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Ângela Maria Pinheiro da Silva Universidade Estadual do Maranhão angela_arquitetura@hotmail.com CENSO ESCOLA DIGNA: a construção de escolas de alvenaria como agente transformador em comunidades rurais Lívia Antunes Furtado Universidade Estadual do Maranhão liviaffurtado505@gmail.com Gabriel Oliveira de Carvalho Azevedo Universidade Estadual do Maranhão eng.azev.civil@gmail.com João Victor Vieira Silva Universidade Estadual do Maranhão vieira.joaosilva@outlook.com Vinícius Capistrano de Paiva Veras Universidade Estadual do Maranhão vcapistrano05@gmail.com 821 9o CONGRESSO LUSO-BRASILEIRO PARA O PLANEJAMENTO URBANO, REGIONAL, INTEGRADO E SUSTENTÁVEL (PLURIS 2021 DIGITAL) Pequenas cidades, grandes desafios, múltiplas oportunidades 07, 08 e 09 de abril de 2021 CENSO ESCOLA DIGNA: A CONSTRUÇÃO DE ESCOLAS DE ALVENARIA COMO AGENTE TRANSFORMADOR EM COMUNIDADES RURAIS A. M. P. Silva, G. O. C. Azevedo, J. V. V. Silva, L. A. Furtado e V. C. P. Veras RESUMO O Programa Escola Digna trata de uma macropolítica educacional, executada no Maranhão, que tem como uma de suas premissas substituir escolas de taipa e/ou materiais precários do Estado, promovendo a universalização do ensino com a oferta de escolas de qualidade. Partindo do pressuposto que um prédio melhor estruturado propicia uma educação de qualidade, que a escola é o centro agregador de uma comunidade pequena e sua construção pode propiciar uma cadeia de mudanças sociais, surgiu o Censo Escola Digna. A pesquisa realizada durante a construção das escolas e perfuração dos poços artesianos mapeou 10 povoados rurais, contemplados com o referido Programa, a partir do levantamento de informações acerca da população, renda, nível de escolaridade, tipo construtivo das casas e acesso à infraestrutura básica dessas localidades. Um ano depois, a pesquisa foi reaplicada, com o objetivo de verificar se tal construção foi um agente transformador nessas comunidades. 1 INTRODUÇÃO A educação no campo tem como principal objetivo construir uma sociedade socialmente equânime, na qual os trabalhadores rurais buscam “garantir o direito à escolarização e ao conhecimento, sem com isso perder seus territórios de vida, trabalho e identidade” (MOLINA e FREITAS, 2011, p. 11), tendo acesso a uma escola com condições físicas e pedagógicas que possibilitem alcançar um ensino de qualidade. Contudo, a educação na zona rural brasileira sempre esteve associada à precariedade na infraestrutura física das escolas e à ausência de saneamento básico naquelas. Neste sentido, Gonçalves (1999, p. 48) aponta que as arquiteturas dos prédios escolares são mais pobres, à medida que estão mais distantes dos centros urbanos. Destacamos que no Brasil, de acordo com o Censo (IBGE, 2010), a população residente em localidades rurais é de 29,9 milhões de habitantes, o que representa 15,65% da totalidade do país. As regiões Norte e Nordeste concetram a maior parte deste contigente, e o Maranhão é o ente federado com mais pessoas vivendo em situação rural (63,07% pop. Urbana / 36,93 pop. Rural). Salientamos, ainda, que o Maranhão ocupa a 26ª posição do Brasil em relação ao IDHM, com índice de 0,639, ficando à frente apenas do Estado de Alagoas. Em relação aos dados da educação, o Estado apresenta índice de 0,562, ocupando a 19ª posição. Conforme o Censo Escolar de 2018, o Brasil possui 56.954 escolas rurais, dentre as quais 8.318 dessas estão localizadas em municípios maranhenses (Censo Escolar Maranhão, 2017). Segundo a Secretaria de Estado da Educação do Maranhão – SEDUC/MA, no ano de 2014 havia no Estado 1.245 escolas funcionando em instalações precárias (galpão, rancho, paiol, barracão etc.) e identificadas como inadequadas para a prática do ensino. Apontamos que a maior parte destas escolas estavam situadas em zona rural. Para melhorar os índices educacionais do Estado como um todo, o Programa Escola Digna, que