Buscar

34-alessandra-pascotto

Prévia do material em texto

PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE: A CONSTRUÇÃO DOS SABERES 
DOCENTES 
 
Alessandra Daniele Pascotto 
Mestranda em Educação 
UNESP – Univ. Estadual Paulista (Campus de Rio Claro) 
lepascotto@ig.com.br 
 
RESUMO 
Este texto tem a intenção de apontar se há fragilidades na formação inicial docente de 
professores alfabetizadores, bem como se as formações continuadas oferecidas pela Secretaria 
Municipal da Educação como o PROFA – Programa de Formação de Professores 
Alfabetizadores (Letra e Vida) e a Proposta Pedagógica do Programa Ler e Escrever, tem 
contribuído significativamente na construção dos saberes e na prática docente de professores 
alfabetizadores de uma escola da rede municipal de ensino de uma cidade do interior do 
Estado de São Paulo, na voz dos professores. As manifestações docentes apontam que seus 
saberes foram construídos na prática, na relação com as professoras mais experientes como 
conselheiras ou modelos, lendo, pesquisando a partir do que os alunos demandavam e 
buscando formação continuada. Os dados obtidos neste estudo são confirmados em pesquisa 
realizada por Micotti (1998) onde se verifica que os professores relatam que aprenderam a 
ensinar ensinando, ou seja, na prática. Tais relatos também confirmam o que nos contribuiu as 
pesquisas de Tardif (2002) quando nos aponta a origem social dos saberes dos professores. 
Bem como, em Micotti (2003) quando afirma: “o desenvolvimento dos saberes da experiência 
mediante as vivencias individuais e coletivas que possibilitam o “saber fazer”... Evidenciam o 
aprendizado na própria prática, mediante a interação com a prática de outras professoras.”. 
Outro dado relevante na fala das professoras é o fato de não sentirem-se preparadas para a 
docência pela Formação Inicial, uma discussão e reflexão em relação à dicotomia Teoria e 
Prática, que também é manifestada e apontada nos textos de Micotti (2003), Tardif e Lessard 
(1998), Schön (1983) e Gatti (2009). 
PALAVRAS-CHAVE: alfabetização; saberes, formação e prática. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
mailto:cassiakriss@hotmail.com
 
 
Introdução 
 
Sabe-se que hoje, em especial no Brasil, ser professor, indiscutivelmente, não é fácil. 
Sabe-se também que se trata de uma “profissão” necessária para a formação de indivíduos 
para todas as outras profissões. Mas, o que é ser professor hoje? Será que ser professor 
atualmente é mais complexo do que foi no passado? 
Com base na contribuição de pesquisadores como Nóvoa, Tardif e outros, podemos 
afirmar que a profissão docente sempre foi de grande complexidade. É evidente que 
precisamos levar em consideração alguns aspectos desta profissão na atualidade como o fato 
de que, hoje, os docentes têm que lidar não só com uma variedade de saberes, como já ocorria 
no passado, mas também com os avanços da tecnologia e sua “invasão necessária” no 
contexto escolar, bem como com toda a complexidade social de hoje e que não existia no 
passado. Isto porque estamos falando da democratização do acesso ao ensino fundamental, de 
uma escola para todos, de diversidades culturais, econômicas, étnicas, raciais, ou seja, de 
muito maior complexidade, a qual não ocorria no passado quando tínhamos uma escola para 
“privilegiados”. 
Outra questão que atualmente angustia professores é sua exposição na mídia. Vemos 
diariamente profissionais das mais variadas áreas, que não a educação, falando na TV, chats, 
revistas etc, como se tivessem conhecimento e propriedade para isto, de práticas de ensino, de 
fracasso, desempenho escolar, se arriscando a sugerir métodos, como se apenas pelo fato de 
terem vivenciado a experiência escolar como alunos por alguns anos, pudessem ignorar 
completamente as pesquisas, a ciência e os saberes da experiência, da prática dos docentes. 
Como se, exagerando um pouco, qualquer um pudesse ser professor a qualquer momento. 
Não é comum o contrário ocorrer, não vemos professores ou estes profissionais de outras 
áreas falando – criticando com propriedade um novo procedimento cirúrgico ou de uma nova 
técnica de plantio de árvores, por exemplo. Então, que faz com que os saberes de profissionais 
como médicos, engenheiros,... não sejam colocados em dúvida enquanto os saberes dos 
professores, além de subestimados são criticados e muitas vezes não respeitados e valorizados 
pela sociedade? 
Em época de eleições, como estamos vivenciando, o que se vê são políticos em 
promessa de campanha, na mídia, apontando a reprovação de alunos e a compra de apostilas 
como solução para os problemas da educação no país. As pesquisas no passado já 
comprovaram por meio de muitos autores que a reprovação é nefasta para os alunos e não 
 
