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Doença Inflamatória Pélvica - BEATRIZ TIANEZE DE CASTRO 1 Doença Inflamatória Pélvica - BEATRIZ TIANEZE DE CASTRO INTRODUÇÃO DEFINIÇÃO Síndrome clínica atribuída à ascensão de microrganismos do trato genital inferior, espontânea ou decorrente de manipulação (inserção de DIU, biópsia de endométrio, curetagem, entre outros), comprometendo o endométrio (endometrite), tubas uterinas, anexos uterinos e/ou estruturas contíguas (salpingite, miometrite, ooforite, parametrite, pelviperitonite) FATORES DE RISCO CONDIÇÕES SOCIOECONÔMICAS Baixa escolaridade Desemprego Baixa renda familiar USO DE MÉTODO ANTICONCEPCIONAL Uso de pílulas combinadas: facilita a infecção por N. gonorrhoeae e C. trachomatis Usuárias de DIU: risco aumentado quando comparadas a mulheres que não usam contraceptivos ou que utilizam outros métodos, sendo um risco maior nos primeiros 20 dias da inserção COMPORTAMENTO SEXUAL Parcerias múltiplas Início precoce das atividades sexuais Novas parcerias ATIVIDADE SEXUAL NA ADOLESCÊNCIA Risco 3x maior de desenvolver DIP aguda do que mulheres acima de 25 anos A exposição a IST é responsável pela ocorrência de DIP no primeiro mês de uso do DIU, e não o uso do dispositivo. No entanto, esse risco é reduzido nas mulheres tratadas para IST antes da inserção do DIU. AGENTES ETIOLÓGICOS MICRORGANISMOS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS EPIDEMIOLOGIA 85% dos casos são causados por agentes patogênicos sexualmente transmitidos ou associados à vaginose bacteriana PRINCIPAIS AGENTES Chlamydia trachomatis Neisseria gonorrhoeae Doença Inflamatória Pélvica - BEATRIZ TIANEZE DE CASTRO 2 OUTROS AGENTES Mycoplasma genitalium Herpes simplex vírus Trichomonas vaginalis AGENTES RAROS Vírus e protozoários ORGANISMOS ENDÓGENOS AGENTES Mycoplasma genitalium Mycoplasma hominis Ureaplasma urealyticum BACTÉRIAS ANAERÓBICAS AGENTES Bacteroides spp. e fragilis Peptoestreptococcus spp Prevotella spp BACTÉRIAS FACULTATIVAS AGENTES Escherichia coli Gardnerella vaginalis Haemophilus influenzae Streptococcus spp. e agalactieae FISIOPATOLOGIA PROCESSO ESTÁGIO 0 OU FASE PRÉ-DIP 1. Os agentes etiológicos estão instalados no colo uterino ESTÁGIO 1a OU ENDOMETRITE 1. Modificação do muco cervical com a menstruação: o sangue proveniente da menstruação é alcalino, formando, portanto, um meio de cultura 2. Ascensão dos microrganismos passando pelo endométrio 3. Endometrite fugaz 4. Sangramento discreto 5. Prolongamento da menstruação ESTÁGIO 1b OU SALPINGITE SEM PERITONITE 1. Os patógenos ascendem, via canalicular, até as tubas uterinas, se instalando no local 2. Reação tecidual Doença Inflamatória Pélvica - BEATRIZ TIANEZE DE CASTRO 3 3. Formação de conteúdo purulento 4. Pode ocorrer pelviperitonite: conteúdo purulento que chega até o peritônio pélvico, através das fímbrias ESTÁGIO 2 OU SALPINGITE COM PERITONITE 1. Acúmulo no fundo de saco de Douglas 2. Maior sensibilidade + dispareunia + dor ao toque vaginal 3. Complexo tubo-ovariano: as alças intestinais e epíplon tendem a bloquear o processo purulento ESTÁGIO 3 OU PIOSSALPINGE/ABSCESSO TUBO-OVARIANO 1. Quadro de piossalpinge: fusão das fímbrias com aprisionamento de pus dentro das tubas uterinas 2. O conteúdo aprisionado faz com que ocorra queda dos níveis de oxigênio e aumento gradativo na proliferação dos anaeróbios em detrimento dos aeróbios ESTÁGIO 4a OU ABSCESSO TUBO-OVARIANO ROTO 1. Surgimento de abscesso tubo-ovariano, visto que o pus pode chegar até os ovários ESTÁGIO 4b OU HIDROSSALPINGE/HIDROOFOROSSALPINGE 1. Hidrossalpinge: formação de uma massa multicística com conteúdo citrino estéril APRESENTAÇÃO CLÍNICA QUADRO CLÁSSICO QUEIXA Dor abdominal baixa ou pélvica de caráter agudo, com duração de até 2 semanas, geralmente bilateral PIORA DA DOR Ato sexual Com movimentos bruscos ACHADOS Hipersensibilidade de órgãos pélvicos Evidência de inflamação em trato genital PODE APRESENTAR Sangramento uterino anormal em pouca quantidade Dispareunia Corrimento vaginal Dor pélvica Dor em abdome inferior Dor à mobilização do colo do útero ao toque QUADRO ATÍPICO Febre baixa Emagrecimento Dor abdominal discreta EXAME FÍSICO DEVE INCLUIR SINAIS DE GRAVIDADE Doença Inflamatória Pélvica - BEATRIZ TIANEZE DE CASTRO 4 Aferição de sinais vitais Exame abdominal Exame especular vaginal, incluindo inspeção do colo uterino para friabilidade (sangramento fácil) e corrimento mucopurulento cervical Exame bimanual, com mobilização do colo e palpação dos anexos PRINCIPAL ALTERAÇÃO Dor abdominal à palpação