Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 JOGOS COOPERATIVOS E COMPETITIVOS NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: PROBLEMATIZANDO CAMINHOS POSSÍVEIS. Geise Mara Souza da Silva, Janaina Hellen Lima Santos, Márcia Regina Canhoto De Lima, José Milton De Lima, Joyce Cristina Claro Menoti. UNESP/Presidente Prudente. geise_souzapv@hotmail.com Eixo Temático: Educação Infantil e Ensino Fundamental. Resumo: Esta pesquisa é fruto de um Trabalho de Conclusão de Curso, que foi apresentado e aprovado pelo Departamento do curso de Educação Física da Unesp de Presidente Prudente, no ano de 2012. A pesquisa foi realizada com uma turma do 5° ano de uma Escola de Ensino Fundamental- Ciclo I, da rede municipal de Ensino de Presidente Prudente. O interesse nessa pesquisa surgiu a partir da constatação de que os alunos participantes da investigação eram extremamente competitivos, prejudicando suas relações no ambiente escolar. Na literatura investigada verificou-se, que a cooperação é valorizada em detrimento da competição, dessa forma, constatou-se a necessidade de produzir uma pesquisa que não valorizasse somente uma forma de jogar em detrimento da outra. Para tanto, foi desenvolvido na sala pesquisada um programa de dezesseis intervenções, para a análise do comportamento dessas crianças frente aos jogos propostos. As intervenções feitas junto a EMEF investigada foram apoiadas em uma educação libertadora defendida por Paulo Freire, pois, tal teoria do conhecimento pressupõe uma formação crítica e emancipadora. O objetivo principal foi verificar se a cooperação é hegemonicamente positiva e se a competição é hegemonicamente negativa. Palavras-chave: Educação Física escolar. Jogos Cooperativos e Competitivos. Paulo Freire. 1. Introdução Este estudo teve como objetivo buscar nos referenciais teóricos e na prática de intervenção, equilíbrio ao aplicar os jogos cooperativos e competitivos nas aulas de Educação Física, não valorizando um jogo em detrimento do outro, pois o que se pode perceber em trabalhos analisados, como os de Orlick (1989) e Brotto (1999) é que os 2 jogos cooperativos são muito defendidos e jogos competitivos são combatidos. Portanto, buscamos proporcionar aos alunos, vivências que unissem a prática cooperativa e a competitiva, sem negar a competição e introduzindo o jogo cooperativo, pois os alunos pesquisados ainda não tinham conhecimento e vivências sobre esse tipo de jogo. Tendo em vista que, os alunos eram extremamente competitivos, os jogos cooperativos foram utilizados para a inclusão e união entre os alunos durante as intervenções. A turma pesquisada fez parte de uma das instituições em que o grupo CEPELIJ (Centro de Estudos, e Pesquisa e Intervenção em Educação, Ludicidade, Infância e Juventude) atua. O CEPELIJ conta com a participação de docentes e discentes do curso de Educação Física e Pedagogia da Faculdade de Ciências e Tecnologia – Unesp- Campus de Presidente Prudente. Os objetivos principais foram verificar se a cooperação é hegemonicamente positiva e se a competição é hegemonicamente negativa e, ainda mediar o equilíbrio entre a competição e a cooperação nas aulas de Educação Física. Os procedimentos metodológicos foram baseados nos pressupostos freireanos que apontam vivências significativas e problematizadoras, para formação de cidadãos críticos. A concepção dos pressupostos freireanos atrelados aos jogos foram de extrema importância para que a aulas fossem além de simples atividades, produzindo valores para a consciência crítica da realidade por meio da práxis. 2. Desenvolvimento do tema Neste início de século, a competitividade exacerbada acirrou ainda mais a separação entre aqueles que ganham e aqueles que perdem, ou seja, entre os que dominam e os que são dominados. Dessa forma, a sociedade reproduz valores acerca da competição que recaem sobre as relações sociais. Para Lima (2008) na sociedade capitalista, os valores de produção, a exacerbação da competição e do individualismo predomina frente ao lúdico, à espontaneidade, à criatividade e à cooperação. Com isso, o jogo também se modificou ao longo da história dos homens. A competição, assim como a cooperação são valores e atitudes