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RICARDO C. ALVES FERREIRA METODOLOGIA DO ENSINO DE FUTEBOL E FUTSAL Tanto o futebol quanto o futsal têm forte apelo na sociedade brasileira e possuem vínculos com aspectos culturais. Poucas manifestações artísticas e esportivas representam tão bem a cultura brasileira como esses esportes, que possuem estilos próprios e personificam o estereótipo do brasileiro. Com o tempo, eles evoluíram e ganharam proporção de espetáculo, movimentando muito dinheiro e interesses às vezes escusos, mas, mesmo assim, sem perderem sua força de encantamento junto aos jovens e às crianças. Nesta obra, são levantadas questões importantes para o desenvolvimento do jovem nessas modalidades, como aspectos pedagógicos e metodológicos aplicados ao futebol e ao futsal, abordando os meios de potencializar a aprendizagem técnica, tática, física e psicológica, além de apresentar as particularidades do processo de crescimento e maturação, as regras, as leis e os direitos que regem os esportes. Tudo isso sem se desconectar de uma visão holística, pautada no entendimento de que o futebol e o futsal são construídos sob relações humanas e aliados à força atrativa que o esporte tem para ser utilizado como ferramenta de educação e de construção de valores de cidadania. O objetivo desta obra é oferecer informações e induzir reflexões para que o leitor consiga, por meio do senso crítico, encontrar soluções para os diversos desafios que emergirem durante sua caminhada como educador-treinador. Código Logístico 59520 Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-6667-4 9 7 8 8 5 3 8 7 6 6 6 7 4 Metodologia do ensino de futebol e futsal Ricardo C. Alves Ferreira IESDE BRASIL 2020 © 2020 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: EnvatoElements Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ F443m Ferreira, Ricardo C. Alves Metodologia do ensino de futebol e futsal / Ricardo C. Alves Ferreira. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2020. 128p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-6667-4 1. Futebol - Esporte. 2. Futsal - Esporte. 3. Educação física - Estudo e ensino. 4. Professores de educação física - Formação. 5. Prática de ensino. I. Título.. 20-64482 CDD: 796.3348071 CDU: 796.33(07) Ricardo C. Alves Ferreira Doutorando em Ciências do Movimento Humano pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Mestre em Engenharia Biomédica, com foco em fisiologia do exercício, e graduado em Educação Física pela Universidade do Vale do Paraíba (Univap). Professor no ensino superior, ministrando as disciplinas de Futebol e Futsal, Aprendizagem e Desenvolvimento Motor, Fisiologia do Exercício, Biomecânica e Educação Física Adaptada e Atividade Física em Condições Especiais. É preparador físico e fisiologista em equipes de futebol profissional, com experiência no Brasil e no exterior. SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! 1 A história do futebol e do futsal 9 1.1 Origem e evolução do futebol 10 1.2 Futebol no mundo 12 1.3 Futebol no Brasil 16 1.4 Aspectos socioculturais 19 1.5 Origem e evolução do futsal 20 2 O ensino de futebol e de futsal 24 2.1 Reflexões acerca da formação do professor 25 2.2 Ambiente de aprendizagem 27 2.3 Métodos de ensino 29 2.4 Abordagens pedagógicas 32 2.5 Pedagogia dos jogos 35 2.6 Iniciação esportiva e capacidades motoras 37 3 Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 41 3.1 Passe 42 3.2 Domínio 43 3.3 Condução 44 3.4 Drible 45 3.5 Chute 46 3.6 Cabeceio 48 3.7 Ações do goleiro 49 3.8 Relação jogador-bola 50 4 Princípios táticos do jogo 53 4.1 Modelo de jogo 54 4.2 Momentos do jogo 55 4.3 Princípios de jogo 58 4.4 Funções e posições no futebol 60 4.5 Sistemas táticos no futebol 61 4.6 Funções e posições no futsal 63 4.7 Sistemas táticos no futsal 64 5 Fisiologia e preparação física 69 5.1 Demandas fisiológicas 70 5.2 Treinamento do jovem 76 5.3 Jogos condicionantes 81 5.4 Avaliações físicas e controle de treinamento 83 6 A regra do jogo 89 6.1 Regras do futebol 89 6.2 Adaptações para categorias de base no futebol 97 6.3 Regras do futsal 99 6.4 Adaptações para categorias de base no futsal 103 7 Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 106 7.1 Papel do professor 107 7.2 Currículo de formação 110 7.3 Entendendo o contexto escolar 117 7.4 Planejando a aula 118 7.5 Futebol e futsal como ferramentas de desenvolvimento humano 122 Gabarito 125 Tanto o futebol quanto o futsal têm forte apelo na sociedade brasileira e possuem vínculos com aspectos culturais. Poucas manifestações artísticas e esportivas representam tão bem a cultura brasileira como esses esportes, que possuem estilos próprios e personificam o estereótipo do brasileiro. Com o tempo, eles evoluíram e ganharam proporção de espetáculo, movimentando muito dinheiro e interesses às vezes escusos, mas, mesmo assim, sem perderem sua força de encantamento junto aos jovens e às crianças. A sociedade também se modificou. As grandes áreas e o espaço fértil para a brincadeira informal perderam lugar para a urbanização, e o futebol aprendido em ruas, campinhos e vielas agora passa a ser responsabilidade de professores em escolinhas e outros ambientes formais. Nesta obra, são levantadas questões importantes para o desenvolvimento do jovem nas modalidades, como aspectos pedagógicos e metodológicos aplicados ao futebol e ao futsal, abordando os meios de potencializar a aprendizagem técnica, tática, física e psicológica, além de apresentar as particularidades do processo de crescimento e maturação, as regras, as leis e os direitos que regem os esportes. Tudo isso sem se desconectar de uma visão holística, pautada no entendimento de que o futebol e o futsal são construídos sob relações humanas e aliados à força atrativa que o esporte tem para ser utilizado como ferramenta de educação e de construção de valores de cidadania. O objetivo desta obra é oferecer informações e induzir reflexões para que você consiga, por meio do senso crítico, encontrar soluções para os diversos desafios que emergirem durante sua caminhada como educador-treinador. Bons estudos. APRESENTAÇÃO A história do futebol e do futsal 9 1 A história do futebol e do futsal O futebol é, sem dúvida, um dos esportes mais praticados no mundo. Os números contabilizam algo em torno de 265 milhões de pessoas o praticando em todo o planeta – além dos adeptos, torcedores e admiradores mundo afora. Muito mais do que so- mente uma mera atividade esportiva, esse esporte se tornou um fenômeno global que influencia costumes e hábitos. No Brasil, o futebol e o futsal invadem a vida cotidiana das pessoas, o que o aproxima muito mais de um conceito de dimensão cultural. Para perguntas como “o que você vai ser quando crescer?”, nãoé difícil escutar a resposta: “quero ser jogador(a) de futebol”. Já reparou que usamos metáforas futebolísticas em nossas con- versas quase a todo momento? Quando algo nos agrada, foi “show de bola”, se alguém foi desprezado, foi colocado “para escanteio”, a quase conquista de um objetivo significa que “bateu na trave”. Tanta influência na vida das pessoas já justificaria tal curiosida- de em entender melhor esse fenômeno e como atingiu tamanha magnitude. Mas compreender a importância dele como elemento e parte integrante de uma sociedade é um dos papéis do educa- dor, já que um esporte com tanta força e relevância pode ser uti- lizado como ferramenta de educação, proporcionando inclusão social, oportunidades, acesso à informação e assistencialismo. De fato, não é só futebol, caso seja um apreciador da modali- dade, você pode, de repente, ter várias informações a respeito do futebol moderno, mas você sabe como esse esporte começou? A partir de agora te convidamos a uma viagem na história pelas lentes do futebol. 1.1 Origem e evolução do futebol Vídeo O esporte que conhecemos por futebol teve origem e se desenvol- veu na Inglaterra no século XIV, porém versões alternativas do jogo podem ter existido muito antes, em locais distintos e distantes. As in- formações sobre esses jogos com bola, ancestrais do futebol, são im- precisas, mas eles existiram e são considerados parte fundamental da história do esporte. Há grandes indícios de que o futebol tenha surgido na China, e evidências levam os historiadores a crer que um jogo praticado com gestos técnicos semelhantes ao que vemos no futebol de hoje era praticado durante a dinastia Han, cerca de dois séculos a.C. Em um espaço determinado e com gols nas duas extremidades, além de uma espécie de rede presa a dois postes de bambu, os chineses chutavam um objeto esférico feito de couro recheado com pele ou penas. Esse jogo era chamado de cuju, que significa chutar bola. A prática era comumente usada para treinamento militar (KITCHING, 2015, GOLDBLATT, 2007). Alguns fatos também apontam para o Japão, mais precisamente em Kyoto, durante o período Asuka (500-700 a.C.). Os japoneses pratica- vam um jogo conhecido como Kemari, que tinha algo ritualístico e ceri- monial em seu conceito, e a ideia básica era chutar a bola para cima, fazendo com que os demais participantes precisassem golpeá-la sem- pre para o alto. Os povos romanos também praticavam jogos envolvendo diferentes tipos de bolas, por exemplo, um jogo chamado harpastum. Acredita-se que este possa ter sido adotado e adaptado de um jogo grego chamado episkyros, após o domínio Romano. Esses jogos, em particular, também são muito similares ao rúgbi, mas, ainda assim, eles representam formas ancestrais do futebol e, como o cuju na China, o harpastum parece estar bastante associado a treinamento e preparação militar. Stray Toki/Shutterstock Figura 1 Representação do Kemari em evento folclórico no Japão 10 Metodologia do ensino de futebol e futsal https://academic.oup.com/hwj/search-results?f_Authors=Gavin+Kitching A história do futebol e do futsal 11 A prática de golpear uma bola parece atrair o ser humano há muito tempo. Jogos contendo bolas estão presentes em quase todas as culturas antigas ao redor do mundo. Exemplos ocorrem nas velhas culturas mesoamericanas há mais de três mil anos, de acordo com achados transcritos em rochas. É interessante o fato de que esses povos tinham uma exclusividade na característica do jogo: a bola quicava. Isso ocorria porque somente eles tinham a borracha, típica das florestas indígenas tropicais. O jogo tinha algo de ritual religioso e místico, fragmentos arqueo- lógicos mostram que locais próprios para abrigar espectadores eram construídos, com uma espécie de arquibancada de pedras. A bola de borracha variava de tamanho, era movida entre uma linha central e golpeada por dois oponentes ou dois times que se utilizavam dos ombros, das canelas, dos quadris e das nádegas. Há vestígios de variações desses jogos mesoamericanos e imprecisões quanto aos rituais de sacrifício associados a eles, mas é possível, ainda, observar jogos muito similares nas culturas indígenas atuais (KITCHING, 2015; GOLDBLATT, 2007). 1.1.1 Futebol na Idade Média Por volta do século IX, pessoas chutavam bolas feitas de bexiga de porco nas ruas como forma de diversão. Alguns séculos depois, joga- dores possuíam algo mais similar a uma bola e o esporte era pratica- do em áreas abertas de grande escala, como grandes áreas verdes ou em estradas. Entretanto, não havia nenhuma regra, eram permitidos, então, empurrões, socos e pontapés, e parte do jogo era extrema- mente rude e violento. Com um número incontável de jogadores que tentavam chegar a determinadas áreas carregando a bola, frequente- mente as partidas eram disputadas entre duas cidades ou vilas, com o objetivo de chegar aos limites da cidade – alternativamente, o jogo poderia ser dividido entre idade ou casados e solteiros. Um jogo pa- recido chamado La Soule era, também, praticado aproximadamente nesse período e parece ter se disseminado na França. Eventualmente, o jogo ficava extremamente violento, o que o tornava alvo de críticas. O Rei Edward III baniu o jogo em 1365 devido à sua extre- ma violência e o Rei James I da Escócia o proibiu em 1424. https://academic.oup.com/hwj/search-results?f_Authors=Gavin+Kitching Um outro exemplo de jogo similar, praticado fora das áreas anglo-saxônicas e célticas, também con- siderado como precursor do futebol, é o Gioco del Calcio. Era praticado no período medieval e início da era moderna em Florença, na Itália, até quase desa- parecer – possivelmente banido na metade do século XVIII. Hoje, sobrevive somente como espetáculo para turistas. As regras desse jogo foram publicadas por Giovanni Bardi, em 1580. 1.2 Futebol no mundo Vídeo O século XIX pode ser considerado um marco importante para o futebol, já que a prática do jogo de bola já era bastante popular por ser um modo comum de diversão entre o povo. Entretanto, era, de certa maneira, discriminado pela aristocracia que, até então, preferia o crí- quete e o jóquei. Apesar da disseminação da prática, uma característica ainda permanecia: a falta de padronização do modo de jogar. Por um longo período, não era clara a distinção entre futebol e rúgbi, havendo muitas variações relacionadas ao tamanho da bola, ao número de joga- dores por equipe, à dimensão do campo e ao tempo de duração. O jogo era frequentemente praticado em escolas, as mais tradicio- nais eram a Rugby e a Eton. Na Escola Rugby, por exemplo, as regras permitiam segurar e correr com a bola nas mãos, dando origem ao rú- gbi que conhecemos hoje. Na Eton, em contrapartida, a bola era gol- peada com os pés; assim, o jogo praticado nessa escola era chamado de the dribbling game, ou seja, o jogo de driblar. Enquanto o da Rugby era chamado de the running game, traduzido como o jogo de correr. Em 1848, Charles Thring, estudante da Universidade de Cambridge, surgiu com a primeira tentativa de um código universal, as regras de Cambridge. Essa ação é considerada o momento crucial no desenvolvimento do futebol, com estudantes das várias escolas se unindo para criar um código que agradaria a todos. Entretanto, não foi fácil, pois, anos depois, Figura 3 Modelo de chuteira e bola utilizados no séc. XIX BrBtBB/Shutterstock 12 Metodologia do ensino de futebol e futsal Figura 2 Selo em que está impresso o jogo praticado em 1827 Se rg ey G or ya ch ev /S hu tte rs to ck A história do futebol e do futsal 13 cada uma das principais escolas – Eton, Harrow, Rugby, Westminster, Winchester, Marlborough e Charterhouse – continuava utilizando suas próprias versões do futebol. Até 1863, por exemplo, a prática de carregar a bola com as mãos ainda ocorria em várias escolas. Figura 4 Pintura representando a prática que deu origem ao futebol Br es ki t/ W ik im ed ia C om m on s Podemos perceber queas dimensões do campo não eram claras. Constantemente, os expectadores do lado de fora recolocavam a bola em jogo com os pés, não sendo possível estabelecer quem era jogador ou expectador. O desenvolvimento inicial de regras ajudou a tornar o futebol um jogo menos violento e brutal. O estabelecimento de regras continuou ao longo dos anos, sem, até aquele momento, a definição do tamanho do campo. O número de jogadores era variado de acordo com o tamanho do campo, não havia uniformes para distinguir os jogadores de uma mesma equipe e era comum os jogadores usarem chapéus durante a prática. Em 1867, os representantes dos onze clubes londrinos e universidades marcaram uma reunião na Taverna Freemason para discutir os princípios e os valores morais do jogo, nascendo, assim, a Football Association, ou Associação do Futebol, primeira associação do que conhecemos hoje como futebol (AGOSTINO, 2011). 1.2.1 Profissionalismo Em 1872, foi disputada a primeira Football Association Cup, conheci- da como FA CUP, uma tradicional competição atualmente. Pelas regras da Associação de Futebol, os jogadores teriam que continuar sendo Era possível observar uma interessante diferença de estilos naquela época: enquanto as equipes da Inglaterra preferiam correr para frente, verticalizando o jogo, os escoceses tinham um estilo de jogar priorizando a troca de passes entre os jogadores. Isso acontecia, talvez, pela forte influência do rúgbi na forma inglesa de jogar. Curiosidade 14 Metodologia do ensino de futebol e futsal amadores e seria proibida qualquer compensação financeira para jogar por qualquer time. Mas os jogadores se mostraram insatisfeitos com o fato de terem que trabalhar em fábricas e ainda treinarem, enquanto os clubes cobravam ingressos para os expectadores assistirem às partidas. A popularidade do esporte continuou aumentando e o número de expectadores também. A partir desse momento, os clubes passaram a pagar por seus jogadores. Para atrair mais público e conquistas, donos das equipes – muitas delas atreladas a fábricas – contratavam jogadores de outras regiões, iniciando, assim, a caracterização da profissionalização do futebol. A Federação Internacional de Futebol (FIFA) foi fundada em 1904 e sua ata de fundação contou com signatários de representantes da França, da Bélgica, da Dinamarca, dos Países Baixos, da Espanha, da Suécia e da Suíça. A Inglaterra e os outros países britânicos não se juntaram ao grupo no início, pois diziam que, como eles inventaram o jogo, não faria sentido serem subordinados a nenhuma associação. Os britânicos passaram a participar da associação no ano seguinte. No início do século XX, vários países já tinham suas ligas domésti- cas formadas e, em 1930, a FIFA organizou seu primeiro campeonato mundial de seleções, a primeira Copa do Mundo. Essa competição foi realizada no Uruguai, escolhido para comemorar o centenário da sua constituição. Após esse ano, o torneio mais importante de futebol, que até então ocorriam nos Jogos Olímpicos, passou a ser na Copa. As ligas domésticas se estabeleceram e aumentaram o número de participan- tes, obrigando a criação de segundas e terceiras divisões. Em 1991, a primeira Copa do Mundo para mulheres foi organizada com sede na China e, desde então, a cada quatro anos o evento acon- tece, assim como na categoria masculina. 1.2.2 Globalização As confederações surgiram para diferentes continentes, a criação delas fomentou a profissionalização e fortaleceu o esporte. A Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), entidade que rege o futebol sul-americano e é responsável por organizar as competições eliminatórias da Copa do Mundo da América do Sul, foi criada em 1916. Em junho de 1954, surgiu a União das Associações Europeias de Futebol (UEFA). No mesmo ano, foi criada a Confederação Asiática de Futebol (AFC). Já em Figura 5 Linha do tempo com a inserção de algumas das regras do futebol moderno Fonte: Elaborada com base em FIFA, 2017; FIFA, 2020a; FIFA, 2020b 1871 Inserção do pênalti no jogo. 1909 Diferenciação do goleiro, que passa a usar cores diferentes dos demais jogadores. 1970 Introdução dos cartões amarelo e vermelho na Copa. 1992 Proibição do uso das mãos pelo goleiro após um recuo. 1992 Punição para carrinhos por trás com cartão vermelho direto. 2018 Utilização do VAR (Video Assistant Referee) na Copa do Mundo da Rússia para lances duvidosos. A história do futebol e do futsal 15 1957 e 1961 foram criadas, respectivamente, a Confederação Africana de Futebol (CAF) e a Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe (Concacaf). Um pouco mais tarde, em 1966, surgiu a Confederação de Futebol da Oceania (OFC). No fim do século XIX, havia somente alguns clubes de futebol. Inglaterra e Escócia tinham os primeiros jogos de clubes se enfrentando por volta dos anos 1870, atualmente são mais de 211 países associados à FIFA. Além disso, devido à globalização, houve um grande aumento de países que participam das eliminatórias classificatórias para a Copa do Mundo; em 1934 eram 32 países e hoje são mais de 200 participantes. Quadro 1 Copas do Mundo realizadas pela FIFA ANO CAMPEÃO PLACAR VICE SEDE 1930 Uruguai 4 x 2 Argentina Uruguai 1934 Itália 2 x 1 Tchecoslováquia Itália 1938 Itália 4 x 2 Hungria França 1950 Uruguai 2 x 1 Brasil Brasil 1954 Alemanha Ocid. 3 x 2 Hungria Suíça 1958 Brasil 5 x 2 Suécia Suécia 1962 Brasil 3 x 1 Checoslováquia Chile 1966 Inglaterra 4 x 2 Alemanha Ocid. Inglaterra 1970 Brasil 4 x 1 Itália México 1974 Alemanha Ocid. 2 x 1 Países Baixos Alemanha Ocid. 1978 Argentina 3 x 1 Países Baixos Argentina 1982 Itália 3 x 1 Alemanha Ocid. Espanha 1986 Argentina 3 x 2 Alemanha Ocid. México 1990 Alemanha Ocid. 1 x 0 Argentina Itália 1994 Brasil 0 x 0 (3x2 nos pênaltis) Itália E.U.A. 1998 França 3 x 0 Brasil França 2002 Brasil 2 x 0 Alemanha Japão/Coreia do Sul 2006 Itália 1 x 1 (5x3 nos pênaltis) França Alemanha 2010 Espanha 1 x 0 Países Baixos África do Sul 2014 Alemanha 1 x 0 Argentina Brasil 2018 França 4 x 2 Croácia Rússia Fonte: Elaborado pelo autor com base em FIFA, 2020c. A partir da Copa de 1954, na Suíça, um marco selou o destino do fu- tebol: a invenção da televisão. A transmissão dos jogos para oito países 16 Metodologia do ensino de futebol e futsal europeus colocava um fim no monopólio exercido pelo rádio. Em 1958, na Copa da Suécia, primeira vencida pelo Brasil, quase todos os países da Europa puderam acompanhar a transmissão ao vivo, enquanto outros continentes assistiam os jogos com aproximadamente um dia de atraso. Já em 1966, na Inglaterra, as redes de televisão começaram a pagar direitos de transmissão, já operando satélites artificiais que possibilitavam que os jogos ao vivo fossem vistos por dois bilhões de pessoas. Só a final entre Inglaterra e Alemanha mobilizou trinta e seis países e cerca de 400 milhões de telespectadores (AGOSTINO, 2011). Daí em diante, fica ainda mais clara a projeção alcançada. Com maior interesse televisivo em transmitir jogos e mais marcas atraí- das pelo crescente número de consumidores, o esporte alcança um patamar no qual os interesses esportivos se confundem com os co- merciais. Isso fica evidente quando observamos o número de placas de patrocinadores espalhadas pelo campo, a quantidade de anúncios nas transmissões e nas camisas das equipes envolvidas, além das partidas sendo jogadas em horários que atendam à grade televisiva. 1.3 Futebol no Brasil Vídeo Você sabe quem foi Charles Miller? Ao mencionar a origem do fute- bol no Brasil, o grande expoente é, sem dúvida alguma, Charles Miller, figura conhecida quando se trata do assunto. Segundo Agostino (2011), diferentemente do que você possa imaginar, o futebol já era jogado aqui no Brasil antes da icônica chegada de Charles Miller ao porto de Santos. Assim como em outras cidades pelo mundo (Buenos Aires, Rio de Janeiro, Gênova, Hamburgo), a disseminação do futebolse deu pelos próprios ingleses comerciantes, engenheiros de estradas de ferro, instaladores de linhas de telégrafo, estudantes ou educadores, e marinheiros ou soldados. Todos eram jogadores em potencial, fazendo demonstrações do jogo em cidades portuárias. No entanto, um marco para a disseminação do esporte foi o entusiasmo de Charles Miller, quem apresentou a modalidade de maneira organizada aos clubes esportivos da época. Por esse motivo é considerado por muitos o “pai” do futebol no Brasil. Nascido no Brasil e filho de um escocês e uma brasileira de origem inglesa, ele passou boa parte da sua infância e adolescência estudando na Inglaterra, e foi lá Recomendamos a minissérie The English Game, produzida pela Netflix. A história se passa na Inglaterra no final do séc. XIX e mostra a transformação do futebol junto aos dilemas da sociedade da época. Direção: Tim Fywell. Inglaterra: Netflix, 2020. Série A história do futebol e do futsal 17 que aprendeu a jogar o recém-criado futebol moderno. Ao voltar para o Brasil, em 1894, para trabalhar em uma companhia de ferro, Miller trouxe consigo duas bolas, uma bomba para enchê-las, um apito e um livro de regras universais (OLIVEIRA, 2012). Apesar de separados por muitas barreiras, trabalho e lazer se com- pletavam, não sendo poucos aqueles que viam o último como uma compensação para os sacrifícios que o primeiro impunha. Outra rea- lidade, também bastante significativa para a difusão do jogo, foi a sua promoção por meio das próprias companhias capitalistas, em muitos casos considerando o esporte um mecanismo de disciplina e desenvol- vimento físico e moral dos trabalhadores (AGOSTINO, 2011). O futebol parece estar totalmente integrado ao modo de viver do Brasileiro, a realidade é que a química do Brasileiro com o futebol, as interferências socioeconômicas e os atalhos encontrados para a prática do esporte criaram um enredo próprio. (CARVALHO, 2012, p. 311) O brasileiro se adaptou ao modo de jogar, o “jeitinho brasileiro” ou futebol arte, como já ouvimos falar, nasceu de uma longa trajetória, influenciada pela corrente migratória e pelas colônias britânicas e fran- cesas. Essa mistura de características proporcionou ao brasileiro seu estilo próprio, além da criatividade e da capacidade de improvisação. O Brasil é hoje o país com o maior número de títulos de Copa do Mundo e reconhecidamente uma das potências do esporte. A Confederação Brasileira de Desportos (CBD) era a entidade res- ponsável pelo futebol no Brasil. De 1933 até 1954, a competição principal era o Torneio Rio-São Paulo, que só era disputado por clubes desses estados. A partir de 1967, a competição pas- sou a contar com a participação de clubes de outros estados, já com o nome de Torneio Roberto Gomes Pedrosa, ou “Robertão”. O primeiro Campeonato Brasileiro de Futebol, popularmente conhecido como Brasileirão, ocorreu em 1971. E, em 24 de setembro de 1979, foi criada a Confe- deração Brasileira de Futebol (CBF) com a prerrogativa de garan- tir a gestão independente do futebol brasileiro e das seleções brasileiras de futebol. O futebol feminino, por sua vez, durante muito tempo foi marginalizado e alvo de preconceito por conta das políticas nacionais. Em 1941, Figura 6 Pelé, considerado o Rei do Futebol Bonkers/Wikimedia Commons Roberto Gomes Pedrosa, nome dado ao antigo campeonato bra- sileiro de clubes, foi um jogador de futebol que iniciou sua carrei- ra no Botafogo, disputou a Copa do Mundo de 1934 pela Seleção Brasileira e, posteriormente, tornou-se um importante dirigente, ocupando o cargo de presidente da Federação Paulista de Futebol. Curiosidade 18 Metodologia do ensino de futebol e futsal foi assinado um decreto que proibia a prática esportiva alegando-se não ser condizente com a natureza feminina. Assim, as mulheres foram proibidas de participarem de modalidades como futebol, futsal, rúgbi, halterofilismo, lutas e etc.; esse decreto foi revogado somente em 1979 (BASTOS; NAVARRO, 2009). A inserção da mulher no futebol e no futsal encontra forte relação com os espaços e papéis conquistados na sociedade, por meio da des- construção, ainda que pequena, da imagem do futebol como sendo um esporte somente para homens. Hoje, após muito custo e luta, o futebol feminino vem ganhando uma projeção importante, tendo sido criados torneios nacionais e ligas. Estimulados pelas federações, os tradicionais clubes passaram a contar com equipes de mulheres e dispor de cam- peonatos organizados pela CBF, transmitidos por emissoras televisivas. A ideia é de massificar o esporte e desconstruir preconceitos, atraindo mais praticantes, potencializando, assim, o desenvolvimento das atletas. Quadro 2 Campeonatos organizados pela CBF Masculino Feminino Campeonato Brasileiro (Séries A, B, C, D) Copa do Brasil Copa do Nordeste Copa Verde Super Copa do Brasil Campeonato Brasileiro – Série A1 Campeonato Brasileiro – Série A2 Copa do Brasil Fonte: Elaborado pelo autor com base em Futebol..., 2020. A partir de 2010, a CBF passou a reconhecer os campeões dos tor- neios disputados entre 1959 e 1970 – o conhecido “Robertão” – com títulos de campeão brasileiro. O futebol brasileiro é marcado pelo forte equilíbrio na disputa pelo título de campeão, enquanto em outras partes do mundo os vence- dores se limitam a três ou quatro equipes que se revezam historica- mente. No Brasil, dezessete clubes já ganharam o título da principal competição nacional, o Campeonato Brasileiro. O livro Vencer ou morrer: futebol, geopolítica e identidade nacional mergulha profundamente nos aspectos sociopolíticos que envolveram o futebol ao longo de sua história, as relações internas entre o Estado e a bola e a paixão do torcedor como instrumento de interesses pessoais. AGOSTINO, G. Rio de Janeiro: FAPERJ: 2. ed.: Mauad, 2011. Livro A história do futebol e do futsal 19 1.4 Aspectos socioculturais Vídeo Assim como na Inglaterra, o futebol que antes era praticado de ma- neira bastante informal passou a ganhar espaço nos clubes elitistas. Com o objetivo de impedir o acesso das classes sociais menos favore- cidas, os primeiros torneios disputados não contavam com a partici- pação da classe operária, os clubes estabeleciam rígidas demarcações sociais e os colégios onde se praticavam o esporte só aceitavam o perfil de estudantes da alta sociedade paulistana (CARVALHO, 2012). Os principais times eram formados por profissionais liberais, ser- vidores públicos e acadêmicos, e eram maioria nos campeonatos nos bairros elitistas. Os negros começaram a se apresentar na modalidade aos poucos até ganharem espaço. Isso começou a ocorrer somente em 1923, por meio do clube Vasco da Gama, que tem origem popular e oportunizou a prática do esporte. 1.4.1 A Violência no futebol O futebol possui uma capacidade incomum de unir povos, conectar culturas, romper idiomas e aproximar diferenças religiosas e étnicas. Entretanto, é importante ressaltar que esse mesmo futebol não está isento das mazelas da sociedade e tem sido marcado por demons- trações de violência e vários tipos de intolerância ao longo do tempo. Relatos envolvendo a violência no futebol são tão antigos quanto as próprias regras (AGOSTINO, 2011). Como um esporte com características tão democráticas e que transmite tanta alegria e paixão pode ser ao mesmo tempo tão violento? O futebol reflete uma microssociedade compreendida em uma sociedade maior, ou seja, ele revela uma face escondida na própria pessoa inserida dentro dessa macrosociedade. Essa pessoa invariavelmente encontra refúgio em grupos de torcedores com os quais se identificam, para expor comportamentos de racismo, homofobia e misoginia. Assim também acontece em redes sociais, manifestações políticas e etc. 1.4.2 O marketing e o capitalismo O futebol tornou-se um esporte de bilhões, clubes grandes arre- cadam com patrocinadores, venda dos direitos federativos do atleta, exposição de suas marcas, direitosde imagem e venda de camisas e 20 Metodologia do ensino de futebol e futsal de ingressos. Dessa forma, contratam jogadores cada vez mais caros e pagam salários exorbitantes, recebendo, em troca, mais possibilidades de conquistas esportivas e maior retorno financeiro. Com a transformação do futebol, agentes e empresários encontra- ram a mina de ouro descobrindo potenciais talentos, cheios de sonhos, e depositando neles toda a expectativa de uma valorização e futura venda. Não é incomum, nesse meio, histórias nas categorias de base de jovens jogadores utilizados por investidores e especuladores que “cui- dam dos atletas” e depois os vendem para faturar fabulosas quantias sem se importar com a formação humana dos jogadores. Esse panorama reflete a realidade de poucos clubes e jogadores. A maior parcela da classe, na verdade, enfrenta duras realidades, com sa- lários baixos e muitas vezes atrasados, pouca ou nenhuma infraestru- tura, além de clubes que só disputam campeonatos estaduais. Ou seja, esses jogadores só têm seus empregos por quatro meses, demonstran- do a imensa diferença na pirâmide socioeconômica, assim como ocorre em outros setores em nossa sociedade. As brilhantes conquistas obtidas pelas seleções brasileiras ao longo da história exacerbaram o sentimento de amor pelo esporte e, junto a isso, a identificação com o estereótipo do jovem pobre que se torna um astro bem-sucedido – principalmente em um país com séria desi- gualdade social. Os jogadores de futebol passam a ser ídolos e heróis de crianças e jovens. Estes veem no futebol a oportunidade de mudar de vida. Boa parte destes jovens, entretanto, não chega a se tornar pro- fissional e muitos dos que se tornam não chegam nem perto de con- quistar as fortunas dos craques dos grandes clubes. Sendo essa uma realidade que abrange menos de 5% dos atletas profissionais. 1.5 Origem e evolução do futsal Vídeo Assim como em vários outros esportes, divergências existem com relação à história do futsal, porém podemos afirmar que é um jogo nascido na América do Sul. Na década de 1930, o futebol já era extremamente popular e amplamente massificado, sendo o esporte preferido em clubes e escolas. No Uruguai, o professor de Educação Física Juan Carlos Ceriani adaptou o tradicional jogo de futebol para a sua realidade. Para jogar futebol, eram necessários 22 jogadores e um campo de dimensões O filme Boleiros, Era uma vez o futebol traz em seu enredo histórias caricatas do futebol do século passado contadas por um grupo de ex-jogadores nostálgicos. Direção: Ugo Giorgetti. Brasil: Paris Filmes, 1998. Filme A história do futebol e do futsal 21 enormes, além dos fatores ambientais. Assim, para facilitar o jogo, ele foi adaptado a um ginásio desportivo, especificamente nas demarca- ções da quadra de basquete do clube, utilizando traves do handebol. As divergências surgem porque em um período bem próximo, na década de 1940, o Futebol de Salão passou a ser jogado no Brasil. O professor Habib Maphuz, de uma escola em São Paulo, também teve a ideia de adaptar sua aula de futebol para um espaço menor e com menos participantes, possibilitando a prática do esporte aos moldes possíveis. No Brasil, esse esporte se massificou rapidamente, e as esco- las tiveram um grande papel nesse sentido. O país também foi o maior divulgador da modalidade, incentivando sua internacionalização. Em 1965, o esporte já havia se difundido por toda a América do Sul, resultando na criação da Confederação Sul-Americana de Futebol de Salão, composta por Uruguai, Paraguai, Peru, Argentina e Brasil. Após sua vinculação à FIFA, em 1989, o futsal começou a ter grandes torneios organizados, permitindo que a modalidade alcançasse uma grande vi- sibilidade mundial. Mas qual é o nome correto, futsal ou futebol de salão? Bom, é im- portante que saibamos que não estamos falando do mesmo esporte. Apesar de ser bastante comum usarmos os dois termos, o futsal teve sua origem no futebol de salão; inclusive seu nome é uma abreviação do esporte original. Devido à sua enorme projeção e na tentativa de normatizar as regras do esporte que se praticava aqui na América do Sul com as do indoor soccer praticado na Europa, para torná-lo um esporte olímpico, as regras do futebol de salão se modificaram. Com isso, popularizou-se sem perder as referências do esporte original, surgindo, assim, o futsal. Segundo Bastos e Navarro (2009), o futsal é o desporto que apre- senta o maior número de equipes e de atletas, participantes dos jogos escolares em todas as suas categorias, inclusive com um grande cresci- mento na área feminina. O desenvolvimento do futsal entre as mulheres cresce em todo planeta. A mídia especializada considera as jogadoras brasileiras as melhores do mundo, além de serem hexacampeãs do Tor- neio Mundial de Futsal Feminino e da Copa América de Futsal Feminino. 