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2019-RafaelMonteiroMorais-tcc

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UNB 
 
 
RAFAEL MONTEIRO MORAIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ARTE-EDUCAÇÃO NO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA): 
UMA PROPOSTA LÚDICA E AFETIVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BRASÍLIA 
 
2019 
 
1 
 
 
 
RAFAEL MONTEIRO MORAIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ARTE-EDUCAÇÃONO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: UMA 
PROPOSTA LÚDICA E AFETIVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalho de conclusão do curso de Artes 
Visuais, habilitação em licenciatura do 
Instituto de Artes da Universidade de 
Brasília. 
 
 
Orientador(a): Prof(a) Dr(a) Cristina Azra 
Barrenechea 
 
 
 
 
 
 
BRASÍLIA, DEZEMBRO DE 2019 
2 
 
Termo de aprovação 
 
Rafael Monteiro Morais 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ARTE-EDUCAÇÃO NO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA): 
UMA PROPOSTA LÚDICA E AFETIVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Monografia aprovada com o requisito 
parcial para obtenção do grau de 
licenciado do curso de Licenciatura em 
Artes Visuais 
 
 
Professor(a) orientador(a): Ms. 
Dr.(a)Cristina Azra Barrenechea 
Professor(a) examinador(a): Ms. Dr.(a)Lisa 
Minari Hargreaves 
 
 
 
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Dedico este trabalho à Deus, à mim 
mesmo e aos golfinhos arquetípicos 
presentes no dia a dia. Que este trabalho 
possa me lembrar do meu potencial como 
indivíduo criativo, expansivo e de tudo 
que posso fazer com amor e dedicação. 
4 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Agradeço ao Universo, primeiramente, por esta oportunidade única, à minha 
mãe, ao meu pai, à minha irmã, ao meu namorado e aos meus amigos. Também 
aos professores da Sala de Recursos do Centro de Ensino Fundamental 01 – Guará 
I, pelo apoio sempre que solicitado ou não. Ao Eduardo pelas trocas, afeto, carinho e 
expressões criativas, sinceras, saudáveis e significativas ao longo dos dois anos de 
convivência. Agradeço também à diretora e vice-diretora por toda compreensão 
diárias em dias de trabalho... E a todos que me assistiram e participaram conosco. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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SUMÁRIO 
 
1 Introdução ............................................................................................. 7 
2 Justificativa .......................................................................................... 8 
3 Objetivos ................................................................................................ 12 
 3.1 Objetivo geral ...................................................................................... 12 
 3.2 Objetivos específicos .......................................................................... 12 
4 Referencial teórico ...................................................................................... 13 
5 Metodologia ................................................................................................. 18 
 5.1 Escola ................................................................................................. 19 
 5.2 Sala de Recursos ................................................................................ 20 
 5.3 Quem é o Eduardo? ............................................................................ 21 
 5.3.1 Síntese psicopedagógica ....................................................... 26 
 5.4 Autonomia do aluno ........................................................................... 28 
 5.4.1 A imitação .............................................................................. 29 
 5.4.2 Relato de experiência ............................................................ 31 
 5.5 Produção com o aluno ........................................................................ 33 
6 Conclusão ................................................................................................... 44 
 Referências ................................................................................................. 48 
 Anexos ........................................................................................................ 51 
 
 
 
 
6 
 
 
LISTA DE TABELAS E FIGURAS 
 
 
Figura 1 Primeira parte da atividade de pintura. Eduardo pintando com tinta 
guache em placa de MDF preenchida com 
desenhos............................................................................................ 
 
 
35 
Figura 2 Eduardo posando ao lado do seu retrato desenhado pelo Rafael no 
suporte da atividade a ser realizada................................................... 
 
35 
Figura 3 Segunda parte da atividade de pintura. Mãos do Eduardo com tinta 
guache................................................................................................ 
 
39 
Figura 4 Resultado da segunda parte das atividades de pintura com tinta 
guache sobre placa de MDF preenchida com desenhos................... 
 
39 
Figura 5 Colagem com recortes de panfleto de supermercado......................... 40 
Figura 6 Eduardo pintando com pincel e tinta guache sobre cartolina branca. 42 
Figura 7 Frame de vídeo, Eduardo e Rafael realizando imitações em Sala de 
Recursos Generalista.......................................................................... 
 
43 
Quadro 1 Síntese psicopedagógica mostrando as evoluções do aluno entre 
2016 e 2019..................................................................................... 
 
26 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
1. Introdução 
 
Este projeto tem intenção de investigar de que maneira a arte-educação pode 
contribuir no desenvolvimento de um aluno especial portador do Transtorno do 
Espectro Autista (TEA) e de paralisia cerebral diplégica espástica, no que diz 
respeito a qualidades como a socialização, a cognição, a expressão não verbal e 
abstrata e autonomia do sujeito. 
Assim, por meio de um relato de experiência como educador social,busquei 
verificar como as atividades artísticas auxiliam no desenvolvimento de um 
determinado aluno – o Eduardo (chamaremos assim para preservar sua identidade), 
especificamente, estudante de uma escola pública do DF. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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2. Justificativa 
 
Refletindo sobre a minha trajetória no curso de artes visuais – licenciatura 
noturna – percebo que o que uniu os meus interesses desde o início é a perspectiva 
da arte como caminho terapêutico, integrador, transformador, liberador e acessível a 
todos indistintamente, em outras palavras - a arte que promove saúde. 
Este projeto tem intenção de investigar de que maneira as ferramentas 
artísticas e lúdicas da arte-educação podem contribuir na formação do aluno com 
necessidades especiais em questão, desenvolvendo a socialização, o 
aprimoramento da cognição, a expressão não verbal e abstrata ao fazer contato com 
materiais e expressões diversas. 
 
É evidente que o aluno com TEA deve ter todos os direitos de acessar os 
conteúdos de sala de aula comum inclusiva e de alcançar todo tipo de êxito. 
Uma escola ou turma considerada inclusiva precisa ser, mais do que um 
espaço para convivência, um ambiente onde ele aprenda os conteúdos 
socialmente valorizados para todos os alunos da mesma faixa etária 
(BLANCO, GLAT, 2007, p. 17). 
 
De acordo com Blanco (2007) a educação inclusiva busca inserir o aluno 
especial portador do TEA no contexto de sala de aula. Complementarmente, 
observo que na escola existem muitas metas a serem alcançadas pelos alunos e 
entendo que elas também podem ser destinadas aos alunos com condições 
especiais. No entanto, penso que não cabe ao aluno, portador do autismo deste 
estudo, que se coloque uma expectativa de que ele alcance essas metas, 
necessariamente. 
É importante dar condições para que o aluno vá mais longe, para mais perto 
de metas coletivas (como operações matemáticas, leitura, etc), mas percebe-se 
também que certas qualidades como o plenofazer artístico, a tentativa e erro, a 
experimentação, a estimulação de um prazer que não está atrelado a um objetivo 
específico para que este aluno possa se sentir em paz,feliz,se divertir de outras 
maneiras. 
Eduardo gosta muito de desenhar bolinhas, de observar carros, ônibus, 
aviões, helicópteros ou da presença de alguém muito próximo de sua afetividade. 
Utilizei esses recursos que são muito familiares ao aluno para que ele possa 
desenvolver certas atividades que sejam prazerosas e contundentes. 
 
9 
 
Uma aprendizagem significativa é aquela que ajusta raciocínio, análise e 
imaginação com afetividade e emoção, onde o vínculo afetivo será um 
grande facilitador das atividades cognitivas e simbólicas, dimensão 
possibilitadora de uma racionalidade melhor definida e de um saber mais 
prazerosamente construído (BEZERRA, 2006, p. 25). 
 
Portanto, as atividades objetivadas ao estímulo da cognição atreladas a 
afetividadeentre aluno e educador facilitam certo grau de flexibilidade e fluidez, 
incentivando o crescimento, confiança e construindo novos caminhos cognitivos e 
afetivos, foramsurpreendentes as novas associações e expressões do estudante. 
É importante ressaltar, que pessoas com o Transtorno do Espectro Autista 
(TEA) têm dificuldades de se libertarem da rotina diária (embora esta também seja 
importante), o que lhes vão conferir certo limite para desafiar-se arealizar caminhos 
antes não traçados, mas que irão ser ainda significativos e preciosos para o 
desenvolvimento pessoal do indivíduo. 
De acordo com a definição de autismo da AMA (Mello, 2007) utilizada para 
fins de intervenção, o autismo que possui um variado espectro de características, 
sendo considerado um distúrbio do comportamento que consiste em uma tríade de 
dificuldades – de comunicação, da socialização e da imaginação.Podem ter 
dificuldades em utilizar com sentido as formas não verbais e verbais da 
comunicação, expressões faciais, ritmo, linguagem corporal, gestos e linguagem 
verbal. Sobre a socialização podem ter dificuldades para compartilhar sentimentos, 
gostos e emoções, para relacionar-se com os outros e na discriminação entre 
diferentes pessoas. Finalmente, podem ter dificuldades na área da imaginação. 
 
Dificuldade no uso da imaginação – se caracteriza por rigideze 
inflexibilidade e se estende às várias áreas do pensamento,linguagem e 
comportamento da criança. Isto pode ser exemplificado por 
comportamentos obsessivos e ritualísticos, compreensão literal da 
linguagem, falta de aceitação das mudançase dificuldades em processos 
criativos. (MELLO, 2007, p. 21) 
 
As atividades artísticas – colagem, pintura, exercícios imitativos – têm o 
objetivo de despertar no aluno o princípio da brincadeira e de exercitar a sua 
socialização, comunicação e expressão. 
Em uma pesquisa realizada por C.S. FIAES e I.D. BICHARA constatou-se 
pouca riqueza e uso limitado de verbalizações nas brincadeiras das crianças 
autistas, além de limitado uso de objetos, gestos e verbalizações escassos, 
comparadas às outras crianças sem autismo. Complementarmente, os autores 
Pellegrini e Bjorklund (2004) apud FIAES, BICHARA (2009) afirmam que a 
10 
 
brincadeira de faz-de-conta possui caráter essencialmente social, acarreta na função 
imediata de ajudar crianças mais jovens a assumirem a perspectiva de outros 
brincantes. 
Nesse sentido esta pesquisa tem a intenção de observara função social que a 
brincadeira pode ter na vida do indivíduo com autismo. 
 