 
garante a aprendizagem, mesmo assim em vez de se investir em uma política pública de uma 
sólida formação de professores, de valorização do magistério, de carreira, de condições de 
trabalho e estudo-reflexão aos docentes, se investe em discursos diante de uma sociedade 
complexa e que tem dificuldade em saber qual o papel da escola hoje. Assim esta não clareza 
de fins e objetivos pode ser parte geradora da angústia e mal estar nos professores. 
Entendemos discurso neste contexto, tendo como cenário a noção de discurso 
concebida por Foucault (2002): como uma ferramenta capaz de operar como sendo verdade, 
definindo papéis, forjando indivíduos e produzindo modos de ser por mecanismos globais, são 
sujeitos reais, com necessidades reais: “O discurso não é simplesmente aquilo que traduz as 
lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nos 
queremos apoderar” (FOUCAULT, 2000, p.10). Nesta perspectiva, o sucesso e fracasso da e 
na profissão professor é aquele circunscrito pela subjetividade e interesses do enunciador. 
Foucault (2003, p. 376) nos ensina que um modo de falar, de enunciar, de nomear o 
outro é também um modo de constituir o outro, de produzir verdades sobre esse outro, de 
cercar esse outro a partir de alguns limites que, mesmo considerando todas as nossas nobres 
intenções psico-didático-pedagógicas, acabam por fazer-nos esquecer de que ocorre, aí 
também, controle do discurso. 
Apesar destes discursos, a falta de políticas públicas em especial voltadas para escolas 
que atendem alunos em situações de vulnerabilidade social, quando pesquisadores olham mais 
precisamente para as práticas docentes na escola, apontam que mesmo diante de apostilas 
prontas que atendem aos interesses do estado, o professor tem saberes da experiência, 
criticidade, criatividade, e muitas vezes, autonomia que não o fazem ser apenas marionetes 
em prol da reprodução. 
Diante deste cenário, descrito até aqui, seriam os aspectos ligados ao recente 
movimento da profissionalização docente que poderiam solucionar as questões relacionadas 
ao desprestígio, desvalorização e desrespeito à profissão professor? Assim, a pergunta “O que 
é profissionalização docente?” nos cerca e nos inquieta provocando variadas reflexões, que 
tentaremos discutir na sequência desse texto. 
Ao refletir um pouco a questão da profissionalização docente com base na formação 
inicial e continuada, e na identidade dos professores considerando os conceitos de habitus e 
campo, podemos afirmar que não se trata de um tema inédito, já que, vem sendo estudado, em 
decorrência da influência da literatura internacional a partir de autores como Tardif, Nóvoa, 
Shulman, Bourdieu, entre outros e de pesquisas brasileiras, que consideraram o professor 
como um profissional que tem saberes - conhecimentos adquiridos e desenvolvidos a partir da 
 
 
prática, da reflexão da prática e na prática, bem como no confronto com as condições desta 
profissão. 
Ao longo da história ser professor tem variado de acordo com os interesses de 
sociedade. Foi durante muito tempo associada ao sacerdócio, dom, sacrifício, missão, o que o 
distancia de Profissão. Sabe-se que ser professor não se trata de sacerdócio e nem dom, e simde uma profissão, e que por isso envolve saberes, competências e habilidades, que precisam 
ser aprendidas. Na década de 1960 inicia-se um movimento de desqualificação dos 
conhecimentos possuídos por professores leigos, não diplomados, considerados por Foucault 
(1980, p. 82), como “inadequados para cumprir sua tarefa ou insuficientemente elaborados: 
conhecimentos ingênuos, colocados em uma posição inferior na hierarquia, ou seja, inferiores 
ao nível exigido de cognição ou cientificidade”, esclarecendo que tal reforma não mudou 
apenas as estruturas e as práticas docentes, mas também a identidade social do professor. 
A história tem mostrado que os interesses de cada época influenciam o sistema de 
ensino brasileiro. Em meados de 1964, por exemplo, com a Ditadura Militar, o foco da 
educação no país era o ensino profissionalizante, com o objetivo de formar mão de obra 
especializada para atender aos interesses do mercado emergente e da sociedade. Neste 
contexto o professor era considerado um técnico que não necessitava ter formação 
profissional já que sua principal função era transmitir os conteúdos a serem aprendidos por 
seus alunos, o que foi denominado como modelo formativo da racionalidade técnica e 
definido como “[...] a competência profissional que consiste na aplicação de teorias e 
técnicas derivadas da pesquisa sistemática, preferencialmente científica, à solução de 
problemas instrumentais da prática” (SCHÖN, 2000, p. 37). 
Surge também, nesta época, a divisão entre aqueles que são os produtores de saberes e 
que estabelecem as leis da educação, e os professores que trabalham nas escolas que são os 
responsáveis pela reprodução - transmissão desses saberes no contexto escolar. Isto tem 
influência na prática docente até nos dias de hoje. Há décadas estudos focalizam sobre este 
distanciamento entre as pesquisas sobre educação produzidas nas Universidades e os saberes 
profissionais necessários à realização da pratica docente nas escolas (TARDIF; LESSARD, 
1998; SCHON, 1983; GATTI 2009). Diante disto, não conseguimos deixar de questionar e 
refletir: porque o professor não pode ser um sujeito ativo em relação às leis, programas de 
ensino, currículo, material didático, entre outros, ou seja, porque não se considera sua 
subjetividade, seus saberes, sua experiência, se ele é parte principal e, diríamos, mais 
interessada do processo ensino aprendizagem? Pois temos visto que eles têm recebido, na 
 
