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SUMÁRIO 1. Introdução ..................................................................... 3 2. Fisiologia da secreção gástrica ............................. 4 3. Inibidores da bomba de prótons (IBPs) ............. 8 4. Antagonistas do receptor H2 da histamina .......12 5. Outras classes ...........................................................15 Referências Bibliográficas ........................................20 3SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA 1. INTRODUÇÃO As doenças ácido-pépticas são dis- túrbios nos quais o ácido gástrico e a pepsina constituem fatores patogêni- cos necessários, porém habitualmen- te não suficientes. Apesar de serem inerentemente cáusticos, o ácido e a pepsina no estômago em geral não provocam lesões nem sintomas, de- vido à existência de mecanismos de defesa intrínsecos. As barreiras ao refluxo do conteúdo gástrico para o esôfago constituem a principal de- fesa esofágica. Se essas barreiras protetoras falharem e houver refluxo, pode ocorrer dispepsia e/ou esofagite erosiva. O estômago é protegido por inúme- ros fatores referidos coletivamente como “defesa mucosa”, sendo vários deles estimulados pela geração lo- cal de prostaglandinas e óxido nítri- co (NO). Se houver ruptura dessas defesas, pode-se verificar a forma- ção de úlcera gástrica ou duodenal. O tratamento e a prevenção desses dis- túrbios relacionados com a acidez são feitos diminuindo a acidez gástrica e aumentando a defesa da mucosa. O reconhecimento de que um agente infeccioso, o Helicobacter pylori, de- sempenha um papel chave na pato- gênese das doenças ácido-pépticas, tem estimulado novas abordagens para a prevenção e para a terapia. As principais indicações clínicas para reduzir a secreção de ácido são a ul- ceração péptica (duodenal e gástri- ca), a doença do refluxo gastroe- sofágico (DRGE; na qual a secreção gástrica causa lesão no esôfago) e a síndrome de Zollinger-Ellison (uma rara afecção hipersecretora causa- da por um tumor secretor de gastri- na). Se não for tratada, a DRGE pode causar displasia no epitélio esofágico que pode progredir para uma afecção pré-cancerosa potencialmente peri- gosa denominada esôfago de Barrett. SAIBA MAIS! A descoberta e o desenvolvimento de fármacos bloqueadores do receptor H2 de histamina por Black et al. em 1972 foram um expressivo avanço no tratamento de úlceras gástricas – uma condição que até então só podia ser tratada através de cirurgia (às vezes heroica). 4SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA 2. FISIOLOGIA DA SECREÇÃO GÁSTRICA O estômago secreta cerca de 2,5 li- tros de suco gástrico por dia. Os prin- cipais componentes exócrinos são pró-enzimas, como a pró-renina e o pepsinogênio, elaborados pelas célu- las principais ou pépticas, e o ácido clorídrico (HCl) e fator intrínseco, secretados pelas células parietais ou oxínticas. A produção de ácido é importante para promoção da digestão proteolíti- ca dos alimentos, absorção do ferro e eliminação de patógenos. As células secretoras de muco são abundantes na mucosa gástrica. Os íons bicarbo- nato são secretados e ficam presos no muco, criando uma barreira pro- tetora como um gel que mantém a superfície da mucosa em um pH de 6-7 em face de um ambiente muito mais ácido (pH 1-2) na luz. O álcool e a bile podem romper essa camada protetora. A secreção de muco e bi- carbonato é estimulada por prosta- glandinas “citoprotetoras” produzidas localmente. A secreção das células parietais é uma solução isotônica de HCl (150 mmol/l) com pH abaixo de 1, sendo a concentração de íons hidrogênio mais de um milhão de vezes mais alta que a do plasma. Para produzi-la, o Cl− é transportado ativamente para canalí- culos nas células que se comunicam com a luz das glândulas gástricas e, desse modo, com o próprio estôma- go. Isso é acompanhado pela secre- ção de K+, que é então trocado por H+ do interior da célula por uma K+- H+- ATPase (a “bomba de prótons”). Dentro da célula, a anidrase carbôni- ca catalisa a combinação de dióxido de carbono e água para gerar ácido carbônico, que se dissocia gerando íons H+ e bicarbonato. Esse último é trocado através da membrana basal da célula parietal por Cl−. Indicações clínicas para redução da