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Câmpus de Presidente Prudente Curso de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado) Convênio UNESP/INCRA/Pronera TERRITORIALIDADES EM TENSÃO NO VALE DO JEQUITINHONHA: TERRITÓRIOS DE VIDA E TERRITÓRIOS COMO RECURSO DO CAPITAL ENIO JOSÉ BOHNENBERGER Monografia apresentado ao Curso Especial de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio UNESP/INCRA/Pronera, para a obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia Orientadora: Dra. Mirian Claudia Lourenção Simonetti Monitor: Leandro Nieves Ribeiro Presidente Prudente 2011 TERRITORIALIDADES EM TENSÃO NO VALE DO JEQUITINHONHA: TERRITÓRIOS DE VIDA E TERRITÓRIOS COMO RECURSO ENIO JOSÉ BOHNENBERGER Trabalho de monografia apresentado ao Conselho do curso de Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia, campus de Presidente Prudente da Universidade Estadual Paulista, para obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia. Orientador: Dra. Mirian Claudia Lourenção Simonetti Monitor: Leandro Nieves Ribeiro Presidente Prudente 2011 Enio José Bohnenberger TERRITORIALIDADES EM TENSÃO NO VALE DO JEQUITINHONHA: TERRITÓRIOS DE VIDA E TERRITÓRIOS COMO RECURSO PARA O CAPITAL Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do título de Bacharel em Geografia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, submetida à aprovação da banca examinadora composta pelos seguintes membros: Presidente Prudente, novembro de 2011 Ao MST, que faz parte de minha caminhada desde 1989, que nos proporcionou e proporciona tantas oportunidades de lutar por uma vida digna em todos seus aspectos. Que nos permite construir nossa formação em sua totalidade. AGRADECIMENTOS A minha companheira Helenice, que com sua serenidade e ternura me ajuda a enfrentar os desafios da luta por um mundo mais humano e justo; A Ana Clara, que há 8 anos caminha conosco, exalando seu perfume, seu carinho e nos contagiando com sua alegria; Ao Pedro Ernesto, que desde cedo aprendeu a ser poeta para cantar a vida com mais alegria e para ajudar a superar a minha ausência; À Marina, que mesmo distante de minha presença, mas não se ausenta na lembrança e no carinho; Aos meus pais Egidio e Xênia, camponeses que às custas de uma enxada, criaram e educaram sete filhos e filhas. Foi com eles que aprendemos a ser resistentes nesta vida dura que os camponeses brasileiros enfrentam; À Mirian, minha orientadora e toda sua equipe (Alex,...) que me ajudaram a descobrir e a escrever os territórios de vida digna dos camponeses do Vale do Jequitinhonha e do Brasil; Ao Leandro Nieves Ribeiro, pelas contribuições técnicas (gráficos, mapas, tabelas...) e pela paciência e compreensão na correção dos trabalhos. As monoculturas ocupam primeiro a mente e depois são transferidas para o solo. As monoculturas mentais geram modelos de produção que destroem a diversidade e legitimam a destruição como progresso, crescimento e melhoria (...) A expansão das monoculturas tem mais a ver com política e poder do que com sistemas de enriquecimento e melhoria da produção biológica. Vandana Shiva RESUMO O presente trabalho buscou analisar a territorialidade em tensão no Vale do Jequitinhonha.-MG; tendo como referencia os territórios de vida e os territórios como recurso do capital. Portanto as contribuições realizadas neste trabalho estiveram vinculadas de analise a questão agraria no Vale Jequitinhonha, durante os anos de.2009 2011, desde a perspectiva da geografia critica. As informações colhidas durante o tempo de pesquisa permitiram analisar a realidade da estrutura fundiária no município de Jequitinhonha e suas contradições históricas e geográficas no contexto do Brasil. Para o qual se utilizou a metodologia de ação e investigação de trabalhos acadêmicos sobre a regiao, bem como junto as comunidades de resistência camponesa, o que possibilitou compreender as mudanças ocorridas no território. A pesquisa se fundamentou em diferentes modelos de desenvolvimento da produção nos territórios camponês e do agronegócio e também buscou-se compreender a luta pela terra e as formas de resistência dos trabalhadores Sem Terra no território. Palavras chaves: Agronegócio, território camponês. RESUMEN El presente trabajo buscó analizar la territorialidad en tensión en el Vale do Jequitinhonha, en el Estado de Minas Gerais – Brasil; teniendo como referencia los territorios de vida y los territorios como recurso del capital. Por lo tanto las contribuciones realizadas en este trabajo estuvieron vinculadas al análisis de la cuestión agraria en el Vale do Jequitinhonha, durante los años.... desde la perspectiva de la geografía critica. Las informaciones recogidas durante el tiempo de investigación permitieron analizar la realidad de la estructura fundiária en el Municipio de Jequitinhonha y sus contradicciones históricas y geográficas en el contexto de Brasil. Para la cual se utilizó la metodología de acción-investigación participativa junto a las comunidades de resistencia campesina, lo que pemitió comprender las transformaciones ocurridas en el territorio. La investigación se fundamentó en los diferentes modelos de desarrollo de la produción en territorio del campesinado y del agronegocio, también se buscó comprender la lucha por la tierra y las formas de resistencia de los trabajadores Sin Tierra en el territorio. Palavras chaves: Agronegocio, territorio campesino. . Lista de Siglas MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário EMATER- Empresa de Assistencia técnica e extensão rural ATER- Assistência técnica e extensão rural IBGE- Instituto Brsileiro de Geografia e Estatística MST- Movimento dos Trabalhadores |Rurais Sem Terra STR- Sindicato dos Trabalhadores Rurais CODEVALE- Companhia de Desenvolvimento do Vale do Jequitinhonha CEMIG- Companhia Energetic de Minas Gerais DER- Departamento de Estradas e Rodagem BEMGE- Banco do Estado de Minas Gerais BNB- Banco do Nordeste do Brasil IBDF-Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal IEF- Instituto Estadual de Florestas CGIAR- Consultative Group on International Agricultural PSN- Plano Siderúrgico Nacional MRH- Micro-região homogênea MIBA- Mineração Minas Bahia EUA- Estados Unidos da América INCRA- Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária UFJF- Universidade federal de Juíz de Fora EJA- Educação de Jovens e Adultos ITERRA – Instituto Técnico de Capacitação Pesquisa da Reforma Agrária UNESP- Universidade Estadual Paulista Lista de figura Figura 1 - O Vale do Jequitinhonha e as três microrregiões: o Alto, o Médio e o Baixo. ........................................................................................................................................ 26 Figura 2 – Povos Indígenas em Minas Gerais na segunda metade do século XVI. ....... 31 Gráfico 1 – Produção agropecuária no Baixo Jequitinhonha ......................................... 20 Gráfico 2 – Área plantada em lavouras no Baixo Jequitinhonha, segundo o Censo Agropecuário de 2006. ................................................................................................... 23 Lista de quadro Quadro 1 - Principais povos indígenas em Minas Gerais, no século XXI. .................... 32 Quadro 2 - Comunidades rurais no municipio de Jequitinhonha ................................... 64 Lista de tabela Tabela 1 – População urbana e rural .............................................................................. 21Lista de fotos Foto 1 – O leito do rio Jequitinhonha, a cidade de Jequitinhonha, os grotões e as chapadas. Fonte: Decanor Antunes, 2009. ..................................................................... 15 Foto 2 – Médio Jequitinhonha, cujos Vales são mais estreitos, pois as terras são mais acidentadas em relação ao Baixo Jequitinhonha. Na foto, temos à frente a plantação de Eucalipto. Fonte: Decanor Antunes, 2009. ..................................................................... 16 Lista de Mapas Mapa 1 - Localização do Vale do Jequitinhonha e suas microrregiões .................................. 15 SUMÁRIO Introdução ....................................................................................................................... 11 I - Territórios e contradições .......................................................................................... 14 1.1 - A caracterização histórica e geográfica do Baixo Jequitinhonha ................. 14 1.2 - A estrutura fundiária e a produção agrícola do Baixo Jequitinhonha ........... 19 II - O Vale do Jequitinhonha: índios, negros e camponeses ........................................... 26 2.2.1 - O território indígena................................................................................... 27 2.2.2- O território dos negros ................................................................................ 33 2.2.3 - O Território do campesinato: destruição e resistência ............................... 35 III- O território como recurso para as empresas de eucalipto e mineradoras no município Jequitinhonha .................................................................................................................. 44 3.1- As políticas de implantação do eucalipto no Vale do Jequitinhonha ............ 44 3.2 - Uma tragédia anunciada ............................................................................... 45 3.3 - O monocultivo do eucalipto no município de Jequitinhonha ....................... 50 IV - Territórios em disputa: um novo período na luta pela terra .................................... 58 4.1 - A luta por territórios de vida – a luta pela terra na região ............................ 