do educador pernambucano Paulo Freire, a partir dos 8 anos de 1960, que em sua obra Freire compreendia o analfabetismo como consequência e não como causa de pobreza. Nessa perspectiva, Freire (1980, p. 104) acredita: [...] numa alfabetização que fosse em si um ato de criação, capaz de desencadear outros atos criadores. Numa alfabetização em que o homem, porque não fosse seu paciente, seu objeto, desenvolvesse a impaciência, a vivacidade, característica dos estados de procura, de invenção e reivindicação. Apesar disso, discutir EJA no Brasil exige a compreensão desse tema nos cenário das desigualdades sociais que atingem o país, uma vez que dados do IBGE de 2010 mostram que a região Nordeste apresenta-se com o maior índice de pobreza e de analfabetismo. Levando-nos a concluir que o problema do analfabetismo, além de educacional, é também de distribuição de renda. No ano de 1967, aprovou-se pela lei nº 5379 o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), cuja concepção que os analfabetos eram pessoas com baixo nível socioeconômico, no entanto, com uma bagagem cultural considerável. Na década de 80, iniciou-se a abertura política no Brasil e outras experiências mais democráticas em EJA, foram ampliando-se aos poucos. O MOBRAL foi extinto no ano de 1985, e as experiências educativas direcionadas aos grupos populares da sociedade continuaram e tornaram-se mais fortes, voltando-se lentamente para a filosofia de Paulo Freire. Na perspectiva de Freire (2000, p.30): Se antes a alfabetização de adultos era tratada e realizada de forma autoritária, centrada na compreensão mágica da palavra, palavra doada pelo educador aos analfabetos [...] agora, pelo contrário, a alfabetização como ato de conhecimento, como ato criador e como ato político é um esforço de leitura do mundo e da palavra. Nos anos de 1990, o conceito de reposição, no que se refere ao ensino de adultos, seria superado pela perspectiva da educação continuada. O marco histórico de afirmação dessa tendência foi a V Conferência Internacional de Educação de Adultos, realizada em Hamburgo (Alemanha) em 1997, que proclamou o direito de todo ser humano de ter acessoà educação ao longo da vida. 9 O termo supletivo foi abolido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996, que afirmou a EJA como modalidade da Educação Básica do Ensino Fundamental e do Médio. Desde então, seu reconhecimento como modalidade de ensino, com especificidades próprias, vem se traduzindo em documentos que orientam as ações educativas do setor, como as Diretrizes Curriculares Nacionais e a Proposta Curricular para o primeiro e segundo segmentos do Ensino Fundamental. Aprovada em 9 de janeiro de 2001, a lei n.10172 com duração de 10 anos, como retrospecto do debate instaurado durante os 02 (dois) anos que antecedem sua publicação, no que tange à EJA, o Plano Nacional de Educação (PNE) reconheceu a extensão do significado de analfabeto absoluto e funcional. Nas diretrizes, o PNE aderiu à ideia de educação continuada ao longo da vida, tratando-a como direito público subjetivo, competindo ao poder público fornecer os recursos para essa educação. A gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sinalizou iniciativas para as políticas públicas de EJA, com a criação do Programa Brasil Alfabetizado, envolvendo, 03 (três) vertentes de caráter primordialmente social para a modalidade de EJA: o Projeto Escola de Fábrica, o Programa Nacional de Inclusão de Jovens o (PROJOVEM), voltado ao segmento juvenil de 18 a 24 anos e por último, o Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio para Jovens e Adultos (PROEJA), destinado à educação profissional técnica em nível de ensino médio, e o Programa Nacional da Educação na Reforma Agrária, além do Exame Nacional de Certificado de Competência. Gadotti e Romão (2011, p. 39) expõem que: O analfabetismo não é doença ou “erva daninha”, como se costumava dizer entre nós. É a negação de um direito ao lado da negação de outros direitos. O analfabetismo não é uma questão pedagógica, mas uma questão essencialmente política. [...] O educador precisa respeitar as condições culturais do jovem e do adulto analfabeto. [...] É preciso entender, conhecer profundamente, pelo contato direto, a lógica do conhecimento popular, sua estrutura de pensamento em função da qual a alfabetização ou a aquisição de novos conhecimentos tem sentido. Isto explica que apesar de vários instrumentos legais de grande impacto, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9.394 de 1996) e a Ementa 10 Constitucional n. 59 de 2009, que ampliou o ensino obrigatório dos 04 aos 17 anos de idade, a erradicação do analfabetismo ocorre a passos lentos. O PERFIL DO ALUNO DA EJA Os alunos da EJA detêm um amplo acervo de conhecimentos e habilidades, em geral, adquiridos de modo não formal, em meios sociais, com a família, a comunidade ou o trabalho. Eles compõem um grupo amplamente