integra o Plano Mais IDH, foi instituído com a prerrogativa de substituir escolas inadequadas por escolas de alvenaria, além de garantir o abastecimento de água potável com a perfuração de poços artesianos. Afinal, de acordo com Molina e Freitas (2011, p. 25), “a escola do campo pode ser uma das protagonistas na criação de condições que contribuam para a promoção do desenvolvimento das comunidades camponesas.” Relevante citar que para que a Educação Básica aconteça, conforme incumbências descritas pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB), cabe aos Estados e Distrito Federal assegurar o Ensino Fundamental. Entretanto, para que este ensino aconteça de forma plena e justa, citamos Gonçalves (1999), que declara o espaço escolar enquanto elemento significativo do currículo proporcionando possibilidades de interação entre a forma (arquitetura) e a função (pedagógica). Diante desse cenário de precariedade nos edifícios escolares na zona rural e com a possibilidade de substituição de grande parte dessas escolas inadequadas, surgiu a pesquisa intitulada de Censo Escola Digna, que se propôs a investigar por meio de um estudo exploratório quantitativo as localidades contempladas com os programas Escola Digna e Mais IDH1. Aqui fazemos um adendo sobre a necessidade de perfuração de poços artesianos em alguns desses lugares, visto a indisponibilidade de água, inclusive para a construção das escolas. A pesquisa consistiu no levantamento de informações através de instrumentos padronizados (questionários), em que foram observados aspectos referentes aos povoados, a partir da construção da escola, tomando como base a importância e necessidade desse empreendimento na comunidade. As fontes de coletas de dados utilizadas foram: entrevistas por meio de questionários fechados, estruturado com perguntas claras e objetivas; visitação; história de vida; notas de campo; pesquisa bibliográfica. De acordo com Maquiavel (2010, p. 33), “uma mudança sempre lança as bases para a edificação de outra.” Dessa forma, o objetivo da pesquisa é verificar se a escola e perfuração do poço artesiano foi um agente transformador nestas comunidades, buscando apreender se com a implantação de escolas em alvenaria houve: (a) melhoria nas condições sociais de vida dessas populações, ao permitir que famílias, antes sazonais, fixassem suas residências alterando suas condições habitacionais com o aumento na construção de casas de alvenaria e redução do número de casas de taipa; b) melhoria no fornecimento dos serviços básicos, e, consequentemente, impulsionando o desenvolvimento socioeconômico local. O resultado dessa pesquisa é um retrato destas 10 comunidades rurais, através de um banco de dados contendo informações sobre a população atual destes povoados, presença de serviços básicos de infraestrutura, dinâmica socioeconômica, dados acerca do nível de 1 Com vistas a superar o baixo Índice de Desenvolvimento Humano, foi instituído o Plano de Ações do “Mais IDH”, criado em 02 de janeiro de 2015 através do Decreto nº 30.612, que sintetiza a atual política do Governo do Estado do Maranhão em promover projetos e ações com objetivo de superar a pobreza e a extrema pobreza, bem como reduzir a desigualdade social no meio urbano e rural, utilizando estratégia de desenvolvimento territorial sustentável, a partir de uma grande mobilização dos poderes públicos e sociedade civil (SEDIHPOP, 2015). escolaridade, além de registro fotográfico e mapas georreferenciados de moradias e demais equipamentos públicos presente nas localidades. O presente trabalho faz ainda um comparativo entre a primeira fase da pesquisa, realizada em 2018 e a segunda fase, realizada em 2019. Buscamos com esse estudo subsidiar pesquisas futuras que analisem as transformações ocorridas, se é que existiram, em decorrência da construção das escolas e, em alguns casos, da perfuração de poços artesianos. Permitindoa apreensão do cenário socioeconômico predominante no conjunto investigado, pois somente a partir da pesquisa, alicerçando-nos em mecanismos científicos, poderemos responder e constatar se houve aumento no Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) em municípios do Estado do Maranhão e elevação no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). 