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Osteossíntese distal de fêmur com placa bloqueada em cão - Relato de Caso

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Osteossíntese distal de fêmur com placa bloqueada em cão - Relato de Caso
Distal femur osteosynthesis with locking plate in a dog - Case Report
Isis Gabrielly dos Santos Machado¹*.
Sara Barbosa Santos²*.
¹ Acadêmica do Curso de Medicina Veterinária pela Universidade Estadual de Goiás.
*isismachado304@gmail.com
² Acadêmica do Curso de Medicina Veterinária pela Universidade Estadual de Goiás.
*sarabarbosasantos91@gmail.com
Resumo
Fraturas ocasionadas por traumas são causas comuns, resultando em lesões
ortopédicas e cutâneas de complexidade variada. As fraturas de ossos longos são as
mais comuns na rotina clínica do médico veterinário e a utilização de placas de aço
cirúrgico é bastante utilizada, proporcionando uma boa estabilidade e preservação de
tecido adjacentes. As fraturas podem ser diagnosticadas de acordo com o histórico
clínico, exame ortopédico e como diagnóstico definitivo de exames radiográficos.
Sabe-se que não existe um método de estabilização de fratura universal, pois todos
possuem vantagens e desvantagem se adequando a localização da fratura, assim como o
porte, peso, idade, número de ossos envolvidos e o grau de comprometimento de tecidos
moles.
O presente relato tem como objetivo descrever o caso de um cão, raça
Yorkshire de cinco anos de idade, com diagnóstico de fratura transversal distal do
fêmur, optando-se pelo tratamento cirúrgico de osteossíntese com placa bloqueada
justaposto à articulação do joelho.
Palavra Chave: osteossíntese; placa bloqueada; fratura distal.
Abstract
Fractures caused by trauma are common causes, causing orthopedic and cutaneous
injuries of varying complexity. Long bone fractures are the most common in the
veterinarian's clinical routine and the use of surgical steel plates is widely used,
providing good stability and preservation of adjacent tissue. It is known that there is no
universal fracture stabilization method, as all have advantages and disadvantages
depending on the location of the fracture, as well as the size, weight, age, number of
bones involved and the degree of soft tissue impairment.
Introdução
Em cães e gatos as fraturas de fêmur são as mais comuns, correspondendo a
mais de 20% de todas as fraturas do esqueleto apendicular, (Whitehair,2016). De acordo
com Fossum (2007), as fraturas se caracterizam pela perda da continuidade do tecido
ósseo. A rotina clínica dos casos de traumas é bastante frequente, observando-se as
fraturas como uma das principais manifestações ortopédicas.
A fratura é ocasionada em sua grande maioria por eventos traumáticos
ocasionados por acidentes automobilísticos, podendo também ser gerado por brigas,
quedas, projéteis balísticos, bem como por condições patológicas como neoplasias e
osteopenia, alto impacto e também por acidentes doméstico. (Fossum, 2007)
As técnicas comumente utilizadas na osteossíntese dos ossos longos são pinos
intramedular, haste bloqueada, fixador esquelético externo, placa óssea e suas
associações: hastes bloqueadas e placa óssea (plate-nail); pinos intramedulares e fixação
esquelética externa e placa óssea associada ao pino intramedular (plate-rod) (Reems,
2003; Fossum, 2014).
A escolha do método de reparo baseia-se no tipo e localização da fratura, assim
como o porte, peso e idade do animal acometido, número de ossos envolvidos e no grau
de comprometimento de tecidos moles (Goodwin, 2005). Segundo Shales (2008), o
método de fixação deve ser escolhido por fatores relacionados à recuperação dos eixos
anatômicos, estabilização adequada, fatores biomecânicos, técnicas atraumáticas com
preservação do leito vascular, imobilização articular e muscular.
As placas bloqueadas foram criadas pela necessidade de desenvolvimento de
um implante que proporcionasse uma osteossíntese mais biológica, ou seja, com menor
agressão aos tecidos adjacentes (ARTHURS, 2015; AUGAT e RUDEN, 2018)
O presente relato tem como objetivo descrever o caso de um cão, raça
Yorkshire de cinco anos de idade, com diagnóstico de fratura transversal distal do
fêmur, optando-se pelo tratamento cirúrgico de osteossíntese com placa bloqueada
justaposto à articulação do joelho.
Caso Clínico
Um cão da raça Yorkshire de cinco anos de idade pesando 2,5 kg, foi atendido
no centro veterinário Lamounier. Durante a anamnese os tutores relataram que o animal
havia tomado um coice no membro pélvico esquerdo (MPE) de manhã, e que à noite o
mesmo não conseguia andar.
