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2007-tcc-jrsamoura

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Prévia do material em texto

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ 
FACULDADE DE DIREITO 
CURSO DE DIREITO 
 
 
JOSÉ RICARDO SOUSA AYRES DE MOURA 
 
 
 
 
 
ABORTO LÍCITO 
NÃO CONTIDO NO CÓDIGO PENAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FORTALEZA-CE 
2007 
JOSÉ RICARDO SOUSA AYRES DE MOURA 
 
 
 
 
 
 
ABORTO LÍCITO 
NÃO CONTIDO NO CÓDIGO PENAL 
 
 
Monografia apresentada a Universidade 
Federal do Ceará - Faculdade de 
Direito, para obtenção do Titulo de 
Bacharel em Direito. 
 
 
Orientador: Prof. Sérgio Rebouças 
 
 
 
 
 
 
 
 
FORTALEZA-CE 
2007
Ayres de Moura, José Ricardo Sousa 
Aborto licito não contido no código penal. / José Ricardo 
Sousa Ayres de Moura – Ceará 2007. 
 
54f. 
 
Monografia (Graduação) – Universidade Federal do Ceará. 
Faculdade de Direito. 
 
Licit Abortion, not include in Legal Code. 
 
1. Abortion. 2. Licit procedure. 
 
Folha de Aprovação 
 
 
JOSÉ RICARDO SOUSA AYRES DE MOURA 
 
 
ABORTO LÍCITO 
NÃO CONTIDO NO CÓDIGO PENAL 
 
Monografia apresentada a Universidade 
Federal do Ceará Faculdade de Direito para 
obtenção do Titulo de Bacharel em Direito. 
 
 
 
Banca Examinadora: 
 
 
______________________________________________________ 
Prof. Sérgio Rebouças 
 
______________________________________________________ 
Prof. Dr. Diogo Musy 
 
_____________________________________________________ 
Prof. Dr. Weiber Xavier 
 
 
 
Fortaleza, 20 de janeiro de 2007 
 
Dedicatória 
 
 
Dedico essa monografia ao meu pai, Evandro Ayres de Moura, 
ex-aluno também dessa Faculdade e aos meus irmãos Atilano e Zoia. 
 
Agradecimentos 
 
Ao Prof. Candido Albuquerque e Prof. Sérgio Rebouças, pelas orientações, 
apoio e incentivo. 
À amiga e sobrinha Rebecca Ayres de Moura Chaves de Albuquerque, por 
ajudar-me nas horas precisas. 
Aos Professores Marcelo Souto Maior e Mauricio Benevides, por acreditarem 
em mim e, a sua maneira, colaborarem para que eu seguisse adiante. 
Aos colegas, Frederico Lissere Barruffini, Rafael Frederico Bruns e Daniel 
Maia, pela ajuda e incentivo nesse último período. 
Aos Professores Dr. Weiber da Silva Xavier e Diogo Musy, por aceitarem fazer 
parte da banca em pouco tempo de leitura. 
Aos meus irmãos, Zoia e Atilano, a minha filha Gisela Maria e seu esposo 
Herbet Vieira e, em especial, a minha mãe Aunésia, por aceitarem as minhas 
loucuras. 
 
Resumo 
 
 
Devido ao aprofundamento da medicina, no seu ramo de medicina fetal, ficou 
cada vez mais precoce o diagnóstico de anomalias fetais, algumas capazes de 
serem revertidas ainda intra-útero e outras que são incompatíveis com a vida 
extra-uterina são alvo hoje em dia de muita discussão acerca do Abortamento 
eugênico ou abortamento licito, autorizado pelos juizes, mas não contido no 
ordenamento jurídico. Esse trabalho leva-nos ao histórico do aborto, mostrando 
que nem sempre foi ilícito ou tipificado no ordenamento jurídico de vários 
povos, ate mesmo em alguns era recomendado para formação de uma etnia 
mais forte e também como controle populacional. Com advento do cristianismo, 
começou-se a incriminar e a recriminar as mulheres que assim o procedessem, 
nesses casos, ou melhor, nos casos anteriores por simplesmente não ser uma 
gravidez desejada, pois os métodos propedêuticos naquela época não existiam 
para detectar gestações com más-formações. Assim tentamos reunir opiniões 
diversas e demonstrar que nesses casos o bom senso, e a disposição ou 
interesse da mãe gestante devem falar mais alto do que as defesas pela vida 
de um ser que jamais saberá que seja dignidade ou ter capacidade de discernir 
o seu destino ou lutar para uma sobrevivência sem ajuda. Finalmente 
concluímos que antes de ser uma questão de foro privativo é também uma 
questão social e de saúde publica, pois a ilicitude do ato de aborto de um feto 
seguramente incapaz de sobreviver fora do útero, pode acarretar atos 
clandestinos e sérias conseqüências para mãe principalmente aquelas de 
poder econômicos inferiores. 
 
 
 
Palavras Chave: Aborto, Aborto eugênico, Legislações sobre aborto. 
 
Abstract 
 
The medicine is nowadays getting deeper in acknowledgement and specially in 
one of its branch, Fetal Medicine. The Diagnosis of any fetal anomalies has been 
made at very precocious time, some of them even capable to be reverted intra-
uterus death and others to assure the fetus are incompatible with the extra-uterine 
life. Because of those, Diagnoses are been used in some countries to allow the 
mother to proceed the abortion. There are currently much quarrel about that. The 
eugenic Abortion or licit abortion is how they have been called when authorized by 
one judge, as they are permitted even though they are not written in the legal laws’ 
system. This paper leads us into the history and description of the abortion, 
showing that it has not been ever illicit or it was not contained in the legal system 
of some peoples. They were recommended during the ancient Greece as part of 
rules for formation of a stronger etnia and also as population control system. With 
advent of the Christianity, it started to be incriminated and to recriminate the 
women who thus done it, in these cases, or better, in the previous cases simply or 
not being a desired pregnancy. At this time there were no methods to detect any 
gestations with harm-formations. Thus we try to congregate different opinions and, 
to demonstrate that in these cases the good-sense, the disposal or the interest of 
the pregnant woman must play the most important role in the decision, much more 
than those who defends the life of someone who will never know what is dignity 
life or who will never have capacity to discern his destiny or to fight for a survival 
without aid. Finally we conclude that before being a question of privative forum it is 
also a social matter and even public health question. Therefore illegality of the act 
of abortion of an embryo, surely incapable to survive outside of the uterus, can 
cause mainly clandestine acts with serious consequences for mother, specially 
those from low economic level. 
 
Key Words: Abortion, eugenic Abortion, laws on abortion. 
 
Lista de Figuras 
 
Figura 1 - Anencéfalo 1................................................................................... 29 
Figura 2 - Anencéfalo 2................................................................................... 31 
Figura 3 - Holoprosencefalia 1........................................................................ 32 
Figura 4 - Holoprosencefalia 2........................................................................ 33 
 
 
Lista de Tabelas 
 
Tabela 1 - Paises e permissão do aborto.................................................... 38 
Tabela 2 - Embasamento jurídico da sentença judicial e do parecer da 
promotoria favorável a pedido de aborto seletivo.................... 
 
46 
Tabela 3 - A argumentação de juízes e promotores contra a 
autorização do aborto seletivo.................................................. 
 