secreção de ácido Ulceração péptica DRGE Síndrome de Zollinger-EllisonDRGE: Doença do Refluxo Gastroesofágico MAPA MENTAL: INTRODUÇÃO AOS SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA 5SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA Figura 1. Ilustração esquemática da secreção do ácido clorídrico pela célula parietal gástrica. A secreção envolve uma bomba de prótons (B), que é uma H+/K+-ATPase, um carregador (C) de simporte para K+ e Cl– e um antiporte (A), que troca Cl– e HCO3–. Um antiporte Na+/H+ adicional situado na interface com o plasma também pode ter participação (não mostrado). Fonte: Rang & Dale: Farmacologia, 2016 Célula G Célula ECS CÉLULA PARIETAL Proglumida AINEs Misoprostol Bloqueadores H2 AtropinaInibidores da bomba de prótons SST2R SST2R SST2R + – – – – – CCK2R EP2/3R H2R CCK2R? M3R GASTRINA SOMATOSTATINA HISTAMINA ACH P C H+ H+ K+ K+ CL– CL– PGE2 AA Os principais mediadores que contro- lam direta ou indiretamente o ácido gerado pelas células parietais são: • Histamina (hormônio local estimulador); • Gastrina (hormônio peptídico estimulador); • Acetilcolina (neurotransmissor estimulador); • Prostaglandinas E2 e I2 (hormô- nios locais que inibem a secreção de ácido); • Somatostatina (hormônio peptídi- co inibidor). 6SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA gastrina, assim como o leite e soluções de sais de cálcio, o que explica por que é inadequado usar sais contendo sais de cálcio como antiácidos. A acetilcolina ( juntamente com uma bateria de outros neurotransmissores e peptídeos) é liberada de neurônios co- linérgicos pós-ganglionares, estimula receptores M3 muscarínicos especí- ficos na superfície das células parie- tais, elevando, em decorrência, o Ca2+ intracelular e estimulando a liberação de prótons. Também apresenta efeitos complexos em outros tipos celulares; através da inibição da liberação da so- matostatina das células D, potencializa sua ação sobre a secreção de ácido pe- las células parietais. A maioria das células do trato gastroin- testinal produz prostaglandinas (PGs), sendo as mais importantes a PGE2 e a PGEI2. As prostaglandinas exercem efeitos “citoprotetores” em muitos as- pectos da função gástrica, incluindo au- mento da secreção de bicarbonato (re- ceptores EP1/2), aumento da liberação de mucina protetora (receptores EP4), redução da produção de ácido gástrico provavelmente por ação sobre os recep- tores EP2/3 nas células ECS, e prevenin- do a vasoconstrição (e, portanto, o dano à mucosa) que ocorre após estímulo agressivo. Essa ação provavelmente é mediada pelos receptores EP2/4. O mi- soprostol é uma prostaglandina sintética que provavelmente explora muitas des- sas ações para manifestar seus efeitos terapêuticos. A somatostatina é um hormônio pep- tídico é liberado pelas células D em muitas regiões dentro do estômago. Mediante atuação no receptor 2 de so- matostatina (SST)2, exerce efeitos ini- bitórios parácrinos sobre a liberação de gastrina pelas células G, sobre a libera- ção de histamina pelas células ECS, as- sim como diretamente sobre a produção de ácido pelas células parietais. HORA DA REVISÃO! As células neuroendócrinas são abun- dantes no estômago, e o tipo dominante são as células ECS (enterocromafim- símiles). Trata-se de células contendo histamina semelhantes aos mastócitos, que se localizam próximo às células pa- rietais. Elas proporcionam uma liberação basal constante de histamina, que ainda é aumentada pela gastrina e a acetilcoli- na. A histamina atua de forma parácrina nos receptores H1 das células parietais, aumentando o AMPc intracelular. Essas células respondem a concentrações de histamina que estejam abaixo do limiar necessário para ativação dos receptores H2 vasculares. A gastrina é um polipeptídeo de 34 re- síduos,mas também existe em formas menores. É sintetizada pelas células G no antro gástrico e é secretada no sangue da porta (atua de forma endó- crina). Sua principal ação é a estimula- ção da secreção de ácido pelas células ECS através da sua ação nos recepto- res de gastrina/colecistoquinina (CCK)2, que aumentam o Ca2+ intracelular. Os receptores de gastrina também são en- contrados em células parietais, mas sua significância no controle da secreção fisiológica é controversa. Os recepto- res