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Conceitos iniciais: carcinicultura marinha, sistemas de produção e compostos nitrogenados UNIDADE 1 9 Introdução A Unidade 1 do curso Compostos nitrogenados em cultivo de camarão marinho abor- dará os conceitos iniciais sobre a carcinicultura marinha, os sistemas de produção e os compostos nitrogenados. O objetivo é que você tenha contato com os principais assuntos relacionados ao cul- tivo de camarão e consiga perceber a importância desse conteúdo em sua atuação profissional. Para facilitar o estudo, teremos muitos exemplos práticos que permitirão uma maior compressão. Não deixe de conferir todos os recursos que preparamos especialmente para você. Bons estudos! 1.Carcinicultura marinha O termo carcinicultura refere-se à criação de camarões em cativeiro, seja ele marinho ou de água doce. É um ramo que está em expansão no Brasil, sendo um negócio bem lucrativo, já que o camarão é um dos produtos pesqueiros mais comercializados no mundo. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimenta- ção - FAO (2020), a maior parte de sua produção ocorre na Ásia e na América Latina. De acordo com os dados da FAO, em 2020, a produção mundial de pescados foi de 177,8 milhões de toneladas, sendo que 49,2% foram provenientes da aquicultura (87,5 milhões de toneladas). Desse total, 65,7% foram provenientes da piscicultura, 20,3% do cultivo de moluscos e 12,8% do cultivo de crustáceos. Observe os dados na ima- gem: 10 Produção mundial em 2020 Fonte: FAO, 2022. #Pracegover: Imagem com vários camarões recém pescados. Em 2020, a carcinicultura mundial foi responsável por produzir 11,2 milhões de to- neladas, sendo 60,1% da sua totalidade de espécies marinhas. Com 5,8 milhões de toneladas, o Penaeus vannamei foi a espécie mais produzida em 2020, representando aproximadamente 51,7% da produção mundial de crustáceos (FAO, 2022). No Brasil, o cultivo desta espécie atingiu uma produção de 54,3 mil toneladas em 2019 (IBGE, 2020). A carcinicultura é uma relevante atividade econômica em diversas regiões do litoral brasileiro, tanto em razão do valor de sua comercialização como pela promoção de emprego e renda. Embora a carcinicultura ocorra também nas regiões Sul e Sudeste do país, o maior número de fazendas de camarão marinho concentra-se na região Nordeste, uma vez que ela possui extensa área costeira e elevadas temperaturas, o que possibilita a criação de camarões durante todo o ano. Essa região foi responsável por 99,6% da produção nacional em 2019, destacando-se os estados do Rio Grande do Norte (20,7 mil toneladas – 38,2%) e do Ceará (16,7 mil toneladas – 30,8%) (IBGE, 2020). 11 O desenvolvimento do setor está atrelado ao cultivo da espécie P. vannamei, que se tornou a principal espécie, devido às vantagens que apresenta em relações a outras, tais como: • Crescimento rápido; • Fácil adaptação a novos ambientes; • Maior taxa de sobrevivência; • Ótima taxa de conversão alimentar; • Grande aceitação no mercado; • Tolerância a altas densidades de estocagem. • Variações ambientais. A tolerância da espécie a uma ampla faixa de temperatura e salinida- de torna possível seu cultivo em uma maior área geográfica (zonas tropicais e subtropicais, com água salgada e com baixa salinidade) (RACOTTA et al., 2003; SAOUD et al., 2003, SAMOCHA, 2019). Saiba Mais Espécimes de ,Penaeus vannamei Fonte: Priscilla Celes (2019). #Pracegover: Imagem com vários camarões recém pescados. 