Prévia do material em texto
UN ID AD E I - V O LU M E 4 ÀREA TEMÁTICA III - AIS AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS MINISTÉRIO DA SAÚDE PROGRAMA DE QUALIFICAÇÃO DE AGENTES INDÍGENAS DE SAÚDE (AIS) E AGENTES INDÍGENAS DE SANEAMENTO (AISAN) BRASÍLIA – DF 2016 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Programa de Qualificação de Agentes Indígenas de Saúde (AIS) e Agentes Indígenas de Saneamento (AISAN) / Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Departamento de Gestão da Educação na Saúde. – Brasília : Ministério da Saúde, 2016. 16 v. : il. Conteúdo: Área temática I – AIS e AISAN: Promoção da saúde no território indígena: Unidade I: territórios e povos indígenas no Brasil, Unidade II: saúde, doença e atenção nos territórios indígenas, Unidade III: políticas de saúde e atenção primária no Brasil e na saúde indígena, Unidade IV: promoção e educação em saúde indígena; Área temática II – AIS: processo de trabalho do agente indígena de saúde: Unidade I: processo de trabalho e planejamento em saúde; Área temática III – AIS: Ações de prevenção a agravos e doenças e de recuperação da saúde dos povos indígenas: Unidade I –Saúde da família indígena, volumes 1, 2, 3, 4, Unidade II: a saúde do jovem, do adulto e do idoso, volumes 1 e 2, Unidade III: saúde e natureza; Área Temática II – AISAN: Prevenção e operacionalização de ações e procedimentos técnicos na área de saneamento: Unidade I: ambiente e saúde, Unidade II: manejo das águas, dos esgotos e dos resíduos sólidos; Área temática III – AISAN: O processo de trabalho do AISAN: Unidade I: produção de informação em saneamento e saúde ambiental no contexto da atenção básica aos povos indígenas, Unidade II: Processo de trabalho do AISAN e sua atuação na equipe de saúde. ISBN 978-85-334-2382-4 Obra completa ISBN 978-85-334-2393-0 Área Temática III – AIS, Unidade I, Volume 4 1. Saúde indígena. 2. Educação na saúde. 3. Formação profissional em saúde. I. Título. CDU 614(81=082) Catalogação na fonte – Coordenação-Geral de Documentação e Informação – Editora MS – OS 2016/0327 Título para indexação Qualification Program for Indigenous Health Agents (AIS) and Indigenous Sanitation Agents (AISAN) Esta obra é disponibilizada nos termos da Licença Creative Commons – Atribuição – Não Comercial – Compartilhamento pela mesma licença 4.0 Internacional. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte. A coleção institucional do Ministério da Saúde pode ser aces- sada, na íntegra, na Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde: <www.saude.gov.br/bvs>. Elaboração, distribuição e informações MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde Departamento de Gestão da Educação na Saúde Coordenação-Geral de Ações Técnicas em Educação na Saúde Diretoria de Gestão da Educação na Saúde Esplanada dos Ministérios, bloco G, sala 725 CEP: 70058-900 – Brasília/DF Telefone: 55 (61) 3315-3814 / 3315-3630 Site: www.saude.gov.br/sgtes E-mails: sgtes@saude.gov.br / deges@saude.gov.br Coordenação Alexandre Medeiros de Figueiredo Antônio Alves de Souza Gleisse de Castro Fonseca Hêider Aurélio Pinto Mônica Diniz Durães Rivaldo Venâncio da Cunha Rui Arantes Organização e revisão Lanusa Terezinha Gomes Ferreira Monica Diniz Durães Rui Arantes Coordenação pedagógica e revisão técnica Sofia Beatriz Machado de Mendonça Renata Palópoli Pícoli Rui Arantes Coordenação de área temática Ana Lúcia de Moura Pontes Ana Paula Massadar Morel Érika Kaneta Ferri Evelin Plácido dos Santos Maurício Soares Leite Patrícia Rech Monroe Vânia Fernandes Rabelo Colaboração técnica Gleisse Castro Fonseca Danielle Soares Cavalcante Luciana de Oliveira Fernandes Lucimar Correa Alves Vera Lopes dos Santos Revisão geral Antônio Alves de Souza Danielle Soares Cavalcante Gleisse de Castro Fonseca Lucimar Correa Alves Vera Maria Borralho Bacelar Colaboração Leila Resende Castro Herculano Luciana de Oliveira Fernandes Maria Emilia Aracema Vera Lopes dos Santos Revisão SESAI Danielle Soares Cavalcante Élida Amorim Valentim Mourão Flávia Carneiro Nunes Gabriel Côrtes Gizeli de Lima Leticia Moreira Oliveira Lysiane de Castro Pereira Paiva Vera Maria Borralho Bacelar Normalização Delano de Aquino Silva – Editora MS/CGDI Ilustração Wanick Correa Flores Capa, projeto gráfico e diagramação MV Agência Impresso no Brasil / Printed in Brazil 2016 Ministério da Saúde. Tiragem: 1ª edição – 2016 – 20 exemplares Ficha Catalográfica ÀREA TEMÁTICA III - AIS Ações de Prevenção a Agravos e Doenças e de Recupera- ção da Saúde dos Povos Indígenas UNIDADE I - VOLUME 4 MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde Departamento de Gestão da Educação na Saúde PROGRAMA DE QUALIFICAÇÃO DE AGENTES INDÍGENAS DE SAÚDE (AIS) E AGENTES INDÍGENAS DE SANEAMENTO (AISAN) BRASÍLIA – DF 2016 Ordenar a formação de recursos humanos para o Sistema Único de Saúde (SUS) por meio do planejamento, coordenação e apoio às atividades relacionadas ao trabalho e à educação na área de saúde tem sido um compromisso constante do Ministério da Saúde, sobretudo, a partir da criação da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES). Para garantir o direito à saúde, previsto na Constituição Federal e no âm- bito de seu escopo de atuação, a SGTES realiza parcerias com as demais secretarias do Ministério da Saúde, bem como com as Escolas Técnicas do SUS (ETSUS), docentes e profi ssionais de saúde de instituições de ensino e de serviços de saúde. A partir dessas parcerias, a SGTES defi ne diretrizes para a formação e qualifi cação dos profi ssionais, produzindo materiais di- dáticos e de apoio ao desenvolvimento dos cursos, sob a coordenação do Departamento de Gestão da Educação na Saúde (DEGES)/Coordenação Geral de Ações Técnicas da Educação na Saúde. Este material é uma ação conjunta entre a Secretaria de Gestão do Tra- balho e da Educação na Saúde (SGTES) e a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) em parceria com a Fiocruz Mato Grosso do Sul, a partir do reconhecimento da importância da missão do Agente Indígena de Saúde (AIS) e do Agente Indígena de Saneamento (AISAN) no contexto da quali- fi cação das ações de saúde junto às famílias indígenas. Os AIS e os AISAN estão distribuídos em todas as regiões do país e con- tribuem signifi cativamente para os avanços e as melhorias da saúde dos povos indígenas brasileiros, principalmente nas ações voltadas à redução da mortalidade infantil, cobertura pré-natal, melhorias nas condições sani- tárias, acesso à água de qualidade, acompanhamento das crianças, vacina- ção e vigilância à saúde da população indígena em geral. Esta iniciativa pretende, portanto, contribuir e facilitar o trabalho dos AIS e AISAN na desafi adora missão diária de ser um promotor de saúde e um agente de cidadania. Com base neste objetivo central, este material didático oferece subsídios para a otimização dos seus resultados e melhor utilização das ferramentas de trabalho disponíveis. Agradecemos a todas e todos que contribuíram para a elaboração do presente material didático, trazendo os seus conhecimentos teóricos e práticos, numa construção co- letiva, democrática e participativa, valorizando mais ainda o resultado fi nal do trabalho. Desejamos, por fi m, que este curso contribua para a qualifi cação dos AIS e AISAN, tornando-os mais preparados para o cumprimento de suas missões sociais. SECRETARIA DE GESTÃO DO TRABALHO E DA EDUCAÇÃO NA SAÚDE SECRETARIA ESPECIAL DE SAÚDE INDÍGENA Anabele Pires Santos Nutricionista. Especialista em Saúde Indígena – UNIFESP. Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Medicina Translacional – UNIFESP. Tutora do Curso de Especialização em Saúde Indígena - UNASUS/UNIFESP. Mariana Maciel Queiroz Membro do Projeto Xingu coordenando a Área Técnica de Saúde da Mulher. Especialistaem Ginecologia e Obstetrícia - Hospital Israelita Albert Einstein, Especialista em Saúde Indígena – UNIFESP. Maurício Soares Leite Nutricionista. Mestre e doutor em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública/ Fiocruz Professor adjunto do Departamento de Nutrição e do Programa de Pós-Gradua- ção em Nutrição da Universidade Federal de Santa Catarina. Pablo Natanael Lemos Cirurgião-Dentista do Projeto Xingu - EPM/UNIFESP. Especialista em Saúde Coletiva, Saú- de Indígena e Gestão em Saúde. Mestrando em Saúde Pública - FSP/USP. Patricia Rech Monroe Enfermeira, especialista em Desenvolvimento de Recursos Humanos em Saúde (FSP USP) Mestre em Saúde Pública (FSP USP). Professor-tutor do Curso de Especialização em Saú- de Indígena - UNASUS/UNIFESP. Rui Arantes Mestre e Doutor em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz-RJ (ENSP/Fiocruz). Atua como Pesquisador Assistente na Fiocruz Mato Grosso do Sul desenvolvendo projetos na área de saúde dos Povos Indí- genas. Sofia Beatriz Machado de Mendonça Médica Sanitarista. Antropóloga. Coordenadora do Projeto Xingu, programa de extensão universitária da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo EPM/ UNIFESP. Vanessa Moreira Haquim Nutricionista do Projeto Xingu - programa de extensão universitária da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo EPM/UNIFESP. Especialista em Nutrição e Saúde na Pobreza pela UNIFESP. Mestranda em Ciências da Saúde pela UNIFESP. TEXTO 1 - AGRAVOS E DOENÇAS MAIS COMUNS NA INFÂNCIA: POR QUE AS DOENÇAS NA INFÂNCIA PREOCUPAM? TEXTO 2 - DESNUTRIÇÃO TEXTO 3 - DOENÇAS DIARREICAS 15 20 38 TEXTO 4 - INFECÇÕES RESPIRATÓRIAS AGUDAS (IRA) TEXTO 5 - A SAÚDE BUCAL DAS CRIANÇAS E A CÁRIE BIBLIOGRAFIA 59 80 84 INTRODUÇÃO 11 Nesta Unidade vamos estudar sobre as características e os papéis sociais da família; a alimentação e nutri-ção nas famílias