1.5.1 Variações do futebol/futsal O futebol e o futsal, apesar de não serem considerados esportes genuinamente brasileiros, ajudaram a fomentar modalidades coirmãs 1969 Foi fundada a Confederação Sul-Americana de Futebol de Salão (CSAFS). 1971 Foi fundada a Federação Internacional de Futebol de Salão (Fifusa). 1985 Realizou-se, na Espanha, o 2º Campeonato Mundial de Futebol de Salão organizado pela Fifusa. Novamente o Brasil venceu. 1988 Diante das dificuldades da Fifusa e projetando um futuro melhor para o futebol de salão, ficou decidido que a FIFA passasse a comandar internacionalmente o esporte. 1989 Foi acordada a fusão FIFA/Fifusa e constituída, na FIFA, com previsão estatutária, a Comissão de Futsal. 1990 O Brasil desligou-se da Fifusa e passou a adotar as novas regras de jogo emanadas da FIFA. 1992 As Copas do Mundo de Futsal da FIFA passaram a ser realizadas de quatro em quatro anos, seguindo o mesmo modelo adotado para o futebol. 1982 No ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, a Fifusa organizou o 1º Campeonato Mundial de Futebol de Salão, com a participação de Brasil, Argentina, Costa Rica, Checoslováquia, Uruguai, Colômbia, Paraguai, Itália, México, Holanda e Japão. O Brasil venceu a final contra o Paraguai por 1 a 0. Figura 7 Linha do tempo de curiosi- dades do esporte Fonte: Elaborada pelo autor com base em O esporte..., 2020. 22 Metodologia do ensino de futebol e futsal tipicamente brasileiras, que contaram com a criatividade e a improvi- sação. Alguns desses esportes são muito praticados e já conquistaram projeção internacional. • Beach Soccer, ou futebol de areia: futebol, inicialmente praticado nas areias de Copacabana, que ganhou o mundo e hoje é um esporte olímpico. • Futevôlei: uma mistura interessante de futebol e vôlei amplamen- te praticado nas cidades litorâneas brasileiras e que ultimamente vem ganhando espaço nas cidades, com locais construídos para sua prática. • Futebol society ou futebol de 5: praticado em grama sintética e bastante difundido nas cidades como forma de lazer, o futebol de 5 também é um esporte paraolímpico, jogado por cegos com uma bola com guizo. • Futmesa: modalidade que começou como recreação dos joga- dores de futebol – durante momento de lazer no clube ou no vestiário antes de iniciar os treinos –, mas hoje já existem mesas próprias para sua prática. Essas modalidades, além de outros jogos associados ao futebol, são comuns na nossa cultura e ajudam inclusive a abrir mercados alternativos. O freestyle, por exemplo, é o nome dado a arte de controlar a bola de ma- neira livre, uma mistura de futebol com malabarismo que vem ganhando espaço em eventos esportivos, como demonstração e competição. CONSIDERAÇÕES FINAIS A história moderna do nosso país também pode ser contada por meio da evolução do futebol e do futsal. Ao aprofundar nossa visão histórica da modalidade, estamos também abrindo caminho para discutir os próximos rumos e o papel desses esportes como transformadores em uma socie- dade moderna, tecnológica e mais individualista.O futebol está longe da neutralidade. Ele serviu, em diferentes contex- tos, contra os poderes opressivos, e para ações revolucionárias. Desde sua origem, o esporte vem servindo para ideais nobres, como a paralisação de guerras civis, a luta a favor da liberdade e o combate à fome e ao racismo, mas também já serviu de ferramenta para ditadores e políticos oportunistas. Portanto, contextualizar o futebol e o futsal dentro da sociedade possibilita aos educadores a criação de estratégias de utilização dessas modalidades de forte apelo cultural e aproximá-las de outras disciplinas e O livro O que é Futsal, de Silvia Vieira e Armando Freitas, traz um panora- ma sobre a história da modalidade. VIEIRA, S.; FREITAS, A. Santo André: Casa da Palavra, 2007. Livro A história do futebol e do futsal 23 áreas de conhecimento. Contar a história do mundo por meio do futebol, por exemplo, pode ser um meio de aproximar-se do educando. Ensinar geografia, sociologia ou matemática baseando-se na evolução do futebol pode parecer um impulso interessante. ATIVIDADES 1. Estudar a história do futebol nos permite valorizar suas origens e manter seus valores. O futebol nasceu como um esporte lúdico e, como se vê, tornou-se uma grande indústria. Discuta essa ideia. 2. Apesar de ser um ambiente sempre recheado por machismo, hoje podemos ver mulheres na arbitragem e em competições nacionais organizadas pela CBF. Você acha que já podemos considerar que a mulher já conquistou seu espaço no país do futebol? 3. O futebol brasileiro é reconhecido por ser celeiro de craques, pois a cada geração temos um novo destaque chamando atenção dos grandes clubes europeus. Descreva esse fenômeno pelo viés sociocultural e histórico. REFERÊNCIAS AGOSTINO, G. Vencer ou morrer: futebol, geopolítica e identidade nacional. 2. ed. Rio de Janeiro: Mauad X, 2011. BASTOS, P. V.; NAVARRO, A. C. O futsal feminino escolar. Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v.1, n.2, p.144-162, 2009. CARVALHO J. E. Geopolitica: 150 anos de futebol. São Paulo: Ed. SESI-SP, 2012. FIFA. London’s football history: Laws of the Game. FIFA, 2017. Disponível em: https:// www.fifa.com/the-best-fifa-football-awards/news/london-s-football-history-laws-of-the- game-2902981. Acesso em: 21 maio 2020. FIFA. From 1863 to the Present Day. FIFA, 2020a. Disponível em: https://origin.fifa.com/ about-fifa/who-we-are/the-laws/index.html. Acesso em: 21 maio 2020. FIFA. History of the Laws of the Game - 1990-2000. FIFA, 2020b. Disponível em: https:// www.fifa.com/news/history-the-laws-the-game-1990-2000-435. Acesso em: 21 maio 2020. FIFA. Archive. FIFA, 2020c. Disponível em: https://www.fifa.com/fifa-tournaments/archive/. Acesso em: 21 maio 2020. FUTEBOL brasileiro. CBF, 2020. Disponível em: www.cbf.com.br/futebol-brasileiro. Acesso em: 21 maio 2020. GOLDBLATT, D. The Ball is round: A Global History of Football. Ed Penguin UK, 2007. KITCHING, G. Feature: modern sport: society and competition: the origins of football: history, ideology and the making of ‘the people’s game’. History Workshop Journal, v. 79, n. I, p. 127–153, 2015. O ESPORTE da bola pesada que virou uma paixão. CBFS, 2020. Disponível em: https://www. cbfs.com.br/futsal-origem. Acesso em: 21 maio 2020. OLIVEIRA, A. F. Origem do futebol na Inglaterra no Brasil. Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v.4, n.13, p.170-174, set./out./nov./dez. 2012. SARMENTO, C. E. A regra do jogo: uma história institucional da CBF. Rio de Janeiro: CPDOC, 2006. 24 Metodologia do ensino de futebol e futsal 2 O ensino de futebol e de futsal A popularidade do futebol e do futsal é um fato facilmente observado em nosso país, onde escolinhas de futebol são muito comuns. O jogo de rua, antes aprendido de maneira natural e livre, é agora ensinado em espaços formais, seja em clubes representados pelas chamadas categorias de base, em instituições privadas (bastante comuns nos centros urbanos, geralmente com campos de grama sintética) ou em organizações públicas, escolas e secretarias de esportes. Dessa forma, o futebol de rua passa a ser mediado, surgindo a figura do professor-treinador, responsável por conduzir o ensino. Nesse sentido, este capítulo pretende trazer reflexões acerca da importância desse professor-treinador na iniciação ao futebol e futsal e no seu ensino, assim como a relação com o ambiente que cerca esse indivíduo. Ciente da sua relevância, esse agente deve assumir protagonismo no processo de ensino-aprendizagem. O contrário disso significaria destinar ao acaso a plenitude da cons- trução das habilidades esportivas. Além disso, trataremos da importância da criação de ambientes favoráveis para que esse processo ocorra, a qual não se limita ao espaço físico, mas atinge todo entorno. Isso implica repensar a aula, pois cada aspecto se torna uma parte importante do todo nessa trajetória. O ensino de qualquer habilidade exige capacitação do profissional, mas esta é especialmente demandada dentro do ambiente esportivo, carregado de paradigmas e com forte ancoragem no empirismo, no qual a cobrança por resultados e o olhar competitivo precoce podem ser muitas vezes um grande empecilho para a formação. Por fim, discutiremos diferentes métodos de ensino, abordando os processos pedagógicos e a visão humanística, para que você domine o conteúdo e possa entender mais sobre como ensinar futebol e futsal. O ensino de futebol e de futsal 25 2.1 Reflexões acerca da formação do professor Vídeo Mundo afora, o Brasil sempre despertou atenção por sua capacidade de revelar talentos e praticar um futebol atrevido e criativo. Mas que fenômeno é esse? Será um dom? Há algo diferente no DNA do brasileiro que já nasce craque? Ao nos depararmos com uma criança talentosa com a bola nos pés, não é difícil escutarmos frases como: “esse já nasceu com o dom!” ou “esse é um goleador nato!”. Contudo, será mesmo que o inatismo tem tanta presença assim no talento? Claro que questões genéticas podem interferir em vários fatores, por exemplo, quanto às capacidades físicas, o tipo de fibra muscular pode influenciar diretamente a capacidade de produção de força do indivíduo. Porém, o fator realmente determinante para a construção das habilidades é a interação com o ambiente. A criança aprende vi- venciando e experimentando por meio da diversificação e da curiosida- de e, de fato, o talento irá emergir das oportunidades oferecidas, pelo interacionismo. De acordo com Reverdito, Scaglia e Paes (2009), é possível estabele- cer uma diferença entre as visões inatista e interacionista: Visão inatista Traz a ideia de que o indivíduo já nasce com determinada habilidade; o talento está na sua herança gené- tica e basta cuidar e esperar para que ele desabroche. O talento é herdado. Visão interacionista O talento é fruto das relações com- plexas entre o indivíduo e o am- biente que o cerca. A pedagogia é baseada no planejamento de ações e na construção de tarefas que favo- reçam o desenvolvimento. O talento é construído. Dessa forma, romper com antigas ideias e quebrar paradigmas do tipo “talento é genético” ou “está no sangue” é o primeiro passo para assumirmos as rédeas do ensino de qualidade, formando professores com visão ampla, que, em primeiro lugar, entendam o contexto em que estão inseridos (esporte educacional, especialização ou alto rendimen- to), ou seja, para quem se está ensinando. 26 Metodologia do ensino de futebol e futsal O ensino de futebol evoluiu de uma prática empírica, pautada nas crenças e nos padrões que se repetem, ou seja, o professor reproduz o que ele aprendeu com seu professor que, por sua vez, também repassou o que sabia da maneira que aprendeu quando jogava. Além disso, o fute- bol pode não conduzir ao alto rendimento, mas, ainda assim, não deixa de ter importância na vida da pessoa. Ele pode trazer valores fundamentais para a construção de uma sociedade melhor, como respeito, cordialidade, companheirismo,resiliência, além de saúde e bem-estar. Essa visão torna a formação e a capacitação do professor-técnico imprescindíveis, conside- rando que, em mãos erradas, o esporte pode ter esses valores invertidos, tornando-se indisciplina, raiva, impaciência e intolerância. Segundo Freire (1989), por si só, o esporte não possui somente valores positivos. Ele pode ser tudo, a grande questão é o que fazemos dele. Assim, inevitavelmente, surgem relevantes questionamentos: es- tamos ensinando bem o futebol? Respeitamos as fases de desenvol- vimento e permitimos a natural capacidade criativa do jogador, ou estamos extrapolando as exigências e mecanizando o ensino? Estamos oportunizando a aprendizagem democraticamente ou privilegiamos os mais hábeis tecnicamente ou mais aptos fisicamente? Estamos ensi- nando somente o esporte em si ou proporcionando uma educação in- tegral, alicerçada nos valores éticos e morais para a construção de uma sociedade justa e com indivíduos mais bem preparados? Com base nessas perguntas, temos os seguintes pilares do ensino do futebol (FREIRE, 1998): O futebol é um jogo de decisões a serem tomadas a todo momento, então, o sucesso depende da capacidade de tomar decisões corretas e em curto espaço de tempo. Portanto, saber estimular a cria- tividade e a autonomia do aluno é imprescindível. Ensinar bem futebol Ao longo dos anos, o futebol tem permanecido um esporte machista e excludente: meninas são desencorajadas a jogar desde cedo e os mais gor- dinhos ou menos habilidosos são alvo de chacota. Nesse sentido, quebrar as barreiras e inserir todos de maneira democrática, independentemente de limitações físicas ou cognitivas, é um dos pilares do ensino de futebol. Para ensinar bem e a todos, a escola ideal não deve tratar igualmente pessoas diferentes que têm necessidades diferentes, as quais devem ser respeitadas. Enfim, ela deve tra- tar a todos com respeito. (Continua) Ensinar bem futebol a todos empirismo: visão que propõe todo conhecimento como proveniente unicamente da experiência, limitando-se ao que pode ser captado do mundo externo por meio dos sentidos. Glossário O ensino de futebol e de futsal 27 O professor-técnico deve estar alinhado às práti- cas pedagógicas esportivas e, ao mesmo tempo, não deve esquecer que o futebol, pela sua força sociocultural, tem papel preponderante na educa- ção e formação humana. Ensinar mais do que futebol a todos Em modalidades como o futebol e o futsal, caracterizadas pela im- previsibilidade, mecanizar o ensino parece ser pouco útil. Devemos re- pensar no método muito além do oferecimento de respostas prontas, de modo que possamos fazer as perguntas corretas e os alunos sejam capazes de construir suas respostas. O talento esportivo, assim como o talento em qualquer área, surge da qualidade e quantidade de estímu- los oferecidos, portanto, a responsabilidade do professor de potencia- lizar e otimizar o tempo do aluno em cada aula é crucial. Sugerimos a leitura do li- vro Fora de Série – Outliers, de Malcolm Gladwell. O autor descreve, em dife- rentes capítulos, histórias que reforçam que o talento surge do ambien- te onde o indivíduo está inserido e da quantidade de horas aplicadas para a construção de tal habilidade. Rio de Janeiro: Sextante, 2008. Livro 2.2 Ambiente de aprendizagem Vídeo Os ambientes de aprendizagem mudaram bastante com a moderniza- ção dos centros urbanos. Antes, o futebol era aprendido naturalmente e em ambientes informais, jogado em campinhos improvisados, em espa- ços de dimensões e formas geométricas diversas, em pisos que poderiam ser de grama, areia, terra, asfalto ou lama. Também eram comuns traves feitas com pedaços de madeira, garrafas ou improvisadas com chinelos, e as bolas eram dos mais diversos tamanhos, pesos e materiais. E quanto aos colegas e adversários? Também eram os mais diver- sos: o time da rua debaixo, a turma da outra escola, os garotos de todas as idades etc. Às vezes o tempo era marcado no relógio, às vezes o jogo ia até escurecer o dia. O número de jogadores então... indefinido! Ou seja, as regras eram adaptáveis. Perceba que, muito mais do que um retrato do Brasil de outrora, estamos destacando a quantidade de cenários possíveis e evidencian- do a imprevisibilidade característica na qual o jogo era aprendido. Todas essas nuances auxiliaram a construir o nosso estilo de jogar, a melhorar a relação jogador-bola, a adaptar-nos constantemente a novas condições todos os dias. Esses cenários cotidianos ensinaram nossos maiores craques e os deram competências genuinamente brasileiras, como a versatilidade e destreza para um drible, o caráter 28 Metodologia do ensino de futebol e futsal improvisado. A diversificação dos ambientes proporcionou de modo natural a esses indivíduos a essência do jogo de futebol: a imprevisi- bilidade (MACHADO et al., 2018). Atualmente, os cenários são outros em grande parte do país. A vida urbana e cosmopolita se expandiu, os ambientes informais imergiram e hoje é mais comum o futebol ser ensinado em locais próprios para isso, como em clubes, escolas etc. E o ambiente, que antes era o princi- pal mediador da construção das habilidades, foi substituído pela figura do treinador. Se já não temos o ambiente imprevisível que exigia que o indivíduo se adaptasse rapidamente durante o jogo e que estimulava a capacidade criativa do jogador, agora, proporcionar essas competên- cias passou a ser de responsabilidade do profissional envolvido com o ensino (SCAGLIA, 1996; BETTEGA et al., 2019). Criar um ambiente de aprendizagem é, acima de tudo, oportunizar o ensino e oferecer aos alunos conteúdos pedagogicamente bem ela- borados. É importante deixar claro que quando tratamos de ambiente de aprendizagem, não estamos falando somente das estruturas físicas, mas do contexto todo. Nesse sentido, a escola tem um papel funda- mental e não deve se apoiar exclusivamente nos aspectos competiti- vos, o que levaria a um caráter de exclusão. 2.2.1 O ambiente escolar É sabido que nem todas as escolas possuem espaço adequado para a prática do futebol ou do futsal. O mais comum é que tenhamos à disposição uma quadra poliesportiva, nem sempre com dimensões oficiais, utilizada para diversas atividades escolares simultaneamente – o que proporcionaria maior dificuldade na criação desses cenários. Essa realidade comum reforça ainda mais a importância do professor- -técnico, pois ele deve ser capaz de criar e proporcionar atividades nesse espaço, possibilitando uma melhor relação do aluno com a bola e instigando o gosto pela prática nos estudantes. O professor-técnico deve estar atento para que o cenário que está construindo para a aula, ou sessão de treino, seja favorável à apren- dizagem, visto que as habilidades são formadas em ambientes propí- cios para seu desenvolvimento. Percebemos, então, que deve partir do professor a iniciativa de manipular o ambiente e contextualizá-lo para que seja possível atingir seu objetivo. Algumas ações que podem ser desenvolvidas por esse profissional são: Na obra O Futsal e a Escola: uma Perspectiva Pedagógica, os auto- res apresentam uma proposta pedagógica para o ensino do futsal, destacando o papel da escola junto ao esporte na construção de conhe- cimentos sociais, culturais e psicológicos. VOSER, R. C.; GIUSTI, J. G. M. 2. ed. Porto Alegre: Penso, 2015. Livro https://www.amazon.com.br/s/ref=dp_byline_sr_ebooks_2?ie=UTF8&field-author=Jo%C3%A3o+Gilberto+M.+Giusti&text=Jo%C3%A3o+Gilberto+M.+Giusti&sort=relevancerank&search-alias=digital-text O ensino de futebol e de futsal 29 Mostrar igualdade no respei- to e no ensino dos valores. Cuidar para que não haja ex- clusão por sexo, idade, peso, altura ou habilidade prévia. Formular aulas estimulantes e participativas. Fazer atividades dinâmicas em que todos possam es- tar ativos a todo momento. Evitar uso de filas, pois isso tira o foco da criança e tor- na o exercício chato. Ter equidadeno ensino, con- siderando que necessidades diferentes merecem aten- ções distintas. De acordo com Galatti e Paes (2006), quando tratamos do esporte na educação física escolar, os propósitos devem estar claros e condizentes com os pressupostos pedagógicos da escola, como a formação do indi- víduo em sua integralidade, adotando métodos cuja ênfase é propor a imprevisibilidade e os problemas a serem resolvidos pelos praticantes. 2.3 Métodos de ensino Vídeo Até recentemente, na maioria dos locais onde a prática esportiva é constante (principalmente o futebol), o ensino estava baseado uni- camente em uma prática voltada a técnicas do jogo, o que não ne- cessariamente resultava em jogar bem. Hoje, a ciência do esporte é contundente em nos mostrar que o futebol e o futsal são modalidades de características peculiares, pois o jogo se desenvolve em um ambien- te desprovido de previsibilidade. O ensino ideal do esporte é aquele com pressupostos metodológi- cos pautados em necessidades reais e com uma pedagogia que respei- te seus praticantes quanto à sua faixa etária, suas motivações e seus interesses. Nesse sentido, a seguir, veremos alguns métodos de ensino e suas diferentes características. 2.3.1 Método analítico Também conhecido como método por partes, o método analítico tem origem na ideia de ensinar as habilidades com base nos funda- mentos de uma determinada modalidade e por meio da repetição dos exercícios, destinados à aprendizagem dos gestos separadamente do jogo formal. Ou seja, é um método que fragmenta o jogo em partes, treina cada uma isoladamente, para depois juntá-las ao final. 30 Metodologia do ensino de futebol e futsal O modelo tem sido usado há bastante tempo no Brasil e parte da premissa de se eliminar os erros e se aprimorar os gestos. Com base em uma visão empirista, as escolas de esportes e os clubes frequente- mente vêm ensinando futsal e futebol, assim como outros esportes co- letivos, dessa maneira. Ele também pode ser chamado de mecanicista, porque, por exemplo, o fundamento de passe é treinado de maneira repetitiva, isolada e exaustivamente na tentativa de especializar o gesto. Por um lado, a crítica a esse modelo está na ausência do próprio jogo, tornando algo que é prazeroso para as crianças e jovens em algo meca- nizado e descontextualizado. Muitas das vezes, eles nem entendem o motivo das repetições. Por outro, esse modelo apresenta uma evolução mais rápida e visível de determinada técnica e, como o desempenho é perceptível nos resultados de jogos e torneios, crê-se que esse método é eficaz. A Figura 1 ilustra uma característica bastante comum ao método analítico: o uso de equipamen- tos que não fazem parte do jogo formal para trei- nar determinadas habilidades ou ensinar técnicas específicas. Algumas características do método analítico são: Repetição excessiva de movimentos. Foco na avaliação e correção de um gesto isolado. Diminuição do caráter coletivo. Desinteresse da criança. Distanciamento das situações reais do jogo, como enfrenta- mentos imprevisíveis. Apartamento da técnica da tática e do físico. Dessa forma, esse método preconiza o ensino e o aprimoramento dos fundamentos, como passe, domínio ou controle de bola, condução, drible, chutes e cabeceios, buscando desenvolvê-los sem oposição ou enfrentamentos. Geralmente, são usadas séries de exercícios, deter- minadas pelo tempo ou número de repetições, feitas individualmente, em duplas ou utilizando colunas ou filas de jogadores, que realizam determinado gesto, um por vez. Um exemplo seria o treino de passe em dupla, no qual um indivíduo fica de frente para o outro em uma dis- tância pré-determinada pelo professor tocando a bola alternadamente. Figura 1 Prática mais técnica e afastada da situação de jogo Se ve nt yF ou r/ Sh ut te rs to ck O ensino de futebol e de futsal 31 2.3.2 Método global O método global, também conhecido como método do todo, consis- te no ensino do esporte por meio de jogos de complexidade menor, mas ainda com vínculos e semelhanças situacionais ao jogo formal. Esse método preconiza o ensino das habilidades dentro do próprio jogo, criando tarefas específicas para ressaltar ou induzir determina- do gesto. O método global tem se mostrado muito mais importante no processo formativo do indivíduo. Na questão motivacional, ele tem ampla vantagem, já que permite variar os tipos de jogos, tornando o ensino atrativo, além de permitir a imprevisibilidade característi- ca do esporte. Além disso, oportuniza a criatividade e induz a to- madas de decisão. Para Garganta e Gréhaigne (1999) e Teoldo, Guilherme e Garganta (2015), o futebol, assim como os demais esportes coletivos, tem como característica a riqueza de situações im- previsíveis. Durante o jogo, surgem tarefas motoras de grande complexidade para as quais não existe um mo- delo de execução e resolução fixo. Nesse contexto, não há preocupação com a forma de execução, mas sim com o cumprimento da tarefa. Assim, não há jeito certo de fazer algo, contanto que seja feito. O futebol, por ser um jogo, deve ser aprendido como tal, ou seja, jogando. O ensino pautado na fragmen- tação do jogo em partes exclui a relação espaço-jogador e jogador-bola e restringe drasticamente a eficiência do ensino (SCAGLIA et al., 2013). Algumas características do método global são: Motivante, pois jogar é divertido. Participação de mais alunos ao mesmo tempo. Semelhança com o jogo formal. A imprevisibili- dade estimula a criatividade e as decisões mais rápidas. Segundo Garganta et al. (2003), o jogo de futebol tem por característica uma elevada versatilidade perceptiva, direcional e motora. Além disso, o desenvolvimento é condicionado por múltiplos fatores, como a movimentação dos colegas de equipe e dos adversários, os setores e espaços onde as ações acontecem, Figura 2 Treinamento técnico integrado ao jogo FotokostFc/Shutterstock Para entender um pouco mais sobre a pedagogia e os métodos baseados em jogos, sugerimos a obra Pedagogia do esporte: Jogos esportivos coletivos. Os autores discutem o papel dos jogos coletivos na Educação Física, com suas respectivas implica- ções no desenvolvimento de crianças e jovens nos esportes coletivos. NAVARRO, A. C.; ALMEIDA , R.; SANTANA, W. C. São Paulo: Phorte, 2015. Livro https://www.amazon.com.br/s/ref=dp_byline_sr_ebooks_2?ie=UTF8&field-author=Roberto+de+Almeida&text=Roberto+de+Almeida&sort=relevancerank&search-alias=digital-text 32 Metodologia do ensino de futebol e futsal a distância entre os alvos, a velocidade da bola e a sua trajetória etc. Isso tudo ainda muda de acordo com o momento do jogo (momento ofensivo ou defensivo). Por isso, o método de ensino deve contemplar a capacidade dos jovens em se organizarem e efetuarem ações conforme o que o momento do jogo solicita. 2.4 Abordagens pedagógicas Vídeo As abordagens pedagógicas e os estilos de ensino 1 são norteado- res no processo de aprendizagem e importantes no desenvolvimen- to do trabalho do professor. A apropriação dessas teorias capacita esse profissional para que ele tenha discernimento no momento da elaboração de conteúdos, objetivos e estratégias da aula. A aborda- gem do ensino do esporte na escola não pode estar limitada apenas à transmissão de técnicas e táticas, o que seria uma visão reduzida e fragmentada desse fenômeno. O esporte não é educativo por si só – aliás, o futebol pode ter tudo: o bem ou o mal, a sapiência ou a ignorância, o inclusivo ou o exclusivo –, e o professor é o responsável por transformá-lo em um objeto de educação e transmissor de virtudes (GOULART, 2018). Para Paes (1998, p. 112), o esporte é uma representação simbólica da vida, da natureza educacional, podendo promover no praticante modificações tanto na compreensão de valores como de costumes e modo de comportamento, interferindo no desenvolvimento individual, aproximando pessoas que têm, neste fenômeno, um meio para estabelecer e manterum melhor relacionamento social. Portanto, o esporte na escola não pode ter como objetivo princi- pal formar atletas, apesar de poder ser um efeito secundário, que não pode ser desprezado. O objetivo maior do esporte deve ser a expan- são de suas inúmeras possibilidades de atividades formativas. Dessa forma, outras dimensões, além das esportivas, devem constar na pro- posta pedagógica, como a atenção aos aspectos sociais, culturais, his- tóricos, antropológicos etc. (FINCK, 2011). Pessoas aprendem de maneiras diferentes, e cada uma traz consigo histórias e vivências distintas. Transmitir informações é algo complexo e as práticas bem-sucedidas de hoje não garantem o mesmo sucesso ama- As abordagens são teorias apli- cadas à pedagogia e os estilos ou linhas de ensino se referem a como o professor interage com o aprendiz. 1 O ensino de futebol e de futsal 33 nhã, e assim também funciona com turmas diferentes. Logo, uma única corrente não deve orientar a prática pedagógica, mas, sim, elementos de diversas linhas (GOULART, 2018). Humanizar as relações e enxergar dentro das equipes e pessoas são um excelente início. Pessoas têm pontos de partidas diferentes e tra- zem consigo heranças biológicas, ambientais e culturais distintas. Por- tanto, um ambiente de ensino democrático é aquele que enxerga cada indivíduo como único em sua necessidade (FREIRE, 1989). 2.4.1 A classificação das abordagens pedagógicas A classificação das abordagens pedagógicas varia na literatura. Po- demos observar diversos modelos – algumas vezes, diferentes somen- te na nomenclatura ou na descrição das características, dependendo do autor pesquisado. É importante entender esses conceitos, mais do que definir exatamente todos. Desse modo, apresentamos algumas abordagens possíveis, de acordo com Finck (2011) e Goulart (2018): Saúde Renovada É voltada à valorização da prá- tica do exercício físico, contri- buindo para uma conscienti- zação da importância de um estilo de vida ativo e saudável. Desenvolvimentista Defende que, na fase funda- mental do desenvolvimento motor, as crianças devem ser envolvidas na exploração e experimentação das suas capacidades motoras. A aula deve privilegiar a aprendiza- gem motora, cognitiva e afe- tiva de acordo com o nível de crescimento e desenvolvi- mento do aluno. Humanista Caracteriza-se por valorizar o aluno e não a atividade. Os pro- fessores ajudam a desenvolver atitudes positivas nos jovens com relação ao papel da ativida- de em suas vidas, dando signifi- cação e proporcionado momen- tos de escolha e criatividade. Construtivista O jogo assume papel de conteú- do e estratégia, sendo o princi- pal meio de ensino. Ele deve ser utilizado em um ambiente praze- roso para o praticante. Crítico-Superadora Sua finalidade é a transformação social, tendo os temas cultura corporal e visão histórica como parte fundamental e integrante dos conteúdos. Além disso, visa desenvolver o senso crítico e questionador do indivíduo, esti- mulando sua compreensão de mundo. 