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A globalização financeira e os países em desenvolvimento: 
em busca de uma visão crítica 
 
Resumo 
Este artigo tem por objetivo organizar alguns pressupostos teóricos que, dispersos na literatura de 
inspiração pós-keynesiana, podem contribuir para uma análise da inserção dos países em 
desenvolvimento na globalização financeira mais adequada do que as abordagens convencionais. Sem a 
pretensão de preencher uma lacuna importante no pensamento crítico (nem muito menos de percorrer 
toda a vasta produção pós-keynesiana a respeito destes temas) entende-se que é possível identificar, 
principalmente em autores heterodoxos franceses e brasileiros, vários argumentos importantes e que 
podem ser integrados de maneira satisfatória. O resultado é uma visão estruturada em três planos: 
“histórico” (que define a globalização financeira, busca suas raízes e estabelece seus limites temporais); 
“estrutural” (que analisa as implicações das finanças liberalizadas num plano global); e finalmente 
“específico” (que examina com mais detalhe as limitações decorrentes da posição ocupada pelas 
economias em desenvolvimento neste quadro). 
Palavras-chave: Globalização financeira; países em desenvolvimento; visão pós-keynesiana 
 
Abstract 
The aim of this paper is to organize some theoretical principles that, scattered in the post-Keynesian 
literature, can sustain a better analysis of the impacts of financial globalization on developing countries than that 
available in conventional approaches. Mainly in French and Brazilian authors, it is possible to identify a lot of 
arguments that can be integrated in an adequate way. This search results in three levels of analysis: the firs one is 
historic (which defines the financial globalization, look for its historical roots and points its temporal thresholds); 
the second is structural (which focuses the implications of the financial liberalization in a global level); and the 
third is specifically worried about the implications of financial globalization to developing countries. 
Key-words: Financial globalization; developing countries; post-Keynesian view 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
 1 
Introdução 
São muito freqüentes, na produção acadêmica denominada “heterodoxa” (de vários matizes, 
mas principalmente pós-keynesiana) posicionamentos contrários ao atual estado de coisas na economia 
internacional, denominado de “globalização”. No que se refere aos aspectos financeiros deste período, 
e particularmente à inserção dos países em desenvolvimento nesta realidade, as críticas talvez sejam 
ainda mais presentes, direcionadas às estratégias de abertura financeira, e defendendo o uso de 
instrumentos de controles de capital. Este posicionamento, mesmo que não explicitamente admitido, se 
contrapõe a uma determinada “visão convencional” favorável à organização contemporânea das 
finanças internacionais e que, de maneira geral, defende a abertura financeira como caminho para as 
economias periféricas se aproveitarem das vantagens da liberdade de movimento dos capitais. 
De forma não inédita neste tipo de embate intelectual, parece faltar a uma visão crítica um 
arcabouço teórico unificado, que possa contrapor-se num plano mais geral de abstração à abordagem 
convencional destes temas. Esta, muito bem resumida nos benefícios tradicionais da abertura financeira 
para os países em desenvolvimento – compartilhamento e diversificação internacional de riscos; 
financiamento de desequilíbrios passageiros de balanço de pagamentos; acesso à poupança externa para 
o financiamento do investimento e do desenvolvimento; e disciplina sobre a política econômica1 – vem 
passando por uma série de questionamentos de natureza empírica (a incapacidade de verificação prática 
destes benefícios2) e sofre dissidências internas importantes (na voz principalmente de economistas 
como J. Stiglitz e D. Rodrik), mas nitidamente continua a pender para o lado da liberalização como 
estratégia de desenvolvimento, ainda que com argumentos levemente modificados (Kose et al., 2006). 
Este artigo parte portanto de duas constatações acerca da visão convencional sobre a 
“globalização financeira” para os países em desenvolvimento – sua “fraqueza” diante das inúmeras 
dificuldades e confrontos com a realidade verificada nos últimos tempos; e sua “força” materializada na 
clareza dos princípios e na capacidade de reinventar a argumentação favorável à abertura – e busca 
organizar alguns pressupostos teóricos que, dispersos na literatura de inspiração pós-keynesiana, 
podem contribuir para uma análise mais adequada do quadro em tela. Sem a pretensão de preencher 
uma lacuna importante no pensamento crítico (nem muito menos de percorrer toda a vasta produção 
pós-keynesiana a respeito destes temas) entende-se que é possível identificar, principalmente em 
autores heterodoxos franceses e brasileiros, vários argumentos importantes e que podem ser integrados 
de maneira satisfatória. O resultado é uma visão estruturada em três planos: “histórico” (que define a 
globalização financeira, busca suas raízes e estabelece seus limites temporais); “estrutural” (que analisa 
as implicações das finanças liberalizadas num plano global); e finalmente “específico” (que examina 
com mais detalhe as limitações decorrentes da posição ocupada pelas economias em desenvolvimento 
neste quadro). Além desta Introdução e de breves considerações finais, o artigo se divide em três 
seções, correspondentes a cada um destes planos. 
I. Perspectiva histórica, características principais e delimitação temporal 
A expressão “globalização” (no caso, “globalização financeira”) é, por si só, causadora de 
considerável polêmica, não sendo poucos os autores que questionam a especificidade histórica do 
período.3 A primeira tarefa do presente esforço é, portanto, a de esclarecer porque aqui a “globalização 
financeira” (doravante, sem aspas) é encarada como uma denominação temporal relevante. Mais do que 
 
1 Ver, por exemplo, Obstfeld & Taylor (2004, seção 1.1). 
2 Para um balanço destas dificuldades, ver por exemplo Eichengreen (2001); e Prasad et al. (2003). 
3 Sendo o exemplo mais notório Hirst & Thompson (1998). 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
 2 
isso, entende-se que, para os países em desenvolvimento, a periodização adequada não é a mesma que a 
empregada no centro. 
A característica mais comumente associada à globalização financeira é o elevado grau de 
mobilidade de capitais, após o predomínio dos controles de capital durante a vigência plena das regras 
de Bretton Woods (que, por sua vez, sucedeu ao padrão-ouro clássico)4. Em uma visão “neutra” ou 
“convencional”, este atributo é apresentado como conseqüência natural de processos em curso a partir 
dos anos 1970: a recuperação da confiança incentivaria a retomada dos fluxos de investimentos entre as 
fronteiras nacionais, na esteira da expansão do comércio internacional e das empresas transnacionais 
americanas e européias, e da própria concorrência entre as grandes instituições financeiras. Por outro 
lado, a queda de custos e riscos associada às inovações financeiras surgidas neste ambiente, também 
decorreu do progresso tecnológico, principalmente no setor de tecnologia da informação.5 Não são 
fatores irrelevantes, mas estão ausentes elementos fundamentais, apontados por autores como Strange 
(1986) e Helleiner (1994), de um lado, e Eichengreen (1996), de outro, para a compreensão das origens 
da alta mobilidade. 