 
escola, tudo pronto, elaborado apenas por pequenos grupos de especialistas ou não, que fazem 
parte do governo. 
Neste contexto, as pesquisas apontam para a necessidade de colocar o professor como 
responsável e sujeito ativo no processo educativo, como professor reflexivo, pesquisador da e 
na sua prática docente, enfim profissional. Assim, pesquisadores iniciam os debates e 
reflexões acerca da profissionalização docente: 
 
É a partir de então que a literatura pedagógica foi invadida por obras e 
estudos sobre a vida dos professores, as carreiras e os percursos 
profissionais, as biografias e autobiografias docentes ou o desenvolvimento 
pessoal dos professores (NÓVOA, 1992, p.15). 
 
As pesquisas que discutem a profissionalização docente, em especial com as 
contribuições de Nóvoa e Gauthier (1992), nos apontam que o ofício de ensinar ocorre dentre 
as situações de: ofício sem saberes, quando o professor é aquele que reproduz, transmite os 
conhecimentos e saberes produzidos por outros, sem considerar seus conhecimentos 
adquiridos em sua prática educativa. Neste sentido para ser professor, basta dominar e 
transmitir os conteúdos. Saberes sem ofício, saberes produzidos no distanciamento entre a 
ciência e a escola, ou seja, que desconsideram as reais situações e condições do exercício da 
docência, bem como necessidades dos alunos. Neste caso os saberes teóricos são adquiridos 
nas universidades e priorizados em detrimento dos saberes da prática, que fica prejudicada. 
Para Foucault (1972, p.71), discursando poder e saber: “É por isso que a teoria não 
expressará, não traduzirá, não aplicará uma prática: ela é uma prática”. 
Assim, em concordância com Gauthier et al. (1998), acreditamos que a docência deve 
ser um ofício pleno de saberes, ou seja, uma profissão que demanda uma formação sólida, 
fundamentada no domínio de vários saberes indispensáveis para seu exercício, são eles: saber 
disciplinar, saber curricular, saber das ciências da educação, saber da tradição 
pedagógica, saber experiencial e saber da ação pedagógica. 
Em relação aos muitos saberes docentes e sua articulação com profissão docente, 
segundo Tardif (2002), do ponto de vista da ação docente, um professor é considerado 
profissional, quando se concebe como detentor de saberes profissionais; quando é capaz de 
analisar e reconstruir sua prática de modo crítico e compartilhado. Não podemos 
desconsiderar a complexidade do significado de profissão, pois, apesar de ser uma palavra 
muito utilizada, sua definição depende de uma construção social, passível das transformações 
sociais, econômicas e políticas que ocorrem no campo do trabalho. 
 