É possível conjecturar, a partir do enfoque evolucionista, que a brincadeira 
empobrecida de crianças autistas possa ter consequências no período 
desenvolvimental, desde os mais imediatos, como o reforço dos prejuízos 
típicos do próprio transtorno, bem como efeitos danosos mais distais. Dessa 
forma, a baixa frequência de envolvimento em atividades que possibilitam o 
desenvolvimento dessas habilidades, sendo a brincadeira o principal espaço 
para tal na infância, possibilita predizer as consequências negativas 
também para o desenvolvimento adulto. Ou seja, os déficits característicos 
do transtorno prejudicam a aparição do fenômeno (a brincadeira) e, a 
ausência deste, por sua vez, possivelmente conduz a atrasos no 
desenvolvimento de habilidades importantes para a adaptação do sujeito 
numa sociedade complexa (FIAES, BICHARA, 2009, p. 237). 
 
Nesta pesquisa foram usados materiais e exercícios para incitar no aluno a 
um novo movimento de expressão da subjetividade, sensibilidade, curiosidade, 
estimulação tátil, visual, auditiva, além de levantar a sua autoestima e outras 
potencialidades como a autonomia e independência de um sujeito único. Aumenta-
se o repertório de movimentos associados à consciência corporal, viabilizando ao 
estudante se ocupar artisticamente de forma prazerosa. Tais atividades 
proporcionam a inserção da arte na vida do estudante de forma acessível, cotidiana, 
generosa e integrada. 
Klin (2006) confirma tais afirmações quando diz que no momento quese 
constrói a coreografia social mutuamente reforçada entre a criança e o cuidador, 
inicia o desenvolvimento das habilidades sociais cognitivas, de comunicação e 
simbólicas. 
Diante deste contexto tem-se como problema de pesquisa: em que medida a 
arte-educação pode contribuir para o desenvolvimento de autistas? 
Com o propósito de responder a questão de pesquisa tem-se como objetivo 
geral: reconhecer a importância da arte-educação para o desenvolvimento de um 
aluno com TEA e paralisia cerebral diplégica espástica. Para tanto traçou-se os 
seguintes objetivos específicos: investigar de que maneira o uso de atividades 
lúdicas e artísticas podem contribuir na formação do aluno autista, caracterizar o 
Transtorno do Espectro Autista e possibilitar um espaço de criação artística 
diferenciado e nutritivo para o sujeito da pesquisa, centrado no bem-estar e 
11 
 
experimentação / questionamento e alargamento dos limites a partir de seu universo 
já conhecido e outro a ser apresentado gradativamente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
12 
 
3. Objetivos 
 
3.1 Objetivo Geral 
 
 Estudar o efeito de atividades lúdicas e artísticas para o desenvolvimento de 
um aluno com TEA e paralisia cerebral diplégica espástica por meio da aplicação 
das mesmas atividades em momentos distintos a fim de observar pequenas 
variações na forma como o aluno se relaciona com a atividade. 
 
3.2 Objetivos específicos 
 
1. Fazer uma revisão bibliográfica sobre o ensino de arte para alunos 
diagnosticados com TEA; 
2. Avaliar as necessidades do sujeito da pesquisa assim como descrever seu 
perfil composto por afinidades, comportamentos, potenciais e dificuldades; 
É comum que os pais caiam na armadilha de apontar apenas 
os comportamentos problemáticos das crianças. Ao fazerem 
isso, podem perder de vista as habilidades e os pontos fortes 
que elas possuem. Quais são os dons e habilidades inatas de 
seus filhos? Após identificarem essas áreas, é possível 
estimular e direcionar seus talentos e potencialidades de 
forma correta (SILVA, p.45, 2012). 
 
3. Planejar as atividades com base nas necessidades observadas no aluno, no 
escopo da pesquisa e no ambiente escolar; 
4. Experimentar exercícios da arte educação para despertar qualidades como a 
curiosidade e engajamento; 
5. Utilizar elementos já conhecidos em seu universo para que o aluno possa se 
sentir confortável com elementos seguros e afetivos; 
6. Aplicar um conjunto de três atividades em duas etapas distintas a fim de 
comparar se ocorreram diferenças na forma como o aluno se relacionou com 
a atividade no segundo momento em que esta foi apresentada para ele; 
7. Registrar fotograficamente e observar as diferenças no decurso da aplicação 
da atividade e diferenças manifestadas entre as atividades aplicadas; 
8. Desenvolver um relato de experiência a fim de registrar todas as mudanças 
observadas; 
9. Comparar eanalisar as diferenças ocorridas na primeira aplicação da 
atividade e na segunda aplicação da mesma atividade; 
13 
 
10. Realizar uma entrevista com a principal responsável pelo aluno abordando 
questões sobre como se dá o comportamento do Eduardo fora do ambiente 
escolar para poder ter uma visão mais completa que possibilitará uma análise 
mais profunda. 
 
4. Referencial teórico 
 
Paralisia cerebral 
As Diretrizes de Atenção à pessoa com paralisia cerebral, redigidas pelo 
Ministério da Saúde, declaram que: 
No que tange a etiologia, incluem-se os fatores pré-natais (infecções 
congênitas, falta de oxigenação, etc.); fatores perinatais (anóxia 
neonatal, eclampsia, etc.); e fatores pós natais (infecções, traumas, 
etc.) (Piovesana et al, 2002). Os sinais clínicos da paralisia cerebral 
envolvem as alterações de tônus e presença de movimentos atípicos 
e a distribuição topográfica do comprometimento (Cans et al, 2007) A 
severidade dos comprometimentos da paralisia cerebral está 
associada às limitações das atividades e com a presença de 
comorbidades (Bax et al, 2005). (BRASIL, 2013, p. 11) 
O sujeito da pesquisa é portador da paralisia cerebral diplégica espástica, 
além de microcefalia e hidrocefalia com derivação ventriculoperinatal. Possui 
antecedentes de prematuridade e sofrimento perinatal como fatores de risco para a 
lesão cerebral adquirida. 
A paralisia cerebral foi descrita pela primeira vez na metade do século XIX, 
em 1843 pelo ortopedista inglês Willian John Little. Ele observou que haviam 47 
crianças que tinham em comum a rigidez espástica que era associada a várias 
ocorrências da hora nascimento e que o aprimoramento na área obstétrica poderia 
amenizar a situação de forma evidente. De acordo com a autora, John Little 
considerou como circunstâncias que poderiam precipitar a rigidez espástica “a 
apresentação pélvica, dificuldades no trabalho de parto, prematuridade, demora para 
chorar e para respirar ao nascer, além de convulsões e coma nas primeiras horas de 
vida” (RUBINSTEIN, 2002, p. 12) 
A paralisia do Eduardo é subdividada em duas categorias: diplégica e 
espástica. A primeira diz respeito a uma condição constrita, tensa e resistente dos 
músculos que são dificilmente totalmente alongados e movimentados. A diplegia diz 
14 
 
respeito ao comprometimento dos membros inferiores em relação aos superiores. 
(MAZZILLO, 2003, p. 22) 
A paralisia cerebral espástica faz com que algumas das características dos 
indivíduos sejam apresentarem os membros inferiores cruzados como uma tesoura e 
marcha na ponta dos pés. Segundo Gianni (2000 apud KAVALCO, 2002), a 
categoria espástica tem origem na alteração do tônus muscular em decorrência de 
lesões sofridas no córtex. Esta especificidade traz hipertonia para os músculos, 
porém, sem rigidez, o que afeta a funcionalidade das pessoas. Este diagnóstico é 
registrado como CID 80.1. 
 
O transtorno do espectro autista 
 
SegundoOnzi e Gomes (2015) as investigações diagnósticas sobre o até 
então denominado autismo infantil, vão desde 1799 quando um menino chamado 
por “selvagem” foi apreendido por caçadores em um bosque, fato que chamou a 
atenção de médicos que iniciaram estudos acerca das psicoses infantis. 
Stelzer (2010) ressalta a importância do caso do menino selvagem para os 
estudos sobre autismo. Fieira e Gagliotto (2015) destacam que o comportamento e o 
diagnóstico do menino foram importantes para as futuras pesquisas sobre o quadro 
do autismo infantil. Esse primeiro caso foi diagnosticado como idiotia. 
Somente em 1906 utilizou-se pela primeira vez o adjetivo autista na literatura 
médica para se referir a pacientes com diagnóstico de demência precoce, ou seja, 
esquizofrenia infantil. 
No entanto, anteriormente, em 1943, Leo Kanner relatou 11 casos do que 
denominou distúrbios autísticos do contato afetivo, os quais apresentavam uma 
“incapacidade de relacionar-se” de formas usuais com outras pessoas desde o 
nascimento. Este profissional também observou respostas incomuns ao ambiente – 
resistência à mudança ou insistência na monotonia, maneirismos motores 
estereotipados, além de aspectos não usuais das habilidades de comunicação como 
a ecolalia (tendência ao eco na linguagem) e inversão dos pronomes. Kanner deu 
ênfase na predominância de déficits de relacionamentos sociais. 
15 
 
Entre 1950 e 1960, houve confusão sobre as causas do autismo, sobre sua 
etiologia e a crença de que isto acontecia em decorrência da ausência de 
correspondência emocional dos pais na relação com seus filhos. Tais noções 
equivocadas foram abandonadas, mesmo que possam ser encontradas em partes 
da Europa e da América Latina, assim como outras evidências sugeriam que o 
autismo era um transtorno cerebral presente desde a infância e encontrado em 
todos os países e grupos socioeconômicos e étnico-raciais investigados, nos anos 
60. 
Michael Rutter em 1978, também realizou um trabalho importante quando 
descreveu quatro critérios para propor uma definição para o autismo: 
 
[...] atraso e desvio sociais não só como função de retardo mental; 2) 
problemas de comunicação, novamente, não só em função de retardo 
mental associado; 3) comportamentos incomuns, tais como movimentos 
estereotipados e maneirismos; e 4) início antes dos 30 meses de idade 
(RUTTER, 2006,p. 2). 
 
