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Identificação Projeto: Os Bebês possuem agência? Bolsista: Bruna Lima Santos RA:194939 Orientadora: Gabriela Guarnieri de Campos Tebet Local de execução:Universidade Estadual de Campinas Vigência: 01/03/2020 - 31/07/2020 Introdução A Presente pesquisa é fruto do trabalho desenvolvido enquanto bolsista CNPQ; SAE sob a orientação da professora Dr Gabriela Guarnieri de Campos Tebet em cooperação com o grupo de estudos Bebeeeeducação. Esta pesquisa busca observar os bebês no seu cotidiano em uma creche pública na cidade de São Paulo. Focando nas relações dos bebês entre eles, com o espaço e os adultos buscando elementos que contribuem ou não para a identificação de agência. O objetivo do trabalho é problematizar o conceito de agência para o estudos de bebês, além de discutir como conceito de agência de Corsaro pode ser adotado nas pesquisas sobre bebês e identificar outras concepções de agência, que possam ser úteis nas pesquisas com bebês. Metodologia O estudo realizado para essa pesquisa iniciou-se com visitas numa creche na zona norte da cidade São Paulo, acompanhando uma turma de berçário com intuito de observar as ações e relações dos bebês já estavam sendo realizadas a partir do projeto de pesquisa da Fapesp que a estudante fazia parte. Assim, foi realizado nas visitas a creche também o registro videográfico através de um aparelho celular para uma análise minuciosa e discussão posterior. Por conseguinte foi efetuada uma pesquisa bibliográfica com o objetivo de identificar quem estava falando desse assunto nos últimos no Brasil. A pesquisa feita foi no Banco de Teses e Dissertações da CAPES e Google Acadêmico, utilizando-se para a busca as expressões: "Bebês + e agency", "crianças + e agency" “Agência + infantil", "Agência + das crianças", "Agência + dos bebês". Em seguida para a discussão e análise dos resultados foram realizados cartografias a fim de evidenciar os movimentos e relações dos bebês através das gravações e registros de memórias. A cartografia é uma maneira de aumentar os olhares para o mundo do bebês, inspirada no trabalho com crianças autistas do pedagogo francês Fernand Deligny. A cartografia com bebês é uma experiência relativamente nova, ainda precisa ser mais explorada para mostrar seus pontos fortes e fracos, mas nos permite adentrar no berçário de uma perspectiva microssociológica interessante que respeita as particularidades do ser bebê, tal como proposto por Mozère (2013). Essa metodologia de pesquisa tem sido utilizada no âmbito do grupo de estudos BebÊEEducação e os trabalhos de Moraes (2018) e Costa (2018) foram referências importantes para o desenvolvimento das cartografias que serão apresentadas neste trabalho. Agência de William Corsaro William Arnold Corsaro é professor da cátedra "Robert H. Shaffer class of 1967", da Faculdade de Sociologia, Universidade de Indiana, Bloomington, Estados Unidos, suas principais pesquisas estão focadas na sociologia da infância e as culturas de pares (MULLER, 2007). Para Corsaro a Agência das crianças é a produção de culturas por meio dasrelações sociais que estabelecem com os pares e com os adultos, quando internalizam a sociedade e a cultura, ao mesmo tempo em que contribuem para sua mudança. E considera que “características importantes das culturas de pares surgem e são desenvolvidas em consequência das tentativas infantis de dar sentido e, em certa medida, a resistir ao mundo adulto” (apud NASCIMENTO, 2011, p. 129). Analisando essa citação Maria Letícia e após algumas leitura realizadas sobre a agência de Corsaro, nota-se que a agência é a junção das suas teorias sobre a infância como forma social, reprodução interpretativa e a cultura de pares. A Infância como forma social é drescita por Corsaro (2011) como: A infância como uma categoria ou parte da sociedade. As crianças são membros ativos de sua infância; no entanto, a infância é apenas um período tem- porário de suas vidas. Para a sociedade, no entanto, a infância é uma categoria ou forma estrutural permanente que nunca desaparece, embora seus membros mudem de modo contínuo e sua natu- reza e conceito variem historicamente. Como forma estrutural, a infância se inter-relaciona com outras categorias estruturais, tais como classe, sexo e faixas etárias. Assim, os planos e as mudanças dessas categorias afetarão a natureza da infância. (CORSARO, glossário, 2011) Ele define a reprodução interpretativa : como um conceito oferecido como alternativa à noção de socialização. O termo interpretativo captura os aspectos inovadores e criativos da participação infantil na sociedade e aponta para o fato de que as crianças criam e participam de suas próprias culturas de pares pela apropriação criativa do mundo adulto para resolver suas próprias preocupações. O