34 Metodologia do ensino de futebol e futsal O conhecimento das abordagens pedagógicas e dos estilos de en- sino nos ajudam a nortear nosso caminho como professores e nos fazem refletir sobre a maneira que interagimos com os alunos e as possibilidades de potencializarmos a aprendizagem. É importante que o professor possua um repertório amplo de técnicas e estilos – trabalhando, principalmente, com turmas grandes e heterogêneas –, e que utilize várias linhas. Quadro 1 Benefícios do planejamento estratégico Recomendamos a leitura do livro A Educação Física e o esporte na escola: coti- diano, saberes e formação, de Silvia Finck. O livro trata, de maneira bastante abrangente, os métodos e as abordagens de ensino. FINCK, S. C. M. Curitiba: InterSaberes, 2012. Livro Estilos de ensino Filosofia Exemplo com treinamento de passe Comandos Centrada no professor, tradicional. O aluno aprende conforme instrução, de- monstração e tomada de decisão do pro- fessor. O professor explica, demonstra e espera que o aluno execute exatamente como foi demonstrado. Tarefas O aluno tem maior responsabilidade no pro- cesso de aprendizagem. O professor explica e demonstra, e o aluno pode, por exemplo, apresentar variações no posicionamento do tronco, do pé de apoio ou na velocidade de execução. Avaliação recíproca Altamente centrada no aluno. O professor determina os objetivos e con- teúdos e os alunos são incumbidos de parti- cipar da aprendizagem uns dos outros. O professor explica e demonstra, os alunos podem apresentar variações e o processo se dá por avaliação e feedbacks dos próprios colegas (trabalho em dupla, por exemplo). Programação individualizada Um número maior de decisões é transferido ao aprendiz. O aluno pode assumir seu próprio ritmo. Mostra respeito pelas individualidades. O professor explica e demonstra vários mo- dos de execução, com níveis de dificuldade diferentes, e o aluno executa aqueles de acordo com o seu grau de habilidade. Descoberta orientada ou descoberta guiada O professor estabelece uma resposta pré- -determinada e esperada para o problema. Então, faz perguntas considerando que elas produzam a necessidade da busca de alter- nativas para a solução por parte dos alunos. O professor separa pequenos grupos e os orienta sobre a tarefa, mas não especifica a forma de execução. Em alguns momentos, ele interrompe a prática e faz questiona- mentos sobre o gesto, no sentido de esti- mular que parta do aluno a descoberta da melhor forma. Solução de problemas O aluno é definitivamente o centro. Ele passa a ser o elemento ativo, formulando perguntas e buscando respostas. O professor seleciona o conteúdo e estimula a curiosidade. A tarefa, o modo (movimentando ou para- do), a formação (duplas, trios), a execução (pé direito ou esquerdo) etc. são criados pelos alunos. Após a sessão, o professor discute com eles, propondo como é possível melhorar. Fonte: Adaptado pelo autor com base em Goulart, 2018. O ensino de futebol e de futsal 35 Com base nas teorias pedagógicas tradicionais e na busca de uma estrutura que possa ser mais eficiente, surge como nova perspectiva a chamada Pedagogia Não-Linear (PNL). Para Machado et al. (2018), a PNL é representada em sua essência pelos jogos reduzidos e seu aspecto- -chave é a manipulação das tarefas, do ambiente e do indivíduo. Ela não segue uma construção linear de conhecimento, mas oferece ajustes para atender às necessidades do aluno. Também segundo os autores, essa visão é baseada nos princípios do futebol de rua. No vídeo Ed Física Brasil entrevista - João Claudio Machado, o Prof. Dr. João Cláudio Machado, da Universidade Federal do Amazonas, fala sobre as novas abordagens pedagó- gicas aplicadas ao futebol. Vale a pena conferir! Disponível em: https://youtu. be/7W4Gkv6yMK0. Acesso em: 15 jun. 2020. Vídeo 2.5 Pedagogia dos jogos Vídeo Quando falamos de jogo, qual é a primeira coisa que vem à sua ca- beça? Muita confusão é gerada com relação a essa definição. Quando o assunto é jogo, para muitas pessoas, a primeira ideia que surge é o re- sultado do jogo anterior do seu time de coração. Já para outras, a ideia de jogo está atrelada à brincadeira ou à ludicidade. De fato, o jogo é tudo isso e está no meio dessas duas ideias, sendo, então, tarefa difícil defini-lo. Podemos entender que tudo que fica entre a brincadeira des- compromissada e o esporte extremamente rígido poderia ser chama- do de jogo. Segundo Huizinga (1999, p. 2), “no jogo, existe alguma coisa ‘em jogo’ que transcende as necessidades imediatas da vida e confere um sentido à ação. Todo jogo significa alguma coisa”. As tarefas criadas dentro dos jogos devem obedecer ao grau de com- plexidade condizente com as faixas etárias ou com o nível de adaptação do indivíduo. Devem funcionar como ferramenta de estímulo para que a criança aprenda a pensar de maneira crítica e a resolver problemas com- plexos, trabalhede maneira colaborativa, e comunique-se com eficácia. Nesse sentido, é fundamental observarmos que diferentes tipos de jogos dependem de tarefas e propostas distintas. Por exemplo, os jogos cooperativos são aqueles em que não há competição entre os participantes do time e o sucesso do jogo depende da participação em conjunto. Já os jogos pré-desportivos são aqueles que procuram se assemelhar ao esporte sobre o qual se pretende ensinar. Além do mais, o jogo é uma atividade extremamente indicada para satisfazer a necessidade de movimento do ser humano, é um conteúdo que representa esforço e conquista, servindo como um importante veículo de cultura (SCAGLIA et al., 2013). https://youtu.be/7W4Gkv6yMK0 https://youtu.be/7W4Gkv6yMK0 36 Metodologia do ensino de futebol e futsal O jogo funciona muito bem como ferramenta pedagógica, pois tem por característica ser divertido e motivante. Afinal, quem não gosta de jogar? Porém, esses aspectos se perdem caso as proposições do jogo superestimarem a capacidade de entendimento do indivíduo, por exemplo, se o jogo estiver complexo para aquela faixa etária, a crian- ça provavelmente não o entenderá e logo se desmotivará. O contrário também é verdadeiro. Subestimar a capacidade da criança, propondo tarefas fáceis, fará com que ela perca o interesse. Para melhor entender como os jogos podem ser utilizados dentro de uma lógica pedagógica dos esportes coletivos, Scaglia et al. (2013) propuseram uma divisão baseada na referência estrutural e funcional do jogo e, com base nessas definições, a criação de matrizes de jogos que auxiliam no processo de organização do método. Referência estrutural Referência funcional É tudo que está presente fisica- mente no jogo, como bola, baliza, dimensão do campo, número de jogadores etc. Rege o jogo, fazendo ele funcionar, como a lógica do jogo, as operações e as regras. Com base nesses conceitos, Scaglia et al. (2013) identificam as ma- trizes de jogos e as classificam em: jogos conceituais, jogos conceituais em ambiente específico, jogos específicos e jogos contextuais. Vamos entender um pouco mais sobre eles? Os jogos conceituais são aqueles cujas referências estruturais e funcionais não respeitam fielmente a lógica do jogo esportivo coletivo especificado. Logo, os conteúdos, evidenciados ao longo do processo de organização, são diversificados, gerando a manifestação de inúme- ras ações conceituais presentes em todos os jogos esportivos coleti- vos, e não apenas no jogo esportivo coletivo que se almeja ensinar. Por exemplo: um jogo de campo reduzido 4 x 4 m em que dois jogadores se enfrentam com o objetivo de somente manter a posse de bola. Os jogos conceituais em ambiente específico obedecem às referências estruturais do jogo que se quer ensinar, por exemplo, no futebol, o tamanho do campo e a presença das traves. Nesse tipo de jogo, os conceitos desenvolvidos nos jogos conceituais são colocados em um ambiente formal, dentro de um espaço físico semelhante ao do jogo formal. Contudo, varia quanto ao cumprimento da lógica O ensino de futebol e de futsal 37 formal (adaptada segundo o conceito trabalhado), pois o processo de organização sistêmico terá ações diferentes das especificamente exigidas no jogo esportivo coletivo pretendido, para a obtenção das formas de pontuação provenientes das modificações das regras. Por exemplo: em um espaço de quadra oficial e com número de jogadores oficiais, somente será permitido o chute a gol depois de dez passes consecutivos na quadra ofensiva. Nos jogos específicos, as referências estruturais e funcionais não são alteradas em relação às da lógica do jogo pretendido. Assim, a maior aproximação ao jogo formal (regras oficiais) e os conceitos aplicados fazem parte de um modelo de jogo pré estabelecido. Por exemplo: um treino coletivo, no qual se estabelece previamente os comportamen- tos, como transição defensiva rápida e compactação da equipe. Por fim, os jogos contextuais são idênticos a uma competição for- mal. Eles devem manter as referências estruturais e funcionais asso- ciados aos desafios emocionais da competição. Portanto, trata-se dos jogos amistosos e oficiais. Sugerimos a leitura do livro Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. Nessa interessante obra, o autor filosofa sobre a ideia de enxergar uma espécie derivada do homo sapiens e destaca que o jogo está implícito na natureza, estando em tudo e se relacionando com o ser nas próprias relações humanas. Dessa forma, a reflexão reforça a importância do jogo. HUIZINGA, J. São Paulo: Perspectiva, 1999. Livro 2.6 Iniciação esportiva e capacidades motoras Vídeo A iniciação ao futebol ou ao futsal costuma ser bastante precoce, alicerçada ainda pela crença de quanto antes melhor. O nível de compreensão e adequação do conteúdo oferecido aos jovens ainda é pequeno, e é necessária a disseminação do conhecimento, que deve partir de professores de Educação Física, principais mediadores dessa relação. Iniciar precocemente no esporte não é o problema real, e, sim, a es- pecialização e a imposição de gestos e ações motoras específicas a uma criança, que podem trazer futuros prejuízos à saúde. A especificidade do esporte, principalmente se direcionado ao âmbito competitivo, exi- ge ações motoras para as quais o jovem nem sempre já está maturado, sem contar com as exigências psicológicas oriundas das cobranças por parte de pais e até de professores. A iniciação esportiva deve estar pautada na ideia de ampliação do universo cognitivo e motor. Para Goulart (2018), a infância é o melhor momento para a estimulação cerebral, pois é quando ocorre a maior plasticidade neural. Nesse contexto, as estratégias didáticas têm um papel fundamental para o desenvolvimento neurológico. O futebol, por exemplo, 38 Metodologia do ensino de futebol e futsal pode ser utilizado como pano de fundo para inserir a criança em práticas motoras variadas e lúdicas, que despertem o encantamento e a satisfação. É interessante ressaltar que, normalmente, o ser humano se interessa pelas atividades prazerosas, e experiências negativas e traumáticas tendem a afastar a criança. Imagine uma criança cobrada excessivamente e exposta diante de seus colegas por algum erro ou alguma derrota. Essa experiência negativa poderia resultar em traumas incorrigíveis. A aula de Educação Física é a oportunidade de iniciar esse processo, que deve ser de longo prazo e multilateral, e o professor deve discernir o futebol ou futsal na escola da equipe de competição escolar. Ambos podem ser incentivados, mas em momentos diferenciados. O futebol e o futsal na escola fazem parte do conteúdo curricular da Educação Físi- ca e de todas as suas dimensões. Já a competição é um instrumento alternativo, que não deixa de ser importante, mas deve fazer parte do processo de ensino e não deve atrapalhá-lo (FINCK, 2011). O respeito às fases de desenvolvimento motor também é imprescindível para o sucesso da forma- ção atlética a longo prazo. O desenvolvimento motor serve como suporte ao trabalho diário e é um pro- cesso contínuo e dependente de todos os domínios do ser humano: cognitivo, afetivo-social e motor (GOULART, 2018). Crianças em período pré-púbere, por exemplo, não estão biologicamente aptas a re- ceber determinadas cargas de treinamento, muitas vezes propostas com o intuito de fazê-las competir melhor e conquistar vitórias. Porém, elas podem es- tar ativamente abertas a receber outros estímulos que não foram oferecidos. Isso se chama janela de oportunidade ou período sensível. Nesse sentido, na abordagem do esporte na es- cola, o professor poderá utilizar alguns elementos do jogo, principalmente o seu caráter lúdico. Além disso, algumas estratégias poderão ser aplicadas no encaminhamento do processo de ensino-apren- dizagem, como a adaptação das regras, o redimen- sionamento do espaço, a alteração do número de participantes e a composição das equipes. Sugerimos a leitura da BaseNacional Comum Curricular (BNCC), docu- mento que regulamenta o conteúdo essencial a ser trabalhado nas esco- las brasileiras públicas e particulares de educação básica. Disponível em: http:// basenacionalcomum.mec.gov.br/ images/BNCC_EI_EF_110518_ versaofinal_site.pdf. Acesso em: 15 jun. 2020. Leitura O efeito da idade relativa é um fenômeno bastante comum observado em diversos esportes e com forte apelo no futebol. Para entender do que estamos falando, basta fazer um levantamento dos principais jogadores inscritos nas principais competições esportivas e observar suas datas de nascimento. O resultado observado será um número maior de atletas nascidos nos primeiros meses do ano. Por que será? Será que algum arranjo astral ou forças ocultas poderiam explicar o que leva os nascidos em janeiro, fevereiro, março e abril a serem mais bem sucedidos esportivamente? Não! Isso é explicado pela vantagem biológica momentânea. Sa- bemos que as turmas são divididas por faixas etárias, mas existe uma vantagem biológica entre as crianças nascidas em janeiro em comparação com as nascidas em novembro. Essa vantagem pode ser física (peso, altura, força, velocidade, agilidade etc.) ou cognitiva (raciocínio, tomada de decisão etc.). Além disso, elas têm experiências, vivências e mais tempo de participação em jogos e brincadeiras, afinal são dez meses a mais. Quando o clube, a escola ou o professor prioriza o resultado da competição, sobrepondo os títulos e troféus ao ensino do esporte, acaba privilegiando os que possuem a vantagem momentânea, ou seja, chutam mais forte, correm mais rápido, saltam mais alto. O problema reside na maturação. Aqueles ga- rotos menos desenvolvidos de outrora possuem tanto potencial esportivo (ou até mais) quanto os outros, mas lhes foi tirada a oportunidade de prática em uma fase importante e, como vimos, o tempo de prática e a qualidade são imprescindíveis para a formação esportiva. Saiba mais http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf O ensino de futebol e de futsal 39 CONSIDERAÇÕES FINAIS O ensino do futebol e do futsal em qualquer dimensão institucional é contaminado por crenças e costumes, muitas vezes distantes de uma prática responsável e clara. Dessa forma, o profissional de Educação Física deve ter um olhar bastante atento às novas abordagens pedagógicas. O ambiente escolar tem o potencial de ser o fio condutor de práticas de ensino que se tornem referências para outras entidades. Na falta de uma linguagem metodológica universal para o ensino do futebol, o exem- plo pode partir de dentro da escola por meio de professores engajados. Além disso, a escola deve ser um espaço democrático e alicerçado na con- vivência, e os alunos devem ter acesso a competências diversas, sejam elas cognitivas, motoras, afetivas ou sociais. A transmissão do conteúdo deve ir além dos aspectos técnicos e táticos, alcançando os valores huma- nos e éticos com o objetivo de construir a cidadania. A assimilação está atrelada a um vínculo afetivo, então, o fato de o aluno se sentir acolhido conta muito. Por isso, não esqueça: o afeto afeta. ATIVIDADES 1. É comum olharmos um jogador de futebol habilidoso e pensarmos que ele nasceu para jogar. Porém, o talento esportivo parece ter pouca relação com o inatismo. Discorra sobre esse tema. 2. Considerando que o futebol também sofre bastante influência do método analítico, comum no ensino de modalidades esportivas no Brasil, explique esse método de ensino usando suas próprias palavras. 3. Observe o diálogo de duas crianças a seguir: - Benício, qual jogo você acha mais legal? - O jogo que eu sei jogar, ué! Agora, reflita sobre a resposta simples, mas repleta de informação dentro do contexto da pedagogia dos jogos, dada pela segunda criança e anote suas considerações. REFERÊNCIAS BETTEGA, O. B. et al. Formar o treinador e o jogador nas categorias de base do futebol: Engendrando na interação e/ou na especificidade? Movimento, Porto Alegre, v. 25, e25021, jan./dez. 2019. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/88087/52673. Acesso em: 15 jun. 2020. FINCK, S. C. M. A educação física e o esporte na escola. Curitiba: Ibepex, 2011. 40 Metodologia do ensino de futebol e futsal FREIRE, J. B. Educação de corpo inteiro. São Paulo: Scipione, 1989. FREIRE, J. B. Pedagogia do futebol. 2. ed. Campinas: Autores Associados, 1998. GALATTI, L. R.; PAES, R. R. Fundamentos da Pedagogia do esporte no cenário escolar. Movimento & Percepção, Espírito Santo do Pinhal, v. 6, n. 9, jul./dez. 2006. Disponível em: http://ferramentas.unipinhal.edu.br/movimentoepercepcao/include/ getdoc.php?id=253&article=79&mode=pdf. Acesso em: 15 jun. 2020. GARGANTA J.; GRÉHAIGNE, J. F. Abordagem sistêmica do jogo de futebol: moda ou necessidade? Movimento, Porto Alegre, v. 5, n. 10, 1999. Disponível em: https://seer.ufrgs. br/Movimento/article/view/2457/1122. Acesso em: 15 jun. 2020. GARGANTA, J. et al. Fundamentos e práticas para o ensino e treino do futebol. In: TAVARES, F. (org.). Jogos desportivos coletivos: Ensinar a jogar. Porto: FADEUP, 2013. GOULART, A. R. Jogos pré-desportivos na educação física escolar: linhas de ensino de desenvolvimento motor e psicomotricidade. São Paulo: Labrador, 2018. HUIZINGA, J. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 1999. PAES, R. R. Esporte educacional. In: 1º CONGRESSO LATINO AMERICANO DE EDUCAÇÃO MOTORA; 2º CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO MOTORA. Anais [...] Foz do Iguaçu, 1998. MACHADO, J. C. et al. Enhancing learning in the context of Street football: a case for Nonlinear Pedagogy, Physical Education and Sport Pedagogy, v. 24, n. 2, p. 176-189, 2018. Disponível em: https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/17408989.2018.1552674. Acesso em: 15 jun. 2020. REVERDITO, R. S.; SCAGLIA, A. J.; PAES, R. R. Pedagogia do esporte: panorama e análise conceitual das principais abordagens. Motriz, Rio Claro, v. 15, n. 3, p. 600-610, jul./set. 2009. Disponível em: http://www.periodicos.rc.biblioteca.unesp.br/index.php/motriz/article/ download/2478/2477. Acesso em: 15 jun. 2020. SCAGLIA, A. et al. O ensino dos jogos esportivos coletivos: as competências essenciais e a lógica do jogo em meio ao processo organizacional sistêmico. 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As ações técnicas do jogo são determinantes para o sucesso da equipe ou do jogador em um duelo individual, desse modo, é importante, então, desenvolver conhecimentos e compe- tências que permitam saber organizar-se nas diferentes fases e nos diferentes momentos do jogo, de acordo com possibilidades de ações criadas e que surgem na partida (GARGANTA et al., 2013). O ensino dos esportes coletivos, como o futebol e o futsal, tem sido pautado tradicionalmente pela fragmentação. São observa- das, com certa frequência, as ações técnicas sendo treinadasse- paradamente do jogo; esse método é conhecido como tecnicista ou analítico e consiste na repetição exaustiva dos gestos. Essa prá- tica é criticada por especialistas da pedagogia do esporte por não oferecer substancialmente o que se espera de um jogador, por exemplo, competências cognitivas e tomadas de decisões rápidas. Apesar de reconhecer a importância dos gestos técnicos, ensinar a alguém como executar corretamente um movimento parece não fazer sentido algum quando assistimos a uma partida de futebol ou futsal, pois não existe um jeito certo, o jeito certo é o que resol- ve o problema apresentado. Neste capítulo, iremos destacar as ações técnicas mais comuns utilizadas durante o jogo, sem a pretensão de esgotá-las e, muito menos, de caracterizá-las como movimentos fechados. As ações do jogo são próprias de cada jogador e podem ser modificadas para atender ao momento da partida, portanto seria leviano nu- merar e limitar os fundamentos técnicos, bem como selecionar o fundamento certo ou errado para determinar o sucesso ou não da tarefa. 42 Metodologia do ensino de futebol e futsal 3.1 Passe Vídeo O passe, caracterizado pelo ato de impulsionar a bola e fazê-la che- gar a um companheiro de equipe, é uma das ações mais importantes do jogo coletivo, aliás, é esse fundamento que dará sentido à coletivi- dade, permitindo a interação entre os integrantes da equipe. A palavra passe por si só já é autoexplicativa no que concerne à manutenção da posse de bola. O ato de passar a bola pode ser feito com diversas superfícies do corpo, como os pés, a coxa, o peito, os ombros, a cabeça ou as mãos. O mais comum é observarmos o passe com a parte interna do pé, pois permite maior precisão, dependendo da orientação corporal. Porém, variações das mais diversas são bem-vindas, por exemplo, o passe com o lado externo do pé confere à bola um efeito extraordinário. O passe apresenta direções, trajetórias e distâncias também variadas. Os passes de longas distâncias são chamados de lançamento e o passe que precede uma finalização ao gol é chamado de assistência. Quanto maior o repertório do jogador, mais habilidoso ele é considerado. Entre os maiores passadores, podemos citar Paulo Roberto Falcão, Andrés Iniesta, David Beckham, Zico, Ronaldinho Gaúcho, Franz Beckenbauer, além de muitos outros que durante suas carreiras ficaram conhecidos pela capacidade de fazer a bola chegar ao seu destino com eficiência e oportunismo. Para aprimorar o passe, é possível fazer um exercício conhecido como Bobinho 4 contra 1. Nessa atividade, os quatro jogadores, em um espaço de 6 x 6 m, devem manter a posse de bola com passes entre ed na l/S hu tte rs to ck Bem sucedida será a tarefa se, por exemplo, o atleta conseguir fazer a bola chegar a um companheiro, vencer um duelo com um adversário ou ter êxito contra um goleiro. Não caberá aqui a indu- ção de determinado gesto, mas apresentá-los com o cuidado de que eles só tenham sentido dentro de um contexto e principal- mente que o gesto não se sobreponha à ação, isso significa dizer que o ensino deve estar pautado na intencionalidade, na resolução dos problemas e não em um gesto mecanizado. Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 43 eles. Só é permitido dar um toque na bola enquanto o jogador no cen- tro da rodinha deve interceptar e roubar a bola. Após três intercepta- ções, troca-se o jogador do meio. Ie sd e Br as il 6 m 6 m trajeto da bola intenção do jogador Esse exercício estimula os jogadores a treinar o passe dentro de uma brincadeira comum e em situação de jogo. Com isso, os atletas precisam estar ativos, preparados para orientar o corpo de modo a executar o movimento, já que a bola se apresenta em condições alea- tórias, aumentando o repertório dos participantes. No canal SoccerCoachTV, há vários vídeos que permitem visualizar, por meio do método de jogo, modelos de treinamento técnico de aprimoramen- to de passe praticados por grandes equipes do futebol mundial. Disponível em: https://www. youtube.com/channel/UCgKCQ- JCkYrRKwqr-17inQsQ. Acesso em: 3 jun. 2020. Vídeo 3.2 Domínio Vídeo O domínio, também chamado de controle ou recepção, é caracteriza- do pelo ato de interferir na trajetória da bola, reduzindo sua velocidade e a amortecendo, ao ponto de o jogador tê-la completamente sobre seu controle. Assim como o passe, ele apresenta ações técnicas e graus de complexidade bastante variados. A área de contato do corpo com a bola pode ser desde os pés, até a coxa, o peito e a cabeça, por exemplo. A dificuldade é influenciada pela velocidade da bola empregada pelo passador, quanto mais rápida a bola, menos tempo para se pre- parar para a ação. O espaço para se executar tam- bém influencia muito na complexidade. A distância do oponente mais próximo, a altura da bola e seu efeito só aumentam o desafio do executor. No futsal, a ação de dominar a bola ganha uma variação mais comum, denominada pisada. Essa prática utiliza-se da sola do pé para o domínio, gesto que também pode ser visto no futebol, mas com menos fre- quência devido ao solado do calçado. ed na l/S hu tte rs to ck 44 Metodologia do ensino de futebol e futsal Para exemplificar o domínio de bola é impossível não citar nomes como Zinedine Zidane, Ronaldinho Gaúcho, Roberto Carlos e Johan Cruyff. Para aprimorar o domínio da bola, uma sugestão é a realização de exercícios como o Bobinho 5 contra 2. Nessa atividade, os cinco jogado- res, em um espaço também de 6 x 6 m, devem manter a posse de bola com dois toques obrigatórios de cada (domina e passa), enquanto os dois jogadores no centro do círculo devem interceptar e roubar a bola. Após três interceptações, troca-se os dois jogadores centrais. trajeto da bola intenção do jogador6 m 6 m Ie sd e Br as il O jogo se assemelha ao anterior e pode ser usado como progressão. O domínio é fundamental para que o jogo funcione e os jogadores precisam estar atentos e dominar rápido para não perderem a bola. A orientação corporal mudará de acordo com a direção em que a bola vem e o componente cognitivo (concentração, raciocínio, elaboração de estratégias e atenção) está presente mais uma vez, assim como no exercício anterior. 3.3 Condução Vídeo A condução consiste no ato de se deslocar em campo ou em quadra mantendo a bola sob seu controle. Esse fundamento caracteriza uma ação individualizada por meio de toques contínuos, normalmente utili- zando os pés que garantem mais velocidade e precisão, porém outras partes do corpo também podem ser utilizadas. Essa técnica tem grande valia durante a transição ofensiva, ou seja, logo após a recuperação da bola, esse é o ato de progredir com ela, aproveitando o momento de desorganização do adversário. Conduzir a bola em velocidade pode surpreender o sistema defensivo do oponen- te e normalmente associa-se aos chamados contra-ataques. A obra Futsal: metodolo- gia da participação, de Santana, traz métodos de ensino do futsal para crianças, privilegiando a participação e desen- volvendo o prazer pelo esporte. SANTANA, W. C. 3. ed. São Paulo: Companhia Esportiva, 2018. Livro https://www.amazon.com.br/s/ref=dp_byline_sr_ebooks_1?ie=UTF8&field-author=Wilton++Carlos+de+Santana&text=Wilton++Carlos+de+Santana&sort=relevancerank&search-alias=digital-text Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 45 No futsal, essa ação tem mais variações do que no futebol de cam- po. Na quadra, a superfície e o solado do calçado permitem o uso da sola do pé para a condução, conhecida como “pente”. No campo, a ação fica limitada devido à irregularidade do terreno. Como exemplo de jogadores com ótima capacidade de condução de bola, aliando técnica e velocidade, podemos citar Kaká, que du- rante sua carreira protagonizou importantes momentos, além de Kylian Mbappé e Neymar. Para a prática e o aprimoramento dessa técnica, é possível utilizar o jogo da condução. É uma brincadeira que faz parte da cultura de rua e pode ser utilizadacomo um jogo adaptado. Cada participante tem uma bola e deve conduzi-la ao outro lado da quadra, o pegador não tem bola e deve tentar pegar a bola de um dos participantes no momento da travessia. trajeto da bola intenção do jogador Ie sd e Br as il Variações podem ser realizadas para adaptar o grau de dificuldade, como o aumento ou a diminuição do espaço da quadra ou o aumento do número de pegadores. 3.4 Drible Vídeo O drible é uma das técnicas mais difíceis e admiradas pelos torce- dores. A habilidade nessa técnica depende muito da criatividade, da versatilidade e da ousadia do executor. Esse recurso é utilizado para transpor e se desvencilhar, desconstruir e desorganizar o sistema de- fensivo do adversário por meio do duelo um contra um. Muito associa- do à beleza do jogo, o jogador driblador normalmente é o protagonista do momento ofensivo. ed na l/S hu tte rs to ck 46 Metodologia do ensino de futebol e futsal O driblador pode ter estilos e características distintas e alguns dribles são bastante conhecidos e ganharam nomes e apelidos, como “caneta” ou “rolinho”, “elástico”, “drible da vaca”, “chapéu” ou “touca”, “pedalada” etc. Temos grandes exemplos de dribladores que abrilhantaram o futebol com suas fintas desconcertantes e repertório surpreendentes. Entre eles, podemos citar Pelé, Marta, Ronaldo Fenômeno, Ronaldinho Gaúcho, Lionel Messi, Paulo Roberto Falcão, Maradona, Garrincha, Neymar e Robinho. Para treinar essa técnica, podemos utilizar o Jogo do enfrenta- mento. Essa atividade é baseada em uma brincadeira de rua cha- mada contrinha. Em um campo com dimensões reduzidas, de 10 x 10 m, por exemplo, os jogadores se enfrentam em um contra um, com o objetivo de fazer o máximo de gols em um minuto de jogo. O jogo vai exigir coragem e induzir a criatividade. O partici- pante irá tentar diversas vezes fazer o gol com base no en- frentamento. Podem ser utili- zados goleiros ou golzinhos – sem goleiro. 3.5 Chute Vídeo O chute, também conhecido como remate ou finalização, é o ato final da construção da jogada, é a concretização da estratégia de ataque e tem como objetivo fazer com que a bola adentre a meta e vença o goleiro adversário. O chute geralmente ocorre no terço final do campo ou logo após o meio da quadra de futsal. Além das jo- gadas de construção, é chamado de chute também o golpe de reposição de bola em jogo, normalmen- te chamado de bola parada. Como exemplos, temos o tiro de meta, tiro livre direto (cobranças de falta) e penalidades. trajeto da bola intenção do jogador Ie sd e Br as il G G 10 m 10 m O livro Futebol Sistêmico: Conceitos e Metodologias de Treinamento, de Belozo e Lopez, apresenta con- ceitos voltados ao trei- namento dos aspectos técnicos, táticos e físicos por meio dos jogos, tema bastante pertinente para complementar os estudos na área. BELOZO, F.; LOPEZ, C. Jundiaí: Paco Editorial, 2017. Livro ed na l/S hu tte rs to ck ed na l/S hu tte rs to ck Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 47 Há diversas variações quanto à superfície de contato com a bola. As áreas do pé que tocam a bola podem ser a parte interna, externa, o peito do pé, o bico do pé e o calcanhar. Essas superfícies de contato podem proporcionar trajetórias e alturas das mais diversas. O chute ganha versões e, consequentemente, diferentes nomencla- turas de acordo com o modo executado e as situações exigidas. Alguns exemplos são: • Chapada: é a finalização utilizando a parte interna do pé, confere mais precisão e é usada nas situações próximas ao gol. • Voleio: a bola é chutada a meia altura sem tocar no chão previa- mente, é um recurso utilizado quando o domínio é inviável. • Sem-pulo: a bola é chutada com o peito de pé após um salto. • Trivela: chute que utiliza a parte externa do pé, ganhando efeito surpreendente. • Bicicleta: gesto complexo e recurso utilizado quando a bola vem alta e o jogador está de costas para o alvo. • Bate-pronto: oferece a superfície do peito do pé para bater na bola imediatamente após ela ter tocado o solo. Destacar exímios chutadores, assim como nas outras ações, é uma tarefa difícil e a escolha depende, também, de gosto individual, do jeito de bater na bola, da força empregada e dos belos gols marcados. Aqui, ousaremos citar Roberto Carlos e Branco, ícones no quesito força, mas temos também outros exímios finalizadores, como Ronaldo, Romário, Cristiano Ronaldo, Roberto Rivelino e Roberto Dinamite. Como prática dessa técnica, temos o jogo da rebatida. A rebatida é um jogo bastante conhecido na cultura das brincadeiras de rua com bola. Nes- se jogo, são formadas duas equipes de dois componentes, cada equipe tem direito a seis chutes (a aproximadamente 15 m do gol) – três chutes de cada jogador –, enquanto a outra equipe se posiciona como defensor e goleiro. Se, com o chute, a equipe fizer um gol, ganha um ponto, mas se os goleiros derem a rebatida, a dinâmica muda e um dos defensores sai para tentar pegar a bola enquanto os atacantes devem tentar fazer o gol, que nessa situação vale dois pontos. Caso a bola pegue na trave, o gol passa a valer três pontos. Soma-se os pontos conquistados a cada chute das equipes e a que tiver mais pontos ganha o jogo. 48 Metodologia do ensino de futebol e futsal trajeto da bola intenção do jogador Ie sd e Br as il 15 m A rebatida é um exemplo de como uma brincadeira informal pode ser mais eficiente para treinar técnicas do que o treino de fundamen- tos, pois ela possui o chute como ponto de partida, mas tem também drible, passe, defesa, emoção, competitividade e o principal: diversão. 