As características descritas podem ser encontradas em grande parte dos 
diagnosticados, porém vai depender do desenvolvimento de cada um e das 
circunstâncias aos quais o indivíduo foi submetido, portanto, existe um espectro de 
comportamentos e características que podem descrever estes indivíduos. 
A contribuição de Rutter e o aumento do número de trabalhos sobre o autismo 
influenciaram na definição do DSM – III (Manual de Diagnóstico e Estatística da 
Sociedade Norte-Americana de Psiquiatria)sobre esta condição, em 1980, quando o 
autismo foi reconhecido pela primeira vez e posto em uma nova categoria de 
transtornos – transtornos invasivos do desenvolvimento (TIDs). 
Mais tarde, o DSM III altera o termo autismo infantil que ficará conhecido 
como transtorno do autismo, ampliando critérios para diagnósticos. Nesse mesmo 
ano, no Brasil é decretada uma lei que assegura todos os direitos de uma pessoa 
portadora de diagnóstico. Portanto, conforme a lei independe se a pessoa possui 
algum tipo de transtorno ou não. A lei regulamenta a criação de condições propícias 
para o estabelecimento de igualdades para todos. Em 1994, dá-se atenção maior 
para os caos de “autismo leve” conhecidos como síndrome de Asperger ou autismo 
funcional, inserida no novo manual DSM IV, ampliando assim o espectro. (DIAS, 
2015) 
De acordo com as pesquisas de Onzi e Gomes (2015), em meados de 2000, 
havia leis que não consideravam crianças portadoras do autismo como portadoras 
16 
 
de uma deficiência, ou seja, esses indivíduos ficavam isolados em relação à 
legislação, e com a falta de acesso a unidades especializadas,sem acesso 
prioritário, tornava-se difícil o acesso a uma equipe multidisciplinar que poderia 
avaliar mais precisamente o diagnóstico da criança. 
A partir da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da 
Educação Inclusiva (2008) tornou-se possível o acesso legal do indivíduo portador 
do TEA a educação básica, acompanhado de um atendimento educacional 
especializado (AEE), com objetivo de fomentar uma prática inclusiva para aqueles 
que necessitam de uma atenção maior para que se possa ser constituído um 
patamar digno de educação especializada e criteriosa. 
Em 2012 foi instituída a Lei Federal 12.764 (Lei Berenice Piano) que 
determina a política nacional de proteção dos direitos da pessoa com o Transtorno 
do Espectro Autista. Berenice Piana foi uma mãe que com ajuda de pais e com 
muita luta e enfrentamento, conseguiu aprovar uma lei através de uma legislação 
participativa, o que fez com se tornasse a primeira mulher a conquistara vitória que 
é a inclusão da pessoa com autismo no mundo em que vivemos. 
Recentemente, novas conquistas foram sendo realizadas em meio a tantas 
lutas por uma parte da população que até pouco tempo era posta à margem da 
sociedade. A lei nº 13.146 foi promulgada em julho de 2015 e instituiu a lei brasileira 
de inclusão da pessoa com deficiência – Estatuto da Pessoa com Deficiência, que 
estabelece aigualdade de condições, direitos e das liberdades fundamentais por 
pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania. 
A Declaração de Salamanca, uma importante conferência promovida pela 
UNESCO entre 7 e 10 de junho de 1994, proclamou a inclusão da seguinte maneira: 
 
• toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a 
oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem, 
• toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades 
de aprendizagem que são únicas, 
• sistemas educacionais deveriam ser designados e programas 
educacionais deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta 
a vasta diversidade de tais características e necessidades, 
• aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à 
escola regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia 
centrada na criança, capaz de satisfazer a tais necessidades, 
• escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os 
meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se 
comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e 
alcançando educação para todos; além disso, tais escolas provêem uma 
educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em 
última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional. 
17 
 
 
O Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais é um manual 
diagnóstico e estatístico feito pela Associação Americana de Psiquiatria para definir 
como é feito o diagnóstico de transtornos mentais. 
É importante realçar que na mais recente edição do DSM, de 2013, não são 
homologadas derivações do espectro do autismo, denominando-se que os pacientes 
possuem apenas diversos níveis de comprometimento (ONZI; GOMES, 2015). 
Portanto, complementa-se aqui que é preciso identificar o sujeito autista não 
somente a partir de seu diagnóstico, mas também de suas características e 
comportamentos. (KLIN, 2016) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
18 
 
5. Metodologia 
 
 
Este estudo trata-se de uma pesquisa participante, pois para Brandão (2007)a 
pesquisa participante apresenta a interação entre pesquisadores e membros das 
situações investigadas. A diferença básica é que o pesquisador não é neutro neste 
tipo de pesquisa, deste modo não ocorre uma resolução de problemas, pois a 
elaboração das suas conclusões surge em conjunto com os sujeitos pesquisados. 
Na pesquisa-participante é possível haver uma interação entre participante e 
pesquisador, onde serão observadas as interações, as nuances, reações, o 
processo e o resultado. 
Como resultado das observações das interações, foi redigido um relato 
baseado na vivência entre educador social e aluno. Estas observações foram 
articuladas com dados obtidos por meio de pesquisa bibliográfica, levantamento do 
diagnóstico e do perfil do sujeito da pesquisa, leitura de documentos 
(psicopedagógicos e clínicos), entrevista com a responsável, análise de conversação 
e fala do estudante com a finalidade de compreender melhor o universo em que se 
encontra o sujeito, construindo uma visão mais integrada das características 
comportamentais do aluno. 
A escolha de realizar uma pesquisa participante foi coerente em virtude do 
trabalho voluntário do projeto Educador Social (do qual fiz parte durante a pesquisa) 
no qual é necessário fazer contato constantemente com o aluno em situações e 
necessidades fisiológicas e pedagógicas. 
 
Entre as suas diferentes alternativas, de modo geral, as pesquisas 
participantes alinham-se em projetos de envolvimento e mútuo 
compromisso de ações sociais devocação popular. Assim, geralmente, elas 
colocam face-a-face pessoas e agências sociais “eruditas” (como um 
sociólogo, um educador de carreira ou uma ong de direitos humanos) e 
“populares” (como um indígena tarasco, um operário sindicalizado 
argentino, um camponês semialfabetizado do Centro-Oeste do Brasil ou o 
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra). De modo geral, elas 
partem em diferentes possibilidades de relacionamentos entre os dois pólos 
de atores sociais envolvidos, interativos e participantes (BRANDÃO, p. 53, 
2007). 
 
Portanto, este tipo de metodologia mostrou-se bastante contundente com o 
contexto do estudo que conduzi porque diz respeito ao ofício do educador social em 
uma escola pública do DF, visto como uma das esferas de trabalhadores mais 
populares. 
19 
 
Em minha atividade como educador social trabalhei diretamente com o aluno 
em momentos de higienização, alimentação, locomoção, além de lidar 
constantemente com frustrações e desafios com relação às atividades mais 
adequadas ao aluno bem como saber dialogar e cooperar com os professores de 
sala de aula regular e das salas de recursos. 
Segundo Brandão (2007), as pesquisas participantes tendem a manifestar 
uma dimensão política de trabalho popular quase sempre mais ampla e com maior 
continuidade do que a própria pesquisa. Possibilitar ao aluno com autismo novos 
espaços de expressão e comunicação por meio da arte educação é um ato político e 
com dimensões ricas e importantes nesse trabalho continuado. 
 
5.1. A Escola 
 
O presente estudo foi desenvolvido no Centro de Ensino Fundamental 01 do 
Guará I etem 38,16 % da sua comunidade escolar formada por alunos oriundos da 
Cidade Estrutural, 12,72% do Setor de Chácaras Lúcio Costa, 30% do Guará, 
10,95% do Vicente Pires e 8,05% dos demais são provenientes de outros lugares do 
Distrito Federal. 
“Escola inclusiva é, aquela que garante a qualidade de ensino educacional a 
cada um de seus alunos, reconhecendo e respeitando a diversidade e respondendo 
a cada um de acordo com suas potencialidades e necessidades”, (MEC, p. 7, 
2004).Por ser uma escola inclusiva, conta em seu corpo discente com 91 alunos 
com necessidades educacionais especiais: 01 com deficiência física, 36 com 
transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, 04 com deficiência auditiva, 03com 
Transtorno Global de Desenvolvimento/Autista, 05 com deficiência intelectual, 10 
com altas habilidades, 02 com deficiências múltiplas, 22 com Deficiência do 
Processamento Auditivo Central, 1 com Transtorno Opositor Desafiador, 03 com 
Dislexia, 01 com Transtorno de Conduta e 03 com outras deficiências. 
A escola conta, também, com uma Sala de Recursos que é a responsável 
pelo atendimento complementar e tem como objetivo geral: promover estruturas 
adequadas de ensino por meio de ações que estimulem a capacidade intelectual, 
crítica e emocional para um bom desempenho pedagógico e social visando a quebra 
de barreiras atitudinais,o qual possibilita o atendimento adequado para auxiliar no 
desenvolvimento do aluno/objeto deste estudo. 
20 
 