47 
 
 
Lista de Abreviaturas e Siglas 
 
ADPF Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental 
APGAR Índice de Bem e Estar do recém nascido da Dra. Apgar. 
CNTS Conselho Nacional dos Trabalhadores da Saúde 
CREMESP Conselho Regional de Medicina – São Paulo. 
CRF Conselho Federal de Medicina 
DIU Dispositivo Intra-uterino 
FIGO Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia 
HC Hábeas Corpus 
OMS Organização Mundial de Saúde 
STF Supremo Tribunal Federal 
 
Sumário 
 
 
1. Introdução..................................................................................................... 12 
2. Aborto na história.......................................................................................... 14 
3. Aborto – Tipo - classificação........................................................................ 20 
4. Vida: conceito, dignidade e qualidade..........................................................23 
5. Anomalias congênitas não compatíveis com a vida..................................... 28 
6. O aborto e as legislações brasileira e estrangeira........................................ 34 
7. Jurisprudência............................................................................................... 39 
8. Considerações finais..................................................................................... 48 
Referências....................................................................................................... 52 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
Introdução 
 
 
 
 
13
Na perspectiva médica e na visão jurídica, o vocábulo aborto 
significa a interrupção da gestação nas semanas iniciais, correspondente até a 
20ª-22ª semana de gravidez ou cerca de 500g, produzida por meios naturais 
ou artificiais, ou seja, espontâneo ou provocado e somente será controvérsia 
dependendo da maneira de se considerar a matéria. 
Etimologicamente a palavra aborto deriva do latim “abortus”, onde 
Ab significa privação e ortus significa nascimento. 
Damásio E. de Jesus exemplifica exatamente essa questão e 
escreve que a prática do aborto pode ser definida sinteticamente como: 
interrupção da gravidez com a morte do produto da concepção. 
O aborto continua ainda um tema tabu, principalmente nos paises de 
maioria católica, onde a igreja não abre mão de seus princípios e seus 
dogmas, mesmo que seja em detrimento da saúde da mulher. 
A finalidade dessa monografia, além, lógico, de ser requisito básico 
de obtenção do titulo de bacharel em Direito, seria despertar para uma visão 
da problemática do aborto no que diz respeito àqueles fetos gerados com más 
formações congênitas não compatíveis com a vida, não sendo ela digna, ou 
seja, que simplesmente não teriam consciência do que seja uma razão de 
viver. Levando, além de tudo isso, uma carga psicológica enorme de 
sofrimento para seus genitores, uma carga imensa também para o Estado que 
deveria prover o bem estar e uma vida digna aos seus cidadãos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2. ABORTO NA HISTÓRIA 
 
Aborto na História 
 
 
 
 
15
O Aborto foi tratado como conduta criminalizada pela primeira vez no 
Código de Hamurábi (BOUZON, 1982): 
 
§ 209 Se um awilum bateu na filha de um awilum e a fez expelir o (fruto) de 
seu seio, pesará 10 siclos de prata pelo (fruto) de seu seio. 
§ 210 Se essa mulher morreu, matarão a sua filha. 
§ 211 Se pela pancada fez a filha de um muskênum expelir o (fruto) de seu 
seio, ele pesará 5 siclos de prata. 
§ 212 Se essa mulher morreu, ele pesará ½ mina de prata. 
§ 213 Se bateu na escrava de um awilum e a fez expelir o (fruto) de seu seio, 
ele pesará 2 siclos de prata. 
§ 214 Se essa escrava morreu, ele pesará 1/3 de uma mina de prata. 
 
Mesmo estando no Código Hamurabi, sabemos que o aborto nem 
sempre foi uma conduta criminalizada, segundo histórico de Nelson Hungria, a 
prática do aborto é de todos os tempos, mas raramente foi objeto de 
incriminação, ficava, de regra, impune, quando não acarretasse dano à saúde 
ou morte da gestante. Entre os hebreus, não foi senão muito depois da lei 
mosaica que se considerou ilícita, em si mesma, a interrupção da gravidez. 
Desde a Grécia Antiga, o aborto sempre foi uma conduta bastante 
utilizada pelas mulheres, que, devido aos mais diversos motivos, não 
desejavam gerar um feto, sendo usual naquela época e não se restringia, 
como hoje, a nenhuma classe específica, afinal, essa preocupação de não 
levar uma gestação a termo existe em qualquer classe social. Hoje a grande 
diferença é em relação ao tratamento concedido às mulheres, que é 
diferenciado em uma classe mais elevada em relação a outra mais baixa. A 
possibilidade de um melhor atendimento e de condições mais seguras são 
garantias para aquelas que podem pagar por esses serviços. 
Como falamos acima, na Grécia Antiga, era corrente a provocação 
do aborto. Licurgo, e Sólon proibiram-na, e Hipócrates, em seu famoso 
juramento, declarava: “a nenhuma mulher darei substância abortiva”. 
Aborto na História 
 
 
 
 
16
Aristóteles e Platão foram predecessores de Malthus: o primeiro 
aconselhava o aborto (desde que o feto ainda não tivesse adquirido alma) para 
manter o equilíbrio entre a população e os meios de subsistência, e o segundo 
preconizava o aborto em relação a toda a mulher que concebesse depois dos 
quarenta anos - já naquele tempo tinha-se noção que fetos advindos de 
mulheres com mais de 40 anos poderiam vir com defeitos e com 
incompatibilidade a vida. Assim o uso do aborto difundiu-se por todas as 
camadas sociais. 
Platão, no seu livro “A República”, concede aos governantes a tarefa 
de melhorar a descendência dos membros da cidade, por meio de casamentos 
entre homens e mulheres superiores. Aos governantes seria dado o poder de 
decidir sobre a realização dos matrimônios, em que número esses 
aconteceriam e quem seriam os cônjuges. As crianças nascidas pertenceriam 
à Cidade e seriam cuidadas por autoridades competentes para cumprir esse 
objetivo. O filósofo aconselhava sobre a idade dos nubentes e especificava 
punições para aqueles que não seguissem as regras da polis. 
 
“...Pegar-se-ia então os filhos dos homens superiores, e levá-
los-iam para o aprisco, para junto de amas que moravam à 
parte num bairro da cidade; os dos homens inferiores, e 
qualquer dos outros que sejam disformes, escondê-los-iam num 
lugar interdito e oculto, como convim”. 
 
Platão descreve como seria a Cidade perfeita e, para tanto, 
determina que os pais não saibam quem seriam seus filhos e filhas, pois esses 
pertenceriam à Cidade. O argumento eugênico, nesse contexto, refere-se à 
melhor população para a polis. Nessa época, as ciências médicas não eram 
avançadas a ponto de propiciar uma boa vida para aqueles que nascessem 
portadores de deficiências. Aristóteles, por sua vez, defendia a realização de 
abortos como forma de controle populacional, além de afirmar que as crianças 
que apresentassem anomalias deveriam ser deixadas para morrer. Esse 
argumento é considerado aborto eugênico. 
Aborto na História 
 
 
 
 
17
Para o direito romano, não existia o aborto enquanto conduta 
criminalizada, uma vez que o feto era considerado parte do corpo da mulher e, 
portanto, ela podia dispor livremente de seu corpo, conforme fosse sua 
vontade. Assim, quando a mulher grávida era vítima de agressão que não 
resultasse na sua morte ou ameaça à sua saúde, geralmente o agressor não 
era punido, pois a morte do feto não estava tipificada como crime. No direito 
romano o aborto não era punido na República nem durante os primeiros 
tempos do Império e foi assimilado ao homicídio somente a partir da época de 
Sétimo Severo (ARMANI et al, 1995). 
Para o direito romano antigo, segundo Alves (1999), o aborto não 
tinha existência autônoma como crime, a Lei das XII Tábuas e as leis 
republicanas não tratavam da matéria. A conduta era considerada crime contra 
a mulher, porquanto o ser humano em vida intra-uterina era tido como uma 
porção do corpo da mulher ou parte de suas vísceras (mulieris pars vel 
viscerum): Geralmente, ficava-se a salvo da punição quando não implicasse 
óbito da mulher ou mesmo agressão à sua saúde. 
No governo de Septimio Severo (193-211 d.C.), houve, contudo, uma 
modificação nesse entendimento, a lei romana passou a tratar do aborto como 
uma privação do pai ao direito de possuir sua prole. Nessa época, a repressão 
social romana era a mesma dada a homicídio praticado com a propinação de 
veneno. Foi então que o aborto passou a caracterizar ofensa à possibilidade de 
prole do pai, pois a este não cabia nenhuma ingerência sobre o feto, uma vez que 
o concebido era considerado parte do corpo da mulher. Nessa época, o homem 
passa a ser o principal interessado no produto da concepçãoe, por isso, foi criado 
um tipo penal, o aborto, para proteger o direito do homem a ter descendentes. 
A Igreja Católica nem sempre foi contra o aborto, devido às teorias 
existentes sobre a animação do feto. Assim, mesmo que existisse uma 
condenação moral, se o feto ainda não contasse com alma, não era punido o 
aborto (40 dias para meninos, 80 dias para meninas) (MURARO, 1989). Em 
1869, houve uma mudança de percepção da Igreja Católica e o que passa a 
interessar para efeitos de aborto é o momento da concepção. Atualmente, o 
catolicismo é contra qualquer tipo de abortamento, mesmo aquele considerado 
Aborto na História 
 