58 4.2 – Os assentamentos como territórios de vida. ................................................. 62 Considerações finais ....................................................................................................... 67 Referências Bibliográficas .............................................................................................. 70 Apresentação Este trabalho foi possível graças ao MST, ao qual ingressei em 1989 ainda no estado do Rio Grande do Sul. Foi lá que aprendemos a ser militantes da vida e enfrentar as elites agrárias deste país, para realizar a tão sonhada Reforma Agrária. Foi no MST que construímos nossa formação política e nos ajudou a assumir a identidade de classe camponesa e trabalhadora. Em 1996 fomos convocados a realizar um trabalho militante no estado de Minas Gerais, criamos raízes por lá e por lá estamos, no ao de 2000 participamos do primeiro curso da Realidade Brasileira em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora. Foi a primeira vez que entramos formalmente em uma Universidade. De 2003 à 2005, o MST nos proporcionou um curso de Ensino de Jovens e Adultos de Nível médio através do ITERRA-RS o qual participamos nos formando em 2005. Nesse período surgiu o trabalho de construção do curso de Geografia em parceria com a UNESP Presidente Prudente, o qual ingressamos em 2007. Este trabalho de pesquisa que resultou na monografia é um aprendizado que construímos coletivamente, portanto fruto de um grande mutirão de pessoas no sentido de buscar conhecimentos para continuar rompendo as cercas do latifúndio, do capital e do saber 11 Introdução Este trabalho de conclusão do Curso de Geografia é um esforço de entender a disputa territorial entre o capital e os camponeses no Vale e no Município de Jequitinhonha, fundamentalmente a terra e a água, em uma região semiárida como é o Vale do Jequitinhonha. Por ter um dos mais baixos índices de desenvolvimento humano(IDH) do Brasil, o Vale do Jequitinhonha, desde a década de 1970 é conhecido como “vale da miséria”, pelos órgãos governamentais. Verifica-se porem, que esta região já foi uma das mais cobiçadas do país, em primeiro momento para a extração do diamante e das pedras preciosas no século XVII, e logo depois para a expansão da atividade agropecuária. Já a partir de 1970, passa a ser alvo das empresas monocultoras de eucalipto, principalmente o Alto e o Médio Jequitinhonha. Mais recentemente, a a partir de 2005, também o Baixo Jequitinhonha também passa a interessar ao capital monocultor de eucalipto. O que nos chama a atenção para a realização de nosso trabalho, que mesmo o Vale sendo uma região considerada pobre pelos índices de desenvolvimento,tem atraído investimentos por parte do capital. E sempre que aparecem os investimentos, vem junto o discurso de levar o desenvolvimento econômico local, geração de empregos e renda para tirar o vale da miséria e da pobreza. Passados alguns anos se percebe que a população local não melhorou de vida e as tais melhorias não atingiram os seus propósitos. Ou pior ainda, os modelos de desenvolvimento acabam destruindo a cultura local, seus modos de vida e seu território. Dessa maneira, o que se percebe, é uma disputa pelos recursos naturais do território , principalmente terra e água. Os camponeses que esperam e lutam há anos por Reforma Agraria e por melhores condições de vida no campo, acabam sempre ficando de fora destes projetos. A conflitualidade se desenvolve entorno de dois projetos, o do capital, que busca aumentar seus lucros a traves da exploração intensiva dos recursos naturais, e os camponeses que querem melhorar suas condições de vida. Entorno destes dois projetos distintos, acontece a conflitualidade, se por um lado o capital busca se territorializar através de projetos incentivados pelos governantes e pelo Estado, principalmente o monocultivo de eucaliptos. Por outro lado, os 12 camponeses vão criando formas de luta e resistência para manter e até ampliar seus territórios e seu modo de vida. Para a realização deste trabalho, nos preocupamos primeiramente em compilar informações sobre a região, em trabalhos acadêmicos, não se preocupando tanto com a área do conhecimento. também buscamos informações locais com lideranças e pela própria vivencia nossa na região. Para discutir a questão do território, nos referenciamos em vários autores, mas fundamentalmente entendemos o território em seu sentido amplo. Concordamos com Fernandes 2008 de que o ponto de partida para discutir o território é o espaço. “o espaço é a materialização da vida humana”. Ele é por tanto, uma totalidade. As relações sociais produzem espaços, e os espaços produzem relações sociais. o conceito de território no sentido mais amplo, o da multidimensionalidade, defendido por Fernandes, que também considera o território na multiescalaridade, que significa levar em conta as diferentes classes sociais. Por tanto, no nosso entender, o território possui toda essa dimensão da vida. Concordamos com Porto-Gonçalves que afirma que é o espaço apropriado, espaço feito coisa própria, enfim, o território é instituído por sujeitos e grupos sociais que se afirmam por meio dele. Assim, há, sempre, território e territorialidade, ou seja, processos sociais de territorialização. num mesmo território há, sempre, múltiplas territorialidades (apud FERNANDES, 2008,p. 5). Dentro deste processo dialético, é que analisamos a territorialização, tanto dos camponeses, como do capital. Se por um lado o capital vê o território apenas como uma fonte de lucros, o território camponês tem um sentido maisamplo, acontecendo portanto uma disputa territorial. Os projetos que ora estão em disputa, conformam duas paisagens diferenciadas. Por um lado a homogeneidade do agronegócio e por outro a diversidade dos territórios de vida, como afirma Fernandes 2008 A composição uniforme e geométrica da monocultura se caracteriza pela pouca presença se pessoas no território, porque sua área está ocupada por mercadoria, que predomina a paisagem. A mercadoria, é a expressão do território do agronegócio. A diversidade dos elementos que compõem a paisagem do território camponês é caracterizada pela grande presença de pessoas no território, porque é neste e deste espaço que constroem suas existências, produzindo alimentos. Homens, mulheres, jovens, meninos e meninas, moradias, produção de 13 mercadorias, culturas e infra-estrutura social, entre outros, são os componentes da paisagem dos territórios camponeses.(p. 11) Quanto a estruturação do trabalho, dividimos em quatro capítulos. No primeiro buscamos desenvolver os aspectos geográficos e históricos da região, desde sua colonização. As características físicas e sua localização no estado e no país, bem como sua estrutura fundiária. No segundo capitulo a formação do campesinato no Vale do Jequitinhonha, sua destruição e resistência, o território indígena e o território negro. Veremos que mesmo depois de seculos de colonização e povoamento da região, a resistência dos índios, negros e camponeses continua forte. Tanto é que temos ainda 32% da população morando no campo no Baixo Jequitinhonha, enquanto no Brasil, temos apenas 15%. No terceiro capitulo, buscamos desenvolver o território como recursos do capital, principalmente a monocultura do eucalipto. Os projetos que se desenvolveram ao longo de sua colonização e povoamento, bem como os novos projetos que estão sendo planejados para a região. E por fim, no quarto capitulo, trabalhamos com a luta pela terra, sua territorialização na região. A isso chamamos de territórios de vida, onde são construídos as alternativas no enfrentamento ao capital. Desta maneira, o trabalho pretende mostrar a grande disputa que há entre dois modelos de desenvolvimento na região do Baixo Jequitinhonha, os territórios de vida e o território como recurso para o capital. Os resultados de tal disputa são imprevisíveis, mas de qual quer forma, eles se confrontam com certeza, seremos chamados a nos posicionar sobre eles. 14 I - Territórios e contradições 1.1 - A caracterização histórica e geográfica do Baixo Jequitinhonha A mesorregião do Vale do Jequitinhonha está localizada no Nordeste mineiro e faz parte do semi-árido brasileiro que está distribuído em três micros regiões, o Alto, o Médio e o Baixo Jequitinhonha. É chamado de vale, pois o Rio Jequitinhonha atravessa toda sua extensão, em torno de 1080 km, desde sua nascente na localidade de Serro, próximo a Diamantina, até a sua foz no litoral baiano. Sua bacia abrange 63 municípios, sendo 41 totalmente incluídos e 22 parcialmente (IBGE, 1997). A palavra Jequitinhonha, vem dos índios Borun, do tronco Aimoré. “O topônimo Jequitinhonha é de origem indígena e tem o significado de rio largo e cheio de peixes” 1 (IBGE, 2010). O Rio Jequitinhonha foi, na época da colonização, o principal meio de locomoção, tanto para o deslocamento humano, como para o escoamento das riquezas, diamantes, ouro e pedras preciosas. Desde então, as atividades para fins de agropecuária, garimpagem, mineração, represas, desmatamentos etc., têm causado muitos danos ambientais no rio e seu entorno. Mesmo assim, ainda é o principal recurso hídrico da região, responsável pelo suprimento de água de grande parte dos municípios que compõe o vale. Segundo Ribeiro (2004), as características fisiogeográficas do Baixo Jequitinhonha, são de terras planas e férteis, vales abertos e serras com poucas diferenças acentuadas entre ambas, bem diferentes do alto. Nas matas as terras possuem fertilidade bastante uniforme e, embora também formada por vales e serras, apresentam diferenças pouco acentuadas de uso dos solos entre terras altas e baixas. Vales largos, cobertos por florestas, chapadas extensas e férteis, grandes áreas planas formando horizontes abertos marcam o Baixo Jequitinhonha. (RIBEIRO, 2004, p.05) 1 Página do IBGE: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 15 Mapa 1 Foto 1 – O leito do rio Jequitinhonha, a cidade de Jequitinhonha, os grotões e as chapadas. Fonte: Decanor Antunes, 2009. A ocupação do Vale do Jequitinhonha inicialmente se deu pelos índios Borun, que no século dezoito se viram ameaçados e perseguidos pelas expedições portuguesas em busca de ouro, posteriormente vieram os colonizadores em busca da terra fértil e “sem dono” 2 . 