Prévia do material em texto
1 MEDICAÇÃO PRÉ-ANESTÉSICA – REVISÃO DE LITERATURA Luiz Henrique Gil BOLFER1, Leticia FANUCCHI1, Eli Cristina Martins DA SILVA1, Cássia Maria Enes Santos LANZA1, Marcelo MEYER1, Amanda SOTELO1, Roseli Borges TEIXEIRA2. 1 INTRODUÇÃO A medicação pré-anestésica (MPA) é um procedimento que antecede a anestesia geral, proporcionando ao paciente uma agradável indução anestésica. Assim, minimiza os efeitos indesejáveis, como a irritabilidade, euforia, salivação, vômito, regurgitação, proporcionando sedação, analgesia, potencialização dos anestésicos gerais e condições favoráveis de trabalho, entre outros. Constitui a primeira etapa para manipulação de pacientes quando seu relaxamento é requerido. A MPA é classificada em fármacos anticolinérgicos, tranqüilizantes, hipnóticos e hipnoanalgésicos (MASSONE, 1999). A MPA apresenta algumas vantagens, como: 1) redução da dor e do desconforto: devido a alguns fármacos apresentarem efeito analgésicos, mas não promovendo uma anestesia; 2) viabilidade de indução direta por anestésicos voláteis: onde o paciente aceita a indução pelo odor agradável, rejeitando odor acre como éter; 3) adjuvante da anestesia local: onde o paciente não permite manipulação mesmo não sendo um procedimento doloroso; 4) redução de risco de excitação pela anestesia barbitúrica, o que reduz o desconforto para o paciente e para o profissional; 5) redução do ptialismo e da sialorréia: que pode aumentar consideravelmente devido alguns fármacos como o cloridrato de xilazina e cloridrato de quetamina por exemplo, além disso uma salivação excessiva poderia obstruir as vias respiratórias; 6) redução de bloqueio vagal na indução por barbitúricos: a indução direta por barbitúricos, sendo metade da dose administrada rapidamente, libera ação simpática, que é indesejável em pacientes com distúrbios cardiocirculatórios (MASSONE, 1999). 1. Alunos do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Tuiuti do Paraná 2. Professora Mestre do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Tuiuti do Paraná. 2 Nessa condição a MPA minimiza tais efeitos; 7) redução do metabolismo basal: alguns fármacos deprimem o sistema nervoso central sem causar transtornos ao animal; 8) potencialização com outras drogas anestésicas: alguns fármacos podem causar sinergismo quando administrados em associações; 9) ação termolítica: fármacos como os fenotiazínicos podem causar queda da temperatura corporal sendo aconselhados em caso de hibernação artificial (CORTOPASSI, 2002, FANTONI, 2002). 2 ANTICOLINÉRGICOS Os anticolinérgicos: conhecidos também parassimpatolíticos, colinolíticos, atropínicos, alcalóides da beladona. Os agentes anticolinérgicos antagonizam os efeitos muscarínicos a nível periférico da acetilcolina. São utilizados para reduzir a salivação e a secreção bronquial, bloquear os efeitos dos impulsos do nervo vago e o efeito produzido por certas drogas que estimulam o sistema parassimpático (CORTOPASSI, 2002, FANTONI, 2002). Os agentes mais utilizados são: atropina, bromidato de escopolamina e glicopirrolato (MASSONE, 1999). A Atropina é utilizada desde o início do século quando se empregava o éter como anestésico, é obtida a partir de uma planta Atropa belladona, sendo encontrada no comércio sob a forma de sulfato. Possui sabor amargo e pH em torno de 5,4, com tempo se ação variando de 60 a 120 minutos. A sua dose é de 0,044 mg/kg (IV, IM, SC) e a dose máxima 1,5 mg (cães) (FUTEMA, 2002, LIN, 1996). É destruída no fígado pela ação da enzima atropina esterase, sendo uma parte excretada intacta pelo rim; reduz a secreção mucosa no trato respiratório com ação broncodilatadora; relaxa a muscultura da íris; não causa alterações significativas no SNC; aumenta o espaço morto; reduz o peristaltismo e a atividade secretora no trato gastroentérico; causa discreta taquicardia (CORTOPASSI, 2002, FANTONI, 2002). A atropina é contra-indicada em pacientes com taquicardia, arritmias, febre e tiroxicose. A atropina não possui antagonista. O Bromidato de escopolamina, conhecida também como hioscina, pertence ao grupo alcalóide da beladona e difere da atropina por apresentar um átomo de oxigênio a mais em sua molécula. Seu tempo de ação varia de 30 a 60 minutos. A sua dose é de 0,01 a 0,02 mg/kg pela via subcutânea. Possui maior ação sobre as glândulas salivares, brônquicas e sudoríparas do que a atropina causando uma taquicardia mais discreta; é dez vezes mais potente que a atropina na diminuição do tremor postural; produz adinamia e 3 sonolência; doses altas podem causar êmese, alucinações e ataxia; não é aconselhada em animais idosos. O glicopirrolato, possui pequena capacidade de atravessar a barreira hematoencefálica e hematoplacentária; promove menos taquicardia, minimizando os efeitos adversos. Seu tempo de ação varia de 120 a 240 minutos (MASSONE, 1999). 