Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
RICARDO C. ALVES FERREIRA METODOLOGIA DO ENSINO DE FUTEBOL E FUTSAL Tanto o futebol quanto o futsal têm forte apelo na sociedade brasileira e possuem vínculos com aspectos culturais. Poucas manifestações artísticas e esportivas representam tão bem a cultura brasileira como esses esportes, que possuem estilos próprios e personificam o estereótipo do brasileiro. Com o tempo, eles evoluíram e ganharam proporção de espetáculo, movimentando muito dinheiro e interesses às vezes escusos, mas, mesmo assim, sem perderem sua força de encantamento junto aos jovens e às crianças. Nesta obra, são levantadas questões importantes para o desenvolvimento do jovem nessas modalidades, como aspectos pedagógicos e metodológicos aplicados ao futebol e ao futsal, abordando os meios de potencializar a aprendizagem técnica, tática, física e psicológica, além de apresentar as particularidades do processo de crescimento e maturação, as regras, as leis e os direitos que regem os esportes. Tudo isso sem se desconectar de uma visão holística, pautada no entendimento de que o futebol e o futsal são construídos sob relações humanas e aliados à força atrativa que o esporte tem para ser utilizado como ferramenta de educação e de construção de valores de cidadania. O objetivo desta obra é oferecer informações e induzir reflexões para que o leitor consiga, por meio do senso crítico, encontrar soluções para os diversos desafios que emergirem durante sua caminhada como educador-treinador. Código Logístico 59520 Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-6667-4 9 7 8 8 5 3 8 7 6 6 6 7 4 Metodologia do ensino de futebol e futsal Ricardo C. Alves Ferreira IESDE BRASIL 2020 © 2020 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: EnvatoElements Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ F443m Ferreira, Ricardo C. Alves Metodologia do ensino de futebol e futsal / Ricardo C. Alves Ferreira. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2020. 128p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-6667-4 1. Futebol - Esporte. 2. Futsal - Esporte. 3. Educação física - Estudo e ensino. 4. Professores de educação física - Formação. 5. Prática de ensino. I. Título.. 20-64482 CDD: 796.3348071 CDU: 796.33(07) Ricardo C. Alves Ferreira Doutorando em Ciências do Movimento Humano pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Mestre em Engenharia Biomédica, com foco em fisiologia do exercício, e graduado em Educação Física pela Universidade do Vale do Paraíba (Univap). Professor no ensino superior, ministrando as disciplinas de Futebol e Futsal, Aprendizagem e Desenvolvimento Motor, Fisiologia do Exercício, Biomecânica e Educação Física Adaptada e Atividade Física em Condições Especiais. É preparador físico e fisiologista em equipes de futebol profissional, com experiência no Brasil e no exterior. SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! 1 A história do futebol e do futsal 9 1.1 Origem e evolução do futebol 10 1.2 Futebol no mundo 12 1.3 Futebol no Brasil 16 1.4 Aspectos socioculturais 19 1.5 Origem e evolução do futsal 20 2 O ensino de futebol e de futsal 24 2.1 Reflexões acerca da formação do professor 25 2.2 Ambiente de aprendizagem 27 2.3 Métodos de ensino 29 2.4 Abordagens pedagógicas 32 2.5 Pedagogia dos jogos 35 2.6 Iniciação esportiva e capacidades motoras 37 3 Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 41 3.1 Passe 42 3.2 Domínio 43 3.3 Condução 44 3.4 Drible 45 3.5 Chute 46 3.6 Cabeceio 48 3.7 Ações do goleiro 49 3.8 Relação jogador-bola 50 4 Princípios táticos do jogo 53 4.1 Modelo de jogo 54 4.2 Momentos do jogo 55 4.3 Princípios de jogo 58 4.4 Funções e posições no futebol 60 4.5 Sistemas táticos no futebol 61 4.6 Funções e posições no futsal 63 4.7 Sistemas táticos no futsal 64 5 Fisiologia e preparação física 69 5.1 Demandas fisiológicas 70 5.2 Treinamento do jovem 76 5.3 Jogos condicionantes 81 5.4 Avaliações físicas e controle de treinamento 83 6 A regra do jogo 89 6.1 Regras do futebol 89 6.2 Adaptações para categorias de base no futebol 97 6.3 Regras do futsal 99 6.4 Adaptações para categorias de base no futsal 103 7 Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 106 7.1 Papel do professor 107 7.2 Currículo de formação 110 7.3 Entendendo o contexto escolar 117 7.4 Planejando a aula 118 7.5 Futebol e futsal como ferramentas de desenvolvimento humano 122 Gabarito 125 Tanto o futebol quanto o futsal têm forte apelo na sociedade brasileira e possuem vínculos com aspectos culturais. Poucas manifestações artísticas e esportivas representam tão bem a cultura brasileira como esses esportes, que possuem estilos próprios e personificam o estereótipo do brasileiro. Com o tempo, eles evoluíram e ganharam proporção de espetáculo, movimentando muito dinheiro e interesses às vezes escusos, mas, mesmo assim, sem perderem sua força de encantamento junto aos jovens e às crianças. A sociedade também se modificou. As grandes áreas e o espaço fértil para a brincadeira informal perderam lugar para a urbanização, e o futebol aprendido em ruas, campinhos e vielas agora passa a ser responsabilidade de professores em escolinhas e outros ambientes formais. Nesta obra, são levantadas questões importantes para o desenvolvimento do jovem nas modalidades, como aspectos pedagógicos e metodológicos aplicados ao futebol e ao futsal, abordando os meios de potencializar a aprendizagem técnica, tática, física e psicológica, além de apresentar as particularidades do processo de crescimento e maturação, as regras, as leis e os direitos que regem os esportes. Tudo isso sem se desconectar de uma visão holística, pautada no entendimento de que o futebol e o futsal são construídos sob relações humanas e aliados à força atrativa que o esporte tem para ser utilizado como ferramenta de educação e de construção de valores de cidadania. O objetivo desta obra é oferecer informações e induzir reflexões para que você consiga, por meio do senso crítico, encontrar soluções para os diversos desafios que emergirem durante sua caminhada como educador-treinador. Bons estudos. APRESENTAÇÃO A história do futebol e do futsal 9 1 A história do futebol e do futsal O futebol é, sem dúvida, um dos esportes mais praticados no mundo. Os números contabilizam algo em torno de 265 milhões de pessoas o praticando em todo o planeta – além dos adeptos, torcedores e admiradores mundo afora. Muito mais do que so- mente uma mera atividade esportiva, esse esporte se tornou um fenômeno global que influencia costumes e hábitos. No Brasil, o futebol e o futsal invadem a vida cotidiana das pessoas, o que o aproxima muito mais de um conceito de dimensão cultural. Para perguntas como “o que você vai ser quando crescer?”, nãoé difícil escutar a resposta: “quero ser jogador(a) de futebol”. Já reparou que usamos metáforas futebolísticas em nossas con- versas quase a todo momento? Quando algo nos agrada, foi “show de bola”, se alguém foi desprezado, foi colocado “para escanteio”, a quase conquista de um objetivo significa que “bateu na trave”. Tanta influência na vida das pessoas já justificaria tal curiosida- de em entender melhor esse fenômeno e como atingiu tamanha magnitude. Mas compreender a importância dele como elemento e parte integrante de uma sociedade é um dos papéis do educa- dor, já que um esporte com tanta força e relevância pode ser uti- lizado como ferramenta de educação, proporcionando inclusão social, oportunidades, acesso à informação e assistencialismo. De fato, não é só futebol, caso seja um apreciador da modali- dade, você pode, de repente, ter várias informações a respeito do futebol moderno, mas você sabe como esse esporte começou? A partir de agora te convidamos a uma viagem na história pelas lentes do futebol. 1.1 Origem e evolução do futebol Vídeo O esporte que conhecemos por futebol teve origem e se desenvol- veu na Inglaterra no século XIV, porém versões alternativas do jogo podem ter existido muito antes, em locais distintos e distantes. As in- formações sobre esses jogos com bola, ancestrais do futebol, são im- precisas, mas eles existiram e são considerados parte fundamental da história do esporte. Há grandes indícios de que o futebol tenha surgido na China, e evidências levam os historiadores a crer que um jogo praticado com gestos técnicos semelhantes ao que vemos no futebol de hoje era praticado durante a dinastia Han, cerca de dois séculos a.C. Em um espaço determinado e com gols nas duas extremidades, além de uma espécie de rede presa a dois postes de bambu, os chineses chutavam um objeto esférico feito de couro recheado com pele ou penas. Esse jogo era chamado de cuju, que significa chutar bola. A prática era comumente usada para treinamento militar (KITCHING, 2015, GOLDBLATT, 2007). Alguns fatos também apontam para o Japão, mais precisamente em Kyoto, durante o período Asuka (500-700 a.C.). Os japoneses pratica- vam um jogo conhecido como Kemari, que tinha algo ritualístico e ceri- monial em seu conceito, e a ideia básica era chutar a bola para cima, fazendo com que os demais participantes precisassem golpeá-la sem- pre para o alto. Os povos romanos também praticavam jogos envolvendo diferentes tipos de bolas, por exemplo, um jogo chamado harpastum. Acredita-se que este possa ter sido adotado e adaptado de um jogo grego chamado episkyros, após o domínio Romano. Esses jogos, em particular, também são muito similares ao rúgbi, mas, ainda assim, eles representam formas ancestrais do futebol e, como o cuju na China, o harpastum parece estar bastante associado a treinamento e preparação militar. Stray Toki/Shutterstock Figura 1 Representação do Kemari em evento folclórico no Japão 10 Metodologia do ensino de futebol e futsal https://academic.oup.com/hwj/search-results?f_Authors=Gavin+Kitching A história do futebol e do futsal 11 A prática de golpear uma bola parece atrair o ser humano há muito tempo. Jogos contendo bolas estão presentes em quase todas as culturas antigas ao redor do mundo. Exemplos ocorrem nas velhas culturas mesoamericanas há mais de três mil anos, de acordo com achados transcritos em rochas. É interessante o fato de que esses povos tinham uma exclusividade na característica do jogo: a bola quicava. Isso ocorria porque somente eles tinham a borracha, típica das florestas indígenas tropicais. O jogo tinha algo de ritual religioso e místico, fragmentos arqueo- lógicos mostram que locais próprios para abrigar espectadores eram construídos, com uma espécie de arquibancada de pedras. A bola de borracha variava de tamanho, era movida entre uma linha central e golpeada por dois oponentes ou dois times que se utilizavam dos ombros, das canelas, dos quadris e das nádegas. Há vestígios de variações desses jogos mesoamericanos e imprecisões quanto aos rituais de sacrifício associados a eles, mas é possível, ainda, observar jogos muito similares nas culturas indígenas atuais (KITCHING, 2015; GOLDBLATT, 2007). 