indígenas; o ciclo de vida e as fases que envolvem a gravidez, o parto, puerpério, o crescimento e o desenvolvimento da criança. Por fi m vamos conhecer al- guns agravos e doenças mais comuns na infância. Vamos refl etir sobre o trabalho do Agente Indígena de Saú- de (AIS), do Agente Indígena de Saneamento (AISAN) e da Equipe Multidisciplinar de Saúde Indígena (EMSI) nas ativi- dades de prevenção, proteção e recuperação da saúde e nas ações de promoção da saúde junto com a comunidade, se- tores governamentais, a sociedade indígena e não indígena. Para atingir os objetivos propostos nesta Unidade, vamos conversar sobre os seguintes assuntos: - Agravos e doenças mais comuns na infância: desnutri- ção, anemia, infecções respiratórias agudas - IRA, doenças diarreicas e cárie; sinais e sintomas das doenças mais co- muns na infância; trabalho do AIS, AISAN e demais mem- bros da EMSI nos cuidados e prevenção dessas doenças. UNIDADE I - VOLUME 4 14 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena14 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena AGRAVOS E DOENÇAS MAIS COMUNS NA INFÂNCIA: POR QUE AS DOENÇAS NA INFÂNCIA PREOCUPAM? nos cinco textos a seguir, você vai estudar sobre algumas do-enças e problemas que acometem com frequência crianças menores de cinco anos: desnutrição e anemia, infecções res- piratórias agudas, doenças diarreicas e cárie. Existem muitas ou- tras doenças que afetam as crianças, mas vamos falar delas em outros cadernos. Nestes textos, você vai entender: - porquê essas doenças acometem mais as crianças; - como fi ca o corpo doente; quais são os sinais e sintomas; - quais são os sinais de perigo e complicações das doenças; - o que o Agente Indígena de Saúde (AIS), o Agente Indígena de Saneamento (AISAN), a Equipe Multidisciplinar de Saúde Indígena (EMSI), a família e a comunidade podem fazer no acompanhamento dos casos de doenças e na prevenção em crianças saudáveis. TEXTO 1 Patricia Rech Monroe e Sofia Beatriz Machado de Mendonça. AGRAVOS E DOENÇAS MAIS COMUNS NA INFÂNCIA: POR QUE AS DOENÇAS NA INFÂNCIA PREOCUPAM? 15AGRAVOS E DOENÇAS MAIS COMUNS NA INFÂNCIA: POR QUE AS DOENÇAS NA INFÂNCIA PREOCUPAM? 15 Na sua comunidade, quais são os problemas e doenças que afetam as crianças? Você já deve ter percebido, na sua comunidade, que as crianças até cinco anos têm mais diarreia e gripe do que os jovens e adultos. Por que isso acontece? Leia este texto e discuta com seus colegas: por que crianças indígenas morrem mais que crianças não indígenas no Brasil? ATIVIDADE PROPOSTA A chamada taxa de mortalidade infantil quer dizer o número de mortes de menores de um ano de idade por cada 1.000 nascidos vivos, em um determinado lugar e ano. Serve para saber o risco de um nascido vivo morrer durante o seu primeiro ano de vida. Por exemplo, se a taxa de mortalidade infantil for de 30 por 1.000 nascidos vivos em um país no ano de 2012, isso quer dizer que, de cada 1.000 crianças que nasceram em 2012, 30 delas morreram antes de completar um ano de vida. Podemos calcular a mortalidade infantil de qualquer território: um país, uma cidade, um Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) e até mesmo uma aldeia. Para isso, precisamos de duas informações: total de crianças menores de um ano que nasceram vivas e total de crianças menores de um ano que morreram naquele ano. Como você viu no texto “Como produzir informação em saúde”, da Área Temática I, a taxa de mortalidade infantil (também chamada de TMI) é um indicador que refl ete as condições de vida, o acesso aos serviços e a qualidade da atenção à saúde da população. Ela mostra o risco que uma criança tem de morrer antes de completar um ano. A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifi ca a TMI em três tipos: 1. TMI alta: acima de 50 óbitos por 1.000 nascidos vivos Acontece em países como Afeganistão, Angola, Haiti, Paquis- tão e Somália. Nesses países, a maioria das pessoas não tem acesso à água potável e a esgoto sanitário. As fezes fi cam a céu aberto ou em fossas, transmitindo doenças. A alimentação é muito fraca, as pessoas não conseguem plantar nem ter dinheiro para alimentar a família. MORTALIDADE INFANTIL DE CRIANÇAS INDÍGENAS NO BRASIL 16 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena Vivem em moradias muito precárias, sujas e sem coleta de lixo. Moram muitas pessoas aglomeradas no mesmo lugar e a transmissão de doenças é rápida. As pessoas convivem com baratas, ratos e insetos nas casas. Alguns lugares são desertos sem água. Outros são cidades muito cheias. São lugares onde acontecem muitos confl itos e guerras, com muitas mortes infantis causadas pela violência. O acesso aos serviços de saúde é muito difícil, não há profi ssionais de saúde sufi cientes, principalmente nas regiões mais afastadas da cida- de. Faltam hospitais, postos de saúde, medicamentos, equipa- mentos e materiais para o trabalho da equipe. Poucos profi ssio- nais de saúde trabalham nesses lugares. As crianças morrem de todo tipo de doenças, como diarreia, pneumonia, tuberculose, malária, Aids e até de fome e de sede. 2. TMI média: entre 21 e 49 óbitos por 1.000 nascidos vivos Acontece em países como Paraguai, Egito, Bolívia, África do Sul e Índia. São países com uma condição geral de saneamento básico, segurança alimentar e acesso a serviços de saúde um pouco melhor, mas ainda morrem muitas crianças todo ano. Existe muita desigualdade social, quer dizer, poucas famílias são ricas e conseguem ter uma boa condição de vida. A maio- ria da população vive em condições de vida muito difíceis, não conseguem se alimentar bem, não tem saneamento básico nem acesso a serviços de saúde quando precisam. Existem poucos profi ssionais trabalhando nas regiões rurais, a maioria fi ca tra- balhando nas cidades. 3. TMI baixa: abaixo de 20 óbitos por 1.000 nascidosvivos Países como França, Noruega, Japão, Cuba e Canadá possuem a TMI abaixo de cinco óbitos por 1.000 nascidos vivos. Nesses países, existem boas condições de vida, saneamento básico para todos, boa alimentação, educação e acesso a serviços de saúde de qualidade. Todas as famílias possuem uma condição de vida parecida, não existem pessoas pobres, todos têm acesso às mesmas coisas. Mesmo nas regiões rurais e afastadas, exis- tem equipes e serviços de saúde para todos. Hoje, o Brasil também está nessa faixa, com uma TMI geral de 13 óbitos por 1.000 nascidos vivos. Mas existem regiões do Brasil onde a TMI está na faixa de médio risco, principalmente em regi- ões rurais, fl orestas e municípios pequenos. AGRAVOS E DOENÇAS MAIS COMUNS NA INFÂNCIA: POR QUE AS DOENÇAS NA INFÂNCIA PREOCUPAM? 17 De acordo com a classifi cação da OMS, nos últimos 20 anos, os povos indígenas que vivem no Brasil passaram de alto risco para médio risco de morte no primeiro ano de vida. Em 1999, a taxa de mortalidade infantil indígena foi de 97 óbitos por 1.000 nascidos vivos no Brasil. Quase metade desses óbitos foram causados por doenças transmissíveis (infecções respiratórias, enteroparasitoses, diarreia, malária, tuberculose) e a desnutrição. No mesmo ano, a TMI das crianças brasileiras não indígenas era de 29 por cada 1.000 nasci- dos vivos. Nessa época, morriam três vezes mais crianças indíge- nas, comparando com as não indígenas. Segundo o SIASI, em 2002, a TMI de crianças indígenas foi de 55,82 por 1.000 nascidos vivos. No mesmo ano, as crianças não indígenas tinham uma taxa de mortalidade de 25 por 1.000, ou seja, proporcionalmente, o dobro de crianças indígenas morreu, comparadas às não indígenas. No ano de 2009, a mortalidade infantil geral no Brasil tinha diminuído bastante, foi de 15 óbitos por 1.000 nascidos vivos. A mortalidade infantil indígena também diminuiu, mas não acompanhou a redução brasileira: tivemos 37,54 óbitos de menores de um ano, para cada 1.000 nascidos vivos, segundo o SIASI. Em 2013, a TMI indígena foi de 43,46 por 1.000, enquanto a nacional foi de 15 por 1.000. Outra informação preocupante: Entre todos os indígenas do país, de 2007 até 2013, a cada 100 pessoas que morreram, aproximadamente 40 foram crianças menores de cinco anos. Entre os não indígenas do país, a cada 100 pessoas que morreram, somente cinco foram crianças menores de cinco anos. Algumas das principais causas de morde em indígenas menores de cinco anos são complicações das doenças respiratórias agudas, desnutrição e doenças diarreicas, além das causas externas, como traumas, afogamentos e agressões. Os próximos textos vão nos ajudar a conhecer melhor essas doenças, como elas aparecem entre as crianças, coimo se complicam e o que o AIS e sua equipe podem fazer. De acordo com a classifi cação da OMS, nos últimos 20 anos, os povos indígenas que vivem no Brasil passaram de alto risco para médio risco de morte no primeiro ano de vida. Em 1999, a taxa de mortalidade infantil indígena foi de 97 óbitos por 1.000 nascidos vivos no Brasil. Quase metade desses óbitos foram causados por doenças transmissíveis (infecções respiratórias, enteroparasitoses, diarreia, malária, tuberculose) e a desnutrição. No mesmo ano, a TMI das crianças brasileiras não indígenas era de 29 por cada 1.000 nasci- dos vivos. Nessa época, morriam três vezes mais crianças indíge- nas, comparando com as não indígenas. Segundo o SIASI, em 2002, a TMI de crianças indígenas foi de 55,82 por 1.000 nascidos vivos. No mesmo ano, as crianças não indígenas tinham uma taxa de mortalidade de 25 por 1.000, ou seja, proporcionalmente, o dobro de crianças indígenas morreu, comparadas às não indígenas. No ano de 2009, a mortalidade infantil geral no Brasil tinha diminuído bastante, foi de 15 óbitos por 1.000 nascidos vivos. A mortalidade infantil indígena também diminuiu, mas não acompanhou a redução brasileira: tivemos 37,54 óbitos de menores de um ano, para cada 1.000 nascidos vivos, segundo o SIASI. Em 2013, a TMI indígena foi de 43,46 por 1.000, enquanto a nacional foi de 15 por 1.000. Outra informação preocupante: Entre todos os indígenas do país, de 2007 até 2013, a cada 100 pessoas que morreram, aproximadamente 40 foram crianças menores de cinco anos. Entre os não indígenas do país, a cada 100 pessoas que morreram, somente cinco foram crianças menores de cinco anos. Algumas das principais causas de morde em indígenas menores de cinco anos são complicações das doenças respiratórias agudas, desnutrição e doenças diarreicas, além das causas externas, como traumas, afogamentos e agressões. Os próximos textos vão nos ajudar a conhecer melhor essas doenças, como elas aparecem entre as crianças, coimo se complicam e o que o AIS e sua equipe podem fazer. 