diversificado quanto ao lugar de origem, faixa etária, experiência escolar, tipo de trabalho, entre outros, mas é justamente essa diversidade que promove uma diversidade de conhecimentos e habilidades que marca as turmas de EJA. Porém, é verdade que [...] apesar de as pessoas pouco letradas possuírem muitos conhecimentos válidos e úteis, elas estão excluídas de outras muitas possibilidades que a nossa cultura oferece. Muitas vezes elas interpretam essa desvantagem como incapacidade, a ponto de não reconhecerem como tal aquilo que sabem ser conhecimento útil e válido. A exclusão do conhecimento que se adquire na escola marca essas pessoas profundamente pela imagem que fazem de si e pelo estigma que a sociedade lhes impõe. É por isso que muitas delas, mesmo tendo outras responsabilidades no trabalho e em casa, decidem estudar. (PROPOSTA CURRICULAR PARA A EJA, 2001, p.41-42). Nesta perspectiva, há uma heterogeneidade dessa população atendida pela modalidade da Educação de Jovens e Adultos com características e especificidades distintas, pois uma grande parcela dos alunos da EJA são sujeitos sociais e culturais, marginalizados nas esferas socioeconômicas e educacionais o que acarreta uma falta de comprometimento e uma participação não ativa na sociedade. Os alunos da EJA são pessoas muito diferentes em termos individuais, culturais, entre outros aspectos, mas possuem muitos pontos em comum, principalmente no que tange à falta de oportunidade e ao abandono, desde cedo, da escola para trabalhar em um subemprego; se identificam quanto ao fato de não terem frequentado a escola nas fases adequadas, alguns desses alunos nem sequer passaram pela escola nessas fases, por razões diversas. 11 Os alunos, de maneira geral, são adultos que passam duas ou três vezes pela escola, voltando quando têm alguma necessidade, como a de subir de cargo em uma empresa, ou mesmo procurar trabalho (na maioria das vezes), visto que, a cada dia, a exigência para as contratações aumentam e, na maioria dos casos, o ensino médio é exigido como escolaridade mínima. Eles se diferenciam das crianças por terem ultrapassado a idade de escolarização formal e por estarem inseridos no sistema de produção (ou, temporariamente, fora dele). No atual contexto, de crescente urbanização, muitos habitantes de áreas rurais migraram para as cidades, onde ocupam postos de trabalho que exigem pouca qualificação. Nas grandes cidades brasileiras, encontram-se muitos alunos de EJA que percorrem essa trajetória. Gadotti observa que “O contexto cultural do aluno trabalhador deve ser a ponte entre o seu saber e o que a escola proporcionar, evitando, assim, o desinteresse, os conflitos e a expectativa de fracasso que acabam proporcionando um alto índice de evasão.” (GADOTTI E ROMÃO, 2011, p. 143). Essa nova modalidade de exclusão educacional, que acompanhou a ampliação do ensino público, acabou produzindo um elevado número de jovens e adultos que, apesar de terem passado pelo sistema de ensino, nele realizaram aprendizagens insuficientes para utilizar com autonomia os conhecimentos adquiridos em seu dia a dia. O resultado desse processo é que, no conjunto da população, assiste-se à gradativa substituição dos analfabetos absolutos por um numeroso grupo de jovens e adultos cujo domínio precário da leitura, da escrita e do cálculo vem sendo tratado como analfabetismo funcional. Esse é o público esperado dos programas de Educação de Jovens e Adultos do 1º segmento do Ensino Fundamental: [...] estão incluídas neste contingente, pessoas que dominam tão precariamente a leitura e a escrita que ficam impedidas de utilizar eficazmente essas habilidades para continuar aprendendo, para acessar informações essenciais a uma inserção eficiente e autônoma em muitas das dimensões que caracterizam as sociedades contemporâneas. [...] As exigências educativas da sociedade contemporânea são crescentes e estão relacionadas a diferentes dimensões da vida das pessoas: ao trabalho, à participação social e política, à vida familiar e comunitária, às oportunidades de lazer e desenvolvimento cultural. (BRASIL, 2001, p. 35 -36) 12 De acordo com Haddad e Di Pierro (2000, p.126), isso demonstra que o desafio da expansão do atendimento na educação de jovens e adultos já não reside apenas na população que jamais foi à escola, mas se estende àquela que frequentou os bancos escolares, mas neles não obteve aprendizagens suficientes para participar plenamente da vida econômica, política e cultural do país e seguir aprendendo ao longo da vida. Cada vez torna-se mais claro que as necessidades básicas de aprendizagem dessa população só podem ser satisfeitas por uma oferta permanente de programas que, sendo mais ou menos escolarizados, necessitam institucionalidade e continuidade, superando o modelo dominante nas campanhas emergenciais. No entanto, é importante destacar que a participação de muitos alunos jovens e adultos