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Peculato Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente 04-08-2022 FUNDAMENTO LEGAL CONSIDERAÇÕES INICIAIS Trata-se de um crime que protege o patrimônio público. O nome “peculato” vem do latim “pecus”. Surgiu do Direito Romano, em que havia um crime chamado “depeculatus” previsto na “Lex Julia”. Resumidamente, em Roma, o bem mais valioso era a carne de boi, inclusive, era considerado um bem público pertencente ao império. Assim, qualquer pessoa que apropriava-se do boi, cometia esse crime. CONCEITO DO CRIME Consiste no crime funcional em que ocorre uma apropriação, um desvio ou uma subtração de coisa móvel pública ou particular, praticado pelo funcionário público em razão do seu cargo ou valendo-se dessa qualidade. BEM JURÍDICO PROTEGIDO O bem jurídico protegido é a administração pública no que tange ao patrimônio público. Ademais, além deste sentido material, é protegido a honestidade e probidade do funcionário público, o qual não pode se apropriar daquilo que não lhe pertence e sim aos órgãos públicos. SUJEITO ATIVO E PASSIVO Quanto ao sujeito ativo, o autor deste crime é o funcionário público. Portanto, trata-se de um crime próprio. Mas, é importante levantar alguns questionamentos: ✓ Alguém que não é funcionário público pode responder por crime de peculato, dependendo da situação, conforme art. 30 do CP e que tenha conhecimento da condição de funcionalismo público. ➔ Por exemplo, “A” foi ao INSS para calcular a aposentadoria, a atendente se ausentou no momento, “A” subtraiu o notebook do INSS. Este indivíduo não cometeu peculato. ➔ Outro exemplo, “B” (não é funcionário público) é partícipe da subtração de carro apreendido com “C” (funcionário público vigia do pátio). “C” deixou a porta aberta para “B” subtrair o carro. Assim, “B” irá responder por peculato, conforme previsto no art. 30 do CP (prevê a incomunicabilidade das Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário. Peculato culposo § 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano. § 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta. Peculato mediante erro de outrem Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. Peculato Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente circunstâncias pessoais, salvo se forem elementares do crime. No peculato, o funcionalismo público é uma elementar do crime). Mas, “B” deve saber que “C” é funcionário público. Já em relação ao sujeito passivo, temos a administração pública. É importante ressaltar que este crime abrange o bem móvel público e também bem móvel particular (peculato malversação). TIPICIDADE OBJETIVA I) PECULATO APROPRIAÇÃO a) Estudo dos elementos do tipo A base legal está no art. 312 “caput - 1ª parte” do CP (Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo. Ocorre quando o funcionário publico se apropria de um valor, bem ou objeto que ele tenha posse por causa do cargo. Destaca-se que “Apropriar-se” é tornar-se o proprietário. Ou seja, passa a agir como se dono da coisa fosse. Lembrando que o agente tem a posse do bem e a posse é lícita e é resultado de seu cargo. →Por exemplo, médico do hospital público se apropria de bisturi. Político se apropria de verba pública. Além disso, o objeto material do peculato são três coisas: a) dinheiro; b) valor (ex. títulos de créditos de dívida pública ; c) bem móvel. O peculato apropriação peculato é muito semelhante ao crime de apropriação indébita (neste caso o bem é particular). Neste caso, temos o dolo específico. Com o objetivo de transferir o domínio da coisa, tornar-se o proprietário definitivo, possui o “animus rem sibbi habendi”. O proveito é para o próprio agente ou para terceiro. Trata-se de um crime material, a consumação ocorre quando o agente inverte a posse, ou seja, se apropria. Cabe tentativa. b) Peculato malversação Malversação vem do direito italiano e significa cuidar mal de alguma coisa. Por exemplo, carro de “A” foi apreendido, a administração pública não é dona do carro, mas tem o dever de cuidar e zelar o bem. Assim, poderá ocorrer peculato nesta hipótese em que o bem não pertence a administração pública, mas