 
 
 
18
terapêutico ou sentimental, decorrente de estupro, como deixam claro as 
encíclicas papais. 
Entre as religiões, aquelas que conferem caráter sagrado à vida, a 
partir da concepção, estão o judaísmo, o cristianismo e o budismo. Os 
protestantes dividem-se em duas correntes: uma é a doutrina do caráter 
sagrado, outra aceita as determinações do legislador civil. O islamismo permite 
o aborto até o quarto mês de gravidez. Em relação aos argumentos religiosos 
católico-romanos, que são basicamente quatro citados por Callahan (1996) no 
livro “Abortion: a reader”: 
(1) Somente Deus é o senhor da vida, (God alone is the Lord of life) 
(2) Os seres humanos não têm o direito de tirar as vidas de outros 
(inocentes) seres humanos, (Human beings do not have the right 
to take the lives of other (innocent) human beings). 
(3) A vida humana inicia no momento da concepção, (Human life 
begins at the moment of conception). 
(4) Aborto independente do estágio de desenvolvimento do 
concepto, é retirar a vida de um ser inocente. (Abortion, at 
whatever the stage of development of the conceptus, is the 
taking of innocent life). 
 
Perante os olhos de Deus chegamos à conclusão é de que o aborto 
é errado. Esses argumentos praticamente estão baseados em um só, ou seja, 
o primeiro, no qual Deus é o provedor de toda vida e, portanto, essa é sagrada, 
cabendo a Ele as decisões sobre vida e morte. Deus dar, Deus tira e só ele 
tem esse direito. 
Em relação ao protestantismo e suas várias correntes, o 
entendimento está centrado na não-absolutização dos direitos do feto ou da 
mãe e na liberdade religiosa. A maioria delas [as correntes protestantes] tem 
admitido à ambigüidade moral nas decisões de aborto. A maioria tem 
reconhecido que tanto os direitos do feto quanto da mãe são importantes, e 
que nenhum deles deve ser absoluto. 
Aborto na História 
 
 
 
 
19
De uma maneira geral, mesmo contra suas convicções religiosas as 
mulheres têm assumido cada vez mais uma posição de independência de suas 
escolhas, fazendo principalmente a decisão baseadas na sua vivência e sua 
realidade dos fatos. Assim atualmente a prática de aborto em certos países 
que ainda não o liberaram encontra-se em evidências, e também a corrente do 
que seja uma vida digna e do que seria qualidade de vida, alojando assim, ou 
melhor, retornando ao questionamento da antiga Grécia onde se fazia 
necessário, ora por um dos filósofos gregos, a prática de aborto por controle 
populacional e ora por não comportar na sociedade a permanência de seres 
humanos incapazes de decidir seus próprios destinos ou de terem uma vida 
digna com qualidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3. ABORTO - TIPO - CLASSIFICAÇÃO 
 
Aborto - Tipo - Classificação 
 
 
 
 
21
Os casos de abortamento constituem a terceira causa de morte 
materna no Brasil. Anualmente são atendidas, no Sistema Único de Saúde 
(SUS), cerca de 250.000 mulheres com complicações de aborto. É a causa 
mais freqüente de hemorragia na primeira metade da gestação, seja ele 
espontâneo ou provocado. Por isso mesmo para o meio jurídico é importante 
saber classificá-lo e conhecê-lo para poder saber como ocorreu e o que tudo 
isso implica. Sabemos também que não se pode estabelecer adequadamente 
taxa de incidência correta pelo motivo de a maioria dos abortos não ser 
detectada, pois são o que chamamos de abortamento sem diagnóstico, 
acontecido antes da 5ª semana de gestação. Dentro dos abortamentos de 
gestações clinicamente diagnosticadas, há uma incidência em torno de 15% a 
20% das gestações que prosseguem sendo que destes 80% são abortos 
precoces, ou seja, antes da 13ª semana. 
Como conceito ou definição do que seria um aborto, escolhemos a 
definição dada pela Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia 
(FIGO), que a define como a interrupção da gestação, com a expulsão ou 
extração do feto ou concepto antes da viabilidade fetal, ou idade gestacional 
igual ou inferior a 22 e feto apresentando peso inferior a 500g ou com 
comprimento menor que 28cm antes da viabilidade. 
 
Classificação 
a) Etiológica – Espontâneo (são causados em torno de 70% por 
fatores fetais e sendo a maior causa as anomalias cromossomais e dentro 
delas persiste com maior incidência as trissomias, sobretudo a 16: e a grande 
maioria ocorre ate a 13ª semana de gestação e os 30% restante são liderados 
por fatores maternos entre os quais podemos citar os leiomiomas uterinos 
gigantes, as más formações uterinas, doenças metabólicas e ainda também 
podemos citar a incompetência istmo-cervical) e Provocado. 
 
Aborto - Tipo - Classificação 
 
 
 
 
22
b) Segundo o período - Precoce e Tardio 
- Precoce - quando ocorrer até a 12ª semana gestacional. 
- Tardio - quando ocorrer após a 12ª semana gestacional, 
porém dentro do conceito de abortamento. 
 
Forma clínica 
Pode-se apresentar como ameaça de abortamento, abortamento 
inevitável, abortamento completo, abortamento incompleto, abortamento retido 
e abortamento infectado. 
Todas as explicações acima se referem à classificação, e forma 
clínica, no que se diz respeito à visão do medico. Agora como maneira de 
visualizar juridicamente a classificação e formas de aborto, dividimos da 
seguinte maneira: 
a) Natural ou espontâneo, quando há interrupção espontânea da 
gravidez, independendo da vontade da gestante; 
b) Terapêutico ou necessário, em que a gravidez põe em risco a vida 
da gestante ou poderá ocasionar um mal sério e iminente à mesma; 
c) Honroso ou moral, que consiste em abortar o feto por ser a 
gestação resultante de estupro; 
d) Seletivo, eugênico ou eugenésico, o encarregado de impedir a 
continuação da gravidez em que haja possibilidade de que a 
criança nasça com taras hereditárias ou más-formações, como 
por exemplo, a anencefalia; 
e) Social ou econômico, aquele que ocorre para não agravar a 
situação econômica e social de famílias já numerosas. 
 
