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190 Unidade III Unidade III 7 MEDICINA NUCLEAR 7.1 Atribuições do biomédico na medicina nuclear A equipe que atua em um serviço de medicina nuclear inclui biomédico ou tecnólogo, médico radiologista especializado em medicina nuclear, físico de saúde, enfermeiro, técnico de enfermagem e farmacêutico. A intervenção desses profissionais engloba vários procedimentos, como planejamento do exame, preparo dos radiofármacos, controle de qualidade geral, calibração de equipamentos, administração do radiofármaco, programação do exame, orientação ao paciente, execução do exame e processamento da imagem. O laudo é uma atribuição exclusiva do médico nuclear. As atribuições do biomédico nessa área estão estabelecidas na Resolução de Diretoria Colegiada da Anvisa RDC n. 38, de 4 de junho de 2008, e apresentadas também no Manual do biomédico (CRBM 1, 2021). O biomédico pode operar equipamentos de cintilografia, PET/CT e PET/RM, definir protocolos de exame, realizar a entrevista com o paciente, atuar no pós-processamento de imagens, documentar exames e gerenciar sistemas de armazenamento de informação, como PAC, RIS e HIS. Além disso, poderá realizar estudos in vivo e in vitro e auxiliar o médico em procedimentos terapêuticos. A medicina nuclear baseia-se na utilização de radiofármacos para a formação das imagens. O biomédico pode realizar procedimentos de radiofarmácia, como solicitação e controle de estoque dos reagentes liofilizados, radioisótopos e demais insumos para a radiofarmácia, preparação e controle de qualidade do eluato dos geradores e radiofármacos marcados no setor, identificação, rotulagem e rastreabilidade dos radiofármacos e radioisótopos, preparação das doses individuais, e administração dos radiofármacos seguindo os protocolos estabelecidos para cada exame e orientação do médico nuclear. Além disso, poderá atuar nas diversas atualizações tecnológicas, no segmento de informática médica, na área de pesquisa, bem como na área administrativa do departamento de diagnóstico por imagem. Da mesma forma que em TC e RM, poderá atuar no segmento de aplicação nas empresas vendedoras de equipamentos e insumos. 7.2 Histórico A medicina nuclear é uma especialidade médica em diagnóstico por imagem que utiliza fontes não seladas de radioisótopos no interior do organismo para fins diagnósticos e terapêuticos. O paciente recebe o material radioativo, em doses baixas e passa a emitir radiação. Assim, os aparelhos na medicina nuclear servem para detectar a radiação no paciente, ao contrário do que ocorre nas outras modalidades radiodiagnósticas, em que o aparelho emite a radiação. 191 IMAGENOLOGIA A história da medicina nuclear teve início com a descoberta da radioatividade natural, em 1896, pelo físico francês Antoine Henri Bequerel. Em 1898, o casal Pierre Curie e Marie Sklodowska Curie descobriu os elementos radioativos como o rádio e o polônio. O conceito de que a radiação natural era emitida por átomos de certas substâncias foi introduzido por Marie Curie. Em 1903, Bequerel e o casal Curie compartilharam o Prêmio Nobel de Física pelas descobertas sobre radioatividade, e Marie Curie foi a primeira mulher e única pessoa a ganhar um prêmio Nobel em duas áreas diferentes, a de Física e Química. Em 1913, um químico húngaro, George de Hevesy, iniciou pesquisas com traçadores em plantas. Estes são materiais radioativos introduzidos em um organismo vivo capazes de sinalizar a trajetória da substância e, portanto, contribuir com estudos fisiológicos. Em 1927, Herrmann L. Blumgart e Soma Weiss também investigaram traçadores, mostrando radônio na circulação sanguínea. A produção de radioisótopos artificiais foi introduzida em 1932, com a construção do primeiro cíclotron. Outro método de produção de radioisótopos é o reator nuclear, desenvolvido durante a Segunda Guerra Mundial. Nesse período, as pesquisas eram voltadas principalmente para a avaliação da glândula tireoide com a utilização do radioisótopo 131I (iodo-131). O íon iodeto é captado por células tireoidianas para a produção de hormônios e armazenado no interior da glândula. Para realizar as medidas e a detecção do radioisótopo, era utilizado um contador Geiger-Muller, que não forma imagem. Foi somente em 1946 que começou o desenvolvimento de aparelhos detectores da radiação com o objetivo de transformar a medida do traçador em imagem. O primeiro equipamento desenvolvido para formar imagens a partir dos radioisótopos foi o mapeador linear (cintígrafo retilíneo), criado por Benedict Cassen, em 1951. Nesse período, foi introduzido o tecnécio-99 metaestável (99mTc), principal radioisótopo de uso na medicina nuclear até hoje. Para formar uma imagem no mapeador linear, era necessário um movimento de varredura linear do detector da radiação. Em 1958, Hal Anger criou a primeira câmara de cintilação, também chamada gama-câmara, melhorando a captação da imagem. Com o desenvolvimento do computador, em 1960, as imagens passaram a ser armazenadas como dados digitais. Em 1963, a câmara de Anger foi aprimorada, permitindo estudos mais flexíveis e dinâmicos. Os equipamentos atuais são baseados nesse modelo de gama-câmara. No mesmo ano do surgimento da TC, em 1970, a evolução da informática trouxe um avanço na medicina nuclear com a reconstrução da imagem tomográfica a partir de traçadores. Esse método foi criado por David E. Kuhl e é chamado single photon emission computerized tomography (SPECT), em português, tomografia computadorizada por emissão de fóton único. Em 1973, um novo método de aquisição foi criado por Brownell e Phelps, a tomografia computadorizada por emissão de pósitrons, em inglês pósitron emission tomography (PET). 192 Unidade III No final da década de 1990, surgiram equipamentos híbridos, incorporando outras técnicas de imagem aos equipamentos da medicina nuclear, como a TC, em 1999, e, em 2010, a RM. Atualmente, os equipamentos híbridos com CT (SPECT/CT e PET/CT) fazem parte dos serviços de medicina nuclear, contribuindo com informações morfológicas no diagnóstico. Os equipamentos híbridos com RM (PET/RM) ainda estão em estudo, com pouquíssimas unidades no Brasil. 7.3 Princípio físico da formação da imagem A medicina nuclear é uma especialidade médica que faz uso de isótopos radioativos com finalidade diagnóstica ou terapêutica. É considerada segura e, em geral, indolor, pois utiliza métodos não invasivos para obter informações diagnósticas. Sua principal característica é a avaliação fisiológica e metabólica, além da avaliação da estrutura dos órgãos. Quanto à morfologia, visualizamos na imagem a localização das moléculas ou átomos do radioisótopo distribuídos especificamente em alguns órgãos ou determinados tecidos, com apresentação de um esboço anatômico. Devido a essas características, utiliza-se o termo imagem molecular na medicina nuclear. A interação entre a radiação emitida pelo paciente com o detector no equipamento produz cintilação. Por isso, os exames na medicina nuclear são chamados comumente cintilografia. Radiação gama emitida pelo paciente Imagem da distribuição do radiosótopo no órgão Detector de radiação (cintilador) Figura 107 – Esquema ilustrativo do princípio físico na medicina nuclear A alta sensibilidade na avaliação da função dos órgãos permite um diagnóstico precoce de inúmeras doenças. Isso porque as lesões manifestam-se, inicialmente, por alterações funcionais, bioquímicas e moleculares reversíveis. As alterações irreversíveis, como, por exemplo, morte celular, são desencadeadas pela progressão do dano, levando a alterações morfológicas que podem ser detectadas nos exames de imagem. Assim, a medicina nuclear é um importante método de diagnóstico precoce e acompanhamento na progressão de diversas doenças, como na avaliação de enfermidades cardíacas, pulmonares, renais, endócrinas, oncológicas, entre outras. Desde a descoberta da radioatividade, substâncias radioativas foram estudadas para serem empregadas como terapia. Na medicinanuclear, além dos exames diagnósticos, alguns radioisótopos são utilizados com aplicação terapêutica, em geral de baixo custo. O iodo-131 (131I), na forma de iodeto, é utilizado no tratamento de hipertireoidismo e câncer de tireoide, constituindo cerca de 97% de todos 193 IMAGENOLOGIA os procedimentos terapêuticos na medicina nuclear (HIRONAKA et al., 2012). Outro radioisótopo é o samário-153 (153Sm), ligado à molécula de ácido etileno-diamina-tetrametileno fosfonado (EDTMP), utilizado para tratamento paliativo da dor óssea metastática (FUNARI et al., 2013). As substâncias radioativas empregadas na medicina nuclear são chamadas radiofármacos e são consideradas fontes não seladas, isto é, a substância radioativa entra em contato direto com os tecidos biológicos. 7.4 Radiofármacos De acordo com a RDC n. 451/2020 da Anvisa, radiofármaco é um medicamento com finalidade diagnóstica ou terapêutica que, quando pronto para o uso, contém um ou mais radionuclídeos. Os radiofármacos compreendem, também, os componentes não radioativos para marcação e os precursores radiofarmacêuticos, incluindo os componentes extraídos dos geradores de radionuclídeos (BRASIL, 2020). Os componentes não radioativos, também chamados kits para marcação, consistem em reagentes que são combinados com um radionuclídeo para formar o radiofármaco final, que será administrado ao paciente. Podem apresentar-se na forma liofilizada e inclui diversos tipos de substâncias inorgânicas, orgânicas, partículas, anticorpos, proteínas e até mesmo células sanguíneas (FUNARI et al., 2013). De maneira mais simples, pode-se definir radiofármaco como um radionuclídeo ligado a um componente não radioativo para uso diagnóstico ou terapêutico. Aproximadamente 95% dos radiofármacos são utilizados para diagnóstico, enquanto 5% são de uso terapêutico. Os requisitos para registro, notificação, importação e controle de qualidade dos radiofármacos são definidos pela RDC n. 451/2020 da Anvisa. A) Componente não radiotivo Radiosótopo B) Componente não radiotivo Radiosótopo Figura 108 – Composição do radiofármaco: A) esquema ilustrativo; B) estrutura molecular do radiofármaco fluordesoxiglicose (FDG-18F), como exemplo Adaptada de: https://cutt.ly/CIRvBL8. Acesso em: 19 nov. 2021. 