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1 Fichamento: Introdução clínica à psicanálise lacaniana – Bruce Fink FICHAMENTO: INTRODUÇÃO CLÍNICA À PSICANÁLISE LACANIANA – BRUCE FINK | RESUMOS PSICOLOGIA – RAFAELA FIDELIS Fichamento: Livro Introdução clínica à psicanálise lacaniana – Autor: Bruce Fink. Capítulo 1. O desejo na análise Bruce começa o texto retomando uma ideia muito difundida sobre o querer mudar do paciente que faz psicoterapia/análise. Ele começa com uma anedota muito famosa que diz: Quantos psicólogos são necessários para mudar uma lâmpada? Só um, mas a lâmpada precisa realmente querer mudar. O senso comum e muitas vertentes da psicologia, então, vão dizer que se a terapia não surte efeito, muito provavelmente, é porque falta vontade de mudar do paciente. Porém, na psicanálise lacaniana, há uma posição radicalmente diferente. Lacan admite que realmente o paciente não quer mudar. Pois, os sintomas surgiram e o paciente se empenha nesse comportamento sintomático, é porque grande parte da energia ficou presa nesses sintomas. Freud, vai se referir a esse investimento como uma forma do paciente extrair certa satisfação do sintoma. Assim, o paciente se mantém numa situação onde não muda, porque há certa satisfação nesses sintomas. Essa é uma característica essencial dos sintomas: “eles proporcionam uma satisfação, mesmo que ela possa não ser óbvia para observadores de fora, ou até para o indivíduo. Pois em algum lugar o indivíduo se satisfaz com esses sintomas.” Na perspectiva freudiana/lacaniana, o terapeuta não pode confiar numa suposta vontade de melhorar por parte do paciente, em algum tipo autêntico de mudança. O paciente, normalmente, já procura terapia quando algo não vai bem, quando não há vontade de viver, etc. Portanto, como esperar dele uma vontade de mudar? Na terapia, portanto, o desejo que funciona é o do analista. Mas muitos não procuram o analisando, não telefonam para aqueles que faltam ou que pararam completamente de comparecer à terapia. Muitos terapeutas se sentem magoados ou rejeitados quando o paciente para a terapia ou falta, porém o que não entendem é que é natural que o paciente queira parar a 2 Fichamento: Introdução clínica à psicanálise lacaniana – Bruce Fink FICHAMENTO: INTRODUÇÃO CLÍNICA À PSICANÁLISE LACANIANA – BRUCE FINK | RESUMOS PSICOLOGIA – RAFAELA FIDELIS terapia, caso contrário poderíamos pensar que os conflitos essenciais ligados aos seus sintomas não estariam sendo afetados. Por isso, os pacientes tendem a faltar ou até parar as sessões quando sentem que estão sendo solicitados a abrir mão de alguma coisa. É o desejo do analista que permite com que eles continuem. Expressões muito sutis do analista podem fazer o paciente manter a terapia mesmo quando eles não têm intenção de continuar. O “até amanhã”, do analista pode bastar para trazer alguns de volta, mesmo que acreditem não ter mais nada a dizer e se sintam empacados. Alguns pacientes, se não a maioria, ainda requerem expressões mais fortes do desejo do analista. Nesses casos, Frink diz que o analista pode até dizer que deseja que o paciente continue, que venha mais vezes ao dia, ou na semana, etc. Em casos de pacientes neuróticos é até essencial que o analista transmita esse desejo de que o paciente prossiga nas sessões, mesmo quando achar que já concluíram o seu trabalho. Tais pacientes terminarão o tratamento quando seu próprio desejo de seguir adiante houver se tornado suficientemente forte e decidido. É importante dizer que o analista está desempenhando um papel, por isso ele não transmite seus sentimentos verdadeiros, ele não é “autêntico”. Pois se assim o fosse, o paciente provavelmente tentaria se adequar aquilo que supõe que o analista gosta ou aprova. O analista deve manter uma postura desejante - desejo de que o paciente fale, sonhe, fantasie, faça associações e interprete - independentemente de qualquer antipatia que possa nutrir por ele. O analista é convocado a sustentar essa mesma postura, esse mesmo desejo, de orientação estritamente analítica também no caso inverso, quando houver atração pelo paciente. A contratransferência existe, mas Lacan aponta que o analista está na relação como uma função, desempenhando um papel. Tais sentimentos pessoais podem ter valor para os analistas deles mesmos em suas análises pessoais, bem como para avaliar se o paciente está tentando situar o analista na sua própria economia libidinal, mas não devem ser demonstrados nem revelados ao analisando. 