ensinados- aprendidos através da educação e da cultura (FREIRE, 2001). Isso acontece principalmente na infância com os jogos e brincadeiras, ou seja, são nas relações sociais que o sujeito estabelece e cria seus valores, transmitindo para outros indivíduos. Para 3 Brown (1994, p.41), “em situação de competição somos menos capazes de ver as coisas a partir da perspectiva do outro”. Mead (1961) define a competição como o ato de procurar ganhar o que outra pessoa está se esforçando para obter, ao mesmo tempo. E, também Brotto (1999), afirma que a competição é um processo onde os objetivos são mutuamente exclusivos e as ações são benéficas somente para alguns. Algumas características do jogo competitivo são a vitória e a derrota, o que faz parte da essência do jogo. O que não se pode dizer é que todos que perdem se sentem fracassados e que isso causa desprazer em jogar. Entretanto, a derrota não deve ser encarada como processo natural, ao pensar que “o importante é competir”, pois os jogadores podem aprender com seus erros e a partir disto buscar uma melhora em seu desempenho e relacionamento com o grupo, ou seja, podemos acumular experiência na competição. Além de aprender com o ganhar e perder Huizinga (1990) e Callois (1990) apresentam que na competição, outros valores são exigidos dos jogadores, como por exemplo, a ética, a honra, o cavalheirismo, e o respeito às regras e aos adversários. No jogo competitivo, há também situações de conflito, o qual este é criticado por Brotto (1999) e Orlick (1989), ao afirmarem que as situações conflituosas aumentam ainda mais a rivalidade entre os participantes do jogo, acentuando momentos de brigas. Outros autores como Lovisolo (1999) e Muniz (2009) afirmam que é no conflito que surgem momentos de desenvolvimento social, desta forma os jogadores debatem problemas que surgem durante o jogo, portanto, nestas ocasiões são construídas as relações sociais em que o consenso é fundamental. De acordo com Lovisolo (1999 apud Muniz 2010) p.29: [...] há conflitos que podem fazer com que as pessoas e os povos melhorem em vários sentidos; há outros, no entanto, que podem levar a destruição física e cultural de pessoas e povos. [...] O conflito bom é aquele que aceita mecanismos históricos de regulação e mudanças. Além disso, no conflito surge a possibilidade de debates entre jogadores e o mediador, para que haja uma discussão na resolução de problemas, de sentimentos de injustiça e de aflições que ser possam ser provenientes de um jogo. A competição interfere nas relações sociais entre indivíduos e também na Educação Física escolar. Segundo Correia (2007) por meio de suas atividades esportivas, essa disciplina consolidou uma visão de que não se pode viver, ou 4 sobreviver, sem competição. Dessa forma, criou-se o mito da competição que permeia a Educação Física escolar, mito esse que acaba perpetuando uma concepção equivocada de que o aluno precisa aprender a competir para sobreviver às adversidades sociais, políticas e econômicas da vida lutando contra seus pares. A Educação Física escolar não pode ter por finalidade o alto rendimento, valorizando os mais aptos, tornando as aulas um ambiente no qual os sentimentos de fracasso e frustração prevaleçam entre os alunos que não se destacam em uma competição. É necessário que o professor se mantenha atento e pratique uma Educação Física que privilegie princípios da criatividade, da ludicidade, da solidariedade, da inclusão entre outros valores, ou seja, uma Educação Física para todos. Brotto (1999, p. 63), afirma que os jogos cooperativos surgiram da preocupação com a excessiva valorização dada ao individualismo e à competiçãoexacerbada na sociedade moderna, mais especificamente, na cultura ocidental. Surge então, a proposta sistematizada dos Jogos Cooperativos, como […] uma das mais adequadas para o desenvolvimento da cooperação e a superação desse processo de esportivização e do mito da competição que permeia a Educação Física escolar (CORREIA, 2007, p. 25). Os Jogos Cooperativos foram criados com o objetivo de promover, a auto- estima, juntamente com o desenvolvimento de habilidades interpessoais positivas, onde os participantes, "jogam uns com os outros, ao invés de