194 Unidade III A regulação dos radiofármacos teve início em 2009, por meio da RDC n. 64/2009 da Anvisa. Essa resolução passou por uma atualização recente, resultando na publicação da RDC n. 263/2019 da Anvisa, que estabelece as diretrizes sobre o registro dos radiofármacos de uso consagrado (BRASIL, 2019d). A escolha de um radiofármaco baseia-se na combinação das características do radionuclídeo e do substrato de marcação. O radionuclídeo ou radioisótopo é um elemento químico que emite radiação cuja escolha depende do tempo de meia-vida, energia emitida e tipo de decaimento (γ, pósitron, β–, por exemplo). O componente não radioativo, por sua vez, deve apresentar distribuição ou localização preferencialmente no órgão ou função fisiológica de interesse do estudo. Os radiofármacos podem ser administrados por via endovenosa, oral, subcutânea ou inalatória, e são distribuídos para tecidos ou órgãos específicos. Na medicina nuclear, o radiofármaco não deve possuir efeito farmacológico, pois o objetivo é a localização. Devemos lembrar que a medicina nuclear estuda a função metabólica e, consequentemente, o órgão não pode sofrer alteração funcional no estudo (HIRONAKA et al., 2012). As substâncias radioativas utilizadas na medicina nuclear estão presentes na forma de fontes seladas e não seladas (MACHADO et al., 2010): • Fontes não seladas: radiofármacos para uso em pacientes e em controle de qualidade. Exemplos: tecnécio-99m, iodo-131, gálio-67, índio-111, lutécio-177, tálio-201, flúor-18 etc. • Fontes seladas: fontes padrão usadas para aferição dos equipamentos. Exemplos: cobalto-57, bário-133, césio-137 e germânio-68. Observação Apesar de existirem fontes seladas no serviço de medicina nuclear, o princípio da formação da imagem nessa área está relacionado com as fontes não seladas, ou seja, os radiofármacos administrados aos pacientes. As fontes seladas são apenas para calibração; suas características não permitem que sejam utilizadas nos pacientes, pois podem causar grandes danos biológicos. Nos exames de cintilografia, são utilizadas pequenas doses de radiação. Alterações somáticas ou danos genéticos ocorrem somente após várias exposições por longo período. Devido aos efeitos da radiação ionizante, radiofármacos não devem ser administrados em mulheres gestantes ou que estão amamentando. Reações alérgicas são raras. Entretanto, os pacientes podem sentir dor no local da injeção (FUNARI et al., 2013). A área que estuda os aspectos químicos, bioquímicos, farmacológicos e fisiológicos das substâncias marcadas com radioisótopos denomina-se radiofarmácia. A radiofarmácia pode ser dividida em industrial, centralizada e hospitalar. Cada área é responsável por uma etapa na produção de radiofármacos até sua forma final. A radiofarmácia hospitalar é a unidade responsável 195 IMAGENOLOGIA por preparação dos radiofármacos, marcação dos reagentes com radioisótopos e fracionamento de doses individuais (FUNARI et al., 2013). Os radioisótopos podem ser naturais ou produzidos artificialmente por meio do bombardeio de partículas para ganhar ou perder massa. Todos os radioisótopos artificiais de uso clínico são produzidos por meio de reações nucleares em reator nuclear ou acelerador de partículas (cíclotron). Os geradores também produzem radioisótopos de interesse clínico, porém dependem de produção de um radioisótopo de meia-vida longa no reator ou no cíclotron. No reator nuclear, a produção de radioisótopos ocorre por fissão nuclear. Resumidamente, no centro do reator, há uma fonte de rádio-berílio, que emite nêutrons naturalmente. Um nêutron se choca com um núcleo de urânio, que, por sua vez, se separa em dois novos núcleos e ejeta mais dois ou três nêutrons, gerando um processo em cadeia. Os principais radioisótopos de interesse para a medicina nuclear produzidos no reator são molibdênio-99 (para gerar tecnécio-99m), iodo-131, samário-153 e lutécio-177. No acelerador de partículas ou cíclotron, íons de hidrogênio (prótons) são acelerados e se chocam com determinados alvos. O bombardeamento de átomos estáveis com partículas carregadas produzirá determinados radioisótopos. Entre eles, podemos citar flúor-18, tálio-201, gálio-67 e iodo-123. O gerador é um sistema prático de produção de radioisótopos, que pode ser utilizado no próprio serviço de medicina nuclear. Baseia-se no decaimento de um radionuclídeo primário de meia-vida longa (“pai”), produzido em um reator ou cíclotron, a um radionuclídeo secundário de meia-vida mais curta (“filho”). Possui as vantagens de ser um sistema pequeno, de fácil transporte, com duração de semanas ou anos. É responsável pela produção de radionuclídeos de meia-vida curta que têm afinidade por fármacos. O produto precisa ser livre de impurezas, estéril e apirogênico para ser usado nos pacientes. O principal gerador utilizado é o de molibdênio-99/tecnécio-99m (99Mo/99mTc), já que o tecnécio é um dos principais radioisótopos utilizados na medicina nuclear. O gerador tem formato de balde, com chumbo em seu interior e um sistema de coluna de troca iônica. O 99Mo possui meia-vida de 67 horas, relativamente longa. Seu decaimento gera 99mTc, de meia-vida curta, de aproximadamente 6 horas. A coluna de troca iônica possui uma extremidade externa para encaixe de um frasco com 6 mL de solução fisiológica de cloreto de sódio e outra extremidade para encaixe de um frasco de coleta a vácuo. Ao encaixar os frascos, a solução de cloreto de sódio passa pela coluna e carrega íons de tecnécio-99m, na forma de pertecnetato de sódio. O 99Mo fica retido na coluna. O frasco de coleta deve ser colocado com blindagem de chumbo apropriada, pois a solução que sai da coluna contém omaterial radioativo (99mTc). Respeitar os horários de eluição garantem maior eficiência no processo de produção (FUNARI et al., 2013; CAMARGO, 2015). 196 Unidade III Blindagem de chumbo para o frasco com 99mTc Solução com 99mTc Blindagem de chumbo do gerador Coluna com 99Mo + 99mTc Solução salina estéril Vácuo Figura 109 – Ilustração do interior do gerador 99Mo/99mTc A maioria dos reagentes, em radiofarmácia hospitalar, são marcados com 99mTc. A marcação de kits deve ser feita de acordo com as instruções da bula, com incubação em condições adequadas de tempo, temperatura, entre outros fatores. Antes de introduzir a solução com 99mTc ao reagente, é importante realizar a assepsia na parte externa do frasco (FUNARI et al., 2013). Nos exames diagnósticos, são utilizados radioisótopos emissores de radiação γ ou β+. Para reduzir a dose de radiação no paciente, os radioisótopos com fins diagnósticos não devem emitir radiação corpuscular. Por outro lado, a radiação em forma de partículas é importante em procedimentos terapêuticos, para eliminar as células danificadas. Assim, são utilizados radioisótopos emissores de partícula β– em terapia, como, por exemplo, o iodo-131. A escolha de um radioisótopo depende de vários fatores, entre eles, as características físico-químicas. Os principais radioisótopos utilizados na medicina nuclear são: • Tecnécio-99m (99mTc): o tecnécio metaestável é um radionuclídeo produzido artificialmente, com propriedade química de formar vários estados de oxidação que possibilitam a formação de complexos de coordenação com uma grande variedade de moléculas inorgânicas e orgânicas. Essa característica permite a marcação de vários reagentes liofilizados (kits) para a realização do diagnóstico de diversas doenças. Possui meia-vida de 6 horas, bastante adequado aos exames. Além disso, emite radiação γ de baixa energia (140 KeV), característica ideal para utilização em gama-câmara. • Gálio-67 (67Ga): possui propriedades biológicas semelhantes ao do íon férrico (Fe3+). Liga-se a transferrina, lactoferrina e transferritina. A ligação do 67Ga com transferrina permite a circulação no sangue e transporte para os demais tecidos. Acumula-se, principalmente, no fígado, no baço, na 197 IMAGENOLOGIA medula óssea e no esqueleto. Pode ser utilizado em estudos infecciosos e processos inflamatórios provavelmente devido à ligação com lactoferrina liberada por leucócitos e substâncias produzidas por microrganismos no local da infecção. Outra aplicação é em estudos oncológicos, porém com foco na avaliação de resposta à terapia para linfomas e alguns outros tumores. Tem sido substituído aos poucos por exames com fluordesoxiglicose (FDG-18F) no PET. No entanto, o PET não está disponível em todos os centros, sendo o 67Ga uma alternativa. Possui meia-vida de 78 horas. É um emissor γ de média energia (93 KeV, 185 KeV, 300 KeV e 394 KeV) cujas imagens são realizadas em gama-câmara (HIRONAKA et al., 2012). • Tálio-201 (201Tl): em imagens cardíacas, vem sendo substituído por novos radiofármacos marcados com 99mTc, porém ainda é utilizado para avaliar a viabilidade miocárdica. O mecanismo de ação caracteriza-se pela penetração na célula através da bomba Na+/K+, devido à semelhança de comportamento com o íon potássio. Em um segmento com perda de função, o tecido viável tem maior captação do 201Tl do que o tecido não viável. Possui meia-vida de 73 horas. É um emissor de radiação γ de baixa energia (135 KeV e 167 KeV) cujas imagens são obtidas em gama-câmara. • Iodo-131 (131I): é produzido em reator na forma de iodeto de sódio (NaI), possui meia-vida de 8 dias e energia de emissão de 364 KeV (alta). Emite partícula β–, adequada à terapia de câncer de tireoide e hipertireoidismo. Devido à emissão γ concomitantemente à β-, imagens podem ser realizadas em gama-câmara para estudos da tireoide, avaliação diagnóstica e tratamento. Pode ser utilizado para marcação de alguns componentes não radioativos, sendo empregado no estudo ou no tratamento de outros tecidos além da glândula tireoide. • Flúor-18 (18F): desde a introdução da molécula fluordesoxiglicose (FDG), em 1977, o radiofármaco FDG-18F tem sido utilizado por mais de quatro décadas para formar imagens no equipamento PET em estudos oncológicos, neurológicos e cardiológicos. É um emissor de β+, produzido por cíclotron, cuja meia-vida é de 110 minutos. 