 
Nóvoa (1987, p.30) contribui apontando que a definição de uma profissão tem a ver 
com o reconhecimento e prestígio concedidos pela sociedade. Em se tratando da profissão 
docente, o processo histórico do movimento da profissionalização docente tem sido 
responsável pela determinação do status ocupado pelo professor na sociedade. 
Para Tardif (2002, p. 247) “o que distingue as profissões das outras ocupações é, em 
grande parte, a natureza dos conhecimentos que estão em jogo”, com base em Bourdoncle e 
em Tardif e Gauthier (apud Tardif 2002) as principais características dos conhecimentos do 
exercício da docência, que lhes garantem o status de profissional são: a prática docente deve 
apoiar-se em conhecimentos especializados e formalizados, ou seja, obtido cientificamente; 
ser adquirido através de uma formação de alto nível, universitária ou equivalente, certificação 
(diploma) que garante acesso a um título profissional; ser voltado para resolver situações 
problemáticas concretas (por exemplo: facilitar a aprendizagem de um aluno com 
dificuldades); ser exclusivo do grupo que o utiliza (esotérico); possibilitar a avaliação dos 
pares, pelos portadores desse conhecimento, (autocontrole da prática); autonomia e 
discernimento para agir na improvisação e adaptação diante de situações novas que exigem 
reflexão; ser evolutivo e progressivo, demandando assim formação contínua e continuada; 
responsabilidade pelo mau uso de seus conhecimentos e danos aos seus clientes. 
Já Nóvoa (1995, 1999), apresenta as seguintes características em relação à profissão 
docente: atividade do professor deve ser desenvolvida em tempo integral, isso exige 
dedicação e compromisso; para exercício da docência, é fundamental uma formação 
adequada e específica, obtida em cursos de nível superior, a regulamentação e a legitimação 
da profissão pelo governo, habilitando-o para o exercício da docência; e a existência de 
associações e sindicatos, caracterizando-os assim uma classe profissional com direitos e 
deveres. 
Nesses termos, Nóvoa (1999, p. 71) afirma que “[...] é na formação dos professores 
que se produz a profissão docente”. 
Perrenoud (2000, p. 15), aponta dez competências relacionadas a saberes, necessárias 
ao bom professor, para ele a profissão docente deve ser embasada no domínio destas 
competências, que define como “uma capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos 
para enfrentar um tipo de situação”. São elas: saber organizar e dirigir as situações de 
aprendizagens; saber administrar a progressão da aprendizagem; saber conceber e fazer 
evoluir os dispositivos de diferenciação; saber envolver os alunos em sua aprendizagem; saber 
trabalhar em equipe; participar da administração da escola; informar e envolver os pais; saberutilizar novas tecnologias; saber enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão e saber 
administrar sua própria formação continuada. 
 Embora reconheçamos que o domínio dessas competências seja importante para a 
atuação docente, por si só não dão conta de solucionar os problemas cotidianos da prática 
docente, para ser competente é preciso ter conhecimentos - saberes e acima de tudo saber 
quando e como utilizá-los. Mas, de quais conhecimentos – saber se está falando? Segundo 
Tardif (2002), o saber deve “englobar os conhecimentos, as competências, as habilidades 
(aptidões) e as atitudes, isto é, aquilo que muitas vezes foi chamado de saber, saber-
fazer e saber-ser”. Sendo assim, trata-se de saberes profissionais, que devem ser colegiados, 
construídos, aprendidos, vivenciados e refletidos, pelo professor em condições reais, 
cotidianas de trabalho, o que nos remete à escola como um espaço privilegiado para atuar e 
aprender. 
 Nóvoa (1992, p. 73) neste sentido, afirma que: “a escola deve ser um lugar de 
reflexão sobre as práticas, o que permite vislumbrar uma perspectiva dos professores como 
profissionais produtores de saber e de saber fazer”. Assim a escola torna-se o espaço de 
exercício do professor de sua formação e de sua profissionalização. 
Assume-se, então, a inquestionável relação entre formação e profissionalização 
docente e não se pode deixar de considerar a autonomia e a responsabilidade que elas 
pressupõem de seus atores, senão tudo isso seria utopia. 
As pesquisas em torno deste tema nos mostram que para que sejam reconhecidos e 
valorizados profissionalmente, os professores devem se assumir como uma classe 
profissional, portadora de saberes próprios e indispensáveis para o exercício da docência, 
adquiridos em um processo formativo e legitimada pelo estado e pela sociedade. 
Diante destas angustias e reflexões, bem como de questões em relação às fragilidades 
e contribuições da formação inicial e continuada, apontados por Gatti e outros (2009), 
relacionados à construção dos saberes profissionais necessários à prática docente, ou seja, que 
são utilizados efetivamente no trabalho docente diário para o desempenho de suas tarefas, 
apontados por Tardif (2002), este trabalho tem a intenção de apontar se há fragilidades na 
formação inicial docente de professores alfabetizadores, bem como se as formações 
continuadas oferecidas pela S.M.E., como o PROFA – Programa de Formação de 
Professores Alfabetizadores (Letra e Vida) e a Proposta Pedagógica do Programa Ler e 
Escrever, contribuíram significativamente na construção dos saberes e na prática docente de 
professores alfabetizadores de uma escola da rede municipal de ensino de uma cidade do 
interior do Estado de São Paulo, na voz dos professores. 
 