CCK2 são bloqueados pelo fármaco experimental proglumida, que tem efei- to inibitório modesto sobre a ação da gastrina. A gastrina estimula também a síntese de histamina pelas células ECS e au- menta, indiretamente, a secreção de pepsinogênio, estimula o fluxo sanguí- neo e aumenta a motilidade gástrica. A liberação desse hormônio é controlada por transmissores neuronais e mediado- res veiculados pelo sangue, bem como a química do conteúdo gástrico. Aminoá- cidos e pequenos peptídeos estimulam diretamente as células secretoras de 7SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA A regulação da célula parietal é com- plexa, e muitos hormônios locais pro- vavelmente desempenham um papel no “ajuste fino” da resposta secretó- ria. O modelo mais aceito atualmen- te é que o eixo gastrina-ECS-célula parietal é o mecanismo dominante para o controle da secreção de áci- do. De acordo com essa ideia, que é apoiada pela maioria dos estudos feitos em camundongos trans- gênicos “nocaute”, a etapa inicial para o controle fisiológico da se- creção é a liberação de gastrina pelas células G. Esta atua através do seu receptor CCK2 nas célu- las ECS promovendo liberação de histamina e pode também possuir um efeito secundário so- bre as próprias células parietais, embora essa hipótese esteja em discussão. A histamina atua so- bre os receptores H2 das células parietais aumentando o AMPc e ativando a secreção de prótons, como descrito. A estimulação vagal direta tam- bém pode provocar secreção de ácido (fato que fundamenta as “úlceras de estresse”) através da liberação de acetilcolina, que es- timula diretamente os receptores M3 presentes nas células parietais. A so- matostatina provavelmente exerce sua influência inibitória tônica sobre as células G, as ECS e as células pa- rietais. As prostaglandinas locais (ou administradas exogenamente) atuam em receptores EP2/3, exercendo efei- to inibitório predominantemente so- bre a função das células ECS. Esse sistema de controle é claramen- te complexo, mas a exposição prolon- gada dos tecidos ao excesso de se- creção gástrica é perigosa e deve ser escrupulosamente regulada. Célula G Gastrina Somatostatina Histamina AA PGE2 Célula ECS CÉLULA PARIETAL Ach AINEs Misoprostol Bloqueadores H2 Atropina Inibidores da bomba de prótons Proglumida SST2R SST2R SST2R M3R H2R CCK2R CCK2R? EP2/3R H+ CP H+ K+ K+ Cl- Cl- Figura 2. Diagrama esquemático mostrando a regula- ção de uma célula parietal gástrica secretora de ácido, ilustrando o local de ação de fármacos que influenciam a secreção ácida. AA, ácido araquidônico; ACh, acetilco- lina; AINEs, anti-inflamatórios não esteroidais; B, bomba de prótons (H+-K+-ATPase); C, carreador simporte de K+ e Cl−; CCK2R, receptor de gastrina/colecistoquinina; ECS (enterocromafim-símile), célula enterocromafim se- cretora de histamina semelhante a mastócito; EP2/3R, receptores 2 e 3 de prostaglandinas; H2R, receptor H2 da histamina; M3R, receptor M3 da acetilcolina; PGE2, prostaglandina E2; SST2R, receptor tipo 2 da somatos- tatina. Fonte: Rang & Dale: Farmacologia, 2016 8SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA 3. INIBIDORES DA BOMBA DE PRÓTONS (IBPS) Os IBPs se ligam à enzima H+/K+-A- TPase (bomba de prótons) e supri- mem a secreção de íons hidrogênio para o lúmen gástrico. A bomba de prótons ligada à membrana é a eta- pa final da secreção de ácido gástri- co. Reduzem-se as secreções de áci- do gástrico basal e a estimulada por alimentos. Eixo gastrina-ECS-célula parietal Liberação de gastrina pelas células G Gastrina atua através do receptor CCK2 nas células ECS promovendo liberação de histamina Histamina atua nos receptores H2 das células parietais aumentando o AMPc Ativação da secreção de prótons FLUXOGRAMA: FISIOLOGIA GastrinaAcetilcolina Histamina Prostaglandina E2 CÉLULA PARIETAL LÚMEN DO ESTÔMAGO Ácido gástrico H+K+ K+ H+ Bomba de prótons O omeprazol bloqueia a bomba de prótons Adenilil- ciclase GiGs ATP AMPc Proteinocinase (ativada) Figura 3. Mecanismo de ação dos IBPs. GS e Gi, proteínas de membrana que intermedeiam o efeito estimulante ou inibitório do receptor acoplado à adenilil-ciclase. Fonte: Farmacologia ilustrada, 2016 9SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA sua própria biodisponibilidade). Em- bora