18 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena AGRAVOS E DOENÇAS MAIS COMUNS NA INFÂNCIA: POR QUE AS DOENÇAS NA INFÂNCIA PREOCUPAM? 19 DESNUTRIÇÃO como já estudamos, para a biomedicina, nutrição é a ciência que estuda o conjunto de alimentos e nutrientes necessários para o crescimento, desenvolvimento e manutenção do corpo das pessoas em cada fase da vida. Quando a criança não cresce e não se desenvolve bem, dizemos que ela está com desnutrição. A desnutrição é uma doença que enfraquece muito a pessoa e pode acontecer em qualquer idade, mas ocorre mais facilmente em bebês e crianças menores de cinco anos. Ela é mais grave nessa fase pois o corpo da criança está se formando ainda. A desnutrição pode deixar as crianças com problemas de saúde para o resto da vida, se não for tratada. TEXTO 2 DESNUTRIÇÃO E POVOS INDÍGENAS Um tema que vem ganhando espaço nas discussões sobre a situação dos povos indígenas no país, e mais especifi camente sobre suas condições de saúde, diz respeito a alimentação e nutrição deste segmento da população brasileira. Os debates não se restringem aos ambientes acadêmicos ou aos fóruns políticos, mas chegam, ainda que esporadicamente, aos grandes jornais e televisões. Infelizmente, isso acontece geralmente em situações dramáticas, como no caso das mortes por desnutrição de crianças Guarani no Mato Grosso do Sul, há poucos anos, com mobilização imediata. Vanessa Moreira Haquim, Anabele Pires Santos, Mariana Maciel Queiroz, Maurício Soares Leite e Sofia Beatriz Machado de Mendonça. 20 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena20 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena DESNUTRIÇÃO 21DESNUTRIÇÃO 21 Responsabilidades de pessoas, de instituições e de partidos políticos são apuradas, e soluções – adequadas ou não – são rapidamente apresentadas e colocadas em prática. Muitas vezes os próprios povos indígenas são acusados pelos não indígenas. Não sabem cuidar de suas crianças, dizem os jornais. Ou não trabalham o sufi ciente, dizem. Ou o alcoolismo entre os adultos é a causa da falta de cuidado com as crianças. Às vezes os jornais ou a televisão afi rmam que sua cultura faz com que alimentem primeiro os mais velhos, para depois dar de comer às crianças. A discriminação é clara e só aumenta o preconceito contra os povos indígenas. Ou seja, contra justamente quem está sofrendo com as mortes. Então, tão rapidamente, como apareceram, estas notícias desaparecem dos jornais, até que novas mortes de crianças aconteçam. Fonte: Modifi cado de Leite, M.S. & Santos, R.V., 2005. Desnutrição entre os índios. Ciência Hoje, julho de 2005, pp. 71-73. Rio de Janeiro. Nós precisamos refl etir sobre tudo isso. Você já viu falas parecidas com essas? O que pensa sobre elas? A desnutrição pode acontecer por vários motivos, principalmente quando a criança não se alimenta direito ou fi ca doente. Quando a criança não se alimenta bem, ela perde peso, deixa de crescere enfraquece. Além de enfraquecer, a criança desnutrida pode adoecer muito rápido. Os casos de doenças mais simples, como gripe, na criança desnutrida podem evoluir rapidamente para casos graves, como pneumonia. Nesse período, se ela não for tratada, seu estado de saúde fi ca muito ruim, podendo até causar morte. 22 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena O I INQUÉRITO NACIONAL DE SAÚDE E NUTRIÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS Em 2009, foi realizada a primeira grande pesquisa sobre saúde e nutrição dos povos indígenas no Brasil. O I Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos Indígenas foi muito importante por se tratar da primeira pesquisa que esteve em todos os DSEI do país. O levantamento encontrou uma situação muito grave: a desnutrição atingia muitas crianças indígenas (uma em cada três tinha desnutrição, entre as menores de cinco anos). A situação foi mais grave na região Norte do país, mas também era grave nos DSEI das outras regiões. Os dados ainda registraram muita anemia entre as crianças. Além disso, mostraram que existe uma grande desigualdade entre as condições de saúde e nutrição das crianças indígenas e as condições das crianças não indígenas. Isso quer dizer, como já vimos no texto sobre o perfi l epidemiológico dos povos indígenas, que encontraram muito mais desnutrição nas crianças indígenas do que nas crianças não indígenas. Quando pesquisaram a anemia, encontraram a mesma situação: mais da metade das crianças indígenas com menos de cinco anos tinha anemia. As crianças indígenas também eram mais atingidas do que as crianças não indígenas que tinham sido avaliadas em outras pesquisas. Isso mostra uma situação que precisa ser mudada com muita urgência. DESNUTRIÇÃO 23 MAS POR QUE AS CRIANÇAS INDÍGENAS SÃO TÃO ATINGIDAS PELA DESNUTRIÇÃO E PELA ANEMIA? O Inquérito também investigou os problemas e, como já dis- semos, encontrou muitas causas. Os pesquisadores dizem que são muito importantes os problemas relacionados ao acesso à terra e à produção de alimentos pelas comunidades. Eles também mostram que as condições sanitárias nas comunidades pesquisadas eram muito precárias, muitas vezes com problemas ou mesmo a falta de sistemas de tratamento de água e de dejetos e de recolhimento do lixo. Foram registrados problemas causados pela água contamina- da, pelas internações por diarreia e por infecções respiratórias. O Inquérito mostrou, ainda, que a suplementação de ferro nem sem- pre acontecia. Com esse tipo de situação, muito comum entre os povos indí- genas do Brasil, não podemos aceitar que ainda se diga que a re- sponsabilidade ou a culpa pela desnutrição da criança é de seus pais. Nós estamos falando de um tipo de situação que aconte- ce mesmo com todo o cuidado dos pais da criança; e os adultos também enfrentam condições que facilitam a ocorrência de prob- lemas de saúde. Estes problemas são causas muito importantes de desnutrição e de anemia e precisam ser solucionados para que possam ser superados. Muitos povos têm suas próprias explicações sobre o problema da desnutrição. É muito importante que a sua equipe conheça as explicações do seu povo. Você e sua equipe já conversaram sobre esse problema? 24 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena COMO SABER SE A CRIANÇA ESTÁ DESNUTRIDA? O que é a desnutrição A desnutrição é uma doença causada por falta de alimentação e por descumprimento de regras no cuidado com a família. A desnutrição é mais comum nos meninos e nas meninas. Também pode atingir os idosos e algumas mulheres gestantes. Quando um casal tem criança pequena, se eles fi zerem relação sexual, pode causar emagrecimento da criança. Isso pode causar desnutrição na criança porque ela não vai ter vontade de se alimentar bem; sempre que ocorrer uma epidemia de gripe ou diar- reia, essa criança vai apresentar sintomas mais graves. Até mesmo outro tipo de sintomas a relação sexual dos pais pode provocar na criança. Os fi lhos dos pais e das famílias que não cuidam bem das crianças e quando os pais têm preguiça de cuidar dos fi lhos, essas crianças estarão sempre desnutridas. A desnutrição também acontece porque alguns rapazes e moças, que ainda são novos, se casam, sem saber as regras de como cuidar de uma criança, ou até mesmo de si próprios. Fonte: Wâtan khwê wa nhõ twâ – Livro sobre nutrição. Agentes de Saúde e Pro- fessores Kisêdjê. Projeto Xingu/Unifesp/MEC/UFMG, 2012. Nem sempre é fácil saber se a criança está desnutrida. A desnutrição não é como a gripe, quando a criança sente mal estar, dores e febre. Às vezes a família só vai saber que a criança está com desnutrição quando ela apresenta alguma outra doença. Por isso é importante que a equipe e a família saibam identifi car os principais sinais que acontecem com a criança que está com desnutrição. A identifi cação e o tratamento de crianças com desnutrição pode ajudar a prevenir doenças graves e até mesmo evitar a morte da criança. Alguns casos de desnutrição podem ser tratados na própria aldeia, mas outros devem ser tratados no Polo Base ou nos hospitais. Como já vimos em outro momento, podemos saber que a criança está desnutrida através da avaliação do seu estado nutricional, ou seja, pesando e medindo a criança. A comunidade percebe a desnutrição como um problema em sua área de abrangência? Por quê? O que o seu povo pensa sobre a desnutrição e como ela pode acontecer? ATIVIDADE PROPOSTA DESNUTRIÇÃO 25 FIGURA 1: exemplo de criança desnutrida Se você não estudou este tema, volte no caderno sobre crescimento e desenvolvimento. SINAIS E SINTOMAS DA CRIANÇA COM DESNUTRIÇÃO Para entender melhor sobre o problema da desnutrição, é importante identifi car os principais sinais clínicos encontrados na criança que está desnutrida. Existem diferentes graus de desnutrição. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a criança pode ter desnutrição leve, considerada de 1o grau; desnutrição moderada, de 2o grau; ou ainda desnutrição grave, de 3o grau. Dependendo do grau de desnutrição ela vai apresentar sinais e sintomas diferentes. 26 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena A criança desnutrida pode apresentar os seguintes sinais e sintomas: • Fica magra. • Fica MUITO magra. • Fica sem fome. • Fica fraca. • Fica com a pele seca. • Fica com os dentes malformados. • Pode fi car inchada (com edema – em casos mais graves). • Fica com cabelos fracos e sem cor (claros). • Fica irritada e muitas vezes parece cansada e sonolenta. • Fica desidratada e com muita sede. • Não cresce como as outras crianças da mesma idade. • Adoece muitas vezes. É importante estar atento a todos os sinais e sintomas. Uma criança que estiver MUITO magra pode ter um tipo de desnutrição chamado marasmo. O marasmo é uma forma de desnutrição muito grave. A criança tem marasmo se estiver MUITO magra e com pouca gordura no corpo. FIGURA 2: Crianças com desnutrição grave – sinais de Marasmo e Kwashiorkor DESNUTRIÇÃO 27 As crianças com marasmo precisam de tratamento urgente e devem ser encaminhadas para um hospital. Para essa avaliação, retire toda a roupa da criança e observe se a criança apresenta os sinais clínicos de uma criança MUITO magra. Nesse caso, é importante observar se: • existe pouco músculo e pouca gordura nos ombros, braços, nádegas e pernas; • é possível ver facilmente o contorno das costelas; • o quadril parece pequeno se comparado ao tórax e ao abdome. O rosto de uma criança MUITO magra pode parecer o de uma pessoa velha. O abdome também pode parecer grande. Uma criança com inchaço (edema) nos dois pés pode ter uma doença chamada Kwashiorkor, que é outra forma de desnutrição muito grave. A criança pode apresentar-se tímida, irritada, com cabelo fi no, pele seca e escamosa, especialmentenos braços, e “cara de lua cheia”. Observe e palpe para determinar se a criança tem edema em ambos os pés. Use seu dedo polegar para pressionar suavemente por alguns segundos o lado superior de cada pé. A criança tem edema se fi car uma marca funda no pé, quando você levantar o seu dedo polegar, que demora para voltar ao normal. Muitas crianças com edema em ambos os pés também estão MUITO magras. PRINCIPAIS DOENÇAS A desnutrição faz com que a criança fi que doente muitas vezes, pois o seu corpo fi ca fraco e não tem força para se defender. As principais doenças que ocorrem quando a criança está desnutrida são: • As infecções respiratórias agudas (IRA). • As diarreias (agudas e persistentes). • As parasitoses intestinais. • A tuberculose em suas diferentes formas. • Algumas carências nutricionais específi cas (vitamina A, ane- mia ferropriva etc). Para um bom acompanhamento, toda equipe precisa saber quem são e quantas são as crianças desnutridas. 28 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena IDENTIFICANDO AS CAUSAS DA DESNUTRIÇÃO 1. A desnutrição é um problema de saúde na sua aldeia? 2. Na sua experiência profissional, você percebe um adoecimento mais rápido das crianças que estão com desnutrição? Do que elas adoecem mais? ATIVIDADE PROPOSTA É importante conhecer e mapear quem são as crianças desnutridas da comunidade, mas isso não é sufi ciente, é preciso investigar cada caso para saber o que realmente está acontecendo. Em primeiro lugar precisamos conhecer a história dessa criança, perguntando para a mãe ou outros cuidadores da criança: • A criança foi amamentada com o leite materno? Por quanto tempo? Quando a criança é amamentada com o leite materno, é mais difícil ela ter desnutrição, pois como vimos, o leite materno é rico em muitos nutrientes que ajudam a proteger a criança. Quanto mais a criança mama o leite da mãe, mais saúde ela vai ter. • Quantos irmãos a criança tem? Tem outros irmãos pequenos? Quando a criança tem muitos irmãos, pode acontecer da mãe não conseguir prestar atenção sufi ciente na alimentação de to- dos os fi lhos, inclusive da criança desnutrida. Nesse caso, você que é agente de saúde, pode conversar com a mãe dessa criança para entender se isso está acontecendo e para que ela dê uma maior atenção à alimentação da criança desnutrida. • A criança está sendo bem cuidada? A casa onde ela mora tem boas condições de limpeza? Conversar com a família para saber se os pais têm cumprido as regras tradicionais de cuidado da criança, se ela está sendo bem alimentada, se a família cuida da higiene da criança e da limpeza da casa. A criança que não está sendo bem cuidada e que mora num lugar contaminado tem mais chances de fi car desnutrida. • A criança está comendo bem? Quais são os alimentos ofere- cidos? Em que quantidade? Conversar com a família para saber se a criança está comen- do alimentos tradicionais, a variedade e a quantidade de alimen- tos oferecidos, quantas vezes por dia a criança está comendo, se não está faltando alimentos na casa, se a família oferece alimen- tos industrializados e perigosos para a saúde da criança. DESNUTRIÇÃO 29 COMO SABER SE A CRIANÇA ESTÁ COMENDO BEM? Saber que a criança está se alimentando não é sufi ciente, precisamos investigar o que ela está comendo e o quanto ela está comendo! Para isso, podemos perguntar à mãe ou ao responsável pela criança como foi a alimentação dela em alguns dias anteriores. Exemplo: • Ela comeu algo durante a manhã? O que? Qual quantidade? • Ela comeu algo no meio do dia? O que? Qual quantidade? • Ela comeu algo durante a tarde? O que? Qual quantidade? • Ela comeu algo durante a noite? O que? Qual quantidade? • Ela comeu algo antes de dormir? O que? Qual quantidade? É preciso procurar entender quais são as causas da desnutrição! Veja o que, para os Yudjá, no Parque Indígena do Xingu, causa a desnutrição: O que é e o que provoca a desnutrição? A desnutrição é provocada pela falta de uma alimentação completa e sau- dável. Também é causada pela falta de frutas. Se a criança comer alimen- tos contaminados e sujos, se não tiver um bom saneamento básico e não tiver higiene domiciliar e higiene na aldeia, ela vai fi car doente e pode fi car desnutrida. O casamento precoce, quando os pais são muito novos e não sabem cuidar dos fi lhos, causa desnutrição. A falta de escovação também pode causar desnutrição, porque com cárie e dor de dente a pessoa não se alimenta bem. É importante também lavar as mãos antes de comer e depois de fazer cocô para evitar doenças. Os pais também precisam respeitar as regras durante o período de resguardo, quando as crianças são pequenas. Fonte: Atxuã seha. Nutrição. Agentes de Saúde e professores Yudja. Projeto Xingu/ Unifesp/MEC/UFMG, 2012. • A criança tem apresentado sintomas de alguma doença? Conversar com a família para saber se a criança apresenta sintomas de alguma doença (febre, dores, diarreia, vômito, cho- ra demais, feridas, cansaço, etc). Se a família contar sobre algum desses sintomas, a criança precisa ser examinada. Como já vi- mos, a criança desnutrida tem mais facilidade de pegar qualquer doença”. 30 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena COMO ENFRENTAR A DESNUTRIÇÃO? Em primeiro lugar, é preciso que toda a equipe conheça o que seu povo pensa sobre a desnutrição, alimentação e saúde. Para isso é preciso fazer muitas conversas com as comunidades. Vigilância nutricional e alimentar A equipe de saúde deve fazer vigilância alimentar e nutricional nas aldeias, pesar as crianças todos os meses, acompanhar as crianças desnutridas e em situação de risco e acompanhar a alimentação de- las. Deve informar a família sobre o estado nutricional, explicar para a família oferecer alimentos balanceados e respeitar as regras para não deixar acontecer desnutrição na criança. Cuidar dos produtos da roça para sua família e para outras famílias, que também podem cuidar dos seus alimentos. Nós, Agentes Indígenas de Saúde (AIS), também temos o dever de acompanhar e cuidar das crianças, mas não somos só nós, os agentes de saúde, que devemos fazer este trabalho. Os caciques, as re- presentantes das mulheres, os professores e os conselheiros das aldeias precisam ajudar no trabalho dos AIS, fazer o trabalho em conjunto com os caciques na conscientização da comunidade, para que as pessoas fa- çam roças para alimentar as famílias. Os professores também precisam fortalecer o trabalho dos AIS e dos agentes de manejo na plantação das frutas para nossas crianças em nossas aldeias. A equipe de saúde não indígena deve trabalhar direito, orientar a comunidade sobre doenças e alimentação, ajudando os AIS a explicar sobre os problemas de saúde e alimentação para a comunidade. As pessoas que têm salário precisam comprar somente alimentos bons para sua família e coisas boas. Fonte: Koa ka’arana ore jemu’e awera imome’wara. Agentes de Saúde e professo- res Kawaiwete. Projeto Xingu/Unifesp/MEC/UFMG, 2012. Muitas vezes é difícil obter todas essas respostas.Nesse momento, é importante perguntar para a mãe ou o responsável se a criança está comendo os alimentos tradicionais que são adequados para a idade dela de acordo com as regras do seu povo. A visita domiciliar é um bom momento para fazer essas perguntas e observar como a criança vive. Uma das estratégias para entender o que está acontecendo com a criança é observá-la e acompanha-la desde que ela acorda até ela dormir. Fazer uma história do dia da criança e anotar tudo o que ela comeu, quem ofereceu, o que ela fez etc. Essa observação pode revelar muitas coisas, inclusive quem pode ajudar a tratar a criança. Às vezes pode ser a avó, ou a tia, porque os pais estão