uns contra os outros" (DEACOVE, 1974, p. 01). Salienta Brotto (1999) que estes jogos são para superar desafios; joga-se para se gostar do jogo, pelo prazer de jogar. Acresce Brotto (1999), que quando jogamos cooperativamente podemos enxergar o outro como alguém é importante e tem valor, essencialmente, por ser quem é, e não pelos pontos que marca ou resultados que alcança, considera-se o outro como parceiro em vez de adversário. Dessa forma, quando jogamos juntos aperfeiçoamos nossa vida em comum-unidade. Não obstante, Brotto (1999), nos revela que há diferenças entre os tipos de jogos cooperativos e competitivos e suas características. Os jogos cooperativos são: divertidos para todos, todos os jogadores tem um sentimento de vitória, todos se envolvem independentemente de sua habilidade, aprende-se a compartilhar e a confiar, entre outros. E os jogos competitivos são: divertidos apenas para alguns, alguns jogadores tem o sentimento de derrota, alguns jogadores são excluídos por sua falta de habilidade, aprende-se a ser desconfiado, egoístas ou se sentirem melindrados com os outros. 5 Para trabalhar jogos cooperativos Orlick (1989), indica uma categorização, sendo essa de total importância para sua inserção nos locais onde se quer trabalhar esse tipo de jogo, pois quando se acostuma jogar de uma só maneira (como é o caso do jogo competitivo) faz-se necessário introduzir aos poucos a cooperação, para que seus participantes não desestimulem, ou estranhem essa maneira de jogar. As categorias dos Jogos Cooperativos, apesar de serem separadas segundo Brotto (1999), se relacionam de maneira interdependente. Elas são: jogos cooperativos sem perdedores; jogos de resultado coletivo e jogos de inversão. A partir desses jogos cooperativos outros podem ser introduzidos na realidade que cerca o perfil dos participantes como os Jogos Semi-Cooperativos. A estrutura desses jogos favorece aos participantes a oportunidade de jogar em diferentes posições como em: todos jogam; todos tocam/todos passam a bola; todos marcam ponto; todas as posições; passe misto e resultado misto. Todavia, trabalhar com uma Educação Física pautada apenas em jogos cooperativos pode ser arriscado, pois na valorização exacerbada de quem coopera o professor pode desvalorizar quem compete. Bem como, Lovisolo (2009 apud MUNIZ, 2010, p.149) nos alerta do perigo de exaltar a cooperação “essa postura de valorização e exaltação daquele que coopera pode gerar competição, conflito, disputa. Seria uma disputa que privilegiaria o mais apto a cooperar”. Além disso, há pessoas ainda ―[…] que podem se beneficiar dos efeitos da cooperação sem cooperar. Isto é: Um aluno pode se beneficiar em um trabalho escolar realizado em cooperação por seus colegas de grupo, sem que necessariamente precise cooperar, esses alunos são denominados “caroneiros”, que se beneficiam sem contribuir. (LOVISOLO, 1999, p. 140). E, ainda Correia (2007) enfatiza o cuidado que se deve ter para que os Jogos Cooperativos e, por sua vez, a cooperação não sejam vistos como uma característica de resignação, modificando os alunos em seres dependentes uns dos outros e sem iniciativa própria. Partindo desse pressuposto, é necessário que ao serem aplicadas as atividades apresentem um equilíbrio entre a cooperação e a competição, para desenvolver no aluno a possibilidade de realizar as atividades com segurança, sem preocupação de conquistar vitórias, buscando a superação dos seus próprios limites e respeito aos amigos. Dessa forma, o aluno terá uma formação integral, pois os jogos cooperativos e competitivos possibilitam vivências diferenciadas, nas quais o aluno tem 6 a oportunidade de vivê-las e aplicá-las em seu cotidiano. Em suma, Muniz (2010) aponta que talvez seja adequada conciliar a aprendizagem dos Jogos Cooperativos juntamente com os Jogos Competitivos, no qual o papel do professor é despertar a participação crítica do aluno, tornando-o capaz de contestar, discordar, interpretar e compreender as regras do jogo, sem se tornarem submissos e acomodados. A pesquisa desenvolvida partiu de uma concepção de educação problematizadora defendida por Freire (1983) em que não existe uma separação rígida entre educador e educando, ambos fazem parte do processo ensino e aprendizado. A educação libertadora abre espaço para o diálogo, a comunicação, o levantamento de problemas, o questionamento e reflexão sobre o estado atual dos acontecimentos que surgem na sociedade e, acima de tudo, busca a transformação. As aulas de Educação Física podem possibilitar a abertura de espaços de diálogo, para a transformação de um espaço de vivências significativas, de descobertas, de criações, de debates, de produção de conhecimento e, principalmente, cooperação e reflexão crítica sobre a experiência. 