Buscar

Redação Morte

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Urgência de viver 
Assunto proibido, atrai mau agouro se falar, arrepia só de pensar, tabu moderno, nem ouse conversar... Mas, ainda assim, uma hora ela vai chegar: a morte. Na contemporaneidade é tabu falar sobre a morte e o morrer, e não teria como ser diferente, afinal, a concepção ocidental acerca do tema e das suas representações sociais se transformou ao decorrer do tempo. Além disso, o sistema social vigente também exerceu uma leve – ou nem tão leve assim - influência nesse processo de mudança, você já pensou nisso ?
O cotidiano corrido e sufocante nos coloca diante de uma rotina que consiste em estudar, trabalhar e produzir, seguindo padrões socialmente aceitos e rejeitando aquilo que não é bem visto. Assim, vamos seguindo de uma forma repetitiva os caminhos que foram traçados por aqueles que vieram antes de nós, alguns dias refletimos um pouco, outros apenas seguimos no piloto automático. Com isso, vamos nos esquecendo de nossa finitude, deixando a vida em segundo plano e ignorando a existência da morte. Nesse processo, somos compelidos a acreditar que só existe um caminho possível, somos tomados pelo discurso produtivista que sussurra diariamente em nossos ouvidos “você precisa fazer isso para ter sucesso”, “você está procrastinando”, “faça mais, seja mais, produza mais”. Logo, deixamos de lado a urgência, a urgência maior, a Urgência de Viver.
 E se nós fôssemos lembrados com constância da nossa finitude ? E se nós fôssemos confrontados pela existência iminente da morte ? Será que dessa forma viveríamos a vida diferente ? Será que teríamos pressa em viver, pressa em ser feliz ? Será que nós priorizaríamos mais o nosso bem-estar e menos a ideia de produzir até à exaustão ou até conseguir um suposto “sucesso” – e o que seria sucesso ? Talvez a linha de chegada nem exista, pois à medida que corremos em busca de algo, novas necessidades são criadas e moldadas para que no fim sejamos capazes de validar o mesmo discurso que nos gera angústia. 
O que eu quero dizer com tudo isso é que nos afastamos não somente da concepção de morte, mas também da vida. A negação moderna em abordar a morte e o morrer com também representou uma ausência da própria vida, uma vez que, quando esquecemos da nossa finitude, valoramos menos o breve espaço de tempo em que estamos aqui, vivendo e modificando o mundo. Ontem fomos, hoje somos, amanhã talvez...
Além disso, o processo de morte e o morrer também desvelam traços cruéis da nossa sociedade, como a desigualdade social e a desumanização dos corpos. Sendo assim, na estrutura em que vivemos não existe nada menos lucrativo do que a morte, pois a morte representa a improdutividade de um corpo sem valor para o mercado - sintomas do capitalismo... E assim as desigualdades também começam a aparecer, tendo em vista que podemos constatar a existência de uma morte distinta para pessoas de distintas classes sociais – alguns com pompas e artifícios, outros desovados e desumanizados. Sim, nem morrer é de graça e a espera incerta de uma morte digna revela que possuímos falhas enquanto sociedade. 
No fim, talvez você se pergunte o que essas coisas têm a ver com saúde mental, mas não podemos nos esquecer que somos seres biopsicossociais e que tudo ao nosso redor pode vir a exercer influência em nossa saúde mental e em nossa qualidade de vida. O afastamento do nosso próprio eu e da vida reverbera em todas as instâncias do nosso ser. Portanto, espero que possamos valorizar mais a vida, nos aproximar de quem somos e do que nos faz felizes para além daquilo que produzimos. Que possamos ser felizes, lembrar da vida e de nossa finitude de maneira saudável e repleta de esperanças de dias melhores, mesmo que nem em todos isso seja possível. 
No fim, eu e você, nós deveríamos ter medo da morte ou do não viver ?

Outros materiais