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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO NAIANA PEREZ BARROSO SÚMULAS VINCULANTES: LIMITES E APLICABILIDADE FORTALEZA 2007 NAIANA PEREZ BARROSO Súmulas Vinculantes: Limites e Aplicabilidade Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade Federal do Ceará (UFC/CE), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. José Cândido Lustosa Bittencourt de Albuquerque FORTALEZA 2007 NAIANA PEREZ BARROSO SÚMULAS VINCULANTES: LIMITES E APLICABILIDADE Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade Federal do Ceará (UFC/CE), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. José Cândido Lustosa Bittencourt de Albuquerque Aprovada em: 18/ 01 / 2006 BANCA EXAMINADORA ________________________________________________________ Prof. José Cândido Lustosa Bittencourt de Albuquerque (Orientador) Mestrando em Direito Constitucional da Universidade Federal do Ceará _________________________________________________________ Prof. Sérgio Bruno Rebouças Mestrando em Direito Constitucional da Universidade Federal do Ceará _________________________________________________________ Dr. Daniel Miranda Advogado A meus pais. “Não é um notável talento o que se exige para assegurar o êxito em qualquer empreendimento, mas sim um firme propósito.” Thomas Wittlam Atkinson RESUMO Súmulas Vinculantes: Limites e Aplicabilidade. O presente trabalho tem por objeto analisar o novo instituto introduzido no sistema jurídico brasileiro a fim de demonstrar sua aplicabilidade prática e seus delineamentos. Pretende-se afastar dos preconceitos que giram em torno do tema, demonstrando a melhora que sua aplicação trará ao sistema. As hipóteses do trabalho monográfico serão investigadas através de pesquisa do tipo Bibliográfica, procurando explicar o instituto através da análise da literatura já publicada em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita que envolva o tema em análise, bem como documental, através de projetos, leis, normas, resoluções, pesquisas on-line, dentre outros que tratam sobre o tema. Segundo a utilização dos resultados, a pesquisa é Pura, tendo por finalidade aumentar o conhecimento do pesquisador para uma nova tomada de posição. Segundo a abordagem, é qualitativa. Quanto aos objetivos, a pesquisa será descritiva, buscando descrever o fato, sua natureza e suas características. Classifica, explica e interpreta os fatos. Exploratória, procurando aprimorar idéias. Ajudando na formulação de hipóteses para pesquisas posteriores, além de buscar maiores informações sobre o tema. Palavras-chave: Súmulas Vinculantes. Limites e Aplicabilidade. Sistema Civilista ABSTRACT Vinculative Enunciated:Stare Decisis. Limits and Applicability. The monographic study hereby presented has the scope of analyzing this new institute introduced by the Brazilian legal system in order to demonstrate its practical applicability and outlines. It has the intention of breaking the prejudice that surrounds the theme, showing the improvement its usage brings to the system.The hypotheses of the monographic work will be investigated through bibliographical research, looking for an explanation for the problem by analyzing previous publications such as books, magazines, detached articles and printing press which involve the theme, as well as document research through projects, rules, resolutions, online material and other means that embrace our work. According to the results utilization, the research is pure, intending to increase the knowledge of the researcher towards a new perspective, a new decision-making possibility. According to the approach, its priority is the quality. About the goals, the research will be describable, intending to expose the fact, its nature and characteristics. It classifies, explains and interprets the facts. It is also exploratory, trying to improve ideas, helping to formulate hypotheses to further researches, in addition to seeking more information about the theme. Key words: Stare decisis. Limits and Applicability. Civil law system. SUMÁRIO 1.INTRODUÇÃO.....................................................................................................................................09 2.ESCOLAS JURÍDICO-FILOSÓFICAS.................................................................................................11 2.1 Escola do Direito Natural .................................................................................................11 2.2Positivismo Jurídico............................................................................................................12 2.3 Escola Histórica...................................................................................................................13 2.4 Escola Sociológica Americana..........................................................................................14 2.5 RealismoJurídico................................................................................................................14 2.6 Visão Eclética......................................................................................................................16 3. ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA INGLESA E AMERICANA..................................................................17 3.1 Os tribunais Ingleses e sua vinculação ao precedente...................................................18 3.1.1 Corte dos Lordes................................................................................................................19 3.1.2 Corte de Apelação.............................................................................................................19 3.1.3 Alta Corte de Justiça .........................................................................................................20 3.1.4 Corte da Coroa...................................................................................................................20 3.1.5 Corte dos magistrados e Corte dos condados...................................................................21 3.2 Os tribunais americanos e sua vinculação ao precedente ............................................21 3.2.1 Justiça Federal...................................................................................................................22 3.2.2 Justiça Estadual.................................................................................................................23 3.2.3 Vinculação ao precedente ................................................................................................23 4. O PRECEDENTE JUDICIAL.............................................................................................................25 4.1 Classificação dos precedentes.........................................................................................26 4.1.1 Precedentes declarativos ou criativos...............................................................................27 4.1.2 Precedentes persuasivos ou obrigatórios.........................................................................27 4.2 Os repertórios de precedentes.........................................................................................28 4.2.1 O sistema inglês................................................................................................................28 4.2.2 O sistema norte-americano................................................................................................29 4.3 Elementos do precedente .................................................................................................30 4.3.1 Ratio Decidendi ................................................................................................................30 4.3.2 Obter dictum......................................................................................................................32 4.3.3 A necessária generalidade dos fatos................................................................................32 4.4 Problemas na determinação da Ratio Decidendi............................................................33 4.4.1 Múltiplas Ratione decidendi...............................................................................................33 4.4.2 Ausência de Ratio decidendi.............................................................................................33 4.5 Técnicas de utilização do precedente .............................................................................34 4.5.1 Distinção............................................................................................................................34 4.5.2 Alteração das circunstancias ............................................................................................35 4.5.3 Decisões per incuriam.......................................................................................................36 4.5.4 Decisões contraditórias na mesma hierarquia...................................................................37 4.5.5 Revogação.........................................................................................................................37 4.6 Eficácia temporal ................................................................................................................39 4.6.1 Eficácia