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47 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Unidade II 5 CITOGENÉTICA: CONCEITOS E FUNDAMENTOS A citogenética é a área da genética que estuda os cromossomos, suas estruturas, funcionalidades e anormalidades relacionadas às suas consequências clínicas. Os cromossomos são estruturas organizadas, presentes dentro do núcleo celular das células nucleadas da espécie humana. Em células somáticas, os cromossomos encontram-se aos pares (2n=46 - diploide) e nas células germinativas; no fim da meiose, encontram-se individualizados, ou seja, um representante de cada cromossomo dos 23 pares originais (n=23 - haploide). Os cromossomos são basicamente formados por DNA e proteínas estruturais. Em sua conformação, os cromossomos possuem uma região de constrição primária denominada centrômero. Os centrômeros são formados por sequências de DNA repetitivo constrito, o que delimita o cromossomo em duas regiões físicas: o braço curto (p – do francês petit) e o braço longo (q – por ser a próxima letra do alfabeto). Além disso, os cromossomos apresentam nas extremidades dos braços curto e longo estruturas constituídas por fileiras repetitivas de proteínas e de DNA, e estas são chamadas de telômeros. Estes são fundamentais para a orientação durante o processo de divisão celular e proteção das extremidades dos cromossomos. A figura a seguir apresenta a estrutura básica dos cromossomos humanos. Telômeros Braço curto p Centrômero Braço longo q Cromátides-irmãs Figura 25 – Imagem de um cromossomo duplicado, antes da separação das cromátides-irmãs 48 Unidade II Observação Cada telômero é composto de matrizes de repetições TTAGGG e é precedido por um subtelômero, que é formado por sequências repetitivas entremeadas de genes específicos de cada braço cromossômico. Os cromossomos da espécie humana são divididos em três categorias: metacêntricos, submetacêntricos e acrocêntricos. Os metacêntricos são aqueles cujo centrômero está localizado na região mediana do cromossomo, ou seja, eles possuem braços curtos (p) e braços longos (q) de tamanhos muito semelhantes. Já os submetacêntricos possuem um braço curto menor do que o braço longo, ou seja, o centrômero está mais deslocado para cima de sua região mediana. Por fim, os cromossomos acrocêntricos são aqueles cujo centrômero está situado na extremidade superior, deixando-o praticamente sem a presença de braço curto. Os cromossomos acrocêntricos possuem uma particularidade: a presença de regiões organizadoras de nucléolos, excetuando-se o cromossomo acrocêntrico Y. A figura a seguir apresenta os três tipos de cromossomos que constituem o cariótipo humano. Telômeros Cromátides Centrômero Braço longo q Braço curto p Satélite Constrição secundária Metacêntrico Submetacêntrico Acrocêntrico Figura 26 O estudo da constituição cariotípica da espécie humana foi um grande desafio durante o século XX. A determinação exata do número cromossômico humano em 1956 foi crucial para o desenvolvimento da citogenética clínica. Na década de 1960, durante a Convenção de Denver, a uniformização da técnica de coloração convencional cromossômica e a da determinação do estudo cariotípico por grupos possibilitou a identificação de diferentes aneuploidias, euploidias e alterações cromossômicas estruturais grandes. 49 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA As aneuploidias são um grupo de alterações numéricas do conjunto cariotípico 2n=46, e o seu portador apresenta variações no número final de cromossomos (a mais – trissomias, tetrassomias; ou a menos – monossomias). Entretanto, não possui alteração da constituição diploide do conjunto cromossômico. Um exemplo clássico de aneuploidia é a trissomia do cromossomo 21, relacionada à síndrome de Down. As aneuploidias podem afetar tanto os cromossomos autossômicos como os sexuais. Entre as aneuploidias relacionadas aos cromossomos autossômicos, destacam-se a trissomia do cromossomo 18 (síndrome de Edwards), a trissomia do cromossomo 13 (síndrome de Patau) e a trissomia do cromossomo 21 (síndrome de Down). Quando tratamos de cromossomos sexuais, destacam-se para o sexo masculino a síndrome de Klinefelter (47,XXY e suas variantes) e a síndrome do duplo Y (47,XYY) e, para o sexo feminino, a monossomia X ou síndrome de Turner (45,X) e a síndrome poli X (47,XXX e suas variantes). A presença de um autossomo extra geralmente leva a anormalidades graves de desenvolvimento, já duplicações de cromossomos pequenos e/ou de regiões pobres em genes parecem ser toleradas e compatíveis com a sobrevivência. As monossomias têm consequências ainda mais graves, pois, invariavelmente, levam a aborto espontâneo durante os estágios iniciais de gravidez. Ter um número anormal de cromossomos sexuais em geral tem consequências mais brandas que números anormais de autossomos. As consequências do desenvolvimento dessas trissomias e monossomias são resultado de um desequilíbrio dos níveis de produtos gênicos críticos codificados nos cromossomos afetados. Por exemplo, as principais características da síndrome de Down estão associadas à presença de três cópias de uma região de 1,6 Mb (megabase) na localização do cromossomo 21q22.2, denominada região crítica da síndrome de Down. As aneuploidias têm etiologia pré-zigótica (na gametogênese, durante a meiose) ou pós-zigótica (na embriogênese, durante a mitose). Essa anormalidade numérica acontece por erros de disjunção cromossômica durante as fases de divisão do ciclo celular, por pareamento desigual entre cromossomos homólogos ou de cromátides-irmãs. As euploidias são anormalidades numéricas que envolvem um conjunto haploide (n=23) inteiro. Elas podem resultar geralmente em triploidias (3n=69) e tetraploidias (4n=92). Esses casos comumente geram perda gestacional (abortamento) e os casos nascidos-vivos são mosaicos. Quando o erro acontece durante a meiose (pré-zigótica), essa alteração originalmente acometerá todas as células do seu portador. Caso ocorra durante a mitose (pós-zigótica), essa anormalidade se apresentará na forma de mosaico. A figura a seguir ilustra a origem das aneuploidias, durante os ciclos de divisão meiótico e mitótico, por erro de disjunção cromossômica. 50 Unidade II Não disjunção Normal NormalMeiose IINormal Não disjunção NormalMeiose I Zigoto Mosaicismo Alteração genética Célula inviável Mosaico 47 / 46 cromossomos Figura 27 – Não disjunção cromossômica no ciclo de divisão meiótico e mitótico, originando perfil celular alterado não mosaico e mosaico Define-se mosaicismo como a presença de linhagens celulares geneticamente distintas em um organismo (pessoa) que são oriundas de um mesmo zigoto. Presente em cerca de 1/10 mil indivíduos, o mosaicismo é um fenômeno relativamente comum e de difícil caracterização, uma vez que pode se apresentar restrito a determinado tecido ou em todos os tecidos de maneira equilibrada ou com distribuição independente intratecidual. Ademais, o mosaicismo pode afetar tanto cromossomos autossômicos como os cromossomos sexuais. 