1.1.1 Futebol na Idade Média Por volta do século IX, pessoas chutavam bolas feitas de bexiga de porco nas ruas como forma de diversão. Alguns séculos depois, joga- dores possuíam algo mais similar a uma bola e o esporte era pratica- do em áreas abertas de grande escala, como grandes áreas verdes ou em estradas. Entretanto, não havia nenhuma regra, eram permitidos, então, empurrões, socos e pontapés, e parte do jogo era extrema- mente rude e violento. Com um número incontável de jogadores que tentavam chegar a determinadas áreas carregando a bola, frequente- mente as partidas eram disputadas entre duas cidades ou vilas, com o objetivo de chegar aos limites da cidade – alternativamente, o jogo poderia ser dividido entre idade ou casados e solteiros. Um jogo pa- recido chamado La Soule era, também, praticado aproximadamente nesse período e parece ter se disseminado na França. Eventualmente, o jogo ficava extremamente violento, o que o tornava alvo de críticas. O Rei Edward III baniu o jogo em 1365 devido à sua extre- ma violência e o Rei James I da Escócia o proibiu em 1424. https://academic.oup.com/hwj/search-results?f_Authors=Gavin+Kitching Um outro exemplo de jogo similar, praticado fora das áreas anglo-saxônicas e célticas, também con- siderado como precursor do futebol, é o Gioco del Calcio. Era praticado no período medieval e início da era moderna em Florença, na Itália, até quase desa- parecer – possivelmente banido na metade do século XVIII. Hoje, sobrevive somente como espetáculo para turistas. As regras desse jogo foram publicadas por Giovanni Bardi, em 1580. 1.2 Futebol no mundo Vídeo O século XIX pode ser considerado um marco importante para o futebol, já que a prática do jogo de bola já era bastante popular por ser um modo comum de diversão entre o povo. Entretanto, era, de certa maneira, discriminado pela aristocracia que, até então, preferia o crí- quete e o jóquei. Apesar da disseminação da prática, uma característica ainda permanecia: a falta de padronização do modo de jogar. Por um longo período, não era clara a distinção entre futebol e rúgbi, havendo muitas variações relacionadas ao tamanho da bola, ao número de joga- dores por equipe, à dimensão do campo e ao tempo de duração. O jogo era frequentemente praticado em escolas, as mais tradicio- nais eram a Rugby e a Eton. Na Escola Rugby, por exemplo, as regras permitiam segurar e correr com a bola nas mãos, dando origem ao rú- gbi que conhecemos hoje. Na Eton, em contrapartida, a bola era gol- peada com os pés; assim, o jogo praticado nessa escola era chamado de the dribbling game, ou seja, o jogo de driblar. Enquanto o da Rugby era chamado de the running game, traduzido como o jogo de correr. Em 1848, Charles Thring, estudante da Universidade de Cambridge, surgiu com a primeira tentativa de um código universal, as regras de Cambridge. Essa ação é considerada o momento crucial no desenvolvimento do futebol, com estudantes das várias escolas se unindo para criar um código que agradaria a todos. Entretanto, não foi fácil, pois, anos depois, Figura 3 Modelo de chuteira e bola utilizados no séc. XIX BrBtBB/Shutterstock 12 Metodologia do ensino de futebol e futsal Figura 2 Selo em que está impresso o jogo praticado em 1827 Se rg ey G or ya ch ev /S hu tte rs to ck A história do futebol e do futsal 13 cada uma das principais escolas – Eton, Harrow, Rugby, Westminster, Winchester, Marlborough e Charterhouse – continuava utilizando suas próprias versões do futebol. Até 1863, por exemplo, a prática de carregar a bola com as mãos ainda ocorria em várias escolas. Figura 4 Pintura representando a prática que deu origem ao futebol Br es ki t/ W ik im ed ia C om m on s Podemos perceber queas dimensões do campo não eram claras. Constantemente, os expectadores do lado de fora recolocavam a bola em jogo com os pés, não sendo possível estabelecer quem era jogador ou expectador. O desenvolvimento inicial de regras ajudou a tornar o futebol um jogo menos violento e brutal. O estabelecimento de regras continuou ao longo dos anos, sem, até aquele momento, a definição do tamanho do campo. O número de jogadores era variado de acordo com o tamanho do campo, não havia uniformes para distinguir os jogadores de uma mesma equipe e era comum os jogadores usarem chapéus durante a prática. Em 1867, os representantes dos onze clubes londrinos e universidades marcaram uma reunião na Taverna Freemason para discutir os princípios e os valores morais do jogo, nascendo, assim, a Football Association, ou Associação do Futebol, primeira associação do que conhecemos hoje como futebol (AGOSTINO, 2011). 1.2.1 Profissionalismo Em 1872, foi disputada a primeira Football Association Cup, conheci- da como FA CUP, uma tradicional competição atualmente. Pelas regras da Associação de Futebol, os jogadores teriam que continuar sendo Era possível observar uma interessante diferença de estilos naquela época: enquanto as equipes da Inglaterra preferiam correr para frente, verticalizando o jogo, os escoceses tinham um estilo de jogar priorizando a troca de passes entre os jogadores. Isso acontecia, talvez, pela forte influência do rúgbi na forma inglesa de jogar. Curiosidade 14 Metodologia do ensino de futebol e futsal amadores e seria proibida qualquer compensação financeira para jogar por qualquer time. Mas os jogadores se mostraram insatisfeitos com o fato de terem que trabalhar em fábricas e ainda treinarem, enquanto os clubes cobravam ingressos para os expectadores assistirem às partidas. A popularidade do esporte continuou aumentando e o número de expectadores também. A partir desse momento, os clubes passaram a pagar por seus jogadores. Para atrair mais público e conquistas, donos das equipes – muitas delas atreladas a fábricas – contratavam jogadores de outras regiões, iniciando, assim, a caracterização da profissionalização do futebol. A Federação Internacional de Futebol (FIFA) foi fundada em 1904 e sua ata de fundação contou com signatários de representantes da França, da Bélgica, da Dinamarca, dos Países Baixos, da Espanha, da Suécia e da Suíça. A Inglaterra e os outros países britânicos não se juntaram ao grupo no início, pois diziam que, como eles inventaram o jogo, não faria sentido serem subordinados a nenhuma associação. Os britânicos passaram a participar da associação no ano seguinte. No início do século XX, vários países já tinham suas ligas domésti- cas formadas e, em 1930, a FIFA organizou seu primeiro campeonato mundial de seleções, a primeira Copa do Mundo. Essa competição foi realizada no Uruguai, escolhido para comemorar o centenário da sua constituição. Após esse ano, o torneio mais importante de futebol, que até então ocorriam nos Jogos Olímpicos, passou a ser na Copa. As ligas domésticas se estabeleceram e aumentaram o número de participan- tes, obrigando a criação de segundas e terceiras divisões. Em 1991, a primeira Copa do Mundo para mulheres foi organizada com sede na China e, desde então, a cada quatro anos o evento acon- tece, assim como na categoria masculina. 1.2.2 Globalização As confederações surgiram para diferentes continentes, a criação delas fomentou a profissionalização e fortaleceu o esporte. A Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), entidade que rege o futebol sul-americano e é responsável por organizar as competições eliminatórias da Copa do Mundo da América do Sul, foi criada em 1916. Em junho de 1954, surgiu a União das Associações Europeias de Futebol (UEFA). No mesmo ano, foi criada a Confederação Asiática de Futebol (AFC). Já em Figura 5 Linha do tempo com a inserção de algumas das regras do futebol moderno Fonte: Elaborada com base em FIFA, 2017; FIFA, 2020a; FIFA, 2020b 1871 Inserção do pênalti no jogo. 1909 Diferenciação do goleiro, que passa a usar cores diferentes dos demais jogadores. 1970 Introdução dos cartões amarelo e vermelho na Copa. 1992 Proibição do uso das mãos pelo goleiro após um recuo. 1992 Punição para carrinhos por trás com cartão vermelho direto. 