3.6 Cabeceio Vídeo O cabeceio é um recurso muito comum nas bolas altas. Nos mo- mentos ofensivos do jogo, ele também é utilizado como passe para um colega e para a finalização da jogada ao gol. Nesse caso, os protagonis- tas da ação são os atacantes, especialistas em golpear a bola para o gol adversário. Nos momentos defensivos, o recurso é utilizado para inter- ceptação de um passe aéreo ou para afastar a bola para o mais longe possível de sua meta em situações de perigo. Variações são observadas no modo de contato com a bola dependendo da velocidade, força e altura pretendida com a ação. Para a finalização ao gol no momento ofensivo, é mais comum observarmos a utilização da área frontal da cabeça, a chamada testada. Essa técnica é menos comum no futsal do que no futebol, já que o esporte de quadra se caracteriza por menos jogadas aéreas e mais bola no chão. Quem você considera grandes cabeceadores? Entre os que marcaram época, podemos citar Romário e Pelé como ícones do cabeceio, além de Gabriel Batistuta, Cristiano Ronaldo, Jardel e Jürgen Klinsmann. Para treinar essa técnica, podemos utilizar o jogo do cabeceio, ou futcabeça. Nessa atividade, a lógica do jogo formal permanece a mesma, mas a estrutura pode ser alterada, diminuindo as dimensões do campo e só valem gols feitos de cabeça após lançamentos para a área. ed na l/S hu tte rs to ck Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 49 trajeto da bola Ie sd e Br as il G G Como só valem gols de cabeça, também serão trabalhados os passes altos. Diminuindo as dimensões do campo, possibilitaremos mais chances de finalização ao gol. Como variação, podemos sugerir a não utilização dos goleiros, o que permite que as jogadas sejam concluídas, não havendo saídas do gol e interceptações. O filme Pelé: O Nascimento de uma Lenda, de Michael Zimbalist, narra a história de vida e carreira do con- siderado melhor jogador de futebol de todos os tempos. Direção: Michael Zimbalist. Brasil; EUA: Imagine Entertainment, 2016. Filme 3.7 Ações do goleiro Vídeo O goleiro tem uma função bastante especifica, e indiscutivelmente foi a que mais evoluiu ao longo dos anos. Devido ao avanço técnico-tá- tico-físico, o futebol se tornou muito dinâmico e veloz e o jogador dessa função teve que se adaptar, aprimorando todos os aspectos pertinen-tes ao jogo (GONÇALVES; NOGUEIRA, 2006). Entre as ações mais comuns utilizadas pelo goleiro estão a pegada, reposição com as mãos, reposição com os pés, entrada de frente, que- da lateral (baixa, alta e meia altura), saída de gol por baixo e saída de gol por cima. Como o jogo se desenha diferentemente em cada situa- ção, as ações do goleiro não se limitam às citadas aqui e para cada ação citada, variações são comumente observadas: vai depender da decisão do indivíduo. Diante de situações de jogo e modificações nas regras – antes era permitido pegar com as mãos após o recuo de um colega –, é neces- sário que o goleiro desenvolva, também, fundamentos dos jogadores de linha, tais como: passe, lançamentos de média e longas distâncias, domínio, chute, drible, cabeceio e proteção, entre outros. Entre os goleiros de maior destaque podemos ci- tar Gordon Banks, Gianluigi Buffon, Sepp Maier, Cláudio Taffarel, Rogério Ceni e Marcos. ednal/Shutterstock 50 Metodologia do ensino de futebol e futsal Para o treino das técnicas dessa posição, são recomendados os jo- gos com o goleiro. É um pequeno jogo de cinco contra cinco. Em um campo de dimensões reduzidas, 40 x 30 m, esse jogo ficará extrema- mente dinâmico e ocorrerão finalizações a todo momento, exigindo ex- trema atenção e reações rápidas dos goleiros. G G Ie sd e Br as il 40 m 30 m trajeto da bola Como o espaço está reduzido, as finalizações ao gol serão constan- tes, os goleiros experimentarão chutes vindos das mais diversas di- reções e trajetórias. Na variação para o futsal, é necessário reduzir a quadra para 25 x 20 m. 3.8 Relação jogador-bola Vídeo Não existe uma maneira correta de se efetuar um gesto, mas te- mos várias ações e gestos mais comuns no futsal e no futebol, os quais podemos enfatizar com a criação de tarefas para o desenvolvimento de tais técnicas (JUNIOR, 1998). Cada ação técnica básica possui uma função de auxiliar na resolução de uma tarefa, porém restringi-las é um grande equívoco. Os diversos elementos que formam a técnica criam a base do jogo e facilitam todas as ações táticas necessárias para o sucesso da equipe. O domínio da técnica do jogo depende da relação do jogador com a bola, e essa relação não deve ser enxergada somente pelo gesto visível. Uma boa relação com a bola inicia-se antes dela chegar até o jogador, a inteligência deve preceder o gesto, entender a situação apresentada, por exemplo, a velocidade da bola, a altura da bola, a orientação es- Assista ao vídeo Treina- mento Específico Global de Goleiros, publicado pelo canal Luis Henrique de Moraes, em que identifi- camos o desenvolvimento de algumas habilidades técnicas por meio do treinamento específico para goleiros com ações combinadas. Disponível em: https://www.you- tube.com/watch?v=QCF0ZyM5wlo. Acesso em: 3 jun. 2020. Vídeo Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 51 pacial, a orientação corporal; e esses mecanismos mentais devem ser trabalhados. Por essa razão, o ensino de futebol baseado somente na mecânica em si parece ter, de fato, pouca relação com as necessidades de ensino. Se as aulas ou os exercícios propostos dentro dessas neces- sidades oferecerem condições diversificadas e oportunidades para os jogadores vivenciarem e experimentarem diversos tipos de execução de um domínio, por exemplo, eles serão muito mais inteligentes na ação do que algum indivíduo que aprendeu a dominar a bola arremes- sada com a mão pelo colega de treino. Existe uma relação estreita entre excelência em recursos técnicos e a quantidade de horas a que foram expostos a essa vivência. Portanto, jogar bem está relacionado a jogar muitas vezes, e não necessariamente a treinar a técnica várias vezes. Um pianista talentoso de jazz que improvisa com eximia classe só atingiu esse nível tocando e se relacionando com essa complexidade de música. No futebol e no futsal é a mesma coisa, a relação corpo-bola no jogo é diferente da relação corpo-bola no treino técnico. No treino técnico, o ambiente é previsível, a bola chega várias vezes na mesma altura, com a mesma velocidade e da mesma direção. Uma forma de treinar as técnicas, é criar pequenos jogos, baseados nos momentos do jogo formal no qual esses pequenos jogos privile- giem alguma determinada técnica. Esse tipo de jogo deve ser ajustado para induzir os jogadores a fazerem as ações dentro do contexto de improvisações e aleatoriedades. As habilidades técnicas dependem da relação corpo-bola nos mo- mentos ofensivos e defensivos do jogo. • Ações defensivas exigirão a capacidade de recuperar a bola ou neutralizar o adversário por meio de, por exemplo, carga com o corpo, interceptação, desarme, carrinho e cabeceio. • Ações ofensivas exigirão a capacidade de manutenção da posse de bola e progressão de jogo. Para tanto, podem ser usados: fin- ta, domínio, passe, chute e cabeceio. A dificuldade da técnica é determinada pelo grau de complexidade do jogo, sendo o processo pedagógico baseado no aumento progressivo das tarefas ou nas necessidades e potencialidades de cada aluno para a plenitude do aprendizado. 52 Metodologia do ensino de futebol e futsal CONSIDERAÇÕES FINAIS Existe a preocupação eminente com o processo formativo a longo pra- zo, principalmente no ensino de jovens e crianças. Por essa razão, o foco não deve estar empregado na repetição e reprodução de gestos descon- textualizados com o esporte. Para a capacidade de execução das técnicas de maneira eficiente, a competência motora é fundamental, assim como a coordenação dos mo- vimentos elementares para a execução. No entanto, devemos pensar o ensino do esporte não como a construção de gestos técnicos, mas com ações de qualidade para que o atleta consiga se sair bem em qualquer situação imposta pelo jogo. ATIVIDADES 1. As ações técnicas são importantes para o desenvolvimento e a construção do jogo, porém especialistas defendem que o ensino não deve estar pautado só na execução do gesto. Discuta esse tema. 2. As habilidades técnicas podem ser divididas em ações de momentos ofensivos e momentos defensivos. Isso significa que defensores devem priorizar nos treinos as ações defensivas, correto? O que você pensa sobre isso? 3. Suponha que você trabalhe em uma escola de futsal com crianças de sete a oito anos. Sabendo que a relação com a bola é importante, quanto mais repetir o gesto técnico, mais domínio sobre esse gesto a criança terá e mais visível será a evolução. Quão vantajoso você imagina que isso será no desenvolvimento esportivo a longo prazo? REFERÊNCIAS GARGANTA, J. et al. Fundamentos e práticas para o ensino e treino do futebol. In: TAVARES, F. (org.). Jogos Desportivos Coletivos. Ensinar a jogar. Porto: Editora FADEUP, 2013. GONÇALVES, G. Á.; NOGUEIRA, R. M. O. O treinamento específico para goleiros de futebol: o uma proposta de macrociclo. Estudos, vida e saúde, Goiânia, v. 33, n. 4, p. 531-543, jul./ago. 2006. Disponível em: http://seer.pucgoias.edu.br/index.php/estudos/article/ view/136. Acesso em: 2 jun. 2020. JUNIOR, N. B. A Ciência do esporte aplicada ao Futsal. Rio de Janeiro: Sprint, 1998. Princípios táticos do jogo 53 4 Princípios táticos do jogo A palavra tática tem origem grega e significa manobra estratégica. Inicialmente atribuída ao comando de tropas do exército, a expres- são foi apropriada pelo esporte utilizando-a com o mesmo sentido: elaborar estratégias para obtenção da vitória. Porém, elaborar es- tratégias parte de um pressuposto de que há um plano de ação em jogo. Para qualquer atividade cotidiana, organizar-se parece ser imprescindível ao almejar o êxito. E no contexto do futebol e do fut- sal, que são modalidades coletivas com alto grau de complexidade e aleatoriedade, os planos de ação deverão ser ainda mais detalhados entre os participantes e, além disso, alicerçados em movimentos sincronizados. Desde que o futebol e o futsal evoluíram para esportes profissio- nais, as equipes passaram a se estudar mais e buscar meiosde se tornarem mais competitivas. Em um jogo em que a vitória depende de fazer mais gols do que levar, é preciso pensar em estratégias e, mais do que isso, executá-las com sucesso. A execução dessas ações coordenadas, chamadas de táticas, de- pende de práticas, ou seja, para isso, os jogadores precisam ter claro entendimento do que deve ser feito, onde dever ser feito e por que deve ser feito. As práticas que levam o indivíduo a se apropriar da tática ou estratégia é também conhecida por nós como treino. Bom, se o treino é importante, o que devemos treinar? Como pode- mos potencializar o entendimento dos nossos jogadores? O que pode- mos fazer para que cumpram sua função? Como deve ser a disposição deles em quadra ou em campo? Este capítulo se propõe a responder a essas perguntas com base na interpretação do próprio leitor sobre o que está escondido por trás do jogo macro. A interação dos jogadores em diversos momentos característicos pode ser entendida como jogos menores dentro do próprio jogo, e moldar os comportamentos dos jogadores nesses momentos específicos pode ser um ponto de partida para tentar responder sobre o que devemos treinar. 54 Metodologia do ensino de futebol e futsal 4.1 Modelo de jogo Vídeo O que quer dizer modelo de jogo? Esse termo ficou conhecido por ser utilizado pelos estudiosos do esporte, mas poucas pessoas sabem, de fato, ao que ele se refere. Você sabe? É bastante comum que haja certa confusão entre modelo de jogo e sistema tático, porém o mo- delo é muito mais do que a maneira com que o treinador posiciona sua equipe em campo. Segundo Gouveia (2019), o modelo representa a interação entre os jogadores e como eles expressam sua identidade para cada momento do jogo. Para Dias (2014), o modelo de jogo é tudo. É a aproximação do que realmente acontece no jogo com o que o treinador gostaria que acontecesse. Em outras palavras, é a materialização das ideias do professor-treinador para sua equipe. Segundo Gouveia (2019), é um padrão regular que orienta as ações de uma equipe dando a ela identidade e forma. E, de acordo com Leitão (2009), o modelo de jogo se refere ao conjunto de orientações e ações para a partida e o modelo de organização de jogo constitui a originalidade da equipe, sendo com base nisso que o treino para preparação coletiva e desenvolvimento individual passa a fazer sentido. Para isso, torna-se imprescindível que o treinador tenha claras suas intenções para aplicá-las a um modelo que traduza suas ideias a algo concreto. A escolha do modelo de jogo deve estar intimamente ligada ao local onde se insere, pois nem sempre as ideias do treinador, por melhores que sejam, funcionam em todos os contextos. Por isso, é importan- te para o treinador o conhecimento adequado do ambiente onde está inserido, como a cultura do país ou região, o clima local, o clube/insti- tuição, sua história e valores, os jogadores que possui, os adversários etc. (DIAS, 2014). O sucesso do modelo depende de o treinador adaptar suas ideias a todo esse contexto e buscar a identidade que se espera. De acordo com Gouveia (2019), mesmo que o modelo esteja defini- do, ele nunca está completamente terminado, pois pode e deve evoluir qualitativamente, por meio do diálogo, da melhor interpretação por parte dos jogadores e de mais soluções aos problemas que surgem, po- rém isso deve acontecer sem alterar a configuração da ideia principal. Sabe-se que os jogos coletivos com características de invasão, como o futebol ou futsal, devem ser entendidos conforme a sua totalidade, e Princípios táticos do jogo 55 a construção do modelo ou estilo de jogar deve estar pautada nos di- ferentes momentos de jogo, ou seja, o modelo de jogo será construído com base no que se espera do comportamento da equipe nesses vários momentos. O treinador pode se perguntar: “o que eu quero que a mi- nha equipe faça assim que recupera a bola? Finalize a jogada o mais rá- pido possível ou mantenha a bola por mais tempo?”, “e quando minha equipe perde a bola? Pressione o adversário ou feche os espaços de progressão?”. Esses são exemplos genéricos e mais adiante estudare- mos melhor os diferentes momentos e exemplos de comportamentos. Dias (2014) e Gouveia (2019) ainda salientam que não existe um mo- delo de jogo melhor ou pior, a criação depende de todo um processo de acumulação de experiências e autocríticas para aprendizagem cons- tante. O modelo vai se construindo na ideia original do treinador e nas interações com os jogadores, sendo, também, importante a capacidade do treinador de se adaptar às intercorrências que afetam o processo. Assim, fica claro que o sistema tático, apesar de ser alvo das análises de comentaristas e torcedores, não é o ponto mais importante, mas deve ser entendido como a estrutura que permitirá a execução mais adequada do modelo pensado. São classificados como esportes de invasão aqueles que possuem características comuns na sua ló- gica de progressão e de conquista de terreno do adversário para chegar à meta, como o futebol, futsal, basquetebol, handebol, rúgbi, futebol americano etc. Curiosidade Para buscar mais informações sobre o assunto, não deixe de acessar o site da Universidade do Futebol. Lá é possível acessar diversos artigos, reportagens e vídeos produzidos por renomados especialistas do futebol e do futsal. Disponível em: https:// universidadedofutebol.com.br/. Acesso em: 24 jun. 2020. Site 4.2 Momentos do jogo Vídeo O futebol e o futsal são classificados como esportes coletivos de invasão e possuem características em comum. Durante a partida de ambas as modalidades, podemos enxergar quatro momentos, que surgem durante o jogo de maneira aleatória (DIAS, 2016). A identificação desses diferentes momentos é o que deverá guiar o professor- -treinador, facilitando a análise do jogo e o processo de estruturação do treino. É com base nisso que o treino se dá e os comportamentos são praticados, e isso explica a importância do treino. Figura 1 Os momentos do jogo Transição ofensiva Transição defensiva Organização ofensiva Organização defensiva Adaptada pelo autor com base em Gouveia, 2019. 56 Metodologia do ensino de futebol e futsal Para modular a unidade de treinamento da equipe, o treinador deve se perguntar qual comportamento coletivo e individual é esperado em cada um desses momentos. 4.2.1 Momento de organização ofensiva A organização ofensiva refere-se aos comportamentos que a equi- pe assume quando possui a bola, começa a construir a jogada, procu- ra progredir no terreno e cria as situações para gol. Essa organização pode ter seu início no tiro de meta com o goleiro, ao passar pelo setor de meio de campo, até chegar ao campo adversário, ou seja, ela pode utilizar um extenso território, saindo, praticamente, de uma extremida- de à outra e utilizando jogadores de diversas posições e funções. Com base nessas características, surge a ideia de dividir esse momento em fases ou submomentos de acordo com a zona de campo. Essa divisão permite melhor entendimento da organização ofensiva. A organização ofensiva é dividida em 3 fases ou submomentos: • 1a Fase – Fase de construção: é geralmente iniciada pelo golei- ro na saída de bola e tem como objetivo avançar ao terreno do adversário.Figura 2 Fases da organização ofensiva 1ª - Fase de construção 2ª - Fase de criação 3ª - Fase de finalização so ftp ixe l/S hu tte rs to ck • 2a Fase – Fase de criação: é o momen- to de criação e tentativa de desequili- brar a defesa adversária; acontece no meio de campo. • 3a Fase – Fase de Finalização: já pró- ximos à meta adversária, os jogado- res têm como objetivo criar situações de finalização e gols. Essa divisão em submomentos de acor- do com as zonas do campo baseadas na progressão (iniciando de cima para baixo) é um facilitador para entender em qual setor a equipe é mais frágil, auxiliando o professor-treinador a mapear cada eta- pa e construir tarefas mais específicasde treinamento. Princípios táticos do jogo 57 4.2.2 Momento de organização defensiva A organização defensiva são os comportamentos assumidos pela equipe quando os jogadores não possuem a bola e pretendem se orga- nizar para impedir que a equipe adversária faça gols. A ideia é fechar os espaços para minimizar as chances do adversário (DIAS, 2016). As ações pré-determinadas aqui serão fundamentais para compor um modelo de jogo e, nesse momento, o comportamento da equipe deverá ser treina- do para que as ações sejam coordenadas. Um exemplo simples disso é a adoção de uma marcação por zona – por setor –, ou marcação individual, na qual cada jogador tem o seu oponente específico. 4.2.3 Momento de transição ofensiva A transição ofensiva corresponde ao momento transitório entre a ocasião em que a equipe recupera a bola e o momento em que começa a se organizar ofensivamente, por isso também é chamada de transi- ção defesa-ataque. Nesse curto espaço de tempo, observam-se atitudes dos jogadores envolvidos e essas atitudes podem se transformar em padrões. Em suma, corresponde aos comportamentos adotados logo após a recuperação da bola, ou seja, melhorar a eficiência desse mo- mento tende a surpreender a equipe adversária, valendo-se da desor- ganização momentânea do oponente. 4.2.4 Momento de transição defensiva A transição defensiva se refere às ações logo após a perda da bola. Normalmente se espera que o comportamento de resposta deva ser imediato a fim de não permitir que o adversário se aproveite da desor- ganização momentânea. Os momentos de transição são considerados fundamentais no futebol e no futsal modernos, pois possuem potencial para desequilibrar. Assim, equipes que executam a transição defensiva imediata e de maneira coletiva conseguem se aproveitar dos segundos de desordem ou de alguma indecisão proporcionados pelo time que está atacando. É importante salientar que essa divisão serve apenas de referência, ou seja, é uma orientação e se torna evidente somente no plano didá- tico, pois durante os jogos esses momentos acontecem aleatoriamente e de modo imprevisível (GOUVEIA, 2019). Recomendamos a página Pedagogia do Futsal, do professor Wilton Santana, um dos maiores nomes do esporte na atualidade. No site, é possível acessar vídeos de treinamento, além de material didático para leitura. Disponível em: https:// pedagogiadofutsal.com.br/. Acesso em: 24 jun. 2020. Site 58 Metodologia do ensino de futebol e futsal 4.3 Princípios de jogo Vídeo Os princípios de jogo correspondem a toda intenção traduzida em comportamentos individuais e coletivos para construção das ideias de jogo (DIAS, 2014). Esses princípios, ainda segundo o autor, podem ser classificados em fundamentais, específicos e relacionados com a ideia de jogo. Os princípios táticos são definidos como um conjunto de nor- mas sobre o jogo que proporcionam aos jogadores a possibilidade de atingirem rapidamente soluções táticas e, por possuírem esse caráter, precisam ser subentendidos e estar presentes nos comportamentos dos jogadores durante uma partida (COSTA et al., 2009). Para Dias (2014), os princípios fundamentais se referem a recusar a inferioridade numérica e criar superioridade numérica a todo momento durante o jogo. Os princípios específicos são divididos em ofensivos (mobi- lidade, espaço, progressão e penetração) e defensivos (cobertura, conten- ção, equilíbrio e compactação). Já os princípios relacionados com a ideia de jogo estão ancorados nos momentos de uma partida citados na sessão anterior, as organizações e transições, tanto ofensivas como defensivas. Observe a seguir alguns exemplos de princípios que podem ser ado- tados a cada momento. Você irá perceber que, passo a passo, construi- remos a maneira de jogar. Princípios da organização ofensiva: posse de bola e rápida cir- culação com verticalização das jogadas. O exemplo de princípio aqui proposto por Dias (2014) deixa claro o objetivo para esse momento e com o propósito preestabelecido fica mais fácil definir os conteú- dos das sessões de treinamento, ou seja, adotaremos ao treinamento tarefas que possibilitem alcançar essas metas. Suponha agora que o princípio seja jogar com amplitude máxima do campo (CORREIA, 2014), isso significa que quando minha equipe possui a bola, eu preciso criar situações para que essa condição se concretize. Nesse contexto, en- tram os subprincípios, ou seja, o que eu preciso fazer para o princípio funcionar. Nesse caso, podemos citar troca de passe em segurança, circulação da bola até provocar erro do adversário, e dar o menor nú- mero de toques possível por jogador. Ao optar como princípio ofensivo a verticalização e rápida finalização ao gol, temos, então, que propor circunstâncias que induzam a esse comportamento coletivo desejado, como a infiltração, a ultrapassagem e as jogadas de linha de fundo. Princípios táticos do jogo 59 Princípios da organização defensiva: defender por zona e manter média pressão. Assim como no exemplo anterior, os princípios da orga- nização defensiva podem conter derivações que ajudarão a condicionar os jogadores a cumprirem a função. Exemplos são induzir o adversário para o lado do campo, fazer a cobertura do colega e orientar o corpo para fechar a possível progressão da bola. Observe que nesse exemplo o professor-treinador terá como missão buscar meios para condicionar os atletas a cumprirem esse princípio (GOUVEIA, 2019). Podemos usar também como princípio da organização defensiva a compactação. Com base nessa ideia, manipulamos o treinamento para que os jogadores se adaptem e se posicionem próximos uns aos outros quando estiverem sem a bola, a fim de inibir a progressão do oponente e fechar sua meta. Princípios da transição ofensiva: aproveitar a desorganização posicional do adversário. Para Dias (2018), com base nesse princípio, o treino deve conter elementos que permitam êxito nesse aspecto, como promover a saída da bola da área de pressão por meio de uma movimentação de um jogador de frente, ou adquirir profundidade para ganhar tempo na organização ofensiva da equipe (GOUVEIA, 2019). Podemos também utilizar como princípio o famoso contra-ataque, que consiste em sair em maior velocidade possível para finalizar ao gol adversário após a recuperação da bola. Princípios da transição defensiva: diminuir os espaços e investir ra- pidamente contra o portador da bola. Nesse caso, o objetivo será pres- sionar imediatamente o adversário que possui a bola, evitando que ele a tire do setor e progrida. No caso de insucesso na reação imediata, um comportamento adequado pode ser o de fechar o lado de dentro do campo, impossibilitando a progressão diretamente ao gol. Outro exemplo seria a contenção, ou seja, a indução do comportamento de atrasar a progressão do adversário, com o intuito de permitir que os companheiros restabeleçam suas posições defensivas. Com base no treinamento pautado nos princípios de jogo, adequados ao modelo sugerido pelo professor-treinador, os jogadores passam a ado- tar comportamentos individuais e coletivos que sincronizam e facilitam a estratégia da equipe. O treino organizado pelos princípios auxilia os jo- gadores na orientação corporal em relação à bola, na proteção à própria baliza, nas ações diante aos adversários, nas relações com companheiros e nas melhores respostas ao dinamismo do jogo (COSTA et al., 2009). Recomendamos a leitura de Sport Lisboa e Benfica 2013/2014: uma visão sobre o modelo de jogo de Jorge Jesus e sua ope- racionalização, de Hugo Dias. O autor analisa com detalhes o trabalho do treinador Jorge Jesus (técnico do Flamengo), durante sua temporada no Benfica. O livro ainda detalha os modelos e princípios de jogo pre- feridos e utilizados pelo treinador português. DIAS, H. Estoril: Prime Books, 2014. Livro 60 Metodologia do ensino de futebol e futsal 4.4 Funções e posições no futebol Vídeo É possível encontrar definições e variações diversas paraas po- sições dos jogadores, ou seja, a distribuição obedece a uma divisão simples do campo, que tem partes de defesa, meio-campo e ataque (GUIMARÃES et al, 2014). As posições clássicas do futebol são as de goleiro, zagueiro, meio-campo e ataque. Essas posições variam den- tro do contexto da estrutura escolhida e suas funções também po- dem ser diversificadas. O goleiro tem como função proteger sua meta e, para isso, é permitido a esse jogador o uso de qualquer parte do corpo dentro da área. Segundo Guimarães et al. (2014), a posição de goleiro foi a que mais evoluiu, devido às modificações das regras, como a proibição do uso das mãos no recuo para dentro da área, o que aumentou a frequência do uso dos pés. Dessa forma, passes médios e longos são pré-requisitos de um bom goleiro, além de boa agilidade e rapidez nas decisões para saídas de gol. Os zagueiros devem, principalmente, impedir a progressão do adversário e proteger seu goleiro, ou seja, devem ocupar os espaços do campo defensivo, sendo fortes no jogo aéreo e afastando a bola em situações de perigo. No momento ofensivo são eles que iniciam a construção da jogada. Geralmente, zagueiros têm menos mobilidade do que os outros jogadores, mas procuram manter o setor resguardado e organizado, precisando de velocidade para a cobertura defensiva. Os laterais possuem importante função defensiva e, também, ofen- siva. No momento da organização defensiva, geralmente preenchem o espaço mantendo a linha dos zagueiros centrais e, em seguida, explo- ram o corredor adversário ajudando a equipe a progredir (GUIMARÃES et al., 2014). Comumente são jogadores que possuem boa capacida- de física devido à exigência imposta para cumprir esse papel. Depen- dendo da estrutura tática, esses atletas são chamados de alas e atuam mais ofensivamente. Possuem como características boa técnica para cruzamentos, força no duelo 1 contra 1, e entendimento de jogo para reduzir os espaços do adversário com a bola (GOUVEIA, 2019). Entre os meio-campistas há várias funções específicas e, nesse caso, as nomenclaturas também podem variar. Os meias com funções defensivas são chamados de volantes, que têm papel crucial, pois devem dar equilíbrio e sustentação à estrutura da equipe (GOUVEIA, 2019). Princípios táticos do jogo 61 Os meias armadores são os criadores, responsáveis pela criatividade da equipe. Os jogadores dessa função normalmente raciocinam com extrema velocidade e ditam o ritmo da partida. Os meios extremos possuem função semelhante à dos alas, sendo uma posição bastante comum quando se opta por jogar com meio-campistas em linha. Jogam próximos à linha lateral ofensiva e movimentam-se para abrir espaços para os laterais (COSTA et al., 2014). Os atacantes são os jogadores mais próximos das metas adversárias e criam as maiores e melhores oportunidades de gol, com o dever de ter a capacidade de jogar entrelinhas. As variações comuns são as de atacante de beirada de campo e atacante de área, também chamado de centroavante. O primeiro tem características de muita mobilidade, geralmente é rápido e se move verticalmente para romper a linha adversária; o segundo possui competência destacada como finalizador da equipe, boa capacidade de ocupação de espaços e, geralmente, é bom cabeceador. É o jogador que tem a função de finalizar as jogadas (GUIMARÃES et al., 2014). Indicamos o livro A pirâ- mide invertida: a história da tática no futebol, de Jonathan Wilson. Essa obra percorre a história da tática do futebol desde a origem do jogo com elementos de cultura e curiosidades. Várias ilustrações ajudam o leitor a compreender as estruturas táticas citadas. Wilson, J. Campinas: Grande Área, 2016. Livro 4.5 Sistemas táticos no futebol Vídeo O sistema tático é também chamado de estrutura e permite uma distribuição dos jogadores no espaço de jogo para cumprimento das propostas de organização da equipe (GOUVEIA, 2019). Ao longo dos anos, o futebol evoluiu em diversos aspectos, inclusive na maneira dos jogadores se organizarem em campo. Segundo Guimarães et al. (2014) e Leitão (2009), o primeiro time a adotar esse sistema foi o Nottingham Forest, em 1880, e em seguida copiado por diversas equipes britânicas, originando o que ficou conhecida como formação clássica: goleiro, dois zagueiros, três meias e cinco atacantes. A partir de 1925 e da evolução das regras de jogo – principalmente a do impedimento –, os jogadores adotaram uma estratégia para rom- per a linha da formação clássica. Esse sistema ficou conhecido como WM, que tinha estruturação 3-2-2-3 e é considerado pelos estudiosos do futebol como o ponto de partida para todos os demais sistemas modernos (LEITÃO, 2009). 62 Metodologia do ensino de futebol e futsal Por volta da década de 1950, mais um defensor foi adicionado à linha de defesa dando origem ao quarto zagueiro e à linha de quatro defensores, originalmen- te o 4-2-4. Em seguida, surge o 4-3-3 e logo o 4-4-3 com suas variações: losango e quadrado no meio de campo (LEITÃO, 2009). Já na década de 1980 se popu- larizou o 3-5-2. As estruturas táticas mais comuns, apesar de diversificações, estão apresentadas na fi- gura a seguir. Figura 3 Estruturação 3-2-2-3 so ftp ixe l/S hu tte rs to ck Figura 4 Formações 4-4-2 e variações (com quadrado no meio/com losango/com 2 linhas) so ftp ixe l/S hu tte rs to ck Sistema 4-1-4-1 Sistema 3-5-2 O sistema tático nada mais é que operacionalizar as ideias. Para Leitão (2009), por exemplo, o esquema tático só faz sentido como re- ferência se potencializar a ação dos jogadores e os comportamentos in- dividuais e coletivos da equipe, para o cumprimento da lógica do jogo, Para maior aprofunda- mento nesse assunto recomendamos o livro Periodização Tática: o futebol arte alicerçado em critérios, que destaca conceitos e aplicações práticas destes, além de propostas de organização e planejamento de treino, como a estruturação do treino semanal dentro do modelo de jogo. PIVETTI, B. São Paulo: Phorte, 2012. Livro Princípios táticos do jogo 63 ocupação mais equilibrada do espaço de jogo, a manutenção da posse da bola e a aproximação do alvo. Então, não se trata de construir uma referência com fim em si mes- ma. A lógica do jogo não pode, jamais, ser perdida de vista. De fato, o sistema tático é unicamente a estrutura posicional que permitirá aos jogadores melhor sintonia coletiva. 4.6 Funções e posições no futsal Vídeo A evolução do futsal o tornou um esporte muito mais dinâmico que no passado, ou seja, antigamente, as funções e os posicionamentos nesse esporte eram mais específicos. No futsal contemporâneo, os jogadores atuam no princípio de ocupação de espaços na quadra, então, o conceito de posicionamento se tornou obsoleto. Assim, os atletas não possuem mais posições fixas, mas funções, às vezes múltiplas, determinadas de acordo com suas características (FERRAZ, 2013). Porém, tradicionalmen- te, podemos reconhecer as seguintes funções e posições: Ily a ko vs hi k /S hu tte rs to ck Figura 5 Posições tradicionais e distribuição em quadra Goleiro Fixo Ala Pivô O goleiro tem como papel principal o uso das mãos para evitar gols da equipe adversária. Fisicamente, ele se destaca pela agilidade e pelas reações rápidas. Além dessas características já conhecidas, o goleiro de 64 Metodologia do ensino de futebol e futsal futsal possui mais funções, ele é o primeiro jogador na fase de constru- ção da equipe. Portanto, além das habilidades defensivas, o goleiro de futsal é fundamental na reposição de bola e na participação com os pés nos momentos ofensivos (BATISTA et al., 2014). O fixo destaca-se pela capacidade de desarme e de liderança na or- ganização defensiva da equipe, porém, assim como o goleiro, participa ativamente da fase inicial da construção das jogadas. Por isso, o bom passe é uma das características para exercer bem essa função. Na fase de criação, o fixo geralmente inicia manobras ofensivase se apresenta como alternativa para a finalização de média e longa distância. Os alas normalmente atuam pelas laterais da quadra e têm função fundamental na criação das jogadas. Possuem como característica mobili- dade e habilidade, sendo responsáveis pelas ações criativas de desequili- brar o sistema defensivo da equipe adversária com dribles e fintas. O pivô é o jogador referência do momento ofensivo, tanto para re- ceber e distribuir as bolas comandando o ataque quanto para se mo- vimentar, abrindo, assim, espaços para os demais jogadores chegarem por trás. Normalmente o jogador que recebe essa função tem boa orien- tação corporal para jogar de costas para o gol e boa capacidade física para giros rápidos, além de excelente finalização (BATISTA et al., 2014). 4.7 Sistemas táticos no futsal Vídeo No futsal, a estrutura tática – ou sistema tático – é o termo conhecido para descrever o posicionamento de cada jogador dentro da formação da equipe. Os sistemas utilizados dependem das características especí- ficas dos jogadores, suas funções determinadas, adversário enfrentado e situação do jogo. Não é incomum uma equipe variar sua estrutura tática mais de uma vez dentro o jogo. A maneira de posicionar a equipe em quadra varia conforme a intenção coletiva do time e para facilitar o senso e a orientação de espaço em quadra, algumas referências espa- ciais são utilizadas pelo treinador para facilitar a compreensão. Os problemas relacionados ao espaço podem ser ilustrados da seguinte maneira: para superar os adversários, a equipe deve coordenar as ações ofensivas, com o intuito de finalizar de ma- neira bem-sucedida; e defensivas, com o intuito de impedir a fi- nalização adversária bem-sucedida. (BATISTA et al., 2014, p. 1042) Recomendamos o livro Futsal, de Antônio Navarro e Roberto Almeida, que aborda a iniciação espor- tiva, o alto rendimento, a psicologia do esporte, a fisiologia do exercício, a educação física escolar, o treinamento esportivo (físico, tático e técnico) e convida a uma reflexão sobre a educação, as rela- ções sociais e, até mesmo, econômicas, entre os que vivem do futsal. NAVARRO, A. C.; ALMEIDA, R. São Paulo: Phorte, 2008. Livro Princípios táticos do jogo 65 É denominada como sistemas de jogo a maneira como os atletas se dispõem em quadra. Os sistemas comumente utilizados são as forma- ções 2x2, 2x1x1, 3x1, 1x3, 4x0, 0x4, além dos sistemas em rodízio. O sistema de jogo representa a base da formação da equipe e funciona de modo interdependente com os padrões de jogo. Para Michelin et al. (2012), com base na definição do sistema ado- tado, o segundo passo é definir o tipo de marcação que a equipe de- verá utilizar. Basicamente, pode-se definir a marcação zonal – ou por zona –, em que cada jogador fica responsável por um setor da quadra; marcação individual, em que cada jogador fica responsável por marcar individualmente seu oponente, independentemente do local da quadra em que se encontrar; ou marcação mista, que seria uma combinação desses dois panoramas, em que se marca individualmente após o mo- mento que o adversário adentrar determinada zona. Na figura a seguir destacaremos algumas das formações de jogo utilizadas no futsal, segundo Freitas, Henrique e Nolasco (2008). Figura 6 Formações de jogo Ily a ko vs hi k /S hu tte rs to ck 2-2 2-1-1 3-1 1-3 4-0 Sistema 2x2 Esse sistema é o mais utilizado na iniciação ao esporte pela simpli- cidade e facilidade de entendimento por parte das crianças. É conside- rado o precursor de outros sistemas atuais e consiste em utilizar duas linhas de dois jogadores. A posição inicial é formada por um fixo e um ala posicionados um em cada lado externamente à área, ou outros dois jogadores, pivô e ala, alinhados um em cada lado na quadra de ataque. 