7.5 Proteção radiológica em medicina nuclear Em um serviço de medicina nuclear, é obrigatória a designação de um supervisor de proteção radiológica certificado pela CNEN para monitorar os procedimentos e as ações relacionados à radioproteção. Além disso, um serviço de medicina nuclear necessita de um plano de proteção radiológica com medidas para evitar exposições radioativas desnecessárias. Esse documento deve ser submetido e aprovado pela CNEN para o funcionamento do serviço. As normas da CNEN NN 3.05 estabelecem os requisitos para a instalação física do serviço, que deve conter as seguintes dependências: • sala de espera exclusiva para pacientes que receberam radiofármaco; • sanitário exclusivo para pacientes; • sala de exames; 198 Unidade III • local de conservação de materiais radioativos e fármacos; • laboratório de manipulação de fontes radioativas em uso; • sala específica para armazenamento provisório de rejeitos radioativos; • sala de administração de radiofármacos; • sala exclusiva com espaço individualizado para administração de emissores de pósitrons; • quarto de internação para terapia com doses terapêuticas de iodo-131 com atividade superior a 1.850 MBq (50 mCi), com sanitário privativo. Cada área deve ser classificada em livre, supervisionada e controlada. Na área livre, o risco de exposição deve ser abaixo dos limites de exposição ao público em geral. Na área controlada, medidas específicas de proteção e segurança são necessárias para garantir que as exposições ocupacionais estejam de acordo com os requisitos de limitação de dose e otimização e prevenir ou reduzir a probabilidade dos efeitos adversos. A área supervisionada não requer medidas de proteção específicas, mas deve ser reavaliada regularmente quanto às condições de exposição ocupacional. As áreas controladas devem apresentar o símbolo internacional de radiação ionizante (trifólio na cor magenta com fundo amarelo e contorno preto) e descrição do material ou uso da sala. A sala de exames e a de administração de radiofármacos são exemplos de áreas controladas. Medicina nuclear Sala de exames (gama-câmara) Acesso restrito Área controlada Acesso somente para pessoas autorizadas Figura 110 – Exemplo de sinalização para sala de exames com equipamento gama-câmara Nas áreas supervisionadas e controladas, as dependências devem ter paredes, pisos e teto totalmente impermeáveis, além de cantos das paredes arredondados, para fácil descontaminação. A instalação física deve conter blindagem necessária e suficiente para manter as doses absorvidas dentro dos níveis estabelecidos pela Resolução CNEN NN 3.01. A sala de comando, por exemplo, deve ser protegida por material plumbífero. 199 IMAGENOLOGIA Uma vez que a medicina nuclear depende de fontes não seladas, além do risco de exposição à radiação, há o risco de contaminação. Por isso, os pacientes necessitam de um sanitário exclusivo devido ao material radioativo que é eliminado pela urina. Além disso, o manuseio dos radiofármacos deve ser feito sempre com avental e luvas, inclusive durante a administração ao paciente. O preparo do radiofármaco deve ser sempre realizado no laboratório apropriado, que possui equipamentos como biombo de chumbo e capela própria para manipulação de radioisótopos, com visor de vidro plumbífero. Além disso, as superfícies devem ser forradas com papel absorvente e plástico para evitar contaminação. As fontes seladas para aferição dos equipamentos apresentam apenas o risco de exposição, uma vez que o material radioativo contido no recipiente não pode ser extraído.Dessa forma, são armazenadas dentro de blindagens próprias (MACHADO et al., 2010). Lembrete Você se lembra da diferença entre irradiado e contaminado? Quando não há deposição direta do material radioativo nos objetos, o risco é de exposição, pois o objeto é irradiado. As fontes não seladas são manipuladas e extraídas de frascos, ocorrendo contato direto com objetos, ou seja, há risco de contaminação. Os três princípios básicos de radioproteção (tempo, distância e blindagem) são fundamentais para garantir que as exposições à radiação ionizante sejam mínimas e que o princípio Alara seja respeitado. Caso, você, aluno, decida seguir com atuação nessa área, é fundamental seguir tais princípios. Para reduzir o tempo de exposição, deve-se trabalhar rapidamente de forma eficiente próximo às fontes radioativas. É fundamental planejar a tarefa a ser executada e realizar treinamento adequado. Recomenda-se não perder tempo próximo ao paciente e transmitir as orientações antes de administrar o radiofármaco. A distância maior das fontes pode ser feita por meio do uso de pinças para manusear os frascos com material radioativo. A sala de exames deve ser projetada de forma que o acompanhante possa permanecer a uma distância de 2 metros do paciente no equipamento. Há sistemas automatizados para a injeção de FDG-18F. O pósitron possui alta energia de emissão, com valor de 511 KeV para cada fóton produzido na formação de pares, o que aumenta a exposição dos funcionários. Por isso, foi desenvolvida uma bomba injetora de FDG-18F, para diminuir a exposição dos operadores, que permanecem distantes do paciente durante a injeção (MACHADO et al., 2010; CAMARGO, 2015). O uso de blindagens deve ser feito sempre que possível. O preparo do material radioativo deve ser realizado atrás de biombo de chumbo. Deve-se manter os frascos com radiofármacos marcados dentro de blindagens específicas e manipular o frasco com a eluição do gerador de 99mTc com castelos de chumbo devido à alta atividade. No transporte da dose, deve-se colocar a seringa no transportador e, ao injetar o material, usar o protetor de seringa (MACHADO et al., 2010; CAMARGO, 2015). 200 Unidade III Figura 111 – Transportador de seringa, blindagens de frascos (vermelha, azul e rosa) e castelo (também chamado cânister), ao lado da pinça Disponível em: https://bityli.com/gkWAn. Acesso em: 8 ago. 2021. O avental de chumbo pode ser útil em algumas situações de exposição a isótopos de baixa energia, mas não deve ser utilizado com isótopos de alta energia, como iodo-131 e flúor-18. Você deve estar se perguntando: “por quê? O avental é de chumbo; é uma blindagem que absorve a radiação”. Vamos à explicação: a interação da radiação de alta energia com o material de alto número atômico do avental (chumbo) produz raios X por freamento, contribuindo para o aumento de dose recebida pelo indivíduo. Assim, o uso de avental de chumbo não deve ser feito nas exposições a iodo-131 ou flúor-18. De acordo com a CNEN NE 6.06, rejeito radioativo é qualquer material resultante de atividades com radioisótopos acima do limite de isenção e cuja reutilização é imprópria ou não prevista (BRASIL, 1990). A segregação dos rejeitos radioativos tem início no local em que são produzidos e deve ser feita de acordo com as características físicas, químicas, biológicas e radiológicas. Os rejeitos radioativos devem ser mantidos no interior de dispositivos com blindagem apropriada e identificados com o símbolo de radiação ionizante (trifólio). A classificação dos rejeitos radioativos depende de vários fatores, entre eles (BRASIL, 2013): • Meia-vida: curta ou longa. • Energia de emissão: baixa ou alta. • Tipo de emissão: radiação γ, partícula β–, pósitron etc. • Características físicas: sólido/líquido, compactante ou não, perfurocortante ou não, rouparia etc. • Características biológicas: putrescíveis, patogênicos etc. • Outras características perigosas: inflamabilidade, corrosividade, toxicidade química etc. 201 IMAGENOLOGIA Os rejeitos radioativos devem ser separados dos demais resíduos e os volumes devem apresentar identificação na parte externa, bem como a taxa de dose na superfície. É importante assegurar a minimização do volume e da atividade dos rejeitos radioativos. Devem ser acondicionados e mantidos em quarentena durante o decaimento até atingir níveis seguros, quando poderão ser tratados como resíduos não radioativos. O armazenamento em local provisório deve ser em área cercada e sinalizada, com acesso restrito a pessoal autorizado (BRASIL, 2014). Monitorações periódicas são importantes para assegurar que os procedimentos de proteção radiológica e segurança estão sendo realizados de forma satisfatória. Todo funcionário do setor deve utilizar dosímetro individual, apenas dentro do serviço, durante a jornada de trabalho, e guardá-lo em local adequado ao término. Devem ser realizadas medidas de contaminação de superfície frequentes, ao término da jornada e quando houver suspeita de contaminação. Sempre que medidas acima do normal forem detectadas, seja na área ou do dosímetro individual, uma investigação deve ser feita para adotar medidas de segurança. É fundamental que o serviço disponibilize treinamentos e educação continuada para garantir a segurança da equipe, do público e do ambiente. A) B) Figura 112 – Monitoração de exposição à radiação: A) contador Geiger-Muller para monitoração de área; B) dosímetro de lapela para uso individual Disponível em: A) https://bityli.com/vprKJ; B) https://bityli.com/iOGQq. Acesso em: 8 ago. 2021. Por fim, para garantir a segurança do paciente e minimizar as doses de radiação, é sempre importante verificar o radiofármaco e a atividade prescrita. A atividade radioativa varia conforme o protocolo do exame e as características do paciente, como peso e idade. Assim, antes de administrar o radiofármaco ao paciente, deve-se medir a atividade em um aparelho chamado calibrador de dose ou curiômetro, que consiste em uma câmara de ionização do tipo poço. Ao colocar a seringa no poço cilíndrico do calibrador de dose, deve-se selecionar o tipo de radioisótopo para que a atividade seja exibida em um monitor nas unidades bequerel (Bq) ou curie (Ci). Esse equipamento deve ser calibrado diariamente com fontes de cobalto-57, bário-133 e césio-137. Além de fracionar a dose individual para cada paciente, é importante realizar o posicionamento correto no equipamento para evitar repetição de imagens. 