12 A carcinicultura vem apresentando uma redução na taxa de crescimento (FAO, 2018), com perdas de aproximadamente US$ 15 bilhões de dólares, principalmente pelos surtos de doença como: Síndrome da Mancha Branca, Mionecrose Infecciosa, Sín- drome de Taura e Necrose Hipodermal Hematopoiética Infecciosa (COSTA et al., 2009; SAMOCHA, 2019). No Brasil, esse histórico iniciou-se em 2004, quando a atividade sofreu uma redução de 15% na produção em relação ao ano anterior (75,9 mil toneladas), em decorrência do vírus da Mionecrose Infecciosa (IMNV) (RODRIGUES, 2005). Nos anos seguintes, surgiram os relatos do vírus da Mancha Branca, primeiramente em Santa Catarina, no ano de 2005, depois no sul da Bahia, em 2008, e em algumas áreas de Pernambuco, Paraíba e do Rio Grande do Norte, no ano de 2011 (GUERRELHAS et al., 2011). As principais doenças observadas no cultivo de camarões marinhos no Brasil são: Síndrome da Mancha Branca (WSS – White Spot Syndrome) – Vírus da Mancha Branca Fases afetadas: Juvenil a adulto Sinais Clínicos: os camarões apresentam redução no consumo alimentar e letargia. A cutícula desprende-se facilmente e manchas brancas podem ser visualizadas no exoesqueleto. No entanto, em muitos casos, os camarões moribundos apresentam coloração variando entre rosa e avermelhada, em função da expansão dos cromatóforos. Nesses casos, a presença de manchas brancas é limitada ou ausente. Camarão com sinais de Síndrome da Mancha Branca (WSSV) Fonte: Lightner (1996) e Morales e Cuéllar-Anjel (2008). #PraCegoVer: imagens de camarões com pequenos círculos brancos no exoesqueleto. 13 Mionecrose Infecciosa (IMN – Infectious Myonecrosis) – Vírus da Mionecrose Infecciosa Fases afetadas: Pós-larvas, juvenis e adultos Sinais Clínicos: os camarões apresentam áreas necróticas no músculo do abdômen, que são inicialmente multifocais e, posteriormente, tornam-se mais difusas, aumentando de tamanho. Em estágios avançados, as áreas necróticas adquirem coloração laranja-avermelhada. Camarão com sinais de Mionecrose Infecciosa (IMN) Fonte: Morales; Cuéllar-Anjel (2008). #PraCegoVer: imagens de camarões com partes necróticas aparentes. Necrose Hipodermal Hematopoiética Infecciosa (IHHN – Infec- tious Hypodermal and Hematopoietic Necrosis) – Vírus da Necrose Hipodermal Hematopoiética Infecciosa Fases afetadas: larvas, juvenis e adultos. Sinais clínicos: camarões com rostos tortos ou deformados, antenas enrugadas, carapaça áspera e deformada, segmento abdominal deformado e grande variação de tamanho (muitos indivíduos pequenos). 14 Camarão com sinais de Necrose Hipodermal Hematopoiética Infecciosa (IHHN) Fonte: Morales e Cuéllar-Anjel (2008). #PraCegoVer: imagens de camarões com corpos deformados. Hepatopancreatite Necrosante Bacteriana (NHP-B – Necrotising hepatopancreatitis) – Hepatobacterium penaei Fases afetadas: juvenis e adultos. Sinais clínicos: durante a fase inicial da doença, não aparecem sinais clínicos. Já na fase aguda, há redução do consumo alimentar, palidez do corpo, com coloração marrom-clara, brânquias amarelo-pálidas a marrons e hepatopâncreas atrofiado. Na fase crônica, os camarões apresentam hepatopâncreas atrofiado de cor escura. Camarão com sinais de Hepatopancreatite Necrosante Bacteriana (NHP-B) Fonte: Lightner (1996). #PraCegoVer: imagem de camarão com sinais de NHP-B. 15 Necrose Hepatopancreática Aguda (AHPNS – Acute Hepatopan- creatic Necrosis Syndrome) – Vibrio parahaemolyticus Fase afetada: juvenil. Sinais clínicos: os camarões apresentam hepatopâncreas pálido e endurecido, de tamanho reduzido, intestino vazio, carapaça mole ou solta, coloração pálida e letargia. Camarão com sinais de Necrose Hepatopancreática Aguda (AHPNS) Fonte: Tran et al. (2013). #PraCegoVer: imagem de camarão com sinais de AHPNS e indicação do estômago, hepatopâncreas e intestino. Fonte: Morales e Cuéllar-Anjel (2014). #PraCegoVer: imagens de camarões com hepatopâncreas pálido e endurecido. 