com outros problemas ou outras crianças para cuidar. Em alguns casos a criança pode estar tomando café antes de comer o beiju e comisso perde a fome e não come bem. Tudo isso precisa ser mapeado, investigado. Por isso, você deve conhecer todas as crianças desnutridas de sua aldeia e área de abrangência. DESNUTRIÇÃO 31 A IMPORTÂNCIA DA CONVERSA COM A COMUNIDADE A conversa com a comunidade pode ajudar muito a equipe na identifi cação das causas da desnutrição e também no planejamento de soluções para os problemas. Uma forma de conversar coma comunidade sobre o problema da desnutrição e sobre outros problemas de saúde é construir junto com os membros da comunidade a rede explicativa, onde vai ser feita uma refl exão sobre a origem e as explicações do problema. Se a desnutrição foi identifi cada como um problema na sua comunidade, use as seguintes perguntas para montar a rede explicativa: • Qual é o problema de saúde? • Por que a desnutrição é um problema? • Por que acontece a desnutrição? Depois é importante criar com a comunidade um plano de soluções para os problemas identifi cados na rede explicativa com propostas de ações em diferentes locais envolvendo as instituições relacionadas à saúde e outros setores: • Aldeia • Polo base • DSEI • Outros setores Veja a seguir um exemplo das explicações da desnutrição e o plano de soluções que foi elaborado por um povo de um DSEI do Mato Grosso: O acompanhamento do estado nutricional (pesar e medir) das crianças deve ser realizado mensalmente sempre que possível. Assim podemos perceber se a criança está perdendo peso ou deixando de crescer. Acompanhar o crescimento da criança é muito importante, pois quando percebemos que a criança não está ganhando peso, podemos agir em conjunto com a comunidade, a família e a equipe de saúde para que essa criança não fi que desnutrida. Quando a criança está com MUITO baixo peso, o acompanhamento deve ser feito com um intervale menor, por exemplo de quinze em quinze dias, ou até semanalmente se necessário, para que seja acompanhada com maior cuidado, observando como está sua alimentação e ajudando a criança a ganhar peso mais rápido. 32 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena DESNUTRIÇÃO 33 34 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena Alguns povos indígenas elaboraram propostas conjuntas de enfrentamento da desnutrição, propondo a criação de animais domésticos como galinhas ou peixes, para comer em tempos de muita chuva e pouca comida. Fizeram projetos para recuperação das terras para o plantio. Mobilizaram os jovens para derrubar e plantar roças comunitárias. Plantar hortas e árvores frutíferas no entorno das aldeias. Cuidar e proteger as crianças que estão mais vulneráveis ou em risco de ter desnutrição. Existem muitas estratégias de enfrentamento do problema da desnutrição, mas é importante saber que elas devem ser construídas em conjunto: a equipe de saúde junto com a comunidade e com outros setores, como a escola, a Fundação Nacional do Índio (Funai), as associações indígenas, as Organizações Não Governamentais (ONGs), os municípios, entre outros. 1. Como é uma alimentação saudável para as crianças do seu povo? 2. Você vai observar o dia de uma criança de dois a sete anos na sua aldeia. Escolha uma criança nessa faixa de idade e acompanhe o dia dela desde que ela acorda até ela dormir, à noite. Observe o que ela faz, como ela brinca, com quem ela brinca, quem cuida dela, quem dá comida para ela, o que ela come, até ela dormir novamente. 3. Faça um relato desta observação, discuta o caso com seus colegas e apresente na próxima etapa, em sala de aula. ATIVIDADE PROPOSTA Veja no quadro a seguir como avaliar a criança com desnutrição e o que fazer em cada situação. Procure ler e estudar junto com seus colegas e com a equipe de saúde de seu Polo Base. Vocês podem planejar as ações educativas e de acompanhamento dos casos de desnutrição em sua área de abrangência. Lembre-se, sempre, de conversar com a equipe sobre os casos de desnutrição. Muitas vezes as pessoas apenas registram os dados nos formulários e fi chas e se esquecem de acompanhar as crianças. DESNUTRIÇÃO 35 36 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena DESNUTRIÇÃO 37 DOENÇAS DIARREICAS TEXTO 3 OBJETIVOS • Entender porquê as doenças diarreicas acontecem mais nas crianças; • Estudar como fi ca o corpo doente, quais são os sinais de peri- go e as complicações da diarreia • Compreender e refl etir sobre o papel do AIS, AISAN, da EMSI, da família e da comunidade nas ações de recuperação, prote- ção, prevenção e promoção da saúde, relacionadas às doen- ças diarreicas. Você já acompanhou crianças com diarreia na sua comunidade? Conte como foi seu trabalho e da EMSI. Conte o que aconteceu com a criança e a família. Para seu povo, por que a diarreia acontece? Existem tratamentos tradicionais para diarreia? Existem cuidados para a criança não pegar diarreia? ATIVIDADE PROPOSTA Patricia Rech Monroe e Sofia Beatriz Machado de Mendonça. 38 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena38 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena DOENÇAS DIARREICAS 39DOENÇAS DIARREICAS 39 A TRANSMISSÃO E OS FATORES DE RISCO DAS DOENÇAS DIARREICAS No mundo inteiro, a diarreia acontece principalmente em famílias e comunidades que moram em lugares onde não há saneamento básico com água potável e esgoto; que não conseguem ter uma boa alimentação por falta de dinheiro ou falta de recursos naturais para plantar, pescar e caçar; e que não recebem uma boa assistência à saúde, lugares onde não há equipes de saúde, estrutura, materiais e equipamentos para o trabalho de saúde. A doença é uma das maiores causas de adoecimento e morte, principalmente em crianças abaixo de dois anos e idosos. As diarreias são causadas por vários tipos de micro-organismos, como bactérias, vírus e protozoários, e por vermes. Os micróbios (ou micro-organismos) causadores de diarreia são seres vivos muito pequenos, invisíveis para os nossos olhos. Eles vivem no intestino do ser humano e podem viver em todo o ambiente: na terra, na água, nas plantas, em animais e nos objetos que usamos. Os vermes vivem no ambiente, na terra, dentro de animais e de seres humanos. No texto “Saúde e Natureza” você vai conhecer melhor os tipos de micróbios (também chamados de micro- organismos) e de vermes. Vai estudar como os cientistas não indígenas descobriram que eles existem, o ciclo de vida e também muitas doenças causadas por eles. A transmissão da diarreia acontece de muitas formas. Nas diarreias causadas por vermes e micróbios, a transmissão acontece pela via fecal-oral, quer dizer, a pessoa doente contamina o ambiente com suas fezes e a pessoa saudável leva até a boca o micróbio ou verme causador da doença, sem perceber. As fezes da pessoa doente podem contaminar a água dos rios, lagoas e poços; a terra, as plantas e a roça; os animais que se alimentam de plantas; o terreno em volta das casas; a rede, colchão, roupas, toalha, lençol e cobertor que a pessoa doente usou. Quando a pessoa doente não lava bem as mãos depois de evacuar, os micróbios das fezes fi cam na sua mão e ela pode contaminar qualquer objeto que pegar, como os utensílios de cozinha, incluindo panela, balde, cuia, copos, prato, colher; os acessórios de banheiro, como vaso sanitário, botão de descarga, torneira, maçaneta da porta; toalhas, roupas, ferramentas e brinquedos. 40 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena A contaminação acontece quando os micro-organismos são transportados de um lugar para outro lugar ou objeto, em quantidade sufi ciente para causar a doença, se a pessoa entrar em contatocom os micro-organismos neste novo lugar. Por exemplo, na frase “a pessoa sujou suas mãos com fezes e contaminou a maçaneta da porta e os copos em cima da mesa”. Usamos a palavra transmissão para dizer que uma doença passou de um organismo para outro, pode ser de um animal para um ser humano ou entre os seres humanos. Por exemplo: “a criança mais velha, que estava doente, transmitiu a diarreia para seus irmãos”. As moscas, abelhas, formigas, baratas, ratos, gatos e cachorros podem passar pelas fezes de uma pessoa doente e depois contaminar alimentos, água armazenada em casa e objetos. Nas diarreias causadas por vírus, a transmissão acontece também pelo contato direto, isto é, de uma pessoa doente para outra, pela saliva, espirro e tosse. Por isso, os casos de diarreia por vírus aumentam rápido e podem chegar a uma epidemia na comunidade e na Terra Indígena. A mulher doente que não lava as mãos depois de evacuar pode transmitir a doença para o bebê quando vai amamentar, porque ela mexe nos seios e no bebê com a mão contaminada. comunidade e na Terra Indígena. FIGURA 3: formas de transmissão DOENÇAS DIARREICAS 41 A complicação mais rápida e perigosa da diarreia é a desidratação. O que você acha que acontece no corpo humano quando ele está com desidratação? Por que ela é perigosa? ATIVIDADE PROPOSTA A ÁGUA EM NOSSO ORGANISMO: CONCEITO DE HIDRATAÇÃO E DESIDRATAÇÃO No conhecimento da biomedicina, o corpo humano é formado por várias estruturas e órgãos. O corpo também é formado por água. Ela está em todas as partes do corpo e no sangue. Todos os líquidos que bebemos têm água: suco, água de coco, mingau, leite, chá. As frutas também têm muita água misturada nelas. Algumas raízes, como a mandioca, batata, cará, cenoura, inhame, têm bastante água também e todos os outros alimentos sempre têm um pouco de água. Depois que ingerimos qualquer tipo de líquido e alimento, a água é absorvida no intestino durante a digestão. Então ela vai para a corrente sanguínea e se mistura com o sangue, que é composto por aproximadamente 85% de água. A água presente no sangue passa por todas as partes do nosso corpo, órgãos e tecidos, até chegar em todas as células. Ela ajuda a transportar nutrientes, hormônios e anticorpos pelo sistema linfático e circulatório. E ajuda a retirar as toxinas e venenos que as células produzem. A diarreia é uma doença que começa com a alteração repentina (que aparece de repente) no hábito intestinal. Acontece um aumento da frequência (do número de vezes) das evacuações, junto com uma diminuição da consistência das fezes, que fi cam líquidas ou semilíquidas. Dizemos que a pessoa está com diarreia quando ela faz cocô mais vezes que o normal e mais mole que o normal. Em alguns casos, aparece muco (um tipo de catarro) e sangue nas fezes. A pessoa também pode ter náusea, vômito, febre e dor abdominal. 