No exame físico observou que o animal apresentava sensibilidade, dor à
palpação, edema, eritema e claudicação do MPE. Os parâmetros vitais de frequência
cardíaca, frequência respiratória e temperatura estavam normais. O animal foi
encaminhado para a internação onde foi colocado o acesso venoso e o mesmo recebeu
medicação analgésica de metadona na dose 0,2 mg/kg endovenosa (EV). Realizou-se o
hemograma, onde se obteve alteração nos neutrófilos, apresentando neutrofilia com
desvio à esquerda.
No outro dia após o atendimento, o animal foi encaminhado para realizar as
radiografias do membro acometido, onde foi diagnosticado fratura transversal distal do
fêmur (Fig.1).
Figura 1: A: projeção latero-lateral direita (LLD) do membro pélvico, seta
evidenciando fratura distal do fêmur esquerdo, B: projeção ventro-dorsal do membro
pélvico evidenciado pela seta fratura distal do fêmur esquerdo.
Após avaliação das imagens radiográficas o animal foi encaminhado para o
atendimento com a ortopedista, onde passou pelo exame ortopédico completo e
optou-se pela realização da cirurgia de osteossíntese com placa bloqueada.
Foi preconizado o seguinte protocolo anestésico para a cirurgia ortopédica:
medicação pré anestésica (MPA) com associação de meperidina na dose de 3 mg/kg
intramuscular (IM), midazolam na dose de 0,3 mg/kg IM e ketamina na dose de 0,5
mg/kg IM. A indução se deu por meio de propofol em bolus na dose de 10mg/kg
intravenoso (EV) e a manutenção foi realizada através de anestesia inalatória com
isoflurano onde o animal foi intubado com sonda traqueal nº4.
No trans-operatório a abordagem ao fêmur se deu pela incisão de pele
estendida do trocanter maior até o epicôndilo lateral do fêmur. Realizou a divulsão dos
tecidos subcutâneos, onde se teve a visualização e incisão da fáscia lata, posteriormente
localizado os músculos bíceps femoral e o vasto lateral sendo os mesmos deslocados
caudalmente e cranialmente obtendo acesso ao foco de fratura do fêmur. Durante a
cirurgia ocorreu a necessidade de ampliar a incisão e abordar a cápsula articular do
joelho para melhor abordagem ao foco de fratura. A fratura foi reduzida, alinhada na
coluna óssea e fixada com uma placa de aço cirúrgico de número 6mm e bloqueada com
quatro parafusos intramedulares.
Figura 2: A divulsão dos tecidos; B localização e deslocamento dos músculos bíceps
femoral e vasto lateral; C exposição do fêmur; D foco da fratura; E alinhamento na
coluna óssea e F fixação da placa cirúrgica com quatro parafusos bloqueados.
Realizou-se três planos de sutura, sendo o primeiro plano de sutura o da fáscia
lata com fio poliglecaprone 2.0 no padrão simples separado, no segundo plano foi feito
a aproximação do tecido subcutâneo também feito com fio poliglecaprone 2.0 no padrão
de sutura simples contínuo e o terceiro plano de sutura a pele com fio de nylon 2.0 no
padrão Wolff.
As medicações administradas no pós-operatório foram: ceftriaxona na dose de
25mg/kg IM, metadona na dose 0,2mg/kg IM, ambos a cada 12 horas. Meloxinew na
dose de 0,5mg/kg via oral (VO) uma vez ao dia e dipirona na dose de 25mg/kg SC a
cada 8 horas.
Após seis dias da cirurgia o animal permaneceu internado e apresentou apatia,
hiporexia e mucosas hipocoradas, optou se por realizar um novo hemograma onde se
teve alterações significativas nos seguintes parâmetros: neutrofilia com desvio à
esquerda, hemoglobina 3.2g/dL (12.0-18.0g/dL), hematócrito 9.6% (37.0 - 55.0%) e
trombocitopenia, caracterizando um quadro de anemia grave. Como tratamento para o
quadrooptou-se por adicionar nas medicações a doxiciclina na dose de 20mg/kg VO a
cada 12 horas, por 21 dias e também administrou se noripurum na dose de 2,5ml/kg no
soro que o animal estava tomando.
Ao decorrer de dez dias de internação o animal se apresentava estável e se
alimentando bem, recebeu alta com as seguintes medicações para fazer em casa:
doxiciclina na dose de 20mg/kg VO BID por 17 dias, prednisolona na dose de 0,5mg/kg
VO BID por 10 dias, hemolitan gold suspensão sendo 5 gotas ao dia durante 30 dias e
hepvet meio comprimido ao dia durante 30 dias.