Os primeiros enfatizam a atuação decisiva dos estados nacionais mais importantes (nos Estados 
Unidos, Japão e Europa) para a “re-emergência das finanças globais”. Na formulação de Helleiner 
(1994), por meio de ações (as medidas de liberalização propriamente ditas e a prevenção de crises 
financeiras, atuando como emprestadorde última instância) e de “não-ações” (a recusa em impor 
controles de capital como estava previsto nas regras de Bretton Woods), a postura estatal não pode ser 
desprezada. Plihon (1998), em linha paralela, detalha a responsabilidade das políticas econômicas no 
centro, a partir da “guinada liberal” nos anos 1980. 
A contribuição de Eichengreen (1996) enfatiza outra face da dimensão política. A passagem do 
câmbio fixo com baixa mobilidade do capital (Bretton Woods) para o câmbio flutuante com alta 
mobilidade não decorreria de uma suposta incompatibilidade entre fluxos livres de capital e a tentativa 
de manter o preço da moeda estrangeira sob controle. A possibilidade ou não de sacrificar os objetivos 
domésticos da política econômica precisa ser levada em conta.6 Na globalização, outra solução para o 
“trilema” teria sido adotada: sacrifício da estabilidade do câmbio em nome dos fluxos de capital 
liberalizados e da autonomia da política econômica doméstica, notadamente a taxa de juros. 
Indo além destas considerações, pode-se argumentar que os elementos de resistência da 
sociedade à submissão da política econômica ao ajuste externo também se enfraqueceram. Não há 
grande retrocesso em termos de democracia, mas certamente o poder dos sindicatos retrai-se e o pleno 
emprego deixa de figurar, na teoria e na prática, como objetivo primordial da política econômica nos 
países centrais, principalmente a partir do final da década de 1970. O que sugere outra face desta 
época: também se trata de um arranjo que resulta menos favorável (ou menos voltado) ao alto 
crescimento, emprego, distribuição de renda. E isto, como se detalhará mais adiante, se revela muito 
mais nítido no caso dos países em desenvolvimento, nos quais a aplicação do raciocínio da “trindade 
impossível” se revela bastante questionável. 
Mas não são apenas a alta mobilidade internacional do capital e o câmbio flutuante que marcam 
a época da globalização; outras configurações devem ser levadas em conta. A começar do padrão 
monetário internacional – e a data mais relevante aqui talvez não seja 1973, mas sim 1971. A partir de 
então, as funções da moeda no plano internacional passam a ser dominadas, pela primeira vez na 
história, por uma divisa não conversível em ouro, cujo “lastro” passa a decorrer de fatores de outra 
 
4 O que leva, na denominação de Eichengreen (1996), ao formato U-shapped para a mobilidade internacional de capitais. Obstfeld & 
Taylor (2004) apresentam farta evidência empírica que sustenta essa oscilação histórica. 
5 Exemplos dessa argumentação podem ser encontrados em IMF (1998, Annex V) e World Bank (2000). 
6 “Sacrificar o crescimento e o nível de emprego através da elevação nas taxas de juro com o objetivo de restabelecer o equilíbrio externo 
teria colocado (em Bretton Woods) em risco a acomodação entre o capital e o trabalho.” (p. 151) 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
 3 
natureza, com implicações importantes. Segundo Serrano (2002), o exercício da política econômica por 
parte do emissor desta moeda reserva livra-se de quaisquer limitações externas e passa a ser pautada 
apenas por objetivos domésticos. Como não se coloca mais a desconfiança em relação ao “real valor” 
desta divisa, esta economia pode passar a incorrer em déficits sistemáticos em conta corrente (ou seja, 
devedor crescente) sem maiores contestações. E a própria flutuação da taxa de câmbio central não 
representa grandes problemas, já que boa parte das suas importações é denominada em sua própria 
moeda. É uma situação nova, em que os privilégios da economia central ampliam-se 
consideravelmente. 
Na realidade, o novo tipo de hegemonia monetária passa a estar vinculada ao que se denomina 
“poder financeiro” do dólar, materializado pelo tamanho, profundidade, sofisticação e diversidade de 
maturidades do mercado financeiro dos Estados Unidos, com destaque absoluto para os títulos 
públicos. E este poderio só teria de fato sido restaurado com a movida unilateral nas taxas de juros 
realizada por Paul Volcker em 1979 e a brutal expansão da dívida pública – daí o sentido de “retomada 
da hegemonia americana” apontado pioneiramente por Tavares (1985). 
Na formulação sintética de Prates (2002), o padrão monetário vigente seria, portanto, o do dólar 
“três Fs”: flexível (já que sua taxa de câmbio não é mais fixa), financeiro (dado que o fundamento de 
sua posição de moeda reserva é o sistema financeiro americano) e fiduciário (baseado apenas na 
confiança).7 
Outras transformações qualitativas características do período se dão no plano financeiro, e uma 
lista mínima deve necessariamente incluir: i) o processo de securitização; ii) o desenvolvimento e a 
disseminação de instrumentos derivativos; iii) a emergência de investidores institucionais (ou a 
“institucionalização das poupanças”); e iv) a tendência à universalização dos bancos.8 Tudo isso, 
acrescido da mudança de fundo: a liberalização/desregulamentação das relações financeiras, nos plano 
doméstico e externo. Em sua descrição panorâmica da configuração do capitalismo atual, Chesnais 
(2005, p. 46) utiliza a expressão “três Ds” para resumir estas mudanças: desregulamentação ou 
liberalização monetária e financeira; descompartimentalização dos mercados financeiros nacionais; e 
desintermediação (abertura das operações de empréstimos, antes reservadas aos bancos, a todo tipo de 
investidor institucional). 
Todos esses processos ocorrem a partir do final dos anos 1970 nos países centrais, razão pela 
qual esse é o momento do início da globalização para a maioria dos autores.9 O que não parece ser 
válido para os países em desenvolvimento. Se o critério fosse o acesso aos mercados financeiros 
internacionais, certamente a segunda metade dos anos 1960 teria que ser incluída – mas se trata dos 
empréstimos bancários tradicionais. Já na década de 1980, apesar de todas as mudanças financeiras e 
monetárias já estarem consolidadas no centro, a realidade é de escassez de financiamento externo e de 
longa digestão da “crise da dívida”, principalmente na América Latina. Ou seja, não há globalização 
financeira para as economias periféricas antes dos anos 1990: é a partir dessa data que elas voltam a 
despertar o interesse dos fluxos de capital privados, com todas as suas características distintivas do 
novo período, e possibilitados pelos processos nacionais de abertura financeira. 
 
7 Ver também Tavares & Melin (1997). Uma análise mais detalhada sobre o sistema monetário internacional “dólar flexível” e o “poder 
financeiro” dos Estados Unidos também estão desenvolvidos em Metri (2003). Este conjunto de autores brasileiros, a nosso juízo, fornece 
uma explicação articulada e suficiente para tais conseqüências e encadeamentos. As interpretações presentes nas coletâneas organizadas 
por Chesnais (1998 e 2005) compartilham alguns dos argumentos (talvez os principais, mas certamente não todos) aqui resumidos. Ver, 
especificamente sobre as questões monetárias, Brunhoff (1998 e 2005). 