2 CENSO ESCOLA DIGNA Segundo Marshal (1967), o direito à educação é um direito social de cidadania genuíno porque o objetivo da educação durante a infância é moldar o adulto em perspectiva. Basicamente, deveria ser considerado não como o direito de a criança frequentar a escola, mas como o direito de o cidadão adulto ter sido educado. Na Constituição Federal de 1988, artigo 6º, a educação é reconhecida como um direito fundamental de natureza social (grifo nosso). Ou seja, é um dever do Estado, assegurá-la para todo o povo brasileiro. Molina e Freitas (2011) apontam que sem ação-política-programa esses direitos são letra morta. Neste sentido, Gonçalves (1999, p. 47) corrobora ao indicar que é na “concretização destas condições que o direito declarado não se efetiva” tendo em vista que o “direito à educação, para tornar-se realidade, precisa materializar-se em um sistema que comporte programa, currículo, métodos, espaços físicos, professores e condições de trabalho, entre outros.” Com o objetivo de elevar o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) para o subíndice educação, foi instituído em 02 de janeiro de 2015, por meio do Decreto nº 30.620, o Programa Escola Digna, com objetivo de promover ações voltadas para a qualificação da educação no Maranhão, sendo estas: (a) erradicar as instalações inadequadas para o funcionamento do sistema educacional do Estado; (b) universalizar o acesso para crianças, jovens, adultos e idosos, ao direito fundamental a uma escola de qualidade; (c) acesso à infraestrutura necessária para formação das pessoas como cidadãos livres, conscientes e preparados para atuar profissionalmente nos mais diversos campos da atividade social (SEDUC/MA, 2014). De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e com a Fundação João Pinheiro, o Maranhão já apresenta uma melhora significativa quanto ao IDHM, com o aumento do índice de 0,682 para 0,687, entre 2016 e 2017. No subíndice educação, que mede escolaridade e frequência escolar, o desempenho relativo do Maranhão foi o 3º melhor do Brasil, com variação de 11,99% - de 0,609 a 0,682 (SEDIHPOP, 2019). A Secretaria de Direitos Humanos e Participação Popular do Maranhão indica que isso se deve ao resultado positivo de políticas públicas de enfrentamento às desigualdades sociais, em especial ao Programa Escola Digna que já entregou mais de 800 escolas, considerando construção, reconstrução e reformas de prédios escolares. A pesquisa visa avaliar o papel transformador das escolas na melhora das condições sociais de 10 comunidades rurais, localizadas em 10 Municípios distintos do Maranhão (Vide Tabela 1). O estudo se enquadra no exploratório quantitativo, em que para análise e avaliação dos resultados do programa, foram realizadas pesquisas in-loco, com o objetivo de identificar: (a) escola inadequada substituída, condições e capacidade de atendimento de alunos e localização em relação ao povoado; (b) avaliação do marco zero, nesse caso sendo considerado a instalação da Escola Digna e sua localização dentro do povoado, além da capacidade de atendimento e se houve aumento ou diminuição de demanda de alunos; (c) existência de serviços básicos de infraestrutura, sendo estes: água, energia, tratamento de esgoto, coleta de resíduos sólidos, telefonia e transporte público; (d) dados demográficos do povoado quando da implantação da escola (número de famílias/pessoas, faixa etária, quantidade de casas, tipo construtivo dessas casas e disposição destas em relação ao povoado); (e) presença de equipamentos/serviços públicos de saúde e segurança. Tabela 