16 Vibrioses Vibrio spp Fases afetadas: pós-larvas, juvenis e adultos. Sinais clínicos: os camarões podem apresentar opacidade muscular, trato digestivo vazio, expansão de cromatóforos, hepatopâncreas inflamado, erosão cuticular e luminescência. A doença causa alta mortalidade (até 90%) em pós-larvas e juvenis. Camarão com sinais de Vibrioses Vibrio spp Fonte: Aguilera – Rivera et al. (2019). #PraCegoVer: imagens de camarões com opacidade muscular. Quando se avalia o desempenho da carciniculturabrasileira e equatoriana, durante o período entre 2000 e 2018, fica nítida a necessidade de modificação nas estratégias de cultivo para o desenvolvimento da carcinicultura no país. O Equador está entre os maiores produtores de camarão da América Latina e apresenta uma produção superior à brasileira, graças aos investimentos públicos e estímulos à atividade. Apesar das dificuldades enfrentadas em função das enfermidades que afetam os cultivos, o país apresenta um crescimento significativo da carcinicultura. Em 2018, o Equador produziu 510 mil toneladas de P. vannamei, cerca de 8,2x mais que o Brasil (62 mil toneladas) (FAO, 2020b), como pode ser observado no gráfico. 17 Comparativo das produções de camarão marinho cultivado no Brasil e no Equador 550000 500000 450000 400000 350000 300000 250000 200000 150000 100000 50000 0 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 (REO-III-V, IHHNV, TSV-1, WSSV, WSSVc, NHP-B, PVNV, IRIDO, RPS, TBP, EMS e FstS) (WSSV, IHHNV, NHP-B e IMNV) Equador: 13 doenças Brasil: 4 doenças Brasil Equador To ne la da s Fonte: Rocha (2017); FAO (2020b). #PraCegoVer: gráfico comparativo entre a produção de camarões no Brasil e no Equador. Diante dos surtos de doença, pesquisadores e produtores, acompanhando uma ten- dência mundial, vêm incorporando às suas estratégias de cultivo, técnicas capazes de reduzir a incidência de doenças e manter a qualidade de água, baseando-se na produção com pequenas trocas de água. Por esse motivo, ao longo dos anos, os sis- temas intensivos vem ganhando espaço na carcinicultura. 1.1 Sistema de produção Podemos classificar os sistemas de produção, genericamente, em quatro tipos: 1. extensivo; 2. semi-intensivo; 3. intensivo; 4. superintensivo. 18 Vale destacar que o desenvolvimento tecnológico foi decisivo para o desenvolvimen- to da carcinicultura, permitindo o abastecimento de água via bombeamento, utiliza- ção de aeradores e intensificação dos cultivos, dentre outros incrementos. Principais diferenças entre os sistemas de produção extensivos, semi-intensivos e intensivos Fonte: adaptado de Tacon e Foster (2003). #PraCegoVer: ilustração comparativa entre os tipos de sistemas. Na imagem, podemos analisar as diferenças entre os sistemas de cultivo em relação a diversos aspectos. Cada triângulo representa um parâmetro e para analisar a imagem precisamos entender que: 19 1. a informação para o sistema extensivo será sempre em cima e para intensivo sempre será embaixo, independentemente da posição do triângulo; 2. a base maior do triângulo representa que o parâmetro é “muito ou grande” no sistema em questão; 3. a base menor (ponta) representa que o parâmetro é “pouco ou pequeno” no sistema em questão. O sistema extensivo foi a primeira forma de cultivo de camarões marinhos praticada no mundo. Este sistema é bastante simples, não utilizando grandes tecnologias, como o uso de aeradores e alimentação artificial (ração). A alimentação é baseada na produção natural, favorecida pela fertilização orgânica e inorgânica (FARIA et al., 2013; OSTRENSKY et al., 2017a). Nos cultivos extensivos, utiliza-se baixa densidade (de 0,5 a 4 camarões/m²), baixa renovação de água e mínima intervenção ao longo do cultivo, resultando em uma baixa produtividade (0,05 – 0,1 kg/m²) (OSTRENSKY et al., 2017b; SAMOCHA et al., 2017). Em função da baixa densidade de povoamento, é provável que não existam problemas para o produtor manter a qualidade da água nesse sistema de produção. Além disso, as fazendas com esse sistema apresentam extensas áreas de viveiros (10-20 ha/viveiro). Cultivo em sistema extensivo Fonte: Lima (2017). #PraCegoVer: imagem de um sistema extensivo, em