51 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA No mosaicismo, o número de células alteradas e normais nos diversos tecidos do organismo humano pode não estar homogeneamente distribuído. Papavassiliou et al. (2009) demonstraram que, em pacientes mosaicos para trissomia do cromossomo 21 a proporção de células alteradas em mucosa oral e no sangue periférico são consideravelmente diferentes e que tais predominâncias estão relacionadas à expressão fenotípica dos tecidos. Saiba mais O mosaicismo está presente em muitos casos de pacientes com doenças genéticas raras. Saiba mais sobre o mosaicismo lendo a referência a seguir: CHECK, W. Mosaicism adds to challenge in molecular diagnostics. Cap Today, 2016. Disponível em: http://www.captodayonline.com/mosaicism- adds-challenge-molecular-diagnostics/. Acesso em: 15 jan. 2020. Outro grupo de anormalidades cromossômicas importantes para o estudo do geneticista refere-se às alterações na estrutura dos cromossomos. Classificam-se em equilibradas(quando não há alteração no conteúdo genômico celular) ou não equilibradas (quando há prejuízo, ou seja, modificação na quantidade e na funcionalidade do genoma). Nas alterações equilibradas, destacam-se: inversões, translocações equilibradas e inserções. Já nas anormalidades não equilibradas, destacam-se: translocações não equilibradas, deleções, duplicações, isocromossomos e cromossomos em anel. As inversões podem ser classificadas em dois grandes grupos: paracêntricas e pericêntricas. As inversões pericêntricas são aquelas em que o cromossomo sofre duas quebras: uma no braço curto e outra no braço longo; esse bloco, que envolve a região centromérica, se inverte de posição. Já na inversão paracêntrica as duas quebras acontecem no mesmo braço do cromossomo e essa região se inverte, não envolvendo a região centromérica. p36.13 p36.11 p34.3 p34.2 p32.3 p31.3 p31.2 p31.1 p21.3 p21.1 p13.3 q12 q21.1 q20 q25.2 q25.3 q31.1 q31.3 q32.1 q32.2 q41 q42.2 q43 q44 p36.13 p36.11 p34.3 p34.2 p32.3 p31.3 p31.2 p31.1 q21.1 q12 p13.3 p21.1 p21.3 q23.3 q25.2 q25.3 q31.1 q31.3 q32.1 q32.2 q41 q42.2 q43 q44 Cromossomo 1 Cromossomo 1 Figura 28 – Inversão pericêntrica e inversão paracêntrica 52 Unidade II As translocações cromossômicas são definidas por “trocas” de partes dos cromossomos (regiões genômicas) entre cromossomos não homólogos. As translocações podem ser equilibradas (quando essa troca de pedaços não altera o conteúdo genômico) ou não equilibradas (quando nesse processo há perda ou ganho de determinados segmentos do DNA). Além disso, temos um tipo muito comum e característica de translocação que envolve apenas cromossomos acrocêntricos: a translocação robestsoniana. Nela, os cromossomos acrocêntricos “perdem” sua RON (região organizadora do núcleo) e há a fusão entre dois cromossomos acrocêntricos, formando um único cromossomo. Essa é uma das principais causas de síndrome de Down e síndrome de Patau herdadas. As inserções são marcadas pela introdução de um determinado segmento cromossômico em outro, comumente sem prejuízo ao conteúdo genômico nuclear. Por sua vez, as deleções e duplicações são consideradas rearranjos estruturais não equilibrados; são, respectivamente, perda e ganho de determinadas regiões/fragmentos dos cromossomos, as quais geralmente causam danos ao seu portador e, consequentemente, caracterizam um determinado fenótipo. Os isocromossomos são caracterizados pela perda total de um dos braços do cromossomo e duplicação do braço restante. Assim, um paciente com isocromossomo terá dois braços curtos ou dois braços longos. Os cromossomos em anel são constituídos pela junção das extremidades dos cromossomos. Essa junção é causada pela deleção das suas extremidades terminais (telômeros) e, com isso, são formadas “pontas ligantes” que se unem para tentar estabilizar o cromossomo que sofreu esse dano. Esses rearranjos estruturais, na maioria das vezes, propiciam o aparecimento de pequenos desequilíbrios estruturais e disrupções gênicas (quebras dentro dos genes), causando principalmente as síndromes de microdeleção e/ou microduplicação e outras anormalidades. 5.1 O teste de cariotipagem clássica: da coleta ao laudo Com a determinação do conteúdo cromossômico celular em 1956 por Tjio e Levan, a comunidade científica e clínica tiveram em suas mãos ferramentas para melhorar a compreensão das anormalidades cromossômicas numéricas e estruturais por meio do exame de cariotipagem clássica. O teste de cariótipo sob bandeamento G tem por finalidade analisar sob a microscopia óptica os cromossomos quanto às anormalidades numéricas e estruturais grandes, com a limitação de ~5 Mb. Cada par cromossômico se cora de maneira única, com um padrão de bandas claras e escuras, permitindo a identificação exata do conjunto cariotípico. Com as técnicas de bandeamento, todos os cromossomos podem ser diferenciados individualmente, viabilizando o diagnóstico de anormalidades. A cariotipagem é a técnica diagnóstica mais usada para avaliar os portadores de doenças genômicas. Atualmente, o exame é disponibilizado em laboratórios específicos da rede pública de saúde e sua realização faz parte da rotina de serviços de genética médica. A cariotipagem possui baixo custo e tem benefícios relevantes à saúde materno-infantil. 53 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA O teste de cariótipo é realizado para pessoas que, rotineiramente, apresentam alguma suspeita ou condição clínica que sugira uma alteração cromossômica. Também é executado em mulheres com idade avançada, devido ao risco aumentado de não disjunções cromossômicas durante o fim do ciclo meiótico do oócito. A seguir, serão apresentadas algumas condições que geralmente acompanham as fichas clínicas dos pacientes submetidos a esse exame: • idade materna avançada; • genitores com translocação equilibrada; • gestações anteriores com relatos de aneuploidias ou anomalias cromossômicas; • malformação fetal ou translucência nucal aumentada; • casais com perdas gestacionais recorrentes; • ansiedade maternal – pré-natal de alto risco. Esse teste pode ser realizado em diferentes materiais biológicos, destacando-se nos linfócitos do sangue periférico, nas células da medula óssea para diagnóstico das neoplasias medulares, no líquido amniótico, na vilosidade coriônica e no sangue fetal do cordão umbilical para o diagnóstico pré-natal, na pele (para casos de mosaicismo restrito à linhagem de fibroblastos – síndrome de Pallister Killian), em material de aborto (cerca de 60% das perdas gestacionais apresentam anormalidades genéticas) ou em qualquer outro material nucleado passível de entrar no ciclo celular. Observação O cariótipo é o estudo do conjunto cromossômico de uma espécie. O exame pode ser realizado em diferentes materiais, por exemplo, na amostra coletada da medula óssea para pacientes com suspeita de leucemia mieloide crônica e para a investigação do cromossomo Philadelphia (Ph). A finalidade desse teste é avaliar e triar, de maneira clássica, anormalidades cromossômicas (aneuploidias e grandes alterações estruturais) com resolução de aproximadamente 450-550 bandas cromossômicas. Para a execução dessa técnica, é necessária a coleta de material biológico vivo do paciente e posterior cultivo celular, uma vez que é preciso analisar células em metáfase (fase do ciclo celular na qual é possível visualizar os cromossomos sob microscopia óptica) para obter o cariótipo. Para finalidade didática, serão acentuados o protocolo para cariotipagem de linfócitos de sangue periférico. O material coletado é adicionado, em ambiente estéril (capela de fluxo laminar), ao meio de cultura específico com agentes mitogênicos (fitohemaglutinina) que estimularão o processo de crescimento celular. Após período de incubação em estufa (37 ºC por 