8 Para uma descrição aprofundada destas transformações, as principais referências no Brasil se encontram em Cintra & Freitas (orgs., 
1998). Uma exposição didática dos processos se encontra no cap. 18 de Carvalho et al. (2000). 
9 Por exemplo, Na periodização de Chesnais (1998a) esta é uma segunda fase, marcada ela “passagem para as finanças de mercado e para 
a interligação dos sistemas nacionais pela liberalização financeira“ e que dura até 1985. Ela é precedida pelo período 1960-1979 (marcado 
pela internacionalização financeira “indireta” de sistemas nacionais fechados) e é sucedida pela terceira fase, pós-1986, em que os traço 
principais seriam a acentuação da interligação, a extensão da arbitragem e a incorporação dos mercados emergentes. 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I EncontroInternacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
 4 
Definido este marco temporal e esclarecidas as origens históricas e traços distintivos do 
período, pode-se passar à análise dos seus desdobramentos, em dois planos. 
II. Instabilidade e especulação no ambiente de finanças liberalizadas e integradas 
Dentro do pensamento crítico no plano internacional, um ponto de partida incontornável para a 
análise da globalozação financeira são as contribuições dos autores herdeiros da “escola da regulação” 
francesa. Os artigos reunidos em duas coletâneas publicadas no Brasil – Chesnais (org., 1998) e 
Chesnais (org., 2005) – apresentam idéias centrais. 
No artigo inicial de uma delas, Chesnais (2005) apresenta a configuração atual do capitalismo 
como aquela em que o “capital portador de juros” ocupa o centro das relações econômicas e sociais. 
Esse capital – que “busca ‘fazer dinheiro’ sem sair da esfera financeira, sob a forma de juros de 
empréstimos, de dividendos e outros pagamentos recebidos a título de posse de ações e, enfim, dos 
lucros nascidos da especulação bem sucedida” (p. 35) – tem nos mercados financeiros integrados, 
interna e externamente, o seu terreno de atuação. Desse quadro, a conseqüência que mais interessa aqui 
é “ascensão das finanças especulativas”, definida, entre outros trabalhos, em Plihon (1995): 
“Hoje em dia, uma parte importante das transações financeiras recebe o impulso direto das antecipações quanto à 
evolução futura das cotações. Por outro lado, afirmar que os mercados tornaram-se fundamentalmente especulativos 
significa também ressaltar dois outros aspectos (...) Em primeiro lugar, os atores que raciocinam em prazo muito 
curto nos mercados são predominantes (...) Em segundo lugar, os operadores tendem a se abstrair da realidade dos 
fundamentos (fundamentals) em benefício da busca de uma opinião sobre a tendência do mercado.” (p. 63-64) 
Como diz o mesmo autor em texto posterior (Plihon, 1998, p. 123), “a especulação não é um 
fenômeno novo na histórica do capitalismo, mas as inovações financeiras recentes deram-lhe uma 
importância sem precedentes”. E esta não se restringe à ampliação do tamanho e das possibilidades de 
atuação, decorre também do fato de sua lógica permear o comportamento de todos os agentes 
relevantes da economia, em processos distintos e complementares. 
No caso das famílias, o ponto de partida é a institucionalização das poupanças, aplicadas por 
meio de fundos de investimento nos oscilantes mercados de títulos e ações. Como as decisões de 
consumo têm ganhado autonomia em relação à renda e respondem crescentemente à riqueza distribuída 
em diferentes aplicações, a dinâmica macroeconômica passa a ser fortemente influenciada pela 
dinâmica financeira (na construção notória de Aglietta, 2004). Mas a importância dos investidores 
institucionais vai muito além; são eles os atores-chave das finanças liberalizadas e integradas (Farnetti, 
1998; Sauviat, 2005). Concentradores de uma massa enorme de recursos, esses fundos se pautam pelo 
duplo imperativo da rentabilidade e da liquidez, em um ambiente de feroz concorrência pautada pela 
performance de curto prazo. Agregue-se a esse quadro a figura dos gestores destes fundos, dotados de 
grande autonomia em relação aos “poupadores” e seus objetivos de prazo mais longo, e totalmente 
pautados pelos ganhos imediatos – inclusive porque em geral sua remuneração está associada ao seu 
desempenho. 
No caso das empresas características dos novos tempos, a lógica especulativa teria sido 
incorporada pela natureza do novo sócio-proprietário típico: estes mesmos investidores institucionais e 
seus critérios de rentabilidade e liquidez de prazo curto, além de outras transformações na organização 
interna (consagradas na “governança corporativa”). Ao mesmo tempo, os grandes grupos industriais, 
longe de se restringirem à produção, são eles próprios agentes relevantes do processo, pólos do capital 
financeiro sujeitos a uma gestão de caixa centralizada – com carteiras compostas por títulos, moedas, 
instrumentos derivativos – na qual os ganhos da acumulação financeira equiparam-se em importância 
aos operacionais (Serfati, 1998). Braga (1997) denomina “financeirização” esse padrão de gestão da 
riqueza, e Plihon (1999) identifica a passagem, no dia-a-dia das grandes empresas, do “regime de 
endividamento” para o de “fundos próprios”. 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
 5 
Por fim, os bancos, terceiro grupo de agentes, ao contrário de vítimas de todos esses processos, 
são os grandes condutores da securitização, tanto no que se refere à intermediação (de um modo 
distinto do tradicional crédito bancário) entre os emissores e os demandantes dos diferentes papéis, 
quanto no processo de “transferência” de sua própria carteira de empréstimos por meio da emissão de 
títulos a ela vinculados (securitização secundária). Para a efetivação destas novas funções não menos 
importantes, também parece decisiva a tendência de universalização das funções dos grandes 
conglomerados bancários. 
Já que os agentes mais relevantes, que são os formadores das convenções, atuam guiados pela 
lógica especulativa, é natural que os seus movimentos sejam mimetizados pelos demais atores de 
menor porte, polarizando as opiniões e conduzindo os movimentos de preços dos ativos. Na formulação 
keynesiana original, o comportamento dos investidores em mercados secundários líquidos, em que o 
motivo especulação predomina sobre o motivo empresarial, é o de manada: sujeito a surtos de 
otimismo exagerado e infundado, seguidos por correções abruptas e violentas. Adicionando a estas 
mudanças a crescente integração possibilitada pelos processos nacionais de abertura financeira, tem-se 
a passagem para a dimensão global aqui buscada: os fluxos internacionais de capital também se tornam 
primordialmente guiados pela busca de oportunidades de ganhos de curto prazo. A tentativa de 
antecipar, agora para além das fronteiras, a opinião média do mercado, seria o padrão estrutural de seu 
comportamento. 