 
Metodologia 
 
Para a realização deste trabalho, apoiamo-nos e fundamentamo-nos em um 
levantamento bibliográfico, com base na pesquisa de diversos autores que abordam o tema, e 
que denotam a relevância do mesmo em relação à profissionalização docente, tendo como 
eixo de problematização a construção de saberes e a apropriação de uma proposta pedagógica 
de três professoras alfabetizadoras e a Professora Coordenadora de uma escola da rede 
municipal de ensino de uma cidade do interior do Estado de São Paulo, os pré-requisitos para 
participarem da pesquisa são que tenham cursado o Letra e Vida e que se utilizem em sua 
pratica do material proposto no Programa Ler e Escrever. Os dados serão coletados por meio 
de entrevistas semiestruturadas, anotadas e filmadas. Serão apresentadas no Quadro 1 as 
características profissionais das professoras selecionadas. 
 
Quadro 1 – Características profissionais das participantes. 
Prof. Idade Tempo 
de 
magistério 
Tempo como 
professor 
alfabetizador 
Tempo 
nesta 
escola 
Graduação Formatura 
Graduação 
 
A 39 18 anos 18 anos 14 anos Pedagogia 2004 
B 33 12 anos 12 anos 12 anos Pedagogia 1999 
C 41 11 anos 11 anos 11 anos Pedagogia 1994 
D 47 16 anos - 12 anos Pedagogia 2004 
 
Todas as professoras envolvidas nesta pesquisa têm formação em pós-graduação em 
nível de Especialização, cursado entre os anos de 2003 e 2005 e sempre atuaram em turmas de 
alfabetização. 
A professora D é Coordenadora Pedagógica da escola há dois anos. A professora C só 
começou a lecionar 7 anos após ter concluído a graduação em Pedagogia. As professoras A e 
D cursaram Pedagogia pelo programa de formação em serviço em parceria com o MEC, 
denominado PEC da PUC SP. 
 
Resultados e discussão 
 
Manifestações docentes referentes à contribuição da formação inicial e continuada 
para o aprendizado do ensino do alfabetizador. 
 
 
Ao serem questionadas sobre a aprendizagem do ensino, em especial da alfabetização, 
as professoras apontam que o que aprenderam na formação inicial não foi suficiente para 
garantir uma boa prática em sala de aula, afirmam que aprenderam a serem alfabetizadoras na 
prática, com as professoras mais experientes como conselheiras ou modelos, lendo, 
pesquisando a partir do que os alunos demandavam e buscando formação continuada. 
Os dados obtidos são confirmados em pesquisa realizada por Micotti (1998) onde se 
verifica que os professores relatam que aprenderam a ensinar ensinando, ou seja, na prática. 
Como podemos observar nos relatos das professoras. 
 “Quando saí do magistério eu achei que já sabia ensinar, mas quando você pega na 
pratica a coisa é diferente, né? Então você começa a procurar porque são varias realidades 
no mesmo lugar, você puxa um pouquinho do que aprendeu mas, vê que não dá base para 
quase nada. Então a gente se espelha em uma professora de referência, pesquisa em textos, 
busca informações”. (A) 
“Aprendi a teoria com base no que eu já pensava sobre alfabetização – educação e a 
prática a partir do que o aluno tá precisando buscando formação continuada. Também 
aprendi com modelo, ninguém nasce sabendo ser professor, a gente pega aquele professor 
que dá uma boa aula, que os alunos aprendem e tenta fazer como ele, vai aprendendo com 
ele”. (B) 
“O magistério e a faculdade que eu fiz não me deu a base para a prática de uma sala 
de aula, depois que me formei demorei 10 anos para ingressar e tive que buscar porque tinha 
uma turma de 4º serie de alfabetização, tive apoio de uma professora mais velha, eu fazia 
tudo que ela falava”. (C) 
“No magistério fiz estágio, era cobrado, tinha que ser feito, aprendi vendo os outros 
fazerem, me ajudou, mas quando cheguei lá eu vi que não sabia e precisei de uma professora 
mais experiente para me ajudar a lidar com a rotina da sala de aula, do dia-a-dia”. (D) 
Tais relatos também confirmam o que nos contribuiu as pesquisas de Tardif (2002) 
quando nos aponta a origem social dos saberes dos professores. Bem como, em Micotti 
(2003) quando afirma: “o desenvolvimento dos saberes da experiência mediante as vivencias 
individuais e coletivas que possibilitam o “saber fazer”... Evidenciam o aprendizado na 
própria prática, mediante a interação com a prática de outras professoras.” O que, nesta 
pesquisa, as professoras foram unânimes em relatar a importância de uma professora mais 
experiente, como modelo ou referência de seu aprendizado, do saber-fazer. 
Outro dado que nos chama a atenção na fala das professoras é o fato de não sentirem-
se preparadas para a docência pela Formação Inicial. Esta discussão e reflexão em relação à 
 