2018 Utilização do VAR (Video Assistant Referee) na Copa do Mundo da Rússia para lances duvidosos. A história do futebol e do futsal 15 1957 e 1961 foram criadas, respectivamente, a Confederação Africana de Futebol (CAF) e a Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe (Concacaf). Um pouco mais tarde, em 1966, surgiu a Confederação de Futebol da Oceania (OFC). No fim do século XIX, havia somente alguns clubes de futebol. Inglaterra e Escócia tinham os primeiros jogos de clubes se enfrentando por volta dos anos 1870, atualmente são mais de 211 países associados à FIFA. Além disso, devido à globalização, houve um grande aumento de países que participam das eliminatórias classificatórias para a Copa do Mundo; em 1934 eram 32 países e hoje são mais de 200 participantes. Quadro 1 Copas do Mundo realizadas pela FIFA ANO CAMPEÃO PLACAR VICE SEDE 1930 Uruguai 4 x 2 Argentina Uruguai 1934 Itália 2 x 1 Tchecoslováquia Itália 1938 Itália 4 x 2 Hungria França 1950 Uruguai 2 x 1 Brasil Brasil 1954 Alemanha Ocid. 3 x 2 Hungria Suíça 1958 Brasil 5 x 2 Suécia Suécia 1962 Brasil 3 x 1 Checoslováquia Chile 1966 Inglaterra 4 x 2 Alemanha Ocid. Inglaterra 1970 Brasil 4 x 1 Itália México 1974 Alemanha Ocid. 2 x 1 Países Baixos Alemanha Ocid. 1978 Argentina 3 x 1 Países Baixos Argentina 1982 Itália 3 x 1 Alemanha Ocid. Espanha 1986 Argentina 3 x 2 Alemanha Ocid. México 1990 Alemanha Ocid. 1 x 0 Argentina Itália 1994 Brasil 0 x 0 (3x2 nos pênaltis) Itália E.U.A. 1998 França 3 x 0 Brasil França 2002 Brasil 2 x 0 Alemanha Japão/Coreia do Sul 2006 Itália 1 x 1 (5x3 nos pênaltis) França Alemanha 2010 Espanha 1 x 0 Países Baixos África do Sul 2014 Alemanha 1 x 0 Argentina Brasil 2018 França 4 x 2 Croácia Rússia Fonte: Elaborado pelo autor com base em FIFA, 2020c. A partir da Copa de 1954, na Suíça, um marco selou o destino do fu- tebol: a invenção da televisão. A transmissão dos jogos para oito países 16 Metodologia do ensino de futebol e futsal europeus colocava um fim no monopólio exercido pelo rádio. Em 1958, na Copa da Suécia, primeira vencida pelo Brasil, quase todos os países da Europa puderam acompanhar a transmissão ao vivo, enquanto outros continentes assistiam os jogos com aproximadamente um dia de atraso. Já em 1966, na Inglaterra, as redes de televisão começaram a pagar direitos de transmissão, já operando satélites artificiais que possibilitavam que os jogos ao vivo fossem vistos por dois bilhões de pessoas. Só a final entre Inglaterra e Alemanha mobilizou trinta e seis países e cerca de 400 milhões de telespectadores (AGOSTINO, 2011). Daí em diante, fica ainda mais clara a projeção alcançada. Com maior interesse televisivo em transmitir jogos e mais marcas atraí- das pelo crescente número de consumidores, o esporte alcança um patamar no qual os interesses esportivos se confundem com os co- merciais. Isso fica evidente quando observamos o número de placas de patrocinadores espalhadas pelo campo, a quantidade de anúncios nas transmissões e nas camisas das equipes envolvidas, além das partidas sendo jogadas em horários que atendam à grade televisiva. 1.3 Futebol no Brasil Vídeo Você sabe quem foi Charles Miller? Ao mencionar a origem do fute- bol no Brasil, o grande expoente é, sem dúvida alguma, Charles Miller, figura conhecida quando se trata do assunto. Segundo Agostino (2011), diferentemente do que você possa imaginar, o futebol já era jogado aqui no Brasil antes da icônica chegada de Charles Miller ao porto de Santos. Assim como em outras cidades pelo mundo (Buenos Aires, Rio de Janeiro, Gênova, Hamburgo), a disseminação do futebolse deu pelos próprios ingleses comerciantes, engenheiros de estradas de ferro, instaladores de linhas de telégrafo, estudantes ou educadores, e marinheiros ou soldados. Todos eram jogadores em potencial, fazendo demonstrações do jogo em cidades portuárias. No entanto, um marco para a disseminação do esporte foi o entusiasmo de Charles Miller, quem apresentou a modalidade de maneira organizada aos clubes esportivos da época. Por esse motivo é considerado por muitos o “pai” do futebol no Brasil. Nascido no Brasil e filho de um escocês e uma brasileira de origem inglesa, ele passou boa parte da sua infância e adolescência estudando na Inglaterra, e foi lá Recomendamos a minissérie The English Game, produzida pela Netflix. A história se passa na Inglaterra no final do séc. XIX e mostra a transformação do futebol junto aos dilemas da sociedade da época. Direção: Tim Fywell. Inglaterra: Netflix, 2020. Série A história do futebol e do futsal 17 que aprendeu a jogar o recém-criado futebol moderno. Ao voltar para o Brasil, em 1894, para trabalhar em uma companhia de ferro, Miller trouxe consigo duas bolas, uma bomba para enchê-las, um apito e um livro de regras universais (OLIVEIRA, 2012). Apesar de separados por muitas barreiras, trabalho e lazer se com- pletavam, não sendo poucos aqueles que viam o último como uma compensação para os sacrifícios que o primeiro impunha. Outra rea- lidade, também bastante significativa para a difusão do jogo, foi a sua promoção por meio das próprias companhias capitalistas, em muitos casos considerando o esporte um mecanismo de disciplina e desenvol- vimento físico e moral dos trabalhadores (AGOSTINO, 2011). O futebol parece estar totalmente integrado ao modo de viver do Brasileiro, a realidade é que a química do Brasileiro com o futebol, as interferências socioeconômicas e os atalhos encontrados para a prática do esporte criaram um enredo próprio. (CARVALHO, 2012, p. 311) O brasileiro se adaptou ao modo de jogar, o “jeitinho brasileiro” ou futebol arte, como já ouvimos falar, nasceu de uma longa trajetória, influenciada pela corrente migratória e pelas colônias britânicas e fran- cesas. Essa mistura de características proporcionou ao brasileiro seu estilo próprio, além da criatividade e da capacidade de improvisação. O Brasil é hoje o país com o maior número de títulos de Copa do Mundo e reconhecidamente uma das potências do esporte. A Confederação Brasileira de Desportos (CBD) era a entidade res- ponsável pelo futebol no Brasil. De 1933 até 1954, a competição principal era o Torneio Rio-São Paulo, que só era disputado por clubes desses estados. A partir de 1967, a competição pas- sou a contar com a participação de clubes de outros estados, já com o nome de Torneio Roberto Gomes Pedrosa, ou “Robertão”. O primeiro Campeonato Brasileiro de Futebol, popularmente conhecido como Brasileirão, ocorreu em 1971. E, em 24 de setembro de 1979, foi criada a Confe- deração Brasileira de Futebol (CBF) com a prerrogativa de garan- tir a gestão independente do futebol brasileiro e das seleções brasileiras de futebol. O futebol feminino, por sua vez, durante muito tempo foi marginalizado e alvo de preconceito por conta das políticas nacionais. Em 1941, Figura 6 Pelé, considerado o Rei do Futebol Bonkers/Wikimedia Commons Roberto Gomes Pedrosa, nome dado ao antigo campeonato bra- sileiro de clubes, foi um jogador de futebol que iniciou sua carrei- ra no Botafogo, disputou a Copa do Mundo de 1934 pela Seleção Brasileira e, posteriormente, tornou-se um importante dirigente, ocupando o cargo de presidente da Federação Paulista de Futebol. Curiosidade 18 Metodologia do ensino de futebol e futsal foi assinado um decreto que proibia a prática esportiva alegando-se não ser condizente com a natureza feminina. Assim, as mulheres foram proibidas de participarem de modalidades como futebol, futsal, rúgbi, halterofilismo, lutas e etc.; esse decreto foi revogado somente em 1979 (BASTOS; NAVARRO, 2009). A inserção da mulher no futebol e no futsal encontra forte relação com os espaços e papéis conquistados na sociedade, por meio da des- construção, ainda que pequena, da imagem do futebol como sendo um esporte somente para homens. Hoje, após muito custo e luta, o futebol feminino vem ganhando uma projeção importante, tendo sido criados torneios nacionais e ligas. Estimulados pelas federações, os tradicionais clubes passaram a contar com equipes de mulheres e dispor de cam- peonatos organizados pela CBF, transmitidos por emissoras televisivas. A ideia é de massificar o esporte e desconstruir preconceitos, atraindo mais praticantes, potencializando, assim, o desenvolvimento das atletas. Quadro 2 Campeonatos organizados pela CBF Masculino Feminino Campeonato Brasileiro (Séries A, B, C, D) Copa do Brasil Copa do Nordeste Copa Verde Super Copa do Brasil Campeonato Brasileiro – Série A1 Campeonato Brasileiro – Série A2 Copa do Brasil Fonte: Elaborado pelo autor com base em Futebol..., 2020. A partir de 2010, a CBF passou a reconhecer os campeões dos tor- neios disputados entre 1959 e 1970 – o conhecido “Robertão” – com títulos de campeão brasileiro. O futebol brasileiro é marcado pelo forte equilíbrio na disputa pelo título de campeão, enquanto em outras partes do mundo os vence- dores se limitam a três ou quatro equipes que se revezam historica- mente. No Brasil, dezessete clubes já ganharam o título da principal competição nacional, o Campeonato Brasileiro. O livro Vencer ou morrer: futebol, geopolítica e identidade nacional mergulha profundamente nos aspectos sociopolíticos que envolveram o futebol ao longo de sua história, as relações internas entre o Estado e a bola e a paixão do torcedor como instrumento de interesses pessoais. AGOSTINO, G. Rio de Janeiro: FAPERJ: 2. ed.: Mauad, 2011. Livro A história do futebol e do futsal 19 1.4 Aspectos socioculturais Vídeo Assim como na Inglaterra, o futebol que antes era praticado de ma- neira bastante informal passou a ganhar espaço nos clubes elitistas. Com o objetivo de impedir o acesso das classes sociais menos favore- cidas, os primeiros torneios disputados não contavam com a partici- pação da classe operária, os clubes estabeleciam rígidas demarcações sociais e os colégios onde se praticavam o esporte só aceitavam o perfil de estudantes da alta sociedade paulistana (CARVALHO, 2012). Os principais times eram formados por profissionais liberais, ser- vidores públicos e acadêmicos, e eram maioria nos campeonatos nos bairros elitistas. Os negros começaram a se apresentar na modalidade aos poucos até ganharem espaço. Isso começou a ocorrer somente em 1923, por meio do clube Vasco da Gama, que tem origem popular e oportunizou a prática do esporte. 