uma grande área. 20 O sistema semi-intensivo é comumente utilizado para o cultivo do camarão L. vannamei, chamado de “convencional”. Nesse sistema, é possível ter um maior controle sobre as variáveis de qualidade de água, como oxigênio dissolvido, pH, transparência e alcalinidade. Além disso, ocorre o uso de rações balanceadas, que proporcionam um aumento das densidades de estocagem. São utilizadas densidades entre 5 e 40 camarões/m², renovação de água mais elevada, viveiros menores (1 e 10 ha) e de tamanho mais homogêneo, quando comparado ao cultivo em sistema extensivo, alcançando uma produtividade de até 0,3 kg/m² (OSTRENSKY et al., 2017a; SAMOCHA et al., 2017). Por conta da densidade, torna-se necessário o uso de aeração emergencial para manter os níveis de oxigênio. Além disso, também é necessária a oferta aos animais de alimento artificial (ração) para complementar a dieta dos camarões, embora a alimentação natural ainda tenha papel importante. A tecnologia empregada nesse sistema foi sendo aperfeiçoada ao longo dos anos, agregando outras estruturas e técnicas como: canais de drenagem, bacias de sedi- mentação, utilização de berçários (25 a 35 dias), além de algumas estratégias de boas práticas de manejo, como controle e tratamento da matéria orgânica. Cultivo em sistema semi-intensivo em Pernambuco A aeração emergencial está relacionada ao uso de aeradores nos momentos em que ocorre queda nos níveis de oxigênio no sistema. Saiba Mais Fonte: Lima (2017). #PraCegoVer: imagem de cultivo semi-intensivo em Pernambuco. 21 O sistema intensivo, por sua vez, tem a finalidade de intensificar o sistema de cultivo e obter alta produtividade. Por isso, os tanques e/ou viveiros são menores (quando comparados aos sistemas extensivos e semi-intensivos). Neste sistema, há um maior controle sobre as variáveis de qualidade de água; as tro- cas de água são reduzidas e pode-se utilizar maiores densidades de estocagem (50 a 300 camarões/m²) (OSTRENSKY et al., 2017a). Com isso, a produtividade alcançada nesse sistema pode ser superior a 5 kg/m² (SAMOCHA et al., 2017). Cultivo em sistema intensivo em Pernambuco Fonte: Lima (2017). #PraCegoVer: imagem de cultivo intensivo em Pernambuco. Já o sistema superintensivo, possui as mesmas características do intensivo, porém, por meio do controle da qualidade de água e estratégias de fertilização que estimu- lam o crescimento de bactérias benéficas, é possível que que sejam utilizadas densi- dades ainda maiores (até 450 camarões/m²) (OSTRENSKY et al., 2017a). Destaca-se que tanto nos cultivos intensivos quanto nos superintensivos, há alta dependência de energia elétrica, mão de obra especializada e alimentação nutricionalmente completa, como aminoácidos e ácidos graxos. Além disso, também podem ser utilizados pro- bióticos, prebióticos e imunoestimulante para aumentar ainda mais a produtividade. 22 1.2 Compostos nitrogenados A produção aquícola baseia-se no fornecimento de um ambiente favorável ao desen- volvimento dos organismos aquáticos. Por isso, a manutenção da qualidade de água é um fator extremamente importante para o sucesso desse cultivo. Independente do sistema de cultivo utilizado, podem ocorrer variações nos parâmetros da qualida- de de água, dependendo das densidades de estocagem, quantidade de alimentação ofertada e manejo. Nesse contexto, um dos principais problemas relacionados à qualidade da água é o acúmulo de compostos nitrogenados, ou seja, qualquer matéria orgânica cuja composição apresente nitrogênio. Podemos citar algumas: a amônia, o nitrito e o nitrato, que podem causar grandes prejuízos ao cultivo. Por conta disso, quando há um aumento da densidade de estocagem, é fundamental ter muita atenção a estes compostos. Ao intensificar-se uma produção, há uma série de consequências que irão muito além do simples aumento da densidade. Quanto