202 Unidade III Figura 113 – Calibrador de dose Disponível em: https://bityli.com/xbIYM. Acesso em: 8 ago. 2021. 7.6 Gama-câmara Em medicina nuclear, a instrumentação envolve uma série de equipamentos que detectam a radiação ionizante produzida pelos radioisótopos. Há equipamentos que captam a radiação sem formação de imagem, como é o caso do calibrador de dose, utilizado para medir a atividade dos radiofármacos, e o contador Geiger-Muller, que detecta radiação no ambiente. Esses aparelhos possuem uma câmara preenchida com gás que ioniza quando exposto à radiação γ ou X. Os equipamentos que formam imagem são a gama-câmara e a PET. Em vez de uma câmara que contém gás, esses equipamentos possuem um cristal sólido como detector que interage com a radiação γ emitida pelo radioisótopo. Essa interação promove um deslocamento de elétrons que resulta em brilho ou cintilação. Por isso, os exames em medicina nuclear são chamados cintilografia. Existem diferenças entre a gama-câmara e a PET. Assim, vamos ver as principais características de cada uma, iniciando pela gama-câmara. Os aparelhos atuais de gama-câmara são baseados no modelo de Hal Anger, de 1960. Possuem uma ou duas cabeças de detecção, gantry, mesa de posicionamento do paciente, console e workstation para reconstruções. 203 IMAGENOLOGIA Cabeças de detecção Mesa de exames Gantry Figura 114 – Componentes de um equipamento gama-câmara Disponível em: https://bityli.com/NOSRP. Acesso em: 8 ago. 2021. Cada cabeça de detecçãopossui três componentes importantes na formação da imagem: • colimadores; • detectores a cintilação, constituídos por cristal sólido; • fotomultiplicadoras. Os colimadores são compostos por chumbo e absorvem os feixes de radiação em ângulos não paralelos às lâminas de chumbo. Consequentemente, apenas os feixes paralelos chegam ao cristal de detecção, o que possibilita identificar a localização do radiofármaco no organismo e diminuir o índice de artefatos nas imagens. A) Paciente Detector Sem colimadores Distribuição do radiofármaco B) Paciente Detector Com colimadores Distribuição do radiofármaco Figura 115 – Esquema ilustrativo da função do colimador na cabeça de detecção: A) a radiação atinge toda a área do detector, danificando a imagem verdadeira; B) o colimador limita o feixe de radiação à localização precisa do radiofármaco no organismo 204 Unidade III Há quatro tipos de colimadores: furo único (pinhole), furos paralelos, furos convergentes e furos divergentes. Os colimadores permanecem em “carrinhos” transportadores e devem ser inseridos nas cabeças de detecção antes do exame. Podem ser trocados conforme o órgão de interesse, protocolo de exame e radioisótopo empregado. O colimador de furos paralelos é o mais utilizado na prática clínica, caracterizado por diferentes energias de emissão: • Colimador de baixa energia: usado para 99mTc (140 KeV). • Colimador de média energia: usado para 67Ga, com vários picos de energia (93, 185, 300 e 395 KeV). • Colimador de alta energia: usado para 131I (364 KeV). A radiação atravessa os colimadores e atinge os detectores. Há vários tipos de cristal de cintilação, mas a gama-câmara possui cristal de iodeto de sódio dopado com tálio, NaI(Tl). O iodeto de sódio sozinho não cintila ao interagir com a radiação γ em temperatura ambiente, mas o tálio nas concentrações de 0,1% a 0,4% funciona como um ativador. Quando os fótons de radiação γ atingem o detector, o cristal é conduzido a um estado de alta energia. As partículas do cristal são excitadas ou ionizadas, ocorrendo um deslocamento de elétrons no interior do cristal. Em seguida, essa energia é liberada na emissão de fótons de luz visível, como brilho ou cintilação. Cada raio γ é transformado em muitos fótons de luz, um fenômeno conhecido como fluorescência. Os fótons de luz produzidos pelo cristal são convertidos em pulsos elétricos por meio de fotomultiplicadoras, que são tubos acoplados ao aparelho. Dentro das fotomultiplicadoras, os fótons são transformados primeiramente em fotoelétrons e, depois, uma série de eletrodos (chamados dínodos) liberam uma quantidade maior de elétrons, amplificando o pulso, conforme representado na figura a seguir. Os pulsos elétricos gerados a partir das fotomultiplicadoras serão processados pelo computador, sendo convertidos para sinal digital e apresentados em imagens. Cristal de cintilação (detector) Fóton de alta energia Fótons de luz visível Elétron primário Elétrons secundários Dínodos Ânodo FotomultiplicadoraEletrodo focalizador Fotocátodo Ionização Figura 116 – Ilustração do acoplamento entre o cristal de cintilação (detector) e o tubo da fotomultiplicadora Adaptada de: https://bityli.com/uvJJx. Acesso em: 8 ago. 2021. 205 IMAGENOLOGIA Há um equipamento de gama-câmara que possui um detector do tipo CZT (cádmio-zinco-telúrio) de alta eficiência na detecção da radiação γ. No entanto, atualmente, os equipamentos com esse tipo de detector foram desenvolvidos apenas para utilização na cardiologia, no exame de cintilografia de perfusão miocárdica. Observação As cabeças de detecção devem permanecer mais próximas possível ao corpo do paciente na região de interesse, para captar a radiação de forma mais precisa e obter boa resolução da imagem. O operador do equipamento (biomédico ou tecnólogo) deve ficar atento a esse detalhe na execução do exame. O computador possui software específico para obter diferentes tipos de imagens, tais como as planares, as dinâmicas e as tridimensionais. Os possíveis métodos de aquisição em gama-câmara são: • Estudos estáticos: formam imagens planares bidimensionais com a cabeça de detecção parada por determinado tempo sobre uma região do corpo para obtenção de um número adequado de contagens de radiação. • Corpo inteiro (varredura): também forma imagens planares bidimensionais, porém a mesa do exame se movimenta para “montar” uma imagem do corpo inteiro. • Estudos dinâmicos: consistem na aquisição de várias imagens planares em pequenos intervalos de tempo para acompanhar a passagem do radiofármaco em determinado sistema ou órgão, como, por exemplo, fluxo sanguíneo, rins, vias biliares e estudo da doença do refluxo gastroesofágico. • Estudos tridimensionais: a técnica para obter imagens tridimensionais e em cortes é a SPECT, como veremos a seguir. 7.7 Tomografia por emissão de fóton único (SPECT) As imagens estáticas, de varredura e dinâmicas são planares e bidimensionais, portanto não mostram a distribuição precisa do radiofármaco nas três dimensões do volume de um órgão. A tomografia, “imagem em cortes”, é um método para aquisição e reconstrução de uma imagem de um fino corte seccional de um objeto. Como se obtém imagens tridimensionais e seccionais em uma gama-câmara? Você se lembra que na TC o arco de detectores realiza uma rotação em torno do paciente, obtendo múltiplas projeções radiográficas? Na medicina nuclear, o processo é semelhante, com a diferença de que a radiação é proveniente do radiofármaco no paciente e o equipamento deverá captar a radiação emitida. A obtenção de múltiplas projeções em uma gama-câmara ocorre pela rotação dos detectores ao redor do paciente. O sistema SPECT consiste em uma gama-câmara com uma ou mais cabeças de detecção acopladas a um gantry. Quando é acionada a aquisição, a cabeça de detecção permanece parada durante alguns segundos (por exemplo, 15 segundos) sobre a região de interesse. Após captar determinado número de 206 Unidade III contagens de radiação, a cabeça gira ao redor do paciente com um pequeno ângulo, por exemplo, 3º. Nessa posição, a cabeça de detecção permanecerá parada com um mesmo intervalo de tempo (15 segundos) para captar a radiação proveniente do paciente e, em seguida, irá girar novamente com mesmo ângulo (3º). Esse processo se repetirá continuamente até que sejam coletados dados de projeções entre 180º e 360º. Os dados coletados são, inicialmente, armazenados em matrizes de 64 × 64 ou 128 × 128 no computador e, posteriormente, são utilizados para reconstrução em uma variedade de planos (axial, coronal, sagital) por meio de algoritmos (cálculos matemáticos). Radiação emitida pelo pacienteRotação Cabeça de detecção Figura 117 – Aquisição SPECT em gama-câmara pela rotação da cabeça de detecção O modo de aquisição por SPECT só foi possível por causa do advento do computador, capaz de processar uma grande quantidade de dados e cálculos em tempo menor, necessários na reconstrução das imagens. O sucesso da TC na década de 1970 foi importantíssimo para o desenvolvimento da SPECT na medicina nuclear, criada por David E. Kuhl e equipe na Universidade da Pensilvânia (UPenn). Observação Na medicina nuclear, a imagem mostrada representa a distribuição do radiofármaco. Áreas de maior concentração são hipercaptantes ou áreas quentes; áreas de menor concentração são hipocaptantes ou áreas frias. É importante notar que a imagem tomográfica da SPECT irá mostrar a distribuição do radiofármaco em cortes ou tridimensional. Como a SPECT é realizada em gama-câmara, os radioisótopos utilizados são emissores de fótons γ simples, como o tecnécio-99m (99mTc). As indicações para realizar a SPECT 207 IMAGENOLOGIA são: cintilografia de perfusão do miocárdio, cintilografia óssea, cintilografia de ventilação e perfusão pulmonar, cintilografia de perfusão cerebral. Na cintilografia de perfusão miocárdica, o estudo tomográfico por SPECT aumenta significativamente a avaliaçãodos territórios de cada artéria coronária. Nesse exame, o paciente recebe um radiofármaco (MIBI-99mTc) que chega às células musculares cardíacas devido à perfusão do órgão. Ao penetrar na célula miocárdica viável, integra-se a mitocôndrias intactas. Caso a célula esteja danificada, o radiofármaco não penetra na célula. O protocolo consiste em realizar duas aquisições, uma em repouso e outra após esforço. Eventos isquêmicos podem ser detectados quando a imagem obtida após esforço apresenta hipocaptação (baixa concentração de radiofármaco) em relação à imagem do repouso, que está normal (com alta concentração de radiofármaco). O defeito é reversível, mas o paciente necessita de tratamento urgente. A figura a seguir mostra as regiões de hipocaptação (em azul e violeta) e hipercaptação (em amarelo) do radiofármaco em um exame de cintilografia de perfusão miocárdica de paciente com isquemia. Observe como as áreas preenchidas na etapa de repouso apresentam-se vazias na etapa de esforço, indicando o evento isquêmico. Esforço Eixo menor Eixo longo vertical Eixo longo horizontal Esforço Esforço Repouso Repouso Repouso Figura 118 – Exame de cintilografia de perfusão miocárdica por SPECT. A imagem mostra um evento isquêmico caracterizado por menor captação de radiofármaco na fase do esforço comparada à do repouso (diminuição do brilho amarelo) Adaptado de: Bontrager e Lampignano (2015, p. 737). 