termo reprodução envolve a ideia de que a criança não se limita a internalizar a sociedade e a cultura, mas também contribui ativamente para a produção e a mudança da cultura. O termo também indica que a criança é, por sua participação muito ativa na sociedade, restrita pela reprodução social. Em outras palavras, as crianças e suas infâncias são afetadas pelas sociedades e culturas em que elas estão inserida. (CORSARO, glossário, 2011) E a cultura de pares é consideraro pelo Corsaro como um conjunto estável de atividades ou rotinas, artefatos, valores e preocupações que as crianças produzem e compartilham em interação com outras crianças. Como os bebês entram no debate sobre agência Ao fazer a pesquisa do termo agência dos bebês, foram encontradas poucas pesquisas quanto ao recorte de período e relevância conforme mostram os gráficos acima. Mas, vale destacar que quando pesquisado os outros termos surgiram palavras que também podem ser referidas a palavra bebês como por exemplo: crianças pequenas/ pequenas infâncias. Por conseguinte, os artigos que aparecem sobre os bebês aparecem em outra categorias. Vale ressaltar, ainda o termo quando é trazido nas pesquisas pouco se difere nas discussões sobre agência de crianças, pois elas sempre vêm acompanhadas para complementar o protagonismo e autonomia seja ela das crianças ou bebês. O conceito de agência de bebês também foi encontrado em pesquisas de discurso materno direcionado aos bebês, e a palavra agência nesse caso é definida como ações da mãe referindo-se ao bebê como tendo, ou iniciando intenções, emoções, preferência ou decisões, como por exemplo nas frase: “ ficou bravo com a mamãe?” “você está conversando?”. Neste caso, os autores (SANTOS, SANTOS, BUSSAB) destacam que agência tem função de atribuir aos bebês ações que estão ainda em desenvolvimento e que na pesquisa qualitativa, voltada para o discurso materno, é tipo de fala que mais aparece. O termo é trabalhado em algumas pesquisas com a prática educativa por meio de ações nos berçários que proporcionam possibilidades interativas aos bebês e também com materialidades que resultam em um diálogo com a agência dos bebês. MARQUES destaca a importância da agência para mostrar: As questões relacionadas às formas como a sociedadefoi moldando o lugar social dos bebês e como foram constituídas as concepções e definições de bebês no âmbito histórico, social e cultural. Sobre esse processo de construção social das concepções de bebê, ao contrário do que acontece no mundo ocidental, em outras sociedades, os bebês são concebidos de uma forma bastante diferenciada, em uma perspectiva que acentua suas potencialidades como sujeitos de agência e de cultura. (MARQUES, 2019, p.25 ) Ao analisar os artigos encontrados na pesquisa bibliográfica sobre “agência de bebês” uma autora tem sido requerida e usada como referência é Alma Gottlieb que faz um estudo sobre a literatura antropológica demonstrando que nas sociedades por algumas ras ocidentais, há uma negligência e marginalização dos bebês, como se eles estivessem fora do conceito de cultura e isso se dá por algumas razões que estão relacionadas a suposta não agência dos bebês. Isso porque eles dependem de outras pessoas sendo assim, são seres considerados passivos. Segundo a autora, os bebês são vistos como um “não-sujeito, ocupando um espaço negativo, quase impenetrável para o olhar antropológico” (GOTTLIEB, 2009, p. 314). A autora apresenta seis razões para a exclusão dos bebês das discussões antropológicas: as memórias e o status parental do próprio antropólogo, a questão problemática da agência dos bebês e sua suposta dependência de outras pessoas, suas rotinas ligadas às mulheres, sua aparente incapacidade de comunicação, sua propensão inconveniente a vazar através de vários orifícios e seu aparente baixo grau de racionalidade. A autora realiza estudos de campo e afirma que cada sociedade pode ter suas próprias opiniões e ideias sobre os bebês. Em alguns casos eles podem ser determinantes na vida das pessoas ao seu redor. Destaca ainda o exemplo da comunidade dos Beng: Ao longo do trabalho de campo na Costa do Marfim, quanto mais eu investigava a vida dos Beng adultos e de crianças mais velhas envolvidas com o cuidado dos bebês, mais descobria que suas decisões diárias eram definidas em função da rotina dos bebês (Weisner & Gallimore, 1977). Os Beng adultos afirmavam que os bebês são reencarnações de seus ancestrais e, dessa forma, nos primeiros anos de suas vidas, lembram com saudade de suas existências prévias (Gottlieb, 1998, 2000, 2004). O dever maior dos pais Beng é o de discernir (por meio de adivinhos) quais os desejos que os bebês supostamente trouxeram de suas encarnações anteriores, para então atendê-los. Nessa perspectiva, os bebês Beng estão longe de ser criaturas