retroativa...............................................................................................................39 4.6.2 Eficácia prospectiva............................................................................................................40 5.PRECEDENTES VINCULANTES NO BRASIL ..................................................................................42 5.1 Os Assentos Portugueses..................................................................................................43 5.2 Controle Concentrado de Constitucionalidade................................................................44 5.2.1 Efeito vinculante do controle concentrado de constitucionalidade.....................................44 5.2.2 Distinção entre efeito erga omnes e efeito vinculante .......................................................45 5.2.3 Vinculação da Ação Direta de Inconstitucionalidade e a Emenda 45/04...........................46 5.2.4 Limites objetivos.................................................................................................................46 5.2.5 Limites subjetivos .............................................................................................................47 5.2.6 Efeito Vinculante da medida cautelar.................................................................................48 5.3 Sentença Normativa Trabalhista........................................................................................49 5.4 Poder Normativo da Justiça Eleitoral................................................................................50 5.5 Incidente de Uniformização da Jurisprudência ...............................................................50 5.6 Súmula..................................................................................................................................51 5.6.1 Modelo Clássico.................................................................................................................51 5.6.2 Vinculação interna..............................................................................................................54 5.7 Súmula Universalmente vinculante..................................................................................54 5.7.1 Competência .....................................................................................................................55 5.7.2 Pressupostos ....................................................................................................................56 5.7.3 Legitimados ......................................................................................................................57 5.7.4 Quórum para aprovação...................................................................................................58 5.7.5 Limites Objetivos...............................................................................................................58 5.7.6 Limites subjetivos .............................................................................................................59 5.7.7 Eficácia temporal ..............................................................................................................60 5.7.8 Revogação .......................................................................................................................61 5.7.9 Possibilidade de interposição de Reclamação..................................................................61 6. ANÁLISE CRÍTICA DO TEMA ...........................................................................................................63 6.1 Desvantagens......................................................................................................................63 6.1.1 Rigidez...............................................................................................................................63 6.1.2 Complexidade....................................................................................................................64 6.1.3 Ofensa à persuasão racional do juiz.................................................................................65 6.2 Vantagens............................................................................................................................66 6.2.1 Estabilidade........................................................................................................................66 6.2.2 Previsibilidade....................................................................................................................67 6.2.3 Igualdade...........................................................................................................................67 6.3 Paralelismo de Sistemas....................................................................................................68 6.4 Aplicabilidade......................................................................................................................69 7. CONSIDRAÇÕES FINAIS..................................................................................................................71 8. REFERÊNCIAS..................................................................................................................................731 INTRODUÇÃO Em praticamente todos os países do mundo, uma decisão tomada pelo poder Judiciário é posteriormente aplicada a casos a ela semelhantes, o chamado precedente judicial. Instituo de pouca aplicação no sistema jurídico brasileiro, agora ganha contornos de relevada importância com a inclusão do art. 103-A e a publicação da Lei 11.417 em 19 de dezembro de 2006. O presente estudo visa basicamente discutir as origens do instituto, qual seja o sistema do common law, e por conseqüência os sistemas judiciais da Inglaterra e dos Estados Unidos da América nos quais o desenvolvimento do tema enriquece e facilita a aplicação no Brasil. Quase desconhecido entre nós o precedente judicial será esmiuçado em suas partes componentes, tais como a ratio decidendi e o obter dictum. Tudo isso para se chegar à análise das Súmulas Vinculantes, primeiramente em seus aspectos formais, a questão procedimental, posteriormente, buscando a apreciação da questão de fundo do tema, qual seja, as vantagens ou desvantagens do instituto, novo em nosso sistema judicial. Não se buscará nestas linhas uma resolução final para a questão das Súmulas Vinculantes, tema por demais rico para ser resolvido de forma peremptória e apressada. Como tudo o que faz parte do universo jurídico este estudo busca tão somente compilar o entendimento atual sobre o tema, registrando a opinião da acadêmica que o redige, bem como dos professores envolvidos neste trabalho 2 ESCOLAS JURÍDICO- FILOSÓFICAS A busca infrutífera do homem pelo seu conceito de Direito torna a questão do precedente judicial variável de acordo com a visão que se tem do mesmo. Assim, as várias escolas filosóficas atribuem ao precedente judicial distintos graus de relevância, dentro do que julgam ser o Direito. Por isso, se fará uma breve análise das escolas mais conhecidas, dando especial ênfase às escolas que conferem importância ao common law, vez que o instituto objeto do presente estudo encontra nele suas origens. 2.1 Escola de Direito Natural O Direito Natural, idéia muito antiga, deriva do entendimento de que o homem é parte da natureza que o rodeia, dela podendo extrair lições para regrar seu próprio modo de viver. O Direito Natural poderia ser distinguido enquanto idéia ou realidade, como idéia teria um sentido tão antigo, que ninguém lhe poderia assinalar o nascimento. No Direito canônico era assente o entendimento de que a lei natural seria a lei entre o divino e o profano, seria assim uma lei imperfeita, mera corruptela da suprema perfeição do divino. Parte esta escola da visão de que há um direito anterior ao homem, posto nas nuvens, acima de qualquer intermitência ou fraqueza humana, o Direito produzido pelos homens deve ser mero reflexo do direito natural já existente. Partindo desta concepção, muitos adeptos do direito natural não atribuem ao precedente judicial a possibilidade de criar direito novo. Outros, porém, menos puristas afirmam que os juízes, em vez de produzirem Direito, devem descobri-lo a partir dos princípios de Direito Natural e da razão. 2.2 Positivismo Jurídico O Positivismo contrapõe-se à idéia de Direito Natural. Enquanto os jusnaturalistas baseiam-se em princípios superiores e absolutos, aos positivistas interessa, predominantemente, os pressupostos lógico-formais de sua vigência. No que tange à importância dada ao precedente judicial essa escola diverge de maneira diametralmente oposta, Kelsen afirma que a descoberta do Direito pelo juiz consiste apenas na determinação da norma geral a aplicar no caso concreto, e mesmo esta determinação não teria um caráter simplesmente declarativo, mas um caráter constitutivo. Outros porém, apesar de atribuírem à atividade jurisdicional o verdadeiro sentido de garantir a coerência do sistema, quanto ao precedente judicial, são categóricos ao afirmar ser a lei a única fonte do Direito. 