 
dicotomia Teoria e Prática, também é manifestada e apontada nos textos de Micotti (2003), 
Tardif e Lessard (1998), Schon (1983) e Gatti (2009). 
Agora, quando questionadas sobre os cursos de formação continuada, oferecidos pela 
SME, apontam o “Letra e Vida” como o mais significativo, como podemos exemplificar na 
fala da professora D: “O Letra e Vida e o Aprofundamento foram os cursos de mais impacto 
na alfabetização dos alunos nesta escola”. 
Em relação aos conhecimentos que julgam necessáriopara a prática docente, elas 
foram unânimes em apontar o que podemos ver na fala de A: “Os professores precisam 
saber: o conteúdo que irão ensinar, a didática (o como ensinar), compreender sobre as 
teorias de desenvolvimento infantil e as dificuldades de aprendizagem para propor 
intervenções adequadas que favorecem o desenvolvimento”. 
Destacam a necessidade de saberes e competências, bem como de um processo 
reflexivo da e na ação docente, segundo o movimento da profissionalização docente. Como já 
apontamos neste texto, com as contribuições de Nóvoa e Gauthier (1992), em especial de 
Gauthier et al. (1998) e Perrenoud (2000). 
As professoras fundamentam, como Sócio interacionista, a concepção de suas práticas 
como professoras alfabetizadoras, segundo B: “o aluno junto com outro aluno, discutem um 
com o outro para chegar a uma conclusão, aprendem na interação, na relação”. 
 Segundo Vigotsky (1998, p.75), o processo de aprendizagem desencadeia vários 
processos internos de desenvolvimento cognitivo (mental), que se materializam somente 
quando o sujeito interage com objetos e sujeitos em cooperação. Uma vez internalizados, 
esses processos tornam-se parte das aquisições do desenvolvimento, portanto possui uma 
dimensão coletiva, originam-se, das relações reais entre indivíduos humanos. 
Quando perguntadas sobre a apropriação dos conhecimentos da Formação Letra e 
Vida e sua aplicabilidade na prática, as professoras falam: 
 “Eu sempre quis fazer a intervenção adequada, sempre quis ser uma alfabetizadora 
competente e o Letra e Vida dá uma ferramenta porque ele ensina atuar na intervenção em 
cada nível, o que fazer, o que perguntar, como agir, como planejar, como agrupar, que 
atividade é adequada. Ele ajuda na alfabetização das crianças”. (A) 
“O Letra atende a necessidade do alfabetizador, aprimorou o que já sabíamos. A 
formadora do Letra pedia toda semana um trabalho pessoal que envolvia uma situação de 
trabalho com as crianças, então você não perdia o norte do que estava fazendo, você 
estudava e ia para sala de aula aplicar e isso deu retorno muito significativo, pois tínhamos 
 