sua meia-vida seja de cerca de 1 hora, uma dose diária única afeta a secreção de ácido por 2-3 dias, em parte porque se acumula nos canalí- culos e em parte porque inibe a H+- -K+-ATPase irreversivelmente. Com a dosagem diária, existe um efeito antissecretor crescente por até 5 dias, depois do qual se atinge um platô. Devido à necessidade de um pH ácido nos canalículos ácidos das células pa- rietais para a ativação dos fármacos, e como o alimento estimula a produção de ácido, a conduta ideal consiste na administração desses fármacos cerca de 30 min antes das refeições. A ad- ministração concomitante de alimen- to pode reduzir ligeiramente a taxa de absorção dos inibidores da bom- ba de prótons, porém não se acredi- ta que esse efeito seja clinicamente significativo. O uso concomitante de outros fármacos que inibem a secre- ção ácida, como os antagonistas dos receptores H2, pode previsivelmente reduzir a eficiência dos inibidores da bomba de prótons, porém a impor- tância clínica dessa interação poten- cial não é conhecida. Os IBPs são metabolizados pelas en- zimas do citocromo P450 hepático, tendo a CYP2C19 o papel dominante. O omeprazol foi o primeiro IBP de- senvolvido e compreende uma mis- tura racêmica de dois enantiômeros. Como o fármaco é uma base fraca, ele se acumula no ambiente ácido dos canalículos da célula parietal es- timulada, onde é convertido em uma forma aquiral e se torna, depois, ca- paz de reagir com a ATPase e inati- vá-la. Esse acúmulo preferencial sig- nifica que tem um efeito específico sobre essas células. Outros inibidores da bomba de prótons (todos com um modo de ativação e farmacologia se- melhantes) incluem o esomeprazol (o isômero [S] do omeprazol), lanso- prazol, dexlansoprazol, pantoprazol e rabeprazol. A via de administração mais comum é a oral, embora existam algumas preparações injetáveis. O omepra- zol é administrado por via oral, mas como se degrada rapidamente em pH baixo, é administrado em cápsu- las contendo grânulos de revestimen- to entérico. Após a sua absorção no intestino delgado, passa do sangue para dentro das células parietais e de- pois para os canalículos onde exerce os seus efeitos. Doses aumentadas causam elevação desproporcional da concentração plasmática (possi- velmente porque seu efeito inibitório sobre a secreção de ácido melhora 10SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA SE LIGA! Os IBPs são mais eficazes quando a célula parietal é estimulada a secretar ácido pós-prandialmente. Como a quantidade de H+-K+-ATPase presente na célula parietal é maior após um jejum prolongado, os IBPs devem ser administrados antes da primeira re- feição do dia. Na maioria dos indivíduos, a administração uma vez ao dia é sufi- ciente para produzir o nível desejado de inibição ácida, e uma segunda dose, que é ocasionalmente necessária, deve ser administrada antes do jantar. A terapia com IBB é indicada nas se- guintes situações clínicas: • Doença ulcerosa péptica: os IBPs são a terapia antissecretora de pri- meira linha no tratamento da do- ença ulcerosa péptica. • Doença do refluxo gastroesofá- gico: os IBPs são indicados em pacientes com doença do refluxo gastroesofágico, inclusivepara o tratamento de esofagite erosiva e como terapia de manutenção em pacientes com esofagite erosiva grave ou esôfago de Barrett. • Síndrome de Zollinger-Ellison: os IBPs, geralmente em altas doses, são necessários para controlar a hipersecreção de ácido gástrico em pacientes com tumores secre- tores de gastrina. • Úlceras associadas a AINEs: os IBPs são indicados na prevenção primária de úlceras gastroduode- nais associadas ao uso de AINE. • Erradicação do Helicobacter pylo- ri: IBPs são componentes de vários esquemas de terapia de primeira linha e de resgate para a infecção por H. pylori. Os IBPs geralmente são bem tolera- dos. Os efeitos adversos dessa clas- se de fármacos são incomuns. Podem incluir cefaleia, diarreia (ambas algu- mas vezes intensas) e rashes. Foram relatadas tonturas, sonolência, confu- são mental, impotência, ginecomas- tia e dores musculares e articulares. Os inibidores da bomba de prótons devem ser usados com cautela em pacientes com hepatopatia ou em mulheres que estejam grávidas ou amamentando. O uso desses fárma- cos pode “mascarar” os sintomas de câncer gástrico. Omeprazol e esomeprazol podem di- minuir a eficácia do clopidogrel porque inibem a CYP2C19 e impedem a sua conversão no metabólito ativo. Embo- ra o efeito nos resultados clínicos seja questionável, o uso concomitante des- ses IBPs com clopidogrel não é reco- mendado devido aos possíveis riscos de eventos cardiovasculares. Os IBPs podem aumentar o risco de fraturas, particularmente se a duração do uso for de 1 ano ou mais. A supressão pro- longada do ácido gástrico com os IBPs (e os antagonistas H2) pode resultar 11SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA Náuseas Diarreia Cefaleia Distúrbios gastrintestinais Fraturas ósseas (o risco aumenta com o uso prolongado; bacia, punho e vértebras) em carência de vitamina B12, porque o ácido é necessário para a sua absorção em complexo com o fator intrínseco. O pH gástrico elevado também pode prejudicar a absorção de carbonato de cálcio. Pode ocorrer diarreia e colite por Clostridium difficile em pacientes que recebem IBP. Os pacientes de- vem ser aconselhados a interromper o tratamento com IBP e contatar seu médico se tiverem diarreia por vários dias. Efeitos adversos adicionais po- dem incluir hipomagnesemia e maior incidência de pneumonia. IBP Ação: inibição da H+/K+- ATPase (bomba de prótons) Principais representantes: Omeprazol, pantoprazol, esomeprazol Vias de administração: Oral, IV Efeitos adversos (incomuns): cefaleia, náuseas, diarreia, efeitos no SNC, ↑ fraturas ósseas Administrar 30-60 min antes da refeição Metabolização hepática via citocromo P450 (principal: CYP2C19) MAPA MENTAL: INIBIDORES DA BOMBA DE PRÓTONS Figura 4. Alguns efeitos adversos do tratamento com IBPs. Fonte: Farmacologia ilustrada, 2016 SE LIGA! O citrato de cálcio é uma op- ção eficaz para suplementar cálcio em pacientes sob tratamento de supressão de ácido, pois sua absorção não é afeta- da pelo pH gástrico. 12SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA secreção de ácido tanto basal quanto estimulada por alimentos em 90% ou mais, mas inúmeros ensaios clínicos indicam que também promovem fe- chamento de úlceras duodenais. No entanto, são prováveis as recidivas depois da suspensão do tratamento. Os principais fármacos usados são cimetidina, ranitidina (algumas vezes combinada a bismuto), nizatidina e famotidina. Há poucas diferenças en- tre eles. O uso desses fármacos dimi- nuiu com o advento dos IBPs. 4. ANTAGONISTAS DO RECEPTOR H2 DA HISTAMINA Os antagonistas do receptor H2 da histamina inibem, competitivamente, as ações da histamina em todos os receptores H2, mas seu principal uso clínico é como inibidores da secreção de ácido gástrico. Podem inibir a se- creção de ácido estimulada pela his- tamina e pela gastrina; a secreção de pepsina também cai com a redução de volume do suco gástrico. Esses agentes não somente diminuem a GastrinaAcetilcolina Histamina Prostaglandina E2 CÉLULA PARIETAL LÚMEN DO ESTÔMAGO Proteinocinase (ativada) Ácido gástrico H+K+ K+ H+ Bomba de prótons A cimetidina bloqueia o receptor H2 da histamina Adenilil- ciclase GiGs ATP AMPc Figura 5. Mecanismo de ação dos antagonistas do receptor H2. GS e Gi, proteínas de membrana que intermedeiam o efeito estimulante ou inibitório do receptor acoplado à adenilil-ciclase. Fonte: Farmacologia ilustrada, 2016 Os fármacos são, em geral, admi- nistrados por via oral e são bem ab- sorvidos, embora também estejam disponíveis preparações para uso intramuscular e intravenoso (exceto a famotidina). Após administração oral, os antagonistas H2 se distribuem am- plamente pelo organismo (incluindo o 13SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA leite materno e por meio da placen- ta) e são excretados principalmente na urina. A meia-vida de todos esses fármacos pode aumentar em pacien- tes com disfunção renal, e é preciso ajustar a dosagem. Os quatro fármacos são igualmente eficazes para a cicatrização das úl- ceras gástricas e duodenais. Contu- do, a recorrência é comum se houver presença de H. pylori, e o paciente for tratado somente com esses fárma- cos. Os pacientes com úlceras indu- zidas por AINEs devem ser tratados com IBPs, pois esses fármacos curam e previnem úlceras futuras de modo mais efetivo do que os antagonistas H2. Os anti-histamínicos