2.3 Escola Histórica A Escola Histórica surgiu na Alemanha com Pchuta e Savigny que buscou elevar o Direito à categoria de ciência, em franca oposição a escola jusnaturalista. Negava esta escola a idéia de um Direito supremo e universal, acreditando em uma interpretação da norma a luz da occasio legis – circunstância histórica da regra interpretanda - e da origo legis- origens da lei, remontando às primeiras manifestações da instituição regulada. Assim, a occasio legis diz respeito às causas históricas próximas a origo legis diz respeito às causas remotas. Na visão da Escola Histórica, cabe ao juiz, ao interpretar a norma, conformá- la às necessidades da época e do lugar, e assim, o precedente judicial seria fundamental na construção do Direito, tendo em vista sua natureza constitutiva. Dessa forma, para o Direito anglo-americano a Escola Histórica é fonte inesgotável de ensinamentos, tendo em vista seu Direito criado através dos tempos, a partir de costumes sedimentados na figura dos precedentes judiciais, sendo estes o exemplo clássico da aplicação dos ensinamentos da Escola Histórica. 2.4 Escola Sociológica Americana Esta Escola vê o Direito pelo prisma do povo, no sentido de que o Direito deve ser a maximização das necessidades sociais e a minimização das tensões e custos sociais, numa busca pelo equilíbrio de interesses. A interpretação sociológica busca precipuamente: a aplicação da norma aos fatos por ela previstos, dando a ela eficácia; a atualização da norma através de uma interpretação histórico-evolutiva que dá elasticidade à norma, permitindo que ela abranja situações novas que não puderam ser previstas pelo legislador; o terceiro e mais importante objetivo refere-se à satisfação dos anseios sociais, às reformas, cumprindo às exigências do bem comum. Essa interpretação abre o sistema jurídico para a realidade social, inviabilizando a autopoiese do Direito, segundo a qual o sistema jurídico é autônomo em relação ao sistema social. Partindo então do pressuposto de que cabe ao juiz o papel de buscar esse equilíbrio de interesses, negando a visão de mera declaração de um Direito preexistente, defendem os juristas o papel criador do precedente judicial, afirmando que sobretudo no common law há também Direito criado pelas decisões judiciais. 2.5 O Realismo Jurídico Americano De forma geral consiste a escola realista na adoção de um método empírico de investigação científica em que se dá proeminência à realidade concreta e se rejeita a presença de comandos ideológicos na valorização da prática judicial na definição do direito, dando às disposições legais papel secundário. Sob esta denominação abrigam-se dois grupos de juristas. O primeiro grupo surgido no início do século XX é capitaneado por Oliver Wendell Holmes Jr, que consagra a idéia do realismo na frase (SOUZA p.27, 2006): “a existência do Direito não tem sido lógica, tem sido prática”. Holmes rejeita a idéia do Direito gravado no firmamento, bem como classifica os estudiosos da escola histórica como meros arqueólogos do Direito, sua visão de Direito é basicamente experiência, aos jusnaturalistas atribui uma ingenuidade ao crerem que o que lhes é familiar e aprovado, deve ser aceito por todos os homens em todos os tempos. Assim, claro está o entendimento desta corrente acerca do precedente judicial, acreditando que os juízes criam Direito O segundo grupo do realismo americano, surgido em meados dos anos trinta, trás duas importantes novidades ao trabalho de seus antecessores. Num primeiro momento, analisa a importância do trabalho de decisão judicial para a compreensão do que é Direito. Além disso, constata que os juízes tomam decisões numa grande variação de fundamentos, sendo alguns destes racionais e analíticos, outros, subjetivos, fruto da impossibilidade de neutralidadedo magistrado, pois na verdade os juízes tomam suas decisões de acordo com suas próprias preferências políticas ou morais, e, então escolhem uma regra jurídica apropriada como uma racionalização. Assim, este segundo grupo trouxe a importante constatação que a decisão do magistrado em sua inteireza não pode oferecer vinculação, devendo-se separar as partes que realmente fundamentam a decisão. 2.6 Visão Eclética O meio termo entre todas estas escolas e suas interpretações, na busca do equilíbrio entre a valorização do precedente judicial e a lei posta, está na síntese do brilhante Justice Benjamin Cardozo (SOUZA, p. 35, 2006): “A teoria dos autores mais antigos era a de que os juízes não legislavam de maneira alguma. Uma norma preexistente estava lá, encravada, porém, escondida no conjunto do Direito consuetudinário. Tudo que os juízes faziam era tirar os mantos e expor a lei. Afastando-se da opinião de que o Direito nunca é feito por juízes, os defensores foram conduzidos às vezes a conclusão de que nunca o direito é feio por outra pessoa. Os costumes, não interessa quão firmemente estabelecidos, não são Direito. Onde o Juiz encontra o Direito que incorpora em seu julgamento? Há momentos em que a fonte é obvia, a regra que se enquadrarão os casos deve ser fornecida pela Constituição ou pela Lei. É verdade que códigos e leis não tornam o juiz supérfluo nem seu trabalho perfunctório ou mecânico. Há lacunas a serem preenchidas . Há dúvidas e ambigüidades a serem esclarecidas. Há dificuldades e erros a serem mitigados, se não evitados.” 3 A ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA INGLESA E AMERICANA Seria impossível entender a teoria de aplicação do precedente judicial em seus países de origem sem, primeiramente, conhecer o funcionamento e a hierarquia dos sistemas inglês e americano, aplicadores da doutrina do stare decicis.( ou seja a aplicação do precedente a caso semelhante posterior). Importante salientar que não se fará aqui uma análise de todo o sistema judicial da Grã– Bretanha e sim, apenas da Inglaterra. Primeiramente se fará uma pequena, porém pertinente observação acerca da adesão do Reino Unido em 1973 à mais alta corte para fins de Direito Comunitário: o Tribunal de Justiça da Comunidade Européia, sendo esta uma das mais importantes mudanças no commom law inglês em vários séculos, dentre muitas outra que veêm ocorrendo desde os fins do séc. XIX. Como se verá adiante, o Tribunal da Comunidade Européia, denominado apenas Tribunal de Justiça, é superior até mesmo à House of Lords inglesa. Através de um mecanismo denominado reenvio prejudicial, em questões relacionadas a Direito comunitário há envio da questão ao Tribunal de Justiça para que ele também aprecie a questão. Não há hierarquia entre as cortes nacionais e o Tribunal, e este também não se vincula, obrigatoriamente, às suas decisões anteriores, porém em geral, as segue. 3.1 Os Tribunais ingleses e sua vinculação aos precedentes judiciais. Neste tópico se fará uma síntese acerca do sistema judicial inglês, individualizando seus tribunais, e comentando brevemente sua vinculação às suas próprias decisões ou às decisões de tribunais superiores. 3.1.1 Corte dos Lordes Esta é a mais alta corte judicial da Inglaterra (também da Irlanda do Norte e Escócia), tendo também competência legislativa. A apreciação dos processos é feita pelo Comitê da Apelação da Casa, formado apenas por profissionais do direito. Os juízes são escolhidos entre os advogados mais proeminentes que atuam perante a Corte, ou por promoção de outros juízes vindos dos Tribunais inferiores. Este comitê tem competência tanto cível quanto criminal e predominantemente aprecia recursos. Em relação a sua posição de Corte Suprema dentro do sistema inglês, não há qualquer dúvida de que a House of Lords é superior dentre todos os tribunais e juízes ingleses, que devem seguir suas decisões. A questão que desperta controvérsia se relaciona à possibilidade da própria corte superior não se vincular às suas próprias decisões anteriores, o que significaria a corte desconsiderar seu precedente, estando todos os tribunais inferiores a ele vinculados. Sempre foi assente o entendimento de que a Corte não poderia deixar de seguir seus precedentes. Ocorre que no ano de 1966, quando a Corte através de um Practice Statement anunciou que a corte poderia afastar-se de seus precedentes. Muitas foram as publicações acerca desta possibilidade de a Corte deixar de seguir precedente anterior, deixando claro que se trata de casos extremos, quando por exemplo, a situação seja outra, forçando que o direito a ser aplicado também seja diverso. Apesar desta potestade da Corte, por ela mesmo concedida, a House continua bastante comedida quando se depara com a possibilidade de afastar seu próprio precedente. Desde a publicação do Practice, e de suas justificações nos Law Reports, já se passaram quarenta anos, e mesmo assim, a moderação é a regra quando se trata de afastar precedente próprio. Saliente-se que entre os anos de 1980 e 1996 a Corte foi suscitada em 29 casos a não seguir seu precedente, porém em apenas 8 destes casos o precedente não foi seguido. Assim, inobstante continue seguindo seus próprios precedentes na maioria das vezes, o Practice Statement de 1966 foi importante por possibilitar a Corte acompanhar mudanças que se processam no seio da sociedade e que não podem ser deixadas à margem pelo Direito. 