2 Terras livres, não ocupadas economicamente pelos colonizadores. 16 Foto 2 – Médio Jequitinhonha, cujos Vales são mais estreitos, pois as terras são mais acidentadas em relação ao Baixo Jequitinhonha. Na foto, temos à frente a plantação de Eucalipto. Fonte: Decanor Antunes, 2009. Segundo Silva 2008, “a história do município do Jequitinhonha é a história da guerra contra os índios Borun”. O povoado que deu origem ao município se formou a partir da instalação do quartel da Sétima Divisão Militar, denominado Quartel de São Miguel, conforme descreve o Diário do Executivo: A origem de sua fundação, como a de várias cidades baianas e mineiras, assenta-se nas guerras feitas ao gentio pelos vice-reis e governadores gerais do Brasil desde o primeiro século da descoberta. Sendo a vasta região do Médio e Baixo Jequitinhonha ocupada inteiramente pela numerosa tribo dos Botocudos, determinou que o 4º vice-rei, Vasco Fernandes César de Menezes, que governou o Brasil de 1720 a 1735, que o capitão-mor Antônio Veloso da Silva continuasse nas guerras então feitas ao gentio bárbaro [...]. a criação dos governadores provinciais, continuaram estes nas guerras indiscriminadas para posse do vale do Jequitinhonha. [...] Quando se constituíram, em março de 1808, as divisões militares, não se pensou logo em colocar uma às margens do Jequitinhonha. Foi somente em 1811 que se criou a que ocupa atualmente o povoado de São Miguel, e que lhe deram por comandante o alferes Julião Fernandes Leão (...). Por ter sido o Rio Jequitinhonha considerado diamantífero e pertencente à Coroa todas as riquezas do sub-solo, determinou o governo da Metrópole que o grande rio fosse guarnecido por tropas de dragões (...), distribuiu companhias de dragões numa extensão superior a cinquenta léguas, até os limites da província, que foi 17 escolhida para sede da Sétima Divisão. (DIÁRIO EXECUTIVO, nº. 9 – 15/11/1960, apud, SILVA, 2007). Em sua trajetória administrativa o povoado foi elevado à condição de Vila- Distrito, de vários municípios chegando a pertencer ao Estado da Bahia e por último ao município de Araçuaí. Somente em 1911 é que o distrito vai se constituir como município de Jequitinhonha, elevando os povoados, que são atualmente os municípios de Almenara, Bandeira, Salto da Divisa, Jacinto, Joaíma, Felisburgo, Rubim, Rio do Prado, Santa Maria do Salto, Jordânia e Palmópolis, a condição de distritos e que, mais tarde também terão sua emancipação política. O município do Jequitinhonha ficou confrontando à Leste e Nordeste com o Estado da Bahia, à Oeste com o município de Araçuaí e à Sudeste com o município de Teófilo Otoni (SILVA, 2008). A seguir, a Mapa 1 mostra a localização do Vale do Jequitinhonha no Estado de Minas Gerais e suas respectivas microrregiões. . 18 Mapa 1 – Localização do Vale do Jequitinhonha e suas microrregiões 19 1.2 - Aestrutura fundiária e a produção agrícola do Baixo Jequitinhonha O território do Baixo Jequitinhonha é formado por 16 municípios, tem uma população total de 175.991 habitantes, sendo que 67,6 % residem na área urbana (118.970 pessoas) e 32,4 % na área rural (57.021 pessoas) (BELO HORIZONTE, 2009). Neste sentido, pode-se verificar que a população rural ainda é expressiva nessa região, visto que está acima da média nacional 3 . Vale ressaltar, que parte significativa da população residente na cidade desenvolve atividades no meio rural, trabalho este que pode ser temporário, como nas lavouras de café ou como diaristas, ou, na condição de assalariados nas plantações de banana, eucalipto, entre outros. Desta maneira, verifica-se que a economia da região está ligada ao meio rural, sobretudo pelo fato da região não ter atraído empresas relevantes que proporcionasse a sua industrialização. A exceção é a extração de rochas de mármore e granito, mas como sua extração é mecanizada, os empregos são insignificantes. Há também uma pequena extração de grafite no Município de Salto da Divisa. Segundo os estudos do Ministério de Desenvolvimento Agrário (BELO HORIZONTE, 2009), em 2009, a renda per capta média do território do Baixo Jequitinhonha é de R$ 114,65 ao mês, que é inferior se comparado com outras regiões do Estado e do país. Grande parte das terras dos municípios está ocupada com pastagens (59,7%), seguido das matas (31,1%) 4 . Em seguida vêm as lavouras que ocupam 7,3% das terras (gráfico 1). Ressalta-se que no Baixo Jequitinhonha os plantios de eucalipto são mais recentes a partir de 2005. Já em termos de valor da produção, 62% vêm de origem animal e 30% das lavouras, portanto esses dados dão conta que 92% da economia da região vêm da agropecuária. (BELO HORIZONTE, 2009) 3 Segundo o Censo do IBGE de 2010, o Brasil conta com 15,65% da população no campo, ou seja, 29.852.986 pessoas. 4 Quanto às matas, somente no município de Jequitinhonha há um parque florestal de mais de 50 mil hectares 20 Gráfico 1 – Produção agropecuária no Baixo Jequitinhonha Em termos da estrutura fundiária, a região segue o país, apresentando uma grande concentração de terras. As áreas acima de mil hectares, que representam 2,6% dos estabelecimentos concentram 30% da área total, porém se ressalta que um proprietário pode ter vários estabelecimentos o que demonstra uma concentração maior das terras. Já as propriedades com menos de dez hectares representam 16,4% dos estabelecimentos e detém somente 0,4% da área. Por outro lado, as propriedades acima de mil hectares que ocupam 30% das terras são responsáveis por apenas 6,8% das pessoas ocupadas no meio rural e apenas 12% do valor anual de produção. Enquanto os estabelecimentos com menos de cem hectares, que ocupam apenas 13,3% das terras são responsáveis por 59,5% das pessoas ocupadas e por 38% do valor anual de produção. Estes dados demonstram que o potencial para o desenvolvimento socioeconômico está nos pequenos e médios estabelecimentos (BELO HORIZONTE, 2009). Outra questão a ser ressaltada refere-se ao potencial de desenvolvimento local dos pequenos e médios produtores, pois a dinâmica de produção e comercialização se dá no próprio município, através das feiras livres e do mercado tradicional. Enquanto que os grandes proprietários mantêm uma relação externa ao local e uma maior relação com os municípios de porte médio, tal como o Município de Teófilo Otoni, que se caracteriza como centro regional de serviços. É importante também ressaltar que no Vale do Jequitinhonha existem vários programas governamentais e políticas públicas voltadas para o atendimento da 31,1% 1,9% 7,3% 59,7% Matas Outros Culturas Pastagens Fonte: IBGE, 2006. 21 população mais pobre da região, entre os quais se destacam o programa Bolsa Família que ajuda na complementação da renda familiar. Outra fonte de recursos é a aposentadoria, que muitas vezes é a principal fonte de renda das famílias. O PRONAF (Programa Nacional de Agricultura Familiar) também atua como fonte de recursos para algumas famílias. Em que pese à importância da agricultura na região verifica-se a precariedade com relação à assistência técnica realizada pela EMATER (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural), através do programa ATER (Assistência Técnica e Extensão Rural). Nos 16 municípios do Baixo Jequitinhonha, há apenas 50 técnicos para atender os mais de 57 mil camponeses e fazendeiros da região (BELO HORIZONTE, 2009). Esse dado equivale a um técnico para cada 1140 pessoas do meio rural, isso contabilizando com os técnicos de escritório que não vão a campo, enquanto que seria necessário um técnico para cada 100 pessoas. Ou seja, dentre as políticas publicas dos governos estadual e federal, o desenvolvimento e melhoramento da produção não é prioridade.. Verificamos que o governo federal prioriza os programas assistenciais, tais como o “Bolsa Família”, que não resolvem os problemas das famílias e nem visam a maior autonomia e soberania da população. O município de Jequitinhonha, localizado no Baixo Jequitinhonha, segue a mesma realidade da região. É o maior município em extensão do Baixo Jequitinhonha, com 3517 km², possui uma população de 24.131 habitantes, sendo que destes, 7.070 habitantes residem no meio rural, ou seja, mais de 30% da população total do município. Vale ressaltar que dentre esses habitantes da área rural, estão sete Projetos de Assentamentos de Reforma Agrária, com 372 famílias e aproximadamente 1480 pessoas. Esses assentamentos foram realizados a partir 1990 e possuem as mais diversas orientações políticas: MST, STR, Banco da Terra, além dos assentamentos criados pelo governo estadual. Tabela 1 – População urbana e rural Pop. urbana Pop. Rural Total Jequitinhonha 17.061,00 70,7% 7.070,00 29,3% 24.131,00 Baixo Jequitinhonha 118.970,00 67,6% 57.021,00 32,4% 175.991,00 Minas Gerais 16.715.216,00 85,3% 2.882.114,00 14,7% 19.597.330,00 Brasil 160.879.708,00 84,3% 29.852.986,00 15,7% 190.732.694,00 Fonte: IBGE, 2010 e MDA, 2009. Org: Enio J.B e Leandro N.R. 22 Nos municípios do Baixo Jequitinhonha, como