3 Fichamento: Introdução clínica à psicanálise lacaniana – Bruce Fink FICHAMENTO: INTRODUÇÃO CLÍNICA À PSICANÁLISE LACANIANA – BRUCE FINK | RESUMOS PSICOLOGIA – RAFAELA FIDELIS Desejo do analista se refere ao desejo do analista como função, como papel e não como ser humano. O desejo do analista não é de que o paciente melhore, que tenha sucesso na vida, que seja feliz, que compreenda a si mesmo, volte a estudar, conquiste o que diz querer ou diga alguma coisa em particular. Trata-se de um desejo enigmático, que não diz ao paciente o que o analista quer que ele diga ou faça. Os neuróticos são extremamente ávidos por descobrir o que as outras pessoas querem deles, a fim de poderem realizar ou frustrar esses desejos dos outros. O desejo do analista é um desejo puro, que não pousa em nenhum objeto em particular, que não mostra ao analisando o que o analista quer dele, embora seja quase inevitável o analisando tentar ler um desejo específico. Bruce ainda traz a questão sobre o saber e desejo. Muitos pacientes chegam à terapia expressando desejar conhecer o que deu errado, onde foi que erraram. Embora há esse desejo expresso, Lacan diz que há um desejo que se sobressai a esse, o desejo de não saber. E quando os pacientes estão próximos de saber e conhecer o que fizeram para sabotar sua vida, é muito comum resistirem e até mesmo desistirem. Quando há essa resistência do analisando em saber e o analista não faz valer seu desejo, é impossível formular um novo saber. Inclusive, Lacan chega a formular que a única resistência que existe em análise é a do analista, pois a resistência do paciente em não saber pode ser superada se o analista estiver disposto a intervir. Quando o analista hesita, perdendo a oportunidade de pôr em jogo o seu desejo, a resistência é dele e não do analisando. Se o que se supõe é que o paciente não deseja realmente mudar e nem saber o que faz com que ele procure terapia? Bruce vai dizer que é quando ocorre uma crise de satisfação do sintoma do paciente, quando o modus operandi não funciona. Por isso, as pessoas tendem a procurar a terapia quando os sintomas deixam de proporcionar certa satisfação ou quando é ameaçada por terceiros. Ainda, Bruce vai dizer que satisfação é um tempo muito limpo para o prazer que se obtém desse sintoma. Pessoas obtêm certa satisfação da sua própria insatisfação, bem 4 Fichamento: Introdução clínica à psicanálise lacaniana – Bruce Fink FICHAMENTO: INTRODUÇÃO CLÍNICA À PSICANÁLISE LACANIANA – BRUCE FINK | RESUMOS PSICOLOGIA – RAFAELA FIDELIS como das queixas: de culpar os outros por sua falta de satisfação. Da mesma forma, muitas extraem prazer em se torturar e se submeter a experiências dolorosas e assim por diante. Portanto, a palavra que descreveria melhor esse “prazer sujo” seria gozo, o tipo de prazer que alguém pode tirar de um castigo, punição. A maioria das pessoas negam que obtêm determinado prazer, e muitas vezes observadores de fora também não notam, no entanto, em alguns casos é possível perceber certo gozo nesse sofrimento causado pelo sintoma. Desse modo, o momento em que alguém procura terapia pode ser entendido como o momento em que ocorre uma crise de gozo desse sintoma. O sintoma que antes proporciona gozo já não funciona mais ou está em perigo. O paciente,então, chega ao consultório com uma demanda, a de que o analista “arrume” essa desordem e devolva sua forma de gozo. Porém, o que ele vai encontrar é uma satisfação substituta que pode ser da transferência. Bruce finaliza dizendo que talvez não seja tão necessário que a lâmpada queira mudar, que basta que ela esteja falhando. “Aliado à queda livre do gozo antes proporcionado pelo sintoma, o desejo do analista pode ser suficientemente intrigante para levar a pessoa a se envolver no processo analítico e, quando regularmente aplicado, a mantê- la em análise.”
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