7.8 Tomografia por emissão de pósitrons (PET) Em 1973, Gordon L. Brownell, Michael E. Phelps e colaboradores desenvolveram um novo método de aquisição tomográfica a partir da radiação emitida por emissores de pósitrons (β+), chamado PET. 208 Unidade III A PET é uma especialidade da medicina nuclear que utiliza radioisótopos emissores de pósitrons para formar as imagens. O pósitron é uma partícula β+ que interage rapidamente com elétron, formando dois fótons de 511 KeV cada, emitidos em direções opostas de 180º. Esse processo é denominado aniquilação pósitron-elétron e formação de pares. Observação Os pósitrons não alcançam o detector no aparelho da PET, pois são aniquilados ainda nos tecidos do paciente. São os fótons produzidos pela aniquilação pósitron-elétron que alcançam os detectores do equipamento. Os fótons de alta energia interagem com o cristal cintilador, produzindo fótons de luz visível que, por sua vez, são convertidos em pulsos elétricos por fotomultiplicadoras. O processo de formação do sinal é semelhante ao da gama-câmara, porém a detecção dos fótons deve ser feita simultaneamente em um corte transversal do paciente. Dessa forma, os detectores na PET estão dispostos na forma de anéis dentro do gantry, que possibilita a aquisição dos dados em 360º, simultaneamente. O computador analisa os eventos de coincidência, isto é, a probabilidade de dois fótons detectados em um curto intervalo de tempo serem de um mesmo evento de aniquilação. Por fim, os dados obtidos são processados pelo computador na reconstrução de uma imagem tridimensional e em cortes da distribuição do radiofármaco. Mesa de exames Gantry Figura 119 – Equipamento PET Adaptada de: https://bityli.com/ePBLg. Acesso em: 8 ago. 2021. O radiofármaco mais utilizado nos exames de PET é a FDG-18F. O flúor-18 é um emissor de pósitrons produzido em cíclotron. Assim, o equipamento PET depende da disponibilidade de cíclotrons próximos aos serviços de medicina nuclear. A molécula FDG é um análogo da glicose ligada ao elemento radioativo flúor-18. A FDG-18F é incorporada no interior da célula por transportadores de glicose (GLUTs) presentes 209 IMAGENOLOGIA em células normais e neoplásicas. Uma vez dentro da célula, a molécula FDG-18F é fosforilada, semelhante ao que ocorre com a glicose. A glicose-6-fosfato entra no ciclo de Krebs para produção de energia, mas a FDG-18F fosforilada não é aproveitada energeticamente, permanecendo no interior da célula tempo suficiente para adquirir imagens do corpo inteiro. Assim, esse radiofármaco tem sido aplicado para a detecção do metabolismo glicolítico do órgão ou tecido in vivo (HIRONAKA et al., 2012). Lembrete O tempo de meia-vida do flúor-18 é de 110 minutos, ou seja, cerca de 2 horas, menor que o tempo de meia-vida do 99mTc, que é de aproximadamente 6 horas. Os estudos em PET com FDG-18F possibilitam uma avaliação de parâmetros funcionais e, por isso, possuem amplas aplicações na prática clínica. Grande parte das indicações de exames de PET com FDG-18F é na área da oncologia. A maioria dos tumores apresentam alta captação de FDG-18F devido à alta taxa de proliferação celular e ao aumento na taxa de metabolismo. A distribuição do FDG-18F mostra alta atividade cerebral e miocárdica variável, constituindo um padrão normal devido ao metabolismo glicolítico desses órgãos. Como o radiofármaco apresenta excreção urinária e não é reabsorvido, é comum rins e bexiga apresentarem alta atividade do radiofármaco. Figura 120 – PET com FDG-18F de paciente com linfoma de Hodgkin. O exame de estadiamento de uma paciente de 15 anos de idade mostra várias áreas de hipercaptação no tórax e no pescoço, indicando linfadenopatia neoplásica. Há hipercaptação normal de FDG-18F no cérebro (B, brain), coração (H, heart), rins (K, kidneys) e bexiga (U, urinary bladder) Fonte: Lisle (2012, p. 277). 210 Unidade III Nos estudos neurológicos, é possível avaliar déficits metabólicos glicolíticos em regiões comprometidas por alterações na perfusão. Também é possível identificar aumento de metabolismo glicolítico em tumores do sistema nervoso central e em crises epilépticas. Além disso, na cardiologia, a avaliação com FDG-18F detecta a presença de metabolismo glicolítico no músculo miocárdico hibernado, ou seja, indica a presença de miocárdio viável em área sem perfusão, em risco isquêmico. Observação Devido à avaliação do metabolismo glicolítico, as principais indicações de PET com FDG-18F são: oncologia, neurologia e cardiologia. Portanto há dois métodos tomográficos em medicina nuclear: SPECT e PET. As principais diferenças entre eles são apresentadas no quadro a seguir. Quadro 17 – Diferenças entre SPECT e PET SPECT PET Realizada em gama-câmara Equipamento PET Detectores são planos Detectores dispostos em anel Imagem com menor resolução e menos detalhada Melhor resolução e maior detalhamento Radioisótopos emissores de radiação γ (fóton único) Radioisótopos emissores de pósitron (cada aniquilação gera dois fótons) Tempo de decaimento dos radioisótopos é maior Tempo de decaimento dos radioisótopos emissores de pósitrons é menor (meia-vida mais curta) Equipamento menos caro, com aparelhos mais acessíveis na maioria dos centros médicos. Não necessita de proximidade com cíclotrons Equipamento mais caro e menos acessível, pois necessita de proximidade com cíclotrons, onde são produzidos os radioisótopos emissores de pósitrons 7.9 SPECT/CT e PET/CT As imagens de SPECT e PET são estudos funcionais, isto é, apresentam medidas fisiológicas in vivo, metabolismo celular e perfusão de um órgão ou sistema. Porém a imagem molecular da medicina nuclear apresenta baixa resolução e um esboço anatômico sem detalhamento da morfologia. As técnicas de TC e RM possuem maior resolução espacial e excelente representação anatômica, com menos informação funcional. A sobreposição de imagens funcionais e anatômicas possibilita visualizar a localização das lesões e melhorar o diagnóstico. Assim, foram desenvolvidos métodos para sobrepor as informações funcionais da SPECT e da PET com as informações anatômicas das outras técnicas (HIRONAKA et al., 2012). Uma das possibilidades foi realizar a fusão de imagens em softwares específicos após a aquisição em aparelhos distintos. Por exemplo, o paciente realiza uma TC um dia e, em outro dia, realiza um SPECT. Porém exames realizados em equipamentos separados em momentos diferentes apresentavam grande variação no alinhamento das imagens do paciente (HIRONAKA et al., 2012). 211 IMAGENOLOGIA No finalda década de 1990, surgiram equipamentos híbridos que conseguiram contornar esse problema com a incorporação da TC aos equipamentos da medicina nuclear. O dispositivo do tomógrafo (tubo de raios X e arco de detectores) foi inserido dentro do gantry das gama-câmaras e dos equipamentos PET. Além de melhorar a técnica de fusão e outros parâmetros técnicos na formação da imagem, possibilitam maior conforto para o paciente que realiza dois exames em um único dia. A SPECT/CT combina a gama-câmara e o dispositivo de TC, também conhecido como CT (do inglês, computed tomograghy) em um mesmo equipamento. A unidade de CT é inserida dentro do gantry, enquanto as cabeças de detecção (dispositivo da medicina nuclear) são acopladas na frente do gantry. A mesa de exame é compartilhada por ambas as unidades e o centro de cada exame é separado por uma distância fixa. Lembrete A unidade da CT possui um tubo de raios X e um arco de detectores no lado oposto. A radiação atravessa o corpo do paciente, sendo atenuada de acordo com a densidade dos tecidos. Os equipamentos PET/CT possuem a unidade de detecção do radiofármaco (anel detector) e a unidade de CT no interior do gantry, mas separados por certa distância. A CT está na parte da frente do gantry, enquanto o detector da PET está atrás. Normalmente, a CT é realizada antes e a mesa movimenta-se com o paciente na mesma posição para adquirir as imagens da distribuição do radiofármaco (aquisição pela PET). No final do estudo, portanto, são apresentadas a imagem funcional da PET e a imagem anatômica da CT. A) Cabeças de detecção Unidade da CT dentro do gantry B) Unidade da CT dentro do gantry Detector PET Figura 121 – Equipamentos híbridos: A) gama-câmara com unidade de CT (SPECT/CT); B) equipamento PET com TC (PET/CT) Adaptadas de: A) https://bityli.com/QkXXq; B) https://bityli.com/FNiRn. Acesso em: 8 ago. 2021. 