Os métodos para se executar o aborto são os mais variados. A 
maioria deles, entretanto, são perigosos e precários, sendo, infelizmente, os 
mais utilizados pela população carente, a qual, de acordo com estimativas do 
Ministério da Saúde, é quem mais se utiliza do abortamento. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4. VIDA: CONCEITO, DIGNIDADE E QUALIDADE 
 
Vida: Conceito, Dignidade e Qualidade 
 
 
 
 
24
O “direito de matar” ou o “direito de morrer” ou mesmo o “direto de 
não viver” sempre teve, em todas as épocas, seus mais extremados 
defensores. Na Índia de antigamente, os incuráveis eram jogados no Ganges, 
depois de se lhes vedar a boca e as narinas com a lama sagrada. 
Os espartanos, conta Plutarco em Vidas Paralelas, do alto do monte 
Taijeto, lançavam os recém-nascidos deformados e até anciãos, pois “só viam 
em seus filhos futuros guerreiros que, para cumprir tais condições deveriam 
apresentar as máximas condições de robustez e força”. Os Brâmanes 
eliminavam os velhos enfermos e os recém-nascidos defeituosos por 
considerá-los imprestáveis aos interesses do grupo. 
Para iniciarmos nossa discussão iniciamos falando sobre o que seria 
vida, ou mesmo conceito de vida e aproveitamos o que escreveu tão 
perfeitamente Alfradique (2005), quando se referiua vida: O vocábulo vida 
possui inúmeros significados, dificultando demasiadamente um sentido pronto 
e acabado. Trata-se de assunto cuja conceituação é tida como inextrincável 
por muitos autores. Citaremos diferentes concepções de tratadistas para 
tentarmos chegar a um ponto comum neste trabalho. 
Tecendo considerações acerca do direito à vida e reconhecendo a 
dificuldade de uma definição, o Constitucionalista José Afonso da Silva disse: 
"Não intentaremos dar uma definição disto que se chama vida, porque é aqui 
que se corre o risco de ingressar no campo da metafísica suprarreal, que não 
nos levará a nada". 
Em virtude das dificuldades sobre o tema, a tarefa de definir o 
sentido exato de vida revela-se enorme. Mesmo porque a vida está em 
constante movimento, acontecendo a todo instante diante de nós. Alguns 
estudiosos, sobretudo das Ciências da Saúde, dizem ser a vida a continuidade 
de todas as funções de um organismo vivo ou então o período compreendido 
entre a concepção e morte. Trata-se, como podemos inferir, de idéia muito 
vaga, carecedora de precisão, não correspondendo a nenhum dado sensorial 
ou concreto, insuficiente para conceituar, por conseguinte, a proposição em 
comento. Em suma, a definição não consegue apresentar características 
individuadoras, inequívocas, do que seja vida. 
Vida: Conceito, Dignidade e Qualidade 
 
 
 
 
25
Quando se procura fazer uma dicotomia entre vida e morte, e 
procurando atribuir a definição de uma atrelada a outra, torna se mais difícil 
conseguir uma definição de vida adequada. Autores tanatologistas costumam 
afirmar, que, por exclusão, vida é tudo aquilo que não está morto, ou seja, que 
não faleceu, não finou, não expirou, não pereceu. Embora atribua clareza solar 
às suas definições, acreditamos que afirmativas assim são por demais 
incompletas e defeituosas. 
O próprio José Afonso da Silva elucida dizendo que no texto 
constitucional (art. 5o, caput) não será considerada apenas no seu sentido 
biológico de incessante auto-atividade funcional, peculiar à matéria orgânica, 
mas na sua acepção biográfica mais compreensiva. Sua riqueza significativa é 
de difícil apreensão porque é algo dinâmico, que se transforma 
incessantemente sem perder sua própria identidade. E conclui afirmando que é 
mais um processo (processo vital), que se instaura com a concepção (ou 
germinação vegetal), transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até 
que mude de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte. 
Atentando somente para o que se vê no dicionário da língua 
portuguesa teríamos de dizer que vida é um Conjunto de propriedades e 
qualidades graças às quais animais e plantas, ao contrário dos organismos 
mortos ou da matéria bruta, se mantêm em contínua atividade, manifestada em 
funções orgânicas tais como o metabolismo, o crescimento, a reação a 
estímulos, a adaptação ao meio, a reprodução, e outras; existência; o estado 
ou condição dos organismos que se mantêm nessa atividade desde o 
nascimento até a morte; o espaço de tempo que decorre desde o nascimento 
até a morte (HOLANDA, 1994). 
Irrefutável, portanto, que o objeto da tutela constitucional é a vida 
humana, levando o já referido Silva (1991) a pontificar que, “por isso é que 
ela constitui a fonte primária de os outros bens jurídicos." É o centro 
gravitacional sobre o qual orbitam todos os outros direitos do gênero humano. 
Em conseqüência, temos que, do asseguramento do direito à vida defluem 
todas as outras situações, quer sejam jurídicas, políticas, econômicas, morais 
ou religiosas do Homem (in genere). Assim, de nada adiantaria a Constituição 
Vida: Conceito, Dignidade e Qualidade 
 
 
 
 
26
assegurar outros direitos fundamentais, como a igualdade, a intimidade, a 
liberdade, o bem-estar, se não erigisse a vida humana em um desses direitos. 
A tarefa de consubstanciar juridicamente, de maneira indiscutível, o direito à 
vida, cumpre ao Direito Constitucional, viga mestra de todas as outras 
ramificações. Por isso que o laureado Arinos (1978), ao tecer escorreita 
dissecação sobre o objeto de estudo do Direito Constitucional, declara que 
outro aspecto de que se reveste o Direito Constitucional é que ele abrange a 
estrutura jurídica do Estado, suas normas fundamentais, a definição e o 
funcionamento dos seus órgãos, os direitos públicos individuais e outros 
assuntos, estejam eles, ou não estejam consignados no texto da Constituição. 
Levamos agora nossa discussão no que seria, portanto uma vida 
digna e qualidade de vida. Vimos por tudo dito acima que nosso direito 
constitucional preza pelo bem da vida e tudo demais gira em torno de dar ao 
cidadão uma vida digna com qualidade. 
Então para se ter uma vida digna deve-se ter antes de tudo a 
possibilidade de poder conquistá-la com seus próprios meios, ter educação 
básica e profissionalizante para que esse cidadão possa decidir o que quer ou 
que não quer do seu Estado e fazer opções quanto sua qualidade de vida. 
A dignidade da pessoa humana é fundamentada em valores 
explicados pela religião, filosofia e ciência que geraram documentos jurídicos 
ao longo da história, como a Magna Carta de 1215, Lei do Habeas Corpus de 
1679, Declaração de independência dos Estados Unidos da América de 1787, 
Declaração dos Direitos da Revolução Francesa de 1789, a Declaração 
Universal dos Direitos Humanos de 1948, algumas Constituições a partir dos 
séculos XIX e XX e Convenções Internacionais, como a Européia dos Direitos 
Humanos de 1950, a da Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural de 
1972 e a Convenção da Biodiversidade de 1992. 
Embora a idéia da igualdade entre os homens tenha surgido no 
período axial no século VIII a.C. em vários locais, como a Grécia, Israel e Ásia, 
a partir da disseminação das religiões monoteístas e da filosofia, com a 
transcendência do saber mitológico da tradição para a o monoteísmo pelo 
saber lógico da razão, nas palavras de Comparato (2005), somente 25 séculos 
Vida: Conceito, Dignidade e Qualidade 
 
 
 
 
27
depois, a primeira organização internacional proclamou na abertura de uma 
Declaração dos Direitos do Homem, que “todos os homens nascem livres e 
iguais em dignidades e direitos”. 
E quando esse pseudo-cidadão que deveria nascer livre e igual em 
dignidade e direitos, não é capaz desde o momento do seu nascimento a ter 
todo esse direito em que se baseia a nossa constituição, ou seja, não terá a 
consciência de decidir ou percepção do que se passa ao seu redor mesmo 
com avançar nos anos de vida (se é que chegará a horas ou semanas de vida), 
e ficará sempre a mercê de alguém para lhe ajudar nas condições mínimas de 
higiene, de alimentação e locomoção ad eternum, passamos a nos questionar 
se não seria mais justo dar lhe o direito de não viver indignamente e sem 
menor chance de ter consciência ou discernimento do que seria uma vida? 
Neste sentido, passaremos a relatar as principais anomalias 
congênitas não compatíveis com a vida. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5. ANOMALIAS CONGÊNITAS NÃO COMPATÍVEIS COM A VIDA 
 
Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 
 
 
 
 
29
Nesta apresentação de algumas e mais comuns anomalias congênitas, 
citaremos as que são totalmente incompatíveis com a vida extra-uterina. 
Temos então anencefalia, holoprosencefalia, trissomia 13, síndrome 
de Edward, agnesia renal bilateral entre outras. 
A maioria dessas anomalias diz se respeito ao tubo neural, sendo, 
portanto de suma importância que este esteja totalmente bem desenvolvido 
para que o nascituro tenha chances de sobrevivência e de desenvolvimento 
total em sua vida extra-uterina. 
 