42 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena O sangue também passa pelos rins, que são um tipo de fi ltro. Neles, toda a toxina que o corpo produz normalmente é misturada com a água do sangue e eliminada pela urina. Podemos dizer que a água em nosso corpo é um tipo de solvente, ela está misturada ao sangue, levando os nutrientes e retirando as toxinas em todo o organismo. Veja na imagem algumas funções importantes da água em nosso corpo: FIGURA 4: funções da água no organismo humano Em um homem adulto, o organismo precisa de quatro litros de água para realizar bem todas essas funções. Pelo sistema circulatório, o sangue faz passar por nossos rins um volume total de 1.500 litros de água a cada dia. A quantidade de água no corpo das crianças, proporcionalmente, é maior do que nos adultos: as crianças de até dois anos têm 80% de água na composição do corpo. Entre 20 e 40 anos de idade, a pessoa tem 60% de água na composição do corpo. Quando as crianças estão com diarreia e vômito perdem mais líquidos que os adultos. DOENÇAS DIARREICAS 43 FIGURA 5: gráfi co como a água entra em nosso corpo FIGURA 6: gráfi co como a água sai do nosso corpo Por isso é preciso fi car muito atento quando uma criança está com diarreia. Vamos olhar dois gráfi cos: o primeiro mostra de que maneiras a água entra em nosso corpo. O segundo mostra como eliminamos a água do corpo, quer dizer, de que formas ela sai do nosso corpo. Veja os gráfi cos e converse com outros AIS da sua turma sobre o que vocês entenderam. 44 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena Isso é importante para entender o conceito de hidratação e desidratação. Dizemos que o organismo está hidratado quando ele tem água sufi ciente para fi car saudável e manter o bom funcionamento dos órgãos. O organismo desidratado está com pouca água, que não é sufi ciente para manter um bom funcionamento de todos os órgãos. Quando ingerimos a mesma quantidade de água que sai do nosso corpo, conseguimos manter nossa hidratação, fi camos hidratados. Quando perdemos muita água pelas fezes, urina, transpiração ou respiração e não ingerimos o sufi ciente para repor, nosso corpo fi ca desidratado. SINAIS E SINTOMAS DA DESIDRATAÇÃO Como podemos saber quando uma pessoa está desidratada? Você já deve ter visto uma planta seca por causa da falta de chuva ou porque alguém se esqueceu de molhar. Como ela fica? Ela fica diferente da planta normal? Por quê? ATIVIDADE PROPOSTA O que você viu de diferente na planta seca, são os sinais de que ela não está normal. Quando o corpo humano está desidratado, também aparecem sinais de desidratação, aquilo que conseguimos enxergar de diferente no corpo da pessoa doente. Sinais de hidratação: a criança está bem hidratada quando seus olhos têm lágrimas e estão úmidos e brilhantes; a boca tem saliva e a língua está úmida; a pele está fi rme; a quantidade de urina está normal; o batimento do coração está normal; a respiração está normal; e ela não tem sede. A criança está alerta, presta atenção, olha e brinca quando conversamos com ela. DOENÇAS DIARREICAS 45 Sinais de hidratação: a criança está bem hidratada quando seus olhos têm lágrimas e estão úmidos e brilhantes; a boca tem saliva e a língua está úmida; a pele está fi rme; a quantidade de urina está normal; o batimento do coração está normal, a respiração está normal e ela não tem sede. A criança está alerta, presta atenção, olha e brinca quando conversamos com ela. FIGURA 7: sinais de hidratação Sinais de desidratação: quando a criança está desidratada, sua boca e língua fi cam secas; os olhos fi cam fundos, sem brilho e secos; quando a criança chora, sai poucas lágrimas e pode até mesmo parar de sair lágrimas. A pele fi ca parecendo borracha, quando seguramos a pele com nosso dedos, fazendo uma prega, ela demora pra voltar ao normal. A criança faz pouco xixi e pode até mesmo parar de urinar. Ela fi ca com muita sede. A criança fi ca mais sonolenta ou irritada. Em casos graves, o batimento do coração fi ca mais rápido e a respiração fi ca mais profunda e rápida. Ela pode fi car prostrada, com o corpo mole e caidinha, com os olhos parados e não reage quando conversamos com ela. FIGURA 8: sinais de desidratação É muito importante o AIS e as famílias conhecerem os sinais de desidratação, para fi carem alertas e avisarem a EMSI sempre que uma criança com diarreia fi car desidratada. FIGURA 7: sinais de 46 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena TIPOS DE DOENÇAS DIARREICAS Outra complicação importante da diarreia nas crianças é a desnutrição, principalmente quando acontecem episódios repetidos e frequentes de diarreia. Você já estudou sobre as complicações da desnutrição e como ela pode deixar a criança mais vulnerável às doenças. Mais à frente vamos estudar sobre o ciclo vicioso da diarreia e desnutriçãojuntas. Na biomedicina, falamos que as diarreias podem ser de três tipos, depende do tempo de duração da doença: • Diarreia aguda: a pessoa doente tem sinais e sintomas de um até 14 dias. • Diarreia persistente: é quando a diarreia se prolonga por mais de 14 dias, até 30 dias. • Diarreia crônica: é aquela diarreia que continua por mais de 30 dias com os sintomas ou tem três ou mais episódios de diarreia aguda no período de 60 dias. 1. Diarreia aguda É o tipo de diarreia mais comum. É uma doença autolimitada, ou seja, sua duração é de um a 14 dias, em média uma semana, e termina mesmo quando não é feito um tratamento específi co. As causas mais comuns de diarreia aguda são: • Vírus: o mais frequente é chamado de Rotavirus. • Bactérias: existem muitas bactérias, ou as toxinas (veneno) que elas produzem que podem causar diarreia. A mais conhe- cida é a Escherichia coli. • Protozoários: o mais comum é a Giardia lamblia. • Remédios: em algumas pessoas, remédios que são usados para tratar outras doenças podem provocar diarreia. Por exemplo: alguns antibióticos, como a amoxicilina. • Alimentos: existem alguns alimentos que podem causar diar- reia, principalmente se forem ingeridos em grande quanti- dade. Por exemplo: açúcar, balas e doces; gordura como a gordura da carne, óleo para cozinhar; frutas que não estão maduras, leite de vaca; pequi; açaí. Outro tipo de diarreia causada por alimentos é a intoxicação alimentar. Ela aconte- ce quando ingerimos alimentos estragados, ou seja, apodre- cidos ou contaminados por micro-organismos durante o seu preparo (pelas mãos ou utensílios contaminados) e pela má conservação de alimentos que fi cam expostos muito tempo ao calor e ao ar. As bactérias são os micro-organismos mais comuns nas intoxicações alimentares, como a Salmonella. DOENÇAS DIARREICAS 47 • Estado emocional: algumas pessoas quando fi cam muito ner- vosas sentem dor de barriga e têm diarreia, mas em geral, nestes casos, ela passa rápido. • Outras doenças: às vezes a diarreia é uma alteração inicial de outras doenças, como malária, pneumonia e infecção urinária. No quadro de diarreia aguda, o intestino reage e fi ca infl amado, aumentando os movimentos peristálticos. Movimentos peristálticos são movimentos involuntários, realizados pelos músculos do tubo digestivo (intestinos e esôfago). Esses movimentos de contração e relaxamento dos músculos empurram devagar o bolo alimentar pelo tubo digestivo, para que a digestão aconteça no local certo. Na diarreia, os movimentos estão empurrando todo o conteúdo do intestino bem rápido, não há tempo para absorver a água, nutrientes e os sais minerais como o sódio e potássio. Com isso, aumenta o número de evacuações e as fezes fi cam mais moles, até mesmo líquidas. A principal complicação da diarreia é a desidratação causada pela perda rápida de água nas fezes. Por isso, o tratamento principal é manter a criança bem hidratada, ou seja, recebendo líquido sufi ciente para seu organismo continuar funcionando bem. Fatores de risco para a criança ter diarreia: • Não ter água potável (tratada) para beber • Não ter boa higiene pessoal e na casa • Criança que para de mamar o leite materno antes de comple- tar seis meses • Criança que nasce com peso baixo (menor que 2.500 Kg) • Criança desnutrida tem mais diarreia e, quando tem, é mais grave O que o profi ssional da EMSI examina e avalia no paciente com diarreia: Conversando com a família e com o doente. Perguntar sempre: • Qual a idade do paciente? • Que dia começou a diarreia? 