72 horas), período em que haverá o maior número de células no ciclo celular, à cultura é adicionada a colchicina, um alcaloide que inibe a 54 Unidade II formação das fibras do fuso mitótico, impedindo que células em metáfase prossigam para sua próxima etapa, a anáfase. Dessa forma, a cultura é interrompida e a preparação cromossômica é iniciada com a adição da solução hipotônica (KCl, 0,075M). Essa solução tem por finalidade aumentar o volume de água dentro da célula, deixando-a túrgida e, assim, melhorando o espalhamento dos cromossomos na célula. Depois, adiciona-se a solução fixadora elaborada na proporção 3:1 (três partes de metanol: uma parte de ácido acético glacial) a suspenção celular para limpar a amostra. Essa lavagem com solução fixadora é realizada ao menos três vezes, deixando o pellet celular bem limpo. No fim, a lâmina é preparada com essa suspensão celular para ser corada e analisada sob microscopia óptica. As imagens são capturadas em softwares especializados de análise cariotípica. A figura a seguir apresenta resumidamente os passos para arealização do cariótipo de linfócitos de sangue periférico. Coleta da amostra Semeadura Cultivo Lâminas Análise Laudo Preparação cromossômica Figura 29 – Sequência esquemática do processamento do teste de cariótipo em sangue periférico 5.2 Cariotipagem sob coloração convencional – passo a passo Quando o estudo cariotípico foi implantado nas rotinas diagnósticas (aproximadamente na década de 1960), os cromossomos eram analisados de acordo com seu tamanho e a posição do centrômero, sendo classificados em grupos de A a G. A análise do cariótipo sob coloração cromossômica convencional é realizada ordenando-os em grupos. A seguir, apresentaremos como é executada a análise cariotípica da espécie humana em grupos. O grupo A é constituído por três pares de cromossomos: 1, 2 e 3. São os maiores cromossomos do genoma. O par número 1 é o maior cromossomo metacêntrico; o par número 2 é o maior cromossomo submetacêntrico e o par número 3 é formado por dois cromossomos metacêntricos grandes, de tamanho menor que o par número 1. A figura a seguir ilustra os pares cromossômicos do grupo A: 55 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Figura 30 O grupo B é constituído pelos pares 4 e 5. Ambos são cromossomos submetacêntricos de tamanho grande, com menor proporção entre os braços curto e longo. Dessa forma, aparentam uma chave-inglesa, conforme mostra a figura a seguir. Figura 31 O grupo C é constituído pelos pares cromossômicos autossômicos de 6 a 12 e pelo cromossomo sexual X. Assim, homens têm 15 cromossomos nesse grupo e as mulheres têm 16. Todos são cromossomos submetacêntricos de tamanho intermediário, conforme mostra a figura a seguir. 56 Unidade II Figura 32 O grupo D é constituído por três pares de cromossomos acrocêntricos grandes (pares 13 a 15), conforme ilustra a figura seguir. Figura 33 O grupo E é formado por três pares de cromossomos submetacêntricos pequenos (16 a 18), e o par 16 é ligeiramente metacêntrico em relação aos pares 17 e 18, conforme mostra a figura a seguir. 57 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Figura 34 O grupo F é formado por dois pares de cromossomos metacêntricos pequenos (19 e 20). Esses pares lembram muito uma gravata borboleta, conforme ilustra a figura a seguir. Figura 35 Por fim, o grupo G é constituído pelos pares cromossômicos autossômicos de 21 a 22 e pelo cromossomo sexual Y. Assim, homens têm cinco cromossomos nesse grupo e as mulheres têm quatro, conforme mostra a figura a seguir. 58 Unidade II Figura 36 Tecnicamente, a análise do cariótipo segue uma ordem prática de sequência de análise de grupos. Geralmente, os cromossomos são avaliados na seguinte ordem: A, B, D, E, F, G e C. A figura a seguir apresenta uma foto de uma metáfase sob coloração convencional como é observada no microscópio óptico. Figura 37 Técnica de coloração sob bandeamento G Em 1972, com o advento da técnica de coloração cromossômica sob bandeamento G, os pares cromossômicos puderam ser identificados de maneira inequívoca e as anormalidades estruturais e numéricas, antes não analisadas de maneira exata, puderam ser elucidadas. 59 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA A técnica de bandeamento G destaca os cromossomos em bandas claras e escuras, sendo que a banda clara é formada por regiões ricas em nucleotídeos GC e as bandas escuras por nucleotídeos AT. As bandas claras são normalmente ricas em genes. Assim, com a técnica de bandeamento G, os cromossomos não são mais classificados em grupos, mas sim aos pares, conforme seu padrão único de bandas claras e escuras. Comparativamente, o padrão de bandas G no cariótipo humano se assemelha a verdadeiros “códigos de barras”, únicos e específicos para cada cromossomo da espécie humana. A figura a seguir apresenta uma imagem de cariótipo sob bandeamento G. Figura 38 A figura a seguir destaca um cariótipo sob bandeamento G montado para o sexo masculino. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 39 A figura a seguir mostra um cariótipo sob bandeamento G montado para o sexo feminino. 60 Unidade II 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 40 Técnica de coloração sob bandeamento C A técnica de bandeamento C é realizada para destacar as regiões de constrição cromossômica primária (centrômeros) e as regiões de heterocromatina constitutiva dos cromossomos 1, 9, 16 e Y. A figura a seguir traz a imagem de uma metáfase sob bandeamento C, evidenciando um cromossomo X com uma alteração estrutural – cromossomo em anel. r(x) Figura 41 61 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Técnica de coloração sob bandeamento NOR A técnica de bandeamento NOR tem por finalidade evidenciar as regiões organizadoras de nucléolos dos cromossomos acrocêntricos (pares 13, 14, 15, 21 e 22). A figura a seguir apresenta a imagem de uma metáfase sob bandeamento NOR, revelando a presença de um cromossomo marcador com duas regiões de NOR destacadas nas extremidades. Mar Figura 42 Técnica de coloração sob bandeamento Q A técnica de bandeamento Q utiliza quinacrina mostarda, um reagente fluorescente que destaca as regiões dos cromossomos em bandas brilhantes e opacas. A figura a seguir traz a imagem de um cariótipo, trissômico para o cromossomo 21, corado por bandeamento Q. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 43 62 Unidade II Técnica de coloração sob bandeamento R Nessa técnica, aplica-se solução salina aquecida para alterar o padrão da banda G. Assim, onde no bandeamento G visualizamos regiões claras, no bandeamento R visualizaremos essa mesma região com tonalidade escura. Por sua vez, as regiões coradas com tonalidade escura no bandeamento G terão tonalidade clara no bandeamento R. A imagem a seguir ilustra a imagem de um cariótipo do sexo feminino normal corado sob bandeamento R. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 44 A figura a seguir apresenta o exemplo de um cariótipo de um menino com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor; esse indivíduo possui um cromossomo marcador extranumerário, ou seja, tem 47 cromossomos em sua constituição celular. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 54 11 17 X Mar 12 18 Y 47, XY, +mar Figura 45 63 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Observação Os cromossomos marcadores estão presentes no cariótipo e não é possível reconhecê-los, ou seja, não apresentam um padrão de banda identificável. Geralmente, são fruto de rearranjos cromossômicos envolvendo mais de um cromossomo. Para atingir o sucesso da técnica de cariotipagem, diversos passos são cruciais para garantir a qualidade do processo, tais como a obtenção de células em metáfase, boa qualidade na preparação cromossômica e na coloração das lâminas. O conjunto desses fatores permite uma análise confiável e inequívoca do cariótipo. Como citado anteriormente, o estudo cromossômico clássico, o qual utiliza a técnica de cariotipagem com bandeamento G, é a ferramenta mais aplicada na rotina diagnóstica dos recém-nascidos portadores de malformações congênitas. Entretanto, dependendo da gravidade desse defeito, nem sempre é possível coletar amostras biológicas em quantidade e/ou qualidade adequada para realizar esse teste, devendo-se ressaltar que a maioria dos conceptos malformados tem uma sobrevida curta, o que dificulta a execução de nova coleta quando necessário. Assim, em determinados casos, o diagnóstico citogenômico fica indefinido. Com relação aos aspectos econômicos, é a técnica de menor valor financeiro. A liberação do laudo é realizada em aproximadamente trinta dias e a sua relação custo-benefício ao paciente, quando utilizada isoladamente, é questionável, pois, conforme acentuado anteriormente, detecta alterações citogenéticas em cerca de 3 a 15% dos pacientes com malformações congênitas e déficit intelectual. Assim, uma margem considerável de casos fica semconclusão; outras técnicas de citogenética molecular e citogenômica são aplicadas para complementar a investigação etiológica das doenças genéticas. 5.3 Citogenética molecular: a hibridação in situ fluorescente (Fish) Técnica amplamente discutida na literatura, a Fish é baseada na homologia entre uma sonda de DNA marcada com fluorescência e o material alvo da pesquisa (células e tecidos). Por meio dessa técnica, é possível determinar perdas, ganhos e rearranjos de regiões específicas do genoma de maneira rápida e sensível sob microscopia de fluorescência. Em meados da década de 1980, com o advento da técnica de Fish, os estudos citogenéticos utilizando essa ferramenta e suas variantes foram cruciais para aprimorar a velocidade e a sensibilidade de análise dos cariótipos. Esse método possibilitou a detecção de anormalidades cromossômicas submicroscópicas (> 0,5 Mb), bem como a caracterização detalhada de muitos rearranjos estruturais. Estudos demonstram que a reavaliação citogenômica de pacientes portadores de malformações usando variantes da técnica de Fish auxiliam na identificação de anormalidades ocultas no teste de cariotipagem. Ainda, essas técnicas permitem o refinamento do mapa da região crítica de síndromes importantes, como a síndrome de 18p- e os casos de mosaicismo na síndrome de 9p-. 64 Unidade II A Fish tem alta especificidade e sensibilidade. Considerada padrão-ouro no diagnóstico de muitas doenças genômicas, possui como vantagens a rapidez em sua execução e a confiabilidade nos resultados. Em contrapartida, por ter um elevado custo e ser específica, não é uma técnica usada para triagem genômica. Em amostras teciduais, a Fish é amplamente utilizada para a confirmação de alterações específicas no DNA já conhecidas. Ela deve ser considerada uma ferramenta de investigação complementar à triagem genômica, com importante aplicabilidade para validar os casos de suspeita de mosaicismo inter e intratecidual. Uma das grandes vantagens da Fish é que ela dispensa o cultivo celular, o que permite a liberação dos resultados em menos de 24 horas e uma conduta clínica imediata. Essa técnica é de alta sensibilidade e especificidade, por conseguinte, não é considerada uma metodologia de triagem, devendo estar vinculada a uma hipótese diagnóstica. Com poder de avaliar pequenas alterações citogenômicas, é considerada padrão-ouro para a análise de doenças monogênicas. Com relação aos aspectos econômicos, a Fish possui custo-benefício elevado, uma vez que sua especificidade, confiabilidade e rapidez encerram o diagnóstico citogenômico. A técnica de Fish se inicia com a desnaturação da fita de DNA dos cromossomos, a qual pode ser realizada tanto por agentes químicos como por calor. Dessa forma, a dupla fita se abre, permitindo que a sonda fluorescente se ligue (hibridize) em sua região homóloga e, após uma série de lavagens, possa revelar a região genômica de estudo. A lâmina é contracorada com um corante fluorescente, de cor diferente ao fluoróforo da sonda, permitindo que a região-alvo e os cromossomos sejam visualizados sob microscopia de epifluorescência. As imagens são capturadas e analisadas em softwares especializados. A figura a seguir apresenta uma imagem de uma célula submetida à técnica de Fish, revelando a presença de três centrômeros do cromossomo 15 (um deles é derivativo – cromossomo marcador). Figura 46 65 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA 5.4 Citogenômica: aspectos clínicos e laboratoriais A MLPA (multiplex ligation-dependent probe amplification – amplificação multiplex de sondas dependente de ligação) e a Fish são técnicas citogenômicas consagradas pela literatura científica. Altamente eficazes, facilitam a identificação de diferentes tipos de aberrações em portadores de doenças genômicas, como microdeleções, microduplicações, avaliação de expressão, imprinting genômico e CNVs. 5.4.1 MLPA É a técnica citogenômica que permite que em uma mesma reação sejam avaliadas cerca de cinquenta regiões do material genético de estudo (DNA ou RNA). É muito usada como teste de screening genômico para portadores de malformações congênitas e na elucidação de quadros clínicos complexos de pacientes sem diagnóstico definitivo. A triagem quantitativa de alterações de regiões importantes do genoma humano, como os subtelômeros, ou de microdeleções por MLPA revela uma taxa de 5-10% de anomalias em pacientes com cariótipo convencional normal e malformações congênitas, portanto, é considerada uma técnica auxiliar valiosa para a análise citogenética de rotina. Para realizar a técnica de MLPA, diferentemente da cariotipagem, não é necessária a coleta de células vivas do paciente, uma vez que não precisam ser cultivadas. O material genético é extraído e submetido a uma reação em cadeia da polimerase (PCR). Em seguida, as regiões-alvo da técnica são marcadas com fluorescência e sequenciadas automaticamente. Após o término da técnica, o produto é analisado por um software que quantifica o material em estudo. No tocante às particularidades da técnica, destaca-se o risco de contaminação do material de estudo com DNA ou RNA de outra amostra. Para isso, é preciso ter extrema cautela no processo de extração e manipulação dos ácidos nucleicos. Com relação aos aspectos positivos, além dos já descritos, ressalta-se que para sua efetivação não é necessária uma grande quantidade de DNA (aproximadamente 50 ng/µL) por reação. Quanto aos custos do teste, a técnica de MLPA tem resultado positivo em razão dos seguintes aspectos: a cobertura no genoma (quantidade de regiões avaliadas por reação); a rapidez com que os laudos são liberados (aproximadamente 24 horas); a praticidade metodológica (kits de trabalho completos e prontos para uso); e sua confiabilidade diagnóstica. A utilização da técnica de MLPA é uma alternativa metodológica com excelente custo-benefício para a detecção de microrrearranjos (duplicações e deleções) no genoma investigado. Essa técnica avalia cerca de quarenta regiões de interesse clínico diferentes em um único experimento; é uma estratégia de triagem genômica quantitativa eficaz, eficiente e efetiva, que contempla a detecção de grandes alterações (aneuploidias) e as pequenas CNVs baseadas em uma hipótese diagnóstica. 