vimos anteriormente no gráfico 1, a produção agropecuária responde por 59,7% de pastagens. Apesar das pastagens serem dominantes, estas contribuem pouco para o desenvolvimento social da região, ao contrário causam impactos negativos no modo de uso e posse da terra, na produção de alimentos e nas relações sociais de produção e provocarem grandes alterações nos ciclos hídricos. Segundo Carneiro e Fontes, estas atividades tem contribuído para ampliação fundiária nesta região, alem de pressionar a agricultura em função da monopolização da terra e contribuição para a redução da mão-de-obra empregada. Segundo o Censo Agropecuário do IBGE de 1995/1996 constatou-se, neste período, uma área total utilizada de 1,157.917 hectares, enquanto, em 2006, a área passou para 1.114.707 ha, isto é, houve uma pequena redução da área utilizada. Contudo, verifica-se que houve uma redução de quase 33% da área utilizada para pastagens, enquanto as matas e florestas mais do que dobraram em sua área utilizada total e as culturas aumentaram de 21.707 para 81.645, isto é, aumentou quase em quatro vezes no período de pouco mais de 10 anos. Isso significa que, está havendo uma tendência de expansão da agricultura e reflorestamento em detrimento das atividades pecuárias, pois se em 1995 as pastagens representavam 85% de toda a área utilizada, em 2006 este valor caiu para 60%. Se, por um lado, a área total utilizada em hectares reduziu-se entre 1995 e 2006, por outro, o número de estabelecimentos rurais aumentou significativamente neste mesmo período. Segundo Belo Horizonte (2009), verifica-se um aumento de 15% no número de estabelecimentos no BaixoJequtinhonha. Dentre os municípios que aumentaram o número de estabelecimentos, Almenara teve 40% de aumento, Divisópolis quase dobrou e Jequitinhonha, em 2006, superou em 3 vezes o número de estabelecimentos de 1995. Isso ocorreu devido aos assentamentos de reforma agrária instalados neste município no período que iremos tratar com mais detalhes no capítulo 4. 23 Gráfico 2 – Área plantada em lavouras no Baixo Jequitinhonha, segundo o Censo Agropecuário de 2006. No gráfico 2, se verifica que a produção agrícola responde por 7,3% da área ocupada e apresenta uma produção diversificada. Dentre os 7,3% da área ocupada por produção agrícola no Baixo Jequitinhonha, em seus municípios as culturas e lavouras permanentes são bastante significativas, sendo a banana o principal produto de Jequitinhonha e Joaíma, o café em Divisópolis, o Coco-da-Baía e o café, os principais produtos de lavouras permanentes de Almenara. O cultivo do café, com 26,7% do total, possui a maior área plantada na região, seguida por feijão (21,5%) e mandioca (21%). Já a produção de Banana está presente em somente 3,2% do total da área plantada. Embora pequena, a produção de banana é destinada ao mercado externo da região, pois é produzido por uma associação de grandes e médios produtores de banana. Com relação ao café, a mandioca, o feijão e outras plantas a área plantada é proporcionalmente superior a da banana (26,7%, 21% e 15,4% respectivamente), e são importantes produções das unidades camponesas, quer para o consumo quer para o mercado local (BELO HORIZONTE, 2009). III - A formação do campesinato no Vale do Jequitinhonha 3.1 – A ocupação do Vale do Jequitinhonha no contexto da formação do Brasil 1,1%2,1%3,2% 8,9% 15,4% 21,0% 21,5% 26,7% Coco-da-baía Milho Banana Cana-de-açúcar Outros Mandioca Feijão Café Fonte: BELO HORIZONTE, 2009. 24 Mesmo que de maneira breve gostaríamos de inserir a história do Vale do Jequitinhonha no contexto da história do Brasil, pois acreditamos que os fundamentos do lugar foram gestados ao longo da história brasileira. Segundo Porto-Gonçalves, em 1492 com o Tratado de Tordesilhas, se constitui um padrão de governar o mundo, a partir desta data se estabelece uma nova historia e uma geografia mundial. Este modelo trouxe consigo a idéia da exploração da natureza e ao mesmo tempo a dominação de alguns homens sobre outros homens, ou seja, da cultura européia sobre outras culturas e povos. E que inclusive num primeiro momento, o ideário dessa dominação se justificava por razões naturais, segundo os quais, certas raças eram inferiores naturalmente. Esse padrão de governar e de dominar pode vir de fora, como pode ser assumido por governantes locais, o que é chamado pelo autor de “colonização do pensamento” (PORTO-GONÇALVES, 2006). Em termos gerais podemos destacar que o Brasil teve três modelos de desenvolvimento. O primeiro e mais longo foi o modelo agroexportador do Brasil colônia, que vai do século XVI ao inicio do século XIX. Desde o inicio da colonização, este modelo econômico esteve voltado para exportação. A maior parte da produção de nossa sociedade era organizada em torno de produtos agrícolas destinados a exportação para a metrópole européia. Assim, o colonizador impôs um modelo ao nosso povo e ao nosso território, onde a prioridade era produzir bens para suprir a necessidade externa em detrimento da necessidade interna. A economia então passou a funcionar em torno do cultivo da cana-de-açúcar, do algodão, da pecuária extensiva, do cacau e mais tarde do café. As principais características deste período foram: o latifúndio por extensão, a monocultura, a venda para o mercado externo e o trabalho escravo (OLIVEIRA & STEDILE, 2005). Esse modelo criou enorme dependência e devido à ela, se implantou um modelo de exportação de matéria prima e produtos agrícolas que vai garantir o mínimo de receita para pagar as importações de produtos industrializados. Para Oliveira (2001) O Brasil desse modo continua sendo uma sociedade apoiada inteiramente, em ultima instancia e organizada para isso na produção em larga escala e estritamente comercial de gêneros primários e semimanufaturados demandados por mercados exteriores. É com essa produção e exportação que fundamentalmente se mantém o Brasil (...) é com essa receita que são pagos os serviços financeiros e outras remunerações aos trustes que aqui operam (p. 297-298). 25 O segundo modelo foi o da industrialização dependente. Com a crise do modelo agroexportador no final da década de 20 do século passado, as elites passam a desenvolver a industrialização, se intensificam a presença de fábricas e aumenta o processo de urbanização. A agricultura passa a produzir matérias primas para a indústria. Esse processo de industrialização se deu com a junção do capital nacional privado e estatal e, capital estrangeiro. Assim começam a vir para o Brasil às grandes transnacionais para implantar suas fabricas. Como essas transnacionais eram detentoras da tecnologia, esse novo modelo continuou a ser dependente do capital estrangeiro. Embora a prioridade fosse implantar indústrias em território brasileiro, as grandes fazendas dedicadas à exportação continuaram intocáveis (OLIVEIRA & STEDILLE, 2005). O terceiro grande modelo surge na década de 1980 com a crise do modelo de industrialização. É o chamado modelo neoliberal. Novamente a economia é subordinada ao capital internacional, só que desta vez ao capital financeiro e já sem o controle estatal. Esse modelo econômico que atua na economia como um todo, passa a ser dominante também na agricultura, o qual recebeu o nome de agronegócio. As principais características deste modelo são: o controle do comercio agrícola por grandes grupos transnacionais; estimulo a implantação de grandes fazendas para produção de monocultivos para exportação; controle das agroindústrias pelos grandes grupos transnacionais; a destruição das instituições públicas voltadas para agricultura. E se intensifica a implantação de um novo modelo tecnológico baseado nas mudanças biotecnológicas. Percebe-se nestes mais de cinco séculos, uma constante dependência externa, com a produção voltada para fora do país; a concentração de renda e riqueza causadora de uma extrema desigualdade no país (OLIVEIRA & STEDILLE, 2005). Desde o inicio da colonização, o modelo de desenvolvimento se dá de forma concentrada. No primeiro modelo a ocupação se deu a partir do litoral nordestino. O segundo modelo se desenvolve nos grandes pólos industriais com a industrialização centralizada, principalmente, em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A região do baixo Jequitinhonha, embora tenha sido ocupado economicamente desde o final do século XVIII com a extração dos minerais, somente verá uma ocupação mais significativa em meados do século XX como veremos nos capítulos a seguir. 26 II - O Vale do Jequitinhonha: índios, negros e camponeses A Mesorregião do Vale do Jequitinhonha é dividida em três Microrregiões, o Alto, o Médio e o Baixo (Figura 1). O Baixo Jequitinhonha, que é o objeto de nosso estudo, tem uma aproximação geográfica com o litoral da Bahia e teve um processo de colonização realizado durante o processo de ocupação da região de Diamantina em meados do século XVIII até o final do século XIX. Figura 1 - O Vale do Jequitinhonha e as três microrregiões: o Alto, o Médio e o Baixo. Fonte: IBGE Havia uma política da Coroa Portuguesa em dificultar ao máximo à ocupação do Baixo Jequitinhonha, para coibir o contrabando, e evitar que a sua riqueza natural se esgotasse rapidamente, pois com o ouro e o diamante brotando a céu aberto, fazendo com que houvesse um rápido deslocamento populacional para esta região. Segundo Moreno [...] vendo isso, a Coroa mandou fechar o caminhoda Bahia para Minas e todos os outros caminhos para as regiões mineradoras. Ninguém saía, nem entrava sem a permissão da Coroa ou de seu representante legal, o Governador. (MORENO, 2001, p. 23). Desta maneira, o Baixo Jequitinhonha só foi ocupado após a decadência do ouro e do diamante nas regiões de Vila Rica (hoje Ouro Preto), e Diamantina, quando não era mais necessário vigiar o contrabando destas riquezas. Assim, a região que antes era 27 vigiada e com um rígido controle para não ser povoada, passa a ser incentivada para a exploração e produção agropecuária, como explica Moreno: Com a mineração em franco declínio, a metrópole propõe a colonização dos sertões do leste mineiro que tinha limites com a mata virgem povoada pelos Borun. As terras desta região, incluindo aqui o baixo Jequitinhonha, deveriam ser ocupadas por colonos para intensificar o comercio e implementar a agricultura, buscando desta forma o povoamento do interior e o abastecimento da corte (MORENO, 2001 pág. 31). 