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Questionário sobre Violência Obstétrica

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Após a leitura dos textos de apoio e consulta entre a literatura especializada, responda ao que se 
pede: 
 
1. Nos últimos anos, o problema da violência obstétrica tem ganhado espaço nos debates, como tema 
urgente, frente às políticas públicas para as mulheres. Infelizmente, a incidência dessas práticas 
ainda persiste. 
 
a) Quais seriam os fatores associados à perpetuação da violência obstétrica? 
 
O parto e o nascimento passaram a ser enxergados como um evento médico e masculino, incluindo 
a noção do risco e da patologia como regra. O parto se tornou em uma patologia que necessita de 
hospitalização e intervenção médica, deixando de ser visto como um evento natural, vinculado à 
sexualidade da mulher. A realidade, então, passou a se caracterizar em um atendimento com abuso de 
intervenções cirúrgicas, muitas vezes humilhantes, em que não há informação à mulher, e por vezes, até 
a negação ao direito de acompanhante. 
Tais atos são considerados um desrespeito aos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, além 
de ser uma violação dos direitos humanos. Sendo assim, vemos que a existência e a perpetuação da 
violência obstétrica podem ser entendidas através de práticas carregadas de significados culturais 
estereotipados de desvalorização e submissão da mulher, atravessadas pelas ideologias médicas e de 
gênero, que consequentemente se naturalizam na cultura institucional. Há um forte uso e abuso de 
crenças e valores baseados na tradição e em concepções consideradas ultrapassadas. 
 
b) Haveria algum elemento psicológico comum presente entre aqueles que praticam a violência 
obstétrica? 
 
O médico, não importa sua especialidade, possui uma figura fortemente enraizada no inconsciente 
dos pacientes, de que este é o detentor de todo o saber, e que tudo o que propõe está correto. Vemos 
que essa figura é estabelecida aos próprios médicos muito antes de iniciarem suas práticas, essa ideia é 
fixada enquanto os indivíduos estão cursando a graduação; surge uma sensação de superioridade por 
estarem no curso mais desejado pelos brasileiros, demandam respeito, esperam ser chamados de ‘doutor’ 
sem antes mesmo de terminar a graduação. 
Com esta situação em mente, a relação médico-paciente se torna uma relação de poder, em que 
o paciente não se atreve a contestar as decisões do ‘doutor’ por medo de ter o tratamento interrompido 
ou ter que procurar outro profissional. No contexto da violência obstétrica, percebemos um discurso 
violento do médico para a mulher, arraigado de falas que perpetuam o medo na gestante; dizem que se 
não for parto cesárea, ela e o bebê correm risco de vida; ou que ser parto vaginal, isso irá atrapalhar o 
Psicologia Hospitalar 
Exercício Avaliativo 
 
Prof. Dr. Fábio Rezeck 
 
Laura Pereira da Encarnação 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ato sexual posteriormente. Dessa forma, a paciente acata a todas as orientações recebidas, sem 
questionar e nem reivindicar seus direitos ou alterações. 
 
2. Haveria a prevalência de algum perfil específico entre as vítimas? Qual (is)? 
 
Sim, mulheres negras em um baixo nível sociodemográfico. A pesquisa ‘Nascer no Brasil’, realizada 
entre março de 2011 a fevereiro de 2013 (D’orsi et. al. 2014 apud Leite et. al., 2020), apontou que mulher 
negras com baixa escolaridade foram a maior parcela de 15.688 mulheres que avaliaram mal a qualidade 
de atenção ao parto. Em alguns serviços públicos de saúde no Brasil, estas mulheres de baixa 
escolaridade e renda são consideradas sem autonomia e sem capacidade de decidir sobre seu corpo no 
parto. 
Mas, curiosamente, segundo a OMS (2018 apud Leite, 2020), mulheres brancas com alta 
escolaridade relataram mais ocorrências de episiotomia e cesariana eletiva. Embora pareça ser paradoxal 
e contraditório, é fato conhecido que a população negra em geral sofre discriminação quando utiliza o 
serviço de saúde, devido ao racismo estrutural presente na sociedade. 
 
3. Seria possível associar o local onde acontece a violência obstétrica como elemento motivacional 
para a continuidade dessa violência? Explique, apresentado, caso positivo, quais o(s) elemento(s) 
estaria(m) relacionado(s). 
 