5.2. A Sala de Recursos 
 
O público alvo do AEE são aqueles estudantes com deficiência física, 
intelectual, mental ou sensorial, estudantes com transtornos globais do 
desenvolvimento (estudantes com autismo infantil, síndrome de Asperger, síndrome 
de Rett, transtorno desintegrativo da infância), estudantes com altas habilidades ou 
superdotação. 
As atividades a serem desenvolvidas na Sala de Recursos foram pensadas 
para que o aluno possa reverberar como sujeito autônomo e crítico aos diversos 
enfretamentos às dificuldades apresentadas em sua caminhada, como cidadão 
capaz de produzir atitudes sensatas e coerentes com base na utilização de recursos 
pedagógicos que despertem o interesse e a criatividade focados no lúdico. 
O aluno estudado é atendido naSala de Recursos Generalista desde 2016, 
onde recebe atendimento educacional especializado que conta com métodos e 
recursos pedagógicos específicos que auxiliam a aprendizagem do aluno.As salas 
de recursos podem ser específicas ou generalistas. Há três tipos de salas de 
recursos específicas: as que se destinam a alunos com superdotação/altas 
habilidades, outras para deficientes visuais e aquelas para deficientes auditivos. Nas 
salas generalistas são atendidos individualmente ou em grupos, estudantes com 
deficiência intelectual/mental, deficiência física, deficiência múltipla e transtorno 
global do desenvolvimento (TGD). 
De acordo com o Documento Orientador Programa Implantação de Salas de 
Recursos Multifuncionais (2012) a inclusão educacional está fundamentada nos 
princípios pedagógicos e marcos legais da igualdade de condições de acesso à 
participação em um sistema educacional inclusivo. A Política Nacional de Educação 
Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008) conceitua a Educação 
Especial como modalidade de ensino transversal a todos as etapas, modalidades e 
níveis, que disponibiliza recursos e serviços e o atendimento educacional 
especializado, suplementar ou complementar. 
A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação 
Inclusiva tem como diretrizes a oferta do atendimento educacional especializado, a 
formação dos professores, a participação da família e da comunidade e a articulação 
intersetorial das políticas públicas, para a garantia do acesso dos estudantes com 
21 
 
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou 
superdotação, no ensino regular. 
Conforme Resolução CNE/CEB nº 4/2009, art. 12, para atuar no atendimento 
educacional especializado, é necessário ao professor ter formação inicial que o 
habilite para exercício da docência e formação continuada na educação especial. O 
professor do AEE tem como função executar esse atendimento de forma 
complementar ou suplementar à escolarização, considerando as habilidades e as 
necessidades educacionais específicas dos estudantes público alvo da educação 
especial. As atribuições do professor de AEE contemplam: 
 
• Elaboração, execução e avaliação do plano de AEE do estudante; 
• Organização de estratégias pedagógicas e identificação e produção de 
recursos acessíveis; 
• Acompanhamento da funcionalidade e usabilidade dos recursos de 
tecnologia assistiva na sala de aula comum e demais ambientes escolares; • 
Articulação com os professores das classes comuns, nas diferentes etapas 
e modalidades de ensino; • Orientação aos professores do ensino regular e 
às famílias sobre a aplicabilidade e funcionalidade dos recursos utilizados 
pelo estudante; • Interface com as áreas da saúde, assistência, trabalho e 
outras. 
• Ensino e desenvolvimento das atividades próprias do AEE, tais como: 
Libras, Braille, orientação e mobilidade, Língua Portuguesa para alunos 
surdos; informática acessível; Comunicação Alternativa e Aumentativa - 
CAA, atividades de desenvolvimento das habilidades mentais superiores e 
atividades de enriquecimento curricular; 
• Definição do cronograma e das atividades do atendimento do estudante 
[...] (BRASIL, 2012, p. 8). 
 
O atendimento educacional especializado ocorre nas escolas em Salas de 
Recursos Multifuncionais. No Distrito Federal, apenas, há variações deste tipo de 
sala, salas com atendimento a públicos específicos como deficientes visuais, 
deficientes auditivos e altas habilidades. Nelas são oferecidos aos alunos atividades, 
recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucional e continuamente. 
 
5.3. Quem é o Eduardo? 
 
Como foi dito anteriormente, para preservar a privacidade do sujeito da 
pesquisa será identificado como Eduardo em meus relatos. Eduardo possui 18 anos 
e mora com sua avó na cidade do Guará, no Distrito Federal. Ele frequenta a 
frequenta duas escolas regularmente, uma no turno matutino - AMPARE 
(Associação de Mães, Pais, Amigos e Reabilitadores de Excepcionais) – onde faz 
22 
 
natação duas vezes por semana e outra no vespertino - Centro de Ensino 
Fundamental 01 do Guará I. 
O sujeito da pesquisa adora ir à escola e é um menino muito dócil de sorriso e 
alegrias contagiantes. Segundo seu laudo possui capacidade intelectual na média 
inferior - CID: G 80.1 (Classificação Internacional de Doenças da OMS), e autismo 
infantil (DSM–IV). 
Em seu histórico médico, Eduardo foi diagnosticado com o Transtorno do 
Espectro Autista (TEA) e também com paralisia cerebral do tipo diplegia espástica, 
associada a alterações cognitivas e comportamentais. Possui marcha comprometida 
devido ao encurtamento dos tendões. Tem acompanhamento na rede de hospitais 
Sarah. Utiliza andador e consegue andar sem ele sem muitas dificuldades – 
inclusive gosta de andar sem ele. Por conter os músculos rígidos em decorrência da 
paralisia cerebral diplégica espástica, os movimentos do Eduardo podem ser um 
pouco descoordenados, o que pode fazer com ele esbarre em outras pessoas que 
estão perto dele de vez em quando, por exemplo, ao pegar uma pasta na mochila 
acoplada atrás da cadeira, pode dar uma cotovelada na pessoa ao lado. 
Com relação ao TEA, “cada caso situa-se em um espectro que varia num 
continuum quanto à gravidade“ (FIAES, BICHARA, p. 235) com suas características 
específicas segundo as quais podem evoluir e mudar ao longo dos anos em 
decorrência do desenvolvimento e estimulações. No entanto, todos os casos de 
forma mais leve ou severa, estão relacionadas aos déficits de comunicação e 
relacionamento social. 
Eduardo, neste momento, está dentro da temporalidade, o que permite 
aumento do tempo previsto para o trato de determinados objetivos, tendo dois anos 
para completar um ano letivo. 
Domina conceitos pré-escolares como noção espacial, cores, reconhecimento 
de figuras e plano gráfico a partir de descrição semântica. Sabe ler e escrever – 
apenas em caixa alta. Quando as palavras são maiores e mais complicadas, tende a 
trocar as letras, portanto necessita de mediação nesse processo. Não correlaciona 
comandos com muitas informações. 
Em uma ocasião em que cheguei atrasado na escola, fui ao encontro do 
Eduardo que já se encontrava em sala de aula. Ao chegar à sala de aula, ele me 
perguntou “faltou ontem por quê?” e eu respondi que estava apenas atrasado. 
Percebe-se que ele não compreende bem a noção de tempo. Ele rapidamente 
23 
 
complementa com outra pergunta: “estava onde?”. Este é mais um exemplo que 
comprova a expansão do repertório de frases do indivíduo. Nunca o ouvi dizer essa 
frase até esse momento. Ele tem expandido o repertório de palavras ditas na escola, 
demonstrando entusiasmo ao dizer pela primeira vez o vocábulo novo. 
Percebe-se também que a palavra que ele usa muitas vezesnão condiz à 
realidade temporal, como por exemplo, o “ontem” utilizado no caso seria relativo ao 
horário anterior de aula. Assim como quando há um feriado ou ele falta, ele diz que 
estava de férias. Penso que muitas vezes as palavras que ele diz são muito mais 
úteis para ele poder se expressar e se relacionar do que para comunicar algo em 
específicocom exatidão e proporção. 
Aparenta desejar atenções diferenciadas para si, solicitando que sejam feitas 
todas as suas vontades. Mas, é capaz de ceder quando incentivado por outra 
pessoa que o estimule e o anime, pois também é muito afetuoso. 
Gosta muito que leiam e cantem para ele. Costuma falar de si mesmo na 
terceira pessoa na maioria das vezes. Adora andar de ônibus, ouvir música alta no 
carro, observar o trânsito e anunciar de qual marca e cor é cada carro e ônibus. 
Sente-se atraído principalmente por carros, ônibus, lápis, canetas, elevadores, 
helicópteros, aviões e recentemente tem se interessado por gaiolas de passarinho. 
Também se interessa pelas pessoas ao seu redor (principalmente aquelas que 
vagueiam pela escola – incluindoprofessores, servidores e visitantes). 
Eduardo gosta muito de se relacionar com as pessoas, é algo que lhe 
desperta alegria genuína. Tem mais facilidade e hábito de socializar e de se 
comunicar com pessoas mais velhas que ele do que com seus colegas de turma 
com idades mais próximas da sua. 
Às vezes por causa das dificuldades de socializar-se, uma das tendências 
mais conhecidas dos indivíduos portadores do TEA é a de se isolar e de se voltar 
para seus interesses específicos. O Eduardo também apresenta ecolalia, ou seja, 
repete rotineiramente tudo o que ouve quando as pessoas conversam com ele. 
Desde que chegouà escola, Eduardo, CEF 01 – Centro de Ensino 
Fundamental do Guará tem evoluído em muitos aspectos como a socialização, a 
comunicação e a expressão. O aluno está muito mais comunicativo do que era 
antes, apresentando constantemente novas palavras, frases, interesses e atitudes. 
Percebeu-se que se sente mais à vontade sendo acompanhado por 
educadores sociais do sexo masculino. Aparenta possuir bastante dependência 
24 
 