1 Relação de municípios pesquisados Censo Escola Digna Ranking IDHM Brasil Posição IDHM Maranhão Município Ano de Emancipação Povoado 5.490* 205** Aldeias Altas 1961 Laranjeiras 5.473* 201** São João do Sóter 1994 Jenipapeiro 5.432 191** Santa Filomena do MA 1994 Assentamento Biéi I 5.081 139 Bom Jesus das Selva 1994 Com. Nova Vida 5.027 133 Turiaçu 1870 Bananal 4.965 127 Peritoró 1994 Bacuri 4.881 111 Barreirinhas 1938 Mangas 4.841 111 Vitorino Freire 1952 Centro Novo 4.718 107 Tuntum 1955 Placa Violão 4.718 74 Lago da Pedra 1954 Centro dos Colados *Município entre os 100 com pior IDHM do Brasil / ** Município entre os 30 com pior IDHM do Maranhão *Fonte: PNUD, IPEA, FJP, 2010 Na Tabela 2 são apresentados IDHM para renda, longevidade, educação, além de dados sobre a oferta de abastecimento de água, esgoto e coleta de resíduos sólidos nos municípios pesquisados. Destacamos o baixíssimo IDHM – Educação, uma vez que, de acordo com parâmetros do PNUD o índice de 0,499 já é considerado um valor muito baixo. Tabela 2 Dados do IDHM Censo Escola Digna Dados do IDHM Dados dos serviços de básicos de infraestrutura* Município IDHM IDHM Renda IDHM Longev. IDHM Educação Abastec. de água Esgotamento Sanitário (fossa séptica) Coleta de Resíduos Sólidos Aldeias Altas 0,513 0,500 0,720 0,374 37,68 7,83 29,55 São João do Sóter 0,517 0,486 0,711 0,401 72,18 2,63 12,30 Santa Filomena do Maranhão 0,525 0,461 0,722 0,435 88,93 9,87 25,57 Bom Jesus das Selvas 0,558 0,537 0,751 0,431 68,73 22,00 96,05 Turiaçu 0,561 0,493 0,776 0,461 49,79 7,40 58,27 Peritoró 0,564 0,499 0,774 0,464 73,65 9,70 45,85 Barreirinhas 0,570 0,515 0,752 0,479 81,35 15,70 81,91 Vitorino Freire 0,570 0,563 0,688 0,477 83,11 10,10 83,31 Tuntum 0,572 0,534 0,726 0,483 87,83 11,40 83,67 Lago da Pedra 0,589 0,561 0,724 0,502 80,59 16,90 92,28 *Fonte: IMESC, 2016 2.1 Caracterização Geral Os 10 povoados contemplados com a substituição de escolas de taipa por escolas de alvenaria, caracterizam-se por estarem na zona rural, alguns distantes cerca de 50 km da sede municipal, com acessos de asfalto, piçarra e/ou leito natural que em alguns períodos do ano, em decorrência das chuvas na região, ficam intrafegáveis (Vide Figuras 1 e 2). A idade das comunidades varia de 20 a 50 anos, tendo de 20 até 150 núcleos familiares. Foram entrevistadas 432 pessoas, sendo 212 na primeira fase em 2018 e 220 na segunda fase, que ocorreu em 2019. Foram construídas 9 escolas com 2 salas de aula e 1 escola com 4 salas de aula, esta última no povoado Mangas, em Barreirinhas, comunidade com o maior números de famílias (Vide Figura 3). A seguir, detalharemos os dados da pesquisa, divididos entre o antes e depois das escolas, indicando o projeto arquitetônico executado e suas alterações ao longo do programa; dados sobre a população, nível de escolaridade e renda; da disponibilidade de energia elétrica, água, esgoto e coleta de resíduos sólidos ofertados nestas comunidades. Por fim, a percepção dos moradores quanto à construção da escola. Fig. 1 Acesso ao povoado Laranjeiras, município de Aldeias Altas Fonte: autora, 2019 Fig. 2 Acesso ao povoado Mangas, município de Barreirinhas Fonte: autora, 2019 Fig. 3 Distribuição das casas no povoado Mangas, em Barreirinhas Fonte: autora, 2018 2.2 Do projeto arquitetônico O Programa Escola Digna se configura como o maior programa de substituição de escolas de taipa e/ou materiais precários do Estado do Maranhão. Contudo, segundo Zarvos (2019) um prédio não pode existir somente para quem mora ou trabalha nele, precisa servir a quem convive com ele. Nesse sentido, Bacelar (2015, p. S/N) aponta que “é essencial ter a compreensãocerta do que é o mundo rural (grifo nosso) para o desenvolvimento adequado de políticas públicas para os moradores dessas regiões”, “construindo estratégias que sejam capazes de considerar as especificidades da vida no campo [...] sobretudo, ao garantir o direito à educação