212 Unidade III Ambas as técnicas, SPECT/CT e PET/CT, apresentam a imagem funcional da distribuição do radiofármaco e a imagem anatômica da CT, que são apresentadas separadamente e sobrepostas. O software apresenta ainda as imagens tridimensionais e em cortes (axial, coronal e sagital). Na sobreposição dos cortes, o software aplica uma escala de cores para representar a concentração do radiofármaco nos tecidos, enquanto a imagem da CT apresenta-se em escala de cinzas. Nas imagens de SPECT/CT, a concentração do radiofármaco geralmente é exibida em ordem crescente, com variações de azul, rosa e amarelo; em PET/CT, a coloração varia de vermelho para amarelo. No entanto, essa coloração pode variar a depender do software e do fabricante. Apesar das técnicas de SPECT/CT e PET/CT apresentarem semelhanças quanto às possibilidades de fusão de imagens, não podemos esquecer que a SPECT utiliza radiofármaco emissor de radiação γ, enquanto a PET utiliza radiofármaco emissor de pósitron (β+). Para exemplificar a importância da SPECT, vamos descrever o exame de cintilografia óssea: método mais frequente e sensível para avaliar anormalidades benignas e malignas no esqueleto. É indicada no acompanhamento de pacientes que tiveram câncer de pulmão, próstata e mama, para avaliar metástases ósseas por meio de uma varredura inicial do corpo inteiro. Como a imagem de varredura é planar e bidimensional, a especificidade é limitada nos casos de captação extraóssea do radiofármaco. O radiofármaco mais utilizado para cintilografia óssea é a molécula metileno difosfonato (MDP) marcada com tecnécio-99m. Esse radiofármaco é absorvido na superfície mineral óssea. Locais onde ocorre intensa formação óssea apresentam hipercaptação (alta atividade) de MDP-99mTc. Como o radiofármaco se acumula no esqueleto, a hipercaptação extraóssea representa alterações patológicas. Em casos de hipercaptação extraóssea, a imagem de distribuição do radiofármaco na SPECT não é capaz de mostrar em qual tecido a lesão metastática se estabelece, mas a CT possibilita detectar a localização exata da lesão, por meio da imagem anatômica, em detalhes. Saiba mais A técnica de SPECT/CT possibilita determinar locais de captações extraósseas na cintilografia com MDP-99mTc. Para visualizar diversos casos de cintilografia óssea, sugerimos a leitura do artigo a seguir: SOUNDARARAJAN, R. et al. SPECT-CT for characterization of extraosseous uptake of 99mTc-methylene diphosphonate on bone scintigraphy. Diagn. Interv. Radiol., v. 19, p. 405-410, 2013. Disponível em: https://bityli.com/ZrxJp. Acesso em: 5 nov. 2021. 213 IMAGENOLOGIA 7.10 PET/RM Em 2010, foi aprovado comercialmente o primeiro sistema de PET/RM, que combina as informações funcionais da PET com as imagens da RM, com alto contraste de tecidos moles. Atualmente, há dois sistemas de PET/RM disponíveis comercialmente. A combinação dessas duas unidades foi um desafio para a engenharia, já que o alto campo magnético da RM causava interferência nos detectores da PET. Esse obstáculo foi contornado, porém a validade clínica e as vantagens da PET/RM sobre a PET/CT ainda está em estudo. A técnica de PET/CT é bem consolidada e não apresenta os aspectos de segurança relativos ao uso do alto campo magnético na RM. As possíveis vantagens do uso da PET/RM estão na grande redução de dose de radiação e na perspectiva de melhorar o diagnóstico de tumores de cabeça e pescoço, cérebro, fígado, pelve, musculoesquelético e doenças cardíacas. Além disso, pode trazer avanços nas pesquisas de doenças neurológicas. Atualmente, há poucos equipamentos disponíveis devido ao alto custo. Saiba mais O corregistro da imagem anatômica da RM aliada à informação metabólica de um radiofármaco (PET) consiste em uma ferramenta de grande interesse, principalmente no campo da oncologia e da neurologia, podendo ser empregado em exames de corpo inteiro no mieloma múltiplo e metástases ósseas, no diagnóstico de câncer de cabeça e pescoço, câncer de próstata e adenocarcinoma cervical invasivo e na determinação de padrões neurodegenerativos na doença de Parkinson (VITOR et al., 2017). Para obter mais informações sobre o uso da PET/RM na medicina nuclear, leia o artigo a seguir. VITOR, T. et al. PET/RM: um novo método de imagem híbrida. Principais indicações clínicas e experiência preliminar no Brasil. Einstein, v. 15, n. 1, p. 115-118, 2017. Disponível em: https://bit.ly/3ESmk6F. Acesso em: 5 nov. 2021. 7.11 Protocolos em medicina nuclear Os protocolos em medicina nuclear consistem em um conjunto de parâmetros e procedimentos, tais como: • indicações para realização do exame; • contraindicações (por exemplo, glicemia acima de 180 mg/dL para exames de PET com FDG-18F); 214 Unidade III • preparo (jejum, ausência de estímulos sensórios etc.); • tipo de radiofármaco (reagente liofilizado e radioisótopo); • dose do radiofármaco medida em atividade (Ci ou Bq) ajustada a peso e idade; • vias de administração de radiofármaco (oral, endovenosa, inalatória etc.); • colimador adequado; • tempo de distribuição do radiofármaco; • posicionamento; • modo de aquisição (estático, varredura, dinâmico, SPECT, PET); • matriz, zoom, FOV, ROI; • necessidade da imagem anatômica por TC, a depender do caso; • necessidade de realização de imagem complementar, em alguns casos. O quadro a seguir apresenta os principais exames na medicina nuclear e radiofármacos mais utilizados, com nome científico e abreviatura. Quadro 18 – Principais exames na medicina nuclear e radiofármacos utilizados Exame Radiofármaco Cintilografia da tireoide Iodeto de sódio (131I ou 123I), 99mTc Cintilografia de perfusão miocárdica Sestamibi (MIBI-99mTc) Iodeto de 201Tl Cintilografia de perfusão cerebral Etilenodicisteína dietil éster (ECD-99mTc) Fluordesoxiglicose (FDG-18F) Cintilografia óssea Metileno difosfonato de sódio (MDP-99mTc) Cintilografia renal dinâmica Ácido dietilenotriaminopentacético (DTPA-99mTc) Cintilografia renal estática Ácido dimercaptosuccínico (DMSA-99mTc) Cintilografia para doenças do refluxo gastroesofágicoEnxofre coloidal (99mTc-coloide) ou DTPA-99mTc Cintilografia hepática Ácido fítico (fitato-99mTc) Cintilografia de ventilação e perfusão pulmonar Ventilação com DTPA-99mTc Perfusão com macroagregado de soro albumina humana (MAA-99mTc) Linfocintilografia de membros inferiores Soro albumina humana (SAH-99mTc) Adaptado de: Funari et al. (2013, p. 78). 215 IMAGENOLOGIA A rotina costuma ser dinâmica e envolve o gerenciamento dos exames a serem realizados de acordo com a agenda e os intervalos de tempo entre administração do radiofármaco e a aquisição de imagens. Cada radiofármaco possui um tempo adequado para distribuição aos órgãos-alvo. Cabe ao biomédico e à equipe estarem atentos aos horários e realizar os ajustes necessários. 8 RADIOTERAPIA 8.1 Atribuições do biomédico na radioterapia A radioterapia é uma área de atuação da imagenologia que se destina ao tratamento por meio de radiação ionizante. Essa área combina tecnologia com assistência direta ao paciente, sendo necessária uma equipe multidisciplinar com médico radioncologista, físico médico, enfermeiro, técnico ou tecnólogo em radioterapia ou biomédico, pessoal de apoio técnico e administrativo (BONTRAGER; LAMPIGNANO, 2015; NÓBREGA, 2012d). Na radioterapia, o biomédico poderá atuar como dosimetrista, operador de equipamentos radioterápicos e supervisor técnico em radioterapia. De acordo com o Manual do biomédico (CRBM 1, 2021), cada função recebe atribuições específicas, mas, em geral, é possível atuar nas seguintes atividades: • executar tarefas de simulação, como auxiliar na confecção de imobilizadores e acompanhar pacientes em exames de TC, RM e PET/CT; • participar do controle de qualidade; • operar equipamentos CT-simuladores (tomógrafos); • adquirir imagens antes do tratamento; • realizar processamento da imagem digital e planejamento computadorizado por meio da fusão de imagens para delimitar órgãos internos do paciente; • analisar as imagens junto ao físico médico e radioncologista e realizar a entrega da dose de tratamento; • realizar cálculo de dose de radiação sob supervisão do físico médico e radioncologista; • verificar o posicionamento anatômico do paciente e a entrega de dose de radiação; • atuar no treinamento de equipamentos e softwares radioterápicos em empresas especializadas; • atuar em pesquisa clínica e produção científica; • supervisionar todas as etapas de simulação, aquisição de imagens, posicionamento do paciente, tratamento, controle de qualidade e realizar treinamento da equipe. 216 Unidade III 8.2 Princípio do tratamento Logo após a descoberta dos raios X por Roentgen, no ano de 1895, surgiu a ideia de utilizar a radiação no tratamento de doenças como o câncer. Em 1896, ocorreram os primeiros tratamentos de câncer de mama e de câncer gástrico com o uso da radiação. A partir de 1950, várias técnicas radioterápicas foram desenvolvidas com o objetivo de eliminar tumores de maneira mais eficiente com menor efeito nas células normais vizinhas. A radioterapia é uma especialidade médica que utiliza radiação ionizante de forma controlada e aplicada localmente para destruir células tumorais. É utilizada no tratamento de neoplasias malignas e, em raras exceções, no tratamento de algumas doenças benignas. O tratamento visa erradicar todas as células cancerígenas com o menor dano possível aos tecidos vizinhos e às células normais ao redor do tumor. Após a irradiação, as células normais circunvizinhas sobreviventes são responsáveis pela regeneração do tecido. As finalidades do tratamento radioterápico são as seguintes: • Curativo neoadjuvante: o paciente é submetido à radioterapia antes da cirurgia para diminuir o tumor e melhorar as condições cirúrgicas. • Curativo radical: a radioterapia é a principal forma de tratamento, isolada ou associada à quimioterapia. • Curativo adjuvante: realizada após cirurgia para diminuir a probabilidade de recidivas. • Paliativo: o tratamento é feito para a remissão dos sintomas, como diminuir sangramento, aliviar dores, obstruções e