H2 também são usados normalmente por infusão intravenosa (IV) para prevenir e lidar com úlceras de estresse agudo as- sociadas com pacientes de alto risco nas unidades de tratamento inten- sivo. Entretanto, como pode ocorrer tolerância com esses fármacos, o uso dos IBPs também vem avançando nessa indicação. Doses baixas de antagonistas H2, atualmente disponíveis em medica- mentos de venda livre, parecem efi- cazes na prevenção e no tratamen- to da queimação (DRGE) somente em cerca de 50% dos pacientes. Os antagonistas H2 atuam somente no controle da secreção ácida. Por isso, eles não aliviam os sintomas por, pelo menos, 45 minutos. Os antiácidos neutralizam de forma mais rápida e eficaz o ácido gástrico, mas sua ação é temporária. Por essa razão, os IBPs são preferidos atualmente no trata- mento da DRGE, especialmente em pacientes com azia grave. SE LIGA! Devido à maior supressão da acidez gástrica em comparação com os antagonistas do receptor H2, o uso de IBP resulta em um controle mais rápido dos sintomas da úlcera péptica e em ta- xas mais altas de cicatrização da úlce- ra. Os IBPs também são mais eficazes na prevenção da toxicidade gastroduo- denal induzida por AINEs e na cura de úlceras gastroduodenais associadas a AINEs quando estes não podem ser descontinuados. Em geral, os antagonistas H2 são bem tolerados. Os efeitos adversos são raros. Têm sido relatados casos de diarreia, tonturas, dores muscula- res, alopecia, rashes transitórios, con- fusão em idosos e hipergastrinemia. Em homens, a cimetidina ocasional- mente provoca ginecomastia e, rara- mente, diminuição da função sexual. Isso provavelmente é causado por sua pequena afinidade por recep- tores de andrógenos. A cimetidina (mas não outros antagonistas do re- ceptor H2) também inibe o citocromo P450 e pode retardar o metabolismo (e, desse modo, potencializar a ação) de vários fármacos, incluindo anti- coagulantes orais e antidepressivos tricíclicos. 14SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA SAIBA MAIS! Ranitidina é retirada do mercado dos EUA (abril de 2020) Após investigação da contaminação com N-nitrosodimetilamina (NDMA), um provável agente cancerígeno humano, a Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos da Améri- ca (EUA) solicitou a retirada imediata de todos os produtos de ranitidina prescritos (incluindo injeção oral e parenteral) e de venda livre. A investigação da FDA descobriu que os níveis de contaminação de alguns produtos da ranitidina, que podem aumentar ao longo do tempo e quando armazenados em temperatura ambiente acima do normal, podem resultar naexposi- ção do paciente a níveis inaceitáveis de NDMA. O teste da FDA não encontrou contaminação com NDMA na famotidina ou cimetidina. Outras autoridades reguladoras em todo o mundo (ex: Health Canada, Agência Europeia de Medicamentos) estão considerando ou adotaram medidas semelhantes. Referência: Vakil, Nimish B. Antiulcer medications: Mechanism of action, pharmacology, and side effects. Post TW, ed. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate Inc. http://www.uptodate.com (Acesso em 24 de abril de 2020). Varfarina Diazepam Fenitoína Quinidina Carbamazepina Teofilina Imipramina A concentração sérica aumenta CimetidinaP450 Metabólitos Figura 6. Interações medicamentosas com a cimetidina. Fonte: Farmacologia ilustrada, 2016 15SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA 5. OUTRAS CLASSES Misoprostol A prostaglandina E2, produzida pela mucosa gástrica, inibe a secreção de ácido e estimula a secreção de muco e bicarbonato (efeito citoprotetor). Mi- soprostol, um análogo da prostaglan- dina E1, está aprovada para a pre- venção de úlceras gástricas causadas por AINEs. ANTAGONISTAS DO RECEPTOR H2 Ação: inibição da secreção de ácido estimulada pela histamina e pela gastrina Principal via de excreção: Renal Uso reduzido com o advento dos IBPs Efeitos adversos (raros): diarreia, tontura, dores musculares, alopecia, rashes, confusão, hipergastrinemia, ginecomastia, diminuição da função sexual Vias de administração: Oral, IM, IV Principais representantes: cimetidina, ranitidina, nizatidina e famotidina MAPA MENTAL: ANTAGONISTAS DO RECEPTOR H2 GastrinaAcetilcolina Histamina Prostaglandina E2 CÉLULA PARIETAL LÚMEN DO ESTÔMAGO