em quadrantes inferiores PERI-HEPATITE Dor à palpação em quadrante superior direito do abdome ABSCESSO TUBO-OVARIANO Massa palpável em topografia sexual Febre alta Irritação peritoneal Diminuição da peristalse Sinais de sepse: taquicardia e hipotensão EXAME GINECOLÓGICO Exame pélvico bimanual: dor à mobilização do colo uterino, útero e anexos Colo friável e com mobilidade aumentada Corrimento endocervical e/ou vaginal purulentos DIAGNÓSTICO CRITÉRIOS NECESSÁRIO Três critérios maiores MAIS um critério menor OU Um critério elaborado CRITÉRIOS MAIORES Dor no hipogástrico Dor à palpação dos anexos Dor à mobilização do colo uterino CRITÉRIOS ELABORADOS Evidência histopatológica de endometrite CRITÉRIOS MENORES Temperatura axilar >37,5°C ou temperatura retal >38,3°C Conteúdo vaginal ou secreção endocervical anormal Massa pélvica Mais de 10 leucócitos por campo de imersão em material de endocérvice Doença Inflamatória Pélvica - BEATRIZ TIANEZE DE CASTRO 5 Presença de abscesso tubo-ovariano ou de fundo de saco de Douglas em estudo de imagem Laparoscopia com evidência de DIP Leucocitose em sangue periférico Proteína C reativa ou velocidade de hemossedimentação – VHS elevada Comprovação laboratorial de infecção cervical por gonococo, clamídia ou micoplasmas EXAMES COMPLEMENTARES INDICAÇÃO Diagnóstico etiológico Avaliação da gravidade EXAMES LABORATORIAIS Hemograma completo VHS Proteína C reativa Exame bacterioscópico para vaginose bacteriana Cultura de material de endocérvice com antibiograma Teste de gravidez (para afastar gravidez ectópica) Detecção de clamídia e gonococo por biologia molecular Pesquisa de N. gonorrhoeae e C. trachomatis no material de endocérvice, da uretra, de laparoscopia ou de punção do fundo de saco posterior Exame qualitativo de urina e urocultura (para afastar hipótese de infecção do trato urinário) Hemocultura EXAMES DE IMAGEM USG transvaginal e pélvica: método acessível e não invasivo no diagnóstico de complicações relacionadas à DIP Principal achado: presença de uma fina camada líquida preenchendo a trompa, com ou sem a presença de líquido livre na pelve DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL PRINCIPAIS Gravidez ectópica Torção de mioma uterino Doença Inflamatória Pélvica - BEATRIZ TIANEZE DE CASTRO 6 Apendicite aguda Infecção do trato urinário Litíase ureteral Torção de tumor cístico de ovário Rotura de cisto ovariano Endometriose (endometrioma roto), Diverticulite CONDUTA TERAPÊUTICA TRATAMENTO IMEDIATO OBJETIVO Evita complicações tardias: infertilidade, gravidez ectópica e dor pélvica crônica QUANDO INICIAR Recomenda-se que, por menor que seja a suspeita, o tratamento seja iniciado o quanto antes AMBULATORIAL INDICAÇÃO Mulheres que apresentam quadro clínico leve e exame abdominal e ginecológico sem sinais de pelviperitonite OBSERVAÇÃO Monoterapia contraindicada pela diversidade de agentes etiológicos implicados na DIP TRATAMENTO Ceftriaxona 500mg, IM, dose única + Doxiciclinaa 100mg, 1 comprimido, VO, 2x/dia, por 14 dias + Metronidazol 250mg, 2 comprimidos, VO, 2x/dia, por 14 dias HOSPITALAR INDICAÇÃO Abscesso tubo-ovariano Gravidez Ausência de resposta clínica após 72h do início do tratamento com antibioticoterapia oral Intolerância a antibióticos orais ou dificuldade de seguimento ambulatorialEstado geral grave, com náuseas, vômitos e febre Dificuldade na exclusão de emergência cirúrgica (ex.: apendicite, gravidez ectópica) TRATAMENTO 1ª Opção Ceftriaxona 1g, IV, 1x/dia, por 14 dias + Doxiciclinaa 100mg, 1 comprimido, VO, + Metronidazol 400mg, IV, de 12/12h Doença Inflamatória Pélvica - BEATRIZ TIANEZE DE CASTRO 7 2x/dia, por 14 dias 2ª Opção Clindamicina 900mg, IV, 3x/dia, por 14 dias + Gentamicina (IV ou IM): 3-5mg/kg, 1x/dia, por 14 dias 3ª Opção Ampicilina/sulbactam 3g, IV, 6/6h, por 14 dias + Doxiciclinaa 100mg, 1 comprimido, VO, 2x/dia, por 14 dias OBSERVAÇÃO Monoterapia contraindicada pela diversidade de agentes etiológicos implicados na DIP PARCERIAS SEXUAIS As parcerias sexuais dos dois meses anteriores ao diagnóstico, sintomáticas ou não, devem ser tratadas empiricamente para Neisseria gonohrroeae e Chlamydia trachomatis Recomenda-se ceftriaxona 500mg, IM, associada a azitromicina 1g, VO, dose única DIU Não há necessidade de remoção do dispositivo Caso exista indicação, a remoção não deve ser anterior à instituição da antibioticoterapia, devendo ser realizada somente após duas doses do esquema terapêutico GESTAÇÃO Alto risco de abortamento e corioamnionite O uso de doxiciclina e quinolonas é contraindicado na gestação