 
alunos que entram com muita dificuldade e as crianças deram um salto, nos deu um bom 
retorno. Nos íamos lá colocávamos em pratica e dava resultado”. (B) 
“Nos ensinou, aprimorou as teorias, o planejar, organizar as atividades”. (C) 
“Antes do Letra e Vida o professor fazia avaliação diagnostica e não partia do 
resultado dela e hoje ele tem um novo olhar sobre a avaliação como diagnostico e ponto de 
partida para fazer uma intervenção pontual no aluno”. (D) 
Parece-nos que o enfoque dado por elas é em relação à intervenção, apesar de 
relatarem que aprenderam “teorias”, demonstram uma grande preocupação com o como fazer, 
como intervir para que o aluno avance. Manifestam também, preocupação com a necessidade 
de colocarem-se como sujeito ativo no processo educativo, como professor reflexivo, 
pesquisador da e na sua prática docente, enfim profissional, como aponta Nóvoa (1992, p.15). 
Em relação à apropriação e usos do material proposto pela S.M.E., no Programa Ler e 
Escrever, elas reafirmam novamente as pesquisas de Micotti (1998), como podemos observar 
nas manifestações a seguir: 
A “O material do Ler é só uma referencia que ajuda a organizar o tempo didático e as 
modalidades desenvolvidas, ele é bem amplo, ajuda de forma geral em Língua Portuguesa, 
alfabetização e Letramento, mas, a gente utiliza o guia não de forma engessada, ao pé da 
letra, ele tem eu se adequar a realidade e não a nossa realidade se adequar a ele. Conforme 
o diagnostico de cada criança a gente utiliza. Se a criança ou classe está mais avançada a 
gente usa ou adapta outro projeto de outro ano”. 
B “Antes fazíamos o nosso material aí veio o Ler e pensamos nossa será que é muito 
diferente? Então nós lemos as orientações e nos propusemos a fazer, experimentar. Nós 
liamos e estudávamos muito nos HTPCs. Como ele é um referencial muitas vezes nós 
utilizávamos ele todo e muitas vezes utilizávamos o que nossos alunos precisavam. Às vezes 
na minha classe utilizamos projetos e sequencias didáticas de anos diferentes (do livro 
laranjinha e do livro azul na mesma turma, ano)”. 
C “É um material que não nos impede de estar adaptando e mudando, por exemplo, nós 
aproveitamos algumas atividades do 1º ano para o Pré II, de acordo com a necessidade dos 
alunos”. 
D “As professoras se apropriaram do material com muito estudo. Usamos o material de 
acordo com a necessidade de cada turma. Não seguimos como um livro didático enviado pela 
SME”. 
Os resultados desta investigação demonstram que as saberes docentes são constituídos 
de muitos fatores de origem social, cognitivo e cultural, considerando as historias de vida dos 
 
 
professores e o habitus de cada um que pode determinar sua prática pedagógica, profissional. 
As manifestações reafirmam como disse a seguinte autora: 
[...] após o período inicial de reprodução das praticas alheias, [...] as 
professoras introduzem algumas modificações no modelo. Mas isso varia 
bastante. As modificações podem ocorrer apenas por injunções da aplicação 
do modelo em uma situação real que é sempre diferente da reproduzida; 
podem consistir em ligeiras alterações, decorrentes da intervenção de 
peculiaridades dos alunos ou da inclusão nas aulas de outras atividades, não 
pertencentes àquele modelo. Mas, as modificações podem ser mais 
profundas, variando com a complexidade das reflexões feitas pelo professor. 
Nas modificações mais profundas intervêm, além da percepção dos efeitos 
praticas junto aos alunos com o relacionamento entre os resultados obtidos 
no aprendizado das crianças e o trabalho feito, a tomada de consciência 
sobre os limites das próprias práticas e a busca de aportes teóricos 
(MICOTTI, 2004). 
Neste sentido, os professores se apropriam das propostas pedagógicas sugeridas pelos 
sistemas, não as reproduzindo pura e simplesmente, mas acrescentando, modificando de 
acordo com suas interpretações, criatividade, criticidade e saberes. 
 
Para não concluir 
 
Entende-se a docência, na atualidade, como uma atividade profissional complexa que 
exige saberes e competências necessárias ao seu exercício, e que os professores constroem a 
sua profissionalização na vivência (prática), articulada à sua formação inicial e continuada. 
Os estudos de Ramalho, Nuñez e Gauthier (2003, p.189), apontam que a 
profissionalização do professor não se constitui como um modelo pré-estabelecido, mas como 
um processo de construção de si nos projetos individuais e coletivos dos contextos nos quais 
os docentes estão inseridos o que implica em reconhecer a história dos docentes nos seus 
contextos, a partir de referências situadas em outros contextos, marcadas por diferenças 
substanciais de realidades. Sendo assim, quando falamos da profissionalização, falamos da 
dinâmica do contexto real do trabalho. 
O movimento da profissionalização docente aponta que o campo da formação de 
professores está exigindo, há décadas, a definição de uma política pública de formação e 
valorização da docência, que englobe a formação inicial, condições de trabalho, salário e 
carreira e a formação continuada. 
Pensar uma formação inicial sólida, como um dos elementos, poder-se-ia dizer 
essencial, para profissionalização, como garantir a todos uma formação capaz de viabilizar a 
 