na sala de aula costuma ser marcada por interesse pelas aulas, respeito e gratidãoao professor. Essa postura espelha o grande esforço que alguns despendem para estudar e uma profunda vontade de aprender. Voltar a estudar muitas vezes representa um desafio a ser superado, pois demanda tempo, força de vontade e dedicação em condições nem sempre propícias. Ao retornarem aos bancos escolares, geralmente esses alunos possuem muita curiosidade e desejo de vivenciar novas experiências, buscando na escola não só um espaço de trocas de saberes e conhecimentos, mas também um espaço de socialização e inserção social. Atualmente, o perfil dos alunos de EJA passa por um processo de rejuvenescimento, pois está absorvendo um contingente de alunos egressos do ensino regular, grande parte dos quais são adolescentes excluídos da escola. Com idade defasada em relação ao ano escolar, e, por motivos variados, esses alunos recorrem a cursos para jovens e adultos para obter certificação escolar. De acordo com Haddad e Di Pierro (2000, p.127), há uma ou duas décadas, a maioria dos educandos de programas de alfabetização e de escolarização de jovens e adultos eram pessoas maduras ou idosas, de origem rural, que nunca tinham tido oportunidades escolares. A partir dos anos 80, os programas de escolarização de adultos passaram a acolher um novo grupo social constituído por jovens de origem urbana, cuja trajetória escolar anterior foi malsucedida. Nessa perspectiva, pode-se observar que o primeiro grupo vê na escola uma perspectiva de integração sociocultural, tem uma visão mais positiva da escola; o segundo mantém com ela uma relação de tensão e conflito aprendida na experiência anterior, muitos têm uma visão 13 negativa: contesta a autoridade do professor, não atribui um valor intrínseco ao conhecimento escolar e está lá porque precisa do diploma. Os jovens carregam consigo o estigma de alunos-problema, que não tiveram êxito no ensino regular e que buscam superar as dificuldades em cursos aos quais atribuem o caráter de aceleração e recuperação. Esses dois grupos distintos de trabalhadores de baixa renda encontram-se nas classes dos programas de escolarização de jovens e adultos e colocam novos desafios aos educadores, que têm que lidar com universos muito distintos nos planos etários, culturais e das expectativas em relação à escola. Assim, os programas de educação escolar de jovens e adultos, que originalmente se estruturaram para democratizar oportunidades formativas a adultos trabalhadores, vêm perdendo sua identidade, na medida em que passam a cumprir funções de aceleração de estudos de jovens com defasagem série-idade e regularização do fluxo escolar. Conforme Gadotti e Romão (2011, p. 143): A EJA não deve ser uma reposição da escolaridade perdida, como normalmente se configuram os cursos acelerados nos moldes do que tem sido ensino supletivo. Deve, sim, construir uma identidade própria, sem concessões à qualidade de ensino e propiciando uma terminalidade e acesso a certificados equivalentes ao ensino regular. Nesse sentido, a formação do discente da EJA exige práticas pedagógicas sensíveis, pautadas na sua realidade, abordando problemáticas próprias e reconhecendo os desafios e potencialidades dessa clientela. O PROFESSOR DA EJA Qualquer pessoa pode ministrar aula, ser um professor-instrutor, visto que é uma profissão cheia de biqueiros, mas professor/educador só alguns podem ser. E essa realidade é muito frequente na EJA, é onde se concentra uma boa parte dos biqueiros: dobras de carga horária, aula suplementar, contratos. 14 Embora os programas de Educação de Jovens e Adultos tenham a sua história, o corpo docente que trabalha com essa modalidade, em sua maioria, não são preparados para trabalharem com as especificidades da clientela em questão. O despreparo desses educadores deve-se também as baixas condições da formação e profissionalização ofertadas pelos cursos que a área de educação oferece. Por isso, Moura (1999, p. 24) discute que: [...] não há ainda uma política de formação dos professores, mas pode-se perceber claramente um ideal de professor para este tipo de ensino, como uma espécie de pregador (ou até mesmo “desconvertor”, cabendo-lhe o papel de representante de Deus) e, como tal, a importância dada aos métodos de memorização e de educação pela palavra. Não podemos ignorar que muitos educadores que atuam na EJA esquecem que trabalhar nessa modalidade vai além de ser um professor “legal, bonzinho”, que conhece a vida social dos alunos, e que o mais importante é inserir esse aluno no mundo do conhecimento, de apresentá-los às práticas sociais que o farão construir o conhecimento e resgatar sua autoestima. Outros, ainda, em sua zona de conforto e despreparo, oferecem o mínimo possível aos alunos e quanto a isso costumamos ouvir falas do tipo: “eles não vão muito longe”, “nem vão pra faculdade”, “já sabem fazer o nome”, “só querem