3. Objetivos Analisar o desempenho das crianças do 5° ano do Ensino Fundamental ciclo I, frente aos jogos cooperativos e os jogos competitivos; Analisar se a competição é hegemonicamente negativa e se a cooperação é hegemonicamente positiva nas situações de jogo; Proporcionar vivências que desenvolvam a criticidade dos educandos a partir da metodologia adotada; Analisar se os alunos desempenharam equilíbrio frente a situações competitivas e cooperativas. 4. Metodologia A metodologia utilizada nesta pesquisa foi uma mesma utilizada nas intervenções do projeto de extensão do qual fizemos parte como participantes do grupo CEPELIJ, intitulado: Paulo Freire e a Cultura Corporal de Movimento: Um caminho possível. A natureza da pesquisa foi qualitativa, caracterizando-se como pesquisa- intervenção. Esta metodologia amplia as possibilidades de um trabalho compartilhado, que tem como preocupação central a indissociabilidade entre produção de conhecimento 7 e transformação da realidade investigada. Para Portugal (2008, p.18) a pesquisa intervenção, [...] não se constitui como uma tecnologia derivada de um conhecimento purificado a ser aplicado sobre um objeto que se quer aprimorar ou que sofreu algum desvio de sua forma padrão, mas como uma opção política diante das formas de dominação em que há participação de práticas acadêmicas. Esta pesquisa foi desenvolvida, em uma escola de um Distrito da cidade de Presidente Prudente e contou com a participação da professora da sala da turma e com aproximadamente trinta alunos do 5º ano do Ensino Fundamental, nas idades entre nove a dez anos. A turma foi selecionada por acreditar que esses educandos já vivenciaram uma variedade de jogos e trazem consigo possibilidades de ter uma compreensão mais ampla de suas características cooperativas e competitivas. Nesta pesquisa, abordou-se na metodologia eixos estruturadores propostos por Lima (2011), que inspirou-se no “Método Paulo Freire”, desenvolvido no Círculo de Cultura do Movimento de Cultura Popular do Recife (MCP). Foram desenvolvidos cinco eixos estruturadores: mapeamento temático, escolha temática, vivência, problematização e conscientização, sendo esses incorporados em todas as aulas ministradas na EMEF investigada. O primeiro eixo designado foi o mapeamento temático que teve como enfoque o estudo sobre a realidade a ser investigada. Foram colhidas informações sobre o contexto social e cultural vivido pelos alunos, por meio de conversa informal equestionários com perguntas abertas e fechadas, para saber sobre o modo de vida, as preferências e tudo o que permeia a vida da sala envolvida. Os dados coletados apontaram que os esportes e os jogos estavam presentes de diversas formas no cotidiano dos alunos em ambos os gêneros. O segundo foi à escolha temática. Neste eixo realizou-se a seleção dos conteúdos a serem trabalhados nas aulas, optou-se pelos jogos a partir dos resultados do primeiro eixo. Os tipos de jogos escolhidos para vivência foram os de natureza cooperativa e competitiva. O terceiro eixo foi à vivência. Neste eixo os alunos tiveram oportunidades de vivenciar todas as atividades de maneira criativa e autônoma em relação ao seu fazer corporal. As situações de experimentação e de vivência tiveram como objetivo a inclusão, a cooperação e a solidariedade. Neste sentido, possibilitou-se que os alunos 8 por meio de uma vivência significativa, tivessem uma participação efetiva nas aulas, pois cada movimento executado pelo aluno é particular e único. O quarto eixo foi a problematização e foi realizada sem seguir formas rígidas de execução. Aqui a interlocução do educador foi fundamental, para que