1.4.1 A Violência no futebol O futebol possui uma capacidade incomum de unir povos, conectar culturas, romper idiomas e aproximar diferenças religiosas e étnicas. Entretanto, é importante ressaltar que esse mesmo futebol não está isento das mazelas da sociedade e tem sido marcado por demons- trações de violência e vários tipos de intolerância ao longo do tempo. Relatos envolvendo a violência no futebol são tão antigos quanto as próprias regras (AGOSTINO, 2011). Como um esporte com características tão democráticas e que transmite tanta alegria e paixão pode ser ao mesmo tempo tão violento? O futebol reflete uma microssociedade compreendida em uma sociedade maior, ou seja, ele revela uma face escondida na própria pessoa inserida dentro dessa macrosociedade. Essa pessoa invariavelmente encontra refúgio em grupos de torcedores com os quais se identificam, para expor comportamentos de racismo, homofobia e misoginia. Assim também acontece em redes sociais, manifestações políticas e etc. 1.4.2 O marketing e o capitalismo O futebol tornou-se um esporte de bilhões, clubes grandes arre- cadam com patrocinadores, venda dos direitos federativos do atleta, exposição de suas marcas, direitosde imagem e venda de camisas e 20 Metodologia do ensino de futebol e futsal de ingressos. Dessa forma, contratam jogadores cada vez mais caros e pagam salários exorbitantes, recebendo, em troca, mais possibilidades de conquistas esportivas e maior retorno financeiro. Com a transformação do futebol, agentes e empresários encontra- ram a mina de ouro descobrindo potenciais talentos, cheios de sonhos, e depositando neles toda a expectativa de uma valorização e futura venda. Não é incomum, nesse meio, histórias nas categorias de base de jovens jogadores utilizados por investidores e especuladores que “cui- dam dos atletas” e depois os vendem para faturar fabulosas quantias sem se importar com a formação humana dos jogadores. Esse panorama reflete a realidade de poucos clubes e jogadores. A maior parcela da classe, na verdade, enfrenta duras realidades, com sa- lários baixos e muitas vezes atrasados, pouca ou nenhuma infraestru- tura, além de clubes que só disputam campeonatos estaduais. Ou seja, esses jogadores só têm seus empregos por quatro meses, demonstran- do a imensa diferença na pirâmide socioeconômica, assim como ocorre em outros setores em nossa sociedade. As brilhantes conquistas obtidas pelas seleções brasileiras ao longo da história exacerbaram o sentimento de amor pelo esporte e, junto a isso, a identificação com o estereótipo do jovem pobre que se torna um astro bem-sucedido – principalmente em um país com séria desi- gualdade social. Os jogadores de futebol passam a ser ídolos e heróis de crianças e jovens. Estes veem no futebol a oportunidade de mudar de vida. Boa parte destes jovens, entretanto, não chega a se tornar pro- fissional e muitos dos que se tornam não chegam nem perto de con- quistar as fortunas dos craques dos grandes clubes. Sendo essa uma realidade que abrange menos de 5% dos atletas profissionais. 1.5 Origem e evolução do futsal Vídeo Assim como em vários outros esportes, divergências existem com relação à história do futsal, porém podemos afirmar que é um jogo nascido na América do Sul. Na década de 1930, o futebol já era extremamente popular e amplamente massificado, sendo o esporte preferido em clubes e escolas. No Uruguai, o professor de Educação Física Juan Carlos Ceriani adaptou o tradicional jogo de futebol para a sua realidade. Para jogar futebol, eram necessários 22 jogadores e um campo de dimensões O filme Boleiros, Era uma vez o futebol traz em seu enredo histórias caricatas do futebol do século passado contadas por um grupo de ex-jogadores nostálgicos. Direção: Ugo Giorgetti. Brasil: Paris Filmes, 1998. Filme A história do futebol e do futsal 21 enormes, além dos fatores ambientais. Assim, para facilitar o jogo, ele foi adaptado a um ginásio desportivo, especificamente nas demarca- ções da quadra de basquete do clube, utilizando traves do handebol. As divergências surgem porque em um período bem próximo, na década de 1940, o Futebol de Salão passou a ser jogado no Brasil. O professor Habib Maphuz, de uma escola em São Paulo, também teve a ideia de adaptar sua aula de futebol para um espaço menor e com menos participantes, possibilitando a prática do esporte aos moldes possíveis. No Brasil, esse esporte se massificou rapidamente, e as esco- las tiveram um grande papel nesse sentido. O país também foi o maior divulgador da modalidade, incentivando sua internacionalização. Em 1965, o esporte já havia se difundido por toda a América do Sul, resultando na criação da Confederação Sul-Americana de Futebol de Salão, composta por Uruguai, Paraguai, Peru, Argentina e Brasil. Após sua vinculação à FIFA, em 1989, o futsal começou a ter grandes torneios organizados, permitindo que a modalidade alcançasse uma grande vi- sibilidade mundial. Mas qual é o nome correto, futsal ou futebol de salão? Bom, é im- portante que saibamos que não estamos falando do mesmo esporte. Apesar de ser bastante comum usarmos os dois termos, o futsal teve sua origem no futebol de salão; inclusive seu nome é uma abreviação do esporte original. Devido à sua enorme projeção e na tentativa de normatizar as regras do esporte que se praticava aqui na América do Sul com as do indoor soccer praticado na Europa, para torná-lo um esporte olímpico, as regras do futebol de salão se modificaram. Com isso, popularizou-se sem perder as referências do esporte original, surgindo, assim, o futsal. Segundo Bastos e Navarro (2009), o futsal é o desporto que apre- senta o maior número de equipes e de atletas, participantes dos jogos escolares em todas as suas categorias, inclusive com um grande cresci- mento na área feminina. O desenvolvimento do futsal entre as mulheres cresce em todo planeta. A mídia especializada considera as jogadoras brasileiras as melhores do mundo, além de serem hexacampeãs do Tor- neio Mundial de Futsal Feminino e da Copa América de Futsal Feminino. 1.5.1 Variações do futebol/futsal O futebol e o futsal, apesar de não serem considerados esportes genuinamente brasileiros, ajudaram a fomentar modalidades coirmãs 1969 Foi fundada a Confederação Sul-Americana de Futebol de Salão (CSAFS). 1971 Foi fundada a Federação Internacional de Futebol de Salão (Fifusa). 1985 Realizou-se, na Espanha, o 2º Campeonato Mundial de Futebol de Salão organizado pela Fifusa. Novamente o Brasil venceu. 1988 Diante das dificuldades da Fifusa e projetando um futuro melhor para o futebol de salão, ficou decidido que a FIFA passasse a comandar internacionalmente o esporte. 1989 Foi acordada a fusão FIFA/Fifusa e constituída, na FIFA, com previsão estatutária, a Comissão de Futsal. 1990 O Brasil desligou-se da Fifusa e passou a adotar as novas regras de jogo emanadas da FIFA. 1992 As Copas do Mundo de Futsal da FIFA passaram a ser realizadas de quatro em quatro anos, seguindo o mesmo modelo adotado para o futebol. 1982 No ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, a Fifusa organizou o 1º Campeonato Mundial de Futebol de Salão, com a participação de Brasil, Argentina, Costa Rica, Checoslováquia, Uruguai, Colômbia, Paraguai, Itália, México, Holanda e Japão. O Brasil venceu a final contra o Paraguai por 1 a 0. Figura 7 Linha do tempo de curiosi- dades do esporte Fonte: Elaborada pelo autor com base em O esporte..., 2020. 22 Metodologia do ensino de futebol e futsal tipicamente brasileiras, que contaram com a criatividade e a improvi- sação. Alguns desses esportes são muito praticados e já conquistaram projeção internacional. • Beach Soccer, ou futebol de areia: futebol, inicialmente praticado nas areias de Copacabana, que ganhou o mundo e hoje é um esporte olímpico. • Futevôlei: uma mistura interessante de futebol e vôlei amplamen- te praticado nas cidades litorâneas brasileiras e que ultimamente vem ganhando espaço nas cidades, com locais construídos para sua prática. • Futebol society ou futebol de 5: praticado em grama sintética e bastante difundido nas cidades como forma de lazer, o futebol de 5 também é um esporte paraolímpico, jogado por cegos com uma bola com guizo. • Futmesa: modalidade que começou como recreação dos joga- dores de futebol – durante momento de lazer no clube ou no vestiário antes de iniciar os treinos –, mas hoje já existem mesas próprias para sua prática. Essas modalidades, além de outros jogos associados ao futebol, são comuns na nossa cultura e ajudam inclusive a abrir mercados alternativos. O freestyle, por exemplo, é o nome dado a arte de controlar a bola de ma- neira livre, uma mistura de futebol com malabarismo que vem ganhando espaço em eventos esportivos, como demonstração e competição. CONSIDERAÇÕES FINAIS A história moderna do nosso país também pode ser contada por meio da evolução do futebol e do futsal. Ao aprofundar nossa visão histórica da modalidade, estamos também abrindo caminho para discutir os próximos rumos e o papel desses esportes como transformadores em uma socie- dade moderna, tecnológica e mais individualista.O futebol está longe da neutralidade. Ele serviu, em diferentes contex- tos, contra os poderes opressivos, e para ações revolucionárias. Desde sua origem, o esporte vem servindo para ideais nobres, como a paralisação de guerras civis, a luta a favor da liberdade e o combate à fome e ao racismo, mas também já serviu de ferramenta para ditadores e políticos oportunistas. Portanto, contextualizar o futebol e o futsal dentro da sociedade possibilita aos educadores a criação de estratégias de utilização dessas modalidades de forte apelo cultural e aproximá-las de outras disciplinas e O livro O que é Futsal, de Silvia Vieira e Armando Freitas, traz um panora- ma sobre a história da modalidade. VIEIRA, S.; FREITAS, A. Santo André: Casa da Palavra, 2007. Livro A história do futebol e do futsal 23 áreas de conhecimento. Contar a história do mundo por meio do futebol, por exemplo, pode ser um meio de aproximar-se do educando. Ensinar geografia, sociologia ou matemática baseando-se na evolução do futebol pode parecer um impulso interessante. ATIVIDADES 1. Estudar a história do futebol nos permite valorizar suas origens e manter seus valores. O futebol nasceu como um esporte lúdico e, como se vê, tornou-se uma grande indústria. Discuta essa ideia. 