66 Unidade II 5.4.2 Cariotipagem molecular por arrays Os testes baseados na técnica de matriz são ferramentas de alta resolução que possibilitam a identificação de ganhos e perdas de microrregiões genômicas em um único experimento. O experimento consiste na hibridação do material do paciente em lâminas ou chips de matriz e, por intensidade do sinal fluorescente, é possível determinar tais alterações quantitativamente. Os arrays diferenciam-se conforme a sua metodologia ou resolução das lâminas ou dos chips. O CGH-array (hibridação genômica comparativa por matriz) consiste na hibridação simultânea entre DNA controle e DNA do paciente e, de acordo com o desequilíbrio genômico do paciente, haverá predominância de sinais marcados do paciente ou do controle, refletindo em duplicações ou deleções, respectivamente. Caso haja homogenia entre os sinais, considera-se que o paciente é normal para o teste. A metodologia de SNP (single nucleotide polymorphisms – polimorfismo de nucleotídeo único) não utiliza DNA controle na hibridação. A partir de sequências de oligonucleotídeos (pequenas sequências de nucleotídeos) presentes nas lâminas ou nos chips, o DNA do paciente é hibridado e os resultados são analisados e contrapostos para a liberação e conclusão do teste. Por fim, o teste de matriz permite uma análise minuciosa de deleções e duplicações no genoma completo. Segundo Slavotinek et al. (2006), as matrizes revolucionaram a forma de se observar o genoma humano, proporcionando, através das suas diferentes plataformas, concluir o diagnóstico de diferentes rearranjos cromossômicos relacionados a quadros clínicos complexos. A figura a seguir apresenta o resultado de uma imagem do cromossomo 21 em um testede matriz, evidenciando que cada ponto verde é uma sonda (probe), a qual cobre uma região do cromossomo analisado do paciente. 2,00 1,60 1,20 0,80 0,40 -0,00 -0,40 -0,80 -1,20 -1,60 -2,00 21 -2 21 -11 21 -2 1 21 -31 21 -4 0 21 -7 21 -1 6 21 -2 6 21 -3 6 21 -4 5 22 -2 Figura 47 Observação O teste de cariotipagem molecular por array é utilizado quando o paciente apresenta fenótipo, com quadros malformativos e deficiência intelectual, sem uma hipótese diagnóstica consistente, já que nesse teste o genoma será avaliado de maneira mais ampla, permitindo que o estudo de variações genéticas, principalmente do tipo CNVs, seja realizado sem um alvo definido. 67 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA 5.5 Nomenclatura para testes citogenéticos e citogenômicos Os resultados de testes citogenéticos e citogenômicos seguem uma nomenclatura internacional para a elaboração dos resultados dos exames. A criação do resultado de um exame segue as normas do ISCN (International System for Human Cytogenomic Nomenclature – Sistema Internacional de Nomenclatura Citogenética), um guia prático que é atualizado rotineiramente, conforme a evolução dos métodos diagnósticos. A seguir, destaca-se o formato da confecção do resultado de um teste de cariotipagem: Número de cromossomos Cromossomos sexuais Cromossomo alterado Banda cromossômica Tipo de alteração, , Figura 48 Observe os exemplos a seguir: • Homem com cariótipo normal: 46,XY — Homem com 46 cromossomos com um par sexual XY. • Mulher com cariótipo normal: 46,XX — Mulher com 46 cromossomos com um par sexual XX. • Homem com síndrome de Down: 47.XY,+21 — Homem com 47 cromossomos (tipo de alteração: um cromossomo a mais; cromossomo 21 alterado). • Mulher com síndrome de Edwards: 47,XX,+18 — Mulher com 47 cromossomos (tipo de alteração: um cromossomo a mais; cromossomo 18 alterado). • Homem com síndrome de cri-du-chat: 46.XY,del(5)(p14 → pter) — Homem com 46 cromossomos (tipo de alteração: parte de um cromossomo a menos – deleção; cromossomo 5 alterado; banda cromossômica envolvida – de p14 até o fim do braço curto p14 → pter). 68 Unidade II Saiba mais O texto a seguir destaca a elaboração de laudos dos demais testes de citogenética e citogenômica. SIMONS, A.; SHAFFER, L. G.; HASTINGS, R. J. Cytogenetic nomenclature: changes in the ISCN 2013 compared to the 2009 edition. Cytogenetic and Genome Research, v. 141, p. 1-6, Jun. 2013. Disponível em: https://www. karger.com/Article/Pdf/353118. Acesso em: 10 dez. 2019. 6 DOENÇAS CAUSADAS POR ANEUPLOIDIAS (ALTERAÇÃO NUMÉRICA) A seguir, estudaremos as principais doenças relacionadas às aneuploidias de cromossomos autossômicos e sexuais mais conhecidas: trissomia do cromossomo 21 (síndrome de Down); trissomia do cromossomo 18 (síndrome de Edwards); trissomia do cromossomo 13 (síndrome de Patau) ; síndrome de Klinefelter (47,XXY e suas variantes); síndrome de Turner ou monossomia X (45,X); síndrome de Duplo Y (47,XYY); e síndrome de triplo X (47,XXX e suas variantes). 6.1 Aneuploidias dos cromossomos autossômicos 6.1.1 Síndrome de Down A síndrome de Down (SD) é caracterizada geneticamente, de maneira clássica, pela trissomia completa livre do cromossomo 21 (T21). A aneuploidia mais comum e frequente na população, a trissomia do cromossomo 21, acomete 1:800 recém-nascidos vivos, independentemente do sexo. Clinicamente, ela é caracterizada pelo fácies característica, com baixa implantação de orelhas, deficiência intelectual, cardiopatias congênitas (30 a 40% dos casos), estenose ou atresia duodenal, ânus imperfurado e doença de Hirschsprung. Os indivíduos com SD apresentam risco maior (dez a vinte vezes) do que a população dissômica de desenvolver leucemias. Entre os pacientes com SD, 90% têm perda auditiva significativa, geralmente do tipo condutor, com casos de hipotireoidismo congênito e Alzheimer precoce. Um dos principais riscos para se gerar um filho com SD é a idade materna avançada. Com o envelhecimento dos oócitos, as fibras do fuso que estão ligadas aos cromossomos homólogos na meiose I também envelhecem, correndo o risco de romperem-se em local errado, permitindo que cromossomos a mais ou a menos segreguem-se de maneira indevida. Por exemplo, o risco de ter um nascido vivo com síndrome de Down na idade materna de 30 é de um em mil; aos 40, de nove em mil. Exclusivamente nas aneuploidias que envolvem os cromossomos acrocêntricos (T13 e T21), podem ocorrer trissomias por translocação robertsoniana, ou seja, o cromossomo extra envolvido na doença encontra-se translocado sobre outro cromossomo acrocêntrico. 69 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Figura 49 – Menino com SD A figura a seguir ilustra a trissomia livre do cromossomo 21. Figura 50 A imagem a seguir traz uma fotografia de uma Fish evidenciando a trissomia do cromossomo 21. 70 Unidade II 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 51 6.1.2 Síndrome de Edwards A síndrome de Edwards (SE) é geneticamente caracterizada pela trissomia completa do cromossomo 18. Acomete 1:5000 indivíduos nascidos vivos, sendo a condição cromossômica autossômica mais frequente após a SD. Clinicamente, os pacientes com SE apresentam retardo de crescimento intrauterino e baixo peso ao nascer, com cardiopatia congênita e outros defeitos no processo de embriogênese, como microcefalia, micrognatia e microstomia. Destaca-se que os recém-nascidos possuem os punhos cerrados e sobreposição de dedos. Além desses sinais, os portadores da SE têm baixa implantação de orelhas. Por se tratar de uma síndrome com grave comprometimento sistêmico, muitos pacientes com SE falecem antes do nascimento ou no primeiro mês de vida. De 5 a 10% das crianças com essa condição vivem após o primeiro ano, e elas geralmente têm uma deficiência intelectual grave. A figura a seguir apresenta um cariótipo de um menino com a trissomia do cromossomo 18. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 52 71 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA 6.1.3 Síndrome de Patau A síndrome de Patau (SP) é geneticamente caracterizada, de maneira clássica, pela trissomia livre do cromossomo 13 (T13). Afeta 1:16.000 recém-nascidos vivos, independentemente do sexo. É clinicamente reconhecida pela grave deficiência intelectual e defeitos congênitos que os pacientes apresentam, destacando-se: cardiopatias congênitas; anormalidades cerebrais ou da medula espinhal; microftalmia; polidactilia; fendas orofaciais; hipotonia muscular. Devido à sua gravidade clínica, a maioria dos recém-nascidos vivos falecem nos primeiros dias ou nas primeiras semanas de vida, sendo que de 5 a 10% dos casos sobrevivem após o primeiro ano de vida. Exclusivamente nas aneuploidias que envolvem os cromossomos acrocêntricos (T13 e T21), podem ocorrer trissomias por translocação robertsoniana, ou seja, o cromossomo extra envolvido na doença encontra-se translocado sobre outro cromossomo acrocêntrico. A figura a seguir mostra um cariótipo clássico de uma menina com síndrome de Patau. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 53 6.2 Aneuploidias dos cromossomos sexuais 6.2.1 Síndrome de Klinefelter A síndrome de Klinefelter (SK) é uma anomalia cromossômica caracterizada classicamente pela presença de um cromossomo X a mais na constituição cariotípica de homens XY (47,XXY) descrita em 1942. Os pacientes com SK podem apresentar também cariótipos 48,XXYY; 48,XXXY; 49,XXXYY; 49,XXXXY, todos de incidência mais rara. 72 Unidade II A SK pode se apresentar na forma de mosaico, destacando-se linhagens 46,XY/47,XXY; 46,XY/48,XXXY e 47,XXY/48,XXXY, além de anomalias estruturais como 47,X,i(Xq)Y e 47,X,del(X)Y. Acomete cerca de 1:650 meninos nascidos vivos, afetando cerca de 3% de homens inférteis e cerca de 5 a 10% dos homens oligospérmicos ou azoospérmicos. A SK dificilmente é diagnosticada na infância, uma vez que asalterações tornam-se mais visíveis somente após o período da puberdade, quando as principais características aparecem nos indivíduos, como: estatura elevada; ginecomastia; hipogonadismo; hipogenitalismo; azoospermia; criptorquidismo; hipospádia; pelos esparsos; ombros estreitos; quadris largos. Alguns casos apresentam deficiência intelectual leve. É comum, mesmo na vida adulta, muitos casos passarem desapercebidos, pois, apesar das características, esses indivíduos possuem uma atividade sexual relativamente normal, mas com dificuldade reprodutiva. Assim, como há uma baixa procura por especialistas, é plausível que grande parte dos portadores de SK não estejam corretamente diagnosticados. O motivo de a SK implicar na infertilidade do indivíduo se deve à diminuição dos andrógenos, causando a atrofia testicular e, consequentemente, a azoospermia. Crianças com SK podem apresentar hipotonia muscular e problemas de coordenação que podem atrasar o desenvolvimento motor. Os meninos afetados geralmente têm dificuldade de aprendizagem, resultando em leves atrasos no desenvolvimento da fala e da linguagem e em problemas com a leitura. A figura a seguir apresenta um cariótipo clássico de um menino com SK. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 54 6.2.2 Síndrome de Turner A síndrome de Turner (ST) é uma cromossomopatia acentuada pela monossomia total ou parcial de um dos cromossomos X, acometendo aproximadamente uma em 2.500-4.000 meninas nascidas vivas. Relativamente rara, a ST é uma das principais causas de aborto prematuro, sendo aparentemente o único tipo de monossomia envolvendo um cromossomo inteiro compatível com a sobrevida. Acomete apenas meninas. 73 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Descrita inicialmente por Henry Turner e Otto Ullrich na década de 1930, a ST é fenotipicamente caracterizada por: baixa estatura; pescoço alado; disgenesia gonadal; amenorreia primária; infantilismo sexual; infertilidade; hipertelorismo mamário; anomalias cardíacas e renais; escoliose. Além disso, as pacientes podem apresentar: linfedema de mãos e pés ao nascer; pescoço curto e alado; baixa implantação de cabelos na nuca; cubitus valgus (deformidade do antebraço, que apresenta inclinação para longe do corpo); linhas hipoplásicas e hiperconvexas; micrognatia; palato alto e arcado; deficiência auditiva; hipertensão arterial; osteoporose; obesidade; distúrbios visuais; intolerância à glicose; dificuldades de aprendizagem; problemas psicossociais; doenças tireoidianas; doenças autoimunes. A ST é uma doença genética caracterizada pela ausência total (aneuploidia constitucional) ou parcial (variante cromossômica estrutural) no par de cromossomos sexuais (XX) de mulheres. Em geral, cerca de 45% das pacientes apresentam constituição cromossômica 45,X. Essa monossomia pode ser decorrente de uma não disjunção de origem pré-zigótica durante a gametogênese, ou pós-zigótica durante o processo de desenvolvimento embrionário e fetal. A causa mais frequentemente associada à ST, ocorrendo em aproximadamente 75% dos casos, é a não disjunção meiótica paterna durante a gametogênese, que advém de um erro na separação dos cromossomos homólogos durante a meiose I, ou da separação das cromátides-irmãs no decorrer da fase de anáfase da meiose II do ciclo celular. Além disso, a monossomia do cromossomo X pode ocorrer de maneira constitutiva (em todas as células do organismo) ou apresentar-se na forma de mosaico. O mosaicismo pode ser responsável por um fenótipo variável nas pacientes com ST, corroborando para exacerbar ou diminuir sinais clínicos característicos da síndrome. Aproximadamente 45% das pacientes que apresentam ST exibem um primeiro cariótipo 45,X, não sendo relatado mosaicismo. Segundo a literatura, um segundo cromossomo sexual é necessário para a sobrevida fetal, assim, teoricamente, todas as meninas nascidas vivas com ST deveriam ter uma segunda linhagem celular com um segundo cromossomo sexual. Essa hipótese é sustentada devido à alta frequência de diagnósticos de meninas com um cariótipo 45,X puro em materiais de abortos (99% dos casos de ST com cariótipo 45,X resultam em óbito fetal). A detecção do mosaicismo depende de alguns fatores, como: o tipo e o número de tecidos analisados; o número de células estudadas; a sensibilidade das técnicas; e a possibilidade de seleção, que pode resultar no desaparecimento de linhagens celulares. Por esse motivo, é importante avaliar um grande número de células para a correta determinação do conjunto cariotípico do organismo. A ST também pode ser decorrente de alterações estruturais envolvendo o braço curto do cromossomo X. Essas aterações incluem: deleções, translocações, duplicações, inversões, cromossomos em anel e isocromossomos. 74 Unidade II Entre os resultados cariotípicos mais frequentes em pacientes com ST em mosaico, destacam-se as linhagens 45,X com 46,X,i(Xq); 46,XX; 47,XXX; 46,X,del(Xp) ou 46,XY. A figura a seguir apresenta um cariótipo clássico de uma menina com a ST. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 55 – Cariótipo de uma mulher com monossomia X (síndrome de Turner) identificada pela técnica de bandeamento G A figura a seguir mostra uma Fish com apenas um sinal para a sonda de centrômero de cromossomo X. Figura 56 – Imagem da Fish da paciente 1, com a sonda DXZ1 – referente ao cromossomo X (verde), evidenciando apenas um sinal para o cromossomo X 75 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA 6.2.3 Síndrome do duplo Y A síndrome do duplo Y (SDY) é uma aneuploidia geneticamente caracterizada pelo cariótipo 47,XYY. Acometendo cerca de 1:1000 meninos nascidos vivos, pode não causar grandes alterações fenotípicas e físicas aparentes, destacando-se apenas a estatura elevada para alguns de seus portadores. Os pacientes com SDY possuem um risco elevado de apresentar dificuldades de aprendizagem e atraso no desenvolvimento de habilidades de fala e linguagem. Os meninos afetados podem ter atraso no desenvolvimento motor e hipotonia muscular. Outros sinais e sintomas dessa condição incluem tremores nas mãos ou outros movimentos involuntários, convulsões e asma. Homens com síndrome de 47,XYY têm um risco maior de apresentar dificuldades comportamentais, sociais e emocionais em comparação com seus pares não afetados. Esses problemas incluem transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH); depressão; ansiedade; e transtorno do espectro autista. A figura a seguir mostra um cariótipo de um menino com SDY. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 57 - Cariótipo de um homem com 47, XYY 6.2.4 Síndrome do triplo X A síndrome do triplo X (STX), também chamada trissomia X, é geneticamente caracterizada pela presença de uma cópia extra do cromossomo X no cariótipo de meninas (47,XXX). A STX acomete cerca de 1:1.000 meninas nascidas vivas, e as portadoras apresentam geralmente estatura mais elevada do que a maioria das mulheres, sem desvios fenotípicos mais graves. 76 Unidade II A STX está associada a um risco aumentado de dificuldades de aprendizado e atraso no desenvolvimento das habilidades de fala e linguagem, atraso motor, hipotonia muscular e dificuldades comportamentais e emocionais. Convulsões ou anormalidades renais ocorrem em cerca de 10% das mulheres afetadas. A figura a seguir apresenta um cariótipo clássico de uma mulher com STX. 1 6 13 19 2 7 14 20 3 8 15 21 9 10 16 22 4 11 17 X 5 12 18 Y Figura 58 Lembrete O teste de cariotipagem clássica é realizado de rotina no estudo de aneuploidias e na triagem de doenças genéticas em pacientes com quadros malformativos sindrômicos. 6.3 Doenças causadas por CNVs (rearranjos estruturais) O delineamento molecular das anormalidades estruturais submicroscópicas não balanceadas é essencial, pois fornece pistas importantes para os diversos efeitos fenotípicos associados àpresença de CNVs e não explicados pela citogenética clássica, por exemplo, o efeito de alterações da dosagem gênica causado por duplicações ou a haploinsuficiência gerada por deleções e a variabilidade fenotípica decorrente dos rearranjos cromossômicos complexos. Ao longo dos anos, as abordagens citogenômicas contribuíram diretamente para a elucidação de mecanismos que levam a essas doenças genômicas. As microdeleções intersticiais que ocorrem em regiões cromossômicas específicas, como na síndrome de Miller-Dieker (17p13) ou na síndrome DiGeorge/Velocardiofacial (22q11.2), puderam ser reconhecidas, diagnosticadas e, consequentemente, melhor estudadas. 77 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Descobriu-se que nessas regiões a recorrência de pontos de quebra específicos é causada pela presença de sequências repetidas – low copy repeats (LCRs). A presença dessas LCRs resulta em instabilidade genômica e predispõe esses locais a recombinações genômicas, causando a doença. Da mesma forma, estudos moleculares aplicados às regiões teloméricas e subteloméricas específicas revelaram que diferentes CNVs presentes nessas regiões, antes não detectadas, estariam diretamente relacionadas com as causas de deficiência mental em muitos pacientes. Observação A citogenômica teve importância fundamental para impulsionar a compreensão da arquitetura do genoma, sua plasticidade e sua relação com a saúde humana. Além disso, a caracterização molecular dessas regiões permitiu a compreensão dos mecanismos que resultaram na estabilização de rearranjos cromossômicos terminais, por exemplo, os pacientes portadores da síndrome da deleção 1p. A reavaliação de pacientes portadores de fenótipo clínico heterogêneo e cariótipo similar utilizando técnicas citogenômicas como a Fish ajudou a identificar pontualmente as microdeleções e refinar o mapa da região crítica de síndromes, estreitando as regiões relacionadas a características clínicas específicas, por exemplo, para a microcefalia em 18q21.33, e para a atresia aural congênita em 18q22.3 para a síndrome de 18q-. A associação entre as alterações não visíveis microscopicamente, menores que 3 Mb, como os rearranjos complexos intra e intercromossômicos e sítios frágeis com as novas síndromes permitiu um impulso no entendimento da correlação genótipo-fenótipo na literatura médica. Desse modo, a relação das duplicações localizadas na região 17p11.2, no cromossomo 17, com as manifestações clínicas dos pacientes portadores hoje está bem estabelecida em diferentes bancos de dados do genoma. As características clínicas de pacientes com a síndrome de Prader-Willi (PWS) também puderam ser melhor compreendidas, como: atividade fetal diminuída; obesidade; hipotonia; retardo mental; baixa estatura; hipogonadismo hipogonadotrófico; estrabismo; mãos e pés pequenos. A maioria dos casos de PWS surge devido a uma microdeleção paterna na região 15q11-q13, incluindo o gene SNRPN (small nuclear ribonucleoprotein polypeptide N – polipeptídeo N da pequena ribonucleoproteína nuclear). Uma vez que a deleção em 15q12 foi associada a um fenótipo específico, a reavaliação em um grande número de portadores com mesmo quadro clínico mostrou que 70% dos pacientes com a síndrome de Prader-Willi tinham a mesma microdeleção, sendo que o restante dos pacientes denotava 78 Unidade II dissomia uniparental materna para o cromossomo 15 e uma minoria apresentava diferenças no padrão de imprinting genômico. SNRPN SNRPN Paterno Materno Cromossomo 15 OFFON OFFON ONOFF snoRNA genes snoRNA genes UBE3A UBE3A Figura 59 Na figura anterior, destaca-se um aglomerado de genes próximo ao centrômero do cromossomo 15 (na banda 15q11.2), o qual está sujeito ao imprinting específico de acordo com a origem (sombreamento em azul e rosa): vários genes, incluindo SNRPN e muitos genes snoRNA são expressos de forma exclusiva a partir do cromossomo 15 paterno, o qual é silenciado no cromossomo 15 materno. Por outro lado, o gene UBE3A é silenciado na cópia paterna e ativo na cópia materna. Assim, a perda de função desses genes tem consequências diferentes, dependendo da origem dos pais: a perda de UBE3A no 15 materno leva à síndrome de Angelman, enquanto a perda de UBE3A no 15 paterno não tem consequências, uma vez que o gene é inativo de qualquer maneira na cópia paterna. O mecanismo envolve a metilação do DNA (indicado no hachurado) da região SNRPN do cromossomo materno 15. Lembrete A associação entre as alterações não visíveis microscopicamente, menores que 3 Mb, como os rearranjos complexos intra e inter-cromossômicos e sítios frágeis com as novas síndromes, permitiu um impulso no entendimento da correlação genótipo-fenótipo na literatura médica. A ausência de contribuição materna da região no cromossomo 15q11-q13, incluindo o gene UBE3A, resulta na síndrome de Angelman (AS), que é caracterizada por deficiência mental grave, comprometimento da fala, ataxia e/ou tremor dos membros e um comportamento típico, que inclui risos frequentes e excitabilidade. Além disso, microcefalia e convulsões também podem estar presentes nesse quadro. 