3 TRANQUILIZANTES Os Tranqüilizantes são fármacos que acalmam a agitação e a hiperatividade, sem produzirem estado de sedação. Perda ou redução da consciência, sendo conhecidos também como agentes ataráticos (“livre de confusão” ou “mente em paz”) (CORTOPASSI, 2002, FANTONI, 2002). Proporcionam discreta analgesia não permitindo intervenções cruentas. Os tranqüilizantes compreendem o grupo das fenotiazinas (clorpromazina, levomepromazina e acepromazina), butirofenonas (droperidol, haloperidol, azaperone) e benzodiazepínicos (diazepan, midazolam). Quando se administram derivados fenotiazínicos nota-se dismetria, deambulação, adinamia, apatia, sonolência e indiferença ao ambiente. Ao contrário dos fármacos sedativos, o incremento nas doses não aumenta o grau de tranquilização, apenas os efeitos adversos. Portanto, quando se deseja maior traquilização deve-se associar agentes opióides ou outros, pois apesar de não possuírem ação analgésica potencializam fármacos analgésicos (MASSONE, 1999). O principal efeito observado com o uso de fenotiazínicos é a hipotensão arterial resultante do bloqueio de receptores α-1-adrenérgicos periféricos. A redução da pressão arterial é dose dependente podendo causar taquicardia reflexa e aumento da concentração de catecolaminas circulantes. Pode ocorrer ainda depressão miocárdica, hipotermia, aumento de perfusão cutânea e visceral, ação antiarrítmica, diminuição da concentração de hemoglobina e vasodilatação esplênica. Em animais braquicefálicos é aconselhável o uso de baixas doses 0,05mg/kg e optar pela via intramuscular. Em relação ao sistema respiratório os fenotiazínicos promovem pouca depressão respiratória mas podem potencializar a ação depressora de outros agentes principalmente dos anestésicos gerais. Os fenotiazínicos não devem ser empregado em pacientes em estado de choque de grau moderado a grave, com histórico de epilepsia (que não esteja controlada) e nas cardiopatias. 4 4 BUTIROFENONAS As butirofenonas (droperido, haloperidol e azaperone), agem sobre a formação reticular mesencefálica, causando boa sedação e tranquilização mas sem reação bifásica como a provocada pelas fenotiazinas. Potencializa a ação de barbitúricos. Pode causar efeitos colaterais, como alucinação e até agressividade sendo seus efeitos dose dependente. Causa discreta hipotensão pelo bloqueio α- adrenérgico. Previne a emese induzida por alguns fármacos, como analgésicos opióides. Por isso são empregadas na neuroleptoanalgesia (MASSONE, 1999). 5 BENZODIAZEPÍNICOS Os benzodiazepínicos facilitam a neurotransmissão das sinapses GABAérgicas, promovendo aumento da freqüência de abertura dos canais de cloro. Os seus receptores estão amplamente distribuídos principalmente no córtex e estruturas límbicas. O GABA é o principal neurotransmissor inibitório do SNC de mamíferos. Reduzem a agressividade, provocam amnésia e alterações psicomotoras, possuem ação ansiolítica, hipnótica, miorrelaxante (no nível dos neurônios internunciaisna medula espinhal, diminuindo a quantidade de informação nociceptiva nos m´-usculos espásticos para a medula espinhal) (HELLEBREKERS,L.J.) anticonvulsivante e praticamente nenhuma ação analgésica, excetuando-se o diazepan que possui discreta ação analgésica. Os benzodiazepínicos (diazepan e midazolan que são os mais empregados) possuem diferenças em relação ao período de latência, duração e intensidade dos efeitos. Possui boa lipossolubilidade, distribuindo-se para todos os tecidos atravessa a barreira hematoencefálica com facilidade, bem como a barreira placentária aumentando a chance de anomalias congênitas e problemas neonatais. Ligam-se amplamente às proteínas plasmáticas, o que pode acarretar agravamento em casos de hipoproteinemia (MASSONE, 1999). A biotransformação ocorre por ação dos microssomas hepáticos, isoenzimas pertencentes ao sistema do citocromo P-450. O diazepan e o midazolan são biotransformados por reações oxidativas. O metabólito do diazepan possui meia vida de eliminação superior a 50 horas. A eliminação ocorre pela urina em forma de metabólitos conjugados como o ácido glicurônico. Os benzodiazepínicos quando associados a outros tranqüilizantes causam prostação o 5 que permite inclusive a indução direta volátil por máscara. O antagonista dos benzodiazepínicos é o flumazenil (lanexat), que possui alta afinidade pelos receptores benzodiazepínicos. Sua dose é de 0,05 a 0,07 µg/kg pela via intravenosa. 