Sim. A condição do sistema de saúde é um elemento importante que deve ser levado em 
consideração para explicar possíveis motivações de maus tratos e experiências negativas; sabe-se que a 
condição de trabalho dos profissionais de saúde está relacionada com a qualidade do atendimento 
ofertado às mulheres. Uma estrutura inadequada tem potencial para ferir a dignidade e a privacidade da 
mulher, assim como reduzir a capacidade do hospital/maternidade em ofertar o melhor atendimento 
possível. Maternidades que operam frequentemente acima de suas capacidades podem deixar muitas 
mulheres com o sentimento de estarem sendo negligenciadas e tendo a comunicação dificultada com a 
equipe de saúde. 
 
4. Quais seriam as propostas para o trabalho psicológico a fim de se buscar a redução/extinção desse 
tipo de violência: 
 
a) Entre as vítimas; 
 
Não é comum a presença de um psicólogo no momento do parto, sendo mais frequente somente 
os médicos e enfermeiros; de qualquer maneira, a gestante necessita de um suporte emocional nesse 
momento, visto que os profissionais envolvidos não estão preparados para tanto. O psicólogo tem um 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
papel muito importante durante a gestação de uma mulher e sua família, a fim de garantir uma qualidade 
emocional e preparo para a chegada da criança. Faz-se necessário uma escuta durante toda a gravidez, 
por ser um processo de transição, rodeado de medos e mudanças para todos os envolvidos. 
Em questão ao combate à violência obstétrica, o psicólogo deve estar ciente do plano de parto de 
mulher e lhe ajudar a buscar e debater todas as informações com embasamento científico, para que esta 
faça a melhor escolha de acordo com aquilo que deseja; uma espécie de aconselhamento psicológico. 
Tais ações também são úteis para combater estereótipos de que o médico é o único detentor do saber, o 
que, muitas vezes, faz com que os pacientes se acanhem e acatem com as escolhas destes. A 
humanização dos processos de gestação e parto consiste em educar e informar as mulheres sobre seus 
direitos, poder de escolha sobre o parto, e isso contribui diretamente para a diminuição da possibilidade 
de violência obstétrica. 
 
b) Entre os profissionais da saúde; 
 
Sabe-se que os profissionais de saúde recebem uma educação voltada para o modelo 
intervencionista, que valoriza a tecnologia, exames sofisticados e procedimentos cirúrgicos; o parto hoje, 
ao invés de ser centralizado na mulher, é focado na figura do médico, que realiza o procedimento da 
maneira que é melhor para ele. O número alarmante de partos cesáreos está fundamento em maiores 
pagamentos honorários por cesárea; economia de tempo; realização clandestina de laqueadura tubária 
durante o parto. Tais aspectos se fundamentam na porcentagem tão pequena de partos realizados com 
pouca ou nenhuma intervenção obstétrica. 
A presença do psicólogo em um contexto hospitalar multiprofissional é recomendada para que se 
instrua o cuidado e o manejo adequado com as pacientes na ala da maternidade, para buscar diminuir a 
taxa de violência obstétrica, realizar psicoeducação para os profissionais sobre como o processo da 
gravidez é transformador na vida de uma mulher, buscar trazer uma maior compreensão da delicadeza e 
importância do momento. E em suma, sempre ressaltar como a violência obstétrica trata-se de uma 
violação dos direitos humanos. 
 
c) Nas instituições onde ela acontece. 
 
O psicólogo atua como um precursor e fiscal do cumprimento de políticas públicas; no caso 
estudado, é necessário que se busque políticas que combatam desigualdades sociais, valorizem os 
trabalhadores da área de saúde, informe sobre a utilização das boas práticas no parto e nascimento e 
busque a compreensão dos sujeitos de forma integral. A saúde deve ser compreendida comoprodutora 
de subjetividade, com o objetivo de resistir a todas as formas de violência, investindo esforços para 
garantir o respeito à vida humana. Cabe, também, uma adequação do departamento de recursos humanos, 
a partir da atuação em psicologia organizacional, para incorporar equipes multiprofissionais, realizar 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
capacitação profissional, engajar a equipe e revisar as práticas relacionadas ao atendimento das 
gestantes e bebês, desde o pré-natal até o pós-parto. 
 
• Referências: 
 
Desrespeitos e abusos, maus tratos e violência obstétrica: um desafio para a epidemiologia e a saúde 
pública no Brasil. LEITE, Tatiana Henriques et al., 2020. 
 
Violência obstétrica no Brasil: uma revisão narrativa. ZANARDO, Gabriela Lemos et al., 2017.

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