compressões neurológicas; tem por objetivo melhorar a qualidade de vida do paciente. O tratamento radioterápico é indicado para eliminar tumores em diversos tipos de câncer. Além disso, é utilizado como um método paliativo no tratamento de metástases ósseas e cerebrais (MAMEDE, 2019). A radiação utilizada nos tratamentos radioterápicos pode ser eletromagnética (X ou γ) ou corpuscular (β–, por exemplo). Há alguns tipos de radioterapia, mas todas baseiam-se em aplicar um tipo de radiação ionizante que irá interagir com o meio sobre o qual incide. A interação resulta na formação de íons e modificações químicas nas moléculas dos tecidos biológicos irradiados. Como consequência, ocorre inativação das vias de sobrevivência celular e inibição da proliferação, que, por sua vez, desencadeiam a morte celular. Lembrete Os mecanismos dos efeitos biológicos da radiação baseiam-se na formação de radicais livres pela hidrólise da água e alterações nas cadeias de DNA. 217 IMAGENOLOGIA Na radioterapia, o tratamento é realizado de forma que a radiação atinja o maior número de células neoplásicas, causando morte celular. A resposta depende de vários fatores, como radiossensibilidade, oxigenação e localização do tumor. Além disso, depende também do tipo de radiação, da quantidade (dose) e do tempo total de administração. Geralmente, na terapia externa, a dose total administrada é fracionada em doses diárias, de forma a respeitar a tolerância das células normais, para que possam sobreviver e repovoar a região irradiada (CAMARGO, 2015). 8.3 Radiossensibilidade e radiocurabilidade Há dois conceitos importantes na radioterapia: radiossensibilidade e radiocurabilidade. Como visto anteriormente, a radiossensibilidade celular está associada ao grau de diferenciação celular e à taxa de proliferação. Lembrete A lei de Tribondeau e Bergonier estabelece que quanto maior a taxa de proliferação e menor a diferenciação celular, maior a radiossensibilidade. Quanto menor a taxa de proliferação e maior a diferenciação celular (célula mais especializada), maior a resistência à radiação. Além da diferenciação celular e da atividade mitótica, a oxigenação também interfere na resposta do tumor à radiação. Quanto maior a oxigenação, maior a probabilidade da ocorrência de danos celulares. A radiocurabilidade, por sua vez, está relacionada à probabilidade real de controlar o tumor devido às diferenças de radiossensibilidade entre as células tumorais e o tecido normal ao redor. Além disso, considera também a capacidade de regeneração dos tecidos normais circunjacentes ao tumor. Assim, a radiocurabilidade é atingida quando a dose de radiação aplicada elimina as células tumorais sem ultrapassar a tolerância dos tecidos normais em volta. Em geral, a maioria dos tumores radiossensíveis apresenta boa radiocurabilidade, mas essa relação nem sempre é bem determinada. Há tumores que desaparecem rapidamente e apresentam uma aparente resposta completa, porém voltam a repovoar e se disseminar. Além disso, há casos em que a localização do tumor é muito próxima a estruturas vitais de alta radiossensibilidade, impossibilitando a entrega de doses capazes de eliminar o tumor. 8.4 Teleterapia Atualmente, há dois tipos de radioterapia: a teleterapia e a braquiterapia. Na teleterapia, a fonte de radiação é externa ao paciente, ou seja, o aparelho e a fonte de radiação não entram em contato direto com o paciente. Assim, a radiação pode atingir órgãos e tecidos normais na trajetória até o tumor. 218 Unidade III Logo após a descoberta dos raios X, surgiram os primeiros equipamentos de teleterapia, mas foi a partir da década de 1930 que surgiram aparelhos para tratar tumores profundos, com energia na ordem de kV. A partir da década de 1950, surgiram equipamentos com faixa de energia maior, na ordem de megaeletronvolts (MeV), como os aparelhos de cobalto-60 e os aceleradores lineares. Há, basicamente, três tiposde aparelhos: ortovoltagem, telecobalto e aceleradores lineares. 8.4.1 Ortovoltagem Esses aparelhos produzem raios X de baixa energia para tratamento superficial. Dentro do aparelho, há dois eletrodos que formam um campo elétrico para aceleração dos elétrons. O choque dos elétrons com o alvo (ânodo) produz raios X. Os equipamentos operam com energia na ordem de quilovolts (de 100 kV a 250 kV), indicado para tratar lesões de pele com até 3 cm de profundidade e prevenção de hemangiomas, queloides e carcinomas basocelulares. Esse tipo de equipamento vem sendo substituído pela eletroterapia, que utiliza aceleradores lineares. 8.4.2 Telecobalto Também chamado cobalto-60, utiliza essa fonte de radiação γ para tratamento. A aparência é similar aos aceleradores lineares, porém a fonte de radiação é uma pastilha de cobalto-60 (60Co), uma substância radioativa com meia-vida de 5 anos. A pastilha emite radiação continuamente e, portanto, permanece dentro de uma cápsula blindada com chumbo na extremidade do braço do aparelho. Quando a cápsula é aberta, a radiação é emitida em direção ao paciente, posicionado em uma mesa. Há aparelhos emissores de radiação γ que utilizam fonte de césio-137 (137Cs) com meia-vida de 30 anos, porém estão entrando em desuso. 8.4.3 Aceleradores lineares Os aceleradores lineares têm funcionamento semelhante aos de ortovoltagem, porém o mecanismo de aceleração é outro, baseado na utilização de micro-ondas. Esse tipo de mecanismo permite que os elétrons sejam acelerados a grandes velocidades e, como consequência, há geração de raios X com maior energia, na faixa de MeVs. A energia dos fótons X produzidos nos aceleradores lineares é maior do que a dos fótons γ produzidos por cobalto-60. Os fótons de raios X são produzidos pela colisão de elétrons com um alvo metálico. Em alguns aceleradores, é possível retirar o alvo e direcionar o feixe de elétrons diretamente ao paciente, tratamento conhecido como eletroterapia. Esse tipo de terapia é indicada para órgãos superficiais com estruturas radiossensíveis ao redor, já que os elétrons possuem baixo poder de penetração nos tecidos biológicos, minimizando os efeitos nas estruturas vizinhas à lesão. Os aparelhos possuem um gantry capaz de girar em volta do paciente e aplicar o feixe de radiação em diversas direções. O braço do gantry contém a fonte de radiação a ser emitida. O paciente é posicionado sobre a mesa de exames com diversos acessórios de posicionamento para garantir a imobilização durante o tratamento. 219 IMAGENOLOGIA Figura 122 – Acelerador linear Disponível em: https://bityli.com/USFOt. Acesso em: 18 nov. 2021. 8.4.4 Fracionamento de doses Você pode estar se perguntando: “mas na teleterapia, então, para que a radiação atinja o tumor, ela atravessa os tecidos normais. Estes não sofrem os efeitos da radiação?” A resposta é sim. A radiação ionizante utilizada na radioterapia afeta todos os tecidos biológicos irradiados em graus variados. Os efeitos dependem da localização e do volume do tumor, bem como da dose total absorvida. Durante o tratamento, é fundamental que os tecidos normais se recuperem enquanto o tecido tumoral é eliminado. Assim, o fracionamento de doses permite a recuperação do tecido normal. O fracionamento é determinado individualmente, para cada tipo de tumor, por meio de fórmulas matemáticas que permitem o cálculo de dose total, número de frações, tempo entre doses e período total de tratamento. Geralmente, são utilizadas frações de 1,5 Gray a 3 Gray (Gy) diariamente por várias semanas. Quando a tolerância dos tecidos normais irradiados é ultrapassada, pode ocorrer a formação de fibroses, atrofias, danos genéticos e desenvolvimento de novos tumores malignos. No entanto, com as técnicas atuais de tratamento, cada vez mais aprimoradas, esses efeitos tardios nos tecidos normais são raramente observados. Já os efeitos imediatos, como leucopenia, plaquetopenia, azoospermia, entre outros, são reversíveis e bem tolerados (CAMARGO, 2015). 8.4.5 Simulação e acessórios de posicionamento O tratamento é baseado no exame clínico e em imagens obtidas por radiografia, TC, RM, PET/CT, entre outras técnicas. 220 Unidade III Antes de aplicar a dose de radiação, são feitos a simulação e o planejamento, que possibilitam escolher a área e o volume de tratamento, a técnica de tratamento (distância foco-superfície, isocentro, número de campos, entre outros), a energia do feixe de radiação, o posicionamento do paciente, os acessórios, entre outros fatores. O objetivo da simulação é obter imagens do tumor e da área a ser irradiada para planejar o tratamento (NÓBREGA, 2012d). Durante a aplicação das doses, o paciente deverá permanecer imóvel para que a região irradiada seja a mais semelhante possível ao planejamento computadorizado, evitando a irradiação de tecidos normais vizinhos ao tumor. O posicionamento do paciente deve ser o mesmo nas etapas de simulação e de liberação de doses. Dessa forma, a simulação é uma etapa importante para assegurar a imobilização e o conforto do paciente antes e durante a aplicação da radiação. Há uma grande quantidade de acessórios e coxins que podem ser utilizados, de diversas marcas e fabricantes: suporte de cabeça e pescoço, máscara termoplástica, travesseiro, base em T, rampa de mama, extensor de ombro, triângulo de apoio (suporte de pernas, sob os joelhos), colchões de espuma, imobilizador a vácuo, entre outros. Os acessórios devem ser rígidos, de fácil manipulação e ter capacidade de se moldar ao contorno do paciente. O material pode variar, mas, em geral, pode ser isopor, plástico ou espuma (CAMARGO, 2015). Com o posicionamento adequado, é possível marcar a região a ser tratada. Além de assegurar a imobilização e o conforto do paciente, os imobilizadores devem garantir a reprodutibilidade do posicionamento na aplicação das doses. A figura a seguir apresenta um acessório de posicionamento. Figura 123 – Máscara termoplástica para imobilização da cabeça Disponível em: https://bit.ly/3q5LfiJ. Acesso em: 17 ago. 2021. 