afetiva das pessoas, mas exige poder fazer as atividades sem ajuda, como ler, 
escrever (ainda que também exija que leia junto com ele) e todas as ações em que 
tem convicção e segurança de que sabe realizar. 
Mora com a avó e primos, possuindo também relações estreitas com a avó 
paterna. Devido ao déficit cognitivo associado ao espectro autista, Eduardo 
necessita de adequações escolares para facilitar o seu processo de aprendizagem e 
socialização com os pares. 
Ele mostra-se bastante receptivo para as novidades que lhe são propostas, 
demonstrando apatia e desânimo quando tem de fazer atividades que realiza desde 
há bastante tempo e que não trazem novidades e desafios. No entanto, quando eu, 
na condição de educador social que o acompanha, não estou na escola fica 
chateado, demonstrando impaciência e descontentamento para outras pessoas. 
Porém, age tranquilamente em algumas ocasiões em que outras pessoas que ele 
conhece o conduzem às atividades. Portanto, percebe-se que o sujeito possui uma 
necessidade explícita de uma companhia, pois porta comprometimentos cognitivos e 
físicos, além de ser carente de atenção. 
Quando o Eduardo está estressado, cansado, nervoso e sem companhia fica 
revirando os lápis de cores de seu estojo, além de apontá-los, batê-los levemente 
contra a mesa direcionando toda atenção e foco. 
Eu e os professores da Sala de Recursos Generalista tentamos fazer com 
que este hábito se torne cada vez menos frequente para que ele se desenvolva em 
outros aspectos. Aceita deixar o estojo de lado para comprometer-se com outras 
atividades mais interessantes e empolgantes. 
Para se aproximar das pessoas ao seu redor, ele gosta muito de saudá-las e 
cumprimentá-las. Faz breves comentários sobre a roupa da pessoa e pergunta seus 
nomes – outros modos que encontrou para interagir e formar vínculos. Quando isso 
não acontece, demonstra sentir falta e em outros casos não hesita em gritar “quero 
cumprimentar na mão!”. Quando alguma pessoa se aproxima dele para 
cumprimentá-lo e não faz o mesmo a mim ou a outra pessoa que está perto dele 
(alguém conhecido), imediatamente pede que seja cumprimentada, dizendo, por 
exemplo: “falar com o Rafael também, na mão!”. 
Em 2018, tinha bastante costume de fazer caça-palavras no computador da 
Sala de Recursos e tem muita agilidade e curiosidade com tablets, celulares e 
25 
 
computadores nos quais pesquisa imagens sobre assuntos que lhe interessam – 
gaiolas de passarinho e ônibus, tendo como exemplo. 
Gosta muito de acontecimentos recorrentes e familiares como aberturas de 
telejornais e da hora de voltar à sala de aula regular. Fica aflito ao perceber coisas 
que fogem ao trivial como um cachorro rosa ou um céu verde em um desenho. Em 
vista disso, parece se incomodar com coisas que saem do seu controle. 
Certa vez, foi colocada uma fita de cetim em seu pulso. Ele foi receptivo a 
essa ação no momento. No entanto, não muito depois esteve agoniado para tirá-la. 
O mesmo ocorre quando se molha, se suja, etc. Mesmo com esses incômodos, 
consegue se dar pequenas permissões quando suja suas mãos de tinta. 
Sente prazer em emitir frases que aprendeu a dizer sobre determinados 
gostos - “Não gosto de banana, não gosto!”, mesmo quando não é perguntado, pois 
fica contente com toda oportunidade para se manifestar e interagir. 
Pratica movimentos repetitivos com o tronco, como um pêndulo, que 
acontecem quando está agitado, nervoso ou muito feliz, conhecidos como 
estereotipia. Também faz movimentos com os braços quando está exaltado – isso 
acontece muito quando ouve o apito da professora de Educação Física ou ouve uma 
buzina de carro. 
Em momentos anteriores de sua vida, quando ficava contrariado, batia sua 
cabeça contra o chão. É muito esperto, inteligente e acha sempre uma solução para 
fazer o que deseja fazer como numa ocasião em que desejava ver a parte inferior do 
corpo de uma das educadoras sociais da escola, mas estava impossibilitado de 
fazê-lo por que estava sentado de frente para ela, consequentemente ele transferiu 
os biscoitos que estava comendo do pacote para suas mãos e jogou a embalagem 
no chão para observar os detalhes do vestuário ou das pernas da moça. 
Ele gosta muito de comer biscoitos recheados – é do que sempre se alimenta 
no recreio. Recentemente tem trazido maçãs as quais eu corto (é um combinado 
feito entre sua avó e eu). Esse ato, feito com carinho, faz com que ele tenha prazer e 
se sinta incentivado a comer outro tipo de alimento. 
Ao ser perguntado sobre o que fez no final de semana ou o que faz durante a 
noite, dificilmente irá responder. De acordo com Mello (2007, p. 21), quando ocorre 
uma aproximação afetiva entre o portador do autismo e outra pessoa, muitas vezes 
esta pode seguir um padrão repetitivo, não contendo algum tipo de troca ou 
26 
 
compartilhamento. De fato, parece haver um tipo de padrão para se comunicar com 
outros indivíduos, raramente havendo um compartilhamento pessoal. 
 
5.3.1. Síntese psicopedagógica 
 
 Esta síntese foi elaborada a partir de laudos, relatórios psicopedagógicos, 
entrevista com a responsável e professores do aluno. Consiste em relatos da 
evolução de Eduardo entre os anos 2016 e 2019. 
 
Quadro 1 - Evolução do aluno em comparação aos anos anteriores em outra escola 
2016 (idade - 15 anos) 2019 (idade - 18 anos) 
Em observações em diversos espaços 
físicos da escola verifica-se que a 
criança não faz contato nos olhos das 
pessoas, demonstra pouco interesse em 
interagir com outras crianças, entretanto, 
revela o interesse à necessidade de 
estar presente durante o recreio sentado 
observando os colegas e os carros que 
circulam na avenida próxima a escola já 
que a mesma não é cercada por muros, 
apenas por alambrados. 
Atualmente o aluno faz bastante contato 
nos olhos das pessoas, demonstra muito 
interesse em interagir com outras 
pessoas, porém a interação com 
pessoas mais próximas de sua idade é 
menor. Demonstra constantemente 
carinho. Permanece tendo o interesse 
de ir ao recreio, dessa forma participa da 
dinâmica e pode falar com as outras 
pessoas. Continua gostando de assistir 
aos carros, ônibus, helicópteros, mas 
isso não lhe tira o foco de interagir com 
as pessoas. 
Durante os atendimentos, Eduardo 
manteve-se tranquilo, porém 
necessitando de intervenções e 
direcionamentos para se engajar nas 
atividades propostas revelando um 
interesse e habilidade pelos jogos 
eletrônicos, entretanto, quando 
contrariado se nega realizar qualquer 
tipo de atividade, inclusive de se retirar 
do ambiente, chegando a dormir sobre a 
carteira de sala de aula. 
Eduardo demonstra interesse por 
aparelhos eletrônicos, no entanto, é 
convencido facilmente a fazer outra 
atividade. Na sala de aula regular, se 
nega a fazer atividades que exijam que 
ele faça tarefas muito desinteressantesaos quais ele já foi demasiadamente 
submetido em outros momentos 
escolares. Quando cansado, não se 
importa de sair da sala exceto nos 
momentos em que está muito cansado. 
Em relação à aprendizagem apresenta 
significativas limitações; quanto à 
Possui muitas limitações de 
aprendizagem, mas apresenta interesse 
27 
 
comunicação verbal responde 
questionamentos simples ou apenas 
verbaliza seus desejos, ainda não é 
capaz de manter um diálogo elaborado 
sobre um assunto, mas quando 
contrariado expressa seus sentimentos 
com gritos fortes e movimentos com o 
corpo com o intuito de intimidar as ações 
de terceiros prevalecendo suas 
vontades. 
em aprender principalmente quando 
acompanhado por outra pessoa 
(professora ou educador social). 
Ao ser perguntado sobre o que fez, por 
exemplo, no final de semana dificilmente 
irá responder, isto é responde 
questionamentos simples com poucas 
palavras e quando não sabe o que 
responder parece responder 
aleatoriamente como se fosse apenas 
para cumprir uma obrigação. Quando 
não sabe o que responder responde 
eloquentemente apenas “Não sei”. No 
entanto, quando está muito cansado e 
não quer conversar, ele mesmo diz, 
muitas vezes reproduzindo estereotipias, 
de um lado para o outro com o corpo. 
Apresenta dificuldades em interessar-se 
por novos conceitos/conhecimentos 
reportando-se em apontar lápis de cor e 
a mexer incansavelmente com eles no 
estojo. A criança lê e escreve 
palavras/frases com coerência, faz 
leitura pausada demonstrando 
compreensão das mesmas, reconhece 
algarismos, realiza operações simples 
de adição e subtração e está iniciando e 
assimilando o processo da multiplicação 
e a memorização da tabuada. 
É flexível e aberto a novo aprendizados 
e quando não quer fazer algum exercício 
pode mexer nos lápis em busca de 
relaxamento e ocupação. Este hábito 
tem se mostrado muito menos frequente 
no atual momento. Gosta muito de ler 
junto de alguém, pausadamente e se 
diverte com novas formas de entoação e 
pronunciação das palavras. Reconhece 
algarismos da unidade de centenas, no 
entanto tem dificuldades em realizar 
operações de adição, subtração e 
multiplicação. Não tem memorizado a 
tabuada. Precisa de muito 
acompanhamento para contar número 
por número até chegar ao resultado 
esperado. Diverte-se muito no processo 
matemático. 
Verifica-se que a criança vem 
apresentando atitudes sexuais de 
acordos com a evolução maturacional da 
criança e esperado para uma pessoa 
com déficit cognitiva e imaturidade 
emocional nestes diagnósticos, pois 
estas revelam dificuldades na aquisição 
Tenho observado comportamentos 
sexuais do aluno, tendo vista que já tem 
18 anos. Demonstra aparente interesse 
por olhar as partes do corpo das 
mulheres ao seu redor. Gosta muito de 
olhar para os seus colegas e de vez em 
quando interage com eles, com o 
28 
 
e na compreensão de comportamentos 
que respeitam as regras sociais. 
acompanhamento isso se torna mais 
fácil para ele pedir um apontador 
emprestado por exemplo. Sentar-se em 
mesas juntas parece fazer com que a 
interação com os outros alunos aconteça 
de fato. Tem aprendido bem pequenas 
regras sociais, por meio da repetição 
para a memorização, mas, em outros 
momentos a falta de compreensão das 
regras sociais não parece causar graves 
prejuízos. 
 