aos sujeitos do campo” (Molina e Freitas, 2011, p. 30). Nesse aspecto, o projeto arquitetônico elaborado inicialmente não considerou as características rurais dos lugares onde seriam implantadas. Apesar de ser inegável a melhoria na estrutura física da escola, conforme Figuras 4 e 5, em que foram disponibilizadas duas ou mais salas de aula para se evitar as turmas multisseriadas2, 4 banheiros, sendo dois PCD3, cozinha, despensa, área de serviço, secretaria e pátio escolar. As ressalvas que fazemos ao projeto estão desde o custo da obra, uma média de R$ 375.110,41 por escola, o dobro do custo previsto para a construção de uma escola de duas salas de aula pelo padrão FNDE4. Os inúmeros aditivos por conta de falhas no projeto, a dificuldade em transportar alguns materiais para os locais da obra, dentre eles: a estrutura metálica do telhado, que exigia mão de obra especializada para sua execução (atualmente a estrutura do telhado é em madeira); forro de gesso, cujas placas quebravam durante o transporte, foram substituídas por forro de PVC; placas de granito que serviam de divisórias para os banheiros, foram substituídas por divisória em alvenaria, pois durante o transporte as placas apresentavam avarias. Fig. 4 Antes – UEM Juarez Nunes, Bacuri, município de Peritoró Fonte: autora, 2018 Fig. 5 Depois – UEM Juarez Nunes, Bacuri, município de Peritoró Fonte: autora, 2018 Outros dois pontos que merecem destaque sobre o projeto arquitetônico estão relacionados à forma do telhado e à forma da escola. Conforme Figura 6, podemos verificar que o telhado do pátio está sobreposto à cobertura das salas de aula. Com isso, a queda d’água dessa estrutura faz com que sempre haja goteiras nas salas de aula, inviabilizando, em alguns 2 As classes multisseriadas são uma forma de organização de ensino na qual o professor trabalha, na mesma sala de aula, com várias séries do Ensino Fundamental simultaneamente, tendo de atender a alunos com idades e níveis de conhecimento diferentes. 3 Pessoa com deficiência. 4 Dados dos projetos licitados no ano de 2013 pela SEDUC/MA (COBRAPE-STPC, 2015). períodos do ano, que as salas de aula sejam utilizadas. O segundo destaque está relacionado ao partido arquitetônico, cuja escola é toda aberta, permitindo que tanto a água da chuva invada o pátio coberto, quanto possibilite o acesso de animais às dependências das escolas. Fig. 6 Telhado do pátio sobre o telhado das salas de aula Fonte: autora, 2018 2.3 Sobre a população, nível de escolaridade e renda e tipo construtivo das casas No que concerne à população, nível de escolaridade e renda, apontamos que não houve mudança significativa nos números, tendo em vista que o intervalo entre as pesquisas foi de apenas um ano. No Gráfico 1 apresentamos o percentual de pessoas por faixa etária, em que verificamos que a maioria das pessoas possui idade entre 30 e 59 anos. Também é alto o número de crianças, dessa forma se confirma a demanda pela escola nessas localidades. Gráfico 1 Dados referentes ao nível de escolaridade Fonte: autora, 2020 No Gráfico 2 são apresentados os dados sobre o nível de escolaridade por série. Apontamos para o alto nível de não alfabetizados nos povoados, representando 18% da totalidade. Nesse ponto destacamos que 13 entrevistados mostraram interesse para que seja ofertada a modalidade de Ensino para Jovens, Adultos e Idosos (EJAI) nas escolas. Outros 9 questionaram a viabilidade de turmas para o Ensino Médio. Gráfico 2 Dados referentes ao nível de escolaridade Fonte: autora, 2020 No Gráfico 3 verificamos que a maioria das pessoas vive da agricultura de subsistência, seguido pelo auxílio do Bolsa Família, aposentadoria e demais. Gráfico 3 Dados referentes à renda Fonte: autora, 2020 Em relação ao tipo construtivo das casas, a nossa hipótese é que com a melhoria das condições da escola, ela se torne o prédio mais importante da localidade, possibilitando a criação de uma nova centralidade