sair um pouco de casa, pois não aprendem devido à idade”. Deixando, assim, de lado a grande missão do professor da EJA: levar o educando em direção ao conhecimento, permitindo que aprofundem seu entendimento acerca da leitura e da escrita, que antes eram vistas como instrumento de comunicação, devendo ser ampliadas para outras áreas, e sendo utilizadas como instrumento de memória, informações e prazer. Para Paulo Freire: A responsabilidade do professor é sempre grande. Sua presença na sala é de tal maneira exemplar que nenhum professor escapa ao juízo que dele fazem os alunos. Seja quem for o professor: autoritário, sério, incompetente, irresponsável, licencioso, mal amado, com raiva do mundo, burocrático, frio, amoroso (...) nenhum deles passa pelos alunos sem deixar sua marca. (FREIRE, 1996, p.73). 15 A formação técnica faz parte da competência que o professor deve trazer na sua formação acadêmica, mas muitas das vezes precisamos buscar na formação continuada um complemento para saber conduzir os ensinamentos dentro da complexidade dessa sociedade de conhecimento (EJA). A aprendizagem já é um processo envolvente por natureza, por ser um professor da EJA exige uma maior interação, compreensão e receptividade às expectativas dos alunos. Por isso, a disponibilidade se faz necessária porque muitas vezes nos deparamos mediando conflitos e restaurando a autoestima desses educandos. Dessa forma, somente fazer leituras sobre educação de jovens e adultos não ajuda muito. É primordial um conhecimento mais aprofundado, através do contato direto com a lógica do conhecimento popular e de sua estrutura de pensamento, uma vez que é em função disso que a aquisição de novos conhecimentos passa a ter sentido. Trabalhar com a Educação de Jovens e Adultos significa conscientizar-se de que é necessário utilizar-se de estratégias para que possa criar vínculos de amizade, que não interfiram na aprendizagem, e um respeito mútuo entre aluno e professor. O professor dessa modalidade deve ser sensível às experiências e habilidades que os alunos já possuem, reconhecendo a legitimidade desses saberes, interligando-os ao contexto sociocultural de suas vidas. Os professores desta área têm em suas mãos a responsabilidade de formar jovens e adultos para atender as suas necessidades pessoais, profissionais, e anseios políticos de toda uma sociedade envolvida nesse processo de adaptação desses alunos ao mercado de trabalho. A LDB 9394/96 contempla em seu artigo 13 a responsabilidade do ato de educar e especifica que os educandos da EJA, deverão participar da proposta pedagógica, cumprir plano de trabalho e zelar pelo aprendizado do aluno, uma vez que se faz necessário um aprendizado para aprender a ensinar àqueles que já sabem, tendo em vista a necessidade de um preparo profissional específico. Infelizmente, alguns professores, muitas vezes, não possuem esse preparo e, principalmente, quando atuam pela primeiravez com esses alunos, isso representa uma situação provocadora de emoções e sentimentos, visto que muitos componentes ali envolvidos são desconhecidos para ele, que terá de lidar com isso para poder 16 desenvolver as atividades escolares. É evidente que nem sempre é possível contar com professores do próprio meio, por isso é conveniente formar àqueles vindos de outros meios, sejam geográficos, ou, sociais. Diante do exposto, podemos afirmar que essa é uma profissão que está longe de ser tranquila. Requer do profissional, entre outras habilidades, equilíbrio, competência, compromisso, liderança, solidariedade, concentração, desprendimento, disciplina, e ainda exigir do aluno disciplina e concentração, sem, no entanto, perder a ternura, como recomenda Gadotti e Romão (2011, p. 92) apesar de considerar uma missão quase impossível. REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA DE PRODUÇÃO ESCRITA DOS ALUNOS DA EJA Escrever é uma atividade que exige exercício contínuo, para que o aluno perca o medo e adquira, através do estímulo constante do professor, o gosto e o domínio da arte de redigir. Uma das maiores queixas apresentadas pelos alunos, seja da EJA ou não, é realmente fazer com que os alunos transponham para o papel as suas ideias de forma coerente e coesa. Fazer com que a leitura/escrita faça parte da vida dos Jovens e Adultos que há muito estavam afastados dos bancos escolares não é tarefa fácil, pois como diz Freire (1979: 71-72): O analfabeto aprende criticamente a necessidade de aprender a ler e a escrever. Prepara-se para ser o agente desta aprendizagem. E consegue faze-lo na medida em que a alfabetização é mais que o simples domínio mecânico de técnicas para escrever e ler. Com efeito, ela é o domínio dessas técnicas em termos conscientes. É entender o que se lê e escrever que se entende. É comunicar-se graficamente. Isto faz com que o papel do educador seja fundamentalmente dialogar com o analfabeto sobre situações concretas, oferecendo-lhe