Proteinocinase (ativada) Ácido gástrico H+K+ Bomba de prótons O misoprostol estimula o receptor da prostaglandina Adenilil- ciclase GiGs ATP AMPc H+K+ Figura 7. Mecanismo de ação do misoprostol. GS e Gi, proteínas de membrana que intermedeiam o efeito estimulante ou inibitório do receptor acoplado à adenilil-ciclase. Fonte: Farmacologia ilustrada, 2016 16SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA duodenais, mas são menos eficazes para úlceras gástricas. Antiácidos comumente usados são combinações de sais de alumínio e magnésio, como hidróxido de alumínio e hidróxido de magnésio [Mg(OH)2]. O carbonato de cálcio (CaCO3) reage com o HCl formando dióxido de car- bono (CO2) e cloreto de cálcio (CaCl2) e é também uma preparação comu- mente usada. Os antiácidos são usados para o alí- vio sintomático da úlcera péptica e da DRGE. Para eficácia máxima, devem ser administrados após a refeição. SE LIGA! Dada a eficácia dos IBPs, os antiácidos não são utilizados no trata- mento da úlcera péptica. O papel dos antiácidos é limitado ao tratamento da azia associada à doença do refluxo gas- troesofágico intermitente leve. O hidróxido de alumínio tende a cau- sar constipação, ao passo que o hi- dróxido de magnésio tende a produzir diarreia. Medicamentos que se as- sociam a esses fármacos ajudam na normalização da função intestinal. A absorção dos cátions dos antiácidos (Mg2+, Al3+, Ca2+), em geral, não é problema em pacientes com fun- ção renal normal; entretanto, podem ocorrer acúmulo e efeitos adversos em pacientes com comprometimento renal. O uso profilático do misoprostol deve ser considerado em pacientes que es- tão recebendo AINEs e se encontram sob risco moderado ou alto de úlceras induzidas por esses fármacos, como pacientes idosos ou com úlceras pré- vias. O misoprostol é contraindicado na gravidez, pois pode estimular as contrações do útero e causar aborto. Diarreia e náuseas dose-dependen- tes são os efeitos adversos mais co- muns e limitam o seu uso. Assim, os IBPs são os fármacos preferidos para a prevenção de úlceras causadas por AINEs. SE LIGA! O papel do misoprostol na úl- cera péptica é limitado à prevenção de úlceras gastroduodenais induzidas por medicamentos anti-inflamatórios não esteroides. É contraindicado em mulhe- res com potencial para engravidar que não estejam em contracepção. Antiácidos Os antiácidos são o modo mais sim- ples de tratar os sintomas da secre- ção excessiva de ácido gástrico. São bases fracas que reagem com o áci- do gástrico formando água e um sal, para diminuir a acidez gástrica. Como a pepsina (uma enzima proteolítica) é inativa em pH acima de 4, os anti- ácidos reduzem a atividade da pep- sina. Administrados em quantidade suficiente, por tempo suficiente, po- dem produzir fechamento de úlceras 17SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA Sucralfato O sucralfato é um complexo de hidró- xido de alumínio e sacarose sulfata- da que libera alumínio em presença de ácido. O complexo residual possui forte carga negativa e se liga a grupos catiônicos em proteínas, glicoproteí- nas etc. Pode formar géis complexos com o muco, ação que se pensa dimi- nuir a degradação do muco pela pep- sina e limitar a difusão de íons H+. O sucralfato pode também inibir a ação da pepsina e estimular a secreção de muco, bicarbonato e prostaglandinas pela mucosa gástrica. Todas essas ações contribuem para o seu efeito protetor da mucosa. O sucralfato é administrado por via oral, e 3 horas após a administração cerca de 30% ainda estão presentes no estômago. No ambiente ácido, o produto polimerizado forma uma pas- ta persistente que, por vezes, pode produzir uma crosta obstrutiva (co- nhecida como bezoar) que fica presa ao estômago. O sucralfato previne danos agudos quimicamente induzidos na mucosa e cura úlceras crônicas sem alterar a secreção de ácido gástrico ou pepsi- na ou tamponar significativamente o ácido. No entanto, seu uso é limitado ao tratamento inicial da doença do re- fluxo gastroesofágico na gravidez. SE LIGA! Foi relatado que o sucralfato suprime o H. pylori e inibe a secreção ácida em pacientes infectados com úl- ceras duodenais. No entanto, o sucralfa- to não é usado para tratar úlceras pépti- cas, pois os IBPs curam as úlceras mais rapidamente e em maior