66 Metodologia do ensino de futebol e futsal Sistema 2x1x1 O sistema 2x1x1 pode ser considerado uma progressão do sistema anterior, relativamente simples e de fácil aprendizagem. Assim como a ilustração da Figura 6, dois jogadores de defesa se posicionam normal- mente ao lado da área, um dos alas em uma posição média e o pivô buscando explorar o espaço mais próximo ao gol adversário. Sistema 3x1 Esse é um dos sistemas mais utilizados no futsal, pois possibilita inúmeras variações e implementações de jogadas ensaiadas, além do surgimento das variações de rodízio. Possui excelente balanço defen- sivo como característica, porém exige grande capacidade física para as transições para o ataque. O pivô normalmente irá se posicionar próxi- mo à marca do pênalti do adversário, os alas e o fixo se movimentam e são responsáveis pela construção das jogadas e por encontrar o pivô. Sistema 1x3 Nesse sistema, extremamente ofensivo, apenas um jogador perma- nece fixo na defesa e três jogadores no ataque. Parece ser um sistema viável para equipes de alto nível técnico e em situações extremas de desvantagem no placar. Sistema 4x0 Esse sistema é caracterizado pela colocação dos quatro jogadores na parte defensiva da quadra, e é usado em situação de vantagem no placar para a manutenção do resultado. É um sistema que exige expe- riência dos jogadores e bom período de treinamento, portanto, é mais comum ser observado em equipes de alto rendimento. Um termo bastante utilizado no futsal é padrão de jogo, que se refe- re a diversas formas de movimentação dos atletas nas quais ocorrem trocas de posições de modo planejado e organizado. Ele é representa- do pelo modo como a equipe age sobre determinadas situações. Ape- sar da imprevisibilidade do jogo, as equipes buscam a padronização baseada nos eventos que se repetem ao longo do tempo, passíveis de serem modeláveis (BATISTA et al., 2014; FREITAS, HENRIQUE, NOLASCO, 2008). Os padrões seguem o sistema de jogo adotado e consistem em movimentos coordenados denominados de manobras na literatura es- portiva(MICHELIN, 2012). Para aumentar o conhecimento na área de treinamento tático, acesse a página Periodização tática, de Vitor Frade. O professor Frade é referência no assunto e o site possui diversos artigos e matérias. Disponível em: http:// periodizacaotactica.com/. Acesso em: 24 jun. 2020. Site http://periodizacaotactica.com/ http://periodizacaotactica.com/ Princípios táticos do jogo 67 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os pontos aqui apresentados permitem ao futuro professor com- preender que a elaboração e estruturação do treino técnico-tático deve obedecer a princípios para que faça algum sentido no jogo. Cada sessão de treinamento, ou unidade de treinamento, deve possuir um propósito para que os processos ou caminhos que levam a equipe ao sucesso ou o jogador ao desempenho máximo sejam alicerçados. Portanto, só pode- mos esperar que aconteça no jogo o que foi proposto em treinamento. É comum nos depararmos com o professor ou treinador que se indis- põe com a equipe, gesticula com veemência ou cobra excessivamente, às vezes aos berros, devido ao erro coletivo numa jogada ou ação individual equivocada. O treinador precisa pensar: “será que os preparei correta- mente?”, “será que consegui transmitir o que eu quero?”, “será que sei o que eu quero?”. O treino deveria servir exatamente para isso, ajustar comportamentos para cada momento do jogo, e esses comportamentos devem estar em concordância com as ideias de como jogar bem. ATIVIDADES 1. Neste capítulo, foi abordada a importância de se adotar um modelo de jogo, pois este parece ser um ponto fundamental para que as unidades de treino tenham sentido e objetivo. Por qual razão o sucesso do modelo depende da compreensão do contexto local? 2. A expressão jogar bem é subjetiva e pessoal, mas na busca por um significado, é possível definir que o jogar bem resulta da coerência entre o plano ideológico e o prático. O que isso quer dizer? 3. Suponhamos que você assuma o comando de uma equipe competitiva de determinado colégio. Com base nos estudos deste capítulo, qual é o critério para a escolha do esquema tático? REFERÊNCIASBATISTA, N. R. et al. Modelo do jogo de futsal e subsídios para o ensino. Movimento, Porto Alegre, v. 20, n. 3, p. 1039-1060, jul./set. 2014. Disponível em: http://www.redalyc.org/ articulo.oa?id=115332101010. Acesso em: 24 jun. 2020. CORREIA, P.; RIBAS, T.; SILVA, V. Uma ideia de jogo, momento de organização ofensiva, 1 ed. Estoril: Prime Books, 2014. COSTA, I. T. et al. Princípios Táticos do Jogo de Futebol: conceitos e aplicação. Motriz, Rio Claro, v. 15, n. 3, p. 657-668, jul./set. 2009. DIAS, H. Sport Lisboa e Benfica 2013/2014: uma visão sobre o modelo de jogo de Jorge Jesus e sua operacionalização. Estoril: Prime Books, 2014. 68 Metodologia do ensino de futebol e futsal DIAS, H. A Construção de um jogar. Estoril: Prime Books, 2016. FERRAZ, M. P. M. Análise das possibilidades táticas do sistema 3 x 1 no futsal. EFDeportes, Buenos aires, ano 18, n. 180, 2013. Disponível em: https://www.efdeportes.com/efd180/ taticas-do-sistema-3x1-no-futsal.htm. Acesso em: 24 jun. 2020. FREITAS, D. C.; HENRIQUE, J.; NOLASCO, R. C. Aspectos técnicos, táticos e regulamentares do futsal sob a ótica de treinadores experts. Efdeportes, Buenos aires, ano 13, n. 125, 2008. GOUVEIA, V. Futebol: treinar para jogar. 1 ed. Estoril: Prime Books, 2019. GUIMARÃES, M. B. et al. As posições no futebol e suas especificidades. Bras Futebol, v. 7, n. 2, p. 71-83, jul./dez., 2014. JUNIOR, N. B. A ciência do esporte aplicada ao Futsal. Rio de Janeiro: Sprint, 1998. LEITÃO, R. A. A. O jogo de futebol: investigação de sua estrutura, de seus modelos e da inteligência de jogo do ponto de vista da complexidade. Campinas, 2009. Tese (Doutorado em Educação Física) – Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas. Disponível em: http://repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/274779. Acesso em: 24 jun. 2020. MICHELINI, M. C. et al. Futsal: Tática defensiva contemporânea e a teoria de ensino dos jogos esportivos coletivos de Claude Bayer. Revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 10, n. 1, p. 20-37, jan./abr. 2012. https://www.efdeportes.com/efd180/taticas-do-sistema-3x1-no-futsal.htm https://www.efdeportes.com/efd180/taticas-do-sistema-3x1-no-futsal.htm http://www.efdeportes http://repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/274779 Fisiologia e preparação física 69 5 Fisiologia e preparação física Para entendermos o papel que um programa de treinamento pode desempenhar no organismo humano, adentraremos no uni- verso da fisiologia do exercício, mais precisamente naquela aplicada ao futebol e ao futsal. Por meio de adaptações fisiológicas, propor- cionadas pelo treino, são promovidas melhorias nas capacidades e, consequentemente, maior aptidão física para o esporte. O futebol, assim como o futsal, é um esporte considerado de característica acíclica e intermitente – ou seja, durante o tempo total de jogo, os atletas se submetem a ações com diferentes tipos de esforços, como corridas em diferentes velocidades e distâncias, saltos, arran- ques, acelerações e desacelerações, mudanças de direção etc. Neste capítulo, conheceremos as competências físicas impor- tantes para o desempenho do jogador, pois é com base no enten- dimento das demandas do jogo que se elabora e se estrutura o treinamento. Também discutiremos os cuidados com o processo de formação esportiva de crianças e jovens, denominado desenvol- vimento esportivo em longo prazo. É preciso que a formação do atleta seja vista como uma constru- ção alicerçada por diversos blocos, que deverão estar devidamente encaixados. Cada etapa desse processo exige um olhar especial, e deixar de enxergar as crianças como adultos em miniaturas já é um bom começo. Os modelos de desenvolvimento de crianças sempre obedeceram ao critério da idade cronológica. Porém, novas pro- postas de modelo vêm sendo estudadas para que a idade biológica de cada uma seja respeitada, já que, dependendo do período ma- turacional, a assimilação e acomodação dos conteúdos propostos têm resultados diferentes. Com isso, será possível elaborar uma estrutura de trabalho que leve em consideração o período propício para determinadas capacidades físicas. 70 Metodologia do ensino de futebol e futsal É com base nessas informações que o professor/treinador inicia o processo de criação e passa a ser capaz de responder a estas per- guntas: o que treinar? Quando treinar? Quem treinar? As demandas fisiológicas dependerão de tudo o que acontece no jogo, do estilo da equipe, da exigência do adversário, dos fatores ambientais e dos aspectos psicológicos. Mas, apesar de cada partida oferecer uma condição, é possível traçar um perfil das modalidades em questão. 5.1 Demandas fisiológicas Vídeo O desempenho esportivo é determinado pelas características técni- cas, táticas, físicas e psicológicas. Nas últimas décadas, o aspecto físico tem sido grande alvo de interesse de pesquisadores na busca pelo en- tendimento sobre como o treinamento pode alterar os fatores fisioló- gicos e aumentar a performance (BANGSBO, 2015). O futebol é uma modalidade que depende de muitas variáveis fisioló- gicas. Assim, tanto o metabolismo aeróbio quanto o anaeróbio estão pre- sentes, e os esforços de alta intensidade com curta duração se interpõem aos períodos de menor intensidade e maior duração. Essa característica, associada à diversificação de gestos, conceitua o esporte como intermiten- te e acíclico, do ponto de vista fisiológico (BARROS NETO; GUERRA, 2004). O treinamento pode ser considerado um conjunto de tarefas que objetiva abalar a homeostase orgânica, ou seja, causar estresse físico. A adaptação a essa sequência de estímulos levará ao que alguns auto- res chamam de supercompensação – termo utilizado para identificar a condição física melhorada. Porém, para que saibamos o que ou quanto se deve ser treinado, é necessário possuirmos um aprofundado conhe- cimento das características da modalidade. Desse modo, quais são as demandas fisiológicas em uma partida de futebol ou futsal? Para se ter uma correta informação sobre as cargas fisiológicas du- rante a partida e para a estruturação racional do treinamento, as ob- servações devem ser feitas em jogos oficiais. As sobrecargas impostas durante uma partida, para melhor entendimento, são divididas em car- gas internas e cargas externas. As cargas internas correspondem às respostas do organismo ao esforço. Frequência cardíaca (FC), lactato sanguíneo ou pres- Fisiologia e preparação física 71 são arterial são algumas respostas fisiológicas ao estímulo recebido (BOURDON et al., 2017). Já as cargas externas se referem à tarefa a que o indivíduo é exposto (o que está fazendo), como a distância per- corrida, o tempo de duração e os arranques realizados. Sendo assim, os fatores a serem identificados são: distância total percorrida; por- centagem da corrida em alta intensidade; tempo de jogo; número de arranques e acelerações; e a frequência cardíaca, que corresponde à carga interna (GOMES; SOUZA, 2008). Para Bourdon et al. (2017), a mensuração das cargas é fundamental e as cargas internas e externas devem ser utilizadas de maneira com- binada para caracterizar o nível de esforço. A tecnologia hoje auxilia na mensuração rápida e precisa de muitas dessas ações de jogo; a grande maioria dos clubes, nas principais ligas, utilizam aparelhos GPS (global position system) acoplados a um frequencímetro, o qual permite a leitu- ra, em tempo real, das ações dos jogadores em campo. com bola mais de 23 km/h de 19,1 a 23 km/h de 14,1 a 19 km/h de 11,1 a 14 km/h de 0 a 11 km/h Figura 1 Distribuição das médias de velocidade da distância total percorrida por uma equipe em uma partida Fonte: FIFA, 2020, p. 126. O gráfico apresentado na Figura 1 demonstra a distribuição das velocidades, utilizadas pelos jogadores, dentro da média da distância total percorrida. As características mudam bastante de acordo com a função e posição em campo; porém, em média, um jogador percorre uma distância total de 10 a14 km, segundo FIFA (2020). Podemos observar, pelo gráfico, que uma pequena parte desse to- tal corresponde a altas intensidades, o que representaria, de acordo com FIFA (2020), 500 a 800 m de corridas em alta intensidade (19 a 23 km/h) e 200 a 350 m de arranques (+ de 23 km/h). Apesar de haver grande predominância dos deslocamentos de média e baixa intensida- 72 Metodologia do ensino de futebol e futsal des, são as ações intensas, as quais definem o jogo, que poderiam supor uma maior relevância do metabolismo aeróbio (FIFA, 2020). Em uma análise feita com base em 370 jogos da Premier League – primeira divisão da Inglaterra e um dos campeonatos mais importan- tes do mundo –, durante a temporada 2005/2006, foram encontrados os seguintes valores de corridas de alta intensidade e distância total percor- rida por posição: meias extremos com 3.138 e 11.535 m; meios-campis- tas com 2.825 e 11.450 m; laterais com 2.605 e 10.710 m; atacantes com 2.341 e 10.314 m; e zagueiros com 1.834 e 9.885 m (BRADLEY et al., 2009). 00 :0 0: 00 00 :1 5: 00 00 :3 0: 00 00 :4 5: 00 01 :0 0: 00 01 :1 5: 00 01 :3 0: 00 01 :4 5: 00 60 70 80 90 100 % d e FC m áx . Tempos de partida (hr:min:seg) Figura 2 Variação da frequência cardíaca durante uma partida Fonte: FIFA, 2020, p. 125. O treinamento físico tem como objetivo capacitar o futebolista a su- perar as demandas físicas solicitadas durante o jogo. A Figura 2 repre- senta a resposta média da frequência cardíaca (FC) durante uma partida de futebol; a zona de 90 a 100 apresenta os valores acima de 90% da FC máxima, demonstrando que, em boa parte do jogo, a equipe se mantém nas zonas de 70 a 80 e de 80 a 90. Essa informação ressalta a importân- cia de se ter um bom condicionamento do sistema cardiorrespiratório. 5.1.1 O treinamento aeróbio Para Barros Neto e Guerra (2004), os objetivos do treinamento ae- róbio são: aumentar a capacidade do sistema cardiovascular em trans- Fisiologia e preparação física 73 portar oxigênio aos músculos solicitados; aumentar a capacidade dos músculos em utilizar o oxigênio fornecido e em oxidar ácidos graxos; e, por fim, aumentar a velocidade de recuperação após ações intensas. O treinamento de resistência aeróbia é de importância substancial, pois o aumento das capacidades aeróbias do organismo forma a base funcional necessária para o aperfeiçoamento de outros aspectos. No futebol e no futsal, essa é a base de apoio para a resistência específica (GOMES; SOUZA, 2008). Os exercícios mais eficientes para o desenvolvimento da capaci- dade aeróbia devem ser feitos no nível um pouco abaixo do limiar anaeróbio, ou seja, em intensidades nas quais os níveis de lactato permaneçam entre 3 a 4 mol (BARROS NETO; GUERRA, 2004). Com essa intensidade, é possível manter um equilíbrio entre os níveis de FC, acidose e consumo máximo de oxigênio. Para Bangsbo (2015), o treinamento aeróbio pode ser divido em três áreas: aeróbio de baixa intensidade, de moderada intensidade e de alta intensidade; além disso, ele pode ocorrer com base na frequência cardía- ca. Em esportes coletivos, esse treinamento se dará em forma de jogo. Resistência especial é o nome utilizado para se referir ao treina- mento voltado ao aumento da capacidade aeróbia dentro das espe- cificidades do jogo, utilizando-se da estrutura e da funcionalidade da partida para se aproximar do aspecto biomecânico da atividade. Esses aspectos serão abordados na sessão 5.3. 5.1.2 O treinamento anaeróbio O treinamento anaeróbio pode ser dividido em lático e alático. O primeiro possui o objetivo de aumentar a capacidade do músculo em realizar atividades de alta intensidade e em um maior número de vezes. Segundo Gomes e Souza (2008), o fator limitante da capacida- de de produção de energia por esse sistema é a alta concentração de lactato, produto da glicólise anaeróbia, que pode levar à diminui- ção da capacidade contrátil dos músculos. Ao determinar a duração do exercício para o treinamento, deve-se levar em consideração que, por volta dos 20 a 40 segundos em intensidade alta, esse sistema atinge seu limite. Portanto, o método mais eficiente para um melhor aproveitamento desse sistema é o intervalado. 74 Metodologia do ensino de futebol e futsal Já no treinamento anaeróbio alático, a fonte energética majoritária é fornecida pelos fosfatos de alta energia, o ATP-CP (BARBANTI, 2010). Esse treinamento tem por objetivo aumentar a força e a velocidade, as quais propiciarão um consequente aumento da força de salto, acele- ração e potência. Para o aumento da potência do sistema alático, os exercícios propostos devem ser de curtíssima duração, com pausas para a recuperação. Para Bangsbo (2015), o intuito do treinamento anaeróbico é aumentar o potencial de desempenho nos exercícios de alta intensidade, podendo ser dividido em treino da velocidade e treino da velocidade resistida, por meio do método intervalado. Ainda, segundo o autor, o treino da velo- cidade corresponde à ação de alta intensidade em um curto período de tempo. Já o treino de resistência de velocidade pode ser dividido em pro- dução da velocidade e manutenção da velocidade, o que podemos ob- servar na Tabela 1. Assim, a produção se refere ao exercício com duração de até 40 segundos e a manutenção ao exercício que dura no máximo 90 segundos. É importante notar o tempo de recuperação entre elas. Tabela 1 Princípios do treinamento de velocidade e treinamento de velocidade resistida Exercício(s) Recuperação Intensidade (%) Número de repetições Treinamento de velocidade 2 - 10 seg. >10x o tempo de exercício 100 2 - 20 Resistência de velocidade (produção) 10 - 40 seg. >5x o tempo de exercício 70 - 100 2 -10 Resistência de velocidade (manutenção) 10 - 90 seg. <3x o tempo de exercício 40 - 100 2 - 15 Fonte: Adaptada de Bangsbo, 2015. Segundo Barbanti (2010), o treinamento físico se baseia em três princípios biológicos: sobrecarga, especificidade e reversibilidade. O princípio da sobrecarga se refere a como as adaptações fisiológicas e morfológicas do organismo dependem da sobrecarga imposta ao in- divíduo pelo volume, pela intensidade e pela densidade de treino. O princípio da especificidade se fundamenta no fato de que um treina- mento específico tem efeitos específicos sobre o organismo; assim, Fisiologia e preparação física 75 quanto mais próximo do jogo for o treino, melhor será a adaptação e as respostas. Por fim, o princípio da reversibilidade é sobre como as al- terações conquistadas com treinamento têm caráter transitório, isto é, a inatividade ou o baixo estímulo tende ao retorno aos estados iniciais. Figura 3 Capacidades condicionantes aplicadas ao futebol Desempenho anaeróbio: • máxima potência anaeróbia; • capacidade anaeróbia; • frequência de produção de energia. Força muscular: • concêntrica; • excêntrica; • isométrica; • frequência de produção de força. Desempenho aeróbio: • máxima potência aeróbia; • capacidade aeróbia.Mas ter 13 05 / S hu tte rst oc k ResistênciaForça Velocidade Fonte: Elaborada pelo autor. O treinamento de força ocorre com base nos valores porcentuais de 1 RM para mensuração da carga máxima (100%). Desse modo, a aplica- ção das cargas próximas a 60% promove resistência muscular, a 80% proporciona o aumento da força máxima e hipertrofia e acima de 90% propicia a força neural (BARBANTI, 2010). Os tipos de contração muscular são: concêntrica, excêntrica e iso- métrica. A força de contração concêntrica é caracterizada pelo encur- tamento da fibra e pode ser vista na ação do chute. A fase excêntrica é definida pelo alongamento das fibras durante a contração e é comum nas desacelerações, muito usadas no futsal. Já a contração isométrica é aquela cuja produção de força não gera movimento, ela é estática; podemos exemplificar a força isométrica com a estabilização após a aterrissagem de salto para cabecear uma bola. A ciência atual já reconhece que é possível aumentare desenvolver a força sem impor altas cargas, por meio de um modelo em que uma A obra Treinamento de força em futebolistas aborda, com detalhes, o treinamento de força para futebolistas, além dos conceitos e da contextua- lização dessa capacidade durante o jogo. O livro destaca os cuidados e também a importância de programas de força para jovens atletas. ARRUDA, M. de; HESPANHOL, J. São Paulo: Phorte, 2009. Livro 76 Metodologia do ensino de futebol e futsal carga média deslocada em alta velocidade permite os ganhos de força compatíveis ao implemento de cargas altas. Apesar da literatura reco- mendar a divisão das manifestações da força em força máxima, força rápida e força resistente, todas elas dependem do potencial de força máxima, ou seja, se esta aumentar, todas as outras também aumen- tarão (BARBANTI, 2010; LOTURCO, 2018). Além do mais, o uso dessa técnica no exercício de salto vertical apresenta íntima correlação com as ações de alta velocidade. 5.2 Treinamento do jovem Vídeo O treinamento de jovens e crianças requer muito cuidado por parte do professor e dos treinadores. Um dos principais equívocos, que po- demos observar na prática, é a tendência de reproduzir em crianças os métodos e modelos de treino aplicados aos adultos. Dependendo da fase ou do estágio de desenvolvimento, a carga ou o tipo de treino ofe- recido à criança pode não produzir nenhum efeito benéfico ou, ainda pior, pode acarretar respostas fisiológicas adversas. Ao iniciar uma criança ou um jovem em uma estrutura esportiva, é extremamente importante que o treinamento não seja visto como uma unidade isolada, mas como parte de um processo de desenvolvimento em longo período (LLOYD; OLIVER, 2012). A busca por um modelo adequado de desenvolvimento esportivo, em longo prazo, tem sido observada ao longo de décadas. Atualmente, a ciência ajuda a entender algumas particularidades a respeito do or- ganismo das crianças, norteando os caminhos para professores e trei- nadores esportivos. Será que um jovem de 10 anos, por exemplo, está apto para receber um treinamento de força? Qual o melhor momento para se inserir a resistência? Com que idade se deve utilizar cargas? Essas perguntas podem ser respondidas pelos períodos sensíveis. Os períodos sensíveis são aqueles nos quais o indivíduo está mais apto a receber certo conteúdo e responder bem a determinado estímulo. O período sensível pode ser entendido, metaforicamente, como a janela aberta. Desse modo, a janela de oportunidade vai estar mais ou menos aberta em dados períodos. A fim de determinar os períodos sensíveis, para receber e responder a treinos de força, resistência, velocidade e habilidades, os marcadores maturacionais são usados como referência. Fisiologia e preparação física 77 O modelo a seguir é proposto por Lloyd e Oliver (2012) para uma es- truturação de trabalho pautado no desenvolvimento esportivo. O mo- delo propõe a utilização dos períodos sensíveis ao treinamento como norte para a elaboração do conteúdo de treino. Figura 4 Representação do modelo de desenvolvimento esportivo em meninos e meninas Idade cronológica 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 + MATURAÇÃO PRÉ- -INFÂNCIA INFÂNCIA ADOLESCÊNCIA ADULTO MENINOS IDADES PRÉ-PVC PVC IDADES PÓS-PVC QUALIDADES FÍSICAS Movimentos fundamentais Movimentos específicos Força Velocidade Agilidade Hipertrofia MENINAS IDADES PRÉ-PVC PVC IDADES PÓS-PVC QUALIDADES FÍSICAS Movimentos funda- mentais Movimentos específicos Força Velocidade Agilidade Hipertrofia Fonte: Adaptada de Lloyd e Oliver, 2012. As estratégias de desenvolvimento esportivo, propostas por Lloyd e Oliver (2012), propõem que, nos períodos iniciais, antes do começo da puberdade, as atividades sejam focadas no desenvolvimento das habi- lidades fundamentais (saltar, correr, arremessar etc.), atribuindo maior importância à variação de movimentos e menor importância à especia- lização esportiva. Assim, conforme o período de puberdade vai se apro- ximando, maior importância vai sendo atribuída aos treinos específicos. Observe que a força é um componente que pode ser trabalhado em todas as fases; porém, é importante ressaltar que o seu desenvol- vimento não está necessariamente ligado à ideia de levantar pesos. Já 78 Metodologia do ensino de futebol e futsal a hipertrofia – essa sim relacionada ao deslocamento de altas cargas –, não deve ser iniciada antes do período púbere. Em diversos países, há programas voltados para o estímulo e a participação de atividades que contemplem o repertório motor da criança, construindo suas habilida- des básicas até que ela esteja apta para receber os estímulos específi- cos e melhorar as respostas aos treinamentos das capacidades físicas. Estudos recentes mostram que a iniciação esportiva que contempla atividades variadas ou multiesportivas constrói adultos mais ricos em mo- vimento, com menor número de lesões e maior longevidade como atleta. Com isso, desenvolve-se uma sociedade mais ativa, refletindo também na saúde pública do país. 5.2.1 Maturação biológica Você sabe qual é a diferença entre idade biológica e idade cronológica? Essa resposta pode auxiliar os professores a não negligenciarem o processo de formação esportiva, algo que ainda vemos com alguma frequência. A idade cronológica se refere aos anos de vida da criança, enquanto a idade biológica diz respeito à maturação sexual. A matura- ção biológica é um processo que ocorre em todos os tecidos, órgãos e sistemas do corpo; a avaliação desse processo permite identificar o progresso ou estado atual de maturação (MALINA et al., 2015). Juntamente com a maturação sexual, ou puberdade, outras caracte- rísticas também se apresentam; algumas são visíveis, outras nem tan- to, mas o fato é que essas características influenciarão nas capacidades motoras e cognitivas dos jovens. As crianças que maturam mais rapidamente e antecipam a idade cronológica são chamadas de precoces. Já aquelas que demoram mais tempo para atingir a puberdade (menarca ou esper- marca) são denominadas tardias. A Figura 5 mostra um exemplo dessa situação, na qual há crianças inseridas em uma mesma turma, porém com condições de maturação bastante distintas. O grande problema dessas diferenças reside no momento que, dentro do cenário esportivo, essas crianças são expostas às mes- Figura 5 Crianças da mesma idade em um treino de futebol m atim ix/Shutterstock Fisiologia e preparação física 79 mas cargas de trabalho, exigências ou competições, sendo comparadas entre si. Obviamente, as crianças precoces terão ampla vantagem em alguns quesitos fundamentais para o esporte – como força, velocidade e agilidade – e, então, chutarão mais forte, saltarão mais alto e correrão mais rápido. Se as deixarmos expostas ao mesmo tratamento, é possível que estejamos cometendo grande injustiça. O pico de velocidade de crescimento (PVC) diz respeito ao momento que a estatura da criança aumenta mais rapidamente. Ele é conhecido popularmente como estirão de crescimento e tem sido utilizado para ca- racterizar o período de aumento de concentração hormonal, apresentan- do transformações no desenvolvimento esportivo (LLOYD; OLIVER, 2012). Assim como o PVC, as características sexuais secundárias também indicam o estado maturacional. Elas são utilizadas por pediatras como um método para identificar a idade biológica, estando relacionados com o PVC (MALINA et al., 2015). Figura 6 Curva do pico de velocidade de crescimento PVC M en in as - al tu ra c m /a no a fase de estirão início do período de estirão menarca 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 4 6 8 10 12 14 16 18 idade pelos pubianos seios PVC M en in os - al tu ra c m /a no b 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 4 6 8 10 12 14 16 18 idade pelos pubianos pênis testículos Fonte: Adaptada de Balyi, 2016. Durante a puberdade, uma série de transformações são observadas no jovem, o que é considerado um marco para o inícioda fase de espe- cialização do indivíduo. Observe, na Figura 6, que as meninas possuem o PVC próximo aos 12 anos de idade. Assim, após o pico de crescimento, ocorre a menarca devido ao aumento da secreção do hormônio estra- diol, que proporcionará transformações morfológicas, como o aumento de gordura corporal, dos seios e do quadril (MALINA et al., 2015), poden- do refletir negativamente no desempenho da jovem jogadora. 80 Metodologia do ensino de futebol e futsal Já os meninos atingem o pico por volta dos 14 anos, dando início à maturação. O modelo de desenvolvimento de atletas em longo pe- ríodo, proposto por diversas instituições mundo afora, preza pela atri- buição de cargas e competências físicas coerentes com as capacidades biológicas da criança. A seguir, veremos algumas dessas capacidades e suas características relacionadas ao desenvolvimento. • Força: o treinamento de força para crianças e jovens sempre foi tema de discussão. Hoje, é aceitável que crianças possam, de ma- neira segura, participar de atividades que envolvam a força, des- de que de modo adequado e orientado (LLOYD; OLIVER, 2012). Porém, é importante salientar que o desenvolvimento de força está associado a vários fatores, como os neurais e hormonais. Então, a janela de oportunidade para essa valência estará mais aberta por volta de 12 a 18 meses após o PVC. • Velocidade: em concordância com o modelo, qualquer efeito de treinamento será resultado de adaptações neurais. Pesquisas indicam que o desenvolvimento da velocidade em jovens atle- tas pode ser influenciado pela maturação. No entanto, durante o período pré-púbere, há boas respostas para os treinamentos de ativação neural, como arranques e treino pliométrico. Já para o treino neural e estrutural (força e pliometria), são observadas respostas melhores em adolescentes. • Hipertrofia: o modelo de desenvolvimento de atletas, proposto por Lloyd e Oliver (2012), sugere que a hipertrofia deve ser inicia- da por volta dos 14 anos para os meninos e aos 12 anos para as meninas – período intimamente ligado ao PVC, no qual os níveis de secreção hormonal aumentam. Portanto, os treinamentos vol- tados para o aumento de volume muscular não terão efeito antes do período proposto. • Potência: é a habilidade para produzir altos níveis de potência, sendo fundamental para o sucesso esportivo; porém, a janela de oportunidade para a potência parece estar mais aberta durante a adolescência, permanecendo na fase adulta. • Mobilidade: o modelo propõe que um programa de mobilidade e flexibilidade possa ser inserido na infância, de 5 a 11 anos de idade. Essa capacidade servirá como uma das mais importantes estrutu- ras para a saúde a longo prazo do indivíduo. Os meninos demons- tram uma diminuição dessa capacidade após completarem 9 anos Fisiologia e preparação física 81 de idade, por isso a importância de se trabalhar o quanto antes com a mobilidade, potencializando o período sensível. • Agilidade: é considerada um componente bastante discutível e com pouca base na literatura pediátrica. Apesar de não haver dú- vidas de que é uma capacidade extremante importante para o futebol e futsal, não há um período sensível determinado para essa valência no modelo de desenvolvimento. • Resistência: anteriormente, era vista como uma capacidade a ser trabalhada durante o período pré-púbere. Porém, como há várias evidências de alterações no sistema cardiovascular central e periférico e na função neuromuscular e metabólica relaciona- das ao crescimento, o modelo de desenvolvimento não deter- mina um período específico, mas atenta para a importância do treino de resistência durante a infância, dando, também, atenção especial ao momento próximo à fase adulta, quando os sistemas cardiorrespiratórios parecem estar mais aptos. Durante a idade pré-púbere, os meninos e as meninas seguem simi- lares no que diz respeito à velocidade, coordenação, resistência e força, portanto, é possível e recomendável a participação conjunta sem dis- tinção. Desse modo, o modelo de desenvolvimento sugere que, nesse período, seja oferecido e privilegiado, para meninos e meninas, um pro- grama que contenha movimentos fundamentais básicos e atividades que aumentem o repertório motor da criança (LLOYD; OLIVER, 2012). O vídeo Maturação e idade biológica no esporte, publicado pelo canal cdechecchi, apresenta uma matéria original- mente exibida pelo canal esportivo SportTV, que discute a matura- ção e a relação entre idade biológica x idade cronológica de crianças e adolescentes inseridos no esporte, dando destaque a quando esse fator é negligenciado por treinadores na formação esportiva. Disponível em: https:// www.youtube.com/ watch?v=zcn3QwANVs8. Acesso em: 23 jun. 2020 Vídeo 5.3 Jogos condicionantes Vídeo Refere-se a jogos condicionantes o método de treinamento que se baseia na estrutura do jogo para o condicionamento físico; ele parte do princípio de que o desenvolvimento das competências técnico-táticas, dentro de uma lógica progressiva e evolutiva dos estímulos, gera adap- tações físicas e psicológicas (DIAS, 2016). Diferentemente de um planejamento chamado de periodização tradicional, em que os aspectos físicos são pensados e treinados isoladamente, nesse panorama mais moderno, chamado por al- guns autores de periodização tática, o treino físico se integra ao jogo por meio de jogos de dimensões menores ou jogos reduzidos. No treino integrado, o treinador procura criar tarefas e exercícios, https://www.youtube.com/watch?v=zcn3QwANVs8 https://www.youtube.com/watch?v=zcn3QwANVs8 https://www.youtube.com/watch?v=zcn3QwANVs8 82 Metodologia do ensino de futebol e futsal dentro do jogo, que exijam comportamentos coerentes com a de- manda fisiológica que se queira desenvolver (DIAS, 2016). Os jogos reduzidos são exercícios modificados, jogados em espaços menores; eles podem integrar todos os aspectos, desde os puramen- te físicos até o comportamento técnico-tático. Esses jogos podem ser utilizados como um meio eficaz de treinamento para a melhoria da ca- pacidade aeróbia e de desempenho, visto que, quando comparados com treinos de corridas tradicionais, não foram encontradas diferenças significativas (GOUVEIA, 2019). A lógica desse método é treinar o futebol jogando futebol, manipulan- do a unidade de treino por meio da intensidade e do tempo de duração. Diversos autores destacam que a maior parte do treinamento físico deve ser feita com bola, pois assim podem ser atribuídas vantagens, como: o desenvolvimento dos grupos musculares específicos e a associação das técnicas e táticas, proporcionando otimização do tempo e maior motiva- ção quando comparada ao treino físico sem bola (GOMEZ; SOUZA, 2008). Na elaboração de tarefas de jogo para condicionamento, devemos nos atentar a alguns fatores, como a dimensão do campo, o número de jogadores, a presença ou não do goleiro, a inferioridade ou supe- rioridade numérica e a intensidade, dependendo da exigência do jogo. A literatura científica dá alguns caminhos para ajudar nessa elaboração com base em respostas fisiológicas de jogos reduzidos. Assim, conforme o número de jogadores participantes diminui, devemos aumentar a intensi- dade do exercício, resultando em maior participação e toques na bola por jogador; porém, quanto menos jogadores envolvidos, menos componen- tes táticos são observados, já que os jogadores tendem a se movimentar sem obedecer às suas funções específicas (TURNER; STEWART, 2014). Tabela 2 Exemplo de formatos de jogos condicionantes em espaço reduzido Número de jogadores Dimensão do campo Tempos Notas 3 vs. 3 25 x 20 m 6 x 1 min (1,5 min de pausa) • Componente tático limitado. • Alto número de ações por jogador. • Alta intensidade. • Aumento das acelerações e desa- celerações e mudanças de direção. 