Detalhando este processo para cada um dos principais agentes e para os diferentes tipos de 
fluxos, tem-se por um lado os investidores institucionais: diversificam sua carteira de aplicações, senão 
em termos verdadeiramente globais, certamente em mais de uma jurisdição ou moeda, e constituem o 
grosso dos fluxos de investimentos de carteira. Por sua vez, o crédito bancário internacional se torna 
cada vez mais de curto prazo, vinculado a operações de hedge ou de apostas descasadas em mercados 
de instrumentos derivativos, principalmente associados às taxas de câmbio. Ao mesmo tempo, os 
grandes “supermercados financeiros globais”, enquanto protagonistas do processo de securitização das 
relações financeiras internacionais, contribuem decisivamente para os fluxos de investimentos de 
carteira. Por fim, mesmo em relação ao IDE, cresce na época da globalização o seu componente 
patrimonial, em decorrência das profundas transformações nos parâmetros de gestão acima 
comentadas. Concretamente, isso se traduz em uma magnitude cada vez maior das operações de fusões 
e aquisições, em detrimento do greenfield (geralmente mais associado a cálculos de rentabilidade a 
longo prazo). 
Instabilidade, volatilidade e especulação seriam assim, pelo menos em potencial, as novidades 
negativas (enquanto natureza intrínseca, e não ocasional) atribuídas aos fluxos de capital no período 
histórico da globalização. Porém, como destaca Prates (2002) a instabilidade não decorre apenas das 
transformações no plano financeiro, mas também das características do padrão monetário internacional. 
Os contornos do dólar “flexível, financeiro e fiduciário” ampliam, e muito, o espaço para incerteza, 
especulação e, em decorrência, volatilidade. 
Em primeiro lugar, taxas de câmbio flutuantes, principalmente entre as moedas centrais, 
adicionam graus de incerteza ausentes dos cálculosdos aplicadores antes de 1973, e abrem vasto 
campo para as operações de proteção e/ou especulação possibilitadas pelas inovações financeiras, 
particularmente os derivativos. E em segundo, relativo aos dois outros Fs, a libertação das limitações 
típicas de um regime monetário atrelado ao ouro, também significa mais instabilidade: de um lado, 
possíveis conflitos entre seus objetivos domésticos e as necessidades monetárias do resto do mundo não 
são relevantes nas decisões de política do país central; de outro o seu passivo externo significativo, 
aliado à prerrogativa da taxa básica de juros da economia global (risco zero), faz com que mudanças 
em sua política monetária provoquem fortes recomposições de carteiras e, assim, violentas oscilações 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
 6 
nos fluxos internacionais de capital. É, em outras palavras, o lado perverso (para os outros países) do 
poder financeiro do dólar norte-americano. 
Assim resumidos, esse conjunto de argumentos resulta em conclusões bastante pessimistas 
sobre as conseqüências da globalização financeira, em um plano mais geral. Como o foco aqui são os 
desdobramentos deste quadro sobre os países em desenvolvimento, duas outras dimensões devem ser 
levadas em conta. 
III. O mundo desigual das finanças globalizadas (no espaço e no tempo) 
Se possui a natureza e as características adversas acima discutidas no plano global, a livre 
movimentação internacional do capital, no que se refere aos países periféricos, se revela ainda mais 
insatisfatória. As especificidades negativas destas economias precisam ganhar relevância no raciocínio, 
tanto no plano financeiro quanto no monetário e em suas conseqüências. Por outro lado, não menos 
importante, a dimensão temporal da liquidez internacional também ajuda a compor o quadro 
explicativo. São essas duas as tarefas enfrentadas nessa seção. 
III.i. Assimetrias, hierarquia e inconversibilidade 
Em parte inspirada pelas idéias de Ocampo (2000 e 2001), Prates (2002) aponta, na tradição 
cepalina dos esquemas centro-periferia, o caráter assimétrico do sistema monetário e financeiro 
internacional, desfavoráveis aos países em desenvolvimento e que, em conjunto, tornariam tais 
economias mais vulneráveis a crises financeiras e cambiais. As três grandes assimetrias identificadas – 
financeira, monetária e macroeconômica – constituem um bom ponto de partida, a partir do qual podem 
ser aprimorados os aspectos julgados mais relevantes. 
A assimetria financeira refere-se ao status dos países em desenvolvimento nas grandes 
aplicações financeiras internacionais, inferior em dois sentidos complementares: o das dimensões 
relativas e o dos determinantes dos fluxos. 
De um lado, o fato de ser destinada a estas praças uma parcela muito pequena das grandes 
carteiras dos aplicadores internacionais. Estas economias não figuram entre os destinos preferenciais 
para a diversificação dos portfólios globais; são, no máximo, oportunidades para ganhos 
extraordinários sujeitos a riscos maiores do que nos mercados centrais – o que exige um 
comprometimento menor do estoque total da riqueza em busca de valorização. Entre outras 
implicações, a participação marginal significa que, em momentos de aversão ao risco e necessidade de 
recomposição de perdas em quaisquer outros mercados, esta parcela reduzida tende a sofrer fortes 
movimentos de realização de lucros.10 Esta posição inferior conserva, ainda, uma assimetria em si 
mesma: se reduzidos diante dos totais aplicados mundo afora, os recursos destinados a cada um dos 
países periféricos tendem a ser muito significativos diante das necessidades, da própria dimensão das 
economias receptoras e de seus mercados financeiros domésticos. Como resultado, grandes efeitos 
dinamizadores e perigosos excessos no período de abundância, e fortes estragos nos momentos de 
saída. 
O outro lado da assimetria financeira se refere aos determinantes gerais dos fluxos de capital. 
Como será discutido na sub-seção seguinte, muito mais do que às condições específicas de cada 
economia, as grandes ondas de liquidez destinadas a estas nações se subordinam a fatores externos – 
notadamente as condições monetárias nas economias centrais, o próprio momento do ciclo econômico 
 
10 Na definição de Coutinho & Belluzzo (1996, p. 141), trata-se de países cujos ativos são “naturalmente os (...) de maior risco e, portanto, 
aqueles que se candidatam em primeiro lugar a movimentos de liquidação, no caso de mudanças no ciclo financeiro”. 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
 7 
global, e o estado de aversão ao risco dos aplicadores internacionais – pouco influenciados pelas 
condições inerentes a estes destinos periféricos. 
Sobre a segunda assimetria, monetária, relativa à hierarquia de moedas, vale a pena se debruçar 
com mais cuidado e incorporar outras contribuições. Não configura grande novidade teórica trabalhar 
com a idéia de que as moedas não são todas iguais no plano internacional; pelo contrário, há um vasto 
espectro de autores, de diferentes filiações, a reconhecer este fato óbvio. 