2.2.1 - O território indígena Essa região não foi diferente com seus primeiros ocupantes – os indígenas – o mesmo massacre vivido por outros grupos indígenas em outras regiões do país também assolou os grupos indígenas dessa região. A região do Leste de Minas Gerais foi habitada pelos índios Borun. Os invasores os chamavam de Botocudos, eram os índios mais temidos do povo branco. Segundo Moreno (2001), [...] na definição dos próprios índios, Borun, significava -“os homens verdadeiros”-serve a representar essa nação temida, valente, guerreira e resistente. Enquanto o termo Botocudo é genérico e tem conotação pejorativa e discriminatória, um apelido ofensivo dado aos Aimoré, MORENO,2001 p. 79/80). Esta imensa região passou a ser um território em disputa, entre os índios e os colonizadores. Ainda segundo Moreno, “Através de formas mais variadas de incentivos materiais e morais, expande-se a fronteira colonial e desestruturam-se as comunidades indígenas” (MORENO, 2001, p. 31). Neste período, o leste mineiro era todo coberto pela mata atlântica, incluindo aqui o Baixo Jequitinhonha, o norte do Espírito Santo e o extremo sul da Bahia. Esta região do Baixo Jequitinhonha era todo habitado pelos índios Borun, que no início do século XIX começaram a ser massacrados e em poucas décadas foram dizimados pelos invasores. Oficialmente, o Baixo Jequitinhonha foi colonizado em 1811 com a implantação da Sétima Divisão Militar em São Miguel, hoje município de Jequitinhonha. Houve porem, uma forte resistência indígena em defesa do seu território, e os conflitos eram muito violentos, conforme destaca o trecho seguinte: Na resistência, as tocaias e armadilhas na mata representavam o singular e o forte na tática guerreira dos índios, que ficavam 28 escondidos pela mata, camuflados e colocados em posições estratégicas e invisíveis aos invasores, atirando flechas de modo que deixavam os invasores indefesos (MARCATO, 1979, apud MORENO, 2001, p. 124). Ou como relata Soares (1992), (...) jamais se entregaram, nem renunciaram a sua liberdade, sua independência, nem se submeteram aos que, de forma feroz e impiedosa, os caçaram feito animais, para civilizá-los, e para que eles se transformassem em brasileiros bons, pacíficos e (...) sem identidade (SOARES, 1992 apud, MORENO, 2001, p. 123). Porém, a superioridade dos colonizadores, em uma luta desigual, usaram de todos os meios para eliminar ou escravizar os indígenas. Estes relatavam à Coroa de Portugal que os índios não eram catequizados, eram antropófagos (canibais) exigiram que a Coroa tomasse medidas contra eles. Estes povos indígenas foram declarados inimigos da Coroa de Portugal em 13 de maio de 1808, (o mesmo ano da fuga da corte de Portugal para o Brasil). A coroa ordenou uma "guerra ofensiva e justa" contra os índios para demonstrar a superioridade dos "brancos civilizados". Segundo Moreno (2001), segue alguns trechos da carta de declaração de guerra aos Borun: Sendo-me presentes as graves queixas que da capitania de Minas Gerais tem subido a minha real presença, sobre as invasões que diariamente estão praticando os índios botocudos antropophagos (...) horríveis e atrozes cenas da mais bárbara antropophagia (...) deveis como principiado contra estes índios antropophagos uma guerra ofensiva, sempre em todos os anos, não terá fim, se não quando tiverdes a felicidade de vos senhorear de suas habitações e de os capacitar da superioridade nas minhas reaes armas de maneira tal que movidos do justo terror das mesmas, peçam a paz e sujeitam-se ao doce jogo das leis e prometendo viver em sociedade possam vir a ser vassalo úteis(...) que sejam considerados como prisioneiros de guerra todos os índios botocudos que se tomarem com as armas na mão em qualquer ataque; e que sejam entregues para o serviço do respectivo comandante por dez anos, e todo mais tempo que durar sua ferocidade (...) empregá-los em seu serviço particular (...) concedo a todos os devedores da minha real fazenda uma moratória de durar seis anos(...) (MORENO, 2001.p. 63 e 64). O resultado de tal política foi um verdadeiro genocídio dos povos nativos. De uma maneira rápida e massiva [...] através de cinco meios principais o branco varreu de grande parte do território mineiro os primeiros senhores do mesmo: O trucidamento 29 do indígena; a tuberculose; a água ardente; a sífilis e a varíola. (MORENO, 2001, p.108). Com o massacre indígena abre-se o caminho para o povoamento dos homens brancos e a colonização do território, e ainda no inicio do século XIX, Formam-se os primeiros núcleos de povoamento as margens do rio e seus afluentes, com a agricultura, a pesca e a caça em abundancia, como recursos para a sobrevivência. (MORENO, 2001) Após a ocupação, começaram as concessões de terras em forma de sesmarias e que depois eram vendidas para outros agricultores interessados na exploração. Como explica Ribeiro: Após a ocupação militar sucedeu a concessão de terras na margem do rio, a colonos vindos das povoações próximas do Termo Minas Novas, que recebiam áreas de meia légua quadrada, isentas de impostos por dez anos (...) Assim, a área produtora de algodão se estendia desde as proximidades de Minas Novas até em torno do quartel de São Miguel, tendo como centro comercial São Domingos (RIBEIRO, 1996, apud MORENO, 2001,p. 141). Novamente o Estado assume o papel para a constituição e formação dos latifúndios. Os fazendeiros se instalam e ocupam esta grande região contando com benefícios e incentivos. A atual estrutura fundiária concentrada do Vale do Jequitinhonha teve inicio neste período. Inicialmente, foi dada a concessão de meia légua 5 para desenvolver a agropecuária, mas com a possibilidade autorizada pela coroa de “ampliar à vontade a sua propriedade para o interior e cultivá-la. E no decorrer de meio século, a região já estava habitada”. (MORENO, 2001, p. 138) Assim, o que antes era considerado um grande espaço “vazio” se tornou alvo de interesse dos exploradores. A ocupação deste território vai ocorrendo na medida em que os colonizadores vão criando a sua organização social. Essa organização estará associada às condições climáticas e físicas, como explica Silva (2008). É bom lembrar que entre 1822 e 1850 a concessão de sesmarias no Brasil estava suspensa e não havia uma política de terra, quando em 1850 se institui a política de terra, com a chamada Lei de Terras, essa passou a ser vendida. O povoamento da região se deu ao longo do século XIX, para cá vinham fazendeiros que buscavam ampliar as fazendas para criação do gado (...) Também vinham lavradores tentar a sorte abrindo pequenas posses em volta das fazendas, muitos libertos 5 Uma légua equivale a 6 km. Portanto, meia légua é igual a 3km.30 também vieram tentar a sorte nas matas jequitinhonhense. Primeiramente vieram migrantes das regiões do litoral em direção ao interior e do interior, região de Minas Novas, sentido litoral. A partir da segunda metade do século vieram milhares de baianos que subiam o rio Jequitinhonha, com a seca no final do século aumenta o fluxo migratório para a região, eram pessoas que vinham do norte de Minas, da Bahia e de outros estados do nordeste fugindo da seca. (SILVA, 2008, P.29). Mesmo não tendo uma política de terras definida, em um primeiro momento, as concessões ocorreram até a Lei de Terras de 1850, que abre o caminho para a propriedade privada da terra no Brasil. Porém, esse povoamento não foi tão significativo como se parece. Para Ribeiro (2004), no inicio do século XX esta região ainda era considerada abandonada e com pouco povoamento. Para este autor, até o inicio do século XX, esta região poderia ser considerada como uma grande fronteira agrícola, ou seja, ainda pouco povoada. Segundo Ribeiro (2004) Um bom exemplo da imagem da “parte de cima do mapa” de Minas Gerais está na literatura de viagem de Álvaro Silveira, nas memórias de Frei Olavo Timmers, no estudo de John Wirth, nas lembranças de Ceciliano de Almeida. Para eles esse era um local de doentios e violentos, que contrastavam duramente com o cenário do rural bucólico (RIBEIRO, 2004, p.02). Passados dois séculos de colonização, persiste esse modelo concentrador de terra, de riquezas, que não permitiu que a maioria da população tivesse acesso a ela como proprietários. As matas foram violentamente devastadas, os córregos e rios diminuíram, as cidades cresceram, muitos camponeses migraram para as grandes cidades. Mesmo assim, os camponeses, os negros e os indígenas continuam resistindo física e culturalmente. Estes últimos chegaram a ser considerados em extinção no Brasil. Segundo Soares (2010), “nos anos 70 a população indígena chegou a ser considerada em vias de extinção, com a população estimada em cerca de 100 mil pessoas”. Porem, ainda na década de 1970 é retomado o levantamento da situação indígena, bem como um trabalho junto a estes povos. “A luta da sociedade brasileira em prol da democratização contribuiu para que estes povos pudessem ressurgir no cenário nacional”. (SOARES, 2010, p.171). A luta pela democratização do Brasil, a nova constituição de 1988, permitiu que estes povos indígenas obtivessem importantes conquistas. A demarcação de suas terras, mesmo que de forma lenta e burocrática, foi sem duvida, a mais importante delas, mas também ocorreram avanços nas áreas sociais, como saúde, educação, sustentabilidade entre outras. Estas poucas conquistas obtidas permitiram que os Povos 31 Indígenas pudessem voltar a ter uma expressão política e social importante em nível nacional e internacional. Mesmo vivendo em situações diversas, os povos indígenas representam hoje 256 povos em todo Brasil, com 187 línguas falantes. No Estado de Minas Gerais, a população indígena aproxima-se de 12 mil pessoas, com três línguas falantes: Borun, Maxakali e Pataxó (SOARES 2010, p. 183). Neste caso, não estão incluídos os povos ainda não reconhecidos e nem os indígenas urbanos. Figura 2 – Povos Indígenas em Minas Gerais na segunda metade do século XVI. Fonte: SOARES, 2010. 