está sob seus cuidados. No peculato em que o bem é particular e está sob a custódia do poder público, tal bem se não estiver sob custódia do poder público não há peculato. Portanto, o poder público deve ser o guardião da coisa, sendo necessário um documento que comprove isso. Somente será peculato depois de assinado tal documento. Por exemplo, o auto de penhora. c) Questões controvertidas Não existe peculato no que se refere a bens imóveis, pois não dá para apreender, ou seja, pegar o bem. Não caracteriza peculato quando a apropriação envolve mão de obra pública. →Por exemplo, “A” (func. Público) leva os pedreiros da obra pública par construir um galpão em sua chácara. Isto é o crime de improbidade administrativa. 10-10-2022 Mas, surge uma outra situação a ser avaliada: no caso do funcionário que se apropria passageiramente da coisa e deseja restituir a Peculato Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente coisa posteriormente. Esta situação é chamada de peculato de uso. Quanto ao peculato de uso, existem dois entendimentos: 1) Não caracteriza crime de peculato, pois não existe um elemento subjetivo do tipo (dolo específico) – não deseja- se tornar proprietário definitivo. Mesmo não sendo peculato, seria crime de improbidade administrativa. 2) A segunda posição vem prevalecendo atualmente. Essa posição define que caracteriza peculato, mesmo que o bem seja restituído posteriormente, haja vista que quando o agente publico utiliza o bem, valor ou coisa para proveito próprio, há o desvio da finidade do bem. Este seria o peculato desvio. O peculato não se aplica ao prefeito. Existe uma lei especial para ele (Decreto Lei. N. 201 de 1967). Não se aplica também aqueles que exercem ônus público (ex. tutor, curador). Cometerá crime de apropriação indébita. A respeito de peculato e prazos administrativos, por exemplo, funcionário público pega o dinheiro e devolve até o dia que ele seria utilizado, mesmo que o bem seja devolvido, caracteriza peculato, podendo caracterizar improbidade administrativa. Ademais, a declaração de que as contas estão ok (declaração de aprovação das contas pelo tribunal de contas’, não afasta a ilicitude de eventual peculato Caso seja restituído o dano causado, pode reduzir a pena no momento de dosimetria. II) PECULATO DESVIO a) Estudo da tipicidade objetiva Definido no art. 312, CAPUT, na parte final. O legislador não explica a forma desse desvio. Em sua essência, é uma modalidade de peculato apropriação, haja vista que só se desvia algo quando já se apropriou. “Desviar” significa alterar o destino. Portanto,o agente emprega o objeto para um fim diverso da sua finalidade original, assim se beneficiando. Trata-se do “descaminho”, ou seja, tirar do caminho original. Necessário que seja em proveito próprio ou alheio. Não se trata de peculato quando é desviada a finalidade para outra que não aquela específica. b) Exemplos práticos No dia a dia, é comum os desvios de verbas pelos funcionários públicos para tirar proveito. Outro exemplo, o desvio de combustíveis. III) PECULATO FURTO a) Fundamento O fundamento se encontra no art. 312, par. Primeiro, CP. b) Análise dos elementos do tipo O funcionário público não tem a posse do bem, valor ou dinheiro. Todavia, tem uma facilidade por ser funcionário público. Ocorre uma subtração. →Por exemplo, o funcionário público (faz faxina na receita estadual), têm as chaves de todas as salas (facilidade de acessar qualquer ambiente). Ao limpar a sala do tesoureiro, percebe que a portado cofre estava entreaberta. O funcionário não tinha posse do valor que estava no cofre, pegou uma parte do dinheiro. O bem pode ser público ou particular (sob cuidados do poder público). Também comete crime o funcionário publico que concorre para que terceiro subtraia. Ex. Funcionário púbico que desliga a câmera. Neste crime, temos o dolo específico. Trata-se de um crime material. A consumação se dá quando o agente passa a ter a posse do bem. IV) PECULATO MEDIANTE ERRO DE OUTREM Peculato Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente Previsto no art. 313, CP. Alguns doutrinadores chamam esse peculato de peculato estelionato. Por erro, o funcionário público recebe dinheiro, se apropria de bem ou valor, obtendo uma vantagem pessoal em torno disso. Mas, a diferença desse peculato para as outras modalidades está na origem do crime. Num primeiro momento o dinheiro ou qualquer outra utilidade (ex. título de crédito, joias, veículo, etc.)chegou até ele por erro espontâneo de alguém. Se caso o funcionário público induzir a pessoa em erro, configura-se estelionato. 