4 vs. 4 30 x 25 m 6 x 2 min (1,5 min de pausa) (Continua) Fisiologia e preparação física 83 Número de jogadores Dimensão do campo Tempos Notas 5vs. 5 40 x 30 m 4 x 4 min (2 min de pausa) • Componente tático moderado. • Moderado ou alto número de ações por jogador. • Moderada ou alta intensidade. • Aceleração/desaceleração e corri- das de altas velocidades. 7 vs. 7 60 x 25 m 5 x 8 min (2 min de pausa) 8 vs. 8 70 x 40 m 3 x 12 (2 min de pausa) • Alto componente tático. • Baixo número de ações por jogador. • Baixa intensidade e aumento de descanso entre as ações. • Aumento das corridas de alta velo- cidade. • Alta ênfase aeróbica. 11 vs. 11 90 x 65 m 4 x 12 (2 min de pausa) Fonte: Adaptada de Turner e Stewart, 2014. Outros estudos também apontam que os formatos com menor nú- mero de jogadores, como os de 2 a 6 por equipe, podem possibilitar maiores ações de alta intensidade. Além disso, atentam que o estímulo verbal por parte do treinador possui grande influência para o aumento da intensidade do jogo (PASQUARELLI et al., 2010). Para a elaboração das tarefas dos jogos, é importante ressaltar que, quanto mais ampla a área de jogo, mais tempo haverá para as tomadas de decisão dos jogadores, o que normalmente torna as ações mais lentas. Em contrapartida, quanto menor o campo, me- nos tempo haverá para as decisões e, com isso, ações mais rápidas serão induzidas, inclusive constantes acelerações e desacelerações com mudanças de direção (TURNER; STEWART, 2014). No vídeo 2v2v2+1 Possession Game for Soccer!, publicado pelo canal Championship Productions, é possível observar alguns exem- plos de jogos reduzidos que possuem a finalidade de aumentar as capacida- des motoras, juntamente com a velocidade de raciocínio e de tomada de decisão. Disponível em: https:// www.youtube.com/ watch?v=YcNJF0iSWtQ. Acesso em: 23 jun. 2020. Vídeo 5.4 Avaliações físicas e controle de treinamento Vídeo As avaliações físicas são fundamentais em qualquer esporte, pois, ao conhecer profundamente o estado atual do indivíduo, po- demos identificar suas necessidades e, consequentemente, elabo- rar um plano adequado. Quando tratamos de esportes coletivos, essa importância é ainda mais evidente. Os testes fisiológicos po- https://www.youtube.com/watch?v=YcNJF0iSWtQ https://www.youtube.com/watch?v=YcNJF0iSWtQ https://www.youtube.com/watch?v=YcNJF0iSWtQ 84 Metodologia do ensino de futebol e futsal dem fornecer informações referentes aos pontos fortes e fracos do atleta (POWERS; HOWLEY, 2017). Segundo Barros Neto e Guerra (2004), pelas características da mo- dalidade, a avaliação da aptidão física deve contemplar a harmonia entre a força, velocidade, flexibilidade e resistência geral e específica, acompanhada da composição corporal. Dentro desse contexto, alguns testes clássicos têm sido utilizados para atender às demandas específicas do futebol e do futsal. A avaliação do consumo máximo de oxigênio é aceita como a melhor forma de quan- tificar a capacidade para exercícios prolongados. Além disso, há o padrão ouro, que é o método direto, no qual se utiliza a espirometria para captar as trocas gasosas durante o esforço na esteira (BARROS NETO; GUERRA, 2004). Todavia, existem diversos protocolos indiretos, com menor custo, que podem ser usados como alternativas válidas cientificamente. A avaliação anaeróbia estima a participação metabólica dos sis- temas energéticos, do anaeróbio lático e do alático. Para a avaliação anaeróbia, é essencial que o teste aplicado empregue os músculos envolvidos no esporte em questão (POWERS; HOWLEY, 2017). Nessa esfera, um dos testes bastante utilizado é o de saltos, horizontais e ver- ticais, para mensurar o desempenho neuromuscular. Existem diversos protocolos para atender às necessidades específicas do esporte, já que a capacidade de produção de força nos saltos tem alta correlação com as ações de velocidade. Dois dos testes mais conhecidos são o Counter Moviment Jump (CMJ) e o Squat Jump. Esses são testes utilizados e validados para a potência de membros inferiores e força de membros inferiores, respectivamente (TURNER, STEWART, 2014). Além de permitirem o acompanhamento da evolução do atleta, de modo prático e rápido, também têm sido usados como ferramenta para indicar fadiga no controle de carga. Muita atenção tem sido dedicada a estratégias para diminuir o risco de lesões esportivas. Essas lesões não só causam prejuízos esportivos e financeiros, como também colocam em risco a saúde e o bem-estar do indivíduo. Entre as diversas linhas de abordagem para conter esse problema, está o controle da carga de treino. Controlar a carga é tão importante quanto realizar o planejamento – se não mais importante. O descontrole e, por via de regra, o excesso de treinamento podem Fisiologia e preparação física 85 expor o jovem atleta ou adulto a condições extremas, nas quais o efeito do treino passa a ser prejudicial. O controle de carga é um ponto crucial para gerenciar a qualidade do treino do atleta; a diminuição da força de salto juntamente a outros critérios, por exemplo, pode representar uma fadiga neuromuscular proveniente do exercício. Com o monitoramento frequente, é possível identificar se o programa de treinamento traz benefícios e adaptações positivas ou se traz possíveis quedas no rendimento, provenientes de excessos de jogos e treinos. A identificação precoce de possíveis qua- dros como esse permite uma intervenção imediata, reequilibrando as cargas, reajustando a alimentação e cuidando da recuperação. Além do controle da fadiga neuromuscular, uma outra ferramen- ta importante para a identificação da carga de treino é a percepção subjetiva de esforço (PSE). A PSE é um questionário simples e muito utilizado no treinamento desportivo; a escala indicada representa a estimativa da intensidade do exercício e os escores podem ser utili- zados como indicadores do esforço, pois têm forte correlação com a intensidade do exercício (POWERS; HOWLEY, 2017). A PSE é frequentemente usada como um modo de controlar a car- ga de treinamento, pois, com base nas respostas apresentadas pelos atletas, o treinador pode reajustar a sobrecarga. Estudos relacionados com overtraining têm demonstrado que indicadores psicológicos, como a PSE, são mais sensíveis e consistentes do que indicadores fisiológicos (BOURDON et al., 2017). Além disso, medidas como a PSE podem ser aplicadas e reportadas em alguns minutos, enquanto biomarcadores fisiológicos podem demorar dias. O vídeo Segredos do Esporte com Irineu Loturco e o NAR-SP (ESPN), publica- do pelo canal NAR-SP, exibe uma matéria do canal esportivo ESPN, em seu programa Segredos do Esporte, que apresenta uma entrevista com o Prof. Dr Irineu Loturco, um dos maiores nomes da ciências do esporte e o diretor do Núcleo de Alto Rendimento (NAR-SP), na qual ele discute o esporte e treinamento. Disponível em: https:// www.youtube.com/ watch?v=t098ZXnbdcc. Acesso em: 23 jun. 2020. Vídeo CONSIDERAÇÕES FINAIS Os treinos de futebol e de futsal devem estar intimamente ligados às ações que ocorrem durante o jogo. Logo, entender bem as características do esporte com o qual estamos lidando é um dos pilares para potencializar as ações dos atletas. Dependendo da posição ou função do jogador, suas demandas fisiológicas são diferentes. Então, o modelo de jogo adotado pela equipe, a sincronia e a organização desta estão associados às exigências motoras durante a partida. Uma equipe desorganizada será evidentemen- te mais exigida; as dimensões física, tática, técnica e psicológica, apesar de serem interdependentes, estão interagindo o tempo todo durante uma par- https://www.youtube.com/watch?v=t098ZXnbdcc https://www.youtube.com/watch?v=t098ZXnbdcc https://www.youtube.com/watch?v=t098ZXnbdcc 86 Metodologia do ensino de futebol e futsal tida. Portanto, a preparação física não deve ser vista como uma estrutura afastada das outras dimensões, visto que elas fazem parte do mesmo jogo e, por isso, o treino ou a preparação deve ter esse olhar ampliado. Grande parte das pesquisas relacionadas à intensidadede jogo são realizadas com o futebol. Isso porque, apesar da forte similaridade entre os esportes, no futsal são necessárias mais pesquisas para identificar as ações em quadra. Essa limitação pode ser explicada pela dificuldade de utilizar o GPS em ambientes fechados, como o ginásio esportivo, no qual o sinal é frágil. Nesses casos, a fidedignidade da coleta pode ser comprome- tida, resultando em poucas publicações científicas sobre o tema. A preparação do jovem atleta é uma constante preocupação e não deve ser negligenciada. O processo de crescimento da criança possui par- ticularidades fisiológicas e, por isso, o programa de treinamento deve res- peitar as fases de desenvolvimento. A exposição do jovem ou da criança a programas de treinamento com cargas elevadas e estímulos incoerentes com sua capacidade de resposta pode acarretar prejuízos irreversíveis, osteomusculares ou psicológicos, na formação desse indivíduo. Tanto para adultos quanto para jovens e crianças o treinamento deve ser muito bem planejado e pautado nos conhecimentos científicos, prin- cipalmente em esportes coletivos, nos quais a quantidade e a heteroge- neidade entre os atletas é comum, a complexidade e a responsabilidade do treinador/professor aumenta ainda mais e o controle deve ser indivi- dualizado e focado na necessidade de cada um. As demandas físicas nos esportes coletivos são complexas, e o elemento chave precisa ser identi- ficado para cada atleta. Além disso, o efeito de diversos tipos de treinos para promover melhorias no desempenho precisa ser entendido antes do programa de treinamento ser iniciado. As divisões de turmas, seja na aula de Educação Física na escola ou em treinos de equipes em clubes esportivos, normalmente seguem o critério da idade cronológica. Por exemplo, em uma turma com meninas entre 10 e 12 anos, podem haver condições biológicas altamente distintas por conta da maturação de cada uma das alunas. Esse panorama se repete Brasil afora, refletindo o problema da formação esportiva. Desse modo, expor esses indivíduos ao mesmo esforço físico, competindo entre si e com mesmo nível de cobrança não parece justo, já que vimos que, quanto mais próximo estiverem da puberdade, mais rápidos, mais fortes e mais cognitivamente preparados estarão. Os excessos àqueles que estão em estágios inferiores podem poten- cializar os riscos de lesão, causar frustração esportiva por não conse- Fisiologia e preparação física 87 guirem acompanhar a turma ou, até mesmo, resultar no abandono do esporte. Para amenizar esse problema, políticas públicas devem ser pro- postas para qualificar o ensino esportivo, assim como ocorre em países como Canadá, Nova Zelândia e Austrália, que possuem planos estratégi- cos para o desenvolvimento de esporte. Fica claro, então, que planejar o treinamento não é tarefa fácil. Portan- to, o profissional deve construir uma relação de respeito e empatia com os comandados, para que seja possível minimizar os erros na formação esportiva e obter desempenhos de alto rendimento no futebol e no futsal. ATIVIDADES 1. Foi destacada a questão da idade biológica versus idade cronológica. Descreva como esse aspecto pode influenciar a formação e o desenvolvimento de crianças e jovens no esporte. 2. Se você fosse responsável pela estruturação de treinamento de uma equipe e pelo desenvolvimento das capacidades físicas, de que maneira você poderia potencializar o desempenho e minimizar os erros de sobrecarga que poderiam resultar em lesões? Discuta o tema. 3. Basear o desenvolvimento das capacidades condicionantes nos jogos rompe com o modelo tradicionalista de se focar na forma física isoladamente. Quais as vantagens de se utilizar esse meio mais moderno de preparação física? REFERÊNCIAS BALYI, I. et al. Long-term athlete development. 2. ed. Victoria: Sport for Life Society, 2016. BANGSBO, J. Performance in sports – With specific emphasis on the effect of intensified training. Scandinavian journal of medicine & science in sports, v. 25, n. 4 , p 88–99, dez. 2015. BARBANTI, V. J. Treinamento esportivo: as capacidades motoras dos esportistas. Barueri: Manole, 2010. BARROS NETO, T. L. de; GUERRA, I. Ciência do futebol. Barueri: Manole, 2004. BRADLEY, P. S. et al. High intensity running in english FA Premier League soccer matches, Journal of sports sciences, v. 27, n. 2, p. 159-168. jan. 2009. Disponível em: http://dx.doi. org/10.1080/02640410802512775. Acesso em: 26 jun. 2020. BOURDON, P. C. et al. Monitoring athlete training loads: consensus statement. International journal of sports physiology and performance, v. 12, n. 2, p. 161-170, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1123/IJSPP.2017-0208. Acesso em: 26 jun. 2020. DIAS, H. A construção de um jogar. 1. ed. Lisboa: Prime Books, 2016. FIFA. 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Neste capítulo, você conhecerá as regras do futebol e do futsal, curiosidades sobre elas e abordagens sobre as possíveis adapta- ções para as categorias de base, na busca da inclusão das crianças e de facilitar o processo educacional e pedagógico. Este capítulo não pretende formar árbitros e/ou auxiliares de arbitragem, mas fornecer um panorama para que o futuro profissional de educação física possa conhecer o jogo e transmitir para seus alunos as regras fundamentais. 6.1 Regras do futebol Vídeo As primeiras regras do futebol foram originalmente elaboradas em 1863 e três anos depois foi criada a International Football Association Board (IFBA), que até hoje, junto à FIFA, responde pelas regras do esporte. Qualquer proposta de mudança de regras deve passar pela aprovação da IFBA, que tem como função preservar ao máximo as regras originais e a identidade do esporte. O reconhecido estilo conservador da International Board se pauta em aspectos como justiça, legitimidade, integridade, respeito, segurança, diversão dos participantes e como a tecnologia pode beneficiar o jogo. Apesar de serem consideradas simples, as regras do futebol esbarram na subjetividade de lances interpretativos, o que pode causar polêmicas e discussões. A autonomia, nesses casos, é toda do árbitro principal. Não alheio às transformaçõestecnológicas e na tentativa de proporcionar mais 90 Metodologia do ensino de futebol e futsal justiça no jogo, o futebol passou a contar com o árbitro de vídeo a partir da Copa do Mundo de 2018, fato marcante para o esporte que passou por poucas alterações ao longo dos anos. Conforme destacado na intro- dução, nesta seção apresentaremos ao aluno um resumo das 17 regras do futebol. Esse resumo está baseado no manual de regras mais recente publicado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF, 2019). Regra 1 – Campo de Jogo O campo de jogo deve ser construído por completo com grama natural ou artificial, ou até híbrido (grama natural e artificial), porém, neste caso, não deve haver uma zona do campo apenas natural e ou- tra apenas artificial. É importante ressaltar que, para o uso de grama artificial, a permissão estará condicionada à aprovação dos órgãos res- ponsáveis pela competição. O campo de jogo obedecerá a forma retangular e deverá ter linhas de marcação contínuas de 12 cm de largura. O campo será dividido ao meio por uma linha que une uma lateral à outra, ao centro dessa linha haverá um ponto central e um círculo com 9,15 m de raio. A dimensão do campo deve ter entre 90 e 120 m de comprimento e 45 e 90 m de lar- gura, porém, para partidas internacionais e, recentemente, para jogos do Campeonato Brasileiro da primeira divisão foi adotada uma medida padrão de 105 por 68 m (CBF, 2019). A Figura 1 aponta as principais medidas e marcações que compõem um campo de futebol. Sh ut te rs to ck /M ak sy m A 16,5 m 90 – 120 m 45 – 9 0 m 5,5 m 11 m 5,5 m 11 m 1 m 9,15 m 40 ,3 m Linha de meio campo 9,15 m Círculo central Meio de campo Marca do pênalti Grande área Gol 7,31 x 2,44 m Figura 1 Campo de jogo com respec- tivas marcações Fonte: Elaborada pelo autor. A regra do jogo 91 Os postes de meta possuem duas traves verticais, unidos por uma barra transversal horizontal chamada de travessão. A altura dos postes é de 2,44 m e a distância entre eles é de 7,32 m. Regra 2 – A bola Toda bola deve ter circunferência entre 68 e 70 cm e peso entre 410 e 450 g, além de apresentar pressão equivalente a 0,6 – 1,1 atmosferas (600 – 1100 g/cm2) ao nível do mar (CBF, 2019). Regra 3 – Número de jogadores É permitida a utilização de 11 jogadores para iniciar a partida em cada equipe, sendo um deles obrigatoriamente o goleiro. Caso alguma equipe possua menos de 7 jogadores, a partida não será iniciada ou deverá ser interrompida, no caso de expulsão ou abandono. Se o regulamento da competição determinar que os nomes de to- dos os jogadores e dos substitutos devem ser relacionados antes do início da partida, e se qualquer equipe começar o jogo com menos de 11 jogadores, somente os jogadores e substitutos cujos nomes foram indicados na relação inicial poderão completar a equipe e participar da partida quando chegarem. O número máximo de substituições em competições oficiais das respectivas principais divisões de ambos os gêneros é três. Em partidas eliminatórias e decisivas, em que após resultado empatado haja a prorrogação, será permitida uma substituição a mais. Em partidas amistosas, é possível a flexibilização dessa regra em co- mum acordo entre as duas equipes e os árbitros para promover maior participação (CBF, 2019). Regra 4 – Equipamento Para atender medidas de segurança, não é permitido o uso de joias, colares ou qualquer outro acessório. O material esportivo obri- gatório é composto de camisa, calções, meiões, caneleiras e calçados. As cores do uniforme das duas equipes devem ser diferentes en- tre si e também diferentes do uniforme do árbitro. Já os goleiros de- vem ter cores diferentes dos demais integrantes da partida, tanto os jogadores de linha quanto os árbitros (CBF, 2019). Figura 2 Padrão de uniformes grebeshkovm axim /Shutterstock 92 Metodologia do ensino de futebol e futsal Regra 5 – O árbitro O árbitro é o responsável pela partida, ele tem autoridade para fa- zer cumprir as regras do jogo e deve controlar a violência e atuar como cronometrista. Esse profissional tem a decisão final para os fatos que ali acontecem, porém não pode mais alterar sua decisão após o reiní- cio do jogo ou após o término do primeiro ou segundo tempo. Se após um dos períodos o árbitro sair do campo de jogo para dirigir-se à área de revisão ou para ordenar que os jogadores regressem ao terreno de partida, continua sendo possível modificar uma decisão relativa a um incidente ocorrido antes de finalizar um dos tempos do jogo. É papel do árbitro punir qualquer infração grave, e ele deve inter- pretar conforme a regra, decidindo a punição com base no tipo de con- tato físico e impacto que essa infração teve no andamento do jogo, avaliando as medidas disciplinares com cartão amarelo ou expulsão. O árbitro tem a prerrogativa de aplicar medidas disciplinares desde a ocasião em que sobe no gramado até o momento de saída do campo de jogo após o fim da partida. No caso de um jogador cometer uma infração passível de expulsão antes do jogo, o árbitro tem autoridade para impedir a participação do jogador (CBF, 2019). Regra 6 – Os outros oficiais de arbitragem Os árbitros assistentes são responsáveis por dar suporte ao árbitro principal na condução do jogo. Eles indicam quando a bola ultrapassa a linha de campo e assinalam uma saída lateral ou para a linha de fun- do. Além disso, têm a responsabilidade de apontar uma posição de impedimento. Outra responsabilidade atri- buída ao árbitro auxiliar é a condução da substituição quando for solicitada. O quarto árbitro tem a responsabilidade de veri- ficar o material ou equipamento utilizado pelos jo- gadores, controlar o entorno da partida e informar ao árbitro principal sobre qualquer acontecimento, vistoriar as bolas, apresentar o tempo de acréscimo indicado pelo árbitro principal e conduzir a substituição. O árbitro assistente de vídeo (VAR) é aquele que acompanha o jogo de uma cabine equipada com monitores de vídeo e pode auxiliar o ár- bitro da partida em situações de erro claro e óbvio ou incidente grave cometido e não percebido. Os lances que permitem a intervenção do Se uma segunda bola, um objeto ou um animal entrar no campo de jogo e causar alguma interferência, o árbitro deve parar o jogo e recomeçá-lo com uma bola ao chão. Essa regra não é válida se a bola estiver entrando na meta, e o árbitro deve validar o gol caso a bola ultrapasse completamente a linha (CBF, 2019). Curiosidade Figura 3 Árbitro assistente de vídeo lu m ya i l s we et /S hu tte rs to ck A regra do jogo 93 VAR são situações de gol, pênaltis, cartão vermelho direto e na identifi- cação incorreta de algum jogador (CBF, 2019). Regra 7 – A duração do jogo Uma partida de futebol oficial possui 90 minutos que são divididos em dois períodos de 45 minutos cada, com um intervalo de 15 minutos. Deve ser acrescido um tempo para compensar os minutos perdidos em paralisações durante a partida, como, por exemplo, atendimentos mé- dicos, substituições, paradas para a hidratação, comemoração de gols e outras intercorrências (CBF, 2019). Regra 8 – Início e reinício de jogo Um tiro inicial é concedido nos dos dois períodos de jogo, um para cada equipe. O tiro inicial também é utilizado logo após um gol para um novo reinício de jogo. Outras formas de reiniciar o jogo podem ser observadas nos tiros livres, pênaltis, arremessos laterais, tiros de meta e escanteio, assim como a bola ao chão. Para o tiro de saída do meio de campo, os jogadores, exceto o joga- dor executante, devem permanecer atrás da linha da bola até que esta seja tocada; enquanto os adversários devem permanecer a uma distân- cia de 9,15 m da bola, ou seja, atrás da marca do círculo central. A bola entra em jogo logo após ser tocada e nitidamente se mover. É possível marcar um gol contra a equipe adversária no tiro de saída. Caso a bola entre no gol da equipe executante do tiro de saída, serámarcado um tiro de canto para o adversário (CBF, 2019). Regra 9 – Bola em jogo e fora de jogo A bola só será considerada como fora de jogo se ultrapas- sar completamente a linha, sendo lateral ou de meta, inde- pendentemente da altura da bola, seja pelo chão ou pelo alto (CBF, 2019). Também será considerada bola fora de jogo quando houver uma interrupção da partida pelo árbitro por qualquer motivo, por exemplo, para um atendimento médico a algum jogador ou por imprevisto de qualquer natureza. Regra 10 – Determinação do resultado do jogo Será marcado gol quando uma equipe conseguir fazer com que a bola ultrapasse a linha passando por entre os dois postes e por baixo do travessão. Caso o goleiro lance a bola com as wi ki m ed ia .c om m on s Figura 4 Somente a bola D está fora de jogo. 94 Metodologia do ensino de futebol e futsal mãos e ela entre na meta adversária, não será marcado gol, mas sim um tiro de meta. O time que conseguir o maior número de gols vence a partida. Se duas equipes obtiverem o mesmo número de gols ou não marcarem, será decretado empate (CBF, 2019). Regra 11 – Impedimento O jogador estará em posição de impedimento se, quando estiver na metade do campo adversário, qualquer parte de sua cabeça, cor- po ou pés estiver mais próxima da linha de meta adversária do que a bola e o penúltimo adversário. É importante salientar que estar em posição de impedimento sem participar ativamente da jogada não constitui infração. Um jogador em posição de impedimento só deve ser punido se tiver participação ativa do lance, por exemplo, ao encostar na bola passada ou tocada por um companheiro. Além disso, é passível de punição nas seguintes situações: ao impedir o adversário de jogar ou de poder jogar a bola ao obstruir claramente sua linha de visão; ao disputar a bola com o adversário; ao tentar claramente pegar a bola que se encontre próxi- ma de si, quando essa ação causar impacto no adversário; ao praticar uma ação óbvia que tenha impacto claro na possibilidade de o adversá- rio jogar a bola; ao ganhar vantagem da posição de impedimento por jogar a bola ou interferir em um adversário quando a bola tiver sido desviada ou rebotada em um dos postes ou no travessão da meta, em um oficial de arbitragem ou em um adversário, jogada por um adversá- rio para fazer uma defesa deliberada (impedir que a bola entre em sua meta) (CBF, 2019). Caso o jogador em posição de impedimento receba a bola jogada deliberadamente por um adversário, ele não deve ser punido. Uma defe- sa deliberada se caracteriza quando um jogador intencionalmente joga ou tenta jogar a bola que vai em direção ou que está muito próxima de sua meta, com qualquer parte do corpo, exceto com as mãos, a menos que seja o goleiro em sua pró- pria área de pênalti (CBF, 2019). Figura 5 Marcação de impedimento Fonte: Elaborada pelo autor. so ftp ixe l/S hu tte rs to ck G A regra do jogo 95 Regra 12 – Faltas e incorreções Os tiros livres indiretos e diretos e o pênalti só podem ser marcados por faltas e infrações cometidas quando a bola estiver em jogo. Será concedido um tiro livre direto a favor da equipe adversária do jogador que praticar uma das seguintes ações considerada pelo árbitro como imprudente: contato temerário ou com uso de força excessiva do tipo fazer carga em um adversário; saltar sobre ele; dar ou tentar dar um pontapé no jogador adversário; empurrá-lo; golpeá- lo ou tentar golpeá-lo; dar uma entrada ao disputar a bola com um adversário; dar ou tentar dar um calço ou uma rasteira em um jogador do time oponente. I. Imprudência significa que um jogador demonstra falta de atenção ou consideração; ou atua sem precaução em relação a um adversário, quando participa de uma disputa com ele. Não é necessária qualquer sanção disciplinar. II. Temeridade significa que um jogador não considera o risco ou as consequências para seu adversário. O jogador deve ser advertido com cartão amarelo. III. Uso de força excessiva significa que um jogador excede a força necessária e assume o risco de causar lesão em um oponente. O jogador deve ser expulso. Será considerada infração e concedido um tiro direto caso um jogador toque a bola com as mãos ou os braços de maneira volun- tária, agarre um adversário, atrapalhe a movimentação, morda ou cuspa em alguém. Quanto à infração do toque de mão na bola, são geradas muitas dúvidas e discussões e vale salientar que a infração será marcada se a mão ou braço encontrar-se em arranjo não natural expandindo a extensão do corpo para baixo, para os lados ou para cima (CBF, 2019). Será concedido um tiro livre indireto quando houver uma jogada perigosa ou um boqueio à progressão de um adversário sem qualquer contato; quando um jogador usar linguagem inapropriada ou gestos que caracterizem insultos ou ofensas; ou quando atrapalhar o goleiro. Também será concedido tiro indireto se o goleiro conservar a bola nas mãos por tempo superior a seis segundos ou usar as mãos para tocar a bola após esta ter sido recolocada em jogo. 96 Metodologia do ensino de futebol e futsal Em geral, as infrações devem ser punidas com advertência verbal. Além disso, a reiteração dessas infrações ou as de natureza flagrante podem ser punidas com cartão amarelo ou cartão vermelho. O cartão amarelo é utilizado para comunicar uma advertência e o cartão ver- melho para comunicar uma expulsão (CBF, 2019). Regra 13 – Tiros livres São conferidos a favor da equipe adversária do jogador que come- ter alguma infração. Para indicar um tiro livre indireto, o árbitro deve manter um braço levantado até que o tiro seja executado. Em um tiro direto, o gol é confirmado se a bola entrar diretamente após a execu- ção. Porém, na execução de um tiro livre indireto, se a bola adentrar diretamente será marcado um tiro de meta. Se a bola, na cobrança de um tiro livre direto ou indireto entrar di- retamente na meta da própria equipe, será marcado um tiro de canto. A execução dos tiros deve ser exatamente no local da infração, a não ser que seja um tiro livre indireto a favor da equipe atacante cometido na área de meta da equipe adversária. Nesse caso, será executado com a bola posicionada em cima da linha de meta e no local mais próximo da infração. Para a execução, a bola deve estar parada e o executor deve dar apenas um toque até que seja tocada por outro jogador de qualquer equipe. Antes ser tocada, todos os jogadores da equipe con- trária devem estar no mínimo a 9,15 m da bola. Um tiro livre pode ser executado levantando a bola com um pé ou com os dois pés simulta- neamente (CBF, 2019). Regra 14 – Tiro penal O tiro penal, mais conhecido como pênalti, é concedido quando um jogador comete uma infração em sua área penal. Para a execução, todos os jogadores, com exceção do batedor, devem estar no mínimo a 9,15 m da meta e o goleiro deve permanecer sobre a linha das balizas, de frente para o executante e entre os postes da meta até a bola ser tocada. O bate- dor tem que impulsionar a bola para a frente e não pode dar um segundo toque consecutivo. Antes do primeiro toque, o goleiro deve ter um dos pés tocando a linha (CBF, 2019). Regra 15 – Arremesso lateral É lateral para uma equipe quando seu adversário toca pela última vez na bola antes desta sair pela linha lateral do campo, ultrapassan- A regra do jogo 97 do-a por baixo ou por cima. Por meio de uma cobrança de lateral, não pode haver gol diretamente se a bola entrar, nesse caso, será concedi- do um tiro de meta. Para a execução do arremesso lateral, o jogador deve se manter de frente para o campo e ter os pés tocando a linha ou fora do campo de jogo. A bola deverá ser arremessada com as duas mãos partindo da nuca e passando por cima da cabeça. Vale ressaltar que o jogador que exe- cutou o lateral não pode tocar a bola pela segunda vez, caso arremesse intencionalmente em um adversário sem que aja de maneira agressiva, o árbitro pode permitir que o jogo prossiga (CBF, 2019).Regra 16 – Tiro de meta Quando a bola ultrapassar a linha de meta, pelo chão ou pelo alto, após tocar em algum jogador da equipe atacante, será concedido um tiro de meta à equipe defensiva. É possível e deve ser validado um gol após uma cobrança de tiro de meta, mas somente contra a equipe adversária; se na cobrança, por um acaso, a bola adentrar seu próprio gol, será con- cedido um tiro de canto para a equipe adversária. Com a bola parada e em qualquer ponto da área de meta deve ser executado por qualquer jogador da equipe, geralmente o goleiro ou outro defensor. Os jogadores da equipe adversária devem encontrar- -se fora da área penal até que a bola entre em jogo (CBF, 2019). Regra 17 – Tiro de canto Será concedido um tiro de canto quando a bola ultrapassar a linha de meta, e tiver sido tocada por último por um jogador da equipe de- fensora (CBF, 2019). Os gols feitos diretamente da cobrança de um tiro de canto são válidos e chamados de gols olímpicos. Recomendamos uma visita à página oficial da Confederação Brasileira de Futebol. Nesse site, é possível consultar o Livro nacional de Regras 2020, além de notícias diversas do universo futebolístico e também acessar uma plataforma de cursos de arbitragem e treinadores. Disponível em: https://www.cbf. com.br/a-cbf. Acesso em: 3 jul. 2020. Site 6.2 Adaptações para categorias de base no futebol Vídeo Apesar de consolidadas e serem reconhecidas mundialmente por sua solidez, as regras podem e devem ser flexibilizadas para atender certas demandas. Para que haja a democratização e a inclusão do esporte, é pos- sível criar adaptações estruturais. Grande parte dos praticantes do futebol são do público infantil e adaptar as regras permite adequar as realidades possíveis à criança, proporcionando, acima