32 A figura 2 apresenta a ocupação do território mineiro pelas populações indígenas. Verifica-se que essas populações ocupavam toda extensão do que veio a ser o estado de Minas Gerais. Os nomes das cidades representam o nome dos grupos indígenas que foram dizimados. Desde os Araxa no triangulo mineiro até Pankararu em Araçuaí no Vale do Jequitinhonha. - Quadro 1 - Principais povos indígenas em Minas Gerais, no século XXI. Povo Municípios Nº de pessoas Nº de hectares demarcados Krenak Resplendor 200 4039 Pankararu Araçuaí 30 S.I* Xukuru e Kariri Caldas 150 172 Xakriaba São Jõao das Missões e Vale do São Francisco 8000 51900 Caxixó Pompéo e Martinho Campos 74 S.I* Maxakali Santa Helena de Missas, Bertópolis, Ladainha e Teófilo Otoni 1500 5375 Sistematização e organização: Leandro N. Ribeiro e Enio J.Bonhenberger. Fonte: SOARES, 2010. *S.I = Sem informação No quadro 1, os grupos sobreviventes ao genocídio contra essas populações. Nele verificam-se os povos que sobreviveram as terríveis investidas dos colonizadores durante 5 séculos. Em nossa pesquisa não foi possível fazer um levantamento do número de indígenas que habitavam o Estado de Minas Gerais antes da colonização. Mesmo em nível nacional não se tem dados precisos, isso dificulta para fazer um comparativo do numero de povos que habitavam essa região e que foram destruídos. Porem, através da figura 2 podemos ter uma idéia da sua presença no estado de Minas Gerais. É importante ressaltar que dentre as conquistas que estes povos realizaram recentemente, a principal delas foi a retomada de seus territórios, visto que nele é que podem resgatar sua cultura fundamental na construção da identidade indígena. Uma grande dificuldade que estes povos enfrentam ao retomar o seu território, é que suas áreas foram totalmente degradadas ambientalmente pela ação dos latifundiários que estavam em sua posse anteriormente. Hoje, algumas aldeias são construídas no meio do capim colonião. Então o processo de recuperação destas áreas se torna prioritária para que estes povos possam retomar a convivência com a natureza. 33 2.2.2- O território dos negros Os negros tiveram importante contribuição no povoamento da região. O primeiro processo de extração do ouro e do diamante no Alto Jequitinhonha foi através da mão de obra escrava. Antes da abolição, estes já formavam quilombos em vários distritos da região. Segundo levantamentos de Santos & Camargo (2008), já foram localizados 105 comunidades quilombolas no Vale do Jequitinhonha. Os Quilombos significaram para os escravos e a comunidade negra um instrumento de luta e resistência. Segundo Santos & Camargo (2008) a palavra quilombo ou “cachambo” é de origem banto, e significa “acampamento” ou “fortaleza” e foi denominada de quilombo pelos portugueses para referenciar as povoações construídas por escravos fugidos. O Brasil foi um dos últimos países a abolir a escravidão, foram três séculos deste regime de exploração da força de trabalho. Ribeiro (1995) relata que não há números exatos sobre a quantia de negros que foram trazidos para o Brasil através do trafego negreiro. “A coroa permitia a cada senhor de engenho importar até 120 „peças‟, mas nunca foi limitado seu direito de comprar negros trazidos aos mercados de escravos” (RIBEIRO, 1995, p.161). A escravidão se tornou um grande negócio para os europeus, os negros foram transformados em mercadoria “legalizada” pelos brancos. Foram os negros que aumentaram os rendimentos das “empresas açucareiras, auríferas, de algodão, de tabaco, de cacau e café” (p. 161). Sobre as estimativas da quantia de negros pra cá trazidos, Ribeiro afirma que não se sabe oficialmente dos números exatos. Para o autor As primeiras estimativas relativas à quantidade de negros introduzidos no Brasil durante os três séculos de tráfico variam muito. Vai desde números exageradamente altos, como 13,5 milhões para Calógeras (1927) ou 15 milhões para Rocha Pombo (1905), até cálculos muito exíguos, como 4,6 milhões para Taunay (1941) e 3,3 para Simonsen (1937). Lamentavelmente, não há estudos demográficos criteriosamente elaborados que permitam substituir avaliações tão desencontradas por um cálculo bem fundado. (RIBEIRO, 1995, p.161/162). Ainda segundo o mesmo, as estimativas mais próximas foram feitas por M. Buescu (1968), que, Admite um ingresso global de 75 mil negros para o século XVI, 452 000 para o XVII, 3 621 000 para o XVIII e 2 204 000 para o século 34 XIX, o que somaum total de 6 352 000 escravos importados de 1540 a 1860. Esses números, de demografia hipotética, não contam com a quantidade geralmente admitida nas fontes primarias (apud RIBEIRO, 1995 p. 162). Assim, mesmo contra a sua vontade, os negros foram os principais responsáveis pela construção das riquezas do país. Na região diamantífera localizada no Alto Jequitinhonha, a exploração do diamante se deu com a mão de obra escrava, isso possibilitou a formação de quilombos ao longo do vale. Os amplos espaços desocupados ou „incultos 6 localizados no entorno do Distrito Diamantino permitiram, tanto antes como após a abolição, a instalação e sobrevivência, até os dias atuais de inúmeros quilombos (SANTOS & CAMARGO, 2008, p.113-114). Já no Baixo Jequitinhonha que teve uma ocupação mais tardia e era pouco ocupada pela população branca, até início do século XIX, os quilombos foram organizados pelos negros que fugiam da escravidão na região diamantífera e depois da abolição. Pelas dificuldades da região árida do Alto Jequitinhonha, foram se deslocando em direção ao litoral a procura de terras e de trabalho. Segundo os mesmos autores, Até o momento foram levantadas 105 comunidades espalhadas por todo território do vale, a maioria se localiza em grotões e áreas de difícil acesso, enfrentam problemas de toda ordem e são parcamente assistidos pelos poderes públicos (SANTOS & CAMARGO, 2008, p. 114). Os negros foram se instalando em regiões mais distantes, nos grotões de difícil acesso, mas nestes locais distantes que eles puderam permanecer e realizar sua reprodução social. A população quilombola de Minas Gerais, em sua maioria, é oriunda do Sul e Sudeste africano, de origem Banto, mas também foram trazidos escravos do Norte e Nordeste da África, pois estes últimos tinham habilidades na extração de minérios (SANTOS & CAMARGO, 2008, p. 42). A população quilombola no Estado é estimada entre 100 e 115 mil pessoas, sendo que 97% se localizam em áreas rurais. Ainda segundo os estudos do Santos & Camargo (2008), até 2007 haviam sido localizados 435 comunidades quilombolas no estado, sendo que a maioria deles (59,2%) está localizado no Norte e Nordeste de Minas Gerais (SANTOS & CAMARGO 2008, p. 43-47). A maioria destes quilombos, 79% deles, ainda não estão em processo de titulação, 20% em fase de titulação e somente 1 quilombo, dos 435 localizados possui titulação (SANTOS & CAMARGO, 2008, p. 53) 6 Terras incultas segundo o dicionário Caldas Aulete se refere a terras não cultivadas. 35 Os conflitos mais expressivos por que passam essa população quilombola se relacionam a grilagem, 61% e 12% com projetos de silvicultura, ou seja, com eucalipto. Neste sentido, percebe-se, que as comunidades quilombolas enfrentam as mesmas dificuldades que os povos indígenas, os sem terra e as comunidades camponesas na luta pela conquista e manutenção do seu território. 2.2.3 - O Território do campesinato: destruição e resistência Há polemicas no meio acadêmico sobre a formação do campesinato no Brasil. Nosso objetivo nessa pesquisa não é entrar neste debate, mas mostrar alguns aspectos do campesinato na região do Vale do Jequitinhonha. O Brasil até a década de 1950/60 era um país rural, com uma ampla maioria de sua população morando no campo 7 , mas com a aceleração do processo de industrialização (que se inicia na década de 1930, e se acelera nos anos de 1950), é que o país vai se tornando cada vez mais urbano. Em 2010, segundo o censo demográfico do IBGE, aproximadamente 85% da população do país vivem nas cidades. Em que pese essa urbanização, os camponeses tiveram e tem um importante papel na história brasileira, tanto em termos econômicos como políticos e sociais. Os dados indicam que a estrutura agrária brasileira é uma das mais concentradas do mundo. Desde a Lei de Terras de 1850, quando se instituiu a propriedade privada da terra, que foi a base legal para impedir que a terra fosse democratizada para os camponeses e ex-escravos que se viram livres em 1888 através da Lei Áurea. Segundo Stédile (2005) A lei nº. 601, de 1850, foi então o batistério do latifúndio no Brasil. Ela regulamentou e consolidou o modelo da grande propriedade rural, que é a base legal, até os dias atuais, para a estrutura injusta da propriedade de terras no Brasil (STEDILE, 2005, P. 23). É no fim do século XIX e inicio do século XX, em meio à crise do modelo agroexportador, que, nasce, no campo brasileiro, o campesinato. Ainda, segundo Stédile (2005) o campesinato brasileiro nasce por um lado dos aproximadamente [...] dois milhões de camponeses pobres da Europa, para habitar e trabalhar na agricultura nas regiões Sudeste e Sul, do Estado do Espírito Santo para o sul. A segunda vertente de formação do 7 São respectivamente 63,84% e 55,3%. 