em seu entorno, havendo também uma mudança no tipo construtivo das casas. Para levantarmos essas informações, na pesquisa de 2018 foram identificadas todas as casas e demais construções do povoado, identificando-as por sua coordenada geográfica, seu tipo construtivo, registro fotográfico e o nome do responsável pela residência. No ano seguinte, fizemos quadrantes nos mapas de cada povoado para localizarmos as edificações registradas anteriormente, com o objetivo de verificar se houve alteração no tipo construtivo das casas (Vide Figuras 7 e 8). Em relação ao tipo construtivo, verificamos uma pequena variação no número de casas de alvenaria e de taipa (Vide Tabela 3). Cabe ressaltar que na pesquisa de 2018 foram mapeadas 212 edificações, para 220 identificadas posteriormente, em 2019. Tabela 3 Tipo construtivo das casas Censo Escola Digna Faixa etária da população 2018 2019 Alvenaria 153 158 Taipa 54 60 Madeira 2 0 Outro Material 3 2 TOTAL 212 220 Fonte: autora, 2020 Fig. 7 Identificação das casas no povoado de Mangas, em Barreirinhas Fig. 8 Identificação das casas no povoado de Laranjeiras, Aldeias Altas Fonte: autora, 2020 2.4 Do acesso aos serviços de infraestrutura De acordo com o Censo (IBGE, 2010) a falta de água potável, o atendimento precário ou mesmo a ausência de abastecimento atinge pelo menos 34,5% da população residente em localidades rurais. Para as escolas rurais, o Censo Escolar (2014) aponta que apenas 27% daquelas possuem rede com abastecimento de água, 59% dependem de poços artesianos, poço cacimbão ou fontes naturais e 14% não dispõe de qualquer serviço de água. No que se refere ao esgotamento sanitário e manejos de resíduos sólidos nas comunidades rurais, estes números são ainda piores, em que as áreas atendidas representam apenas 17,1% e 26,9%, respectivamente. Já em relação aos prédios escolares apenas 5% desses possuem esgoto encanado, 80% utilizam fossas e 15% não dispõe de qualquer estrutura para tratar os resíduos. Sobre a pesquisa, em 2018 e 2019, verificamos que o fornecimento de energia elétrica ocorre em 100% das casas dos povoados. Em relação à água, na Tabela 3 são indicados os tipos de fornecimento em relação às casas. Destacamos que para o poço da comunidade, em três localidades a água somente foi disponibilizada a partir da perfuração do poço para atendimento da escola, sendo nos povoados de Jenipapeiro (São João do Sóter), Bananal (Turiaçu) e Mangas (Barreirinhas). Tabela 4 Dados referentes ao abastecimento de água Censo Escola Digna Tipo de fornecimento de água 2018 2019 Água da chuva armazenada em cisterna 5 4 Poço próprio 12 39 Poço da comunidade* 179 151 Rede de abastecimento 3 10 Poço cacimbão 13 16 TOTAL 212 220 Cabe destacar que quando questionados sobre a percepção de melhorias advindas com a construção da escola, 22 entrevistados citaram que a perfuração da poço e, consequentemente, o fornecimento de água foi mais relevante que a construção da própria escola. Na Tabela 5 são apresentados os dados de esgotamento sanitário. Chama atenção o elevado número de fossas rudimentares e de residências sem qualquer tipo de tratamento para o esgoto. Nesse ponto, ressaltamos uma curiosidade relatada pela gestora da Escola Municipal Gonçalves Dias5, cujas crianças precisaram ser ensinadas pelas professoras a utilizar o vaso sanitário, visto ser a primeira vez que estavam tendo contato com tal objeto. Essa situação desencadeou outra, pois as crianças agora se recusam a fazersuas necessidades fisiológicas no quintal. Elas relatam ter medo de serem importunadas pelas galinhas, patos, porcos e outros animais. Com isso, tem sido constante os pedidos aos pais para instalarem banheiros com bacias sanitárias e chuveiros em suas casas. Tabela 5 Dados referentes ao esgotamento sanitário Censo Escola Digna Tipo de esgotamento sanitário 2018 2019 Fossa rudimentar (fossa negra) 114 114 Fossa séptica 91 96 Sem informação 7 10 TOTAL 