É interessante notar que em uma das orientações para intervenção 
pedagógica redigida pelos seus pedagogos e psicólogos responsáveis consta que 
ele precisa ser estimulado por meio da criatividade com atividades onde seja 
permitido construir, explorar, criar. Estas são as principais ações e diretrizes desta 
pesquisa. 
 
5.4. Autonomia do aluno 
 
Constato que existe autonomia nas atitudes do Eduardo. Pode ser que por se 
sentir menos pressionado a tomar alguma atitude ou pelo fato de eu não estar ao 
seu lado para ajudá-lo ele se sinta mais confortável para tomar certas atitudes que 
nos permitem reconhecer sua autonomia. Por exemplo, em uma das tardes, quando 
estava no banheiro, o aluno se levantou do lugar de costume ao qual eu o direcionei 
para se sentar. Ao retornar do banheiro, ao procurá-lo, não o encontrei. Logo, 
imaginei que ele tivesse ido embora, já que estava quase no horário de saída, mas 
também porque não imaginei que houvesse outra hipótese que explicasse tal 
ocorrido, a não ser que ele já tenha sido buscado por sua responsável. Entretanto, 
me surpreendi ao ver que ele tinha se movimentado por vontade própria para se 
sentar em outro banco próximo dali. Presumo que este indício de uma maior 
independência seja resultado de uma das ações que tenho feito com ele para que 
ele possa se tornar mais flexível e se sentar em outros lugares quando não 
estivesse em sala de aula. É importante ressaltar que pessoas portadoras do TEA 
possuem dificuldades para saírem da rotina. Com o exercício constante de mudança 
29 
 
de lugar, ele se sentiu seguro e confiante para locomover-se, sem o meu auxílio ou 
de outra pessoa, para chegar a outro lugar. 
Isto também pode ser observado em outros momentos, na sala de recursos, 
também com relação à mudança de lugar, parecendo contente ao me chamar para 
interagir - tendo como exemplo quando ele pega um cachorro feito de feltro 
confeccionado em um dos projetos e começa a “latir”. Quando ocorreu o projeto, 
para fazer com que o aluno se envolvesse mais com as confecções, eu “latia” para 
ele, movimentando o cachorro, na frente dele. Ele achava graça e com o tempo, este 
ato se tornou algo familiar e de conexão afetiva para o Eduardo. Após o projeto ter 
ocorrido, meses depois, ele continuava a tomar a atitude de levantar-se, pegar o 
cachorro de feltro, levá-lo para a mesa onde estava sentado, e “latia” novamente 
com a intenção de me convidar. Era claro uma intenção de interagir, como se fosse 
uma brincadeira (se é que não é). Também faz questão de encher a garrafa d’água 
sozinho. 
Entendo que ao longo do meu período de convivência com o aluno, este 
percebe oportunidades para fazer novas conexões, associações e frases. Certo dia, 
após recebê-lo com a responsável, logo após ela se retirar, Eduardo foi até uma 
cadeira, para sentar-se perto de mim – o que ele sabe bem comunicar – dizendo 
“sentar perto de você?”, e em seguida “conta as novidades!”. 
É evidente, que todo o desenvolvimento do aluno é possível graças a um 
constante exercício que todos os profissionais da escola e a responsável (avó) 
realizam. O acompanhamento de uma pessoa com quem ele se sente a vontade e 
com o qual ele convive há dois anos em todos os momentos e os constantes 
exercícios tornam, também, possível um desenvolvimento mais fluido e saudável. 
Quanto mais conhecida for a pessoa para o aluno, mais disponível ele estará 
para os comandos e novos caminhos a rumar. Atividades novas despertam no aluno 
a vontade de realizá-las. Portanto, mesmo que haja um limite diário para novos 
exercícios e esforços contínuos, estas mesmas novidades são necessárias para que 
ele se sinta motivado para avançar e fazer coisas diferentes. 
 
5.4.1. A imitação 
 
Por meio de pesquisas no assunto ao longo do convívio com o meu aluno, 
percebi a coerência e contundência que teriam os exercícios imitativos para o 
30 
 
Eduardo. Alunos portadores do TEA possuem dificuldades em imitar as ações do 
outro. 
 
A dificuldade de sociabilização, que faz com que a pessoa com 
autismotenha uma pobre consciência da outra pessoa, é responsável, em 
muitoscasos, pela falta ou diminuição da capacidade de imitar, que é um 
dos pré-requisitos cruciais para o aprendizado, e também pela dificuldade 
de secolocar no lugar do outro e de compreender os fatos a partir da 
perspectivado outro. (Mello, 2007, p. 21) 
 
A imitação traz um exercício de espelhamento. Permanecia de frente para o 
Eduardo e começava a imitar todos os movimentos que o Eduardo fazia. Como a 
faixa suportávelde estimulação de pessoas com esta condição é muito estreita, 
possui em média duração de 10 a 15 minutos. 
 
A dificuldade para se relacionar socialmente que os portadores de autismo 
possuem, de acordo com Rogers & Williams (2006), pode estar relacionado ao 
déficit na imitação motora. A capacidade imitativa dos portadores do TEA foi 
examinada em numerosas pesquisas onde frequentemente foi vista como estando 
precária em comparação às outras crianças, inclusive às crianças com outros tipos 
de comprometimento mental. No entanto, recentemente, tem-se desenvolvido novas 
propostas de investigação acerca da correlação entre autismo e déficit de imitação. 
 
Nessas novas pesquisas, a imitação serve para o estabelecimento de uma 
ponte de comunicação com o autista, cuja faixa suportável de estimulação é 
muito estreita. A imitação é apresentada como um meio de burlar essa 
dificuldade de relação vinculada à constituição da criança autista, que, 
sendo imitada, poderia perceber o outro da relação com menos ansiedade. 
Essa relação, estabelecida a partir de uma familiaridade dos estímulos 
introduzidos por via da imitação, poderia evoluir em outros sentidos. Mas é 
importante valorizar esse canal de estabelecimento do primeiro contato com 
um paciente cuja dificuldade para o tratamento envolve exatamente o 
contato com o terapeuta (TIMO, 2011, p. 846). 
 
A partir dessa conclusão acerca de pesquisas anteriores, observaram-se os 
efeitos que a técnica imitativa pode surtir no Eduardo, em contexto escolar e não 
clínico, como nas pesquisadas apresentadas por Timo (2011), de forma que possa 
servir como um elemento facilitador e afetivo para contribuir e participar do universo 
do aluno, a partir de pequenos exercícios feitos em variados ambientes da escola. 
Segundo Stern (1985), a imitação motora pode servir como um condutor para 
que seja construída afetividade entre mãe e filho nos primeiros meses de vida e 
31 
 
também posteriormente, no que diz respeito à expressão e compartilhamento de 
sentimentos, emoções e pensamentos. 
 
5.4.2. Relato de experiência – A imitação como linguagem 
 
Diariamente me surpreendi com pequenas atitudes do estudante, por 
exemplo,o presenciei imitando a gargalhada de um colega ao emitir “hahaha” ao 
invés de “hehehe” (que soa como a sua risada habitual). Ele também imitou a minha 
risada e a de seu professor da sala de recursos. Tem evoluído ainda mais, imitando 
a risada de outras pessoas de seu convívio. Ele está descobrindo o seu poder de 
expressão, o que pode fazer com sua voz e corpo. 
É muito interessante como ele aprendeu a utilizar a sua voz em outra altura 
intencionalmente para imitar alguém. Isto provavelmente é o resultado de uma série 
de exercícios imitativos em que eu e o Eduardo imitávamos um ao outro diariamente 
ao longo da semana, espontaneamente, em momentos e ambientes variados, 
portanto considero que é a atividade mais potente e mais estimulada deste projeto. 
 
“Uma instância de imitação pode resumir a presença de mutualidade; fazer 
algo que acabou de ser feito pelo outro é saber algo não somente sobre o 
ato, mas também sobre a similaridade entre o si mesmo e o outro” 
(KLINGER & DAWSON, p.32, 1992). 
 
 
Constato também - com base em observações minhas e em relatos de sua 
responsável e outros professores - que a evolução dos comportamentos do aluno se 
dão também em decorrência dos diversos acompanhamentos empenhados em 
diversos momentos e ambientes de sua vida. 
As imitações neste contexto vieram de uma vontade autêntica minha de imitar 
o aluno, enquanto ele gargalhava por causa do som do apito da professora de 
Educação Física. Refletindo um pouco mais, penso que foi uma forma que encontrei 
de me conectar e interagir com o aluno em outro nível. 
Percebo ainda que, nestes exercícios ele mesmo toma a atitude de começar 
um movimento para que eu o imite (é mais uma forma de interagir e disso ele gosta 
muito!). Percebo que os efeitos desse exercício se estenderam para outros 
momentos de sua vida, com base em relatos da avó do aluno e outros profissionais 
da escola. 
32 
 