simplesmente os meios com os quais possa se alfabetizar. Por esta razão, a produção de texto, não pode ser encarada como atividade apenas de Língua Portuguesa, restrita à composição textual que focalize apenas um 17 tema proposto. Deve sim permear todos os campos e disciplinas, uma vez que a utilização frequente da escrita contribuirá para ampliar o conhecimento do aluno sobre o funcionamento da escrita e sua capacidade de comunicação. Para que se dê o processo de ensino-aprendizagem, na alfabetização de jovens e adultos, é necessário conhecer as estratégias cognitivas desenvolvidas pelos alunos. Partir do conhecimento já produzido pelo sujeito da aprendizagem é o ponto essencial para orientar a ação pedagógica e nortear a produção de material didático. O conhecimento já constituído pelos alunos tem sua origem na luta do dia-adia, fruto das relações sociais por eles vividas, do tipo de vida decorrente dessas relações, bem como de suas experiências linguísticas, culturais e sociais. Nesse aspecto, o processo de ensino-aprendizagem não tem por alicerce somente conhecimentos trazidos pelo professor, definidos numa ordem onde só ele conhece a lógica e os procedimentos pedagógicos. Mas deve ter por base situações significativas, que são verdadeiras motivações para que os alunos busquem se alfabetizar. Pois “o comando da leitura e da escrita se dá a partir de palavras e de temas significativos à experiência comum dos alfabetizandos e não de palavras e de temas apenas ligados à experiência do educador” (FREIRE, 1997 p. 29,). Ler e, sobretudo, escrever costumam ser atividades vistas como “escolares” para a maioria dos alunos e delas, alguns, fazem de tudo para se verem livres o mais rapidamente possível. Sendo assim, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Língua Portuguesa – Ensino Fundamental – 1ª a 4ª série (1997, p.35) fazem a seguinte consideração: O ensino da Língua Portuguesa tem sido marcado por uma sequenciação de conteúdos que se poderia chamar de aditiva: ensina-se a juntar sílabas (ou letras) para formar palavras para formar frases e a juntar frases para formar textos. O aluno, ao ir para a escola, já leva consigo conhecimentos prévios, fruto das experiências vivenciadas no dia a dia do seu contexto social. Para o enriquecimento desses conhecimentos, necessário se faz que a escola, considerando seus diferentes níveis, promova a sua ampliação de modo que o aluno se torne capaz não apenas de interpretar diferentes textos que circulam socialmente, como também de produzir textos eficazes nas mais diversas situações. 18 Os jovens e adultos envolvem-se em práticas sociais de leitura e de escrita, diariamente, quer seja ao pedir para alguém que leia o nome de um ônibus ou de uma rua, quer leia uma carta que recebe, que veja o prazo de validade de um produto no supermercado, que anote um recado para alguém. Embora, muitos, não saibam ler e escrever, essas pessoas, de certo modo, já apresentam graus de letramento, uma vez que estão imersas num mundo letrado e fazem uso, de alguma forma, da leitura e da escrita. O fundamental, é que mesmo quando os alunos dizem que não sabem ler, eles sejam levados a crer que a leitura não é um processo de decifração, mas um processo de construção de sentidos do texto e que “a escrita não é um produto escolar, mas sim um objeto cultural, resultado de esforço coletivo da humanidade” (FERREIRO, 2001, p. 43). A função social da escrita, bem como a sua utilização autônoma como recurso comunicativo promove a interação entre os sujeitos. Por meio da linguagem, os seres humanos comunicam-se, transmitem e buscam informações, expressam seus pensamentos e sentimentos, argumentam e produzem conhecimento. Sobre este aspecto, a proposta curricular para o 1º segmento em EJA sugere que, "para favorecer a leitura compreensiva e motivar os jovens e adultos que se iniciam no mundo da escrita, é fundamental selecionar textos significativos e interessantes." (BRASIL, 2001, p. 57). O professor deve propiciar aos alunos o acesso a diferentes gêneros textuais que fazem parte do seu cotidiano como livros, revistas, jornais, cartazes, vídeos, boletos, receitas, textos das redes sociais, pois, não é somente nas escolas que os alunos têm contato com esses gêneros, mas essa constitui um espaço privilegiado, essencial para as práticas sociais que envolvem a leitura e a escrita. Quanto a isso os PCNs de Língua Portuguesa (1997, p. 30) faz a seguinte recomendação: Cabe, portanto à escola viabilizar o acesso do aluno ao universo dos textos que circulam socialmente, ensinar a produzi-los e a interpretá-los. Isso inclui os textos das diferentes disciplinas, com as quais os alunos se defrontam sistematicamente no cotidiano escolar e, mesmo assim, não manejar, pois não um trabalho planejado com essa finalidade. 