 
articulação teoria-prática, com estágios supervisionados que não são apenas espaços de 
observação, mas sim de construção? Como lidar com o fato de que as escolas hoje possuem 
professores formados nas mais variadas faculdades, institutos e universidades, com os mais 
diferentes níveis de conhecimento, responsabilidade e compromisso? Isto tudo sem falar nos 
diferentes percursos, histórias de vida e habitus de cada um destes professores. Neste 
contexto: é possível garantir uma classe profissional, com um interesse coletivo, considerandoos saberes e a subjetividade de cada um? E, ainda, o campo, a escola, pode influenciar 
favorecendo ou não a profissionalização, quando se trata de um espaço democrático, 
participativo e acima de tudo que valoriza e incentiva a prática do professor reflexivo, 
pesquisador e responsável pela continuidade de sua formação? 
Certamente estas angústias, questões difíceis de serem respondidas, não nos deixam 
concluir este tema e nem temos esta pretensão. O que fica neste momento é a curiosidade, a 
necessidade, a vontade de saber e conhecer. Fica a pergunta: se dermos voz aos docentes, o 
que eles apontariam como contribuições à sua profissionalização em relação a sua formação 
inicial, continuada e saberes da prática? Seria preciso ouvir e valorizar os professores 
reconhecê-los como sujeitos ativos no caminho de sua profissionalização? Respeitá-los pela 
responsabilidade em relação ao excesso de missões que a contemporaneidade lhes atribuiu, 
bem como, pela falta ou pobreza de políticas pública de formação e valorização do 
magistério, seria um caminho? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
BOURDIEU, P. Sociologia. (organizado por Renato Ortiz). São Paulo: Ática. 1983. 
 
FOUCAULT, M. A ordem do discurso. São Paulo: Edições Loyola. 2000. 
 
_______. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. São Paulo: 
Martins Fontes, 2002. 
 
_______. História da sexualidade: a vontade de saber. (trad. Maria Thereza da Costa 
Albuquerque e J.A. Guilhon Albuquerque). 12.ed.Rio de Janeiro: Graal. 1997. 
 
FOUCAULT, M. Two Lectures. In: GORDON, C. (Ed.). Power/Knowledge: selected 
interviews and other writings (1972-1977). London: Longman, 1980. p. 78-108. 
 
GAUTHIER, C et al. Por uma teoria da pedagogia. Ijuí: Unijuí, 1998. 
 
GATTI, B.; NUNES, M. (coord.) Formação de Professores para o Ensino Fundamental: 
Estudo de Currículos das Licenciaturas em Pedagogia, Língua Portuguesa, Matemática e 
Ciências Biológicas. São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 2009. 
 
LESSARD, C.; TARDIF, M. La nature et la place d’une formation professionnelle selon 
les conceptions de l’université. Symposium international sur la formation profissionnelle. 
Reseau Éducation et Formation(REF). Toulouse. 26 out. 1998. 
 
MICOTTI, M. C. de O. O professor e as propostas de mudanças didáticas. In: SERBINO, R. 
V. et al. Formação de Professores. São Paulo: Fundação Editora da UNESP.1998. 
 
________. Alfabetização: O aprendizado do ensino. In: Alfabetização: os caminhos da 
pratica e a formação de professores. Rio Claro: Instituto de Biociências, UNESP. 2004. 
 
NÓVOA, A. (Coord.). Os professores e sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote. 1992. 
 
NÓVOA, A. Vidas de professores. Porto: Porto editora. 1999. 
 
______.Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. 
Educação e Pesquisa. 1999. v. 25. n.1. 
 
______. Profissão professor. 2. ed. Porto: Porto editora. 1995. 
 
PERRENOUD, P. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação. Lisboa: Dom 
Quixote. 2002. 
 
PERRENOUD, P. Formando professores profissionais: quais estratégias? Quais 
competências? 4. ed. Porto Alegre: Artmed. 2000. 
 
RAMALHO, B. L.; NUÑES, I. B.; GAUTHIER C. Formar o professor, profissionalizar o 
ensino: perspectivas e desafios. Porto Alegre: Sulina. 2003. 
 
 
 
SCHÖN, D. A . The reflective practitioner: how professional think in action. Nova York: 
Jossey Bass. 1983. 
 
______. Educando o professor reflexivo. São Paulo: Artmed. 2000. 
 
TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 7ª ed. Petrópolis. RJ: Vozes. 2002. 
 
VEIGA-NETO, A. Foucault e a educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. (Coleção 
Pensadores da Educação). 
 
VYGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes. 1998.

Continue navegando