Por exemplo, Belluzzo & Almeida (2002), especialmente nas páginas 56 a 62, retomam as 
discussões de Keynes no Treatise on Money e nos trabalhos preparatórios para a conferência de Bretton 
Woods para mostrar que a defesa, então feita por ele, de uma moeda exclusivamente internacional (o 
bancor), gerenciado por um “banco central dos bancos centrais” (a International Clearing Union) – 
como mecanismos para a promoção da liquidez necessária ao bom funcionamento da economia 
internacional e também para evitar o “ajuste assimétrico” dos balanços de pagamentos – estava fundada 
em uma clara concepção sobre as diferenças entre as moedas nacionais, a partir do que chamou de 
“poderio financeiro”: 
“Ao realçar a importância do ‘poderio financeiro’ para determinar a maior ou menor liberdade de execução das 
políticas monetárias, Keynes estava apontando para a hierarquia entre as moedas nacionais. Pretendia sublinhar a 
capacidade inferior das economias devedoras e ‘dependentes’ de atrair recursos ‘livres’ para a aquisição de ativos e 
bens denominados na moeda nacional. Dessa diferença de poder financeiro nascem importantes assimetrias nos 
processos de ajustamento de balanço de pagamentos entre países credores e devedores.” (p. 58, ênfases no 
original)11; 12 
Como fica claro, tais diferenças diziam respeito, naquele contexto, às moedas dos países 
centrais (mais explicitamente, tratava-se da disputa entre Estados Unidos e Inglaterra) e tomavam como 
critério principal para determinar a posição na hierarquia a situação credora ou devedora de cada 
economia. Tomado aqui como ponto de partida, o raciocínio requer, portanto, acréscimos para dar 
conta da situação dos países em desenvolvimento – não só por esta condição não ser levada em conta 
no raciocínio keynesiano, mas também porque não é o fato de eventualmente tornar-se credora 
internacional que fará com que uma moeda periférica se torne central, ou dotada de grande “poderio 
financeiro”. 
Por sua vez, McKinnon (2002) – autor acima de qualquer suspeita de keynesianismo ou 
heterodoxia – também evocava a assimetria monetária como uma das causas para as crises financeiras 
recentes em mercados emergentes. Os determinantes desta hierarquia ajudam a clarear o tipo de 
acréscimo que se julga necessário para um tratamento adequado da questão. Nas suas palavras, tratava-
se da diferença entre moedas “provisórias” e “definitivas”, com o dólar no centro do sistema: 
“Europe and the euro aside, the world is on a dollar standard. International trade and capital flows in Asia, Africa, 
the Americas, and Australasia are mainly invoiced in dollars, governments hold their official foreign exchange 
reserves in dollars, and privateforeign exchange markets are organized using the dollar as the vehicle currency. 
(...) The resulting currency asymmetry, a strong dollar as ‘definitive’ money at the center and a fragile periphery, 
unbalances the world’s monetary system.”(p. 1-2) 
Para a mensuração desta assimetria monetária há alguns caminhos complementares. Ganhou 
destaque nos últimos anos, no interior do mainstream economics, a idéia do “pecado original”: a 
 
11 Esta idéia é o ponto de partida para Prates & Cintra (2007) avançarem na análise de Keynes sobre a hierarquia de moedas e suas 
possíveis lições para o caso brasileiro. 
12 Decorre desta concepção dos ajustamentos outra notória prescrição do mesmo autor, relativa à assimetria financeira já tratada e à 
temática mais ampla da mobilidade internacional do capital. Nas palavras de Belluzzo & Almeida (2002, p. 60): “...Keynes quis ressaltar 
o caráter negativo dos ajustamentos de balanço de pagamentos, num sistema internacional em que problemas de liquidez ou de solvência 
dos países deficitários e de menor ‘poderio financeiro’ têm de ser resolvido mediante a busca da ‘confiança’ dos mercados de capitais. (...) 
(no arranjo institucional proposto por ele) não haveria lugar para livre movimentação de capital monetário de curto prazo entre as diversas 
praças financeiras.” 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
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explicação da fragilidade financeira dos países em desenvolvimento pela incapacidade de emitir dívida 
externa em sua própria moeda (Einchengreen, Haussmann & Panizza, 2005a e b). Trata-se de um 
grande avanço (principalmente por conta da atribuição das causas desta deficiência a falhas no mercado 
financeiro internacional, e não apenas a debilidades domésticas), mas que não dá conta de todas as 
dimensões. A denominação de dívidas se refere a uma das três funções monetárias clássicas – unidade 
de conta, meio de pagamento e reserva de valor – exercidas fora das fronteiras do país onde é emitida. 
Krugmann (1995) já desdobrava estes três papéis em seis, separando a dimensão privada da oficial. 
Enquanto meio de pagamento no plano internacional, uma moeda pode ser “veículo” (i.e., 
liquidar transações em geral) do ponto de vista privado, mas é a sua participação nas intervenções dos 
bancos centrais nos mercados de câmbio o que avalia esta função em termos oficiais. O mesmo pode 
ser dito em relação à unidade de conta: uma coisa é a denominação de preços, o faturamento 
(invoicing) das trocas de bens e serviços, e outra (que não envolve necessariamente a mesma moeda) é 
o monitoramento da taxa de câmbio nos regimes de atrelamento (peg) por parte das autoridades 
monetárias. Por último, e certamente mais importante, a função de reserva de valor se refere tanto à 
moeda em que estão consolidados os ativos financeiros privados e as operações de financiamento 
internacional (banking, na expressão do autor) quanto àquela em que estão denominadas as reservas 
internacionais oficiais dos diferentes países. 
Esta mensuração em várias dimensões simultâneas fornece um quadro em que, a despeito de 
contestações mais sérias em alguns aspectos, sobressai o papel do dólar como moeda internacional por 
excelência.13 Talvez o autor com contribuição mais extensa a respeito do tema, Cohen (1998. cap. 5) 
constrói uma “pirâmide monetária” bastante elucidativa, baseada em uma distinção adicional a respeito 
do uso da moeda no plano internacional. Na sua formulação, todas as seis funções vistas no parágrafo 
anterior se referem a um processo mais comum, denominado international currency use ou 
simplesmente currency internationalization. Pode ocorrer, em paralelo, o que é chamado de foreign-
domestic use ou currency substitution: o uso de uma moeda estrangeira no interior do espaço nacional 
de outra economia, ou o desafio da soberania no exercício local das três funções da moeda, nesta 
ordem: reserva de valor, unidade de conta, e finalmente meio de pagamento – quando o padrão 
monetário entra definitivamente em colapso.14 
Seguindo esses critérios, no ponto mais alto da pirâmide se encontraria a top currency, no caso 
contemporâneo obviamente o dólar norte-americano. Abaixo dela, na medida em que o topo vai 
ficando mais longe, os outros degraus: moedas “patrícias” (atualmente o euro, talvez o iene); “de elite” 
(libra, franco suíço, dólar australiano, entre outras) ; “plebéias” (exportadores de petróleo mais ricos, 
emergentes de renda média, países desenvolvidos menores); “permeadas” (caso dos latino-americanos 
em geral); “quase moedas” (os exemplos citados são Azerbaijão, Bolívia, Cambodja, Laos e Peru) e 
finalmente “pseudo moedas” (como a do Panamá). O critério é a perda progressiva de funções no plano 
internacional no que se refere à currency internationalization até um determinado estágio (moedas 
plebéias), a partir do qual passam a ser ameaçadas inclusive no plano nacional pela currency 
substitution. No caso das permeadas, a ameaça é principalmente ao papel de reserva de valor, enquanto 
 
13 O momento em que este trabalho é produzido (segundo semestre de 2007/primeiro de 2008) apresenta sinais de enfraquecimento da 
moeda norte-americana, não só em termos da sua taxa de câmbio, mas também questionamentos quanto ao seu papel de reserva. A nosso 
juízo (iluminado inclusive pela experiência histórica, particularmente nos anos 1970), as evidências ainda não são suficientes para se 
decretar uma transição de hegemonia monetária. Mas certamente é um tema a ser acompanhado em seus desdobramentos e nos impactos 
sobre o raciocínio aqui exposto. 