19 Quando as atividades que envolvem a produção escrita não surgem de uma necessidade para chegar a um propósito, não é propriamente uma produção escrita, quando escrevemos porque outra pessoa nos manda escrever, como acontece frequentemente na escola, e ainda, por cima, oferece o título, tema ou gravuras previamente escolhidas, estamos apenas exercendo atividades mecânicas que pouco têm a ver com significado e sentido. Constituem-se apenas em um pretexto para cópias, resumos, estudo da ortografia e gramática e outras tarefas de ensino de língua. De acordo com Possenti (1996 p. 31-32) apud Antunes, 2009: No dia em que as escolas se dessem conta de que estão ensinando aos alunos o que eles já sabem, e que é em grande parte por isso que falta tempo para ensinar o que não sabem, poderia ocorrer uma verdadeira revolução... Sobrariam apenas coisas inteligentes para fazer na aula, como ler e escrever, discutir e reescrever, reler e reescrever mais, para escrever e ler de forma sempremais sofisticada, etc. Dessa forma, para que os alunos se apropriem, especialmente os da EJA, das práticas de escrita – para desenvolver, muito mais do que a capacidade de escrever, o gosto e compromisso com as produções escritas, a escola terá de mobilizá-los internamente, pois dominar estratégias de escrita (e também escrever para aprender) requer esforço. Precisará fazê-los achar que a escrita é algo interessante e desafiador, algo que, conquistado plenamente, dará autonomia e independência. Precisará torná-los confiantes, condição para poderem se desafiar a aprender fazendo. Uma prática que não desperte e cultive o desejo de ler e escrever não é uma prática pedagógica eficiente. O ensino de escrita na educação de jovens e adultos Neste trabalho, pretendemos analisar e refletir como ocorre o processo de ensino-aprendizagem da escrita em uma turma de Educação de Jovens e Adultos (EJA) de uma escola pública do município de Lucrécia-RN. De maneira mais específica, pretendemos observar as concepções de escrita que norteiam a prática da professora, quais as principais dificuldades encontradas em sala de aula no trabalho com a escrita e que metodologias ou propostas são utilizadas pela professora para procurar resolver os problemas encontrados cotidianamente. 20 Para tanto, agendamos com a professora da turma pesquisada a observação de várias aulas, para que pudéssemos perceber como ocorre o processo de ensino aprendizagem da escrita por parte dos alunos e da professora da referida turma da EJA. Além disso, também elaboramos um questionário com interrogações abertas, que foi aplicado à professora da turma, conforme sua disponibilidade, tendo em vista a coleta das informações necessárias para a realização desta pesquisa. Em relação à análise dos dados realizada ao longo deste artigo, nos fundamentamos em trabalhos ou pesquisas de vários pesquisadores, professores e teóricos da área, tais como Soek (2009), Costa (2009), Barroco e Tuleski (2007), Soares (2003), Arroyo (1996), Geraldi (1993), dentre outros, que discutem questões relacionadas ao ensino-aprendizagem de escrita em vários níveis de ensino, focalizando, alguns deles, o trabalho com jovens e adultos. Além disso, também nos subsidiamos do que prescrevem documentos oficiais como os Parâmetros Curriculares Nacionais-PCN (2000) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação-LDB (1996), que normatizam o ensino em nosso país. A construção do processo de escrita A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é o segmento de ensino da rede escolar pública brasileira que recebe os jovens e adultos que não completaram os anos da Educação Básica em idade apropriada e querem voltar a estudar. É importante que as pessoas tenham o desejo de ler, porem muitos dos que sabe leem não conseguem interpretar o texto. Dessa maneira o processo de escrita na educação de jovens e adultos muda o reconhecimento da especificidade, suas trajetórias de vida, seu protagonismo social e cultural na identidade coletiva de classe, gênero, raça e etnia. Não adianta aprender uma técnica e não saber usá-la. Essas duas aprendizagens – aprender a técnica, o código (decodificar, usar o papel, usar o lápis etc.) e aprender também a usar isso nas práticas sociais, as mais variadas, que exigem o uso de tal técnica – constituem dois processos, e um não está antes do outro. Ao se aprender o código, passa-se a aprender a usá-lo em situações diversas. São, na verdade, processos indissociáveis, mas diferentes, em termos de processos 21 cognitivos e de produtos, como também são diferentes os processos da alfabetização e do letramento. Os jovens e adultos, ao chegarem à escola possuem um nível de letramento, embora não sejam alfabetizados, pois, a medida que estão sendo inseridos em uma sociedade letrada, conhecem as funções da escrita e as utilizam em seu cotidiano. O adulto precisa compreender que a escrita e a leitura vão além da decifração e transcrição de letras e sons, são atividades orientadas pela procura do sentido