48 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena • Quantas vezes evacuou hoje? • Quantas vezes evacuou no dia anterior? • As fezes estão amolecidas ou líquidas? • Está piorando ou melhorando? • Apareceu sangue ou muco (catarro) nas fezes? • Ele comeu alguma coisa diferente? • Ele está vomitando? Quantas vezes por dia? • Está vomitando só agua ou alimentos? • O paciente está apresentando outros sinais e sintomas, como dor de barriga, dor de cabeça, fraqueza, pouca vontade de co- mer ou mamar? • O paciente teve febre? • O paciente tem sede? • O paciente está fazendo xixi? • O paciente já teve diarreia antes? Há quanto tempo foi isso? • Tem mais gente na casa com os sintomas? Examinando o doente. No exame físico, o profi ssional da EMSI verifi ca: • Peso e estado nutricional: teve perda de peso depois que co- meçou a diarreia? Está desnutrido ou eutrófi co? • Estado geral: o paciente está ativo, atento, tranquilo, irritado, desanimado, sonolento ou caidinho e mole (prostrado)? • Temperatura: tem febre? • Boca e língua: a boca e a língua estão úmidas ou secas? • Olhos: estão normais ou fundos? Quando chora tem lágrimas ou o olho está seco? • Prega da pele: quando faz a prega da pele, ela volta rápido ou demora? FIGURA 9: fazendo a prega da pele: segure a pele entre dois dedos, assim… Se a pele não voltar logo ao normal, a pessoa pode estar desidratada. DOENÇAS DIARREICAS 49 • Frequência cardíaca: está normal ou aumentada? • Frequência respiratória: está normal ou o paciente está can- sado, com respiração rápida e difícil? • Abdome: o ruído dos movimentos peristálticos está aumen- tado? Dói quando aperta? • Mãos e pés: estão quentes ou frios? Estão úmidos e suados? • Fontanela (moleira) em bebês: está normal ou está funda? Tratamentos A diarreia aguda é uma doença autolimitada, a maioria dos casos não é tratada com medicamentos. O tratamento mais importante é manter a criança bem hidratada e evitar a desidratação, que pode matar! Se não é feita a reposição de água e de sais minerais, o corpo da criança entra em um quadro perigoso de queda de pressão arterial, perda de consciência, convulsões, coma, falência de órgãos, parada cardíaca e morte. Plano 1: tratamento do paciente sem desidratação O que fazer: - Pesar a criança duas vezes ao dia – pela manhã e à tarde, todos os dias, enquanto durar a diarreia. Anotar o horário e o peso. - Avisar a EMSI da sua área ou Polo Base assim que puder, pas- sando o caso. - Explicar para a família a importância de dar mais água, min- gau, suco natural, chá ou leite materno para a criança. - Após orientação da equipe, dar soro de reidratação oral (enve- lope) ou soro caseiro após cada evacuação (usar colher, copo, cuia ou seringa): • Crianças até seis meses - dar 50 ml • Crianças de seis meses a um ano - dar 100 ml • Crianças de um a dois anos - dar 150 ml • Crianças acima de 2 anos - dar 200 ml - Lembre-se de que a criança pode sentir náusea e não conse- guir tomar o soro, por isso ele deve ser dado para a criança bem devagar, um pouquinho de cada vez. - Anotar o horário e a quantidade de soro que a criança tomou. - Anotar o horário quando a criança urinar, evacuar, vomitar ou se alimentar. 50 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena DOENÇAS DIARREICAS 51 Plano 2: tratamento do paciente com pouca desidratação O que fazer: - Pesar a criança duas vezes ao dia – pela manhã e à tarde, todos os dias, enquanto durar o quadro diarreico. Anotar o horário e o peso. - Avisar a EMSI da sua área ou Polo Base. A criança deve ser acompanhada pela equipe. Ou a equipe se desloca para sua aldeia ou a criança deve ser encaminhada para o Polo Base ou Unidade Básica de Saúde. A EMSI deve iniciar a Terapia de Reidratação Oral (TRO). - Iniciar a TRO: a criança deve receber o soro oral (de envelope ou caseiro) na dose correta, que é de 50 ml/kg no período de 4 a 6 horas. Por exemplo, uma criança de 6 kg precisa tomar 300 ml no período de 4 a 6 horas para repor a água e os sais minerais (sódio e potássio) que está perdendo. - A criança deve receber o soro oral aos poucos, em pequenas quantidades, várias vezes, para não vomitar. Pode ser usada colherzinha ou seringa. - Anotações e balanço hídrico: o profi ssional deve anotar o ho- rário em que a TRO começou,a quantidade de soro que a criança tomou e o horário de cada tomada. Ao fi m de 4 ou 6 horas a criança precisa tomar toda a quantidade calculada para o seu peso. - Deve-se anotar também a hora e a quantidade aproximada de urina e fezes que a criança eliminou. Se a criança mamar, comer ou vomitar, também deve ser anotado. - Se a criança vomitar, esperar 10 minutos para continuar o soro. - Passar para a equipe todos os registros que você fi zer durante o dia sobre o que a criança ingeriu e eliminou. - A criança que é amamentada pode continuar recebendo o lei- te da mãe à vontade. A criança mais velha pode continuar tomando normalmente outros líquidos naturais que a famí- lia oferecer: água, mingau, suco natural, chá, água de coco. O refrigerante, suco em pó e suco de caixinha não podem ser oferecidos enquanto a criança estiver doente. Esses produtos não hidratam bem e muitas vezes pioram a diarreia. Se a criança começar a apresentar qualquer sinal ou sintoma da situação 2 (veja o quadro anterior), é preciso começar o plano de tratamento 2. 52 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena “Quando a equipe de saúde, junto com o AIS, sabe explicar bem sobre a importância do soro oral, sobre a doença e o que a desidratação faz no corpo da criança, a família entende que o soro é um tipo de tratamento... É remédio mesmo, não é só água para encher a barriga da criança... Mas precisa paciência para explicar, mostrar a doença no fi lme, na foto... Tem mãe que não quer dar o soro porque ela acha que a diarreia vai piorar com essa água. Na nossa cultura, não é bom tomar água pura quando tem diarreia, isso é novidade para nós. Pode tomar mingau e alguns tipos de sucos, não é qualquer fruta que pode. Mas se a gente explicar do jeito certo e se mãe ver que tem um resultado, que a equipe fi ca lá com a criança direto, dando o soro devagar e acompanhando, ela vai confi ar. Mas se o enfermeiro vai lá na casa, deixa uma jarra de soro com a mãe e vai embora, para ela isso é igual a uma jarra de água mesmo”. Fonte: Depoimento de AIS. Relatório de ofi cina de vigilância da saúde, Projeto Xingu/ UNIFESP, 2004 A Terapia de Reidratação Oral (TRO) deve ser feita sempre por uma pessoa da equipe. O AIS que recebeu treinamento pode fazer junto com os outros membros da EMSI. Durante a TRO, o soro oral não deve ser entregue à família, porque é um tratamento supervisionado. O profi ssional precisa dar a dose certa e anotar todas as vezes que a criança tomou, recusou ou vomitou. Quando a TRO é feita de forma supervisionada, aumenta muito a chance de a criança se recuperar e não fi car com desidratação grave, que pode matar. Assim, a equipe tem um controle do balanço hídrico, ou seja, da quantidade de água ou líquidos que está entrando no orga- nismo e da quantidade que está sendo eliminada pela criança. - Outros medicamentos: a criança pode precisar de medicamen- tos para febre ou para diminuir os vômitos, de acordo com a avaliação médica. Por exemplo, nas diarreias causadas por Rotavírus a criança vomita muitas vezes, por isso não con- segue tomar o soro e desidrata muito rápido. Nestes casos, a equipe avalia a necessidade de usar antiemético injetável, para continuar a TRO. DOENÇAS DIARREICAS 53 Após o período da TRO, depois que a criança receber toda dose de soro calculada, deve-se continuar dando o soro oral depois de cada evacuação, seguindo as doses: • Crianças até seis meses - dar 50 ml • Crianças de seis meses a um ano - dar 100 ml • Crianças de um a dois anos - dar 150 ml • Crianças acima de dois anos - dar 200 ml A criança que é amamentada pode continuar recebendo o leite da mãe à vontade. A criança mais velha pode continuar tomando normalmente outros líquidos naturais que a família oferecer: água, mingau, suco natural, chá, caldos ou água de coco. Se a criança em tratamento continuar piorando, ou se o caso já chegar para você com sinais e sintomas da situação 3 do quadro anterior, é preciso começar o plano 3. Plano 3: tratamento do paciente com desidratação grave O que fazer: - Pesar a criança. Anotar o horário e o peso. - Avisar a EMSI da sua área ou Polo Base. A criança deve ser encaminhada imediatamente. Se não conseguir falar com a equipe, remova a criança de qualquer jeito para a sua refe- rência. - Enquanto isso, tente dar o soro oral aos poucos, mas não insis- ta se a criança estiver vomitando muito. - Durante o transporte da criança para o Polo Base ou Unidade Básica de Saúde, anotar se teve vômitos, o número de evacu- ações, se está urinando, se está mamando, aceitando alimen- tos ou líquidos. - Durante a viagem de remoção, oriente a mãe a proteger a criança do sol, porque ela perde mais água pelo suor, fi cando desidratada mais rápido. - Hidratação venosa: a criança deve receber o soro na veia, pres- crito e administrado pela EMSI. Outros medicamentos injetá- veis para febre e vômitos podem ser usados, de acordo com a necessidade e a avaliação da equipe. Tratamento com antibióticos e antiprotozoários Algumas diarreias agudas causadas por bactérias e protozoários precisam de tratamentos específi cos. A EMSI deve avaliar o caso. 54 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena 2. Diarreia persistente A duração desse quadro é de 14 a 30 dias e, geralmente, a causa é infecciosa, ou seja, causada por bactérias ou protozoários. Acontece principalmente com crianças desnutridas e abaixo de três anos. O corpo da criança desnutrida é mais fraco, não tem proteção contra os micro-organismos. Quando a criança desnutrida tem uma diarreia persistente, ela não consegue absorver bem os nutrientes dos alimentos, assim perde peso e piora a desnutrição. Por outro lado, a desnutrição também causa uma piora da diarreia persistente. Chamamos isso de círculo vicioso da doença. É muito grande a chance de uma criança desnutrida morrer quando tem uma diarreia persistente, sem acompanhamento e sem tratamento. Para recuperar a saúde da criança, é preciso quebrar esse círculo vicioso. Isso só é possível se os profi ssionais de saúde, família e comunidade trabalharem juntos, para o tratamento e acompanhamento da criança e nas ações de vigilância nutricional, vigilância em saúde e segurança alimentar que já conversamos em outros textos. 