212 220 5 Nas proximidades do povoado, nasceu o romancista Antônio Gonçalves Dias, poeta maranhense. Em relação ao resíduo sólido, apontamos que a maior parte deste é queimada (Vide Tabela 6), visto que os povoados são distantes das sedes municipais. Apenas o povoado de Centro dos Colados, em Lago da Pedra, dispõe do serviço de coleta pela Prefeitura Municipal. Destacamos que esta comunidade dista apenas 5 quilômetros da sede municipal. Tabela 6 Dados referentes aos resíduos sólidos Censo Escola Digna Quando ao destino dos resíduos 2018 2019 Coletado na porta 39 35 Enterrado 18 3 Jogado em terreno baldio 21 13 Queimado 134 169 TOTAL 212 220 Fonte: autora, 2020 2.5 Da percepção dos moradores quanto à construção da escola Na Figura 9, apresentamos um infográfico sobre a percepção das pessoas em relação à construção da escola. Fig. 9 Infográfico com a percepção das pessoas quanto à construção da escola Fonte: autora, 2020 4 CONSIDERAÇÕES Somente através de políticas públicas no meio rural, que priorizem a agricultura familiar e o modo de vida da população do campo, será possível permitir às pessoas viverem em comunidades estruturadas, nas quais seja fomentada a economia local, educação e/ou serviços básicos de infraestrutura. Analisando os primeiros dados do Censo Escola Digna, percebemos que a construção das escolas nos povoados tem sido apreendida como favorável, ao possibilitar melhorias a essas comunidades e aumento na frequência dos alunos nas salas de aula. Outro fator crucial de transformação ocorre naquelas localidades onde houve a perfuração do poço artesiano, pois a água é essencial para a vida e sua reprodução, principalmente, ao se constatar que mais da metade das pessoas entrevistadas tem como principal fonte de renda a agricultura, que depende essencialmente da água para a sua produção. Contudo, ainda não é possível mensurar se a escola desempenha o papel de agente transformador nas comunidades, uma vez que esta avaliação necessita de um intervalo maior de utilização do prédio escolar pela população. Todos os dados dessa pesquisa estão arquivados num banco de dados, para subsidiar futuras pesquisas, tornando possível pensar em políticas públicas que atendam a essas populações desassistidas, almejando que as Escolas Dignas sejam agentes de transformação e, consequentemente, impulsionem o desenvolvimento socioeconômico local e os Índices de Desenvolvimento Humano Municipais (IDHM). 5 REFERÊNCIAS BRASIL (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. Censo IBGE (2010). Disponível em:<https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ma/panorama> Acesso em 14 de novembro de 2019. Censo SEDUC 2014, 2015, 2016 e 2017. (Disponibilizado pela Secretaria de Estado da Educação do Maranhão). Decreto nº 30.612, de 02 de janeiro de 2015. Disponível em:<http://www.cpisp.org.br/htm/leis/page.aspx?LeiID=547> Acesso em Acesso em 14 de novembro 2019. GONÇALVES, Rita de Cássia. A Arquitetura Escolar como materialidade do direito desigual à educação. Ponto de Vista v. 1 • n. 1 • julho/dezembro de 1999. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/pontodevista/article/view/1520/1529 MAQUIAVEL, N. (1996) O Príncipe. Tradução de Maria Lucia Cumo. Rio de Janeiro. MARSHALL, T. H (1967) Cidadania, Classe Social e Status. Rio de Janeiro. MOLINA, M. C.; FREITAS, H. C. D. A. (2011) Educação do campo. Em aberto, Brasília, v. 24, n. 85, p. 177, abr 2011. PNUD Brasil IDH. Disponível em: <http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/post- 2015/sdg-overview1/mdg2/. Acesso em 14 de novembro de 2019. https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ma/panorama http://www.cpisp.org.br/htm/leis/page.aspx?LeiID=547 http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/post-2015/sdg-overview1/mdg2/ http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/post-2015/sdg-overview1/mdg2/
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