3.1.2 Corte de Apelação Um grau abaixo da House of Lords fica a Corte de Apelação que é na prática dividida em uma parte Criminal e outra Cível. No que tange a vinculação em relação aos precedentes a Corte de Apelação, em sua divisão Cível é subordinada às decisões tomadas na Casa dos Lordes e também se vincula às suas próprias decisões anteriores, somente delas podendo afastar-se em casos extremos como: conflito entre precedentes, alteração de precedente pela Casa dos Lordes ou precedente estabelecido na ignorância de precedente anterior. À Divisão Criminal se aplica tudo que foi anteriormente dito para a Divisão Cível, com apenas uma diferença. Tendo em vista que a Divisão Criminal trata de Direito Penal, suas decisões devem ser bem mais flexíveis, evitando-se assim a condenação de um inocente, pela simples vinculação a precedente anterior. Assim, sempre que a Divisão acreditar que a decisão anterior foi injusta poderá dela afastar- se, vez que trata-se do inestimável valor liberdade. 3.1.3 Alta Corte de Justiça Esta corte é a de divisão mais complexa para nós brasileiros, acostumados a divisões estanques e claras de nossos tribunais. Esta corte é dividida em três unidades e também tem competência recursal e originária. Hierarquicamente é inferior à Corte de Apelação devendo seguir seus precedentes. 3.1.4 Corte da Coroa Possui este Tribunal tanto competência recursal como originária. Esta corte deve seguir os precedentes dos tribunais superiores, porém, suas decisões não tem capacidade de vincular nem ela própria, pois suas decisões não geram precedentes internos nem externos. 3.1.5 As cortes dos magistrados e as cortes dos condados São as cortes inferiores obrigadas a seguir os precedentes dos tribunais superiores. Suas decisões não são reportadas e não podem produzir precedentes obrigatórios ou mesmo persuasivos e assim, também não se obrigam por suas próprias decisões. 3.2 Os Tribunais Americanos e sua vinculação ao precedente Para se falar do Direito americano é forçoso mencionar a origem deste Estado, qual seja, a de colônias independentes fundadas por ingleses. No chamado Novo Mundo forjou-se um sistema primitivo de Direito com fortes bases no commom law inglês e na Bíblia. Surgiram também codificações, espelho da origem dos colonos, não só inglesa,como também alemã, irlandesa e francesa. Em 1776 veio a Declaração de Independência das colônias americanas, que passaram a não mais obedecer às leis inglesas, elaborando leis próprias. Porém, devido a origem inglesa da grande maioria dos colonos, o Estado Americano desde seu início segue a tradição do common law inglês. Esta divisão da Justiça americana é de mais fácil assimilação por parte de nós brasileiros seguidores do sistema civilista, vez que a exemplo do sistema brasileiro é dividida em Justiça Federal e em Justiça Estadual. 3.2.1 A Justiça Federal Americana A Suprema Corte é a superior instância de toda a organização judiciária americana, formada por um Chefe de Justiça e mais oito Ministros. As cortes imediatamente inferiores a esta são os chamados Tribunais Federais de Apelação, que seguindo a divisão geográfica do país em doze regiões, são em mesmo número, e mais uma Corte de Apelação para o Circuito Federal. Por fim, representando o primeiro grau de jurisdição da justiça federal americana, temos as Cortes Distritais, havendo pelo menos uma em cada Estado da federação americana. 3.2.2 A Justiça Estadual Americana São cinqüenta os estados da federação americana, o que representa cinqüenta diferentes organizações judiciárias, porém há grande similitude entre elas possibilitando um estudo de visão geral acerca do tema. Todos os estados possuem uma Corte de Última Apelação que dela emerge o entendimento majoritário acerca da matéria estadual posta para apreciação. Abaixo das Cortes de Apelação estão as Cortes Intermediárias, que somente existem em metade dos estados americanos, têm em regra, competência em recursal. Presente em todos os estados da federação americana as Trial Courts tem representação em todo o Estado,sua competência pode ser geral ou específica, como em alguns estados em que a competência cinge-se a Direito de Família, por exemplo. Já as Cortes de Jurisdição Inferior tem competência apenas para matérias que envolvam pequenas causas, relacionadas a pequenos valores em dinheiro, ou violações menores da lei criminal. 3.2.3 Vinculação aos precedentes no sistema judiciário americano A Suprema Corte não se vincula aos seus próprios precedentes, deles podendo afastar-se sempre que lhe parecer necessário, não havendo sequer necessidade de justificações. Porém, todos os tribunais americanos, tanto federias como estaduais, são vinculados pelos precedentes da Suprema Corte. No que tange às Justiças estaduais e federais, as decisões tomadas em um âmbito não vinculam o outro, apenas representam precedentes persuasivos. Dentro da Justiça Federal, guardam grau de persuasão apenas as decisões dentro de uma mesma jurisdição, assim, as decisões de uma Corte de Apelação são vinculantes para as Cortes Distritais da mesma Jurisdição, somente. A mesma regra é seguida pela Justiça Estadual, vez que as cortes superiores vinculam as inferiores, porém, estando dentro da mesma jurisdição, bem como o fato de que a primeira instância não produz qualquer precedente. 4 O PRECEDENTE JUDICIAL O Precedente Judicial pode ser conceituado como um caso sentenciado ou uma decisão tomada que pode no futuro, ser aplicada à questão similar ou idêntica, posteriormente surgida. Duas são as teorias que buscam explicar a natureza jurídica do Precedente Judicial: a teoria declarativa e a teoria constitutiva. A Teoria Declarativa, também chamada ortodoxa, afirma que o Direito preexiste à declaração judicial, o direito seja ele legislado ou costumeiro, independe da declaração judicial, que é apenas uma constatação ou prova da existência do direito. Este entendimento acerca do precedente judicial remonta ao Século XVI, tendo acolhida até os nossos dias atuais. A Teoria Constitutiva, hoje dominante principalmente nos Estados Unidos, entende que a decisão judicial cria direito. Esta teoria teve crescimento com as críticas feitas à teoria declarativa que não explica aqueles casos em que os tribunais tomam decisões não previstas pelo ordenamento, resolvendo os inúmeros casos não previstos pelo legislador. São questões de direito somente encontradas nas decisões dos tribunais. Até mesmo na tradicional Casa dos Lordes inglês já se reconhece que o Juiz faz a lei, com moderação. A principal crítica a teoria constitutiva refere-se à separação dos poderes, pois o juiz criar direito seria ofensa à competência do Poder Legislativo. Porém este argumento parece colocar o principio da separação dos poderes em patamar acima dos demais, pondo de lado as vantagens que adviriam das aparentes ofensas à separação. A separação dos poderes esboçada por Aristóteles e formulada por Monstesquieu, regra segundo a qual um Poder não pode invadir as atribuições de um outro, não merece esse absolutismo que gera crítica à teoria constitutiva. Mesmo em nosso sistema, todos os poderes de uma forma ou de outra exercem atividades a ele não inerentes, flexibilizando o princípio e ao mesmo tempo dando a ele efetividade. Outra crítica se refere à retroatividade do direito criado pelo tribunal, atingindo relações já consolidadas. O último argumento se refere ao fato de o direito criado pelos tribunais, vincular apenas alguns e não todos os tribunais. Ora essa crítica não seria aplicável ao nosso sistema, vez que a Súmula Vinculante, editada pelo Supremo Tribunal Federal é de seguimento obrigatório para todo o Poder Judiciário, não vinculando apenas o Poder Legislativo, em obediência à separação dos poderes. 4.1 Classificação dos Precedentes Judiciais Basicamente todos os sistemas jurídicos aceitam o precedente judicial como sendo a decisão anteriormente tomada pelo Poder Judiciário que terá aplicação às decisões similares e a ela posteriores. A importância do precedente depende do sistema em que ele estiver inserido, e da relevância dispensada ao instituto, que pode ter natureza meramente declarativa ou criativa, também podendo ser persuasivo ou obrigatório. 4.1.1 Precedentes Declarativos ou Criativos O precedente declarativo é aquele que manifesta direito já existente. Em sistemas mais desenvolvidos os precedentes declarativos são os mais comuns, vez que o direito já está previsto pela atividade legislativa, ou mesmo por decisões judiciais anteriores. O precedente criativo apesar de ser em menor número apresenta maior importância, pois inova o sistema jurídico apresentando uma nova norma. 4.1.2 Precedentes Persuasivos ou Obrigatórios O precedente persuasivo é aquele que o juiz segue se quiser, baseando-se na sua convicção de que aquele precedente seria aplicável ao caso posto para sua análise. No Direito inglês os precedentes persuasivos são aqueles editados por tribunais inferiores. O precedente obrigatório se subdivide em relativamente obrigatório e absolutamente obrigatório. O relativamente obrigatório é aquele do qual a Corte pode-se afastar desde que existam fundadas razões para tanto, razões que podem referir-se a uma incoerência do precedente ou a um erro no mesmo. Porém, não há espaço para subjetividade da Corte não aplicadora do precedente, o erro deve ser objetivamente apontado, para se justificar a não aplicação do precedente relativamente obrigatório. Já o precedente absolutamente obrigatório é aquele que não admite ser afastado pelo julgador em nenhuma hipótese. 