de tudo, segurança. https://www.cbf.com.br/a-cbf https://www.cbf.com.br/a-cbf 98 Metodologia do ensino de futebol e futsal Foi aprovada pela International Board a possibilidade de as federa- ções e associações de cada país adotarem adaptações para as catego- rias de base, principalmente nas fases iniciais. As adaptações podem ser nas dimensões do campo, no tamanho e peso da bola, na altura e largura das traves, no número de jogadores, no tempo de duração da partida, no número de substituições, nas medidas disciplinares etc. Além do quesito segurança, por exemplo, utilizando bolas mais le- ves e diminuindo o tempo para não expor a criança a cargas altas, as adaptações e flexibilizações são favoráveis à aprendizagem e ao de- senvolvimento do esporte. Em um campo com medidas oficiais, 11 por 11, uma criança de 7 anos provavelmente tocaria pouco na bola e es- taria desconectada do jogo. Imagine agora um goleiro de 10 anos de- fendendo uma meta oficial, que tarefa injusta, não? O quão frustrante seria a partida para esses exemplos citados. Essas alterações buscam aproximar a criança do jogo, incluí-las, entusiasmá-las. Segundo a FIFA (2016), por meio do seu progra- ma para crianças, para o melhor desenvolvimento em diversos aspectos, as competições antes dos 10 anos de idade não são aconselhadas. Até essa idade, torneios e festivais utilizando 5 contra 5 ou 7 contra 7 seriam o mais adequado. Para as categorias sub-9 (abaixo de 9 anos), o recomendado é o uso do campo com dimensões menores, representado na Figura 6 pela marcação preta mais grossa, além de um tempo de jogo de no máximo 30 minutos. Para as categorias sub-11 (de 9 e 10 anos), o recomendado é o uso do campo com dimensões exemplificadas na figura pela marcação preta mais fina e tempo de jogo de até 50 minutos. As traves também podem ser reduzidas em suas dimensões e a bola pode ter pesos e tamanho menores. Ainda segundo o plano Grassroots (FIFA, 2016), as traves ou balizas podem ser adaptadas para 5 x 7 m, além de eliminar a regra de impedimento. Fonte: Elaborada pelo autor. Figura 6 Tamanhos de quadra M aksym A/ Shutterstock Jogo 5 x 5 Jogo 7 x 7 40 m 20 m 40 m 60 m A regra do jogo 99 6.3 Regras do futsal Vídeo O futsal, apesar de ter se originado do futebol e possuir semelhanças nas suas ações técnicas, se difere bastante quanto às regras. São diferenças significativas, por exemplo, nas reposições de bola, como laterais e tiros de metas em que no futebol se utiliza as mãos e os pés para estas reposições, respectivamente, enquanto no futsal essa ordem é contrária. Assim como na Seção 6.1, aqui apresentaremos uma versão resumi- da das regras, porém baseada na edição 2019/2020 do livro de regras oficiais da Confederação Brasileira de Futebol de Salão (FPFS, 2019). Regra 1 – Quadra de jogo As dimensões da quadra devem obedecer às medidas de 25 a 42 m de comprimento por 16 a 25 m de largura. Para jogos oficiais, o pa- drão utilizado é a medida 40 m x 20 m. As traves, conhecidas também como metas, possuem 2 m de altura e 3 m de largura. As marcações devem ser bem visíveis, pois normalmente em quadras poliesportivas há outras marcações. É necessário utilizar linhas com 8 cm de largura. As linhas maiores são também chamadas de linhas laterais e as duas menores são chama- das de linhas de meta ou linhas de fundo. A quadra deve conter uma linha que di- vide suas duas metades. No ponto médio dessa linha há uma marca em forma de cír- culo medindo 10 cm, usado para o início e reinício de jogo e um círculo maior de 3 m de raio. A área tem um formato de semicírculo e possui raio de 6 metros. O ponto do tiro de canto está nos cantos da quadra. Há ainda uma marca para o tiro livre direto sem bar- reira, também chamado de segundo ponto penal, que fica a 10 m da meta adversária e de frente para o gol e uma demarcação a 5 m da linha de meta, que determina o limite do goleiro na cobrança desse tiro (FPFS, 2020). Fonte: Elaborada pelo autor. Figura 7 Quadra de futsal Ka na te /S hu tte rs to ck 16 a 25 m 5 m 6 m 3 x 2 m 10 m 3 m 25 a 4 2 m 100 Metodologia do ensino de futebol e futsal Regra 2 – A bola O padrão da bola deve obedecer às medidas de no mínimo 62 cm e de no máximo 64 cm, pesando de 410 a 430 g, e deve ser feita com couro ou material similar (FPFS, 2020). Regra 3 – Número de jogadores Em uma partida de futsal são permitidos no máximo 5 jo- gadores em quadra, sendo quatro jogadores de linha e o go- leiro. Caso uma das equipes esteja com menos de 3 jogadores, a partida não deve ser realizada, e se uma equipe no meio da partida ficar com menos de 3 jogadores por conta de expulsão ou abandono, o jogo deve ser interrompido. Para a suplência ou o banco de reservas, uma equipe pode contar com mais nove jogadores. Uma recente modificação proposta pela FIFA determina que dos jogado- res reservas somente 5 poderão permanecer em processo de aquecimen- to, os demais deverão estar sentados no banco (FPFS, 2020). Regra 4 – Equipamento dos jogadores Não é permitido o uso de objetos considerados perigosos para a saúde do jogador e demais participantes, portanto, joias, anéis, pulsei- ras etc. devem ser retirados antes de adentrar a quadra de jogo. O material exigido oficialmente é camisa de manga curta ou comprida, calções, tênis, meias de cano longo e caneleiras. O uniforme do goleiro deve diferir das cores dos demais participantes do jogo, seus compa- nheiros, adversários e arbitragem (FPFS, 2020). Regra 5 – Arbitragem principal e auxiliar Para a partida ser conduzida, haverá dois ár- bitros, o auxiliar e o principal que deverão zelar para o bom andamento da partida. Entre deveres e poderes são 56 itens. Resumidamente, o árbi- tro principal têm o papel de controlar e condu- zir a partida com o auxílio dos auxiliares fora de quadra, inibindo a violência e fazendo cumprir as regras do jogo. Cabe também ao árbitro apontar e identifi- car ao anotador os jogadores que cometerem infrações ou que fizerem gol. Na Figura 9 ob- Figura 9 Sinais do árbitro para identificar os jogadores Fonte: FPFS, 2020. Figura 8 Bola oficial Bu gB ar p/ B ik im ed ia Bo mm ons A regra do jogo 101 servamos de que maneira o árbitro indica as respectivas numera- ções dos jogadores (FPFS, 2020). Regra 6 – Cronometrista e anotador Além dos árbitros dentro da quadra, no jogo deve conter um cro- nometrista e um xanotador, também conhecidos como mesários. O cronometrista deve estar atento e controlar o tempo de jogo, e o anotador confere as fichas dos jogadores inscritos para a partida e anota na súmula as faltas cometidas, individuais e coletivas, os gols, os cartões e outras possíveis ocorrências (FPFS, 2020). Regra 7 – Duração da partida A partida de futsal tem duração de 40 minutos, divididos em pri- meiro e segundo tempo. Vale ressaltar que esses dois tempos de 20 minutos são cronometrados e o relógio para toda vez que a bola está fora de jogo (FPFS, 2020). Regra 8 – Bola de saída A bola de saída – ou tiro de saída – é utilizada para início e reinício de jogo. Antes de a partida começar será sorteada a equipe que sairá com a bola no primeiro tempo e, consequentemente, seu adversário o fará no início da segunda etapa. Após cada gol, o reinício se dá no mesmo local (FPFS, 2020). Regra 9 – Bola em jogo e fora de jogo A bola será considerada como fora de jogo sempre que ultrapassar completamente as linhas da quadra, laterais ou de meta, sendo por cima ou por baixo. Estará fora de jogo também quando a bola tocar o teto do ginásio ou se em alguma ocasião a partida for paralisada pelo árbitro da partida (FPFS, 2020). Regra 10 – Contagem de gols Será gol quando uma equipe conseguir fazer com que a bola aden- tre a meta adversária, ultrapassando completamente a linha de meta (FPFS, 2020). Regra 11 – Impedimento Não há, para o futsal, uma regra de impedimento (FPFS, 2020). Regra 12 – Faltas e incorreções Falta é qualquer infração cometida por um jogador enquanto a bola estiver em jogo. A infração pode ser punida com tiros livres diretos, 102 Metodologia do ensino de futebol e futsal indiretos e pênaltis. Para tiros diretos, serão consideradas atitudes como derrubar o jogador adversário, empurrar, bater, cuspir, segurar, jogar com imprudência, jogar perigosamente etc. Caso essas situações ocorram nos limites da área, será assinalada uma penalidade máxima. Será concedido um tiro indireto para a equipe adversária quando forem verificados atos como permanecer com a bola por mais de 4 segundos na área penal, ou caso o goleiro receba uma bola do compa- nheiro de equipe após lateral ou escanteio, além de atrasar ou retardar o tempo da partida e atrapalhar a reposição do goleiro. Os cartões são usados como medidas disciplinares e têm como objetivo coibir a violência. O cartão amarelo é utilizado em caso de má conduta – também conhecida como conduta antidesportiva –, por exemplo, desrespeitar os árbitros, atrapalhar ou impedir o reinício do jogo e fazer simulações. Já o cartão vermelho é utilizado em situações de violência do jogador, por meio de jogo desproporcional, gestos obscenos, ofensivos; impedir com a mão, não sendo o goleiro, a marcação de um gol; cuspir em alguma pessoa durante a partida; comprometer a integridade física de um jogador; impedir de modo ilegal a tentativa de finalizar um gol (FPFS, 2020). Regra 13 – Tiros livres Os tiros livres são concedidos como consequência de infrações ou faltas cometidas pelo adversário. São chutes de reposição da bola após a paralisação devido à infração, classificados em tiro livre direto e indireto. O tiro direto acontece quando a falta representar imprudência, ação temerária utilizando força excessiva. O tiro livre direto por falta acumu- lativa ocorre a partir do momento em que uma equipe comete a sexta falta, ou seja, assim que a equipe comete a quinta infração, o anotador deve avisar aos jogadores que o limite de faltas coletivas se esgotou. Assinalada a falta, a bola deverá ser posicionada na segunda marca penal se o local da falta for atrás da referida marca, caso seja à frente dela, a bola deve ser posicionada no local da infração. Os tiros livres indiretos não são acumulativos (FPFS, 2020). Regra 14 – Penalidade máxima A penalidade máxima é conferida quando uma infração é cometida dentro da área penal. É um tiro direto cobrado da marca do pênalti, lo- calizada no limite da área penal de frente para o gol. Todos os jogadores, A regra do jogo 103 exceto o executor do lance e o goleiro adversário, deverão estar atrás da linha da bola. O batedor só pode dar um toque na bola e terá quatro segundos para execução após o sinal do árbitro (FPFS, 2020). Regra 15 – Tiro lateral Acontece toda vez que a bola sai de jogo pela linha lateral da qua- dra. Deve ser executado com os pés, no local onde a bola saiu. O exe- cutor deve estar de frente para a quadra e o adversário deve respeitar uma distância mínima de 3 m para a execução. Se o chute saído da lateral for para o gol, deverá ser validado somente se houver desvio de outro jogador (FPFS, 2020). Regra 16 – Arremesso de meta Será concedido um arremesso de meta sempre que a bola, após ter sido tocada pela última vez por jogador da equipe atacante, sair pela li- nha de meta, ultrapassando-a completamente. Para a execução, a bola deve estar nas mãos do goleiro e este deve lançá-la de qualquer ponto de dentro da área (FPFS, 2020). Regra 17 – Tiro de canto É assinalado tiro de canto quando a bola é tocada por último pela equipe que está defendendo e sai completamente pela sua linha de meta. Para a execução, a bola deve estar posicionada dentro do quarto de círculo e deve ser cobrado em 4 segundos. Se a bola entrar na meta adversária após a cobrança, o gol é validado. Caso um gol seja feito contra a própria meta, com ou sem desvios de outros jogadores, não será validado (FPFS, 2020). Indicamos o site oficial da Confederação Brasileira de Futebol de Salão, que traz diversas informações sobre o mundo do futsal, além de disponibilizar o livro de regras mais recente, notícias sobre a seleção brasileira e as principais competições nacionais. Disponível em: https://www.cbfs. com.br/. Acesso em: 3 jul. 2020. Site 6.4 Adaptações para categorias de base no futsal Vídeo O futsal apresenta possíveis variações para democratizar a partici- pação na modalidade, é importante que essas adaptações sejam feitas coerentes com as respectivas idades e os respectivos graus de desen- volvimento. Com relação às dimensões da quadra, não haverá tanta necessidade de modificação, pois o futsal já possui espaço diminuído em sua estrutura, porém quando a quadra possui dimensões máximas, uma adaptação também é bem-vinda. A adequação dos jogos deve ser enxergada com cuidado pelos professores e responsáveis. https://www.cbfs.com.br/ https://www.cbfs.com.br/ 104 Metodologia do ensino de futebol e futsal O futsal, em sua essência, já é uma adequação e adaptação do futebol. Suas regras permitem a participação maior dos indivíduos, o número de substituições ilimitado e o maior número de toques na bola por partida já demonstra essa característica. Ainda assim, podemos ser mais flexíveis de acordo com a necessidade do público. Na organização de festivais de futsal, caberá ao professor de educação física, então, observar se as traves são muito altas, se a bola é muito pesada e se o tempo não é excessivo. Caberá a esse profissional ponderar sobre todas essas situações, além de conscientizar federações e ligas para tal importância. No futsal, as bolas têm tamanhos e pesos diferentes para adequar- -se às categorias de base, conforme apresentado na tabela a seguir. Tabela 1 Classificação das categorias e suas respectivas bolas Categoria Sexo Peso Circunferência Adulto e sub-20 Masc./Fem. 410 g a 430 g 62,5 cm a 63,5 cm Sub-17 e sub-15 Masc./Fem. 400 g a 440 g 62 cm a 64 cm Sub-13 Masc./Fem. 350 g a 380 g 55 cm a 58 cm Sub-11 e sub-9 Masc./Fem. 300 g a 330 g 52 cm a 55 cm Inferior ao sub-9 Masc./Fem. 250 g a 280 g 49 cm a 52 cm Fonte: Adaptada pelo autor com base em FPFS, 2020. Existe a opçãode também adaptar as dimensões da quadra para atender à iniciação esportiva, isso se faz importante principalmente ao treinar em quadras com dimensões oficiais (40 x 20 m). CONSIDERAÇÕES FINAIS O professor de futebol e futsal não precisa ter necessariamente forma- ção em arbitragem para ser capaz de ensinar as modalidades em questão, porém é imprescindível que tenha o domínio das regras para poder trans- mitir os valores do jogo. O esporte não tem a pretensão de resolver todos os problemas da educação, mas por trás do respeito às regras do jogo está o respeito por toda regra, respeitar a ética do jogo ensina a respeitar as éticas de civilidade e convivência. O professor de Educação Física é o transmissor e divulgador das regras do jogo por meio das aulas, dos treinos e das competições. É com ele que No vídeo Benjamín A - Levante UD (4-0, Semifinal Íscar Cup), publicado pelo canal FC Barcelona, podemos observar uma partida das categorias de base em que fica claro que as competições para crianças são organizadas e adequadas para aten- der às capacidades dos pequenos aprendizes. Disponível em: https:// www.youtube.com/ watch?v=4XZUwkvVQ7w. Acesso em: 3 jul. 2020. Vídeo https://www.youtube.com/watch?v=4XZUwkvVQ7w. https://www.youtube.com/watch?v=4XZUwkvVQ7w. https://www.youtube.com/watch?v=4XZUwkvVQ7w. A regra do jogo 105 o esporte informal começa a caminhar para a formalidade. Em escolas ou demais instituições, a participação em campeonatos e festivais é uma ferramenta educacional importante e motivadora. Normalmente, caberá ao profissional de educação física a responsabilidade pela organização, estruturação e arbitragem dos jogos. Sugerimos que você esteja atento às modificações e às possíveis alterações das regras para manter-se sempre atualizado, principalmente no futsal que historicamente apresenta mu- danças nas regras praticamente todos os anos. ATIVIDADES 1. Imagine que você é um árbitro de futsal e momentos antes de iniciar a partida uma das equipes compareceu com apenas três jogadores. Durante o jogo, um desses atletas foi advertido com o segundo cartão amarelo e foi, consequentemente, expulso. Qual postura deve ser adotada nesse caso? E se a competição fosse na categoria sub-9? 2. Se durante uma partida de futebol um defensor toca a bola com o braço involuntariamente estando dentro da área, qual seria a decisão do árbitro? 3. Na cobrança de um pênalti, o goleiro se adianta e um dos atacantes invade a área antes de o batedor tocar a bola, que é defendida pelo goleiro. Qual deve ser a decisão do árbitro? REFERÊNCIAS CBF. Livro de regras 2019-2020. CBF, 23 out. 2019. Disponível em: https://www.cbf.com.br/a- cbf/arbitragem/aplicacao-regra-diretrizes-fifa/livro-de-regras-2019-2020-portugues. Acesso em: 2 jul. 2020. FIFA. Manual FIFA de futebol base. Grassroots, 2016. Disponível em: https://grassroots.fifa. com/fileadmin/user_upload/pdfs/grassroots_2016__e.pdf. Acesso em: 2 jul. 2020. FPFS. Livro nacional de regras 2020. FPFS, 2020. Disponível em: http://www. federacaopaulistadefutsal.com.br/novo/wp-content/uploads/2020/03/Livro-Nacional-de- Regras-2020-Paraguassu-em-PDF.pdf. Acesso em: 2 jul. 2020. 106 Metodologia do ensino de futebol e futsal 7 Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades Você já se perguntou qual seria a função do futebol e do futsal nas aulas de Educação Física? Será que esportes que já são praticados em outros ambientes, ofertados em escolinhas e clubes, têm lugar na escola? E o professor de Educação Física, qual seria o papel dele no processo de ensino-aprendizagem? Quais seriam suas obrigações e como ele pode conduzir o processo? Questões como essas reforçam a importância de aprimorar os conhecimentos acerca das modalida- des e qual seria a melhor forma de transmiti-las. Apesar de se diferirem em alguns aspectos, como regras e di- mensões espaciais, ambos os esportes possuem a mesma lógica e consequentemente muita proximidade no quesito técnico-tático, sendo aqui tratados como sinônimos muitas vezes. Aliás, na escola, a modalidade se modifica e se adapta ao contexto, sem nomenclatu- ra formal e específica. Quer um exemplo? Crianças jogando durante o intervalo das aulas informalmente em uma disputa de 6 contra 6. Não é futsal, nem futebol, mas os esportes em sua plena manifesta- ção. As duas modalidades estão ali presentes. O futebol e o futsal têm grande força de atração entre os jovens e podem ser usados como ferramenta de integração com outras disciplinas, ressignificando a Educação Física, muitas vezes vista somente como recreação e extensão do intervalo. Aproveita- -se desse aspecto afetivo do esporte para qualificar as aulas de Educação Física, atribuindo a ela uma função mais ampla, ajudando a despertar a atenção, a curiosidade e o interesse pela participação. Assim, este capítulo pretende discutir o futebol e o futsal dentro da escola e o papel dos professores nessa relação. Conhecer como planejar o conteúdo para facilitar a operacionalização, entendendo as dificuldades, respeitando as diferenças, democratizando o ensino. 7.1 Papel do professor Vídeo Refletir sobre o papel do professor/treinador é imprescindível para que possamos qualificar o ensino das modalidades dentro das organi- zações, seja na escola, nos clubes ou nas escolinhas esportivas. Apesar das diferenças presentes na finalidade e no funcionamento dos espor- tes em diferentes contextos, a postura do mediador está pautada nos mesmos princípios. Não há dúvidas de que o esporte escolar deve estar alicerçado em valores educacionais que contribuam para a promoção de inclusão, autonomia, inserção, cooperação e cidadania (GALATTI; PAES, 2006). Entretanto, valores como esses ficam comprometidos quando o professor, influenciado pelo modelo de treinador de equipe profissional, passa a dar maior importância para os resultados esportivos. A competitividade exacerbada desnorteia o processo educativo e o desenvolvimento esportivo, pois pressupõe a importância maior ao imediatismo, além do resultado do produto acima do processo. Diversos autores têm debatido sobre esse tema e sugerido competências e ações que caracterizariam o papel do profissional que atuará dentro da quadra ou do campo. A preocupação se justifica quando são observados profissionais privilegiando a imposição física como critério de seleção, ou seja, maior prestígio e atenção para alguns poucos e consequente exclusão e desassistência para outros. A busca por títulos em categorias de base é outro fator importante a ser discutido. Essa postura pode estar submetendo crianças à cobran- ça inadequada e à pressão psicológica, o que pode ter como resultado a desmotivação ou a não aprendizagem plena, já que o foco foi dado ao resultado e não ao aprendizado. Nos estudos condu- zidos por Galatti e Paes (2006), os autores consideram fundamental que o professor seja portador de boas práticas e recomendam que, para exercer a fun- ção, o profissional deve obedecer às seguintes regras: Figura 1 Treinador/professor Sh ut te rs to ck /m at im ix 107Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 108 Metodologia do ensino de futebol e futsal Proporcionar a oportunidade para construção das habilidades motoras básicas. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Potencializar a técnica e tática por meio de treinos e experiências específicas, para que essas ações façam sentido. Valorizar as múltiplas inteligências, enxergando que cada indivíduo pode apresentar uma competência. Possibilitar a transformação e o ensinamento de valores. Construir relações pessoais, cooperação, empatia e respeito. Ensinar e desenvolver elementos básicos que compõem a lógica do jogo, os momentos de atacar e os momentos de defender. Estimular as competências cognitivas, por meio de tarefas condizentes às capacidades individuais e do grupo. Despertar o prazer e interesse pela prática esportiva, como praticante e espectador, despertandoa convivência com esporte para a vida. Promover autonomia, autoestima e autoconfiança. Criar metáforas e conexões do esporte com a vida. Compete ao professor estabelecer vínculos entre a aula de futebol ou futsal e o projeto pedagógico da escola, adaptando-a ao contexto da insti- tuição, número de alunos por turma, horário e faixa etária, com o objetivo de favorecer o desenvolvimento em suas individualidades, respeitando suas fases sensíveis de aprendizagem e proporcionando condições de se aprender o esporte por meio dele mesmo (GALATTI; PAES, 2006). Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 109 Independentemente da faixa etária ou do ambiente em que se ensina, essas condutas são baseadas nas relações humanas e são importantes para o processo pedagógico de qualquer natureza. O mediador da ativi- dade deve ter plena certeza da sua influência no processo formativo dos jovens. Nesse âmbito, faz-se necessário destacar alguns aspectos negati- vos comumente observados em escolinhas de futebol, escolas ou clubes. Para Garganta et al. (2013), os principais equívocos e comportamentos que devem ser evitados no processo de desenvolvimento esportivo são: Utilizar métodos de ensino extremamente tradicionalistas para ensinar as técnicas do futebol, ao invés do ensino do jogo. 1 2 3 4 5 6 7 Expor os jovens antes do período adequado a competições e jogos, colocando em confronto adversários de nível desigual às vezes. Especializar precocemente ao esporte e a funções específicas, sem que se atenda a formação integral. Comportar-se de maneira autoritária e inibir opiniões e expressões individuais. Planificar os treinos em função de jogos, campeonatos e torneios, além de não prestigiar o calendário escolar, como provas, férias, trabalhos. Usar repetições excessivas de exercícios analíticos, transformando o treino em monótono e desmotivador. Reprimir o erro, desencorajando a tentativa e a descoberta. O professor de Educação Física, como personagem mediador do pro- cesso ensino-aprendizagem no futebol e no futsal, deve estar ciente das suas responsabilidades na vida dos jovens e das crianças. A ele cabe a busca pelo conhecimento e a continuidade de seu processo evolutivo por meio de capacitações e trocas de experiências com colegas. Além disso, es- pera-se que ele seja autocrítico e se permita momentos de autorreflexão. Analisar os pontos positivos e negativos, após uma sessão de treino ou uma aula, por exemplo, é um exercício importante no processo Indicamos o vídeo Passaporte SporTV: projeto da federação alemã de futebol desenvolve esporte no país, publicado pelo site SporTV. Nesse vídeo é apresentado o modelo de desenvolvimento esportivo para o futebol na Alemanha, onde es- porte e educação andam juntos. Disponível em: http://sportv. globo.com/videos/copa-2014/t/ ultimos/v/passaporte-sportv- projeto-da-federacao-alema- de-futebol-desenvolve-esporte- no-pais/3410696/. Acesso em: 6 jul. 2020. Vídeo 110 Metodologia do ensino de futebol e futsal de crescimento do professor, pois assim como em qualquer área, continuamos a nos desenvolver ao longo da vida e as experiências durante esse trajeto nos tornam mais preparados e aprimoram nosso processo criativo. 7.2 Currículo de formação Vídeo É muito importante estabelecer diferenças para o esporte em sua expressão de acordo com o nível de referência e experiência que o in- divíduo possui. Segundo Rezer (2009), apesar de futebol e futsal apre- sentarem regras específicas e diferenças estruturais, o ensino como conteúdo pedagógico na escola na compreensão crítica e no conheci- mento da cultura corporal de movimento são iguais, portanto são con- ceituados como futebóis. A construção de um currículo formativo e de desenvolvimento para esses esportes está ancorada em valores como proporcionar ensino- -treino organizado, estruturado na ideia de desenvolvimento a longo prazo e proposta orientada pelo jogo, além de garantir o acesso a um treino pautado no jogo e no jogador, estimulando-o a criar situações de aprendizagem (GARGANTA et al., 2013). Para diferenciar o conteúdo a ser entregue, Garganta (2013) o dis- tingue em níveis básico, elementar, intermediário e especialização, de acordo com as referências que o indivíduo possui do esporte. Essa di- visão permite, então, nortear o planejamento e a estruturação de um plano de treinamento a longo prazo. Nível básico: Obsessão pela bola – caracteriza-se pela fase na qual o entendimento do jogo é elementar, assim como a relação com a bola. As técnicas não estão apuradas, o jogo fica desorganizado e é comum a aglomeração ao redor da bola. Não há uma consciência clara do obje- tivo do jogo, que é a marcação de gols, e tudo gira em torno do espaço onde a bola se encontra, gerando problemas quanto ao envolvimento e à participação no jogo. Nível elementar: Iniciação ao jogo – os gestos técnicos ainda são fre- quentes e a ocorrência de erros técnicos constantes influencia a fluidez da partida, porém já se observam melhorias quanto ao entendimento de jogo e de funções e posições ainda em estruturas simplificadas, como jogos de 4 contra 4 ou 3 contra 3. Começam a aparecer alguns princípios de jogo, como penetração, cobertura ofensiva e cobertura defensiva. Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 111 Nível intermediário: Organização posicional da equipe – as técnicas já possuem maior desenvolvimento e a diminuição de erros técnicos permi- te maior continuidade no jogo. É possível observar, nessa fase, maior com- plexidade nos princípios, como a mobilidade e o equilíbrio coletivo. Além disso, há maior consciência de posicionamento e funções nos diferentes períodos e momentos do jogo. Manifesta-se, também, a compreensão do aspecto coletivo e das conexões setoriais em que a equipe se beneficia das ações individuais. Nível de especialização: Refinamento da dinâmica coletiva – o nível agora permite maior organização e complexidade, pois os jogadores apre- sentam qualidades técnicas e táticas de modo contextualizado em relação às ações apresentadas. Além da constante mobilidade e do equilíbrio po- sicional, o jogo é muito mais coletivo e interativo entre os participantes. Quadro 1 Faixas etárias e respectivos conteúdos dos momentos ofensivos e defensivos Defesa Ataque 5 anos – 8 anos Jogos variados e diversificados com passagens pelas funções ofensivas e defensivas de maneira livre. 9 anos – 11 anos Referências baseadas no oponente, pouca limitação de espaço, ênfase na devesa por setor, ocupação de espaços e aproximação com abordagem, dobra de marcação, fechamento de linha. Posicionamento atrás e à frente da linha da bola, principalmente nos momentos de recomeço do jogo (tiro de meta, falta, lateral e escanteio). Desenvolver jogo direto (passes longos), mas apre- sentando opções para um jogo de passes curtos. Procurar equilíbrio setorial na distribuição dos joga- dores, pois as movimentações centram-se muito na trajetória da bola. Referenciais que facilitem a orga- nização ofensiva no momento de recomeço do jogo. Busca por situações de superioridade numérica. 12 anos – 14 anos Educar a defesa individual por setor em espaço de- limitado. Estimular compactação em largura e pro- fundidade. Priorizar ações mais setoriais do que in- dividuais. Pressionar o portador da bola, induzindo para o lado mais fraco. Apresentação de noções de retorno para trás da linha da bola em momentos de quebra de marcação. Bloqueio de corredores, prin- cipalmente o central. Desenvolvimento de ações ini- ciais com o goleiro atuando na cobertura. Inserção de jogo de passes curtos. Reforçar movi- mentos em compactação, movimentos com alter- nância simples de posições durante a construção ofensiva. Incrementar movimentos com e sem bola para situações de superioridade numérica dese- quilibrando a defesa adversária. Usar espaços nos corredores laterais do campo ofensivo por meio da circulação da bola, para,assim, propiciar situações de finalização. (Continua) 112 Metodologia do ensino de futebol e futsal Defesa Ataque 15 anos – 17 anos Aperfeiçoar a defesa individual por setor com refe- rências zonais. Constituir linhas defensivas e com- pactação do bloco. Criação de zonas de pressão. Movimentações que consigam induzir a bola para zonas de pressão. Estratégias coletivas para reequi- líbrio após quebras de linhas defensivas. Desenvol- vimento de ações de pressing na busca da retomada da posse de bola. Jogo com maior frequência de passes curtos, apro- ximação e abertura de linhas de passe. Criação de linhas de passe em todos os setores. Utilização do goleiro como linha de passe facilitadora da manuten- ção da posse de bola. Criação de movimentos mais frequentes com alternância de posições. Movimenta- ções para quebra de linhas defensivas do adversário e consequente abertura de espaços para infiltrações. ≥ 17 anos Direcionado aos interesses inerentes ao modelo de jogo exposto pelo treinador. Fonte: Adaptado pelo autor com base em Bettega et al., 2015 No primeiro estágio, a proposta é alicerçada no repertório motor e em movimentos fundamentais. Além disso, não há a preocupação com a especialização, por isso, jogos variados e bastante lúdicos são os mais indicados nessa fase. Note que conforme as idades vão subindo, o grau de complexidade aumenta, assim como as informações e o número de tarefas. Isso acontece até o último estágio, no qual é caracterizada a con- solidação das habilidades e o conteúdo vai depender do modelo de jogo e dos princípios adotados pelo treinador. O jogador já possui elementos em seu repertório e consegue adaptar-se às necessidades do modelo. 7.2.1 Vertentes do esporte Para o profissional que pretende trabalhar com futebol e futsal, co- nhecer as características do meio onde o esporte está inserido é de fundamental importância, pois isso determinará o perfil de trabalho e a postura adequada do professor. Assim como não devemos reproduzir com crianças os treinos que atletas adultos e profissionais realizam, também o comportamento do professor não deve ser semelhante aos exemplos de treinadores de alto rendimento, ou seja, é preciso deixar claro que são universos diferentes. A Lei n. 9.615 de 24 de março de 1998, a Lei Pelé (BRASIL, 1998), no Capítulo III, trata da natureza e das finalidades do desporto e os Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 113 classifica de modo a diferenciar em desporto educacional, desporto de participação, desporto de formação e desporto de rendimento. Segundo o artigo 3º, o desporto pode ser reconhecido em qualquer das seguintes manifestações: Desporto educacional, praticado nos sistemas de ensino e em formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hiper competitividade de seus praticantes, com a finalidade de al- cançar o desenvolvimento integral do indivíduo e a sua formação para o exercício da cidadania e a prática do lazer. Esta manifes- tação está subdividida em Esporte Educacional e Esporte Escolar. Ambas compreendem o ambiente escolar. (BRASIL, 1998) O esporte educacional deve ser inclusivo, promover a participação e incentivar a cooperação e a disciplina. De acordo com Tubino (2010), o esporte escolar permite competições e é oferecido aos alunos com al- gum interesse e talento esportivo, porém essa prática deve estar à frente dos princípios da formação para a cidadania. Desporto de participação, de modo voluntário, compreenden- do as modalidades desportivas praticadas com a finalidade de contribuir para a integração dos praticantes na plenitude da vida social, na promoção da saúde e educação e na preservação do meio ambiente. (BRASIL, 1998) Também conhecido como esporte-lazer ou esporte comunitário, ele é caracterizado por maior espontaneidade e está atrelado aos fins de saúde e qualidade de vida. As regras podem ser oficiais, adaptadas ou inventadas. Para Tubino (2010), o esporte-lazer tem como princípios a participação, o prazer e a inclusão. Desporto de rendimento, praticado segundo normas gerais desta Lei e regras de prática desportiva, nacionais e internacio- nais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e comunidades do País e estas com as de outras nações. Também conhecido como esporte de Desempenho, tem como objetivo aumentar a performance e atingir resultados, vencer campeo- natos, bater recordes e recompensas financeiras. Ainda assim a ética deve ser uma referência como fio condutor nas relações dos competidores em jogos e treinamentos. (BRASIL, 1998) Nessa manifestação esportiva, dois tipos de termos são utilizados: esporte de rendimento ou de alto rendimento (TUBINO, 2010). O alto rendi- mento pode ser representado, por exemplo, por atletas de nível olímpi- co. Já atletas do esporte de rendimento também buscam desempenho, mas não necessariamente têm o esporte como profissão principal. 