 
Figura 1 - Anencéfalo. 
 
Iniciaremos com a mais comum e o mais atual problema no direito 
que é o feto anencéfalo ou anencefalia. A anencefalia é malformação 
relativamente comum, ocorrendo em 1:1000 nascimentos. 
A anencefalia é um defeitodo tubo neural (uma desordem 
envolvendo incompleto desenvolvimento do cérebro, da espinha dorsal e das 
suas coberturas de proteção). O tubo neural é de envoltura estreita que dobra 
e fecha entre a terceira e quarta semana da gravidez para formar o cérebro e a 
Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 
 
 
 
 
30
espinha dorsal do embrião. Anencefalia ocorre quando o fim “cefálico" ou de 
cabeça do tubo neural não se fecha, enquanto resultando na ausência de uma 
porção principal do cérebro, do crânio, e do couro cabeludo. 
É caracterizada pela ausência da abóbada craniana ou calvária, sendo que 
os hemisférios cerebrais e as estruturas diencefálicas encontram-se 
substituídas por uma massa vascular e neural amorfa e achatada. As 
estruturas faciais e as órbitas estão presentes e é muito comum associar-se a 
outras malformações, mesmo extraneurais. Portanto, crianças com esta 
desordem nascem sem ambos: uma calota (a parte dianteira do cérebro) e um 
cérebro (o pensamento e coordenações da área do cérebro). 
O tecido de cérebro restante está freqüentemente exposto - não 
coberto através de osso nem de pele. A criança é – conseqüentemente – 
surda, inconsciente e incapaz de sentir dor. Embora alguns indivíduos com 
anencefalia possam nascer com um talo de cérebro rudimentar, mas a falta de 
um cérebro funcionando permanentemente, regras que refugam a possibilidade 
de já ganharem consciência. A evolução é sempre, invariavelmente, fatal, 
podendo ser proposta a interrupção da gestação no momento do diagnóstico, 
seja ele feito em qualquer idade gestacional. Ações reflexivas como respiração 
(respirando) e respostas para soar, ou toque, podem acontecer. A causa de 
anencefalia é desconhecida. Embora se creia que a dieta da mãe, a falta do 
acido fólico, possam ter um papel importante, os cientistas acreditam que 
muitos outros fatores também estejam envolvidos. 
Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 
 
 
 
 
31
 
Figura 2 – Anencefalo 2. 
 
Algumas pessoas defendem o fato de que os fetos anencéfalos 
poderão servir como doadores de órgãos para outros bebês com anomalias 
graves e não letais. Até que ponto seria justo submeter uma gestante aos 
riscos próprios deste período e ao desconforto físico e emocional para 
beneficiar outros bebes? 
Outro tipo de má formação não compatível com a vida tem os bebes 
com holoprocenfalia que constitui uma má-formação craniofacial devido a uma 
anormalidade complexa do desenvolvimento do cérebro; acontece devido a 
uma falta da segmentação do prosencéfalo nos hemisférios, que origina uma 
alteração na clivagem deste. 
A incidência varia de acordo com o tipo de malformação. Por 
exemplo, a ciclopia que é uma apresentação muito rara, tem como incidência 
em recém-nascidos vivos de 1:40.000, a maioria, portanto morre ainda na vida 
intra-uterina. A etiologia é heterogênea e na maioria dos casos a causa não 
pode ser determinada. São geralmente associadas às trissomias 7, 13 e 18, a 
Síndrome de Meckel-Gruber e às triploidias. 
 
Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 
 
 
 
 
32
 
Figura 3 - Holoproencefalia 1. 
 
Outras causas podem estar relacionadas com infecções intra-útero 
virais, diabetes, ingestão de alcalóides, aspirina. 
Alguns podem ter uma apresentação dominante ou autossômica 
recessiva. A holoprosencefalia é o resultado da falha da rachadura do 
prosencéfalo. Prosencéfalo é a maior das três vesículas cerebral primitivas e que 
dá origem aos hemisférios cerebrais e ao diencéfalo que inclui a neuro-hipófise, o 
talamus, o terceiro ventrículo e o bulbo olfatório. Pensa se que esse processo de 
diferenciação é induzido pelo mesênquima que se interpõe entre o teto da boca e 
o prosencéfalo. Ele mesmo é o responsável pelo desenvolvimento norma das 
estruturas da face e da parte do nariz, na estrutura interorbital e do bordo 
superior. Uma interferência na atividade de desenvolvimento do mesênquima faria 
aparecer defeitos em ambas as áreas da cabeça até a face. 
As anomalias cerebrais são de graus diferenciados e variam de 
acordo com a falha da rachadura do prosencéfalo, como conseqüência ocorre 
a divisão incompleta dos hemisférios cerebrais e das estruturas subjacentes. 
As alterações do holoprosencefalo são classificadas de acordo com 
a separação do prosencéfalo em: 
Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 
 
 
 
 
33
Alobar: é apresentação mais severa, de modo que há ausência da fissura 
inter-hemisférica, do terceiro ventrículo, da neuro-hipófise, do bulbo olfatório e do 
tracto olfatório. É possível que venha como apresentação ciclopía (Figura 4). 
 
 
Figura 4 – Holoproencefalia. 
 
Semilombar: nesse tipo de apresentação, ambos os hemisférios são 
parciais, existem, mas separados por um único ventrículo. Apresentam 
portanto, hipotelorismo, micro-oftalmia, coloboma, bordo medial leporino e tem 
característica plana por ausência do septum nasal. Se sobrevivem apresentam 
retardamento mental acentuado. 
Lobar: nesse caso, mais leve, a fissura inter-hemisférica está bem 
constituída, mas existe um determinado grau de fusão das estruturas. O pellucidum 
do septum está ausente e tracto, olfatorio do bulbo e o corpo duro podem ser 
hipoplásicos ou ausente. A cara é normal e pode aparecer retardamento mental. 
As malformações associadas ao holoprosencefalia são: hidrocefalia, 
anencefalia, polidactilia, sindactilia, sirinomelia e hérnia umbilical. A maioria de 
recém-nascidos morre cedo e as crianças com alterações menores sobrevivem 
geralmente com graus diversos de retardamento mental. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
6. O ABORTO E AS LEGISLAÇÕES BRASILEIRA E ESTRANGEIRA 
 
O Aborto e as Legislações Brasileira e Estrangeira 
 
 
 
 
35
6.1 Legislação Brasileira 
 
Dentro da Legislação Brasileira o aborto encontra-se tipificado no 
texto dos seguintes artigos do Código Penal: 
 
“Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento” 
Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho 
provoque: 
Pena - detenção, de um a três anos. 
 
“Aborto provocado por terceiro” 
Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: 
Pena - reclusão, de três a dez anos. 
 
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante: 
Pena - reclusão, de um a quatro anos. 
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é 
maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o 
consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. 
 
Forma qualificada 
Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas 
de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos meios empregados 
para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são 
duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte. 
 
Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico: 
 
O Aborto e as Legislações Brasileira e Estrangeira 
 
 
 
 
36
Aborto necessário 
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; 
 
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro 
II – “se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de 
consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”. 
 
No Código Penal brasileiro, o crime de aborto é classificado no Título 
“Dos Crimes Contra a Pessoa” e no capitulo “Dos Crimes Contra a Vida”. 
Assim o objeto da tutela penal é a vida do feto. Não se trata de vida 
independente, mas se considera que o produto da concepção vive o que é 
suficiente para haver proteção. 
Diante do Direito Civil, o feto não é pessoa, mas spes personae, de 
acordo com a doutrina natalista (a aquisição da personalidade se dá com o 
nascimento com vida). É considerada expectativa de ente humano, possuindo 
expectativa de direito. Entretanto, para efeitos penais, é considerada pessoa. 
Tutela-se, então, a vida da pessoa humana. A açãode provocar o aborto tem 
por objeto interromper a gravidez e eliminar o produto da concepção. Isto 
significa que a mulher grávida e o fruto da concepção constituem objeto 
material da ação de provocar aborto, sendo consumado o crime com a morte 
do mesmo, independente de ter ocorrido no ventre materno ou fora dele. 
 