14 Principalmente nos países da América Latina, este segundo fenômeno se materializou em processos de dolarização em diferentes 
intensidades e momentos da história recente. A rigor, o autor faz uma distinção adicional, entre dois tipos de currency substitution: a 
assimétrica (tal como descrita aqui) e uma outra, simétrica, referente a um inevitável processo de intercâmbio monetário entre economias 
com fortes laços comerciais e financeiros. Neste último caso, não há invasão da soberania monetária e, como o próprio nome sugere, 
trata-se de um processo bilateral, que avança junto com a mobilidade internacional do capital. 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
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que no extremo inferior da pirâmide a moeda estrangeira é preferida inclusive na denominação legal de 
contratos. 
Assim, retomando o argumento, se não é exclusividade de um posicionamento crítico sobre a 
globalização considerar que a organização monetária internacional é (ou sempre foi) hierarquizada, 
talvez o seja trazer para o primeiro plano da análise esta assimetria monetária. É a partir dela – junto 
com a dinâmica instável e especulativa e as demais assimetrias – que se deve encarar a inserção externa 
dos países em desenvolvimento, e os seus desafios. 
Um bom exemplo de abordagem nesta direção é a feita por Herr (2006). Segundo este autor, a 
compreensão adequada da globalização passa pela consideração, entre outros aspectos, das diferenças 
de qualidade entre as moedas nacionais, dos efeitos destas diferenças sobre os seus emissores, e da 
competição no topo da hierarquia monetária em cada período. Para tal autor, existiria um currency 
premium – uma espécie de “prêmio de liquidez” keynesiano específico a cada moeda nacional, 
determinado pela reputação (brand name) e que guiaria a ordenação delas aos olhos dos investidores 
globais. E, para aqueles que se situassem nas piores posições, algumas conseqüências negativas seriam 
impostas, principalmente a impossibilidade de emitir dívida externa na sua própria moeda com seu 
desdobramento principal – o currency mismatch entre ativos e passivos15 – e a necessidade da 
manutenção de uma elevada taxa de juros para compensar a desconfiançados aplicadores externos. 
Trabalhando com conceitos parecidos e implicações na mesma direção, a abordagem 
consolidada em Carneiro (2007) usa expressão “incoversibilidade” para descrever as moedas emitidas 
por países como o Brasil. Parte-se da mesma constatação de que essas moedas, no plano internacional, 
não possuem aceitação, ou não desempenham de maneira significativa nenhuma das suas três funções 
clássicas. Seriam então, neste sentido – de facto16 – inconversíveis. 
As razões para esta situação inferior são então buscadas na incapacidade de constituírem – elas 
próprias ou os ativos nelas denominados – boas reservas de valor. E aqui um outro ponto importante: 
por mais que a estabilidade monetária interna tenha sido assegurada, nem neste plano doméstico o 
papel de reserva de valor pode ser exercido de maneira inconteste, justamente por conta da fraqueza 
externa. A determinação, sempre, é de fora para dentro, da posição inferior na hierarquia para as 
debilidades domésticas: 
“...a estabilização do valor interno da moeda não se transmite à estabilidade do valor externo da moeda, expresso na 
sua taxa de câmbio com as divisas centrais. Para uma parcela expressiva das moedas periféricas é exatamente a 
instabilidade do valor externo da moeda a razão essencial para a instabilidade do seu valor interno.” (p.13) 
Em termos mais precisos, o autor define a hierarquia a partir de uma moeda global ou de 
reserva, que não possui risco de preço ante si mesmo; as outras, além dos riscos de crédito específicos, 
por natureza mais elevados do que o do emissor da moeda central, adicionariam um risco de preço – 
relativo à incerteza quanto às condições de (re)conversão na moeda reserva, ou a flutuação esperada da 
taxa de câmbio. O que diferenciaria as moedas inconversíveis daquelas conversíveis (que não a 
reserva) seria justamente a magnitude desse risco de preço. Esta diferença também se traduz na 
inexistência, nestas moedas inferiores, de um “ponto de reversão” nos momentos de desvalorização 
 
15 O fenômeno está, como também enfatizado por Prates (2002) e pela literatura convencional (principalmente, Goldstein & Turner, 
2004), na origem do caráter “gêmeo” (cambial e financeiro) das crises que atingiram os “mercados emergentes” nos anos 1990 e da 
impossibilidade dos bancos centrais atuarem como emprestadores de última instância. 
16 A distinção desta dimensão da inconversibilidade em relação àquela centrada nos seus aspectos formais – que informa as discussões e 
propostas pela “livre conversibilidade” do real, presente nos trabalhos de Arida (2003a e b) entre outros – é feita principalmente em 
Belluzzo & Carneiro (2004). À p. 221, se lê: “Ao não suprimir a hierarquia de moedas no espaço globalizado, a conversibilidade não 
elimina a razão central para o mais elevado prêmio de risco pago pelas moedas não conversíveis. Ou seja, ele é um prêmio que se paga 
para manter a riqueza em moedas mais frágeis. Como moedas não são bananas, em particular a moeda reserva, a sua demanda aumenta 
como decorrência direta da sua valorização.” 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
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cambial – aquele patamar abaixo do qual os ativos se tornam atraentes para os aplicadores globais, que 
retomam então o fluxo de entrada (Carneiro, 2002). 
Do ponto de vista dos impactos externos sobre os países periféricos, são acrescidas novas 
considerações à assimetria financeira já vista, e também é ressaltada a assimetria macroeconômica (a 
terceira da lista) que a inconversibilidade implica. Em relação a esta última, sua definição em Prates 
(2002) – “diferentes graus de autonomia de política dos países pertencentes ao sistema” – também está 
baseada em um largo espectro de autores que apontam, como uma das conseqüências da globalização, a 
redução dos raios de manobra dos policy makers. 