2. Apesar de ser um ambiente sempre recheado por machismo, hoje podemos ver mulheres na arbitragem e em competições nacionais organizadas pela CBF. Você acha que já podemos considerar que a mulher já conquistou seu espaço no país do futebol? 3. O futebol brasileiro é reconhecido por ser celeiro de craques, pois a cada geração temos um novo destaque chamando atenção dos grandes clubes europeus. Descreva esse fenômeno pelo viés sociocultural e histórico. REFERÊNCIAS AGOSTINO, G. Vencer ou morrer: futebol, geopolítica e identidade nacional. 2. ed. Rio de Janeiro: Mauad X, 2011. BASTOS, P. V.; NAVARRO, A. C. O futsal feminino escolar. Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v.1, n.2, p.144-162, 2009. CARVALHO J. E. Geopolitica: 150 anos de futebol. São Paulo: Ed. SESI-SP, 2012. FIFA. London’s football history: Laws of the Game. FIFA, 2017. Disponível em: https:// www.fifa.com/the-best-fifa-football-awards/news/london-s-football-history-laws-of-the- game-2902981. Acesso em: 21 maio 2020. FIFA. From 1863 to the Present Day. FIFA, 2020a. Disponível em: https://origin.fifa.com/ about-fifa/who-we-are/the-laws/index.html. Acesso em: 21 maio 2020. FIFA. History of the Laws of the Game - 1990-2000. FIFA, 2020b. Disponível em: https:// www.fifa.com/news/history-the-laws-the-game-1990-2000-435. Acesso em: 21 maio 2020. FIFA. Archive. FIFA, 2020c. Disponível em: https://www.fifa.com/fifa-tournaments/archive/. Acesso em: 21 maio 2020. FUTEBOL brasileiro. CBF, 2020. Disponível em: www.cbf.com.br/futebol-brasileiro. Acesso em: 21 maio 2020. GOLDBLATT, D. The Ball is round: A Global History of Football. Ed Penguin UK, 2007. KITCHING, G. Feature: modern sport: society and competition: the origins of football: history, ideology and the making of ‘the people’s game’. History Workshop Journal, v. 79, n. I, p. 127–153, 2015. O ESPORTE da bola pesada que virou uma paixão. CBFS, 2020. Disponível em: https://www. cbfs.com.br/futsal-origem. Acesso em: 21 maio 2020. OLIVEIRA, A. F. Origem do futebol na Inglaterra no Brasil. Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v.4, n.13, p.170-174, set./out./nov./dez. 2012. SARMENTO, C. E. A regra do jogo: uma história institucional da CBF. Rio de Janeiro: CPDOC, 2006. 24 Metodologia do ensino de futebol e futsal 2 O ensino de futebol e de futsal A popularidade do futebol e do futsal é um fato facilmente observado em nosso país, onde escolinhas de futebol são muito comuns. O jogo de rua, antes aprendido de maneira natural e livre, é agora ensinado em espaços formais, seja em clubes representados pelas chamadas categorias de base, em instituições privadas (bastante comuns nos centros urbanos, geralmente com campos de grama sintética) ou em organizações públicas, escolas e secretarias de esportes. Dessa forma, o futebol de rua passa a ser mediado, surgindo a figura do professor-treinador, responsável por conduzir o ensino. Nesse sentido, este capítulo pretende trazer reflexões acerca da importância desse professor-treinador na iniciação ao futebol e futsal e no seu ensino, assim como a relação com o ambiente que cerca esse indivíduo. Ciente da sua relevância, esse agente deve assumir protagonismo no processo de ensino-aprendizagem. O contrário disso significaria destinar ao acaso a plenitude da cons- trução das habilidades esportivas. Além disso, trataremos da importância da criação de ambientes favoráveis para que esse processo ocorra, a qual não se limita ao espaço físico, mas atinge todo entorno. Isso implica repensar a aula, pois cada aspecto se torna uma parte importante do todo nessa trajetória. O ensino de qualquer habilidade exige capacitação do profissional, mas esta é especialmente demandada dentro do ambiente esportivo, carregado de paradigmas e com forte ancoragem no empirismo, no qual a cobrança por resultados e o olhar competitivo precoce podem ser muitas vezes um grande empecilho para a formação. Por fim, discutiremos diferentes métodos de ensino, abordando os processos pedagógicos e a visão humanística, para que você domine o conteúdo e possa entender mais sobre como ensinar futebol e futsal. O ensino de futebol e de futsal 25 2.1 Reflexões acerca da formação do professor Vídeo Mundo afora, o Brasil sempre despertou atenção por sua capacidade de revelar talentos e praticar um futebol atrevido e criativo. Mas que fenômeno é esse? Será um dom? Há algo diferente no DNA do brasileiro que já nasce craque? Ao nos depararmos com uma criança talentosa com a bola nos pés, não é difícil escutarmos frases como: “esse já nasceu com o dom!” ou “esse é um goleador nato!”. Contudo, será mesmo que o inatismo tem tanta presença assim no talento? Claro que questões genéticas podem interferir em vários fatores, por exemplo, quanto às capacidades físicas, o tipo de fibra muscular pode influenciar diretamente a capacidade de produção de força do indivíduo. Porém, o fator realmente determinante para a construção das habilidades é a interação com o ambiente. A criança aprende vi- venciando e experimentando por meio da diversificação e da curiosida- de e, de fato, o talento irá emergir das oportunidades oferecidas, pelo interacionismo. De acordo com Reverdito, Scaglia e Paes (2009), é possível estabele- cer uma diferença entre as visões inatista e interacionista: Visão inatista Traz a ideia de que o indivíduo já nasce com determinada habilidade; o talento está na sua herança gené- tica e basta cuidar e esperar para que ele desabroche. O talento é herdado. Visão interacionista O talento é fruto das relações com- plexas entre o indivíduo e o am- biente que o cerca. A pedagogia é baseada no planejamento de ações e na construção de tarefas que favo- reçam o desenvolvimento. O talento é construído. Dessa forma, romper com antigas ideias e quebrar paradigmas do tipo “talento é genético” ou “está no sangue” é o primeiro passo para assumirmos as rédeas do ensino de qualidade, formando professores com visão ampla, que, em primeiro lugar, entendam o contexto em que estão inseridos (esporte educacional, especialização ou alto rendimen- to), ou seja, para quem se está ensinando. 26 Metodologia do ensino de futebol e futsal O ensino de futebol evoluiu de uma prática empírica, pautada nas crenças e nos padrões que se repetem, ou seja, o professor reproduz o que ele aprendeu com seu professor que, por sua vez, também repassou o que sabia da maneira que aprendeu quando jogava. Além disso, o fute- bol pode não conduzir ao alto rendimento, mas, ainda assim, não deixa de ter importância na vida da pessoa. Ele pode trazer valores fundamentais para a construção de uma sociedade melhor, como respeito, cordialidade, companheirismo,resiliência, além de saúde e bem-estar. Essa visão torna a formação e a capacitação do professor-técnico imprescindíveis, conside- rando que, em mãos erradas, o esporte pode ter esses valores invertidos, tornando-se indisciplina, raiva, impaciência e intolerância. Segundo Freire (1989), por si só, o esporte não possui somente valores positivos. Ele pode ser tudo, a grande questão é o que fazemos dele. Assim, inevitavelmente, surgem relevantes questionamentos: es- tamos ensinando bem o futebol? Respeitamos as fases de desenvol- vimento e permitimos a natural capacidade criativa do jogador, ou estamos extrapolando as exigências e mecanizando o ensino? Estamos oportunizando a aprendizagem democraticamente ou privilegiamos os mais hábeis tecnicamente ou mais aptos fisicamente? Estamos ensi- nando somente o esporte em si ou proporcionando uma educação in- tegral, alicerçada nos valores éticos e morais para a construção de uma sociedade justa e com indivíduos mais bem preparados? Com base nessas perguntas, temos os seguintes pilares do ensino do futebol (FREIRE, 1998): O futebol é um jogo de decisões a serem tomadas a todo momento, então, o sucesso depende da capacidade de tomar decisões corretas e em curto espaço de tempo. Portanto, saber estimular a cria- tividade e a autonomia do aluno é imprescindível. Ensinar bem futebol Ao longo dos anos, o futebol tem permanecido um esporte machista e excludente: meninas são desencorajadas a jogar desde cedo e os mais gor- dinhos ou menos habilidosos são alvo de chacota. Nesse sentido, quebrar as barreiras e inserir todos de maneira democrática, independentemente de limitações físicas ou cognitivas, é um dos pilares do ensino de futebol. Para ensinar bem e a todos, a escola ideal não deve tratar igualmente pessoas diferentes que têm necessidades diferentes, as quais devem ser respeitadas. Enfim, ela deve tra- tar a todos com respeito. (Continua) Ensinar bem futebol a todos empirismo: visão que propõe todo conhecimento como proveniente unicamente da experiência, limitando-se ao que pode ser captado do mundo externo por meio dos sentidos. Glossário O ensino de futebol e de futsal 27 O professor-técnico deve estar alinhado às práti- cas pedagógicas esportivas e, ao mesmo tempo, não deve esquecer que o futebol, pela sua força sociocultural, tem papel preponderante na educa- ção e formação humana. Ensinar mais do que futebol a todos Em modalidades