4.2 Repertórios de Precedentes 4.2.1 O Sistema Inglês Os repertórios de precedentes (law reports) representam a documentação dos casos mais importantes perante os tribunais, gerando a possibilidade de consulta aos precedentes formados. O sistema de documentação inglês passou por várias fases. Primeiro surgiram os Anuários Year Books, que não eram exatamente compilações de casos anteriores e sim, regras de como bem proceder em juízo.Posteriormente, no ano de 1537 surgem as compilações como hoje conhecidas, porém eram menos organizadas e iminentemente privadas, porém, suas citações perante os Tribunais lhes trouxe legitimidade, e elas ganharam em organização. Por fim, a terceira fase teve início em 1865 com o início as publicações do Incorporated Council of Law Reports, fase que perdura até os dias atuais. Decorre da própria lógica que se um sistema jurídico se baseia nos precedentes é preciso haver uma compilação e organização desses precedentes, uma publicação que os torne conhecidos. Os repertórios de precedentes (law reports), significam a compilação de decisões judiciais consideradas as mais relevantes. Um law report deve conter o nome das partes, o caso discutido, o Tribunal donde é proveniente e principalmente o fundamento utilizado na decisão. Digno de espanto é o fato de na Inglaterra não existir um sistema oficial de publicação dos repertórios. A compilação dos casos é feita pela iniciativa privada e não pelo governo, o que para nós romanistas parece uma grande contradição, como se sustenta a Justiça baseando-se em publicações privadas! Porém, existem várias instituições que se dedicam à publicação dos precedentes, sendo a mais respeitada a pertencente a uma organização não governamental, são os chamados The Law Reports, publicados pela Incorporated Council of Law Reports for England and Wales. 4.2.2 Sistema Norte-Americano Da mesma forma que na Inglaterra, nos Estados Unidos a publicação dos precedentes é de fundamental importância para que o sistema funcione de maneira coesa. Na América as publicações são ainda mais importantes, vez que são em número bem maior que na Inglaterra e também pelo fato de a Justiça americana subdividir-se em estadual e federal. Além das compilações de particulares, a União publica os repertórios da Justiça Federal e os Governos Estaduais publicam as decisões de sua justiça estadual. O funcionário encarregado desta tarefa chama-se reporter. 4.3 Elementos do Precedente A aplicação do precedente ao caso concreto é tarefa detalhada do aplicador do direito e não mera aplicação sem qualquer análise mais apurada como querem crer a maioria dos analistas treinados sob o pálio da cultura romano-germânica. O processo de aplicação não é uma atividade mecânica e desprovida de análise crítica, não é o juiz um mero robô que aplicará o precedente sempre que ocorrer tais e quais fatos. Não basta uma mera leitura do precedente aplicável ao caso, e sim um estudo de todos os seus elementos, como se fará adiante. 4.3.1. Ratio Decidendi Além de toda a celeuma, é consenso na maioria da doutrina, que a razão (Ratio) de um precedente seria toda a parte da decisão que vincule a fundamentação para a decisão do caso, tudo que foi utilizado pelo juiz na sua decisão, tendo caráter objetivo, como leis, doutrina ou jurisprudência, e não entendimentos próprios do magistrado, que não podem ser vinculantes. As várias teorias que buscam conceituar a Ratio Decidendi de uma decisão giram em torno dos seguintes: seria a Ratio tudo aquilo que retirado causaria outra espécie de decisão. Seria então a razão a premissa maior de um silogismo necessário, cuja premissa menor seria a decisão tomada, a conclusão em si. Outra teoria diz que não há qualquer participação judicial na formação da Ratio, esta seria tão somente a resposta aos estímulos dados pelo caso concreto. Assim, o binômio estímulo/resposta seria a Ratio Decidendi daquele caso específico. A última teoria acerca da afirma ser esta composta pelos fatos considerados pelo juiz como fundamentais e a decisão tomada pelo juiz baseada nestes mesmos fatos. Deve ser dada atenção ao fato de que a decisão acerca do que é fundamental ou não em uma decisão passa também pela análise dos sentidos descritivos e prescritivos da Ratio Decidendi. O sentido descritivo refere-se tão somente a saber como foi aquela decisão tomada, o modus operandi utilizado pelo juiz para aquela decisão. Já o sentido prescritivo identifica a proposição jurídica que vincula ou obriga a decisão do caso posterior, ou seja, identifica a proposição de Direito prescrita pelo caso anterior ao caso posterior, e que nesta hipótese deve ser seguida. 4.3.2 Obter Dictum O outro elemento do precedente que se opõe a razão é o Obter Dictum. A descoberta do que é Dictum se faz por exclusão, tudo aquilo que não for a Ratio de uma questão será o Dictum, não sendo, portanto obrigatória. 4.3.3 A necessária generalidade dos fatos Decorre da própria lógica a necessidade de generalidade na questão apreciada para que seja possível a aplicação de um precedente. Quanto mais geral for a questão analisada, a mais casos será possível aplicar o precedente formulado. Porém tanto há limites para a generalidade das questões como também para a semelhança entre os casos. Seria absurdo exigir para a aplicação de um precedente que houvesse identidade absoluta entre os casos, sob pena de impossibilitar por completo a aplicação de qualquer precedente a caso posterior. O critério para o correto grau de extensão dado a generalização deve ter por parâmetro e limite a constatação de não haver razão jurídica que leve a distinção entre o fato concreto do precedente e o fato concreto do caso em julgamento, pertencendo ambos, na situação dada, a mesma categoria de fatos. 4.4 Problemas na determinação da Ratio Decidendi 4.4.1 Múltiplas Rationes Decidendi Pode ocorrer de a mesma decisão trazer mais de uma razão, nesse caso não cabe a escolha, devendo todas serem obrigatórias, não pode o juiz escolher uma e relegar as outras a mera natureza de Dictum. Outra hipótese ocorreria no caso de uma mesma decisão ser tomada por vários juízes de um tribunal que se utlizaram de razões distintas. Este caso é bastante controverso na doutrina, porém o entendimento mais coerente com o sistema aponta que os casos posteriores não devem ser vinculados vez que havendo várias razões diferentes para o mesmo caso, não haveria razão discernível. 4.4.2 Ausência de Ratio Hipótese oposta ao anteriormente comentado, ocorre quando não há naquela decisão qualquer razão a fundamentá-la. Trata-se de caso raro vez que no Direito Inglês a fundamentação da decisão é imprescindível para a resolução de qualquer caso. Nos casos em que não foi identificada a razão, o entendimento predominante é no sentido de que nessas hipóteses não haverá qualquer obrigatoriedade, ou vinculação. 4.5 Técnicas utilizadas na aplicação do precedente A aplicação dos precedentes, não é tarefa mecânica e automática, e sim um juízo a ser procedido caso a caso. Assim, são várias as técnicas que buscam auxiliar o aplicador no momento da determinação de qual o precedente mais indicado para aquele caso. Não existem regras estanques, nem leis peremptórias para a aplicação dos precedentes anteriores, de forma que as técnicas existentes tornam a análise de cada caso mais simples, ao mesmo tempo em que não permitem um casuísmo exacerbado, diminuindo a generalidade dos fatos postos sob análise. Um precedente judicial pode ser seguido em um caso posterior, se apesar de não obrigatório possuir força de persuasão para tanto. Por outro lado um precedente deve ser utilizado caso provenha de corte superior. Assim, em certos casos o precedente não será aplicado, apesar de uma primeira análise fazer parecer o oposto. 4.5.1 Distinção A técnica mais utilizada para a não aplicação de um precedente ao caso sob análise, é aquela que aplica a distinção entre os casos. Esta técnica nos leva de volta a noção de fatos fundamentais dos dois casos, aquele do precedente e o caso posterior sob análise. Se os casos forem considerados distintos pelo Tribunalou pelos juízes então o precedente não terá aplicação, vez que se trata de casos distintos. Do exposto fica claro que a distinção é feita pelo caso particular posto para análise do magistrado, demonstrando que cada juiz terá maior ou menor inclinação para distinguir no caso concreto. A possibilidade de poder distinguir do juiz é de suma importância para o sistema, vez que trás flexibilização e possibilita ao juiz não proceder de forma que sabe ser injusta. Porém este poder de distinguir do magistrado não pode ser levado ao extremo, sob pena de seu uso indiscriminado, poder ferir a isonomia e desnaturar a própria obrigatoriedade de vinculação aos precedentes obrigatórios. 4.5.2 Alteração das circunstâncias Deve-se observar atentamente a alteração das circunstâncias sob as quais foram tomadas determinadas decisões. Não basta que haja decisão aplicável ao caso posterior, é forçoso observar se a alteração das circunstâncias não impede que aquele precedente seja aplicado ao novo caso. A máxima latina cessante ratione, cessat ipsa lex, ou seja, cessando as razões para a existência da norma jurídica, ela deixa de existir por si própria. Esta doutrina é bastante freqüente no Direito americano, mas também encontra aplicação no Direito inglês, na Corte dos Lordes, tendo em vista seu poder de afastar-se das próprias decisões anteriores. Importante salientar que a mera alteração das circunstâncias não autoriza todo e qualquer juiz a não aplicar o precedente, apenas nos casos em que os juízes já possuem a prerrogativa de afastar um precedente é que a alteração poderá ser utilizada. 