Em Ocampo (2000), a questão é posta nos seguintes termos: enquanto as economias centrais 
seriam essencialmente policy making, as periféricas seriam policy taking – no sentido de não possuírem 
capacidade de implementar ações anti-cíclicas, diante das dificuldades oriundas do seu setor externo. Já 
em Carneiro (2007), assim como em outros trabalhos do autor, esta assimetria é apresentada a partir de 
uma regra fixa na determinação das taxas de juros domésticas: a taxa de juros básica do sistema (aquela 
em vigor na moeda reserva), acrescida justamente do prêmio de risco que, oriundo das desconfianças 
em relação à capacidade de pagamento do devedor (risco de crédito) e das condições de conversão na 
moeda reserva (risco de preço, expectativa de flutuação cambial), caracteriza as demais moedas e, em 
especial, distingue as conversíveis das não conversíveis. Logo, particularmente para estas economias 
localizadas nos estágios mais baixos da hierarquia, um patamar mínimo, estabelecido externamente 
(tanto pela política monetária central como pelas expectativas dos investidores), se impõe sobre o preço 
interno do dinheiro.17 O que também quer dizer, conforme sugerido em Carneiro (2003), que a idéia do 
“trilema”, ou da libertação da política monetária com a adoção do câmbio flutuante, mantida a alta 
mobilidade internacional do capital, não se aplica perfeitamente nestes casos. 
No que se refere à assimetria financeira vista pelo ângulo dos emissores de moeda 
inconversível, o fato de os seus ativos não constituírem boas reservas de valor os deslocaria para o 
segmento high yield dos mercados internacionais de título – isto é, muito rentáveis mas muito 
arriscados; ou, na ordem inversa, obrigados a pagar um rendimento maior para convencer o investidor a 
assumir os seus (distintos) riscos mais elevados. É exatamente este o segmento no qual uma parcela 
marginal dos portfólios globais é alocada e que sofre as primeiras baixas em momentos de aversão ao 
risco. Já entrando no tema da seção seguinte, Carneiro (2007) conclui, fechando um círculo vicioso: 
“...exatamente por estarem denominados em moeda de menor qualidade o valor e o rendimento desses títulos são 
mais sensíveis ao ciclo de liquidez internacional, sujeitando-se com mais freqüência aos sudden stops, típicos 
desses ciclos ou ao seu padrão feast and famine. A conseqüência é uma maior volatilidade do valor externo dessas 
moedas, ou seja, da sua taxa de câmbio com a moeda reserva.” (p. 18) 
É assim, partindo da configuração assimétrica do sistema monetário-financeiro internacional 
característica da época contemporânea, que se julga mais adequado encarar a inserção dos países 
periféricos na globalização. Seja por possuírem moedas fracas e que não constituem reserva de valor no 
plano internacional – com baixo “poderio financeiro”, “provisórias”, “plebéias”, com baixo currency 
premium ou “inconversíveis” –, seja por verem seu raio de ação na política econômica doméstica muito 
limitado, seja ainda por figurarem (por motivos de dimensão e importância relativas e pelos 
determinantes gerais dos fluxos de capital) entre as vítimas preferenciais nos momentos de “fuga para a 
qualidade”; tais economias se deparam muito mais com riscos do que com oportunidades ao se abrirem 
aos fluxos de capital característicos deste período histórico. Principalmente porque, como vai 
 
17 Em Carneiro (2002. p. 233) se lê: “A possibilidade de escapar dessa regra existe apenas para os países de moeda conversível, ou seja, 
para onde há um fluxo permanente de capitais produtivos e financeiros. Nesse caso, a fixação das taxas de juros internas abaixo do valor 
de mercado implica a saída de capitais e a conseqüente desvalorização da taxa de câmbio. Essa por sua vez, tem um piso a partir do qual 
passa a ser interessante a volta dos capitais, para adquirir ativos produtivos ou financeiros a baixo preço, em razão da moeda 
desvalorizada. No caso das moedas não conversíveis essa alternativa não existe, porque nãohá piso para a desvalorização da taxa de 
câmbio.” 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
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trabalhado a seguir, o mundo das finanças desreguladas é desigual não apenas no espaço, mas também 
no tempo. 
III.ii. Ciclos de liquidez e seus determinantes 
Como síntese das considerações feitas anteriormente, chega-se à questão da oscilação na 
disponibilidade de financiamento externo para países em desenvolvimento. Especificamente, tal 
oscilação assume a forma de ciclos – entendidos como uma etapa ascendente seguida por uma 
descendente (mesmo que não se exija a mesma duração dessas duas fases). Não cabe, em um trabalho 
como este, quantificar este movimento, perceptível a qualquer observador atento da realidade 
financeira contemporânea.18 Do ponto de vista teórico, interessa investigar as causas dessa alternância 
de períodos. O ponto de partida é a idéia de que, para os gestores das massas de riqueza direcionadas à 
acumulação financeira, o duplo imperativo rendimento-liquidez está, constantemente, permeado pelas 
considerações a respeito do risco. Tal constatação óbvia, quando transportada para o plano 
internacional, ajuda a compreender a gênese do movimento cíclico. 
Já foi apontado, na seção I, que durante a “diplomacia do dólar forte” foi necessária a imposição 
de um elevado diferencial positivo de rendimento para que “a passagem por Nova York se tornasse 
obrigatória” para todos os aplicadores à escala global (Tavares, 1985). Posteriormente, já a partir de 
1985, reafirmada a hegemonia monetária, bastam o risco zero e a sofisticação do sistema financeiro 
capitaneado pela dívida pública; o rendimento não precisa mais – e nem deve – ser tão elevado. Isto 
quer dizer que, dali em diante, não há mais dúvidas sobre qual é o “porto seguro” do sistema, e que 
portanto estar fora dos títulos públicos americanos significa incorrer em riscos progressivamente mais 
elevados – primeiro nos outros papéis em dólar, posteriormente nas outras moedas conversíveis e, 
finalmente, nas inconversíveis. 
Chega-se, assim, ao cerne da explicação da fase ascendente dos ciclos de liquidez em tela. A 
busca por rendimento – o money chasing yield, na famosa expressão minskyana – em ativos 
denominados em moedas fracas é um movimento que significa, sempre, uma redução na aversão ao 
risco dos aplicadores globais ou, na linguagem keynesiana, uma queda na preferência pela liquidez por 
parte dos mesmos agentes. Os traços principais do ciclo minskyano são bastante conhecidos: vive-se 
uma fase de otimismo, em que as expectativas sobre os rendimentos futuros sustentam o crescimento 
das operações em direção a “regiões” mais arriscadas e, assim, eleva-se a fragilidade financeira. No 
raciocínio original do autor (Minsky, 1982), esta fragilidade se transformava em crise a partir de um 
choque de expectativas, que derrubasse o fundamento das relações financeiras anteriormente 
estabelecidas – as rendas esperadas do investimento – e detonasse uma violenta elevação da preferência 
pela liquidez. 
Com o ciclo de liquidez internacional a reversão assume feições semelhantes: algum fenômeno 
que seja capaz de alterar o estado geral de expectativas – aqui não quanto aos investimentos futuros, 
mas sim em relação à combinação risco/rendimento dos ativos em países emergentes vis-a-vis aqueles 
dos mercados centrais – provoca o movimento de volta para o porto seguro ou a “fuga para a 
qualidade”. Que, fechando o raciocínio, significa sempre o mesmo fenômeno de aumento da 
preferência pela liquidez ou ampliação da aversão ao risco. 