e do significado. O sujeito está intimamente ligado ao objeto, procurando buscar distribuídas para a tomada de consciência deste processo. A aprendizagem da leitura e da escrita não se realiza da mesma maneira para todas as pessoas. E na maioria das vezes as dificuldades dos alunos podem ser ocasionadas pelo processo de ensino que normalmente utiliza um método único de educação. Assim, o trabalho na EJA depende muito da identidade pessoal e cultural do mesmo. A escrita não é uma mera transcrição da fala, por isso é necessário que os alunos compreendam essa noção, para lidar com a linguagem escrita na escola, a representação de letras e sons. A apropriação da escrita é diferente do aprendizado de ler e escrever. Assim, a sala de aula deve ser um espaço de muitas informações escritas, o aluno deve estar em contato direto com várias leituras, diversidade de textos e gêneros textuais, que facilitam a compreensão das especificidades do sistema de escrita. O indivíduo alfabetizado não é necessariamente um indivíduo letrado, alfabetizado é aquele indivíduo que sabe ler e escrever; já o indivíduo letrado é o indivíduo que vive em estado de letramento, que usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a escrita, responde adequadamente as demandas sociais da escrita (SOARES, 2003). Portanto, é preciso que saibamos que a construção de um sistema de representação da escrita é concebida como um código de transcrição, sua aprendizagem é como aquisição de uma técnica; a mesma se converte na apropriação de um novo objeto de conhecimento, ou seja, uma aprendizagem conceitual. A concepção de escrita do professor da EJA Como tem demonstrado várias pesquisas realizadas na área, a prática de produção textual tornou-se algo indispensável para o ensino e aprendizagem da 22 língua materna, uma vez que é no texto que a língua “se revela em sua totalidade quer enquanto conjunto de forma, quer enquanto discurso” (GERALDI, 1993, p. 135). Esta perspectiva apresentada por Geraldi, também é enfatizada pelos PCN (2000, p. 35), quando defendem que a partir do texto o aluno tanto pode aprender a escrever palavras e frases, como ordená-las de modo a produzir algo com conteúdo e qualidade. E esse pressuposto não é válido apenas para o ensino de línguas na modalidade normal. Alunos de Educação de Jovens e Adultos também precisam aprender a produzir textos, a escrever, e isso só é possível através de um trabalho sistemático com diversos textos. Sendo o texto, portanto, elemento central no processo de ensinoaprendizagem, como propõe Geraldi (1993) e os próprios PCNs (2000), é preciso compreender as concepções de escrita que têm norteado as práticas dos professores nas escolas brasileiras. Em seus trabalhos, Geraldi (1993) apresenta duas concepções teóricas de escrita: como inspiração e como trabalho. Na primeira concepção o aluno escreve porque é incentivado por alguém, ou, melhor dizendo, é inspirado a escrever. Na segunda concepção se escreve por necessidade ou por pura obrigação, considerando as especificidades do ambiente onde o aluno está inserido. A partir dessa proposição, Sercundes (1997), sob uma abordagem metodológica, elabora três concepções: escrita como dom, como consequência e como trabalho, reportando-se as duas primeiras à perspectiva teórica de escrita como inspiração. Para este autor, na primeira concepção, a escrita é vista como “fruto de uma emoção”, de maneira que, reescrever o texto, além de ser uma tarefa difícil, que exige trabalho, tornaria o aluno frio, pois quebraria o encanto da inspiração. Dessa forma, não ocorre nenhuma atividade prévia sobre o assunto, isto é, a leitura de um ou mais textos, uma discussão ou um debate sobre o tema, enfim, não há nenhuma orientação para subsidiar educando na construção de seu texto.Na segunda concepção de escrita proposta por este autor, aquela que é vista como consequência, os textos são produzidos a partir de atividades prévias como: a leitura de um texto, comentários sobre ele, sua interpretação, estudo do vocabulário, ou ainda um filme, uma palestra, um passeio, dentre outros. A última e terceira concepção apresentada pelo autor é a de escrita como trabalho, a qual contempla também as atividades prévias da concepção de escrita como consequência, entretanto, naquela, tais atividades servem como suporte e, nesta, como pretexto para a produção escrita. 