36 campesinato brasileiro teve origem nas populações mestiças que foram se formando ao longo dos 400 anos de colonização, com a miscigenação entre brancos e negros, negros e índios, índios e brancos e seus descendentes. Essa população em geral, não se submetia ao trabalho escravo e, ao mesmo tempo não era capitalista, eram trabalhadores pobres, nascidos aqui. Impedida pela lei de terras de 1850 de se transformar em pequenos proprietários, essa população passou a migrar para o interior do país, pois, nas regiões litorâneas, as melhores terras já estavam ocupadas pelas fazendas que se dedicavam à exportação (STEDILE, 2005, p. 27). No caso dos camponeses do Jequitinhonha, foi esta segunda vertente que deu a sua origem, através da mestiçagem e dos quilombos. Continua Stédile: Não tinham a propriedade privada da terra, mas a ocupavam, de forma individual ou coletiva, provocando, assim, o surgimento do camponês brasileiro e de suas comunidades. Produto do sertão, local ermo, despovoado, o camponês recebeu o apelido de “sertanejo” e ocupou todo o território do Nordeste brasileiro e nos Estados de Minas Gerais e de Goiás (STEDILE, 2005, p. 27). A ocupação do Vale do Jequitinhonha começa na região de Diamantina, na nascente do Rio Jequitinhonha, com a corrida atrás do ouro no século XVIII. Essa ocupação trouxe um enorme contingente populacional para a região. Porém, a busca do ouro, diamantes e das pedras preciosas fez com que a produção de alimentos ficasse em segundo plano, preferindo importar alimentos de outras regiões. Ao desenvolverem um trabalho sobre a formação do campesinato no Vale, os autores Graziano & Graziano Neto nos relatam: Esse rápido povoamento possuía um objetivo dominante: a descoberta do ouro e das pedras preciosas. Não se estabeleceu, portanto, como consequência, empreendimentos de médio e grande porte que se dedicassem à agropecuária. O abastecimento alimentar e dos meios de produção necessários para a mineração foi satisfeito através de importações de outras regiões brasileiras (GRAZIANO & GRAZIANO NETO,1983, p.86). A extração do ouro levou a uma alta nos preços dos produtos alimentícios, o que induziu a população a produzir alimentos para sua subsistência. Mas somente com a decadência da mineração no final do século XVIII e inicio do século XIX é que a atividade agropecuária comercial irá se desenvolver. A massa da população trabalhadora, homens livres ou escravos libertos ou refugiados (...) dispersaram-se pelo meio rural, dando origem certamente ao campesinato ali hoje estabelecido. O garimpo praticado por essa população nunca deixou de existir, mas passou, com o tempo, a se constituir em atividade complementar a produção agrícola, salvo raros locais onde tem produção marcante. (GRAZIANO & GRAZIANO NETO, 1983, P.86). 37 Mas também ao lado dessa população camponesa surgem as grandes fazendas para produção pecuária comercial. Os antigos empreendedoresda mineração passaram a investir na criação de gado, tropas de muares e comercio com outras regiões. Assim descreveu Silva (2008): Também vieram lavradores tentar a sorte abrindo pequenas posses em volta das fazendas, muitos libertos também vieram tentar a sorte nas matas jequitinhonhense. Primeiramente vieram migrantes das regiões do litoral em direção ao interior e do interior, região de Minas Novas, sentido litoral. A partir da segunda metade do século vieram milhares de baianos que subiam o rio Jequitinhonha, com a seca no final do século aumenta o fluxo migratório para a região, eram pessoas que vinham do norte de Minas, da Bahia e de outros estados do nordeste fugindo da seca. No início do século XX a região era densamente povoada com imensas fazendas criadora de gado e muitos pequenos lavradores que viviam da agricultura que faziam o comércio nas feiras livres. Em suas andanças pela região Tettero (1919, p. 54) assim a descreveu: “Não vendo meios para levar os seus mantimentos a alguma feira, devem contentar-se com empastar os seus lugares, razão porque também por lá infelizmente grassa largamente o mal de colonião”. E outras passagens, ele também lamenta que a falta de estradas e pontes que davam acesso aos distritos do município de Jequitinhonha, para transporte do mantimento, desestimulava a plantação de cereais e induziam a formação de pastos com a esperança de obter algum gado à meia de quatro por um. (TETTERO, 1919, p. 53, apud, SILVA, 2008, p.29). É neste período também que se estabelecem os conflitos pela posse da terra. Como afirmam Graziano & Graziano Neto (1983). Os conflitos pela posse da terra tem como fundamento a tentativa constante dos grandes proprietários de aumentarem seus domínios (territorial, social e político) por sobre os grupos camponeses. Nota-se, inclusive, que o interesse dos grandes proprietários pelo domínio de amplas parcelas de terra dá-se não pela terra em si ou pelo que possa produzir - como mercadoria que se valoriza ou como meio de produção - mas sim pela possibilidade de dominar os homens que trabalham a terra. Dominar a terra é condição essencial para se dominar os homens, para se dominar o trabalho e as atividades políticas dos camponeses (GRAZIANO e GRAZIANO NETO, 1983, p.86). Nota-se a importância da dominação do território para se dominar as pessoas que ali habitam, exatamente pelo fato do território ser uma totalidade, ele se torna multidimensional, ou seja, não se resume aos aspectos meramente econômicos. Em meio a esse processo distinto de relações sociais se dá à criação do campesinato na região. Esse processo foi possível pelas várias relações sociais instituídas na região, como afirmam Graziano & Graziano Neto 38 A nova situação social ao criar um espaço social e físico e liberto da dominação, permite a produção camponesa o estabelecimento de um modo de vida próprio que lhe tem assegurado sua reprodução social. (GRAZIANO e GRAZIANO NETO, 1983, p.87) Este processo da criação e reprodução do campesinato e sua territorialização na região, começada ainda no século XVIII, vai até o inicio de 1970, quando se inicia o processo de desterritorialização, com a expulsão dos mesmos pelas empresas de eucalipto e pastagens. Na década de 1980, parte do território camponês será retomado pelas lutas com Reforma Agrária como mostraremos em nossa pesquisa. A década de 1970 passa a ser um marco no Vale do Jequitinhonha por dois motivos principais. Primeiro o governo através de suas agencias caracterizam a região como “vale da morte”, de “pobreza absoluta”. E no segundo motivo, para combater a pobreza e a miséria propõe o “progresso e o desenvolvimento econômico” como, saída para a condição de miséria da região. (CALIXTO, 2006, p. 06). Para tanto, os governos estadual e federal criaram subsídios para as grandes empresas capitalistas através dos incentivos fiscais, principalmente para incentivar a formação de grandes plantações de eucalipto. Com isso, inicia-se o processo de expropriação do campesinato em todo o Vale do Jequitinhonha. As chapadas que eram utilizadas em comum pelos camponeses são privatizadas. É também nesse período em que se dá uma grande migração de camponeses para São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Apesar deste modelo que expulsa os camponeses, priorizando o modelo capitalista de incentivos as grandes empresas, os camponeses continuaram resistindo, seja através das posses, ou se organizando em sindicatos ou mesmo através das ocupações de terra. Ferreira (2002) realizou uma pesquisa sobre as comunidades tradicionais no Extremo Norte do Estado do Espírito Santo, destaca que o modo de vida das comunidades tradicionais antes da implantação da monocultura do eucalipto naquela região, se baseava em um modo de vida próprio, singular e que apesar das transformações ocorridas no meio rural continua resistindo, Baseava-se no trabalho familiar, no uso predominante extrativista e comunal do meio natural coberto pela floresta tropical litorânea- que supria as necessidades de água, frutas, madeira, ervas medicinais, pescado, caça- e na disponibilidade de terras que permitia o cultivo dos roçados (FERREIRA, 2002, p.05). 