mais camarões por unidade de área, maior será a dependência do uso de alimento nutricionalmente completo, a necessidade de con- trole da qualidade de água, o uso de aeradores e de mão de obra especializada. Além disso, a rentabilidade financeira não está obri- gatoriamenteligada à densidade populacional e produção, uma vez que os custos para a intensificação do cultivo são altos. Atenção 23 Nos sistemas extensivos, compostos como a amônia, o nitrito e o nitrato não chegam a alcançar valores prejudiciais aos animais cultivados em razão da menor carga or- gânica. No entanto, quando passamos para o cultivo intensivo, é necessário entender a dinâmica dos compostos nitrogenados e o papel da comunidade bacteriana para auxiliar a manutenção da qualidade da água. Durante o cultivo, o nitrogênio está presente nos ambientes aquáticos sob várias for- mas, por exemplo: nitrogênio orgânico dissolvido (aminoácidos, peptídeos etc.), nitro- gênio orgânico particulado (fitoplâncton, zooplâncton e bactérias), amônia (NH3), íon amônio (NH4 +), nitrito (NO3 -), nitrato (NO2 -), óxido nitroso (N2O), nitrogênio molecular (N2) etc. (ESTEVES, 2011). Nos sistemas de cultivo, as principais fontes de nitrogênio são os fertilizantes nitro- genados, as excretas dos organismos e as sobras de ração (CRAB et al., 2007; Sá, 2012). Principalmente nos sistemas extensivos e semi-intensivos, os fertilizantes são adicionados com o objetivo de aumentar a disponibilidade de nutrientes para os pro- dutores primários. Alguns dos fertilizantes utilizados como fontes de nitrogênio são: ureia, nitrato de cálcio e nitrato de sódio (SÁ, 2012). Na alimentação dos camarões, o requerimento nutricional em relação à proteína é maior nos estágios iniciais (pós-larvas), reduzindo-se gradativamente ao longo do cultivo. As rações comerciais utilizadas para o cultivo são ricas em proteína bruta, com teores entre 26% e 50%, onde aproximadamente 16% dessa proteína é nitrogênio (SÁ, 2012). Quando a ração é ingerida, inicia-se o processo de digestão; os camarões aproveitam em média 25% do nitrogênio ofertado e o resto é liberado no ambiente na forma de nitrogênio amoniacal total (AVNIMELECH, 2012). 24 Ciclo do nitrogênio na carcinicultura Fertilizantes nitrogenados Alimento Ração não consumida Fezes Amônia Nitrito Bactérias Nitrato N2 (NH2)2CONH4NO3 (NH4)2SO4 Fonte: adaptado de Crab et al. (2007). #PraCegoVer: ilustração do ciclo de nitrogênio na carcinicultura. Sabendo disso, pode-se estimar a quantidade de nitrogênio amoniacal total que é fornecido ao sistema a partir da ração (SAMOCHA et al., 2017). Isso é possível a partir da equação: NAT = Ração × %PB × %N × % Excreção Onde: NAT é nitrogênio amoniacal total; %PB é a porcentagem de proteína bruta da ração; %N é a porcentagem de nitrogênio na proteína (16%); % Excreção é a taxa de excreção do animal. 25 Exemplo 1 Em um tanque é ofertada diariamente 1 Kg de ração 40% PB. Quanto de NAT está sendo fornecido diariamente? NAT = Ração × % PB × %N × % Excreção 1. Transforme a quantidade de ração de quilograma (Kg) para grama (g): 1 Kg é equivalente a 1.000 g 2. Multiplique a quantidade de ração (1.000 g) pelo teor de proteína (40%): 1.000 × 0,4 = 400 g de proteína 3. Multiplique a quantidade de proteína pela porcentagem de nitrogênio na proteína (16%): 400 g × 0,16 = 64 g de nitrogênio 4. Multiplique pela taxa de excreção (75% – fração de nitrogênio convertida em NAT): 64 × 0,75 = 48 g NAT Exemplo 2 Em um viveiro, são ofertados diariamente 5 Kg de ração 35% PB. Quanto de NAT está sendo fornecido diariamente? NAT = Ração × % PB × % N × % Excreção 1. Multiplique a quantidade de ração (5 Kg) pelo teor de proteína (35%): 5 Kg × 0,35 = 1,75 Kg de proteína 2. Multiplique a quantidade de proteína pela porcentagem de nitrogênio na proteína (16%): 1,75 Kg × 0,16 = 0,28 Kg de nitrogênio 3. Multiplique