79 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA Em outros casos, as microdeleções foram observadas após a identificação inicial de translocações. A deleção em 22q11, por exemplo, foi inicialmente relatada em pacientes com síndrome de DiGeorge, portadores de translocações não equilibradas envolvendo o cromossomo 22. Estudos posteriores utilizando técnicas citogenômicas em um grupo de pacientes com as mesmas manifestações clínicas mostraram que 95% apresentavam microdeleções em 22q11.2, permitindo associar essa região genômica a uma síndrome antes muito difícil de ser diagnosticada. O fenótipo principal dessa síndrome é a presença de malformação cardíaca conotruncal, associada ou não a outras alterações, como palato fendido, hipoplasia de timo e de glândula paratireoide, dismorfias faciais, voz nasalada, dificuldade de aprendizagem, doenças psiquiátricas e deficiência mental leve. Assim, hoje as deleções da região q11.2 do cromossomo 22, por possuírem a mesma etiologia, são classificadas como variações de um mesmo espectro clínico, com sobreposição de fenótipo e expressividade variável, denominada síndrome da deleção 22q11.2. Da mesma forma, pequenas sequências repetitivas menores que 10 kb, as LCRs (low copy repeats – repetições de poucas cópias), estariam envolvidas em rearranjos relacionados a diferentes doenças genômicas, além da associação com síndrome da deleção 22q11.2, também na doença de Charcot-Marie-Tooth tipo 1 A, que é decorrente de uma duplicação de aproximadamente 1,4 Mb em 17p12. Inúmeras síndromes de microdeleção também foram identificadas com o auxílio dessas correlações. Por exemplo, na síndrome de Williams-Beuren, que é caracterizada principalmente por sinais faciais distintivos e estenose aórtica supravalvar, a observação da segregação da translocação balanceada associada a um fenótipo clínico característico revelou uma região específica no cromossomo 7, que compreende o gene da elastina e é responsável pela anormalidade cardíaca nesses pacientes. Em 1993, pesquisadores descreveram uma família com Williams-Beuren portadora de uma translocação entre os cromossomos 6 e 7, cujo ponto de quebra em 7q11.23 provocou uma disrrupção no gene da elastina, acreditando-se ser essa a causa dos defeitos cardíacos nesses pacientes. Investigações posteriores em indivíduos com síndrome de Williams-Beuren revelaram microdeleções em 7q11.23 em 90% dos casos. Outros exemplos da relevância da correlação genótipo-fenótipo proporcionada pelos avanços nos estudo da arquitetura do DNA para a identificação inequívoca de uma variedade de quadros sindrômicos presentes ao nascimento são os casos de síndrome de Wolf-Hirschhorn, a qual está relacionada à ausência de segmentos genômicos no braço curto do cromossomo 4, em 4p16.3, à síndrome do cri-du-chat, causada pela deleção parcial em 5p15.2 (região crítica), à monossomia 18qe suas variantes em 18q22-qter e à síndrome de Miller-Dieker (17p13.3). 80 Unidade II Resumo A citogenética é a área da genética que estuda os cromossomos, suas estruturas, funcionalidades e anormalidades relacionadas às suas consequências clínicas. O teste de cariótipo é o exame que avalia a constituição cromossômica das espécies. Os humanos apresentam 46 cromossomos em suas células diploides, e estas podem sofrer alterações numéricas e estruturais. Tais variantes podem causar quadros sindrômicos, como a síndrome de Down e, se a linhagem celular da medula óssea for acometida, pode provocar o desenvolvimento de leucemias. Vimos que as grandes variantes são passíveis de serem detectadas com o cariótipo. Entretanto, as pequenas anormalidades passarão despercebidas devido à limitação da técnica. Assim, devemos lançar mão de técnicas de citogenética molecular (Fish) e citogenômicas (MLPA e matriz). Por fim, destacamos que as doenças cromossômicas numéricas (aneuploidias), estruturais (deleções, duplicações, inversões – entre outras) e de imprinting e UPD podem ser identificadas por diferentes testes laboratoriais. Exercícios Questão 1. Por intermédio do estudo do cariótipo, é possível analisar alterações no número de cromossomos de uma espécie. No cariótipo a seguir, por exemplo, observa-se uma alteração denominada: 1 6 13 19 7 14 20 8 15 21 9 16 22 10 17 X 11 18 Y 12 32 4 5 Figura 60 81 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA A) Nulissomia. B) Trissomia. C) Tetrassomia. D) Haploidia. E) Monossomia. Resposta correta: alternativa B. Análise das alternativas A) Alternativa incorreta. Justificativa: nulissomia é uma aneuploidia que ocorre quando há a perda de um par completo de cromossomo, sendo quase sempre letal. B) Alternativa correta. Justificativa: no cariótipo, é possível observar a presença de três cromossomos 18, o que indica uma trissomia. A trissomia do 18 é chamada de síndrome de Edwards. C) Alternativa incorreta. Justificativa: síndrome XXXX (também chamada tetrassomia X ou 48,XXXX) é uma desordem cromossômica rara causada pela presença de 4 cromossomos X em vez de 2. Essa condição ocorre apenas em mulheres, uma vez que não há presença do cromossomo Y. D) Alternativa incorreta. Justificativa: a haploidia é o estado de um núcleo, de uma célula que possui um só cromossomo para cada par de homólogos. A haploidia é representada simbolicamente por n. E) Alternativa incorreta. Justificativa: monossomia se refere à condição na qual existe apenas uma cópia do cromossomo especificado, por exemplo, a síndrome de Turner, que acomete mulheres que apresentam 45 cromossomos (44 autossômicos + 1 sexual X). 82 Unidade II Questão 2. (PUCRS 2001) 1 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 X / Y 2 3 4 5 Figura 61 O cariótipo é de um indivíduo do sexo ______ com síndrome de ______. A) Feminino – Klinefelter. B) Masculino – Klinefelter. C) Masculino – Down. D) Feminino – Turner. E) Masculino – Turner. Resposta correta: alternativa B. Análise das alternativas A) Alternativa incorreta. Justificativa: a síndrome de Klinefelter só ocorre no sexo masculino (XXY). 83 GENÉTICA E CITOGENÉTICA HUMANA B) Alternativa correta. Justificativa: a síndrome de Klinefelter consiste num grupo de anomalias cromossômicas nas quais encontram-se dois ou mais cromossomos X em machos. A síndrome, resultante de uma deficiência genética com o cariótipo 47, XXY, é uma das principais causas de esterilidade no sexo masculino. C) Alternativa incorreta. Justificativa: a síndrome de Down é a trissomia do cromossomo 21 (autossômica) e acomete ambos os sexos. D) Alternativa incorreta. Justificativa: a síndrome de Turner é uma monossomia do X. E) Alternativa incorreta. Justificativa: a síndrome de Turner acomete apenas o sexo feminino por ser uma monossomia do X. Cariótipo 44 autossômicos + 1 X = 45 cromossomos.
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