Discussão
As fraturas de ossos longos, principalmente em fêmur que representam 45%,
são as queixas mais comuns na rotina clínica cirúrgica da medicina veterinária, podendo
alcançar médias de 20 a 25% do total em cães e gatos (Larin et al., 2001; Caquias,
2011), possuindo assim posição de destaque nas cirurgias ortopédicas (Romano et al.,
2008).
O diagnóstico do paciente foi estabelecido pela avaliação no histórico clínico,
exame ortopédico e exames radiográficos. O exame complementar de radiografia
simples confirmou a suspeita de fratura distal do fêmur, como mostra o Matos et al.,
(2018). Segundo Thrall et al., (2014) planos radiográficos de diferentes posições
resultam em diagnósticos satisfatórios para a investigação do local, tipo e complexidade
das fraturas.
O uso da meperidina na MPA de acordo com (Yamazaki, Mari Suguino, et al,
2011) diz que é um análogo da morfina, com período de ação de 2 a 4 horas e menores
efeitos depressores sobre o aparelho cardiorrespiratório, sendo utilizada para tratar a
dor moderada a intensa, geralmente aguda, como fraturas e lesões de tecidos moles.
A cetamina promove um estado dissociativo com presença de analgesia
somática, aumento da pressão arterial, débito cardíaco e frequência cardíaca (Valadão,
2002; Duque et al., 2005), exercendo vasoconstrição periférica, não alterando
significativamente a frequência respiratória, mantendo livre as vias aéreas e reflexos
protetores (Rosa, A. L., & Massone, F. 2005)
O midazolam faz parte do grupo dos benzodiazepínicos, causam efeito
sedativo pouco visível em cães e podem ser administrados tanto na MPA quanto na
indução anestésica (Spinosa, Górniak, 2006). Os efeitos provocados por esta classe de
fármacos são tranquilização leve, relaxamento muscular, amnésia, alterações
psicomotoras, potencialização de agentes anestésicos injetáveis e inalatórios (reduzindo
as doses destes fármacos) e efeitos anticonvulsivantes (Cortopassi, Fantoni, 2016).
Já o propofol foi aplicado para facilitar a intubação endotraqueal como relata
Armitage (2008), para manutenção anestésica, optou se pelo uso da anestesia inalatória,
como o isoflurano, no qual a recuperação anestésica ocorre de forma rápida. Segundo
Roush (2005), todos os pacientes merecem alívio da dor desde o pré-operatório,
trans-operatório e pós-operatório.
No caso relatado, a técnica utilizada de placa bloqueada de acordo com
Dallabrida (2005) proporciona uma melhor cicatrização, restauração e função do osso e
tecidos moles circundantes. Assim, promovendo o retorno da função biomecânica do
membro o mais breve possível (Gimmill, 2007). De acordo com (Da Silva, Bruna
Zafalon et al, 2017) embora seja classificada como “simples”, a ocorrência de
não-uniões é comum, devido à subestimação das forças biomecânicas de rotação e
compressão que atuam sobre o foco da fratura.
A técnica de reparo estabelecida no paciente foi a fixação da fratura por meio
de placa cirúrgica, que diferente de (Fossum, 2014) recomenda as associações de hastes
bloqueadas e placa óssea (plate-nail); pinos intramedulares e fixação esquelética externa
e placa óssea associada ao pino intramedular. A escolha da placa bloqueada de acordo
com (Da Silva, Bruna Zafalon et al, 2017), apresenta vantagens pelo fato de ser estável
e não permitir movimentação entre o implante e o osso, conferindo estabilidade e
rigidez ao sistema contribuindo para uma melhor cicatrização, restauração e função do
osso e tecidos moles circundantes. Por não demandarem um modelamento perfeito para
justaposição à superfície óssea, as placas bloqueadas têm sido amplamente utilizadas
em procedimentos que preservam os tecidos, tais como as osteossínteses minimamente
invasivas com placa (MIPO) (Arthurs, 2015).
Considerações Finais
O método utilizado de placa bloqueada para correção de fratura do fêmur, foi
eficaz para promover estabilidade e consolidação. Portanto, todo o manejo pré, trans e
pós operatório foram satisfatórios para proporcionar a reabilitação do paciente. Porém,
existe a necessidade de continuidade do monitoramento para se obter o sucesso da
recuperação total do paciente.
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