indefesas sem opinião ou impacto sobre o mundo. Para os Beng, assim como para muitas sociedades não ocidentais, a suposta dependência total dos bebês, da forma como é amplamente pressuposta por antropólogos ocidentais, não existe – e, portanto, desafia a nossa ideologia implícita de que bebês são criaturas passivas, o que impediu a possibilidade de privilegiamos os bebês como sujeitos legítimos, e muito menos como produtores ativos de cultura.” (GOTTLIEB 2009, p.321) Uma outra ideia que é trazida em alguns dos textos é questão da subjetivação do bebê, pois ela pode ser uma forma de agenciar as singularizações que não parte de princípios hegemônicos. talvez seja interessante parar de tentar entender por que o bebê não é considerado um indivíduo – apesar de esse ser também um esforço muito importante –, e olhar para o que o bebê já produz fora da lógica da individuação. A autonomia e a subjetivação aparecem justamente nas brechas dessas tentativas sucessivas de normalização e produção de indivíduos. Para Suely Rolnik e Guattari, “a autonomia se refere à novos territórios, novos refrões sociais” (GUATTARI, ROLNIK, 1996:122). É uma autonomia que não é essencialmente de alguém, que passa por vários agenciamentos, que promove uma atmosfera de singularizações nas relações sociais. Por isso, aposto que trabalhar com bebês e procurar entender as construções de subjetividade que estão em jogo nos territórios de cuidado, por exemplo, é uma forma de também resistir à padronização imposta pelos regimes de verdade dominantes, além de perseguir a ideia de que as agências são elas mesmas mediadas e atravessadas por múltiplas categorias”(VALIM , 2017, p. 23 ) Ao realizar a leitura dos textos encontrados sobre a agência dos bebês conforme já mencionado torna-se relevante afirmar que a antropóloga Gottlieb é referência e citada por muitos textos. Resultados A partir de registros de vídeo, foram produzidos mapas que registraram as ações, interações dos bebês com e sobre o ambiente, espaços e pessoas. A observação e discussão acima permitiu perceber que os bebês na perspectiva de William Corsaro não possuem agência. Portanto, nota-se que o conceito de agência de Corsaro não pode ser adotado para pensar os bebês porque através das relações, interações e mapas que vimos nas discussões eles não formam grupos de pares, eles não tem preocupações eles não compartilham interações com os outros e essas ações são essenciais para agência de Corsaro. Pensando em outras perspectivas de agência, se considerarmos que o bebê é ativo na sociedade e não se limita a internalizar-la e a contribui ativamente para a produção e mudança de cultura. Talvez pode-se considerar que o bebê possui agência. Mas, para isso será necessário uma observação atenta para essa consideração. Pois, já existem algumas discussões como por exemplo da Leena Alanen (2001) que o bebê é ator mas não agente, ou seja ele age socialmente e contribui para ampliar os processos de reprodução cultural e social, mas, ele não transforma as relações sociais de nenhuma forma. Algumas outras concepções de agências podem talvez contribuir para pensarmos os bebês como por exemplo a Louise Holt que afirma que os bebês embora não sejam autônomos e independente eles possuem agência que é compreendida como intersubjetiva com os responsáveis, mas, que através da interpretação adequada dos seus desejos eles consegue ter capacidade de afetar mudança. A ideia de agência dos objetos do Bruno Latour também pode ser potente para pensarmos nos estudos futuros bebês. E até mesmo as ideias da antropóloga Alma Gottlieb que traz considerações focando na subjetivação do bebê e que ela pode ser uma agência se consideramos as singularidades que não partem das ideias hegemônicas. Conclusão Agência é conceito muito discutido na sociologia da infância como uma maneira de reconhecer que as crianças sejam consideradas dignas de estudos, partindo da suas próprias individuações e especificidades, deixando assim de ser um recipientes de adultos. Ainda é incipiente os estudos sobre agência de bebês, por isso é necessário um maior aprofundamento e discussão do conceito. Pois, se partimos da afirmação de Tebet (2013) que um bebê não é uma criança. Precisamos considerar as especificidades e particularidades deles que pesquisas sobre crianças não consideram. A cartografia com bebês se mostrou bem potente para algumas análises e discussões como vimos no decorrerdo texto. A maioria dos mapas destacam as relações dos bebês entre eles, com os objetos e espaços. Mas, na perspectiva da agência de Corsaro que era o nosso maior foco, não foi possível identificar que os bebês possuem agência, porém nota-se alguns outros conceitos que talvez possa ser potente para os estudos dos bebês.
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