o diálogo a respeito das experiências e conhecimentos trazidos pelos alunos fosse valorizado, pois se não há diálogo verdadeiro, não há nos sujeitos um pensar verdadeiro, pensar crítico (FREIRE, 1987). Desta forma, foi problematizado e fomentado o debate, instigando o pensamento reflexivo que pôde ser realizado, antes, durante e depois das atividades propostas. O quinto e último eixo foi à conscientização. A partir da vivência significativa e da problematização, pretendeu-se verificar de que maneira, as aulas serviram de suporte para que os alunos pudessem incorporar ao seu estilo de vida os componentes da cooperação e da competição de maneira ativa, prazerosa e consciente dos seus limites e possibilidades. Constatou-se a compreensão dos alunos de que é possível se divertirem, se sentirem parte de um jogo, brincadeira, sem se preocuparem com o resultado final, pois em muitas atitudes dos educandos foram observadas a alegria, a diversão, a amorosidade. Os cinco eixos temáticos foram importantes, pois serviram para criar vínculos, vivenciar e compreender as dificuldades da prática, trocar informações e conhecimentos; e favorecer, ainda, a formação de todas as pessoas envolvidas na pesquisa. Uma tentativa de romper com a Educação Física escolar, excludente, extremamente competitivista e opressora, dando a oportunidade de todos os alunos viverem sua corporeidade de maneira completa e solidária. O programa de jogos foi composto por dezesseis intervenções, que foram divididas entre oito intervenções de jogos cooperativos e oito jogos competitivos. Optou-se primeiramente pelos jogos cooperativos, pois foi observado que as crianças competiam muito e se sentiam desvalorizadas ao perderem um jogo e ainda, muitos alunos denegriam a imagem de outras crianças, por estas não desempenharem um “bom” papel em tal atividade. Daí a necessidade de propor os jogos cooperativos, a fim de aproximar as crianças uma das outras e estas passarem a enxergar e valorizar seus colegas de turma. Posteriormente, os jogos competitivos foram vivenciados em forma de competição individual, para que os alunos pudessem competir com eles mesmos, tendo em vista que todos os alunos passaram pela mesma situação de jogo, buscou-se o 9 entendimento para que eles possam se colocar no lugar no outro e evitarem expor o próximo a situações desagradáveis. E, por fim a competição coletiva, pois nela o grupo mesmo competindo se une para atingir os objetivos comuns. 5. Resultados No ano em que antecedeu a investigação do programa de jogos cooperativos e competitivos, constatou-se que os alunos da sala pesquisada, eram extremamente competitivos, ficavam frustrados e desanimados quando perdiam um jogo. Esses anseios refletiam no seu desempenho na sala de aula, como a professora mesma relatou: “Os alunos que venceram o jogo ficam debochando dos alunos que perderam, e estes se sentem mal, e ficam desestimulados até mesmo em fazer atividades de outras matérias”. Além disso, a sala possuía características relevantes que muitas vezes dificultava o aprendizado, como: a falta de atenção e concentração, a baixa autoestima e a inferioridade. Durante o desenvolvimento da pesquisa, o primeiro tipo de jogo a ser vivenciado pelos alunos foi o cooperativo e iniciou-se com jogos semi-cooperativos para que os alunos não estranhassem essa nova maneira de jogar. Estes jogos se subdividem em todos tocam/todos passam, todos jogam todas as posições, passe misto e resultado misto. E, também, jogos cooperativos sem perdedores, onde todos jogam juntos para superar um desafio comum. Houve ainda os de resultado coletivo, no qual a motivação estava em realizar metas comuns. Por fim os jogos de inversão enfatizaram a noção de interdependência, no qual os tipos de inversão são rodízio, inversão do goleador, inversão do placar e inversão total. Destacam-se aqui alguns dos jogos cooperativos vivenciados nas intervenções: pega-pega abraço, desenhar nas costas, queimada escudo, futpar, e também as variações de jogos semi-cooperativos. No início, os alunos apresentaram dificuldades de entender as regras, e antes de começarem a jogar falavam: “eu não sei, eu não consigo”, “esse jogo é de competição?”, mas no desenrolar