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CONHECIMENTO E FORMAS DE UTILIZAÇÃO DE PLANTAS MEDICINAIS POR AGRICULTORES FAMILIARES DE SANTA ALBERTINA (SP). Bueno, A. R. 1*; Sant’Ana, A. L. 2 Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”- Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira, DFTASE “Departamento de Fitotecnia, Tecnologia de Alimentos e Sócio-Economia”- UNESP, Ilha Solteira, SP. Aline_raia3@yahoo.com.br INTRODUÇÃO A partir do estudo das relações entre comunidades tradicionais e plantas medicinais surgiu a etnobotânica, que compreende o estudo e a interpretação do conhecimento, significação cultural, manejo e os usos tradicionais dos elementos da flora, englobando a maneira como um grupo social classifica as plantas e as utiliza (CABALLERO, 1979). O conhecimento tradicional sobre o uso das plantas é vasto e, em muitos casos, o único recurso terapêutico disponível às populações rurais de países em desenvolvimento, tais como o Brasil (PASA et al., 2005; AGRA et al., 2008; VEIGA- JUNIOR et al., 2008). A etnobotânica permite entender a proximidade e a vivência entre os moradores de uma comunidade e as plantas presentes no local, o que possibilita o resgate do conhecimento sobre essa relação de afinidade entre o homem e o meio ambiente. Plantas medicinais são aquelas que possuem uma ou mais propriedades reconhecidas de cura, prevenção, diagnóstico ou tratamento sintomático de doenças, usando-se órgãos ou partes das plantas que apresentam atividade terapêutica, devido à presença de um determinado princípio ativo. As plantas medicinais in natura são usadas para prevenção de sintomas e para cura de doenças (LORENZI, 2002). O objetivo do trabalho é fazer o levantamento etnobotânico de plantas medicinais, utilizadas por 12 produtores familiares do município de Santa Albertina-SP, e identificar as principais formas de uso, as indicações para as quais são empregadas e as percepções dos produtores sobre as plantas medicinais cultivadas e/ou utilizadas nas propriedades. MATERIAL E MÉTODOS A pesquisa possui caráter interdisciplinar, pois envolve conhecimentos das áreas de sociologia rural e biologia, especialmente a etnobotânica. A pesquisa foi realizada em propriedades rurais predominantemente familiares, no município de Santa Albertina (SP). O município possui 394 propriedades, ocupando uma área de 16.563 hectares. A pesquisa constou da aplicação de um questionário em 12 propriedades, no período de agosto de 2010 a fevereiro de 2011. O questionário permitiu o levantamento de informações gerais sobre a família e a propriedade, e dados específicos sobre o conhecimento dos produtores em relação às plantas medicinais cultivadas nas propriedades ou utilizadas pela família, sobre quais são formas de cultivo e/ou aquisição de plantas medicinais, as formas de uso e as indicações (tipos de doenças ou sintomas) para as quais são empregadas, a maneira como aprenderam o cultivo e o uso das plantas e as percepções dos agricultores familiares em relação às plantas medicinais. O questionário é composto em sua maioria por questões abertas, mailto:Aline_raia3@yahoo.com.br� de modo a permitir maior liberdade para os entrevistados exporem suas idéias. A pesquisa, em função de ser realizada nas propriedades rurais, também utilizou da observação direta para compor o quadro de análise e interpretação dos dados. RESULTADOS E DISCUSSÕES A tabulação dos dados dos 12 questionários, aplicados junto aos agricultores familiares de Santa Albertina, permitiu constatar que 91,6% dos respondentes foram mulheres. A área das propriedades variou de 6,1 a 145,2 hectares, sobre as principais atividades econômicas das propriedades, as atividades citadas foram: gado de leite, cana-de-açúcar (silagem), pastagem, limão, tomate, uva, seringueira, eucalipto, e criações de porcos e galinhas. Em relação às plantas cultivadas nas propriedades dos 12 entrevistados (Figura 1), verificou- se que 75% cultivam Erva Cidreira (Melissa officinalis) e Erva Santa Maria (Chenopodium ambrosioides), 58,3% Hortelã (Mentha piperita) e Boldo (Plectranthus barbatus), 50% Babosa (Aloe vera), 41,6% Caferana (Tachia guianensis), 25% Alecrim (Rosmarinus officinalis), Gambá (Pativeria alliacea), Poejo (Mentha pulegium) e Arruda (Ruta graveolens), 16,6% cultivam Açafrão (Curcuma longa), Avelóz (Euphorbia tirucalli), Urucum (Bixa orellana), Pariparoba (Pothomorphe umbellata) e Erva-Doce (Foeniculum vulgare). Outras 17 espécies estão presentes em apenas uma das propriedades (8,3%). Todas as famílias entrevistadas declararam usar ao menos um tipo de planta medicinal, sendo que as mais utilizadas são: Erva Santa Maria (Chenopodium ambrosioides), Erva Cidreira (Melissa officinalis), Boldo (Plectranthus barbatus), Caferana (Tachia guianensis), Hortelã (Mentha piperita), Cavalinha (Equisetum giganteum), Babosa (Aloe vera) e Alecrim (Rosmarinus officinalis) (Figura 1). Além destas, outras 14 espécies foram citadas, cada uma por apenas uma das famílias. Além do uso de