4.5.3 Decisões per incuriam O conceito mais simples desta técnica de decisão é aquele que diz ser a decisão per incuriam aquela tomada na ignorância de um precedente obrigatório ou de uma lei relativa ao caso. Será esta doutrina aplicada nos casos em que se o tribunal tivesse tido conhecimento do precedente ou da lei, teria dado solução completamente diversa ao caso. É preciso que se demonstre que a decisão teria sido alterada caso a lei ou o precedente obrigatório tivesse chegado à esfera de conhecimento do Tribunal, que teria então, tomado outra decisão. 4.5.4 Decisões Contraditórias na mesma Hierarquia Em regra, havendo decisões conflitantes provenientes de uma mesma corte, a solução se dá com a aplicação da última decisão, o critério seria então o cronológico. Porém a questão apresenta certas particularidades. Primeiramente porque este critério de aplicar a última decisão não é absoluto, pois não há revogação implícita do precedente anterior, que pode ate mesmo não ser do conhecimento da corte, o que levaria a ser esta uma decisão per incuriam. Assim, em tais casos, ambas as decisões devem ser consideradas válidas, de forma que a corte deverá analisar na hipóteses o melhor precedente a ser aplicado, análise que deve ser feita da forma mais consciente possível, levando em consideração os critérios de justiça, oportunidade e correção no momento de tomar a decisão. 4.5.5 Revogação Trata-se de técnica em que se revoga o precedente anterior. A impossibilidade de se revogar um precedente predominou no Direito Inglês até o ano de 1966 quando a Corte dos Lordes manifestou-se no sentido de a corte poder afastar-se de suas decisões anteriores. Nos Estados Unidos a teoria do binding precedente sempre foi aceita, pois os juízes americanos acreditam na sua capacidade de analisar o caso concreto e afastar-se dos precedentes superados pelas mudanças sociais. De fato a técnica da revogação está em perfeita consonância com a doutrina do stare decisis que não exige obediência cega dos juízes aos precedentes e sim que eles se inspirem nas decisões anteriores para melhor decidir o caso concreto. Tendo em vista a força do precedente dentro do sistema do common law, fácil é perceber o inconveniente que será afastá-lo diante de um caso concreto. Vários valores devem ser cuidadosamente sopesados para se afastar de forma convincente um precedente. A injustiça, a inconveniência e a incorreção do precedente devem ser claramente demonstradas, como também deve ser avaliado o prejuízo para a estabilidade de todo o sistema do stare decisis com o afastamento do precedente. A revogação pode ser implícita ou expressa, esta não trás qualquer especificidade, ocorre sempre que uma corte manifestar-se no sentido de estar revogando um precedente seu, esse caso só será possível quando a corte tenha poderes para tanto. Já a revogação implícita, terá lugar sempre que a Corte dos Lordes decidir em sentido diverso de anterior decisão sua, e também ocorrerá quando a decisão for contrária a decisão de corte superior. 4.6 Eficácia temporal do Precedente Questão que tem preocupado os juristas do common law trata da eficácia temporal da decisão que anuncia uma nova regra, revogando ou modificando a decisão anterior. Assim, a questão que se apresenta diz respeito a saber se a nova regra teria efeitos retroativos ou não. A questão é de relevada importância, vez que caso se aplique o novo precedente às questões anteriores estar-se-ia atingindo casos já sedimentados sob orientação de precedente anterior. A orientação acerca da possibilidade de retroatividade ou não das novas decisões gera também conseqüências no seio da sociedade. Ante as mudanças que se operam com o passar dos tempos os tribunais vêem-se em meio a encruzilhada de seguir os passos da modernidade ou manter-se seguindo as decisões mais antiquadas. 4.6.1 Aplicação Retroativa Ocorre quando a nova decisão é aplicada a casos anteriores. A retroatividade pode ser Pura ou Clássica. Na aplicação da retroatividade Pura o novo precedente será aplicado a todos os casos anteriores e posteriores a ele, inclusive àqueles em que já houve trânsito em julgado. Já a retroatividade clássica é aquela em que o novo precedente será aplicado à questões posteriores e também anteriores, porém quanto a estas últimas somente nos casos em que não houve trânsito em julgado, ou não foi declarada a prescrição ou a decadência. Seria esta uma retroatividade mitigada, não aplicável em certos casos. O fundamento da retroatividade está na visão de que o Direito declarado na decisão judicial seria mera declaração do Direito já existente. A retroatividade clássica é a mais aplicada principalmente na Inglaterra. A principal crítica que se faz à aplicação retroativa diz respeito à insegurança jurídica que poderá ser gerada dentro da sociedade. É fato que as pessoas pautam seus negócios de acordo com o que os tribunais declaram ser o Direito, caso decisões venham alterar o anteriormente estabelecido, as conseqüências serão danosas. 4.6.2 Aplicação Prospectiva A aplicação prospectiva é necessária tendo em vista a necessidade de segurança jurídica, mantida através dos precedentes judiciais anteriormente estabelecidos. A prospectividade pode ser Pura, caso em que a nova decisão não será aplicada nem mesmo ao caso em questão, somente sendo aplicados a casos posteriores. Já a aplicação prospectiva clássica é aquela em que a nova decisão é aplicada a fatos futuros e também ao caso que gerou o novo precedente. Por fim, temos a aplicação prospectiva a termo, aquela em que a nova decisão somente será aplicável a futuras decisões a partir de um certo momento, data futura e certa. Esta espécie de aplicação muito se aproxima da prática já sedimentada pelo nosso Supremo Tribunal Federal, na Lei 11.417/06, que trás a possibilidade de modulação temporal dos efeitos de uma Súmula Vinculante. O principal argumento para a manutenção da aplicação não retroativa é encontrado na necessidade de segurança jurídica, vez que as decisões não alcançariam situações já sedimentadas.5 PRECEDENTES VINCULANTES NO BRASIL O instituto do precedente, em qualquer sentido em que seja tomado, é encontrado em qualquer sistema jurídico, isto porque toda sentença abre um precedente. Os atributos do precedente vinculante ou apenas persuasivo é que variam de sistema para outro. Assim, nos sistemas do civil law, como o brasileiro, o precedente tem em regra, efeito mínimo, sem qualquer vinculação, já no common law, o precedente exerce papel fundamental, sendo na verdade, o âmago de todo o sistema. De forma resumida se expõe o papel do precedente no sistema romano- germânico: – nenhum juiz ou Tribunal se vincula a entendimento seu anterior – os órgãos inferiores não tem que julgar como fizeram os órgãos superiores Porém o precedente judicial não é de todo desconhecido em nosso sistema brasileiro, apesar da forma diferenciada da existente no common law, existem aqui também certos precedentes vinculantes. Então, se fala em precedentes judiciais lato sensu, como exemplo o resultado do incidente de uniformização da jurisprudência, as decisões de controle de constitucionalidade, súmulas vinculantes e as sentenças normativas da Justiça do Trabalho. Passaremos a uma breve análise de cada um destes temas. 5.1 Os Assentos Portugueses A primeira experiência brasileira com o efeito vinculante se deu através dos Assentos Portugueses, quando o Brasil ainda era uma colônia de Portugal. A origem do instituto remonta aos antigos assentos da Velha Casa de Suplicação o mais alto Tribunal do Reino que foi criado pelas Ordenações Manuelinas de 1521, mantidos nas Ordenações Filipinas e regulada finalmente na Lei da Boa Razão de 1769. Em linhas gerais dizia o dispositivo que em caso de dúvida deveria o Desembargador dirigir-se ao Corregedor, e o entendimento adotado deveria ser registrado para não mais permanecer dúvida posterior acerca daquele mesmo tema. O instituto foi aplicado no Brasil pela Resolução da Assembléia Geral em 1875, fazendo assim vigorar no país a jurisprudência de um outro. Proclamada a República em 1891 os assentos foram abolidos do Brasil. Em Portugal porém, os institutos continuam em vigor apesar das diversas controvérsias que giram em torno do tema, sendo o último capítulo da longa controvérsia dado pela declaração de inconstitucionalidade em parte do artigo 2° do Código de Processo Civil Português que trata do assunto. 5.2 Controle Concentrado de Constitucionalidade Originário do Brasil Império, como um controle político, cabendo ao Legislativo a elaboração, a revogação das leis e a guarda da Constituição. Somente com o advento da Constituição Federal de 1891 o Brasil passou a reconhecer o controle jurisdicional de constitucionalidade. Tal instituto foi repetido de formas semelhantes nas Cartas de 1934, 1937 e 1946 e com a Emenda Constitucional 16 de 26/11/1965 é que se inaugura o controle jurisdicional concentrado e a via de ação direta de constitucionalidade de leis no Brasil. A Constituição de 1967 e sua Emenda de 1969 mantiveram com pequenas alterações o controle concentrado. A Constituição de 1988 trouxe vantagens ao instituto. No Brasil o controle jurisdicional de constitucionalidade pode ser feito através da forma difusa ou concentrada. O controle concentrado, e somente este, poderá ter efeitos vinculantes, objeto de nosso interesse. 