como o futebol e o futsal, caracterizadas pela im- previsibilidade, mecanizar o ensino parece ser pouco útil. Devemos re- pensar no método muito além do oferecimento de respostas prontas, de modo que possamos fazer as perguntas corretas e os alunos sejam capazes de construir suas respostas. O talento esportivo, assim como o talento em qualquer área, surge da qualidade e quantidade de estímu- los oferecidos, portanto, a responsabilidade do professor de potencia- lizar e otimizar o tempo do aluno em cada aula é crucial. Sugerimos a leitura do li- vro Fora de Série – Outliers, de Malcolm Gladwell. O autor descreve, em dife- rentes capítulos, histórias que reforçam que o talento surge do ambien- te onde o indivíduo está inserido e da quantidade de horas aplicadas para a construção de tal habilidade. Rio de Janeiro: Sextante, 2008. Livro 2.2 Ambiente de aprendizagem Vídeo Os ambientes de aprendizagem mudaram bastante com a moderniza- ção dos centros urbanos. Antes, o futebol era aprendido naturalmente e em ambientes informais, jogado em campinhos improvisados, em espa- ços de dimensões e formas geométricas diversas, em pisos que poderiam ser de grama, areia, terra, asfalto ou lama. Também eram comuns traves feitas com pedaços de madeira, garrafas ou improvisadas com chinelos, e as bolas eram dos mais diversos tamanhos, pesos e materiais. E quanto aos colegas e adversários? Também eram os mais diver- sos: o time da rua debaixo, a turma da outra escola, os garotos de todas as idades etc. Às vezes o tempo era marcado no relógio, às vezes o jogo ia até escurecer o dia. O número de jogadores então... indefinido! Ou seja, as regras eram adaptáveis. Perceba que, muito mais do que um retrato do Brasil de outrora, estamos destacando a quantidade de cenários possíveis e evidencian- do a imprevisibilidade característica na qual o jogo era aprendido. Todas essas nuances auxiliaram a construir o nosso estilo de jogar, a melhorar a relação jogador-bola, a adaptar-nos constantemente a novas condições todos os dias. Esses cenários cotidianos ensinaram nossos maiores craques e os deram competências genuinamente brasileiras, como a versatilidade e destreza para um drible, o caráter 28 Metodologia do ensino de futebol e futsal improvisado. A diversificação dos ambientes proporcionou de modo natural a esses indivíduos a essência do jogo de futebol: a imprevisi- bilidade (MACHADO et al., 2018). Atualmente, os cenários são outros em grande parte do país. A vida urbana e cosmopolita se expandiu, os ambientes informais imergiram e hoje é mais comum o futebol ser ensinado em locais próprios para isso, como em clubes, escolas etc. E o ambiente, que antes era o princi- pal mediador da construção das habilidades, foi substituído pela figura do treinador. Se já não temos o ambiente imprevisível que exigia que o indivíduo se adaptasse rapidamente durante o jogo e que estimulava a capacidade criativa do jogador, agora, proporcionar essas competên- cias passou a ser de responsabilidade do profissional envolvido com o ensino (SCAGLIA, 1996; BETTEGA et al., 2019). Criar um ambiente de aprendizagem é, acima de tudo, oportunizar o ensino e oferecer aos alunos conteúdos pedagogicamente bem ela- borados. É importante deixar claro que quando tratamos de ambiente de aprendizagem, não estamos falando somente das estruturas físicas, mas do contexto todo. Nesse sentido, a escola tem um papel funda- mental e não deve se apoiar exclusivamente nos aspectos competiti- vos, o que levaria a um caráter de exclusão. 2.2.1 O ambiente escolar É sabido que nem todas as escolas possuem espaço adequado para a prática do futebol ou do futsal. O mais comum é que tenhamos à disposição uma quadra poliesportiva, nem sempre com dimensões oficiais, utilizada para diversas atividades escolares simultaneamente – o que proporcionaria maior dificuldade na criação desses cenários. Essa realidade comum reforça ainda mais a importância do professor- -técnico, pois ele deve ser capaz de criar e proporcionar atividades nesse espaço, possibilitando uma melhor relação do aluno com a bola e instigando o gosto pela prática nos estudantes. O professor-técnico deve estar atento para que o cenário que está construindo para a aula, ou sessão de treino, seja favorável à apren- dizagem, visto que as habilidades são formadas em ambientes propí- cios para seu desenvolvimento. Percebemos, então, que deve partir do professor a iniciativa de manipular o ambiente e contextualizá-lo para que seja possível atingir seu objetivo. Algumas ações que podem ser desenvolvidas por esse profissional são: Na obra O Futsal e a Escola: uma Perspectiva Pedagógica, os auto- res apresentam uma proposta pedagógica para o ensino do futsal, destacando o papel da escola junto ao esporte na construção de conhe- cimentos sociais, culturais e psicológicos. VOSER, R. C.; GIUSTI, J. G. M. 2. ed. Porto Alegre: Penso, 2015. Livro https://www.amazon.com.br/s/ref=dp_byline_sr_ebooks_2?ie=UTF8&field-author=Jo%C3%A3o+Gilberto+M.+Giusti&text=Jo%C3%A3o+Gilberto+M.+Giusti&sort=relevancerank&search-alias=digital-text O ensino de futebol e de futsal 29 Mostrar igualdade no respei- to e no ensino dos valores. Cuidar para que não haja ex- clusão por sexo, idade, peso, altura ou habilidade prévia. Formular aulas estimulantes e participativas. Fazer atividades dinâmicas em que todos possam es- tar ativos a todo momento. Evitar uso de filas, pois isso tira o foco da criança e tor- na o exercício chato. Ter equidadeno ensino, con- siderando que necessidades diferentes merecem aten- ções distintas. De acordo com Galatti e Paes (2006), quando tratamos do esporte na educação física escolar, os propósitos devem estar claros e condizentes com os pressupostos pedagógicos da escola, como a formação do indi- víduo em sua integralidade, adotando métodos cuja ênfase é propor a imprevisibilidade e os problemas a serem resolvidos pelos praticantes. 2.3 Métodos de ensino Vídeo Até recentemente, na maioria dos locais onde a prática esportiva é constante (principalmente o futebol), o ensino estava baseado uni- camente em uma prática voltada a técnicas do jogo, o que não ne- cessariamente resultava em jogar bem. Hoje, a ciência do esporte é contundente em nos mostrar que o futebol e o futsal são modalidades de características peculiares, pois o jogo se desenvolve em um ambien- te desprovido de previsibilidade. O ensino ideal do esporte é aquele com pressupostos metodológi- cos pautados em necessidades reais e com uma pedagogia que respei- te seus praticantes quanto à sua faixa etária, suas motivações e seus interesses. Nesse sentido, a seguir, veremos alguns métodos de ensino e suas diferentes características. 2.3.1 Método analítico Também conhecido como método por partes, o método analítico tem origem na ideia de ensinar as habilidades com base nos funda- mentos de uma determinada modalidade e por meio da repetição dos exercícios, destinados à aprendizagem dos gestos separadamente do jogo formal. Ou seja, é um método que fragmenta o jogo em partes, treina cada uma isoladamente, para depois juntá-las ao final. 30 Metodologia do ensino de futebol e futsal O modelo tem sido usado há bastante tempo no Brasil e parte da premissa de se eliminar os erros e se aprimorar os gestos. Com base em uma visão empirista, as escolas de esportes e os clubes frequente- mente vêm ensinando futsal e futebol, assim como outros esportes co- letivos, dessa maneira. Ele também pode ser chamado de mecanicista, porque, por exemplo, o fundamento de passe é treinado de maneira repetitiva, isolada e exaustivamente na tentativa de especializar o gesto. Por um lado, a crítica a esse modelo está na ausência do próprio jogo, tornando algo que é prazeroso para as crianças e jovens em algo meca- nizado e descontextualizado. Muitas das vezes, eles nem entendem o motivo das repetições. Por outro, esse modelo apresenta uma evolução mais rápida e visível de determinada técnica e, como o desempenho é perceptível nos resultados de jogos e torneios, crê-se que esse método é eficaz. A Figura 1 ilustra uma característica bastante comum ao método analítico: o uso de equipamen- tos que não fazem parte do jogo formal para trei- nar determinadas habilidades ou ensinar técnicas específicas. Algumas características do método analítico são: Repetição excessiva de movimentos. Foco na avaliação e correção de um gesto isolado. Diminuição do caráter coletivo. Desinteresse da criança. Distanciamento das situações reais do jogo, como enfrenta- mentos imprevisíveis. Apartamento da técnica da tática e do físico. Dessa forma, esse método preconiza o ensino e o aprimoramento dos fundamentos, como passe, domínio ou controle de bola, condução, drible, chutes e cabeceios, buscando desenvolvê-los sem oposição ou enfrentamentos. Geralmente, são usadas séries de exercícios, deter- minadas pelo tempo ou número de repetições, feitas individualmente, em duplas ou utilizando colunas ou filas de jogadores, que realizam determinado gesto, um por vez. Um exemplo seria o treino de passe em dupla, no qual um indivíduo fica de frente para o outro em uma dis- tância pré-determinada pelo professor tocando a bola alternadamente. Figura 1 Prática mais técnica e afastada da situação de jogo Se ve nt yF ou r/ Sh ut te rs to ck O ensino de futebol e de futsal 31 2.3.2 Método global O método global, também conhecido como método do todo, consis- te no ensino do esporte por meio de jogos de complexidade menor, mas ainda com vínculos e semelhanças situacionais ao jogo formal. Esse método preconiza o ensino das habilidades dentro do próprio jogo, criando tarefas específicas para ressaltar ou induzir determina- do gesto. O método global tem se mostrado muito mais importante no processo