das intervenções foram percebendo o intuito do jogo e gostaram muito da atividade, pois: “ninguém perdeu, e é melhor jogar cooperativamente porque todo mundo é vencedor”. De acordo com o relato das crianças as atividades, bola entre as pernas, pega-pega hospital e dança da cadeira cooperativa foram muito significativas, pois criaram estratégias juntos para atingir objetivo final da atividade: “a gente aprendeu a 10 ser unido para fazer as coisas”, “o jogo ensinou a gente quando tá em dificuldade tem que ajudar o outro”, “é importante ajudar o amigo, porque ele também pode ajudar a gente”. Um dos métodos utilizados para a coleta de dados foi questionário, com perguntas abertas e fechadas sobre os jogos cooperativos e os competitivos, que a professora da sala respondia mensalmente em relação às intervenções e atitudes dos alunos provenientes das aulas de Educação Física. Segundo a professora, as atividades proporcionaram uma maior socialização/interação entre os alunos e atitudes de cooperação e solidariedade foram percebidas em vários momentos. E, ainda percebeu-se que os alunos se tornaram mais críticos, que expunham seus pontos de vista em relação aos acontecimentos da aula. A professora enfatizou que as atividades cooperativas os tornaram mais próximos uns dos outros, respeitaram-se mais e solicitaram mais ajuda. Em suma, a professora nos revelou que as atividades cooperativas ajudaram em relação ao problema de falta de atenção que era uma característica fortemente presente da turma. Por tudo isso, o clima de tensão em relação às atividades foi amenizado, e a preocupação com o resultado final foi diminuída. A alegria, diversão, prazer em estar jogando se faziam presentes, mas não eram em todos os momentos, pois alguns alunos não apresentaram muitas atitudes de cooperação nos jogos e nas relações interacionais, e em alguns momentos muitos alunos preferiam jogos competitivos. Por fim, tivemos como resultado do programa de jogos cooperativos, que a cooperação não é hegemonicamente positiva, pois alguns alunos não construíram senso de unidade e também outros, não compartilharam os mesmos sentimentos de vitória, pois ainda preferiam os jogos competitivos. O programa de jogos competitivos foi o último a ser trabalhado, para comparar com as atitudes dos educandos anteriores à pesquisa. Percebeu-se que eles jogavam com menos receio, ajudavam mais os companheiros do time, criaram estratégiase não se preocuparam tanto com o resultado final. Os jogos competitivos foram: nunca três, fechar a porta, pique-bandeira, queimada tradicional, gaviões e pintinhos, entre outros. Em virtude da problematização feita durantes as aulas, pode-se perceber que alguns alunos já haviam melhorado a forma exacerbada de competir: “Perder faz parte”, “um dia a gente ganha outro a gente perde”, “aula passada eu perdi e essa eu ganhei e não mudou nada”, “perdemos porque faltou união”. 11 Em relação ao questionário respondido pela professora referente à competição as afirmações foram que algumas crianças ainda se frustram por não vencer, mas logo ficam bem, principalmente quando falam que o importante é se divertir, porém aprenderam a aceitar melhor as perdas e não se sentirem tão superior caso vençam. Dado o exposto, ao analisar o desempenho das crianças frente aos jogos competitivos, constatou-se que a competição não é hegemonicamente negativa, pois podem ensinar bons valores e muitas vezes, observamos que os alunos se sentiam felizes pelo o amigo vencer e não necessariamente desejavam a derrota do próximo. E, ainda percebemos que a competição ensina bons valores dependendo do modo de como é ensinada; como respeitar as regras do jogo sem querer ganhar a qualquer custo e aprenderam a lidar com conflitos surgidos nos jogos. O equilíbrio almejado pela pesquisa, não foi totalmente alcançado, pois apesar dos alunos terem tido um avanço em relação às atitudes de cooperação e aos valores éticos da competição, ainda ficavam receosos quando perdiam e nem sempre cooperavam quando necessário. Mas nem por isso deixaram de avançar enquanto sujeitos críticos e autônomos, pois em função de uma relação horizontal entre professoras e alunos, foram se percebendo como parte de uma totalidade, como explicita a fala de uma aluna: “eu me senti vivendo o jogo”. 