Contudo, nota-se uma dificuldade que pode ser observada quando estamos 
fazendo o exercício de imitação apenas com movimentos do corpo (sem voz). No 
entanto, ele se faz ser ouvido e percebido por nós que observamos seus novos 
movimentos e intenções que compõem novos repertórios expressivos de uma 
benéfica convivência e socialização. 
Até mesmo em momentos em que seria muito pouco provável ele fazer novos 
movimentos de exercício de imitação, o Eduardo se dispõe a executá-los. É bastante 
interessante. Parece-me que os fatoresinteligência emocional, atenção, afeto, 
necessidade de se expressar e se relacionar do aluno são necessários para a 
condução e dinâmica dessa atividade. 
Levanto outros questionamentos: será que ele gosta de se ver no outro que o 
imita ou será que mexe com ele o fato de estar se vendo no outro? Será que ele 
toma consciência de seu corpo, gestos, alturas de voz, e outras características a 
partir do movimento da imitação - o espelho? Será que me enxerga como uma 
extensão dele? 
Num pequeno espaço de tempo: em cinco minutos ele me convida não 
verbalmente para imitá-lo, interagir, a partir do que ele está sentindo (sono) e partir 
disso novos movimentos surgem como o piscar de olhos (como houve na segunda 
atividade de pintura), pequeno balançar do corpo e um biquinho nos lábios. 
É possível notar quando os movimentos são intencionados para serem 
imitados, pois são movimentos que usualmente ele não faz. Ele se movimentou 
dessa maneira em uma sexta feira, últimos horários, quando estava bastante 
cansado em decorrência das atividades do dia e da semana inteira. Aparentemente, 
existem dois tipos de cansaço que o aluno sente em determinado dia: no primeiro 
tipo está cansado em decorrência de estafa cognitiva, o que o limita de apreender 
novos conceitos e realizar atividades que o desafiem. No segundo, o cansaço é 
físico e não necessariamente irá afetar a vontade do aluno de realizar novas tarefas 
no momento. Evidentemente, pode haver dias em que o Eduardo demonstra estar 
cansado dos dois modos, mas notou-se uma diferença de disposição. 
Sua evolução é surpreendente. O aluno está apresentando novos 
movimentos, ações, repertório, o que significa que ele está crescendo e se 
expandindo! 
 
 
33 
 
5.5. Produção com o aluno 
 
Mais uma vez, é relevante relatar que há uma flexibilidade quanto ao 
momento de aplicação das atividades planejadas, pois o aluno apresenta ocasiões 
que extrapolam o horário da programação de atividades, o que configura certa 
espontaneidade e demanda do aluno. 
Escolhi as quatro atividades a partir das observações das necessidades do 
aluno Eduardo. Esse conjunto de atividades compreende uma produção de 
atividades lúdicas, motoras e expressivas. Houve uma aplicação (parte 1) e 
reaplicação (parte 2) para observar as diferenças entre os dois momentos e se 
houve algum tipo de desenvolvimento, diferenças e outros comportamentos. 
 
Primeira atividade – Parte 1 
 
O objetivo desta atividade é perceber como o Eduardo pode interagir com a 
tinta guache para criar novas imagens e assim, aumentar o seu repertório rumando 
possivelmente para a abstração das formas. O suporte utilizado foi o papel e 
madeira MDF. Foram mostrados recortes de imagens de livros didáticos antigos e 
outros oriundos de panfletos de supermercado para colar caso o aluno quisesse. 
São trinta minutos disponíveis para isso. O objetivo é apreender o que acontece 
quando é dada total liberdade para o aluno experimentar, no papel e em outros 
suportes. 
Coloquei o Eduardo frente a frente com o suporte que estava na posição 
vertical, como um espelho de frente pra ele. Mostrei-lhe as tintas guache e pinceis. 
O comando era de pintar o que quisesse fazer. Eu lhe pedi que pintasse o suporte 
que já havia sido pintado por mim, por tantose trata de uma colaboração criativa. Eu 
havia pintado um retrato do Eduardo. E pedi que ele o pintasse. Então o fez. Com a 
tinta guache, no começo, ele pintou o rosto de um dos “Eduardos” retratados, com a 
cor rosa. Timidamente, ele começou a pintar, traço a traço... Logo notei que ele 
estaria em breve entediado com o exercício. 
É necessário passar exercícios logo no início da tarde, pois com o passar do 
tempo, ele perde o foco e energia. Portanto, eu tenho costume de ser mais rápido 
com ele nesse sentido. Maior agilidade. Logo eu sugeri que ele usasse as mãos 
para pintar e que pintasse em outras regiões do suporte que tem 49,7 cm x 86 cm. 
34 
 
Ele gosta muito de mergulhar mão no pote de tinta, fato que me surpreende 
até hoje, pois tudo que foge do comum como pintar um lago de rosa, o assusta e o 
deixa irritado e agitado. Não foi o caso. Ele pintou com gosto e ao perguntar para ele 
se gostou de mexer com a tinta, ele respondeu que sim. Esfregou a mão em 
algumas partes do quadro e até colocou a mão como uma impressão, sem esfregar. 
Não demorou muito para que ele quisesse lavar a mão e terminar o exercício. Estes 
tipos de trabalhos não podem demorar muito para que ele não perca o entusiasmo e 
não fique cansado. 
Portanto, penso que seja viável apenas quinze minutos para todo o exercício, 
incluindo o tempo de limpeza dos materiais e das mãos. Também é importante 
incentivar ao aluno para que lave os pincéis e outros componentes da limpeza da 
sala após as atividades de arte empregadas. 
Percebo que quanto mais o aluno realiza este mesmo tipo de exercício, mais 
se sente habituado a fazê-lo, ou seja, torna-se menos resistente e mais confiante, 
porém o acompanhamento não deixa de ser necessário. Sobretudo, é necessário 
suscitar novos interesses no aluno, para que este se sinta sempre incentivado (pois 
já apresenta vontades de fazer novos feitos). 
Diferentemente do primeiro exercício, ele pareceu se familiarizar muito mais 
com o material, fazendo com o que o seu manuseio se tornasse mais fluido. 
Pretende-se investigar nos exercícios posteriores se o aluno se sente inclinado a 
realizar a atividade mesmo sem acompanhamento incessante. 
 
35 
 
 
Figura 1 
 
Figura 2 
 
 
36 
 
Parte 2 
 
Demos prosseguimento ao exercício anterior. Ele atendeu bem aos meus 
comandos. Mostrou-se bastante flexível principalmente ao começo do exercício, ao 
final mostrou-se mais rígido e seguro de suas decisões, sem mudar muito de ideia 
(por exemplo, ao ser perguntado se queria usar outra cor). 
Sua habilidade para pintar melhorou! Agora ele conseguiu pintar traços mais 
longos e outros tipos de pincelada que sugeri, executando sem dificuldades a forma 
circular, que está maior do que era em outros exercícios. Ele soube realizar com 
êxito uma pincelada pingada – semelhante à técnica do pontilhismo. No começo 
preferiu usar pincel, mas no decorrer do exercício, perguntei se queria usar as mãos 
e concordou, iniciando por dois dedos até pintar a mão inteira, esfregando uma na 
outra como se estivesseesfregando as mãos para lavar com sabão. 
Não demorou muito tempo para que ele pedisse para lavar as mãos. Esse 
momento foi interessante. Ele teve uma dificuldade maior para se levantar porque as 
duas mãos estavam sujas de tinta. Ele mostrou estar com medo de cair, então eu o 
ajudei e sujamos o chão de amarelo. Foi um momento delicado, mas curioso porque 
pôde proporcionar ao Eduardo um momento em que ele pôde ver que estava tudo 
bem sujar o chão e as mãos de tinta e que ele poderia lidar bem com a adversidade. 
Meu papel foi também o de encorajá-lo e de fazer com que sentisse seguro. 
Ele até riu e se descontraiu. Ao chegar à pia ele até me disse que não queria mais 
lavar as mãos, mas pareceu ter mudado de ideia rapidamente. Eduardo parece se 
animar quando lambuza as mãos com tinta: é como assistir a uma criança bem 
pequena brincar com tinta. Lavamos as mãos e voltamos ao exercício. 
O menino continuou a pintar com o pincel. As pinceladas melhoraram e eu 
sugeri novas formas de pintar e que pintasse em outras regiões do suporte, usasse 
outras cores, lavasse o pincel, que pintasse com um pedaço de papel higiênico e 
tinta. Eu demonstrei como seria e ele reproduziu maravilhosamente, até repetiu a 
técnica diversas vezes, com intimidade com o material. 
Percebo, como arte-educador, a necessidade de não interferir no processo do 
Eduardo, pois sinto que sem a minha interferência outras ações podem surgir. 
Como por exemplo, quando ele estava pintando com o pincel já com a tinta azul e o 
molhou com a tinta amarelo, misturando as duas cores na madeira MDF. Eu 
comecei perguntar quais as cores que ele misturou e o que seria o resultado disso. 
37 
 
Não disse de imediato o resultado, e então, não muito depois ele respondeu que 
dava verde. 
Outra dinâmica que acontece entre uma pincelada e outra é que ele olha 
muitas vezes para mim e pede para que eu fique com as mãos cruzadas, como ele 
gosta de ficar na maior parte do tempo. Questiono-me se esse pedido funciona 
como algo que lhe dá segurança, confiança ou é um acordo. Mas chego a conclusão 
de que não é um acordo pois quando eu não faço o que ele me pede, ele continua a 
pintar mesmo assim, ou seja, não é necessariamente um acordo ou uma troca de 
serviços – “eu faço o que você quer que eu faço mas você também faz o que eu 
quero que você faça”. Penso que isto é mais uma forma de interagir comigo, o que 
ele faz com muito prazer. 
Por vezes ele pinta olhando para mim, quase que como se tudo fosse uma 
coisa só. Outras vezes também pinta concentradíssimo no que faz e no resultado 
das pinceladas. De fato, a pintura, os movimentos que são iniciados por ele e todo o 
efeito que isso lhe causa que se manifesta ao longo dos dias a seguir configura a 
atividade como uma “coisa só”. Ele olha para mim, olha pra pintura. Começo a imitá-
lo, ele larga o pincel por alguns minutos, e ele faz novos movimentos para que eu 
possa imitá-lo. Portanto, o exercício das imitações se faz presente aqui também! O 
que possibilita que o trabalho seja muito mais integral! 
Percebo novos trejeitos surgindo, como o piscar de olhos que ele fez para que 
eu o imitasse. Um pequeno gesto feito por ele, indica o início de um novo exercício 
lúdico que ele demonstra querer que eu faça com ele. 
Continuando, após ter limpado as mãos, decide usar os dedos para pintar 
novamente – isso não acontece normalmente em outros exercícios artísticos feitos 
na escola. Normalmente ele se suja com as tintas e pede para eu auxiliá-lo para 
lavar as mãos e não se lambuza mais. Isso demonstra bastante engajamento na 
atividade, é muito positivo! Eu achei que ele teria parado de pintar com mais 
facilidade, em menos tempo, mas ele realmente curtiu fazer a atividade o que me 
trouxe alegria como ele também sentiu durante o “jogo”, ou seja, intercalamos 
pintura com movimentos de imitação! Novas palavras surgiram – “tá bom”: fez com 
uma vozinha fina, quando eu transferi a tinta para a tampa do recipiente, frases que 
normalmente eu digo quando ele está transferindo algum líquido para outro lugar! E 
o piscar dos olhos sugerindo de forma não verbal que eu o imitasse ou que fizesse o 
que ele queria que fizesse o que resultaria numa interação. Interessante, pois em 
38 
 