 
6.2 Legislações Estrangeiras 
 
Prestando atenção à legislação de alguns países, vemos que 
atualmente, há basicamente três linhas de pensamento a respeito da permissão 
ou não do aborto. 
A não-criminalização do aborto, seria a primeira delas, para todos os 
casos, deixando a cargo da mulher e do médico responsável à opção pelo 
O Aborto e as Legislações Brasileira e Estrangeira 
 
 
 
 
37
aborto. Havendo o consenso entre ambos, o aborto poderá ocorrer. Esta é a 
conduta adotada por países como Rússia, o Japão e a Hungria. Que ao 
primeiro olhar deveria causar aumento da incidência, mas pelo contrário, 
resultou na diminuição do número dos mesmos. Isso foi encarado como uma 
política de prevenção. 
Na linha de legislações mais liberais, como do Canadá (país que 
permite o aborto por livre escolha da mulher), a permissão obtém-se para 
realização do aborto por diversos motivos, que vão desde fatores sócio-
econômicos (em casos de prole numerosa, controle de natalidade, impotência 
patrimonial do casal), até a escolha livre da mulher, dando mais ênfase na 
autonomia da mesma. Já na China (que conta com a maior população do 
planeta), o aborto serve inclusive como medidas extremas de controle de 
natalidade. No ordenamento jurídico de países também considerados liberais, 
como da Suécia e da Islândia, estabelece-se o aborto social. 
A grande maioria dos países, caso do Brasil, Israel, Espanha, 
França, Chile, Argentina, entretanto, encontra-se na terceira tendência relativa 
ao aborto: permitem-no apenas em algumas situações, como, por exemplo, em 
caso de estupro, de risco de vida à gestante e de má-formação do feto. Mesmo 
entre os países que aderem a esta linha, não há uma homogeneidade, pois 
existem divergências quanto aos motivos que podem ser considerados para se 
efetivar um aborto legal. 
Nos Estados Unidos, país regido pelo Common Law, a situação é 
diferente, enquadrando-se em nenhuma das três tendências. Em todos os 
estados americanos, o aborto era ilegal até que um caso no início dos anos 70 
gerou um processo que acabou na suprema corte. 
O tribunal decidiu a favor, ditando que a mulher tem o direito 
constitucional de decidir se ela quer ou não ter o filho, o que acarretou a 
legalização do aborto em todo o país. A partir daquela decisão a corte 
reconheceu a necessidade de traçar um balanço entre o direito da mulher de 
escolher o aborto e os interesses do Estado em assegurar a saúde da gestante 
e proteger a vida humana em potencial. Assim, foi determinado que no primeiro 
trimestre haveria obrigatoriamente a possibilidade de se fazer o aborto em 
O Aborto e as Legislações Brasileira e Estrangeira 
 
 
 
 
38
todos os estados. No segundo trimestre, entretanto, os estados que assim 
desejassem poderiam proibir tal prática desde que apresentassem justificativas 
plausíveis, geralmente relacionadas à garantia da saúde da gestante. Já no 
terceiro trimestre, o aborto não seria permitido em Estado algum, desde que a 
gravidez não colocasse em risco a vida da gestante, baseando-se como vimos 
em critério da viabilidade (OLIVEIRA, 2003). 
 
Tabela 1 - Países e permissão do aborto 
Motivos Aborto terapêutico 
Aborto 
eugênico 
Aborto 
honroso 
França sim sim não 
Brasil sim não sim 
Peru sim não não 
Israel sim sim sim 
Suíça sim não não 
Espanha sim sim até o 3º mês 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7. JURISPRUDÊNCIAS 
 
Jurisprudência 
 
 
 
 
40
Estima-se que mais de três mil pedidos judiciais já foram concedidos 
para autorizar interrupções seletivas da gestação no país, a grande maioria 
realizada em hospitais públicos. 
A CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde) 
entrou com a ação de Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental 
número 54 junto ao Supremo Tribunal Federal, pretendendo que não houvesse 
mais o impedimento da antecipação terapêutica do parto em casos de gravidez 
de feto anencefálico mediante a declaração da inconstitucionalidade da 
interpretação dos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal como 
forma impeditiva. 
Para que provisoriamente se dissipasse a nuvem de insegurança 
jurídica, no dia 1° de julho de 2004, o Ministro Marco Aurélio concedeu a 
medida liminar para reconhecer "o direito constitucional da gestante de 
submeter-se à operação terapêutica de parto de fetos anencefálicos, a partir de 
laudo médico atestando a deformidade". 
No dia 20 de outubro de 2004, todavia, o Supremo Tribunal Federal, 
em sessão plenária, por maioria de votos, revogou parcialmente a aludida 
medida liminar, para afastar o reconhecimento do direito constitucional das 
gestantes de se submeterem à operação terapêutica de parto de fetos 
anencefálicos, mas para mantê-la no que tange ao sobrestamento de 
processos e decisões não transitadas em julgado envolvendo a imputação de 
crime de aborto por conta de tal operação, até prosseguimento do julgamento 
para apreciação de questão de ordem acerca do cabimento da argüição de 
descumprimento de preceito fundamental no caso e, em seguida, do mérito. 
Na retomada do julgamento, os ministros do STF analisaram, no dia 27 
de Abril subseqüente, o cabimento da ADPF 54. Por sete a quatro, os ministros 
resolveram dar seqüência à tramitação do processo no Supremo, para posterior 
decisão quanto à legalidade da interrupção de gravidez de fetos anencefálicos. 
O ministro Joaquim Barbosa, seguindo o entendimento do relator, 
ministro Marco Aurélio, que se pronunciara, anteriormente pelo cabimento da 
ADPF, afirmou que "milhares de autorizações judiciais de interrupção de 
Jurisprudência 
 
 
 
 
41
gravidez em caso de anencefalia já foram concedidas no país nesses últimos 
anos, mas para cada autorização concedida várias outras são negadas, 
criando assim uma insegurança jurídica inadmissível". Também favorável, 
Gilmar Mendes argumentou que a própria insegurança jurídica pode ser vista 
como descumprimento de preceito fundamental. Para ele, o que a CNTS 
questiona é a necessidade de se respeitar um preceito fundamental da 
Constituição brasileira, que é o princípio da dignidade da pessoa humana, da 
liberdade e do direito à saúde. "A existência ou não da violação de tais 
preceitos será objeto de exame quando do julgamento de mérito. Mas cabe 
enfatizar, nesse ponto, que este requisito legal para a admissibilidade da ADPF 
me parece completamente cumprido", observou Mendes. Assim, o tribunal, por 
maioria, entendeu admissível a Argüição de Descumprimento de Preceito 
Fundamental e, ao mesmo tempo, determinou o retorno dos autos ao relator, 
para apreciar o mérito. (texto copiado de Aborto uma abordagem jurídica e 
social de Hélio Roberto Cabral de Oliveira). 
 
Outros pareceres: 
Ementa: recurso em sentido estrito. Aborto provocado por 
terceiro. Negativa de autoria. 1. Existência do delito de aborto 
comprovado através da ficha ambulatorial, registro de ocorrência e 
prova testemunhal, supre o exame de corpo de delito, artigo 167 
do CPP. 2. A sistemática dos delitos de competência do tribunal 
do júri determina que o juiz singular, uma vez demonstrada a 
existência do crime e havendo indícios da autoria, remeta o 
processo a julgamento para que os jurados pronunciem-se sobre 
o mérito da acusação. Improviso o recurso defensivo (recurso em 
sentido estrito nº 70012109617, Terceira Câmara Criminal, TJRS, 
Relator: Elba Aparecida Nicolli Bastos, julgado em 21/07/2005). 
 