6 HIPNÓTICOS Os hipnóticos (etomidato e hidrato de cloral) promovem ou induzem o sono e possuem ação analgésica insignificante. O etomidato potencializa ação dos fenotiazínicos e benzodiazepínicos (CRUZ, 2002). É um fármaco de curta ação porém altamente hipnótica, tendo a vantagem de causara pouca alteração a nível cardiorespiratório e hemogasométrico. Já o hidrato de cloral possui pouca ação analgésica sendo pouco utilizaddo pelo advento dos barbitúricos (MASSONE, 1999). 7 HIPNOANALGÉSICOS Os hipnoanalgésicos (morfina, meperidina, fentanil, butorfanol, tramadol, etc) são também denominados de analgésicos narcóticos, analgésicos fortes ou morfinosímiles. Causam discreta depressão no SNC elevando o limiar da dor. Possuem como representantes os opiáceos (composto puros derivados do ópio) ou os opióides (substância natural ou sintética que produz efeitos semelhantes aos da morfina). Os opióides atuam na maioria das células nervosas, promovendo hiperpolarização, bloqueando a transmissão de estímulos nocivos para os centros mais altos agindo sobre os receptores pré e pós sinápticos no nervo sensorial aferente primário no nível de medula espinhal. A morfina é o representante derivado alcalóide do ópio. Causa excitações principalmente em felinos conscientes quando se utiliza a via intravenosa, acrescida de depressão respiratória, estimulando a emese, náuseas, defecação e salivação. A meperidina possui discreta ação hipnótica; reduz a pressão venosa, arterial e as secreções salivares e brônquicas; causa pouca depressão respiratória; por via intravenosa causa taquicardia e hipotensão; é destruída rapidamente pelo fígado. A dose varia de 1 a 5mg/kg por via intramuscular. O fentanil caracteriza-se por ser um fármaco mais potente que a morfina; provoca queda na atividade motora; não causa vômito mas relaxa os esfíncteres podendo ocorrer a eliminação de fezes; apresenta como antídoto a nalorfina. 6 8 CONCLUSÃO A medicação pré-anestésica (MPA), bem como a avaliação do paciente no pré-operatório é de suma importância para um procedimento cirúrgico seguro e eficiente. Os fármacos a serem utilizados na MPA devem ser escolhidos de acordo com a condição física do paciente na ocasião, bem como exames pré-operatórios de suporte, garantem o sucesso do procedimento. 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CORTOPASSI, S.R.G., FANTONI, D.T. Medicação pré-anestésica. In: FANTONI, D.T., COROTOPASSI, S.R.G. Anestesia em cães e gatos. Roca, São Paulo, SP, 2002, pg. 151. CORTOPASSI, S.R.G. Anestesia pediátrica. In: FANTONI, D.T., COROTOPASSI, S.R.G. Anestesia em cães e gatos. Roca, São Paulo, SP, 2002, pg. 215. CRUZ, M;L; Anestesia em ortopedia. In: FANTONI, D.T., COROTOPASSI, S.R.G. Anestesia em cães e gatos. Roca, São Paulo, SP, 2002, pg. 280. FANTONI, D.T., CORTOPASSI, S.R.G. Protocolos anestésicos. In: FANTONI, D.T., COROTOPASSI, S.R.G. Anestesia em cães e gatos. Roca, São Paulo, SP, 2002, pg. 209. FUTEMA, F., FERRIGNO, C.R.A. Anestesia no Trauma. In: FANTONI, D.T., COROTOPASSI, S.R.G. Anestesia em cães e gatos. Roca, São Paulo, SP, 2002, pg. 251. LIN, H.C. Preanesthetics and anesthetics adjunts. In: THURMAN, J.C., TRANQUILLI, W.J., BENSON, G.S. Veterinary anesthesia. 3 ed. Baltimore, Maryland, 1996, pg. 182. MASSONE, F. Medicação pré-anestésica. In: MASSONE, F. Anestesiologia veterinária. 3 ed. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, RJ, 1999, pg. 17. MASSONE, F. Técnicas anestésicas em felinos. In: MASSONE, F. Anestesiologia veterinária. 3 ed. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, RJ , 1999, pg. 103. MASSONE, F. Técnicas anestésicas em cães. In: MASSONE, F. Anestesiologia veterinária. 3 ed. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, RJ, 1999, pg. 108. MASSONE, F. Anestésicos injetáveis. In: FANTONI, D.T., COROTOPASSI, S.R.G. Anestesia em cães e gatos. Roca, São Paulo, SP, 2002, pg. 159.