3. Diarreia crônica É a diarreia que dura mais de 30 dias ou quando ocorrem três ou mais episódios de curta duração num período de dois meses. Pode ser causada por parasitoses, como amebíase ou giardíase; alergia ao leite de vaca; ou pode ser sinal de outras doenças mais graves. A equipe deve ser avisada e fi car atenta para identifi car, avaliar e acompanhar um caso de diarreia crônica. Em geral a diarreia crônica cursa junto com a desnutrição. IMPORTANTE Preparo do soro de reidratação oral O SRO (soro de reidratação oral) é embalado em um pequeno pacote ou envelope protegido da luz. É um pó para solução oral. Após a diluição em 1 litro de água, sua composição é de glicose, cloreto de sódio, cloreto de potássio e citrato de sódio. Além da água, o SRO também repõe alguns sais minerais (sódio e potássio) muito importantes para o funcionamento de todo o corpo, músculos, coração e cérebro. Ele contém um pouco de glicose, para oferecer energia para o organismo. Cuidados durante o preparo do soro de reidratação oral: • Verifi car a data de validade do pacote e se ele está limpo e seco. Não usar o soro se ele estiver com data de validade ven- cida ou se a embalagem estiver úmida, suja ou aberta. DOENÇAS DIARREICAS 55 • Usar uma vasilha, jarra ou outro tipo de recipiente com tam- pa que mostre a medida de 1 litro. Lembre-se de lavar bem o recipiente com água e sabão. Se não houver tampa pode ser usado papel toalha, gaze ou outro tipo de material limpo e seco para manter o frasco tampado. • Usar somente água fria, fi ltrada ou fervida.Se usar agua fervi- da, precisa esperar ela esfriar para misturar o pó. • Respeitar o volume total de 1 litro e misturar bem todo o con- teúdo do pacote. • Não ferver o soro depois de preparado. • Não misturar nenhum outro ingrediente, como açúcar. • Anotar a data e a hora em que foi preparado. Após o preparo, o soro pode fi car em temperatura ambiente (15ºC a 30ºC) e deve ser usado em até 24 horas. Após esse tempo, jogar fora o que sobrou e preparar outro pacote. Como preparar o soro caseiro Se faltar o envelope de SRO, pode ser usado o soro caseiro, apenas em último caso, se não tiver outro jeito de hidratar a criança. • Lave bem as mãos com água e sabão. Pegue um copo limpo, de 200 ml, com água fria que esteja fi ltrada ou fervida. • Acrescente um punhado de açúcar (com a mão fechada) e uma pitada de três dedos de sal. Misture bem. Você também pode utilizar a colher-medida, distribuída nos postos de saúde: • Lave bem as mãos com água e sabão. Pegue um copo limpo, de 200 ml, com água fria que esteja fi ltrada ou fervida. • Misture duas medidas rasas de açúcar e uma medida rasa de sal. Para fazer certo a medida rasa, encha a medida da colher, passe a uma espátula ou as costas de uma faca, retirando o excesso de sal ou açúcar. É muito comum as pessoas acreditarem que dar algo para beber pode piorar a diarreia. É fácil pensar isso, quando se vê as fezes líquidas numa criança, mas os líquidos naturais não causam diarreia. Ela vai continuar mesmo que a pessoa não beba líquidos. Mas dar líquidos ajuda a pessoa a fi car forte e a sair do quadro de desidratação, que pode matar. Também ajuda a “limpar” o sistema digestivo, retirando micro-organismos. O AIS e a EMSI têm um trabalho muito importante de orientar e ajudar as famílias a conhecerem e entenderem mais sobre os perigos da desidratação. 56 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena O QUE O AIS E O AISAN DEVEM FAZER? Espaço para registro de palavras novas Anote aqui palavras do texto que você não conhece e pesquise o signifi cado com seus professores, colegas e no dicionário. Ações de prevenção individual e ações de promoção da saúde coletiva relacionadas às doenças diarreicas: • Melhoria da qualidade da água. • Destino adequado de lixo e dejetos. • Ações de controle de moscas, formigas e baratas. • Medidas de higiene individual e de manipulação de água e ali- mentos. • Orientação dos familiares da criança doente para não trans- mitir a doença. • Ações de educação em saúde, particularmente em áreas de elevada incidência de diarreia. • Participar da articulação com escolas, lideranças, mulheres, associação indígena, para o desenvolvimento de ações coleti- vas, como mutirões de limpeza e ações educativas. • Explicar sobre o que acontece com o corpo da pessoa com diarreia e desidratação, para entenderem a importância da terapia de reidratação oral. • Verifi car com a EMSI se está acontecendo a vacinação contra o Rotavirus. Esta vacina ajuda a controlar os surtos de diarreia causados por este vírus. Rotavírus, em geral, causa quadros graves, de transmissão rápida para um número grande de crianças e aldeias. Ações de acompanhamento e recuperação da saúde da criança com diarreia: • Vigilância das doenças diarreicas. • Conhecer sinais e sintomas das complicações. • Acompanhar as consultas e visitas da equipe, buscando tirar dúvidas, aprender e exercitar. • Registro dos casos de diarreia. • Comunicação com a equipe. DOENÇAS DIARREICAS 57 58 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena58 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena INFECÇÕES RESPIRATÓRIAS AGUDAS (IRA) TEXTO 4 OBJETIVOS SISTEMA RESPIRATÓRIO: TRANSMISSÃO, SINAIS E SINTOMAS DAS IRA • Entender porquê as infecções respiratórias agudas afetam mais as crianças; • Estudar como fi ca o corpo doente, os sinais de perigo e as complicações das doenças respiratórias agudas; • Compreender e refl etir sobre o papel do Agente Indígena de Saúde (AIS), da Equipe Multidisciplinar de Saúde Indígena (EMSI), da família e da comunidade nas ações de recupera- ção, proteção, prevenção e promoção da saúde relacionadas às doenças respiratórias agudas. Quais são as doenças respiratórias que você conhece? Para seu povo, por que elas acontecem? ATIVIDADE PROPOSTA As doenças respiratórias são um conjunto de doenças causadas por micro-organismos e outros agentes, como poluição, substâncias tóxicas, fumaça e cigarro, que atacam o caminho do ar, que chamamos de sistema respiratório. Essas doenças podem ser AGUDAS ou CRÔNICAS. Patricia Rech Monroe e Sofia Beatriz Machado de Mendonça. INFECÇÕES RESPIRATÓRIAS AGUDAS (IRA) 59INFECÇÕES RESPIRATÓRIAS AGUDAS (IRA) 59 As doenças ou Infecções Respiratórias Agudas (IRA) têm início rápido e duram em média sete dias. A gripe, o resfriado, a pneumonia, a otite média aguda e a amidalite são exemplos de IRA. Sempre são causadas por micro-organismos, como vírus, bactérias e fungos. As Doenças Respiratórias Crônicas demoram mais para apresentar sinais e sintomas; melhoram e voltam ao longo da vida; são mais difíceis de tratar e curar. Geralmente são causadas pela poluição, poeira, fumaça e cigarro. São exemplos a asma, a rinite alérgica e a doença pulmonar obstrutiva crônica. Neste texto, não vamos estudá-las, pois não acontecem tanto nas crianças, como as IRA. Para entender melhor como as Infecções Respiratórias Agudas atacam nosso organismo, vamos estudar agora o caminho do ar, ou sistema respiratório. O caminho do ar: o sistema respiratório O sistema respiratório é o conjunto de órgãos que fazem a entrada, a fi ltração, o aquecimento, a umidifi cação e a saída do ar do nosso organismo. A respiração e a troca dos gases acontecem nos pulmões, mas para o ar chegar lá deve percorrer várias partes de uma estrutura, que recebe o nome de vias aéreas, ou caminho do ar. As vias aéreas são divididas em via aérea superior e via aérea inferior. A via aérea superior tem a função de preparar o ar do meio ambiente para entrar nos pulmões, ou seja, fi ltrar, esquentar e umidifi car o ar. Cada componente da via aérea superior trabalha realizando uma atividade. A via aérea superior é formada por: nariz, orofaringe, laringe, ouvidos e seios da face. Nariz - a parte de dentro se chama cavidade nasal. As laterais do nariz recebem o nome de asa de nariz. A cavidade nasal possui pelos que são importantes para fi ltrar, umedecer e esquentar o ar. Orofaringe - é um tubo que começa na cavidade nasal e segue para baixo, no pescoço. A porção de cima da faringe tem uma comunicação com o canal do ouvido. A parte de baixo tem comunicação com a boca e serve de passagem para o ar e os alimentos. As amídalas fi cam na orofaringe e protegem contra a entrada de vírus e bactérias. Laringe - é um tubo curto que liga a faringe na traqueia. A laringe tem uma tampa chamada epiglote que não deixa o alimento entrar na traqueia. Na laringe temos as cordas vocais, por onde o ar passa e produz a voz e a fala. Seios da face - são cavidades (buracos) cheias de ar que fi cam dentro dos ossos da face. Nestes seios da face também pode acontecer uma infl amação ou infecção, chamada sinusite. 60 AÇÕES DE PREVENÇÃO A AGRAVOS E DOENÇAS E DE RECUPERAÇÃO DA SAÚDE DOS POVOS INDÍGENAS | Saúde da Família Indígena FIGURA 10: Via aérea superior A via aérea inferior tem a função de continuar a levar o ar até os pulmões. É formada pela traqueia e pelos brônquios. Traqueia – é um tubo que entra no tórax e se divide em dois brônquios. Por dentro, a traqueia é forrada por mucosa e pequenos pelos chamados cílios, que têm a função de expulsar a poeira, micro-organismos e secreção. Brônquios – são dois tubos que entram no pulmão e se dividem em bronquíolos, que continuam se dividindo