formativo do indivíduo. Na questão motivacional, ele tem ampla vantagem, já que permite variar os tipos de jogos, tornando o ensino atrativo, além de permitir a imprevisibilidade característi- ca do esporte. Além disso, oportuniza a criatividade e induz a to- madas de decisão. Para Garganta e Gréhaigne (1999) e Teoldo, Guilherme e Garganta (2015), o futebol, assim como os demais esportes coletivos, tem como característica a riqueza de situações im- previsíveis. Durante o jogo, surgem tarefas motoras de grande complexidade para as quais não existe um mo- delo de execução e resolução fixo. Nesse contexto, não há preocupação com a forma de execução, mas sim com o cumprimento da tarefa. Assim, não há jeito certo de fazer algo, contanto que seja feito. O futebol, por ser um jogo, deve ser aprendido como tal, ou seja, jogando. O ensino pautado na fragmen- tação do jogo em partes exclui a relação espaço-jogador e jogador-bola e restringe drasticamente a eficiência do ensino (SCAGLIA et al., 2013). Algumas características do método global são: Motivante, pois jogar é divertido. Participação de mais alunos ao mesmo tempo. Semelhança com o jogo formal. A imprevisibili- dade estimula a criatividade e as decisões mais rápidas. Segundo Garganta et al. (2003), o jogo de futebol tem por característica uma elevada versatilidade perceptiva, direcional e motora. Além disso, o desenvolvimento é condicionado por múltiplos fatores, como a movimentação dos colegas de equipe e dos adversários, os setores e espaços onde as ações acontecem, Figura 2 Treinamento técnico integrado ao jogo FotokostFc/Shutterstock Para entender um pouco mais sobre a pedagogia e os métodos baseados em jogos, sugerimos a obra Pedagogia do esporte: Jogos esportivos coletivos. Os autores discutem o papel dos jogos coletivos na Educação Física, com suas respectivas implica- ções no desenvolvimento de crianças e jovens nos esportes coletivos. NAVARRO, A. C.; ALMEIDA , R.; SANTANA, W. C. São Paulo: Phorte, 2015. Livro https://www.amazon.com.br/s/ref=dp_byline_sr_ebooks_2?ie=UTF8&field-author=Roberto+de+Almeida&text=Roberto+de+Almeida&sort=relevancerank&search-alias=digital-text 32 Metodologia do ensino de futebol e futsal a distância entre os alvos, a velocidade da bola e a sua trajetória etc. Isso tudo ainda muda de acordo com o momento do jogo (momento ofensivo ou defensivo). Por isso, o método de ensino deve contemplar a capacidade dos jovens em se organizarem e efetuarem ações conforme o que o momento do jogo solicita. 2.4 Abordagens pedagógicas Vídeo As abordagens pedagógicas e os estilos de ensino 1 são norteado- res no processo de aprendizagem e importantes no desenvolvimen- to do trabalho do professor. A apropriação dessas teorias capacita esse profissional para que ele tenha discernimento no momento da elaboração de conteúdos, objetivos e estratégias da aula. A aborda- gem do ensino do esporte na escola não pode estar limitada apenas à transmissão de técnicas e táticas, o que seria uma visão reduzida e fragmentada desse fenômeno. O esporte não é educativo por si só – aliás, o futebol pode ter tudo: o bem ou o mal, a sapiência ou a ignorância, o inclusivo ou o exclusivo –, e o professor é o responsável por transformá-lo em um objeto de educação e transmissor de virtudes (GOULART, 2018). Para Paes (1998, p. 112), o esporte é uma representação simbólica da vida, da natureza educacional, podendo promover no praticante modificações tanto na compreensão de valores como de costumes e modo de comportamento, interferindo no desenvolvimento individual, aproximando pessoas que têm, neste fenômeno, um meio para estabelecer e manterum melhor relacionamento social. Portanto, o esporte na escola não pode ter como objetivo princi- pal formar atletas, apesar de poder ser um efeito secundário, que não pode ser desprezado. O objetivo maior do esporte deve ser a expan- são de suas inúmeras possibilidades de atividades formativas. Dessa forma, outras dimensões, além das esportivas, devem constar na pro- posta pedagógica, como a atenção aos aspectos sociais, culturais, his- tóricos, antropológicos etc. (FINCK, 2011). Pessoas aprendem de maneiras diferentes, e cada uma traz consigo histórias e vivências distintas. Transmitir informações é algo complexo e as práticas bem-sucedidas de hoje não garantem o mesmo sucesso ama- As abordagens são teorias apli- cadas à pedagogia e os estilos ou linhas de ensino se referem a como o professor interage com o aprendiz. 1 O ensino de futebol e de futsal 33 nhã, e assim também funciona com turmas diferentes. Logo, uma única corrente não deve orientar a prática pedagógica, mas, sim, elementos de diversas linhas (GOULART, 2018). Humanizar as relações e enxergar dentro das equipes e pessoas são um excelente início. Pessoas têm pontos de partidas diferentes e tra- zem consigo heranças biológicas, ambientais e culturais distintas. Por- tanto, um ambiente de ensino democrático é aquele que enxerga cada indivíduo como único em sua necessidade (FREIRE, 1989). 2.4.1 A classificação das abordagens pedagógicas A classificação das abordagens pedagógicas varia na literatura. Po- demos observar diversos modelos – algumas vezes, diferentes somen- te na nomenclatura ou na descrição das características, dependendo do autor pesquisado. É importante entender esses conceitos, mais do que definir exatamente todos. Desse modo, apresentamos algumas abordagens possíveis, de acordo com Finck (2011) e Goulart (2018): Saúde Renovada É voltada à valorização da prá- tica do exercício físico, contri- buindo para uma conscienti- zação da importância de um estilo de vida ativo e saudável. Desenvolvimentista Defende que, na fase funda- mental do desenvolvimento motor, as crianças devem ser envolvidas na exploração e experimentação das suas capacidades motoras. A aula deve privilegiar a aprendiza- gem motora, cognitiva e afe- tiva de acordo com o nível de crescimento e desenvolvi- mento do aluno. Humanista Caracteriza-se por valorizar o aluno e não a atividade. Os pro- fessores ajudam a desenvolver atitudes positivas nos jovens com relação ao papel da ativida- de em suas vidas, dando signifi- cação e proporcionado momen- tos de escolha e criatividade. Construtivista O jogo assume papel de conteú- do e estratégia, sendo o princi- pal meio de ensino. Ele deve ser utilizado em um ambiente praze- roso para o praticante. Crítico-Superadora Sua finalidade é a transformação social, tendo os temas cultura corporal e visão histórica como parte fundamental e integrante dos conteúdos. Além disso, visa desenvolver o senso crítico e questionador do indivíduo, esti- mulando sua compreensão de mundo. 34 Metodologia do ensino de futebol e futsal O conhecimento das abordagens pedagógicas e dos estilos de en- sino nos ajudam a nortear nosso caminho como professores e nos fazem refletir sobre a maneira que interagimos com os alunos e as possibilidades de potencializarmos a aprendizagem. É importante que o professor possua um repertório amplo de técnicas e estilos – trabalhando, principalmente, com turmas grandes e heterogêneas –, e que utilize várias linhas. Quadro 1 Benefícios do planejamento estratégico Recomendamos a leitura do livro A Educação Física e o esporte na escola: coti- diano, saberes e formação, de Silvia Finck. O livro trata, de maneira bastante abrangente, os métodos e as abordagens de ensino. FINCK, S. C. M. Curitiba: InterSaberes, 2012. Livro Estilos de ensino Filosofia Exemplo com treinamento de passe Comandos Centrada no professor, tradicional. O aluno aprende conforme instrução, de- monstração e tomada de decisão do pro- fessor. O professor explica, demonstra e espera que o aluno execute exatamente como foi demonstrado. Tarefas O aluno tem maior responsabilidade no pro- cesso de aprendizagem. O professor explica e demonstra, e o aluno pode, por exemplo, apresentar variações no posicionamento do tronco, do pé de apoio ou na velocidade de execução. Avaliação recíproca Altamente centrada no aluno. O professor determina os objetivos e con- teúdos e os alunos são incumbidos de parti- cipar da aprendizagem uns dos outros. O professor explica e demonstra, os alunos podem apresentar variações e o processo se dá por avaliação e feedbacks dos próprios colegas (trabalho em dupla, por exemplo). Programação individualizada Um número maior de decisões é transferido ao aprendiz. O aluno pode assumir seu próprio ritmo. Mostra respeito pelas individualidades. O professor explica e demonstra vários mo- dos de execução, com níveis de dificuldade diferentes, e o aluno executa aqueles de acordo com o seu grau de habilidade. Descoberta orientada ou descoberta guiada O professor estabelece uma resposta pré- -determinada e esperada para o problema. Então, faz perguntas considerando que elas produzam a necessidade da busca de alter- nativas para a solução por parte dos alunos. O professor separa pequenos grupos e os orienta sobre a tarefa, mas não especifica a forma de execução. Em alguns momentos, ele interrompe a prática e faz questiona- mentos sobre o gesto, no sentido de esti- mular que parta do aluno a descoberta da melhor forma. Solução de problemas O aluno é definitivamente o centro. Ele passa a ser o elemento ativo, formulando perguntas e buscando respostas. O professor seleciona o conteúdo e estimula a curiosidade. A tarefa, o modo (movimentando ou para- do), a formação (duplas, trios), a execução (pé direito ou esquerdo) etc. são criados pelos alunos. Após a sessão, o professor discute com eles, propondo como é possível melhorar. Fonte: Adaptado pelo autor com base em Goulart, 2018. O ensino de futebol e de futsal 35 Com base nas teorias pedagógicas tradicionais e na busca de uma estrutura que possa ser mais eficiente, surge