Ementa: recurso em sentido estrito. Pronuncia. Aborto. Atesta o 
laudo pericial que o aborto teve como causa o chute que a vítima, 
visivelmente grávida,sofreu no ventre ou que decorreu das 
convulsões, estas, resultantes das pancadas fortes na cabeça, de 
qualquer forma, resultou das agressões sofridas e que há nos autos 
indícios suficientes dando o acusado como autor. Portanto, 
presentes os requisitos do artigo 408, código de processo penal - 
prova da materialidade e indícios da autoria - nada a reparar na 
decisão. Recurso em sentido estrito conhecido e improviso. (recurso 
em sentido estrito nº 6457-3/220, Primeira Câmara Criminal, TJGO, 
relator: Des. Byron Seabra Guimarães, julgado em 06/05/1999). 
Jurisprudência 
 
 
 
 
42
Pareceres emitidos por Conselhos Regionais de Medicina 
 
Assunto: Interrupção da gravidez nos casos previstos por lei ou aborto legal 
Relator: Conselheiro Cristião Fernando Rosas 
 
Ementa: O médico exerce a medicina de forma ética, quando 
respeita a lei e os direitos reprodutivos de seu paciente, sendo de seu direito 
recusar-se à realização de atos médicos que embora permitidos por lei sejam 
contrários aos ditames de sua consciência. O consulente Dr. M.C.F., solicita 
parecer do CREMESP sobre interrupção de gravidez nos casos previstos por 
lei ou aborto legal. 
Parecer: 
Assim sendo, considero que exerce a medicina de forma ética, o 
médico que, em respeito à lei, atende a este direito reprodutivo, que há 58 anos 
está inscrito no Código Penal Brasileiro, seguindo as orientações normatizadas 
pelo Ministério da Saúde. Também entendo ser um direito do médico, conforme 
estipulado no artigo 28 do nosso diploma legal, recusar-se à realização de atos 
médicos, que embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua 
consciência. Todavia, isto não o exime da responsabilidade de aconselhamento, 
informação, orientação e o devido encaminhamento a serviço que dê este tipo 
de atendimento, se este for o interesse da paciente. Este é o nosso parecer, 
s.m.j. Conselheiro Cristião Fernando Rosas. 
 
Assunto: Eutanásia passiva. Recém-nascidos com menos de 400 gramas, os 
anencéfalos e os que apresentam trissomia 13 ou 18 confirmadas. 
Relatores: Conselheiros Henrique Carlos Gonçalves e Marco Segre. 
O consulente, Dr. E.T.N., faz as seguintes indagações: 
"1) Se o médico aceitar o procedimento de não intervir nas condições 
relatadas estará infringindo o Código de Ética Médica? 
2) Estará sujeito as penalidades do Código Civil? 
Jurisprudência 
 
 
 
 
43
3) A atitude de não intervir configura uma eutanásia passiva? 
4) Supondo que as considerações do AAP e da OMS sejam 
referentes a recém nascidos com índice de APGAR igual a zero. 
Um recém-nascido nestas condições pode ser considerado 
como morto? Nesse caso a não ressuscitação ou reanimação 
infringe a lei penal e/ou a ética? 
5) No caso de APGAR 1 ou 2 a não reanimação é ilegal ou antiética?" 
 
Parecer 
A expressão eutanásia não consta de qualquer norma ética ou 
jurídica, atualmente, em nosso País. Assim, não se pode falar em "eutanásia 
permitida", seja ela ativa ou passiva. 
O que vai se firmando, isto sim, é a percepção da inutilidade de se 
manter um doente "vivo" a todo custo, infringindo-lhe, a ele e à sua família, 
infindável sofrimento. 
Com relação a casos de morte encefálica já é consensual, em 
termos éticos, que se considere a situação de morte. Entendemos válido (e até 
aconselhável) que se dê o atestado de óbito, mesmo que a função cardio-
respiratória esteja sendo mantida artificialmente, mormente quando se vá 
realizar a retirada, do corpo, de órgãos para transplantes. 
O consulente indaga sobre "eutanásia passiva", isto é a não imposição, 
ao paciente, de medidas que lhe prolonguem a vida que, já se sabe, está 
inapelavelmente condenada a curtíssimo prazo - isto, em casos pediátricos, 
referindo-se ele à normatização da OMS e da FIGO (Federação Internacional de 
Ginecologia e Obstetrícia). Embora, repita-se, não haja normatização especifica a 
esse respeito, no Brasil, fere claramente a visão humanista da Medicina a 
"manutenção da vida a todo custo". Acrescente-se que, para os bebês 
anencefálicos já existe até jurisprudência autorizando o aborto, a pedido da mãe - 
dai defluindo o reconhecimento que essa "vida" não precisa ser preservada. 
Depreende-se do exposto, bem como das respostas aos propostos 
quesitos, que virão a seguir, que a postura ética que sugerimos - e que resulta do 
Jurisprudência 
 
 
 
 
44
"pensar" e "sentir" dos Membros desta Casa, e que reflete o "pensar" e "sentir" de 
boa parte da categoria médica, bem como da sociedade em geral - nem sempre 
tem o aval pleno da Legislação. E que esta - conforme se vê no caso dos bebês 
anencefálicos - vai, se adequando, num primeiro momento através da 
jurisprudência, às características culturais, dinâmicas, da sociedade. Remete-se o 
encaminhamento de cada situação em espécie ao senso ético de cada profissional, 
mantendo o máximo de obediência possível à norma ainda vigente. 
Isto posto, proponho as seguintes respostas para as questões 
formuladas pelo consulente: 
Resposta 1) Não sendo, essas situações explicitadas no Código de 
Ética Médica, não. 
Resposta 2) É o Código Penal que estabelece penalidades, e, no 
caso, tudo dependerá do como for interpretada cada situação específica. 
Resposta 3) Conceitualmente, até sim, tendo em conta as 
considerações supra-expostas. 
Respostas 4 e 5) O índice de APGAR tem o objetivo de avaliar a 
vitalidade do recém-nascido nos primeiros minutos após o parto. O médico 
atribui notas que variam na escala de 0 a 2 para 5 sinais clínicos observados 
no neonato. Assim, o índice de APGAR, medido no 1º, 2º (em desuso), 5º e 10º 
minuto (às vezes), servem de indicadores para procedimentos imediatos ou 
futuros a serem realizados na criança. Assim, um recém nascido, fruto de uma 
gravidez de risco, cuja intervenção obstétrica se deu de forma adequada e 
oportuna, pode ter um índice de APGAR de zero ou muito baixo (1, 2, 3) no 1º 
minuto, revertido para índices satisfatórios após manobras corretas e bem 
sucedidas no pós parto imediato. 
Nestes termos, o uso do índice de APGAR como indicador da 
reanimação ou não do recém-nascido é equivocada, se usado de forma isolada. 
Quanto aos recém-nascidos com menos de 400 gramas, 
anencefálos, trissomia 13 ou 18 confirmadas, a orientação ética coincide com a 
técnico-científica. 
Jurisprudência 
 
 
 
 
45
Este é o nosso parecer, s.m.j. Conselheiro Henrique Carlos 
Gonçalves; Conselheiro Marco Segre. 
Aprovado na 2.925ª Reunião Plenária, realizada em 28.03.2003. 
Homologado na 2.928ª Reunião Plenária, Realizada em 01.04.2003. 
 
Consulta nº 1.444-25/83 
Assunto: A constatação de anencefalia não tem amparo legal para prática de 
abortamento 
Relator: Conselheiro Pedro A. Azevedo Marque 
O Dr. R.M.N. em vista das atividades que vem sendo desenvolvidas no 
município de Cubatão e das inúmeras indagações que lhe são formuladas por 
colegas da região da Baixada Santista, consulta-nos sobre a possibilidade, do 
ponto de vista ético, de se proceder o abortamento quando forem diagnosticadas, 
nos exames pré-natal, certas anomalias, notadamente anencefalia. 
Informa, outrossim, que a conseqüência invariável desse diagnóstico 
intra-uterino é o desejo manifesto pelo casal de interromper a gestação, visto 
que a anencefalia é incompatível com a vida. 
O Código Penal no artigo 128, prevê as hipóteses em que o aborto 
praticado por médico deixa de ser punido. Por outro lado, de acordo com o 
Código de Deontologia Médica, o médico não pode deixar de cumprir a 
legislação existente. 
Assim sendo, em vista da legislação vigente, encontra-se o médico 
impedido de realizar o referido aborto. 
O CREMESP, presentemente, encontra-se discutindo e propondo 
mudanças na atual legislação. 
Aprovada na 1.127ª em 29/01/85. 
 