221 IMAGENOLOGIA Após a simulação, é feito o cálculo de dose e das frações em um sistema computadorizado. Em seguida, o cálculo de dose é conferido pelo físico médico e pelo radioterapeuta. Somente após a simulação, o planejamento e a conferência, o tratamento no aparelho será iniciado. É importante que o paciente se mantenha imóvel e com a região a ser irradiada descoberta. Apesar de permanecer sozinho na sala de tratamento, o paciente é observado pelo operador de radioterapia na sala de comando (CAMARGO, 2015). 8.4.6 Blocos e colimadores O tratamento radioterápico é planejado de forma individual, dependendo da localização, da área e do volume tumoral. Além disso, deve evitar a irradiação de estruturas anatômicas de risco ao redor do tumor. Para delimitar o feixe de radiação à área tumoral, o médico radioterapeuta e o físico médico são responsáveis por delinear a área de tratamento, ou seja, o formato do feixe de radiação. Nos equipamentos convencionais, utilizam-se blocos de chumbo ou cerrobend acoplados ao simulador para absorver a radiação e delimitar o tamanho do feixe. Os blocos de chumbo têm entrado em desuso devido ao alto ponto de fusão (327 oC) e substituídos por cerrobend, cujo ponto de fusão é 70 oC. O cerrobend é uma liga metálica composta por bismuto, chumbo, estanho e cádmio. Esses blocos são utilizados na simulação e também no aparelho de radioterapia (por exemplo, um acelerador linear) para a aplicação das doses. A maioria dos aceleradores lineares possui outro tipo de limitador de feixe chamado colimador multilâminas (MLC, do inglês, multileaf colimator), que são lâminas com 1 cm de espessura inseridas no gantry do equipamento. As lâminas se movem independentemente conforme a área de tratamento programada pelo computador (NÓBREGA, 2012d). Figura 124 – Colimador (MLC) Disponível em: https://bityli.com/MacDj. Acesso em: 22 ago. 2021. 222 Unidade III 8.4.7 Definiçãode volumes e técnicas de tratamento Em radioterapia, a área de tratamento (volume) a ser tratada é definida pelo protocolo ICRU 62 (International Comission on Radiation Units and Mesaurements), que propõe os delineamentos de volume com utilização de margens de segurança ao redor do volume-alvo. O médico radioterapeuta define o volume de tratamento e, para tanto, utiliza-se das seguintes definições: • Volume do tumor bruto (em inglês, gross tumor volume – GTV): é o volume do tumor palpável e clinicamente visível nos estudos de imagem como TC e RM. Corresponde à área de maior concentração de células tumorais. • Volume tumoral clínico (em inglês, clinical tumor volume – CTV): inclui GTV acrescido da doença subclínica no campo de radiação. • Volume tumoral planejado (em inglês, planning target volume – PTV): é o volume de tratamento, que inclui CTV e margens de incertezas geométricas causadas por erros de programação e movimentação dos órgãos. PTV CTV GTV Figura 125 – Esquema ilustrativo da definição de volumes considerados no planejamento radioterápico Um dos parâmetros considerados na técnica de tratamento que pode influenciar na dose de radiação dos tecidos é a determinação do número de campos de irradiação. Podem ser utilizados os seguintes arranjos: campo único, linear (três campos), três campos (em formato de Y ou T) ou quatro campos (em forma de X). A determinação do número e do arranjo de campos de tratamento visam diminuir a dose de radiação aos tecidos sadios vizinhos e, principalmente, para órgãos de risco. Os órgãos de risco são tecidos normais cuja radiossensibilidade pode influenciar no planejamento radioterápico. 223 IMAGENOLOGIA Saiba mais No tratamento de câncer de esôfago, os principais órgãos de risco são coração, pulmões e medula espinal. A escolha da técnica de tratamento influencia na dose de radiação recebida por esses órgãos. Para saber mais sobre o assunto, sugerimos a leitura do artigo a seguir, que exemplifica a escolha de campos no tratamento de tumores de esôfago: JUSTINO, P. B. J. et al. Planejamento tridimensional para radioterapia de tumores de esôfago: comparação de técnicas de tratamento e análise de probabilidade de complicações. Radiologia Brasileira, v. 36, n. 3, p. 157-162, 2003. Disponível em: https://bit.ly/3mVdezH. Acesso em: 8 nov. 2021. 8.4.8 Planejamento O planejamento depende do tipo de simulador e técnica de imagem utilizada para delineamento do tratamento. Quando se utiliza radiografias, o planejamento é denominado convencional bidimensional (2D). Os campos de irradiação são desenhados sobre as radiografias, com possibilidade de arranjos mais simples. Por outro lado, devido à melhor resolução espacial e de contraste nas imagens obtidas por TC e RM, a avaliação do volume tumoral e das estruturas vizinhas por essas técnicas possibilita uma localização mais precisa, além de permitir arranjos de campos mais complexos e melhor avaliação de distribuição de dose. Assim, foram desenvolvidos aparelhos tomógrafos específicos para a etapa de simulação na radioterapia, chamados simuladores-TC. O simulador-TC possui maior abertura no gantry e mesa plana similar ao aparelho de radioterapia, aproximando as condições de simulação do tratamento. As imagens obtidas pelo simulador-TC são enviadas para o sistema e utilizadas no planejamento para definição de volumes, campos e cálculo de dose (NÓBREGA, 2012d). O planejamento feito a partir das imagens de TC é denominado radioterapia conformacional tridimensional (3D) ou 3D-CRT (em inglês, 3D-conformal radiation therapy). A radioterapia de intensidade modulada (em inglês, intensity modulated radiation therapy – IMRT) é uma técnica em que o computador controla a modulação na fluência do feixe de fótons para determinado PTV durante o tratamento. Ocorre uma variação na intensidade do feixe no campo de tratamento. Dessa forma, a distribuição de dose de radiação é irregular, mas acompanha o volume tumoral e evita a exposição de órgãos críticos como a medula espinal. Assim, a técnica IMRT possui maior precisão na distribuição de dose, diminuindo a irradiação de tecidos sadios vizinhos. Essa técnica é realizada apenas em aceleradores lineares MLC e depende de diversas ferramentas próprias para sua execução. Por esse motivo, esse equipamento não está disposto na maioria das clínicas (CAMARGO, 2015; NÓBREGA, 2012d). 224 Unidade III Na técnica IMRT, as lâminas do MLC se movem durante a irradiação da área tumoral em determinado campo, com o gantry estático. Porém a IMRT apresenta um número limitado de ângulos do gantry. Recentemente, foi introduzida nos aceleradores lineares uma variação da IMRT com arcos dinâmicos, conhecida como arcoterapia volumétrica modulada (do inglês, volumetric modulated arc therapy – VMAT). Essa técnica depende de um software chamado RapidArc, que controla o MLC enquanto o gantry rotaciona ao redor do paciente. Assim, o campo de tratamento é modificado simultaneamente com a rotação do gantry. O procedimento é similar à IMRT, mas o gantry não permanece estático durante a movimentação das lâminas do colimador. Como resultado, há diminuição de exposição à radiação para o paciente e menor tempo de tratamento para cada seção. A radioterapia guiada por imagem (em inglês, image-guided radiation therapy – IGRT) é uma técnica em que as imagens são feitas logo antes da entrega da fração de dose. O aparelho possui um dispositivo que produz imagens em tempo real, durante o tratamento. As imagens em tempo real são comparadas com as imagens do planejamento por sobreposição no programa do computador, que calcula os valores de deslocamento. Dessa forma, essa tecnologia permite identificar e corrigir problemas nas variações da programação e movimentação do paciente durante a aplicação das doses. É importante observar que as técnicas mais modernas de teleterapia utilizam acessórios específicos com o objetivo de melhorar a reprodutibilidade e diminuir as margens de incerteza do volume de tratamento. 8.5 Braquiterapia A braquiterapia (do grego, braqui, que significa “curto”), também chamada radioterapia interna, é um método terapêutico que consiste na irradiação de tumores por meio de fontes radioativas seladas em cateteres ou sementes colocadas próximo ao volume alvo (BASKAR et al., 2012). A radiação ionizante emitida pelo radioisótopo deposita sua energia no local da neoplasia, levando as células à morte (CALCINA et al., 2001). A utilização da braquiterapia teve início pouco depois da descoberta do elemento rádio-226, no final da década de 1890, por Pierre e Marie Curie. No início do século XX, esse radioisótopo foi testado para tratar lesões na pele e demonstrou seu potencial para tratar neoplasias (NATH et al., 1997). Os avanços tecnológicos de maior impacto na braquiterapia foram a introdução de radionuclídeos artificiais, a implantação de fontes por afterloading e o planejamento computadorizado para a avaliação de dose de radiação (THOMADSEN et al., 2008). Embora não seja a modalidade de radioterapia dominante, continua tendo um papel importante no tratamento do câncer (WILLIAMSON, 2006). Os radioisótopos em fontes seladas podem ser colocados em moldes na superfície da pele (superficial), no interior de cavidades naturais do corpo (intracavitária) ou inseridas diretamente no próprio tumor (intersticial). As fontes mais utilizadas são fios removíveis de irídio-192, e sementes de iodo-125 e de ouro-198. Em geral, são utilizados emissores de radiação γ e β–. No Brasil, algumas regiões ainda utilizam a técnica de inserção manual com fontes de césio-137, rádio e cobalto-60. A inserção manual tem 225 IMAGENOLOGIA sido amplamente substituída por sistemas automatizados do tipo afterloading, que consistem em posicionar, primeiramente, os aplicadores em cavidades ou perto do local de tratamento e, em seguida, inserir as fontes. Quando o paciente é posicionado com os aplicadores, o aparelho é acionado para liberar a fonte,
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