114 Metodologia do ensino de futebol e futsal Desporto de formação, caracterizado pelo fomento e aquisição inicial dos conhecimentos desportivos que garantam compe- tência técnica na intervenção desportiva, com o objetivo de pro- mover o aperfeiçoamento qualitativo e quantitativo da prática desportiva em termos recreativos, competitivos ou de alta com- petição. (BRASIL, 1998) Nessa inclusão, ocorrida em 2015, a ideia foi diferenciar o rendi- mento de adultos e jovens. O tratamento a esses grupos não deve ser igual, sendo o desenvolvimento o foco dos jovens (TUBINO, 2010). Quadro 2 Manifestações do esporte e princípios fundamentais ESPORTE Formas de exer- cício do direito ao esporte Esporte-educação Esporte-lazer Esporte-desempenho Divisões das for- mas de exercício ao esporte Esporte educacional Esporte escolar Esporte-lazer Rendimento Alto- -rendimento Princípios Participação Educação Cooperação Responsabili- dade Inclusão Desenvolvimen- to esportivo Espírito espor- tivo Participação Prazer Desenvolvimento esportivo Desenvolvimento esportivo Competição – Êxitos Superação Fonte: Tubino, 2010, p. 44. O esporte educacional possui características inerentes, muito dife- rentes do esporte de alto rendimento, ou seja, o objetivo fundamental do primeiro é a participação. Apesar de não possuir o mesmo apelo mi- diático dos grandes eventos esportivos, o esporte educacional atinge o maior número de pessoas, como fenômeno da inclusão social, promo- vendo saúde e desenvolvimento intelectual e humano (TUBINO, 2010). É fundamental que enxerguemos qualquer programa esportivo como um potencial educativo. O benefício dessa participação é suprir as necessidades da motricidade, enriquecendo o aprendizado de mo- vimentos básicos e específicos do esporte. Além disso, é objetivo que esse ambiente de aprendizagem transcenda as barreiras do jogo para trabalhar os conceitos e valores intrínsecos ao esporte: a cooperação, o respeito mútuo, a solidariedade, a inclusão social e o exercício da cidada- Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 115 nia, garantindo e aprimorando a inclusão e o desenvolvimento humano (TUBINO, 2010). Ademais, cria-se uma cultura de movimento, reconheci- damente benéfica à saúde física/psicossocial/mental das pessoas. 7.2.2 Esporte como direito O esporte é, por lei, um direito do cidadão e deve ser concedido a todos os indivíduos de 0 a 18 anos de idade com a perspectiva indispen- sável de educação e lazer. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seu artigo 71, afirma que “a criança e o adolescente têm direito a informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos e produtos e serviços que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvol- vimento” (BRASIL, 2017). A oferta deve ser concedida à participação de todos sem distinção alguma, não apenas aos mais talentosos e com po- tencial para se tornarem jogadores de futebol profissional, por exemplo. Segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2018), a edu- caçãofísica como componente curricular trata da cultura corporal de movimento que se manifesta das mais diversas formas e com diversos significados. Para a Unesco, por meio da sua Carta Internacional da Educação Fí- sica da Atividade e do Esporte, publicada em 2015, a educação física e o esporte são um direito fundamental de todos e a participação deve ser incentivada durante toda a vida. A carta reforça o discurso da im- portância da prática, citando que as experiências positivas de jogos, atividades lúdicas e esportivas devem ser disponibilizadas a todos. Ain- da, a atividade física orientada pode ajudar a estabelecer uma base de conhecimento, habilidade, atitudes e motivação, aspectos necessários para a participação ao longo da vida na atividade e no esporte. A seguir está o artigo 1º da referida carta internacional. Artigo 1 – A prática da educação física, da atividade física e do esporte é um direito fundamental de todos. 1.1 Todo ser humano tem o direito fundamental de acesso à edu- cação física, à atividade física e ao esporte, sem qualquer tipo de discriminação com base em etnia, gênero, orientação sexual, língua, religião, convicção política ou opinião, origem nacional ou social, situação econômica ou qualquer outra. 1.2 A liberdade de desenvolver habilidades físicas, psicológicas e de bem-estar, por meio dessas atividades, deve ser apoiada por todos os governos e todas as organizações ligadas ao esporte e à educação. 116 Metodologia do ensino de futebol e futsal 1.3 Oportunidades inclusivas, assistivas e seguras para a partici- pação na educação física, na atividade física e no esporte devem ser disponibilizadas a todos os seres humanos, em especial crianças de idade pré-escolar, pessoas idosas, pessoas com defi- ciência e povos indígenas. 1.4 É um direito de toda menina e de toda mulher ter oportuni- dades iguais de participar em todos os níveis e funções de su- pervisão e decisão na educação física, na atividade física e no esporte, seja para fins recreativos, para a promoção da saúde ou para o alto rendimento esportivo. 1.5 A diversidade da educação física, da atividade física e do es- porte é uma característica fundamental do seu valor e atração. Jogos, danças e esportes, tradicionais e indígenas, também em suas formas modernas e emergentes, demonstram o rico patri- mônio cultural do mundo e devem ser protegidos e promovidos. 1.6 Todos os seres humanos devem ter oportunidades plenas de alcançar um nível de realização que corresponda a suas ca- pacidades e a seus interesses, por meio da educação física, da atividade física e do esporte. 1.7 Todos os sistemas de educação devem considerar o devido lugar e a importância da educação física, da atividade física e do esporte, para estabelecer um equilíbrio e fortalecer os vínculos entre as ati- vidades físicas e os outros componentes da educação. Da mesma forma, eles devem assegurar que uma educação física inclusiva e de qualidade seja parte obrigatória do ensino primário e secundário, e que o esporte e a atividade física, na escola e em todas as outras instituições educativas, tenham um papel integral na rotina diária de crianças e jovens. (UNESCO, 2015, p. 4, grifos do original) A Carta Internacional da Educação Física, da Atividade Física e do Es- porte ainda destaca em seu artigo 2º , que “a atividade física e o esporte podem proporcionar uma ampla gama de benefícios às pessoas, às co- munidades e à sociedade em geral” (UNESCO, 2015, p. 3). Portanto, po- líticas públicas devem ser estimuladas e cobradas para oferecer maior abrangência nos programas socioeducativos. Isso é reforçado pelo ar- tigo 3°: “todas as partes interessadas devem participar da criação de uma visão estratégica que identifique as opções e as prioridades políti- cas” (UNESCO, 2015, p. 4). A pesquisa e as evidências científicas também são temas contem- plados pela Unesco e considerados aspectos indispensáveis para o de- senvolvimento da educação física, da atividade física e do esporte. Vale ressaltar, também, o destaque para a qualificação exigida ao profissional O livro O futsal e a escola: uma perspectiva pedagógica, apresenta o futsal como uma modalidade viável a ser desenvolvida na escola, proporcionando desen- volvimento esportivo sem se desprender do viés educacional, além de aspectos relacionados à formação humana. O material tem grande valia aos profissionais de edu- cação física na constru- ção do planejamento e da execução das aulas. VOSER, R. C.; GIUSTI , J. G. M. Porto Alegre: Penso, 2015. Livro Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 117 e o valor dos espaços e das estruturas físicas de qualidade e seguros para as práticas de educação física e, consequentemente, das práticas esportivas em que se inserem o futebol e o futsal (UNESCO, 2015). 7.3 Entendendo o contexto escolar Vídeo Um tema importante a ser discutido é o futebol e o futsal dentro do contexto escolar. Como esses esportes podem contribuir para a edu- cação? Aprender por meio do que nos dá prazer parece ser muito mais eficiente. Se dentro da escola, na sala de aula, dermos a opção de os jovens ficarem ou saírem, quantos ficariam ali? E se essa opção fosse dada na aula de futebol lá do clube? Bom, se você concordar que ha- verá uma grande diferença, então concordamos que o futebol tem o papel de atrair. Nesse sentido é que o poder público, as instituições de ensino e o professor devem atuar, criando estratégias para que o futebol seja o meio de auxiliar o indivíduo a se tornar melhor. Muitos paradigmas fo- ram construídos ao longo do tempo dentro da educação física escolar, como a utilização das aulas para a descoberta de talentos esportivos ou o desenvolvimento da aptidão física e a formação de equipes competi- tivas (FINK, 2011). Essa visão ficou impregnada à imagem das aulas de Educação Físi- ca. Do outro lado está a evidente importância da formação integral do ser, a inclusão social e a participação a qual todos têm direito. Segun- do a BNCC (2018), ao longo da educação básica 1 , os alunos devem desenvolver as competências gerais, resultando em um processo de formação humana que aponte à construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva. Galatti e Paes (2006) reforçam que a educação física escolar deve preocupar-se com a formação integral dos alunos, atuando nos aspectos motor, cognitivo, afetivo e social. O esporte ofere- cido pela escola conjectura a formação do indivíduo em sua totalidade, pois aqueles que aprendem de fato o esporte desenvolvem habilidades diversificadas que contribuirão para o melhoramento das qualidades fí- sicas, além da ampliação de valores morais e sociais (CAVALCANTI, 2013). Correspondente à educação infantil, ao ensino fundamental e ao ensino médio. 1 118 Metodologia do ensino de futebol e futsal Na escola, o futebol que prestigia a formação de equipes reduz seu significado incluso no processo educacional. Mas isso não configura a exclusão da competição esportiva e da valorização do talento, estas também são bem-vindas e podem muito bem fazer parte do ambiente escolar. Muitos dos jovens e das crianças matriculados nas escolas pú- blicas espalhadas pelo país não têm condições de frequentar e praticar esportes em clubes, devido às distâncias impostas pelas condições eco- nômicas, sociais e geográficas. “A escola, tanto privada como pública, deve oferecer espaço para o aprendizado e para o treinamento esporti- vo, pois a maioria dos jovens não tem acesso a clubes socioesportivos” (FINK, 2011, p. 107). O futebol tem o dever de aproximar a atividade física e a educação do jovem de maneira prazerosa e consensual. Qualquer relação impositiva será superficial e trará desgastes no futuro, assim também é no espor- te. Aulas que proporcionam experiências positivas tendem a refletir em engajamento e continuidade. Entretanto, ambientes onde o professor privilegia os melhores pensando no campeonato escolar, pressiona de- masiadamente osalunos, atua com rigidez e autoritarismo e inibe suas decisões e opiniões, o que tende a gerar experiências traumáticas, além de causar afastamento e desinteresse pela aula ou pela atividade. O método dos jogos pedagógicos na escola é uma boa alternativa. Especialistas observam que, durante o jogo, os praticantes têm em co- mum o gosto por ele e por quererem desfrutar possibilidades ofereci- das. Assim, o ato de jogar dificilmente se tornará enfadonho, o mesmo não se pode dizer com relação ao modo como, por vezes, o futebol é ensinado e treinado (GARGANTA et al., 2013). 7.4 Planejando a aula Vídeo A sessão semanal, ou microciclo, auxilia o professor a organizar a distribuição de conteúdos em cada unidade de treino. Cada semana deve possuir um objetivo que contenha os aspectos técnicos, táticos, físicos e psicossociais inseridos de acordo com o nível de aptidão e a necessidade identificada. O microciclo deve estar em consonância com o planejamento macro, também chamado de macrociclo (planejamento semestral/anual), porém salientamos que o microciclo deve ser flexível e adaptável. Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 119 Pessoas têm pontos de partida distintos e evoluem em diferentes velocidades, ou seja, o desenvolvimento não é linear e reestruturar a aula para se adaptar à necessidade do aluno é uma das grandes vir- tudes do professor. Por esse motivo, o professor deve estar atento às demandas pessoais e coletivas que se apresentam durante o processo de desenvolvimento. Além disso, o planejamento e a construção dos conteúdos não devem ser fechados, mas, sim, permitir a inserção e a modificação de elementos que podem tornar o treinamento mais rico. A sessão de treino é o último passo no processo de planejamento, as sessões ou aulas devem ter relação com a que a precede e a subse- quente. Cada sessão deve ser estruturada do mesmo modo, ou seja, com a mesma estrutura organizacional, normalmente dividida em três blocos que consistem em primeira parte ou aquecimento, parte princi- pal e parte final. Essa divisão permite que o professor-treinador insira os conteúdos e os distribua coerentemente de acordo com o tempo destinado a cada um desses blocos. Figura 2 Professor em momento de integração com os alunos Sh ut te rs to ck / R aw pi xe l.c om Para a estruturação da sessão de treinamento, alguns componentes são levados em consideração. Esses aspectos são flexíveis e auxiliam a organizar a prática. 120 Metodologia do ensino de futebol e futsal • Espaço: mantenha a organização do espaço simples e entendível, desde a organização inicial até pequenas alterações durante a sessão. É importante o cuidado para não reconfigurar o ambiente drasticamente, isso pode deixar a aula confusa e atrapalhar sua dinâmica. • Tempo: o tempo do exercício pode ser flexível, permitindo a fluência da atividade para atingir as metas da aula. Porém, é importante o extremo cuidado com o excesso de volume, principalmente para crianças. A utilização de pausas para recuperação e feedbacks 2 pode ser uma alternativa. • Intensidade: é sempre preferível a utilização de períodos curtos de estímulo com intensidade elevada seguidos de pausas, pois assim o jogo também se apresenta. As pausas podem ser estra- tégicas e utilizadas para considerações e explanações por parte do professor. • Regras: é possível usar diferentes regras para os jogos e as práti- cas, adaptando-as às características dos jogadores participantes. Assim, será possível a realização do exercício, além de torná-lo estimulante. • Número de jogadores: a utilização de menos ou mais jogado- res é uma alternativa importante para estimular as capacidades técnicas, físicas e cognitivas. É possível criar superioridade ou in- ferioridade numérica em uma das equipes para diminuir ou au- mentar o grau de dificuldade do jogo. A aula deve proporcionar um ambiente rico, com tarefas desafia- doras que estimulem a curiosidade e o interesse. Fazer com que haja participação e interação de todos durante toda a aula é fundamental para a motivação dos alunos, por isso alguns comportamentos clássi- cos devem ser evitados: não deixar os alunos em filas ou colunas, não paralisar a aula a todo momento para correções e não deixar alunos no banco de reserva ou esperando. É possível criar exercícios dinâmicos que permitam a participação da turma. Uma sessão de treino ou uma aula pode obedecer à seguinte estrutura: Feedback é um termo em inglês utilizado para sugerir uma in- formação resposta ou avaliação sobre algo realizado. 2 Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 121 Quadro 3 Estrutura de treino UNIDADES ATIVIDADES Parte inicial (aquecimento) – 10 minutos Conversa inicial Brincar Ativação e preparação Parte principal – 40 minutos Jogo conceitual com tarefa simples Jogo mais complexo Transferência Parte final – 10 minutos Volta à calma Diálogo de conciliação Feedback de aprendizagem TOTAL = 60 minutos Fonte: Elaborado pelo autor. No Quadro 3 podemos observar um modelo de distribuição de con- teúdo. Nesse exemplo, propomos uma sessão dividida em três partes ou unidades: i) parte inicial; ii) parte principal; iii) parte final. Porém, vale deixar claro que pode-se utilizar quantas unidades forem necessá- rias, ficando a critério do professor. A parte inicial seria a fase de ambientação da atividade proposta, po- pularmente chamada de aquecimento. Essa parte deve ser utilizada para uma conversa inicial, apresentação das atividades e objetivos propostos. Em seguida, uma brincadeira, que pode ser, preferencialmente, uma ati- vidade lúdica relacionada à parte principal, ou uma preparação para os gestos, contendo mobilidade, flexibilidade e ativação neuromuscular. A parte principal pode ser subdividida, mas não necessariamen- te. Em nosso exemplo foi planejado um jogo conceitual, jogos mais simples em sua estrutura e funcionalidade (3 contra 3). Em seguida, o grau de complexidade do jogo aumenta, assim como as dimensões 122 Metodologia do ensino de futebol e futsal da quadra (3 contra 3 com apoio) e, depois, o jogo formal: 4 contra 4 com goleiro. A parte final é utilizada como volta à calma, um momento de abran- dar os ânimos, com diálogo e feedback. Isso favorece o momento de reforço positivo e acomodação do aprendizado. 7.5 Futebol e futsal como ferramentas de desenvolvimento humano Vídeo Assim como já discutido anteriormente, o futebol e o futsal têm forte apelo midiático e grande popularidade entre os brasileiros, sendo mo- dalidades que ultrapassam a esfera esportiva e têm conotação cultural em nosso povo. Características como essas não podem ser desperdiça- das e devem ser utilizadas como ferramenta de desenvolvimento hu- mano, auxiliando no processo educacional da criança e do jovem. Por que não utilizarmos o futebol, por exemplo, para despertar o in- teresse por geografia, conhecendo a localização e as características dos países que disputarão a próxima Copa do Mundo? Ou que tal discutir história ou política usando os países-sede, talvez debatendo estatística e matemática para probabilidades de uma equipe ser bem-sucedida em um torneio, além de outros aspectos que podem ser aproximados, como saúde, meio ambiente, sexualidade, ética etc. A escola deve ser um ambiente rico e democrático, assim como o fute- bol. A aula de Educação Física é o elo que liga esses dois universos, e pensar por esse aspecto permite refletir, além de favorecer o entendimento da forte relação de interdependência existente entre eles. Atividades que des- pertam o interesse das pessoas possuem essa responsabilidade agregada. Ensinar pelo esporte traz maior significado à nossa profissão. Segundo Garganta et al. (2013), a maior contribuição que podemos oferecer é uma formação consistente, valorizando as competências dos jovens e auxiliando-os a encontrar seu caminho. Os valores associados a relações humanas já estão intrínsecos noesporte, mas devem ser reforçados positivamente, como o companheirismo, a solidariedade, a gentileza, o respeito às regras, a tolerância, além de valores individuais, como a disciplina, a resiliência, a motivação e o entusiasmo (GARGANTA et al., 2013; GALATTI; PAES, 2006). Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 123 O futebol e o futsal como manifestações esporti- vas devem ser compreendidos como um fenômeno social e imprescindível para assegurar os direitos à cidadania. Esse pressuposto reforça o reconheci- mento do esporte como direito de todo cidadão já garantido pela nossa constituição. O esporte é fruto das relações humanas e esse princípio deve ser sem- pre lembrado. Na obra Metodologia dos jogos condicionados para o futsal e educação física escolar, o professor Balzano propõe reflexões sobre o jogo e sua relação com o desenvolvimento humano. Além disso, o autor destaca diretrizes metodológicas para o ensino do futsal na escola e oferece uma coletânea de 178 jogos, divididos por objetivos, idades e fundamentos, entre outros aspectos. BALZANO, O. N. 1. ed. São Paulo: Fontoura, 2012. Livro CONSIDERAÇÕES FINAIS O esporte em suas mais diversas manifestações deve ser estimula- do dentro da escola, porém com viés mais profundo, ou seja, além da visão do esporte vendido pelos veículos midiáticos, trazendo significado para o aprendizado da modalidade. Observamos atualmente as aulas de Educação Física e manifestações esportivas perdendo cada vez mais espaço na escola, sendo delegada essa função a clubes e outros espa- ços específicos. Na contramão a esse movimento, a sociedade contem- porânea vem valorizando cada vez mais os valores contidos no esporte. Características como competitividade, senso de coletividade, trabalho em equipe, respeito a regras e hierarquia, responsabilidade e disciplina, re- siliência e flexibilidade são exigências do mercado de trabalho atual, por exemplo, e claramente inerentes ao esporte. Nesse processo, o professor tem papel fundamental e sua atuação nas aulas de Educação Física deve incluir ações pedagógicas que favoreçam a inserção do esporte na cultura e na vivência do indivíduo por toda a vida, desenvolvendo os hábitos saudáveis que a prática esportiva pode proporcionar. É importante sabermos que qualidades como amorosida- de, empatia, respeito e tolerância são fundamentais para a bem-sucedida prática pedagógica. Independentemente da vertente do esporte e dos objetivos aos quais se propõe, está claro que o futebol e o futsal são fenômenos culturais que se manifestam por meio das relações humanas. Enxergá-los apenas pelo viés da performance é reduzir a visão sobre uma condição humana com- plexa. Independentemente da idade a qual se destinam e do ambiente em que são oferecidos, o futebol e o futsal, pela sua magnitude, devem cumprir o papel de promover a saúde mental e física. 124 Metodologia do ensino de futebol e futsal ATIVIDADES 1. Quanto às vertentes do esporte, a Lei Pelé diferencia as manifestações esportivas pela sua finalidade. O futebol e o futsal inseridos nesse contexto devem obedecer a essas diretrizes. Qual é a importância dessa diferenciação? 2. A escola, tanto privada como pública, deve oferecer espaços para o aprendizado e o treinamento esportivo, pois a maioria dos jovens não tem acesso a clubes socioesportivos. Discuta sobre esse tema. 3. Como seria uma sessão de treino ou aula de futebol e futsal elaborada por você? Como você dividiria a sessão e quais elementos inseriria? Exercite sua criatividade baseada na estrutura demonstrada aqui. REFERÊNCIAS BETTEGA, O. B. et al. Formação de jogadores de futebol: princípios e pressupostos para composição de uma proposta pedagógica. Movimento, v. 21, n. 3, p. 791-801, jul./set. 2015. BRASIL. Lei n. 9.615, de 24 de março de 1998, Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 24 mar. 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/Leis/ L9615consol.htm. Acesso em: 3 jul. 2020. BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente. Brasília, DF: Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2017. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/ handle/id/534718/eca_1ed.pdf. Acesso em: 3 jul. 2020. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_ versaofinal_site.pdf. Acesso em: 3 jul. 2020. CAVALCANTI, L. A. Fatores que motivam alunos, professores e gestores na prática e desenvolvimento do futsal escolar. Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v. 5, n. 18, p. 284-290. jan./dez. 2013. FINK, S. C. M. A Educação e o esporte na escola. Cotidiano, saberes e formação. 2 ed. Curitiba: Ibepex, 2011. GALATTI, L. R.; PAES, R. R. Fundamentos da Pedagogia do esporte no cenário escolar. Movimento & percepção, v. 6, n. 9, jul./dez. 2006. GARGANTA, J., et al. Fundamentos e práticas para o ensino e treino do futebol. In: TAVARES, F. (org.). Jogos Desportivos Coletivos. Ensinar a jogar. Porto: Editora FADEUP, 2013. REZER, R. Pressupostos orientadores para o ensino dos “futebóis” na educação física escolar. Cadernos de Formação RBCE, v. 1, n. 1, p. 71-87, set. 2009. TUBINO, M. J. G. Estudos brasileiros sobre o esporte: ênfase no esporte-educação. Maringá: Eduem, 2010. UNESCO. Carta Internacional da Educação Física, da Atividade Física e do Esporte. Unesdoc, 2015. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000235409_por. Acesso em: 3 jul. 2020. https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/534718/eca_1ed.pdf https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/534718/eca_1ed.pdf https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000235409_por Gabarito 125 GABARITO 1 A história do futebol e do futsal 1. A profissionalização só faz bem ao esporte, já que organiza e estabelece direitos e deveres. Entretanto, é importante que os valores fundamentais do esporte não sejam desvirtuados e que cuidados sejam tomados para que a busca pelo lucro não se sobreponha à formação humana, intrinsecamente ligada ao esporte. 2. As mulheres conquistaram um espaço importante no cenário futebolístico, mas isso ainda está longe do ideal. Mais oportunidades poderiam ser oferecidas em diversos cargos, mas ainda vemos preconceito nos estádios e nos clubes. A mudança já começou, porém não pode estacionar. 3. O fenômeno pode ter relação com as constantes ondas imigratórias no Brasil. Recebemos povos de diversas origens e captamos um pouquinho de cada perfil. Com um país de dimensões territoriais imensas, as interações podem ter contribuído para um jeito brasileiro exclusivo de jogar. 2 Metodologia do ensino de futebol e futsal 1. O inatismo reflete a ideia de que alguém traz, em sua herança genética, as habilidades de determinada área. Porém, essa ideia é limitada em seu conceito, já que é possível comprovar que as habilidades também são construídas com base em experiências e vivências de qualidade. Portanto, o interativismo parece explicar melhor a construção do talento esportivo. 2. O método analítico oferece um aprendizado específico das técnicas e dos fundamentos do futebol e futsal, mas exclui a ideia da imprevisibilidade presente no jogo e prioriza o gesto mecânico. Dessa forma, ele desfavorece um ensino integrado e mais próximo da realidade desse esporte. 3. Para que seja útil como ferramenta de ensino, o jogo deve contemplar principalmente as competências das crianças de modo coerente com as fases de desenvolvimento e momento biológico. Dessa forma, deve principalmente atrair as crianças com tarefas plausíveis às suas capacidades, senão a atividade será desmotivadora. 126 Metodologia do ensino de futebol e futsal 3 Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 1. O ensino das técnicas deve estar pautado na ideia de contextualizar o que está sendo aprendido. O foco somente no movimento desfavorece o aprendizado do esporte como um todo, mecanizando e criandorepetidores de gestos e não pensadores do jogo. 2. As habilidades técnicas são divididas em ações de momentos ofensivos e momentos defensivos, porém deve ser ofertada a oportunidade de os alunos vivenciarem todos os aspectos do jogo. Portanto, principalmente durante o processo de aprendizagem, o ensino não deve fragmentado. 3. A repetição contínua de determinado gesto tende, de fato, a proporcionar uma especialização e tão logo uma execução mais desenvolta dessa habilidade. A curto prazo, essa criança parecerá mais habilidosa do que as outras, mas a longo prazo, essa repetição não será vantajosa, pois os cenários mudam, assim como a dificuldade do jogo. Então, o gesto aprendido em condição fechada nem sempre refletirá o jogo em si. É importante ressaltar, também, o risco aumentado de lesões por repetições excessivas, principalmente nas idades menores. 4 Princípios táticos do jogo 1. O sucesso do modelo depende de diversos fatores e o treinador deve levar em consideração todos eles, por exemplo, a imposição de regras, regimentos e métodos que deve estar alinhada com a cultura local, com as condições climáticas e estruturais e com os costumes dos indivíduos para não se tornar um empecilho. É importante que saibamos ajustar as ideias iniciais ao ambiente de interação. 2. O jogar bem, segundo o autor, está associado com a materialização da ideia inicial do professor, ou seja, quanto mais a realidade do jogo estiver próxima ao que foi pensado na elaboração do plano. Portanto, jogar bem está associado à execução do que foi treinado. 3. O critério de escolha do esquema ou sistema tático deve estar apoiado na ideia e no modelo de jogo, assim como nas características dos jogadores em realizar determinadas funções. Ou seja, o esquema deve estar de acordo com as peças que possuímos para a melhor execução das ideias. Gabarito 127 5 Fisiologia e preparação física 1. A idade cronológica é a contagem temporal dos anos do indivíduo, já a idade biológica representa sua atual fase de desenvolvimento do organismo. O grande problema relacionado a esse tema é que a distribuição ou divisão das equipes utiliza o critério cronológico, ou seja, inseridas na equipe podem haver pessoas em fases de desenvolvimento bem distintas. Desse modo, não observar essas particularidades pode induzir o professor a comprometer o processo de formação. Alguns dos problemas observados são: exposição a cargas excessivas, insucesso esportivo, subestimação de potencial, menos participação em treinos e jogos, desmotivação etc. 2. Para minimizar os riscos de lesões esportivas e potencializar os ganhos com o treinamento, é importante o controle de cargas. Por meio de testes e avaliações, como o teste de salto vertical, é possível identificar a fadiga neuromuscular do atleta e, assim, reorganizar o conteúdo de treino a ele oferecido. 3. Diversos especialistas do treinamento esportivo concordam que treinar em condições semelhantes à competição favorece melhores adaptações. Estudos mostram que é possível desenvolver as capacidades físicas por meio de jogos adaptados. Como vantagem, esse método aumenta a inteligência de jogo, além de otimizar o tempo de trabalho, focando exclusivamente na intensidade semelhante e esperada do jogo. 6 A regra do jogo 1. No caso citado, em uma partida oficial, o árbitro não deve permitir a continuidade do jogo, encerrando-o, pois segundo a Regra 3, não é permitida a realização de uma partida com uma equipe com menos de três jogadores. Porém, a segunda parte da questão traz a necessidade de enxergar com outros olhos a rigidez da regra. Caso não haja um regulamento específico para essa competição nessa situação, caberá o bom senso dos organizadores e professores envolvidos, ou seja, uma suspensão temporária ou uma advertência verbal pode fazer com que a regra seja mais flexível e não haja a necessidade de excluir o jovem. 2. Caso o toque na bola com as mãos ou os braços seja involuntário e a posição desses membros não esteja ampliando a extensão do corpo, por exemplo, braços abertos ou acima da cabeça, não será marcada a infração. Por isso, é importante que o jogador esteja ciente de que 128 Metodologia do ensino de futebol e futsal na utilização de qualquer gesto dos braços que dê margem a uma interpretação contrária dessa citada, será assinalado o pênalti. 3. Nessa situação, deve ser repetida a cobrança de pênalti, pois os dois jogadores cometeram a infração, tanto o goleiro quanto o jogador invasor. Como o goleiro se beneficiou dessa infração, a cobrança deve ser executada novamente. 7 Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 1. A diferenciação do esporte por suas diferentes manifestações, descrita pela Lei Pelé, é importante para garantir a equidade esportiva e a participação de todos, sem distinção de mais ou menos aptidão. Assim, fica claro ao professor que deve se entender o contexto em que o esporte está inserido e para quem ele está sendo oferecido. O indivíduo que se destaca como potencial atleta deverá ser direcionado para um centro ou um clube específico. 2. A escola é um ambiente que deve privilegiar a educação e formação integral do indivíduo. Isso não significa excluir a oportunidade a competições e jogos, até porque muitos dos locais no nosso país estão distantes dos grandes centros urbanos, e poucos têm acesso a clubes, seja por situação socioeconômica ou por oportunidade. Vale lembrar que o acesso à competição deve obedecer aos devidos cuidados, além de respeitar as individualidades. 3. É importante que a sessão de treino tenha começo, meio e fim. Que seja bem planejada e atenda às necessidades da turma. Uma estrutura de treino pode conter: parte inicial, com duração de dez minutos, deve valorizar a integração e preparar para a próxima atividade com brincadeiras e exercícios gerais; parte principal, com duração de quarenta minutos, precisa de tarefas que estimulem a participação de todos e atendam o objetivo principal da aula ou sessão de treino, com um mini jogo e o jogo formal; e a parte final, que tem o objetivo de diminuir o calor e a tensão proporcionados pelos exercícios, além de ser usada como momento de reflexão e de conversa sobre o que foi aprendido na aula. Tem duração de dez minutos. RICARDO C. ALVES FERREIRA METODOLOGIA DO ENSINO DE FUTEBOL E FUTSAL Código Logístico 59520 Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-6667-4 9 7 8 8 5 3 8 7 6 6 6 7 4 Página em branco Página em branco