Jurisprudência 
 
 
 
 
46
Resumo do embasamento da sentença judicial ocorrido em alguns 
pedidos favoráveis de aborto 
 
Tabela 2 - Embasamento jurídico da sentençajudicial e do parecer da 
promotoria favorável a pedido de aborto seletivo 
Embasamento jurídico no deferimento Juízes MP 
Inexibilidade de conduta diversa 1 2 
Artigo 5o. da Constituição 3 4 
Preservar a higidez psíquica da gestante 63 41 
Inexibilidade de conduta diversa + Preservar a higidez psíquica da 
gestante 1 2 
Inexibilidade de conduta diversa + Artigo 5o da Constituição + Preservar 
a higidez psíquica da gestante 7 5 
Preservar a higidez psíquica da gestante e autoriza o aborto pelo art. 128 17 5 
No Artigo 5o. da Constituição + art. 3o, Código de Processo Penal e 
princípios gerais do direito nos princípios de jurisdição voluntária e art. 
1104 e seguintes do Código Penal 
78 32 
Estado de Necessidade + Aplicando-se anologia "in bonam parte" 
usando art. 124 CP c/c o Art. 128,I e II + Artigo 5o. da Constituição 1 4 
Autoriza o aborto nos termos do art. 128,I e II do CP 39 24 
Aplicando-se anologia ïn bonam parte" usando art. 124 CP c/c o Art. 
128,I e II 13 29 
No Artigo 5o. da Constituição + art. 3o, Código de Processo Penal e 
princípios gerais do direito nos princípios de jurisdição voluntária 6 5 
Não há crime em realizar o aborto pois o feto não tem mais vida a ser 
tutelada 6 3 
Não encontra amparo no direito normativo 3 2 
Sem acesso à informação / julgado na 2a. Instância 12 43 
TOTAL 250 201 
 
Jurisprudência 
 
 
 
 
47
Tabela 3 - A argumentação de juízes e promotores contra a autorização do 
aborto seletivo 
Embasamento jurídico no indeferimento Juízes MP 
Não se opões desde que haja risco de vida materno 0 1 
Não configura estado de necessidade 4 5 
Não encontra amparo no direito normativo 9 53 
Invisibilidade do direito à a vida 0 3 
TOTAL 13 62 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
Considerações Finais 
 
 
 
 
49
As principais conclusões alcançadas no trabalho apresentado são. 
 
1. Mostramos que de acordo com relatos históricos, durante grande parte do 
tempo e de forma geral, era o aborto uma prática comum e amplamente 
aceita com ausência de recriminação concreta. 
2. A recriminação e a criminalização do aborto tiveram início junto com o 
advento do cristianismo 
3. Atualmente, com o desenvolvimento da medicina, vem-se criando um novo 
conceito sobre o início da vida, considerando-o a partir do momento em que 
se dá a atividade cerebral. Até então, o feto seria tido somente como um 
prolongamento do corpo da mulher, um conjunto de células. Tal conceito já 
tem tido certa aceitação, principalmente a partir do texto da Resolução n° 
1.480/97 do Conselho Federal de Medicina, editada conforme o artigo 3° da 
Lei 9.434/97, que, por sua vez, dispõe sobre a retirada de órgãos, tecidos e 
partes do corpo humano post mortem para fins de transplante e tratamento. 
4. Através da genética, em especial no segmento medicina fetal, criou novos 
desafios para a Bioética e a Justiça, a partir do momento que as más-
formações fetais são bem mais facilmente identificadas do que há 
algumas décadas. 
5. Sabendo que a lei evolui com o tempo e com o pensamento da 
comunidade, que para tal as normas são feitas é nítido que o Código 
Penal atual, datado de 1940, não acompanha e nem exprime o 
desenvolvimento da sociedade e seu pensamento. 
6. Nos países considerados de primeiro mundo, há, em geral, uma vasta gama de 
previsões legais para o aborto, quase todos deixando na mão da mulher o 
poder de decisão quando se trata de gestações até o 1º trimestre. 
7. Já em paises dito do terceiro mundo, ainda há poucos avanços, o que 
acaba ocasionando o fato de possuírem o maior número de abortos 
praticados todos os anos, sendo em sua grande maioria clandestinos 
além de uma das causas de infecção e hemorragias acentuadas levando 
ao aumento da mortalidade materna. 
Considerações Finais 
 
 
 
 
50
8. Presume se que haja cerca de um milhão de abortos sendo praticados no 
país todos os anos, segundo estimativas do próprio Ministério da Saúde. 
O aborto é uma realidade, principalmente para as pessoas de baixa 
renda, sendo comum encontrar mulheres nas regiões periféricas que já 
abortaram mais de uma vez. 
9. Dar informação e o acesso da população de baixa renda a métodos 
anticoncepcionais temporários (pílulas, Diu etc.) ou permanentes 
(laqueadura) que só a população de nível de renda maior tem, evitariam o 
alto número numero de abortos e infecções por aborto clandestino. 
10. Projetos de Leis tramitam pelo Congresso Nacional, sendo que sua 
maioria propõe, ao menos, aumentar o leque de permissivos legais para o 
aborto, quando não desejam legalizar o aborto como um todo. 
11. Apesar do Brasil se caracterizar como um Estado laico, onde o setor 
religioso, principalmente a Igreja Católica, influencia, de forma acentuada, as 
mais variadas questões nacionais, dificultando principalmente qualquer 
avanço nos debates em relação ao aborto. Nota-se que está tendo grande 
aceitação a possibilidade de interromper a gravidez nos casos em que a 
gestante apresente um feto anencéfalo ou com má formação não compatível 
com a vida extra uterina. A partir do HC 84025, houve uma grande polêmica, 
tendo a discussão sobre o aborto seletivo alcançado repercussão nacional. 
12. Vale lembrar que, em se tratando de aborto, não se pode pensar 
unicamente no feto, o qual não é uma pessoa em sua plenitude, mas sim 
uma expectativa de ser humano. Importante se torna levar em 
consideração – também – a posição da gestante. 
13. Por outro lado, se o crime de aborto tem por objetividade jurídica proteger 
a dignidade relativa do feto, a potencialidade de vida humana, e o 
portador de má-formação não compatível com a vida, como anencefalia 
não possui tal dignidade, tal potencialidade, é de se concluir que, no caso 
do abortamento do feto assim, não existe lesão ao bem jurídico tutelado 
pelo tipo penal. Não havendo lesividade, não há que se falar em crime: é 
fato atípico. 
Considerações Finais 
 
 
 
 
51
14. No caso, como há princípios constitucionais contrastantes, o sistema 
deverá fazer atuar um mecanismo de harmonização que submeta o 
princípio de menor relevância ao de maior valor social. 
15. Sabemos também que em alguns países onde o aborto é legalizado para 
fetos com má-formação muitas mães optam por tê-los e sempre com uma 
dose de sofrimento e de resignação pelos relatos ocorrido, os recém 
nascidos duram muito pouco. Aqueles que têm respaldo de tecnologia 
permanecem com um tempo de vida maior, prolongado por essa 
tecnologia, mas sem qualquer perspectiva de algum dia terem consciência 
ou manifestação própria de sua condição de ser humano. 
16. Por tudo que expomos, estamos conscientes apesar da formação católica 
embutida durante anos que o assunto em questão se diz exclusivamente à 
mãe que carrega o feto com má-formação, sendo de sua inteira decisão 
levar adiante a gestação. Assim, tanto os governantes, quanto os 
legisladores devem ter em mente que o assunto em evidência deve ser 
tratado além de uma questão de saúde pública como uma questão de 
justiça social. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
Referências 
 
 
 
 
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