extensão. O sucralfato tem poucos efeitos ad- versos, sendo o mais comum a cons- tipação. Efeitos menos comuns, além da formação de bezoar gástrico, in- cluem boca seca, náuseas, vômitos, cefaleia e rashes. Pode ligar-se a outros medicamentos se for tomado simultaneamente, incluindo antibióti- cos fluorquinolonas, teofilina, tetraci- clina, digoxina e amitriptilina. Como exige ambiente ácido para ativação, os antiácidos administrados conco- mitantemente ou antes de sua admi- nistração reduzem sua eficácia. Se- melhante aos antiácidos, a retenção significativa de alumínio ocorre ape- nas em pacientes com insuficiência renal. O sucralfato também pode se ligar ao fosfato e levar à hipofosfa- temia. A combinação de sucralfato e antiácidos pode potencialmente am- plificar esses efeitos. Bismuto Às vezes, o quelato de bismuto (dici- tratobismutato tripotássico) é usado em esquemas combinados para tra- tar H. pylori. Tem efeitos tóxicos so- bre o bacilo e também pode impedir 18SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA sua aderência à mucosa ou inibir suas enzimas proteolíticas bacteria- nas. Acredita-se que possua também outras ações protetoras da mu- cosa, por mecanismos que não são claros, e é Outras classes Efeitos adversos: diarreia, náuseas Pode ligar-se a medicamentos se administrados simultaneamente Contraindicado na gravidez (estimula contração uterina) Efeitos adversos: constipação (mais comum) Efeitos adversos: náuseas, vômitos, escurecimento da língua e das fezes Efeitos adversos: constipação (alumínio), diarreia (magnésio) Ação: inibe secreção de ácido e estimula secreção de muco e bicarbonato Ação: proteção da mucosa gástrica Ação: inibição do H. pylori e proteção da mucosa Administrar após refeição Ação: reagem com o ácido, formando água e sal Sucralfato Bismuto Antiácidos Misoprostol MAPA MENTAL: OUTRAS CLASSES SE LIGA! O papel das preparações de bismuto é limitado a parte de um regi- me de antibioticoterapia quádruplo para úlceras em pacientes positivos para H.pylori. amplamente utilizado como medica- mento de venda livre para tratamento de sintomas gastrointestinais leves. Muito pouco é absorvido, mas se a eliminação renal for comprometida, as concentrações plasmáticas eleva- das de bismuto poderão resultar em encefalopatia. Os efeitos adversos in- cluem náuseas e vômitos e escureci- mento da língua e das fezes. 19SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA Profilaxia de úlceras associadas ao uso de AINEs Úlcera péptica DRGE Componente da terapia na infecção pelo H. pylori Síndrome de Zollinger- Ellison DRGE Úlcera péptica Úlceras associadas a AINEs Componente da terapia na infecção pelo H. pylori Tratamento inicial da DRGE na gravidez Dispepsia Alívio sintomático na úlcera péptica ou refluxo esofágico Supressores da acidez gástrica Indicações Representantes: Omeprazol, Esomeprazol, Lansoprazol, Dexlansoprazol, Pantoprazol, Rabeprazol Representantes: Cimetidina, Ranitidina, Nizatidina, Famotidina Indicações Indicações Indicações Representantes: Trissilicato de magnésio, hidróxido de alumínio Indicações Indicações Antiácidos Antagonistas dos receptores H2 Sucralfato Inibidores da bomba de prótons Quelato de bismuto Misoprostol MAPA FUNDAMENTOS DA RELAÇÃO MEDICO PACIENTE 20SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bruntos, Laurence L. Chabner, Bruce A. Knollmann, Bjorn C. As bases farmacológicas da terapêutica de Goodman & Gilman. 12. ed. Porto Alegre: AMGH, 2012. Rang H. P., et al. Rang & Dale: farmacologia. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. Whalen, Karen. Finkel, Richard. Panaveli, Thomas A. Farmacologia ilustrada. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016. Wolfe, M Michel. Proton pump inhibitors: Overview of use and adverse effects in the treatment of acid related disorders. Post TW, ed. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate Inc. http://www.uptodate.com (Acesso em 24 de abril de 2020). Vakil, Nimish B. Antiulcer medications: Mechanism of action, pharmacology, and side effects. Post TW, ed. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate Inc. http://www.uptodate.com (Acesso em 24 de abril de 2020). 21SUPRESSORES DA ACIDEZ GÁSTRICA
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