Tanto em uma direção quanto na outra, as alterações nas convenções podem representar um 
movimento de prazo mais longo – que dá origem às fases “de cheia” e “de seca” do ciclo – ou uma 
mera mudança passageira que não é capaz de inverter o movimento mais duradouro (no que pode ser 
 
18 Respeitado o marco temporal definido na seção I, não é difícil identificar dois grandes ciclos de liquidez para economias em 
desenvolvimento na época da globalização financeira: um que começa no início dos anos 1990, se reverte em 1997-98 e tem sua fase 
descendente até 2002; e outro que inicia sua ascensão em 2003 e aparentava ter atingido seu auge em 2007. 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
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definido como “mini-ciclos”).19 Pelo fato de os fluxos internacionais de capital serem, como já 
discutido, permeados pela lógica especulativa, tanto as duas grandes fases parecem ser mais curtas no 
período atual em relação a épocas anteriores, como a ocorrência dos mini-ciclos se torna mais 
freqüente. 
Uma dimensão adicional, mas não menos importante, diz respeito aos processos econômicos 
que, para além dos fatores psicológicos, pautam essa oscilação de expectativas, preferência pela 
liquidez, e graus de aversão ao risco. Uma questão teórica presente em qualquer discussão sobre ciclos 
é a atinente à endogeneidade ou exogeneidade dos mecanismos que explicam a fase ascendente e, 
principalmente, a reversão. Na problemática em tela, ela toma a forma da oposição entre fatores 
externos e internos às economias receptoras dos fluxos – ou, na denominação comum na literatura 
internacional, entre pull e push factors. 
A concepção de fundo aqui é a de que, por mais que haja uma interação com os fatores 
domésticos, são as condições vigentes nas economias com moedas conversíveis que pautam o ciclo. 
Particularmente, como a própria expressão já deixa claro, a busca por rendimento em papéis mais 
arriscados é um desdobramento da queda da remuneração nos ativos lá negociados. Assim, para além 
de outras variáveis externas – como a taxa de crescimento da economia global – que também 
influenciam o estado geral de aversão ao risco dos aplicadores globais, é principalmente a política 
monetária no centro, a começar do emissor da moeda reserva, quem define a maior ou menor 
disponibilidade de financiamento para economias como a brasileira. 
A obviedade da constatação anterior não deve obscurecer o seu significado mais importante: por 
mais que os “fundamentos” domésticos possam reforçar uma ou outra direção, as condições gerais de 
acesso ao mercado financeiro internacional e aos seus supostos benefícios são definidas, 
essencialmente, por políticas e processos alheios ao controle (ou, até, à capacidade de influência) local. 
Esta é a lição final, que nem sempre se faz presente nas previsões e recomendações correntes sobre o 
tema. Nos termos aqui utilizados, o fato de o mundo das finanças globalizadas ser desigual no tempo 
decorre de ser, antes disso, desigual no espaço. Ou, de outro modo, a condição de vítima, muito mais 
do que protagonista, dos ciclos de liquidez, é decorrência do conjunto de assimetrias discutidas acima. 
Na síntese de Ocampo (2001), 
“...whereas the center economies – particularly the largest economies among them – are ‘business cycle makers’, 
the developing countries (…) are ‘business cycle takers’. This reflects the fact that, broadly speaking, the center 
generates the global shocks (in terms of economic activity, financial flows, commodity prices and the instability of 
the exchange rate of major currencies), to which developing countries respond.” (p. 7, grifos no original) 
Considerações finais 
Como apontado na Introdução, o esforço aqui realizado partiu de duas impressões 
complementares sobre o debate acerca da inserção periférica na globalização financeira: a “força” (em 
termos de clareza, organização, poder ideológico) dos argumentos convencionais sobre o tema, em 
contraste com a ausência de um arcabouço crítico bem definido; e ao mesmo tempo a “fraqueza” do 
raciocínio tradicional, frente aos muitos questionamentos enfrentados, principalmente após o período 
recente de crises. Diante disso, julga-se haver espaço para tentativas de sistematização de uma visãocrítica ainda bastante dispersa. A contribuição, certamente limitada, que este artigo procura dar é a 
organização de uma interpretação alternativa, organizada em três planos. 
No primeiro deles, histórico, a concepção é a de que o período atual é marcado por uma 
combinação peculiar dos aspectos monetário e financeiro da economia internacional e que este arranjo 
não é um simples desdobramento da evolução natural das forças de mercado ou produto 
 
19 Boom and burst, feast and famine, ou sudden stops são expressões em inglês presentes na literatura para caracterizar as fases do ciclo. 
Autor: André M. Biancareli
Trabalho apresentado no I Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (2008)
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exclusivamente das mudanças tecnológicas. Por processos políticos e diplomáticos de natureza 
complexa, define-se uma época em que claramente há ganhadores e perdedores. Entre estes últimos, 
situam-se na maior parte do tempo as economias menos desenvolvidas. 
Em primeiro lugar porque – e aqui o segundo plano de análise – as mudanças qualitativas nos 
sistemas financeiros e a emergência de um novo conjunto de atores-chave com seus critérios, 
procedimentos e valores de atuação, foi capaz de disseminar a lógica especulativa para um amplo 
conjunto de relações econômicas e financeiras, com impacto inevitável nos fluxos internacionais de 
capital. Adicionalmente, também contribuem para a dinâmica instável e especulativa as características 
do padrão monetário internacional em vigor. 
E em segundo porque – descendo para o terceiro plano – estas economias são as grandes 
prejudicadas pelas diferentes assimetrias do sistema: a financeira, a macroeconômica e, provavelmente 
a mãe de todas as outras, a monetária. É isto que significa, aqui, trazer para o primeiro plano da análise 
as especificidades da condição periférica. São países emissores de moedas inconversíveis, incapazes de 
desempenhar no plano internacional as funções clássicas da moeda (principalmente a de reserva de 
valor), tornando suas economias suscetíveis a uma série de características negativas deste mundo 
desigual. Destacou-se aqui uma destas conseqüências: a oscilação cíclica da disponibilidade de 
financiamento externo para tais economias e o fato de que tais ciclos são comandados, em essência, por 
fenômenos e políticas que estão muito além do controle destas suas maiores “vítimas”. 
No momento em que o mundo vive, aparentemente, mais um episódio de inflexão cíclica, que 
provavelmente terá implicações para a situação financeira externa dos países em desenvolvimento, 
talvez estas idéias sejam úteis. Se não para antecipar os próximos desdobramentos da conjuntura – 
tarefa notoriamente ingrata dada a própria natureza do capitalismo – pelo menos para relembrar uma 
antiga lição: a de que o passado recente não deveria ser tomado como bom parâmetro para a antecipação 
do futuro. 
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Autor: André M. Biancareli
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Autor: André M. Biancareli
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