5.2.1 O efeito vinculante no controle concentrado Cumpre salientar que apenas o controle concentrado possui a possibilidade de vinculação, o que gera ao controle difuso uma certa desconformidade. A mesma causa pode ser julgada por um juiz de primeira instância e pelo Supremo Tribunal Federal, gerando não raras vezes decisões contraditórias, trazendo incertezas para todo o sistema e desacreditando-o principalmente aos olhos dos jurisdicionados. 5.2.2 Distinção entre Eficácia Erga Omnes e Efeito Vinculante Tal distinção ficou plenamente clara com a Emenda Constitucional n° 3/93 e a redação dada por ela ao artigo102 §2° da Constituição Federal, mediante a criação da ação declaratória de constitucionalidade, previam-se expressamente como coisas diferentes a eficácia erga omnes e o efeito vinculante. A eficácia erga omnes de uma decisão no controle concentrado se restringe a sua parte dispositiva, atinge eficácia geral e abstrata da norma objeto não tendo aplicação a normas paralelas, não alcançando casos posteriores, não tendo obrigatoriedade a casos semelhantes. Já o efeito vinculante é um plus em relação ao efeito erga omnes e significa obrigatoriedade de a Administração Pública e os órgãos do Judiciário se submeterem à decisão proferida de efeito vinculante. Esta vinculação é originária dos fundamentos da decisão. 5.2.3 Vinculação na ação Direta de Inconstitucionalidade e a Emenda 45/04 A nova redação dada pela Emenda 45/04 ao § 2° do artigo 102 da Constituição Federal afasta a celeuma anterior em relação à vinculação na ação direta de inconstitucionalidade. A nova redação consagrou o entendimento predominante no Supremo Tribunal Federal, dando fim ao longo debate relacionado a este tema. Na prática, significa que as decisões proferidas em sede de ação direta de inconstitucionalidade além da eficácia erga omnes terão também efeito vinculante para toda a administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal e demais órgãos do poder Judiciário. Em relação ao Judiciário a decisão em sede de ADIn repercutirá em todas as ações em andamento em relação àquele tema. Caso a decisão do STF não seja respeitada caberá a Reclamação conforme previsão do art. 102, I, l da Constituição Federal. 5.2.4 Limites Objetivos do Efeito Vinculante A questão que tem suscitado dúvidas gira em torno do que seria atingido pela autoridade da vinculação. A doutrina é bastante divergente tanto no Brasil como no exterior. Deve-se atentar primeiramente para a estrutura peculiar do controle abstrato no qual se requer a afirmação da constitucionalidade ou da inconstitucionalidade de um ato normativo, em tese. Não há litígio, não há partes, não há fatos. Dessa forma não há razão para que declarada a inconstitucionalidade de uma lei estadual, lei idêntica em outro Estado seja publicada sob o fundamento de que não haveria vinculação. Assim, entendendo Mendes (1990. p 56) “a decisão deve ter efeito vinculante, vez que a limitação ao efeito vinculante à parte dispositiva da decisão tornaria de todo dispiciendo esse instituto, uma vez que ele pouco acrescentaria aos institutos da coisa julgada e da força de lei. Ademais, tal redução diminuiria significativamente a contribuição do Tribunal para a preservação e desenvolvimento da ordem constitucional.” 5.2.5 Limites Subjetivos do efeito vinculante Não gera qualquer dúvida a constatação de que a decisão em sede de Ação Declaratória de Constitucionalidade vincula os demais órgãos do Poder Judiciário e também da Administração Pública. Na prática o desrespeito ao art. 102 § 2° gera a possibilidade de se intentar uma Reclamação perante o Supremo conforme anteriormente exposto. A polêmica gira em torno da possibilidade de vinculação do Poder Legislativo e do próprio Supremo Tribunal Federal em relação à decisão tomada em sede de Ação Direta de Constitucionalidade. Em relação à vinculação do Poder Legislativo domina na doutrina brasileira o entendimento de que tendo em vista a separação dos poderes e a falta de texto expresso na Carta Magna, decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal não vincula o Legislativo que poderá editar lei posterior tratando do mesmo tema. Ocorre, porém, que caso o Legislativo edite nova norma já declarada inconstitucional pelo Supremo, não poderá haver aplicação desta norma pelo Judiciário ou pela Administração Pública, caso contrário caberá Reclamação para O STF. Em relação à vinculaçãodo próprio Supremo à decisão anteriormente proferida, é entendimento pacífico que não está o STF vinculado à sua própria decisão, levando em consideração principalmente, texto expresso da Carta que declara efeito vinculante “em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário.” Da mesma forma que não caberá perante o Supremo Tribunal a reapreciação de questão na qual já se discutiu a constitucionalidade do ato normativo. Caso, porém haja alteração do caso, poderá haver reapreciação pelo Tribunal Egrégio, sendo outras as circunstâncias. 5.2.6 Efeito vinculante da medida cautelar Seja a decisão tomada em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade ou de Ação Direta de Constitucionalidade, terá a cautelar concedida efeitos ex nunc e vinculantes. Todas as ações que tramitem em relação àquele tema deverão ser sobrestadas até que o Supremo decida a questão de forma definitiva. De outra forma não poderia ser, vez que a paralização das demais ações é medida fundamental para a coerência de todo o sistema, havendo a prevalência do controle concentrado sobre o difuso. 5.3 Sentença Normativa Trabalhista Através da Sentença Normativa ainda sobrevive na Justiça do Trabalho uma espécie de vinculação, em caso de dissídio coletivo referente a novas condições de trabalho, a decisão prolatada pode atingir outros empregados da mesma empresa que tenham a mesma profissão ou até mesmo todos os empregados daquela mesma categoria profissional, dentro da jurisdição do tribunal. A constitucionalidade do instituto é garantida por sua previsão constitucional art.114 e pelo art. 5°, XXI da Carta Magna. O efeito vinculante das sentenças é inegável vez que tem eficácia ultra partes, apesar de sofrer limitações no campo subjetivo (somente atinge aquela mesma categoria profissional), e espacial (somente na jurisdição daquele tribunal), permanece a vinculação para outros órgãos da Justiça do trabalho. 5.4 Poder Normativo da Justiça Eleitoral As resoluções do Tribunal Superior Eleitoral são respostas às consultas a ele feitas acerca de qualquer tema relacionado ao Direito Eleitoral. Essas indagações são sempre em tese, não representando nenhum caso concreto. É grande a divergência acerca da força vinculante da consulta, os favoráveis argumentam que seria ilógico que questão submetida ao Tribunal em tese tivesse desfecho diferente quando apresentada em concreto. Os opositores afirmam que seria inconstitucional previsão infra-constitucional que obrigasse a vinculação ao juiz. Na prática as resoluções são seguidas por juízes, tribunais, pelo próprio TSE e pelos candidatos, fundamentados na certeza na inutilidade de opor-se a um entendimento já externado pelo Tribunal Superior. 5.5 Incidente de Uniformização da Jurisprudência. De acordo com a doutrina Marinoni (2005, p. 157/158) é cabível o presente incidente sempre que se verificar em qualquer julgamento, proferido pelo Tribunal em recurso ou ação originária, divergência a respeito da interpretação do direito. Quando suscitado o incidente, será votado pelo órgão uniformizador, dando interpretação que deverá obrigatoriamente ser seguida pelo órgão fracionário. A decisão qualquer que seja ela, é irrecorrível. Importante salientar que o incidente somente aprecia questão de direito e não questões fáticas Tal julgamento terá então força vinculante em relação ao processo no qual se instaurou o incidente. Ocorre que além da vinculação ao próprio caso e ainda a possibilidade de edição de súmula, o que postulamos seria a própria vinculação de todo o tribunal àquele entendimento anteriormente adotado, garantindo a coerência de todo o sistema. 