pela taxa de excreção (75% – fração de Nitrogênio convertida em NAT): 0,28 × 0,75 = 0,21 Kg NAT 1.3 Conversão dos compostos nitrogenados Segundo Ebeling et al. (2006), nos sistemas de cultivo, dependendo das estratégias de manejo adotadas e das condições ambientais, a conversão do Nitrogênio Amonia- cal Total (NAT) pode acontecer, principalmente, de três formas: 26 • por meio da remoção fotoautotrófica por algas, em que o NAT é convertido em biomassa algal; • pelas bactérias autotróficas, responsáveis pela oxidação da amônia em nitri- to e nitrato; • pelas bactérias heterotróficas, responsáveis por transformar o NAT direta- mente em biomassa bacteriana. Esses processos são influenciados diretamente pelas variáveis de qualidade da água, como: alcalinidade, temperatura, pH, potencial redox (ORP), oxigênio dissolvido, lumi- nosidade, disponibilidade de carbono orgânico, entre outras (EBELING et al., 2006). Um tanque de cultivo de camarão é um ecossistema bastante complexo, indo além do fornecimento de ração e de fertilizantes, no qual há uma cadeia biológica que envolve um conjunto de microrganismos, como fitoplâncton, zooplâncton, bactérias, protozo- ários, entre outros. A matéria orgânica presente no tanque de cultivo de camarão irá passar pelo pro- cesso de mineralização, que liberará os nutrientes nela contidos para o ambiente, especialmente o nitrogênio (N) e o fósforo (P). Na presença de luz, as microalgas utilizam estes nutrientes como substrato para o seu desenvolvimento. Em seguida, incorpora-os à sua biomassa, convertendo-os novamente em compostos orgânicos. As microalgas na água servem de alimento para as populações de zooplâncton (OS- TRENSKY et al., 2017b). 27 Ciclo biológico em um tanque de cultivo de camarão Luz Fertilizantes Ração Zooplâncton Fitoplâncton Nutrientes Bactérias Matéria orgânica Nitrito Amônia Nitrato N2 Fonte: Lima #PraCegoVer: imagem ciclo biológico em um tanque de cultivo de camarão, com destaque para a incidência de luz solar, a entrada de fertilizantes e ração e, dentro do tanque, o fitoplâncton, o zooplâncton, matéria orgânica, bactérias, assim como nitrato, nitrogênio, nitrito e amônia. O fitoplâncton e o zooplâncton apresentam, no entanto, um ciclo de vida curto e, quando morrem, essa matéria orgânica estimula o crescimento de organismos de- tritívoros, que fragmentam a matéria orgânica, expondo-as para a ação bacteriana (bactérias autotróficas e heterotróficas). As bactérias então mineralizam essa maté- ria e liberam os nutrientes novamente na coluna d’água (OSTRENSKY et al., 2017b). As bactérias autotróficas, por sua vez, utilizam a oxidação de substâncias minerais como única fonte de energia para o seu desenvolvimento, não necessitando de ne- nhum nutriente orgânico. Certos compostos orgânicos podem até inibir o crescimen- to dessas bactérias. Pelo fato de as bactérias nitrificantes participarem do ciclo do nitrogênio convertendo a amônia (nitrogênio amoniacal) em nitrito e, posteriormente, convertendo o nitrito em nitrato (forma menos tóxica para os camarões), elas são um dos tipos de bactéria mais importantes para a carcinicultura (EBELING et al., 2006; OSTRENSKY et al., 2017b). 28 Já as bactérias heterotróficas utilizam substâncias orgânicas como fonte de ener- gia e são relacionadas à decomposição da celulose, açúcares, proteínas e de outros compostos nitrogenados. Durante o cultivo, na presença de compostos orgânicos, essas bactérias atuam na transformação do nitrogênio amoniacal em biomassa bac- teriana (EBELING et al., 2006). Chegamos ao fim desta unidade, na qual foi possível aprender conceitos introdutó- rios relacionados à carcinicultura marinha, os diferentes sistemas de produção utili- zados, assim como sobre os compostos nitrogenados e sua conversão neste meio. Até a próxima aula!
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