alguns outros momentos ele me pede que eu feche os olhos, mas ele também não 
quer fazê-lo. Como se ele estivesse a inverter as posições. 
Ele parece gostar de me imitar, de me dar os comandos para fazer o que ele 
quer e de me ver representando ele, fazendo coisas que ele gosta, percebo que ele 
gosta porque sorri bastante. Tudo isso parece convergir para o sentido da interação 
que lhe é tão precioso e necessário. 
Quando uma moça amiga dele chegou e se aproximou da pintura ele disse 
“sozinho, sozinho!”, o que indica uma importância do seu lugar de individualidade 
(não quer mostrar paraa vovó) e que demonstra autonomia, pois quer fazer as 
coisas por si só! Respeito sua necessidade de ter um espaço criativo desta forma, 
que não precise ser constantemente mostrado para outras pessoas. Também sugeri 
que colasse imagens em cima da tinta pintada. 
O movimento das pernas cruzadas - quando fui imitar ele quando estava de 
pernas cruzadas, ele demonstrou tentar empurrar os joelhos para o chão, fez isso 
para que eu sentasse de pernas cruzadas com o meu limite e não com o limite dele, 
achei interessante isso, pois ele estava a demonstrar que eu me sentasse do jeito de 
sempre e não do jeito dele, ainda que ambos estivéssemos sentados de pernas 
cruzadas!! Ao pedir que ele também cruzasse as mãos, ele disse “tô pintando!!”, ele 
também nunca tinha feito essa afirmação com tamanha segurança antes. Tudo isso 
em um único exercício. Exibe autonomia quando abre os potes ainda que diga que 
não consegue, aí digo “consegue sim, Eduardo!”, e ele prossegue e se supera. 
Quando se sujou com a tinta e estava desesperado para lavar as mãos, com o meu 
auxilio percebo que ele não fica tão desesperado e logo se entrega aos risos!!! 
Concluo que o aluno obteve maior habilidade com os materiais e pareceu 
estar mais fluido com relação aos traços feitos com o pincel, com os dedos e mãos - 
o que levou a uma ampliação das formas com círculos maiores e traços mais lentos 
e delicados. Além disso, conseguiu utilizar um novo material para pintar – o papel 
higiênico, quando molhado na tinta. Analisou-se que caso o Eduardo esteja 
desacompanhado desacelera e não executa as atividades com tanto engajamento e 
em poucos minutos para de praticar. 
 
39 
 
 
Figura 3 
 
 
Figura 4 
Segunda atividade 
 
O objetivo desta atividade é observar como o aluno pode realizar o recorte e a 
colagem e como pode interagir com as imagens das revistas e panfletos disponíveis 
40 
 
para recorte. Pretende-se observar se o Eduardo faz algum tipo de seleção a partir 
das imagens a serem coladas no papel e que relação estas imagens podem ter com 
a vida dele. Objetivou-se investigar de que forma dará sua expressão com esses 
materiais. A orientação dada foi a de que ele poderia recortar e colar o que quisesse. 
Observei que há uma dificuldade de desenhar uma variedade maior de 
elementos além dos quais ele já está acostumado, portanto foi pertinente estudar o 
que ele poderia fazer com imagens que já estão prontas para serem recortadas. São 
trinta minutos de atividade que variam dependendo da vontade e disponibilidade do 
aluno. 
 
Parte 1 
 
Na primeira parte, utilizamos um antigo livro didático para recortar. O rapaz 
escolheu sem delongas recortar imagens de legumes e hortaliças advindos do livro 
didático para colá-los com cola branca numa folha de papel A4. Isso me deixou 
curioso, pois ele escolheu imagens de alimentos os quais não come. Comecei a 
questionar-me se isso aconteceu por tanto ouvir incentivos das pessoas do seu 
convívio – nas quais me incluo – a ingerir esses alimentos. Será que a escolha 
ocorre por uma vontade de contentar as pessoas que o incentivam a comer 
verduras, legumes e frutas? Ele demonstrou gostar de fazer a tarefa proposta. 
 
Figura 5 
41 
 
Parte 2 
 
Na atividade de hoje, fizemos as colagens em um suporte diferente – em 
cartolina branca – pois achei que seriam necessárias para tornar o exercício mais 
desafiador e despertar novos estímulos no aluno. Dei os comandos de cortar e colar 
mais uma vez dando ênfase na possibilidade de cortar outras imagens que não 
fossem apenas as de folheto de supermercado ao qual ele está acostumado e sente 
atração. Perguntei a ele se ele gostaria de utilizar um pincel e ele concordou. Havia 
outras possibilidades de figuras para recortar como de costume nesta atividade, mas 
ele se concentrou nas imagens de produtos de supermercado. No entanto, ele 
recortou imagens de biscoitos que ele tanto gosta de comer. 
Mais uma informação pode ser necessária para tentar compreender um pouco 
mais do universo do Eduardo: ele gosta muito de ir ao supermercado com a avó, 
onde ele tem a autonomia de escolher tudo o que quer levar e pilota com muito 
prazer e destreza o carrinho de compras. Portanto, observo que recorta as imagens 
de que mais gosta porque fazem parte de seu repertório cotidiano mais íntimo. 
Experimentamos também tinta guache. Ao utilizar somente um pincel, as 
cores amarelo e azul começaram a se misturar. Aproveitei o momento para explicar 
qual seria o resultado da mistura dessas duas cores e que o resultado da soma 
dessas estava na ponta do pincel. Mais ao final do exercício, sugeri que usássemos 
materiais diferentes para colar ou para usar como carimbo – casca da maçã e 
plástico de bala com tinta. Penso que ele aceitou por cumplicidade, mas não 
pareceu realmente se interessar pela ideia. 
Este exercício foi interrompido por duas pausas, uma para o banheiro e outra 
para um café. Após a segunda pausa, ele puxou mais uma vez assunto comigo 
dizendo “gostosa a balinha!”, “é ruim!”, e “é gostosa!”. Isso me impressionou porque 
é resultado de uma maneira que desenvolvi para interagir com ele e provocar novas 
reações e respostas. 
Outro exemplo: na saída da escola eu costumo dizer “até sexta!”, quando na 
verdade estamos em uma segunda-feira. Isso faz com que ele retruque corrigindo e 
reagindo de outra forma dizendo: “não, até terça!”. 
As atividades propostas parecem integrar-se à vivência escolar, fazendo com 
que esta se torne mais rica e construtora de novos diálogos e oportunidades para se 
comunicar e relacionar-se. 
42 
 
 
 
Figura 6 
 
Terceira atividade 
 
 Posicionei duas cadeiras, onde nos sentamos e ficamos de frente para o 
outro, como se estivéssemos de frente para um espelho. 
 Começo a imitar o Eduardo. Há momentos em que eu começo e em outros o 
Eduardo. (Eu o imito bastante e penso que isso o agrada por vários motivos, dentre 
eles porque estou me apropriando da linguagem e repertório (de gestos, voz, etc) 
que ele mais conhece para me comunicar e interagir com ele). 
 Quando ele tem que me imitar no exercício, se ele não o fizer, eu faço o 
comando verbal ou utilizo o suporte físico, pegando nos braços dele e fazendo o 
movimento, por exemplo. E assim, vamos revezando. Ele se diverte bastante e ri 
muito. 
 Acenamos para pessoas, objetos, para o céu, para as janelas, levantando os 
braços como num exercício de alongamento (é assim que combinamos de 
chamarmos o exercício), pois se relaciona muito bem com o que fazíamos antes nas 
aulas de Educação Física, nas quais nos alongávamos juntamente ao restante da 
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turma e combinava com a professora que se eu me alongasse também, isso o 
incentivaria a se alongar conosco. 
 Eu o ajudava a se alongar, devidamente, o tocando, dando comandos verbais 
e utilizando situações reais como o ônibus que passava em frente à escola, como 
motivadoras para que ele fizesse maior esforço físico apoiando-se com os braços no 
andador, como se fizesse flexões, para conseguir ver melhor os ônibus. Nesse 
momento ele gritava entusiasmado e determinado: “ônibus amarelo!” 
 Para complementar este relato, é interessante relacionar esta atividade com a 
habilidade do aluno em se desenhar. Este movimento foi notado na medida em que 
as atividades artísticas foram sendo propostas e realizadas por ele nas quais 
espontaneamente foi sendo visto um desenho de “boneco de palito” sendo 
executado por ele – em folha de papel sulfite e em quadro branco, seguido por uma 
clara verbalização de que este era o Eduardo, como o aluno me contou. 
 O estudante também quis me representar. Não há nenhuma aparente 
distinção entre o desenho no qual fui representado com o desenho em que ele 
mesmo se representa. Há aqui um espaço para uma indagação: será que existe 
uma intenção de desenhar o que seria o outro assim como ele vê a si mesmo? Ou 
essas ações são feitas com

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