39 Assim, as comunidades tradicionais têm seu modo de vida próprio, diferindo conforme as condições climáticas e físicas de cada região. Mas são semelhantes no que se refere aos valores fundamentais relativos ao trabalho, as relações familiares, a convivência com a natureza, bem como os valores morais e religiosos e as relações de parentesco e vizinhança. Tais valores são elementos centrais do modo de vida camponês. Ferreira (2002) ao descrever a cultura camponesa cita Antonio Candido que utiliza o termo “rústico” ao abordar a cultura camponesa, cabocla ou caipira, cujas características são as do “isolamento, da posse da terra, do trabalho domestico” (p.40) para ele a questão organizacional das comunidades é uma forma para garantir sua reprodução social. Para Ferreira (2002), destaca que a terra é um elemento fundamental na cultura destes povos. Para autora, citando Woortman, “a terra camponesa constitui a expressão de uma moralidade (...) algo pensado e representado no contexto de valorações éticas, e não simplesmente como objeto de trabalho ou mercadoria” (p.40). Para Ferreira (2002) o tripé das sociedades camponesas está estruturado na terra, na família e no trabalho. Neste sentido, a autora afirma que o território camponês é o espaço da reciprocidade, A terra é o chão da moradia, „um espaço onde se reproduzem socialmente varias famílias de parentes, descendentes de um ancestral fundador comum‟(WOORTMANN). É o espaço da reciprocidade, principio moral onde a pratica da troca de tempo responde a satisfação das necessidades de trabalho. A troca articula os elementos terra, trabalho e alimentos, que expressam uma relação também moral entre os homens e deles com a natureza. No uso da terra, o trabalho dá-se como valor ético, construindo a família enquanto valor. O valor monetário do trabalho, embora expressão da autonomia camponesa frente à sociedade como um todo, acontece preferencialmente na feira, que é o espaço do negocio, fora do território camponês. (FERREIRA, 2002, P. 40). Para estas comunidades tradicionais, a exploração do homem pelo homem, a busca do lucro, não faz parte do seu cotidiano. Assim, “o limite da produção, momento de deixar de trabalhar, é quando há superexploração da força de trabalho [...] o limite [...] situa-se até onde se mantém uma certa quota de utilização do trabalho familiar” (FERREIRA, 2002, p. 40). Ou seja, a exploração não é aceita pelos camponeses e não se refere apenas a valores monetários, esse princípio também é aplicado na relação homem-natureza, e ai também o cuidado do aproveitamento racional dos recursos naturais para não criar desequilíbrios.Isso para nós é um dos aspectos que caracterizam o território de vidas. Segundo Ferreira Produzir muito além do que se necessita é algo desvantajoso para estas comunidades, pois requer mais tempo de trabalho, que poderia ser usufruído para outras atividades lúdicas, religiosas e de lazer, que 40 ocupam um espaço significativo e valorizado no cotidiano marcado por relações de solidariedade (FERREIRA, 2002, p.40). Desta maneira, o modo de vida destas comunidades tradicionais, não se enquadra no sistema capitalista, de exploração do trabalho, do acumulo de riquezas, da destruição do meio ambiente. Um sistema mundo que valoriza em demasia o avanço da ciência e da técnica e desrespeita os saberes populares acumulados em séculos. Segundo Ferreira, a conceituação teórica sobre modo de vida nasce no século XIX com Karl Marx, que, “entende que as condições de produção material vividas por uma sociedade caracterizam suas diferentes formas de organização social, política e econômica. Entremeados por sua elaboração cultural” (FERREIRA, 2002, p. 43). No campo da Geografia, “esta discussão é iniciada por Vidal de La Blache, cuja elaboração teórica está na formulação do conceito gênero de vida”. (FERREIRA, 2002, p. 43). No entanto, embora gênero de vida e modo de vida apresentam “proximidades de entendimento, permanecem as diferenciações como veremos nas explicações da autora O gênero de vida nasce na Geografia Positivista Francesa que é definida por seu objeto: ciência dos lugares diferenciados a partir das relações sociedade/natureza, onde a escala privilegiada é o lugar. O modo de vida traz as diferenças dos grupos sociais originadas das suas condições materiais, ou seja, a diferenciação social, política, econômica e cultural nascida na produção da própria existência, inserida também no sistema produtivo dominante, onde a escala é a do mundo. (FERREIRA, 2002, p.44, grifo da autora). No Baixo Jequitinhonha, o processo do surgimento dos camponeses se dá de forma muito semelhante com as demais, porém, há uma particularidade que precisa ser registrada. Os primeiros camponeses foram se instalando através de posses, mas uma grande massa que formou a população rural desses camponeses veio junto com os fazendeiros, o que resultou na formação diferenciada de lavradores. Isso se deu na forma: 1) escravos em primeiro momento; 2) agregados, onde o sujeito morava com sua família na fazenda e trabalhava para o fazendeiro embora produzisse para o seu consumo; 3) sitiante lavrador que possuía um pequeno sítio, onde morava com sua família e realizava alguns roçados na fazenda ou prestava serviço em empreitadas ou como diaristas para o fazendeiro; 4) posseiros que ocupavam terras devolutas. A particularidade dos camponeses do Baixo Jequitinhonha é que estas categorias citadas (lavrador, sitiante e posseiro), estavam totalmente dependentes da grande fazenda. Como estes camponeses não tinham seu território, ou mesmo quando tinham era na 41 forma de posse, ou seja, não tinham documentos legais das terras, criou-se então, uma dependência econômica, política e até cultural com relação a grande fazenda. Ribeiro (1997) define a fazenda como “um governo de terras e homens, um poder, e, até uma economia”, que nasceu baseada quase sempre no trabalho dos outros. Silva (2008) analisa esse processo A fazenda foi montada no Nordeste de Minas com base no trabalho escravo, trabalho de índios agregados. As duas características principais da fazenda era o trabalho alheio e a divisão do espaço da fazenda, por parte do fazendeiro, com outros com os quais o fazendeiro mantinha relações de mando, amizade e gerência de tipos e gradações diversas. Mesmo aqueles que não eram obrigados a prestar serviços, eram subordinados por fortes laços morais, outros ligados pelo favor, proteção. Era o fazendeiro quem dizia de quem era a terra, quais as relações que vigeriam ali, a quem se devia respeito e como ele se manifestaria. (SILVA, 2008, p. 31) Assim, as relações sociais estabelecidas no espaço da fazenda, eram de obediência ao fazendeiro, por imposição através da força, ou uma relação de favor e de compadrio, sendo que o fazendeiro se via como um doador que estava “ajudando” alguém, o que muitas vezes também era aceito pelo “favorecido”. O espaço da fazenda era também um lugar de trocas, entre os camponeses e entre camponeses e fazendeiro, e de relações sociais, não era, portanto, somente um espaço de relações econômicas, como explica Silva 2008: “A fazenda no Jequitinhonha (...), na sua origem, não era apenas dinheiro, foi tudo isto e muito mais, foi uma cultura, alem de ser economia” (SILVA 2008, p.31). Ou seja, foi uma dominação econômica imposta pela classe dos fazendeiros, mas também se incorporou uma forma sutil de dominação, através das relações culturais. Como explica Silva (2008): O poder do fazendeiro era tão expressivo que o município era a expressão da fazenda. (...) um mando que se dava (...), tanto pelo exercício da força física violenta, como através da violência simbólica, subordinação e dependência. Eram os fazendeiros que construíam os prédios escolares, igrejas, hospitais e faziam festas etc. (RIBEIRO 1997, apud SILVA 2008, p.32). A partir da década de sessenta mudanças significativas ocorrem na agricultura brasileira, bem como nessa região. Até este período, se combinavam as atividades agrícolas e pecuárias dentro da fazenda. A partir das mudanças tecnológicas incorporadas na agricultura e pecuária, esta relação muda. A pecuária passa a ser predominante no Baixo Jequitinhonha, diminuindo no Médio e Alto. Com isso, vai 42 havendo uma diminuição significativa da produção agrícola e consequentemente a diminuição do contingente de força de trabalho. Segundo Silva (2008), entre 1960 e 1980 o rebanho bovino aumentou em mais de um milhão e meio de cabeças na região. Essa expansão da pecuária se deu, segundo o autor, pelo fato do Vale estar situado na Região Sudeste, próximo aos grandes centros urbanos e próximo do Nordeste brasileiro, as duas regiões com maior concentração populacional do país. Com a mudança das técnicas e da linha de produção mudou também a relação econômica e começa a expulsão do campesinato para a cidade. Há um ditado popular no Vale que certamente está relacionado a este período, “aonde o boi chega o homem sai”. Assim, milhares de camponeses tiveram que abandonar o campo e foram viver na cidade. Para Silva (1990) e Brandão (1974), um elemento importante desse processo foi a participação do Estado na implantação das novas diretrizes para o Vale do Jequitinhonha. Em 1965 é criada a CODEVALE - Comissão de Desenvolvimento do Vale do Jequitinhonha – que passa a coordenar as políticas de implantação de infraestrutura para a região. Em 1971, chega o projeto de eletrificação através da CEMIG (Companhia Energética de Minas Gerais). O DER/MG (Departamento de Estradas e Rodagem), participa desse processo construindo estradas e pontes melhorando o acesso aos municípios. A TELEMIG (Telefonia de Minas Gerais), implanta o sistema telefônico. A Secretaria de Agricultura de Minas Gerais instala 11 escritórios na região para melhoramento na saúde animal. A EMATAER (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural) MG também se instala para prestar assistência técnica, e também instalam 11 postos de comercialização de implementos e produtos para a agropecuária. Ainda como medidas para incentivar o modelo proposto, o Estado também instalou a rede bancaria como o Banco do Brasil, Minas Caixa, BEMGE (Banco do Estado de Minas Gerais), Credireal, BNB (Banco do Nordeste), além de outros bancos Privados (SILVA 2008, p.38). Ou seja, o Estado foi o financiador desse processo através da implantação da infraestrutura e de incentivos para a implantação das novas políticas para a região.
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