como nova perspectiva a chamada Pedagogia Não-Linear (PNL). Para Machado et al. (2018), a PNL é representada em sua essência pelos jogos reduzidos e seu aspecto- -chave é a manipulação das tarefas, do ambiente e do indivíduo. Ela não segue uma construção linear de conhecimento, mas oferece ajustes para atender às necessidades do aluno. Também segundo os autores, essa visão é baseada nos princípios do futebol de rua. No vídeo Ed Física Brasil entrevista - João Claudio Machado, o Prof. Dr. João Cláudio Machado, da Universidade Federal do Amazonas, fala sobre as novas abordagens pedagó- gicas aplicadas ao futebol. Vale a pena conferir! Disponível em: https://youtu. be/7W4Gkv6yMK0. Acesso em: 15 jun. 2020. Vídeo 2.5 Pedagogia dos jogos Vídeo Quando falamos de jogo, qual é a primeira coisa que vem à sua ca- beça? Muita confusão é gerada com relação a essa definição. Quando o assunto é jogo, para muitas pessoas, a primeira ideia que surge é o re- sultado do jogo anterior do seu time de coração. Já para outras, a ideia de jogo está atrelada à brincadeira ou à ludicidade. De fato, o jogo é tudo isso e está no meio dessas duas ideias, sendo, então, tarefa difícil defini-lo. Podemos entender que tudo que fica entre a brincadeira des- compromissada e o esporte extremamente rígido poderia ser chama- do de jogo. Segundo Huizinga (1999, p. 2), “no jogo, existe alguma coisa ‘em jogo’ que transcende as necessidades imediatas da vida e confere um sentido à ação. Todo jogo significa alguma coisa”. As tarefas criadas dentro dos jogos devem obedecer ao grau de com- plexidade condizente com as faixas etárias ou com o nível de adaptação do indivíduo. Devem funcionar como ferramenta de estímulo para que a criança aprenda a pensar de maneira crítica e a resolver problemas com- plexos, trabalhede maneira colaborativa, e comunique-se com eficácia. Nesse sentido, é fundamental observarmos que diferentes tipos de jogos dependem de tarefas e propostas distintas. Por exemplo, os jogos cooperativos são aqueles em que não há competição entre os participantes do time e o sucesso do jogo depende da participação em conjunto. Já os jogos pré-desportivos são aqueles que procuram se assemelhar ao esporte sobre o qual se pretende ensinar. Além do mais, o jogo é uma atividade extremamente indicada para satisfazer a necessidade de movimento do ser humano, é um conteúdo que representa esforço e conquista, servindo como um importante veículo de cultura (SCAGLIA et al., 2013). https://youtu.be/7W4Gkv6yMK0 https://youtu.be/7W4Gkv6yMK0 36 Metodologia do ensino de futebol e futsal O jogo funciona muito bem como ferramenta pedagógica, pois tem por característica ser divertido e motivante. Afinal, quem não gosta de jogar? Porém, esses aspectos se perdem caso as proposições do jogo superestimarem a capacidade de entendimento do indivíduo, por exemplo, se o jogo estiver complexo para aquela faixa etária, a crian- ça provavelmente não o entenderá e logo se desmotivará. O contrário também é verdadeiro. Subestimar a capacidade da criança, propondo tarefas fáceis, fará com que ela perca o interesse. Para melhor entender como os jogos podem ser utilizados dentro de uma lógica pedagógica dos esportes coletivos, Scaglia et al. (2013) propuseram uma divisão baseada na referência estrutural e funcional do jogo e, com base nessas definições, a criação de matrizes de jogos que auxiliam no processo de organização do método. Referência estrutural Referência funcional É tudo que está presente fisica- mente no jogo, como bola, baliza, dimensão do campo, número de jogadores etc. Rege o jogo, fazendo ele funcionar, como a lógica do jogo, as operações e as regras. Com base nesses conceitos, Scaglia et al. (2013) identificam as ma- trizes de jogos e as classificam em: jogos conceituais, jogos conceituais em ambiente específico, jogos específicos e jogos contextuais. Vamos entender um pouco mais sobre eles? Os jogos conceituais são aqueles cujas referências estruturais e funcionais não respeitam fielmente a lógica do jogo esportivo coletivo especificado. Logo, os conteúdos, evidenciados ao longo do processo de organização, são diversificados, gerando a manifestação de inúme- ras ações conceituais presentes em todos os jogos esportivos coleti- vos, e não apenas no jogo esportivo coletivo que se almeja ensinar. Por exemplo: um jogo de campo reduzido 4 x 4 m em que dois jogadores se enfrentam com o objetivo de somente manter a posse de bola. Os jogos conceituais em ambiente específico obedecem às referências estruturais do jogo que se quer ensinar, por exemplo, no futebol, o tamanho do campo e a presença das traves. Nesse tipo de jogo, os conceitos desenvolvidos nos jogos conceituais são colocados em um ambiente formal, dentro de um espaço físico semelhante ao do jogo formal. Contudo, varia quanto ao cumprimento da lógica O ensino de futebol e de futsal 37 formal (adaptada segundo o conceito trabalhado), pois o processo de organização sistêmico terá ações diferentes das especificamente exigidas no jogo esportivo coletivo pretendido, para a obtenção das formas de pontuação provenientes das modificações das regras. Por exemplo: em um espaço de quadra oficial e com número de jogadores oficiais, somente será permitido o chute a gol depois de dez passes consecutivos na quadra ofensiva. Nos jogos específicos, as referências estruturais e funcionais não são alteradas em relação às da lógica do jogo pretendido. Assim, a maior aproximação ao jogo formal (regras oficiais) e os conceitos aplicados fazem parte de um modelo de jogo pré estabelecido. Por exemplo: um treino coletivo, no qual se estabelece previamente os comportamen- tos, como transição defensiva rápida e compactação da equipe. Por fim, os jogos contextuais são idênticos a uma competição for- mal. Eles devem manter as referências estruturais e funcionais asso- ciados aos desafios emocionais da competição. Portanto, trata-se dos jogos amistosos e oficiais. Sugerimos a leitura do livro Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. Nessa interessante obra, o autor filosofa sobre a ideia de enxergar uma espécie derivada do homo sapiens e destaca que o jogo está implícito na natureza, estando em tudo e se relacionando com o ser nas próprias relações humanas. Dessa forma, a reflexão reforça a importância do jogo. HUIZINGA, J. São Paulo: Perspectiva, 1999. Livro 2.6 Iniciação esportiva e capacidades motoras Vídeo A iniciação ao futebol ou ao futsal costuma ser bastante precoce, alicerçada ainda pela crença de quanto antes melhor. O nível de compreensão e adequação do conteúdo oferecido aos jovens ainda é pequeno, e é necessária a disseminação do conhecimento, que deve partir de professores de Educação Física, principais mediadores dessa relação. Iniciar precocemente no esporte não é o problema real, e, sim, a es- pecialização e a imposição de gestos e ações motoras específicas a uma criança, que podem trazer futuros prejuízos à saúde. A especificidade do esporte, principalmente se direcionado ao âmbito competitivo, exi- ge ações motoras para as quais o jovem nem sempre já está maturado, sem contar com as exigências psicológicas oriundas das cobranças por parte de pais e até de professores. A iniciação esportiva deve estar pautada na ideia de ampliação do universo cognitivo e motor. Para Goulart (2018), a infância é o melhor momento para a estimulação cerebral, pois é quando ocorre a maior plasticidade neural. Nesse contexto, as estratégias didáticas têm um papel fundamental para o desenvolvimento neurológico. O futebol, por exemplo, 38 Metodologia do ensino de futebol e futsal pode ser utilizado como pano de fundo para inserir a criança em práticas motoras variadas e lúdicas, que despertem o encantamento e a satisfação. É interessante ressaltar que, normalmente, o ser humano se interessa pelas atividades prazerosas, e experiências negativas e traumáticas tendem a afastar a criança. Imagine uma criança cobrada excessivamente e exposta diante de seus colegas por algum erro ou alguma derrota. Essa experiência negativa poderia resultar em traumas incorrigíveis. A aula de Educação Física é a oportunidade de iniciar esse processo, que deve ser de longo prazo e multilateral, e o professor deve discernir o futebol ou futsal na escola da equipe de competição escolar. Ambos podem ser incentivados, mas em momentos diferenciados. O futebol e o futsal na escola fazem parte do conteúdo curricular da Educação Físi- ca e de todas as suas dimensões. Já a competição é um instrumento alternativo, que não deixa de ser importante, mas deve fazer parte do processo de ensino e não deve atrapalhá-lo (FINCK, 2011). O respeito às fases de desenvolvimento motor também é imprescindível para o sucesso da forma- ção atlética a longo prazo. O desenvolvimento motor serve como suporte ao trabalho diário e é um pro- cesso contínuo e dependente de todos os domínios do ser humano: cognitivo, afetivo-social e motor (GOULART, 2018). Crianças em período pré-púbere, por exemplo, não estão biologicamente aptas a re- ceber determinadas cargas de treinamento, muitas vezes propostas com o intuito de fazê-las competir melhor e conquistar vitórias. Porém, elas podem es- tar ativamente abertas a receber outros estímulos que não foram oferecidos. Isso se chama janela de oportunidade ou período sensível. Nesse sentido, na abordagem do esporte na es- cola, o professor poderá utilizar alguns elementos do jogo, principalmente o seu caráter lúdico. Além disso, algumas estratégias poderão ser aplicadas no encaminhamento do processo de ensino-apren- dizagem, como a adaptação das regras, o redimen- sionamento do espaço, a alteração do número de participantes e a composição das equipes. Sugerimos a leitura da Base
Compartilhar