11-08-2022 O erro pode envolver três situações, sendo elas: 1) O erro pode versar sobre a coisa ou obrigação entregue ao funcionário público. Não havia a necessidade de entregar aquele bem ou valor, mas o cidadão imaginava que devia. Por exemplo, “A” paga IPTU na prefeitura para o funcionário público, mas tinha isenção total”. 2) O erro pode ser sobre a pessoa. Por exemplo, “B” precisava pagar o IPTU na prefeitura, mas pagou no setor que não tinha competência de receber esse dinheiro. 3) Precisa pagar, no lugar certo. Mas, o erro é sobre a quantidade. Por exemplo, paga a mais e o funcionário público se apropria do valor excedente. Nessas três hipóteses, o funcionário púbico se aproveitou do erro cometido pelo cidadão. Em todos os casos, o funcionário público tem consciência de que o cidadão está se equivocando, ou seja, incidindo em erro. Portanto, o dolo é no sentido de que o agente está de má-fé, sabendo do erro cometido pelo cidadão se aproveita disso. Se o funcionário público estiver de boa-fé, não há crime de peculato. O crime se consuma com a efetiva apropriação do dinheiro ou utilidade pelo funcionário público. Admite-se tentativa (crime plurissubsistente). V) PECULATO ELETRÔNICO Previsto nos arts. 313-A e 313-B, abaixo dispostos: Apesar do nome, não se trata de um peculato e sim um crime de falsificação. Ocorre quando agente insere, altera ou excluí dados no sistema de informação, sem autorização da autoridade competente. →Por exemplo: alteração de dados no sistema previdenciário por funcionário público, modificando a pena no boletim informativo). Inserção de dados falsos em sistema de informações Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado Aa Peculato Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente VI) PECULATO CULPOSO Neste tipo penal, a pena é muito menor. Trata-se de um crime de pequeno potencial ofensivo, onde se insere as regras do JECRIM. Neste caso, o funcionário público não tem a intenção de se apropriar, utilizar ou desviar, mas por uma falta de dever objetivo de cuidado dá causa a outro crime praticado por alguém. Gera uma oportunidade para que um terceiro (funcionário publico ou não) venha a cometer um crime prejudicando a administração pública. Esse funcionário que agiu culposamente não possui ligação com o terceiro que atuou dolosamente. →Por exemplo: imagine que o tesoureiro deixou o cofre aberto e o faxineiro roubou dinheiro. O faxineiro cometeu peculato apropriação e o tesoureiro cometeu peculato culposo. →Guarda do fórum caiu no sono de madrugada, durante isso entraram e levaram algo. O guarda não desejava que aquilo acontecesse e nada foi combinado. Cabe ressaltar que é necessário que haja nexo de causalidade entre a conduta culposa e a conduta dolosa. O crime de terceiro deve ter se consumado para que configura-se o peculato culposo. Pode ocorrer a extinção da punibilidade com a reparação do dano da seguinte forma: • Se reparado até o trânsito em julgado, será dada uma decisão de extinção de punibilidade. • Se reparado depois do trânsito em julgado, não extingue a punibilidade, mas a pena cai em metade. ASPECTOS FINAIS É importante discutirmos se é aplicável o princípio da insignificância nos crimes contra a administração pública. Existe uma súmula do STJ que define que não se aplica quanto aos crimes de administração publica, haja vista que está em jogo a honestidade do funcionário público. No entanto, essa súmula vem sendo flexibilizada pelo STJ dependendo das circunstâncias do caso em concreto. Inclusive, mesmo que não haja punição na esfera criminal, haverá punição na esfera administrativa. A ação penal é incondicionada. Não tem segredo de justiça.
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