6. Conclusão Dado o exposto, ao analisar o desempenho das crianças frente aos jogos competitivos, constatamos que a competição não é hegemonicamente negativa, pois podem ensinar bons valores e muitas vezes, observamos que os alunos se sentiam felizes pelo o amigo vencer e não necessariamente desejavam a derrota do outro. E, também notamos que a competição ensina bons valores dependendo do modo de como é orientada, pois os alunos respeitaram as regras do jogo sem querer ganhar a qualquer custo e aprenderam a lidar com conflitos ocorridos durante os jogos. O equilíbrio almejado pela pesquisa, não foi totalmente alcançado, pois apesar dos alunos terem um avanço em relação às atitudes de cooperação e aos valores éticos da competição, ainda ficavam receosos quando perdiam e nem sempre cooperavam quando necessário. As vivências propostas foram muito significativas no entendimento de todos os participantes dessa pesquisa como; professora, diretora e alunos. Além disso, com a problematização de questões que foram provenientes das aulas os alunos conseguiram 12 visualizar um sentido maior nas vivências, pois o diálogo se fazia presente de uma forma horizontal e autêntica. Com a conscientização puderam perceber que são sujeitos capazes de intervir na sua realidade, de maneira crítica e respeitando a opinião do outro. Neste trabalho, não podemos afirmar que houve equilíbrio ao final do programa de jogos cooperativos e competitivos, pois os alunos não se tornaram totalmente cooperativos e não eram em todos os momentos que a alegria, diversão, prazer em estar jogando se faziam presentes e alguns alunos não tiveram muitas atitudes de cooperação nos jogos e nas relações interacionais. E, também não podemos afirmar que a competição os tornou menos individualistas, pois alguns ainda ressentiam quando perdiam jogos. No entanto, como educadores não podemos desanimar e nem desacreditar da nossa capacidade de transformação, pois somos seres inacabados em processo de humanização. Temos que considerar o aluno como um ser que pensa, sente, ama e que é capaz de criar sua própria história. 7. Referências BROTTO, F. O. Jogos Cooperativos: O jogo e o esporte como um exercício de convivência. 1999. Dissertação (Mestrado em Educação Física). Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1999. BROWN, G. Jogos cooperativos: teoria e prática. São Leopoldo: Sinodal, 1994 – 1995. CAILLOIS, R. Os Jogos e os homens. Lisboa: Cotovia, 1990. CORREIA, M. M. Jogos cooperativos e Educação Física escolar: Pedagogia da Práxis possibilidades e desafios. Efdeportes, Buenos Aires, ano 12, nº 107, p.1, 2007. DEACOVE, J. Co-op games manual. Perth: Family Pastimes, 1974. FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 12aed. 1987, 220p. _________. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2001. __________. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 12ªed. 1983, 220p. HUIZINGA, J. Homo Ludens: O jogo como elemento da cultura. 2.ed. São Paulo: Perspectiva, 1990. LIMA, J. M. - O jogo como recurso pedagógico no contexto educacional/José Milton Lima. – São Paulo: Cultura Acadêmica: Universidade Estadual Paulista, Pró-Reitoria de Graduação, 2008. 13 LIMA, M. R. C. de. A busca de caminhos entre a Educação Física escolar e os pressupostos freireanos, 2011. LOVISOLO, H. Cofres-palavras: pertencimento, participação e cooperação. Motus Corporis – Revista de Divulgação Científica do Mestrado e Doutorado em Educação Física, Rio de Janeiro, v. 6, n. 1, p. 128-142, 1999. LOVISOLO, H. Competição, cooperação e regulações. In: LOVISOLO, Hugo; STIGGER, Marco. Esporte de rendimento e esporte na escola. Campinas, SP: Autores associados, 2009. MEAD, M. Cooperation and competition among primitive people. Boston: Beacon, 1961. MUNIZ, I. B. Os jogos cooperativos e os processos de interação social, Dissertação de Mestrado, Vitória, 2010. ORLICK, T. The cooperative sports & games book: challenge without competition. New York: Pantheon Books, 1978. _________.Vencendo a competição. São Paulo: Círculo do Livro, 1989. PORTUGAL, F. T. A pesquisa-intervenção e o diálogo com os agentes sociais, 2008.
Compartilhar