plantas medicinais para o tratamento de problemas de saúde, 91,6% utilizam remédios convencionais (de farmácia), de forma associada aos fitoterápicos. Figura 1: Tipo de plantas medicinais utilizadas pelos agricultores pesquisados. Fonte: Dados da Pesquisa, 2011. Dos 12 informantes, 41,7% declararam não ter problemas crônicos de saúde na família. Já dentre os que alegaram possuir problemas de saúde na família, 62,5% declararam apresentar algum membro da família com problemas cardíacos, 12,5% com doença relacionada aos rins, 12,5% mencionaram problemas de coluna e 12,5% a ansiedade. Foram citados 43 usos pelos 12 entrevistados (Figura 2). Figura 2: Formas de utilização das plantas medicinais pelos agricultores pesquisados. Fonte: Dados da Pesquisa, 2011. Figura 3: Partes das plantas medicinais utilizadas pelos agricultores pesquisados. Fonte: Dados da Pesquisa, 2011. Dentre os entrevistados, 58,3% usam ou já usaram plantas medicinais para tratamento de problemas ou doenças de animais domésticos ou de criação. Dentre as plantas usadas para esse fim estão a Erva Santa Maria, empregada como vermífugo, para curar machucados e melhorar dores musculares em animais domésticos ou de criação; a Erva-Cidreira para inflamação de úberes em vacas de leite; Caferana para problemas intestinais, como cólicas e dor de estômago, e o Avelóz como cicatrizante de feridas. Além do uso medicinal, 50% das famílias declararam utilizar as plantas medicinais para outra finalidade, como temperos (Açafrão, Hortelã, Alecrim e Louro), na alimentação (Maracujá e Mamão), e até mesmo como plantas ornamentais (Babosa). As plantas não cultivadas nas propriedades rurais são adquiridas em barracas de plantas medicinais, supermercados, doadas por vizinhos e até coletadas em brejos (onde se obtém a cavalinha, por exemplo). Em relação à transmissão de conhecimentos sobre como se cultivam as plantas medicinais, as principais fontes são: 45,4% aprenderam com os pais, 18,2% com os sogros, 9,0% com avós, 9,0% somente com a mãe, 9,0% com amigos, 4,7% por meio de programas de TV, e 4,7% pela leitura de livros (dois produtores entrevistados possuíam livros sobre plantas medicinais). A forma como aprenderam utilizar as plantas medicinais também foi semelhante, sendo as principais fontes: 47,3% os pais, 15,8% somente a mãe, 10,5% os sogros, 10,5% a leitura de livros, 5,3% os avós, 5,3% os amigos e 5,3% por meio da TV. Nas conversas com os agricultores (as), foi possível também perceber algumas percepções e até superstições em relação ao assunto. Alguns acreditam que as plantas podem tirar “mau-olhado”, trazer boa sorte e que ao dar mudas de algumas plantas a amigos, não se deve deixar a própria pessoa retirar a muda, o dono da planta é que deve retirar e dar a outra pessoa, caso contrário a planta morre, especialmente no caso da arruda. CONCLUSÕES Constatou-se que as mulheres apresentam maior interesse e conhecimentosobre as plantas medicinais, sendo responsáveis ainda pelo cultivo, preparo e aquisição das plantas medicinais para utilização pela família, pois estas plantas são cultivadas especialmente nos quintais e hortas, espaço de domínio das mulheres na divisão do trabalho dentre os agricultores familiares tradicionais. A respeito das plantas medicinais percebeu-se que o uso maior é de plantas comuns, encontradas facilmente, sendo a utilização de plantas medicinais de cerrado quase inexistente. Todos os entrevistados possuem e usam as plantas medicinais cultivadas na propriedade e eventualmente as adquirem, mesmo quando nenhum membro da família apresenta problemas crônicos de saúde na família. Além do uso das plantas medicinais, a maioria das famílias usa também remédios convencionais, mas demonstram acreditar que as plantas medicinais sempre ajudam a melhorar os sintomas e contribuem para curar o problema de saúde. Pode-se concluir que a utilização de plantas medicinais é muito freqüente dentre os agricultores familiares e a principal forma de aquisição de conhecimentos sobre o cultivo e o preparo ainda se dá por meio dos pais, sogros, amigos, sendo passados de geração em geração. 5. REFERÊNCIAS AGRA, M. F.; SILVA, K.N.; BASÍLIO, I. J. L. D.; FRANÇA, P. F.; BARBOSA-FILHO, J. M. Survey of medicinal plants used in the region Northeast of Brazil. Rev. Bras. Farmacogn., v.18, p. 472-508, 2008. CABALLERO, J. La etnobotânica. In: BARRERA, A. (ed). La etnobotânica: três puntos de vista y una perspectiva. Xalapa: INREB, p. 27-30, 1979. LORENZI, H.; MATOS, F. J. A. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas. São Paulo: Instituto Plantarum, 2002. 512p. PASA, M. C.; SOARES, J. J.; GUARIM-NETO, G. Estudo etnobotânico da comunidade de Conceição- Açu (alto da bacia do rio Aricá Açu, MT, Brasil). Acta Bot. Bras., v.19, p. 195-207, 2005. VEIGA-JUNIOR, V. F. Estudo do consumo de plantas medicinais na Região Centro-Norte do Estado do Rio de Janeiro: aceitação pelos profissionais de saúde e modo de uso pela população. Rev. Bras. Farmacogn., v.18, p. 308-313, 2008.