5.6 Súmula 5.6.1 O modelo clássico Súmula significa o conjunto da jurisprudência dominante de um tribunal, abrangendo os mais variados ramos do Direito, organizados através de verbetes numerados sem compromisso coma temática do assunto. Assim cada um dos verbetes conhecidos por súmulas na verdade são enunciados, a súmula seria o conjunto desses enunciados. A origem da súmula no Brasil remonta no ano de 1963, data da publicação da primeira Súmula da Jurisprudência pelo STF, fruto do esforço e iniciativa do mentor de todo o Projeto Ministro Victor Nunes Leal. A edição da súmula é resultado de um processo específico de elaboração, previsto regimentalmente, que passa pela escolha do tema, discussão técnico-jurídica, a aprovação, e finalmente a publicação para o conhecimento de todos. Os motivos para a edição das súmulas não se restringem ao acúmulo de processos e na busca por maior celeridade por parte do Judiciário. A principal razão para a edição de uma súmula está na certeza jurídica que é trazida àquele assunto diante daquele tribunal. A súmula recobre determinados aspectos da lei, ou preenche lacunas por ela deixadas, contribuindo para a certeza do Direito. Outro bom motivo seria a previsibilidade, pois tanto os jurisdicionados como o próprio tribunal já tem prévio conhecimento do entendimento consolidado acerca daquele tema. Pesa também o princípio da igualdade, vez que a súmula mitiga possíveis desigualdades na interpretação e aplicação de determinada norma, o que resulta em tratamento isonômico para os submetidos às mesmas leis. Não resta dúvida de que a Súmula é um rompimento com o nosso sistema civilista, representando um direcionamento em relação ao common law. Porém é crucial salientar que a súmula é apenas uma semelhança com a teoria do stare decisis, não representado de forma alguma o alcance ou a forma daquele, senão vejamos. Primeira e fundamental diferença entre a súmula e o precedente é o fato de aquela ser fruto de várias decisões reiteradas daquele tribunal acerca do mesmo tema, enquanto que o precedente é estabelecido na decisão de apenas um caso concreto. Em segundo lugar o precedente possui em seu bojo tanto a ratio decidendi como dictum na decisão prolatada, enquanto que a súmula somente possui a razão da decisão, sendo desta maneira completamente aplicável, todo seu conteúdo é essencial. Outra diferença refere-se também que o precedente tem força vinculante incontestável, a súmula tem força vinculante em relação apenas ao próprio tribunal, apesar de as súmulas do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça desfrutarem de grande prestígio, sendo tidas quase sempre por incontestáveis. Além de todas as diferenciações apresentadas, cabe destacar a que mais ainda aproxima a súmula da nossa tradição romanística, o fato de a súmula sempre se referir a direito legislado. As espécies de súmula são: - Meramente declaratória, que apenas repete o que esta na lei. - Intra legem que interpreta a lei de acordo com os limites do próprio sistema. - Extra legem que preenche espaços vazios deixados pela norma. Assim, as súmulas são sempre subjacentes à lei. 5.6.2 Vinculação interna A súmula reflete entendimento cristalizado daquele tribunal, logo, nada mais natural que o preceito sumulado seja seguido por todo aquele tribunal em seus órgãos fracionários ou em sua composição plenária. Há, contudo, uma parte da doutrina que afirma que o efeito vinculante da súmula decorreria exclusivamente de disposição do regimento interno do tribunal, o que traria sua inconstitucionalidade. Caso a publicação de um entendimento dominante em um tribunal de nada adiante para casos posteriores seria um rematado absurdo. Ademais, com as previsões dos artigos 481 e 557 do Código de Processo Civil, o efeito vinculante interno das súmulas restou plenamente pacificado, sendo o regimento interno um mero corolário da natureza do instituto. Dessa forma, a vinculação é inerente ao próprio instituto, qualquer análise em contrário, feriria a lógica. 5.7 Súmula Universalmente Vinculante De acordo com o exaustivamente exposto durante todo este trabalho já restouclaro que as súmulas, e nem mesmo as vinculantes, tem qualquer identidade com os precedentes judiciais ingleses ou americanos. Assim, as súmulas vinculantes não representam uma adoção de instituto inglês ou americano, ou mesmo adaptação às cegas ao nosso Direito de conceito estrangeiro. Nada disso, as súmulas vinculantes são perfeitamente compatíveis com o nosso sistema romanístico. Trata-se apenas e tão somente de uma inspiração, e não de uma cópia de Direito importado. Dito isso se passará agora à análise dos contornos da súmula vinculante prevista no artigo 103-A da Constituição Federal e disciplinada pela Lei 11.417/06 publicada em 19 de dezembro de 2006. 5.7.1 Competência para editar súmula vinculante De acordo coma previsão do art. 103-A a competência fica restrita ao STF, o artigo 2° da lei 11. 417 trás a mesma previsão, in verbis. Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. Inobstante a proposta inicial ser de que o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal Superior do Trabalho também pudessem editar súmulas vinculantes, não logrou aprovação esta parte da lei. 5.7.2 Pressupostos para a edição de súmula vinculante O § 1° do art. 103 da Constituição Federal cria pressupostos para a edição da súmula vinculante, in verbis: § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. Quanto à determinação do que seriam reiteradas decisões caberá análise baseada no bom senso, não há um número predeterminado que signifique reiteradas decisões. A controvérsia é requisito óbvio para a edição de súmula, sem ela não haveria motivos para se pacificar o entendimento acerca de determinado assunto. A controvérsia deve ainda recair sobre a validade, eficácia e a interpretação da norma jurídica o que significa respectivamente discussão em torno da constitucionalidade de determinado ponto, do melhor significado de determinado dispositivo, e finalmente a discussão em torno da coercibilidade daquela norma no meio social. A controvérsia deve também acarretar grave insegurança jurídica que decorre principalmente de decisões divergentes sobre o mesmo assunto, e também a grande multiplicação de processos requisito de fácil constatação, principalmente para qualquer operador do Direito diante de um judiciário abarrotado de processos. 5.7.3 Legitimidade para a provocação De acordo como § 2° do art. 103-A da Constituição Federal § 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. Assim, a legitimidade para propor a publicação, revisão ou cancelamento de súmula se estende a todos os legitimados a propor Ação Direta de Inconstitucionalidade. Nos momentos iniciais à publicação da emenda, a doutrina de pronto criticou este parágrafo por trazer legitimação restrita, vez que outros tribunais deveriam também ser legitimados. Vindo, portanto, ao encontro dos clamores doutrinários a lei 11.347/06 legitimou também em seu art. 3°: VI- o Defensor Público da União XI - os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares. e ainda: 1 o O Município poderá propor, incidentalmente ao curso de processo em que seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo. De forma correta e seguindo entendimento pacificado junto ao próprio Supremo a Lei trouxe a possibilidade de ser ouvido em sede de edição de súmula vinculante o amicus curiae, art.3°: § 2 o No procedimento de edição, revisão ou cancelamento de enunciado da súmula vinculante, o relator poderá admitir, por decisão irrecorrível, a manifestação de terceiros na questão, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Impende salientar que da mesma forma que ocorre nas ações e constitucionalidade, para haver participação dos legitimados no processo da súmula é preciso que se analise a pertinência temática para os entes legitimados universais e os legitimados que devem obedecer a pertinência temática. 5.7.4 Quórum para aprovação De acordo com o artigo 103-A é necessário o voto de 2/3 (dois terços) dos Ministros para a aprovação da súmula. 5.7.5 Limites objetivos Cada enunciado representa o entendimento em relação à questão de direito, tomada em várias decisões anteriores. Dessa forma a súmula não possui digressões acerca deste ou daquele ponto, não trás qualquer indicação ao caso concreto que lhe deu origem, significando assim que seu enunciado já contém o necessário para aplicação. Desta forma a questão fática é estranha ao conteúdo da súmula, mesmo que se trate de questão jurídica já sumulada, caberá sempre ao juiz singular analisar se há subsunção do caso concreto posto para análise ao conteúdo sumulado. Impende salientar que nem toda matéria poderá ser objeto de súmula, somente matéria constitucional. Assim, serão principalmente cabíveis as súmulas nos casos de Direito Previdenciário ou Tributário dada a pequena variabilidade das questões submetidas, já o Direito de Família ou o Direito Penal que apresentam grande variabilidade fática, tornam bastante complexa a edição de uma súmula vinculante, tendo em vista o casuísmo quase sempre presente nas questões apresentadas para apreciação. 5.7.6 Limites Subjetivos Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. Assim, é clara a disposição legal estendendo a vinculação a toda a Administração pública, de outra forma não poderia ser, vez que a própria administração á maior litigante dentro do poder judiciário, e principalmente trazendo demandas que são reiteradamente decididas da mesma forma. Espera-se que com a edição de súmulas se reduza consideravelmente o número de demandas perante o judiciário, e principalmente demandas repetidas. Por fim cabe esclarecer que não haverá qualquer vinculação por parte do poder legislativo, vez que tanto não há previsão constitucional, como tal disposição feriria a separação dos poderes. 5.7.7 Eficácia Temporal O artigo 103-A da Constituição Federal é claro ao aduzir que a partir da publicação na imprensa oficial a súmula terá efeito vinculante. A doutrina afirma ainda que essa eficácia será ex tunc retroagindo para alcançar questões anteriores, porém respeitando a coisa julgada. Art. 4 o A súmula com efeito vinculante tem eficácia imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por decisão de 2/3 (dois terços) dos seus membros, poderá restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de
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