23 Existem outras concepções de escrita que orientam ou norteiam a prática do professor em sala de aula. Entretanto, preferimos recorrer apenas a essas concepções aqui apresentadas porque acreditamos que, de um modo geral, elas compreendem as demais concepções propostas por outros autores. Elas são amplas e generalizantes, mas, ao mesmo tempo, apresentam especificidades que permitem distinguirmos cada uma delas e, assim, possibilita ao professor adota alguma delas em sua sala de aula, procurando redirecionar suas práticas pedagógicas voltadas para o ensino da escrita, seja qual for o nível de aprendizagem da turma. As práticas pedagógicas de escrita na sala de aula Em relação à produção ou escrita de textos, foco de nosso trabalho, conforme Geraldi (1993, p. 137), algumas questões são fundamentais no momento da escrita, como por exemplo: “ter o que dizer” (conteúdo); “uma razão para dizer o que se tem a dizer”; “se tenha para quem dizer o que se tem a dizer”. Nesse sentido, o professor não pode apresentar atividades de produção de textos para seus alunos sem considerar o contexto no qual ele está inserido e a situação enunciativa da produção. Essa afirmação se sustenta no postulado da teoria de Bakhtin (1992, p. 112), quando afirma que: qualquer que seja o aspecto da expressão-enunciação [por exemplo, a escrita] será determinado pela situação social mais imediata (...) [sendo a enunciação produto da interação entre indivíduos] a palavra dirige-se a um interlocutor, [ela] variará se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não (...) é preciso supor além disso um certo horizonte social definido e estabelecido que determina a criação ideológica do grupo social. Como podemos perceber nas palavras desse teórico, a produção escrita, por exemplo, é determinada pela situação social, pelo contexto histórico e valores ideológicos da sociedade. Nesse sentido, conforme aponta Geraldi (1993), quando um aluno produz um texto “para a escola”, ou seja, uma redação, ele está utilizando e cumprindo as regras da escrita impostas por padrões sociais, como uso de normas gramaticais. Além disso, o estudante demonstra os conhecimentos adquiridos com o passar dos anos, visto que as informações que o homem obtém no decorrer de sua vida são ampliadas e não ignoradas. 24 Os conhecimentos adquiridos pelo estudante jovem ou adulto são de extrema relevância em atividades de produção de textos e, portanto, precisam ser considerados pelo professor no momento de elaboração de propostas de atividades com a escrita. Não há como um aluno falar sobre determinado assunto do qual ele não tem conhecimento, não terá o que dizer, nos termos de Geraldi (1993). Muitas vezes os professores apresentam determinados temas para que os alunos produzam um texto, mas esquecem de promover uma base conceitual sobre certo assunto ou temática. Em alguns casos, os professores fazem uma breve explanação sobre a temática da proposta de produção, porém, nesse momento, os professores acabam impondo uma leitura para os alunos, diferente daquela que eles iam construir. Em outras palavras, os alunos produzem textos que demonstram o posicionamento do professor e não sua opinião diante do texto. De acordo com Soares (2003), nesses casos, há a homogeneização do discurso na sala de aula, uma vez que os alunos expõem no texto as mesmas opiniões discutidas em sala, não demonstrando seu próprio posicionamento diante do texto. Por isso, Geraldi (1993) propõe como ponto de partida para o trabalho com a produção escrita a realização de atividades que antecedam a prática da escrita de textos, ou as chamadas "atividades prévias", as quais o professor e os materiais didáticos poderiam oferecer sob a forma de sugestões para que se assistam a um determinado filme, peça de teatro, programa de televisão, ou a leitura e discussão de textos de autores distintos sobre um mesmo tema, para, a partir da análise e discussão desses textos, despertar o senso crítico nos alunos. Além de ter o que dizer, o aluno precisa ter motivos para produzir um texto. Quando o professor sugere uma proposta sem uma justificativa que realmente motive o aluno para a produção daquele texto, a escrita se torna mecânica e o aluno desmotivado para produzir seu texto. O porquê da produção de determinado texto se constitui na interação do aluno com o seu interlocutor, no caso, o professor, a partir de acordos prévios. O professor precisa mostrar ao seu aluno que o seu texto não estará sendo produzido apenas para lhe ser atribuída uma nota ou mesmo para preencher lacunas de uma aula de línguas. Além de uma função comunicativa, o texto 25 do aluno precisa ter uma função social, que precisa ser conhecida não somente pelo professor, mas também pelo próprio aluno. 26 REFERÊNCIAS ARROYO, M. G. Assumir nossa diversidade cultural. In: Revista de Educação da AEC, nº 98, ano 25, Brasília, jan/mar de 1996, p.42-50. BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. 6. ed. São Paulo: Hucitec, 1992. BARROCO, S. M. M. S S; TULESKI, S. C. VIGOTSKI: O homem cultural e seus processos criativos. In: Psicologia da Educação, v. 24, p. 15-32, 2007 BEISIEGEL, Celso de Rui, (1974). Estado e educação popular. São Paulo: Pioneira. BRASIL, SEF. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa: 5ª. a 8ª. Série. Brasília: SEF, 2000. COSTA, A. C. M. Educação de Jovens e Adultos no Brasil: novos programas, velhos problemas. 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