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Aula 03

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24/03/2023, 21:23 UNINTER
https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 1/23
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRANSTORNO DO ESPECTRO
AUTISTA
AULA 3
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Prof. Bruno Luis Simão
CONVERSA INICIAL
Ao longo das aulas, você pôde conhecer questões que permeiam o contexto histórico e
evolutivo do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Sabe-se que o TEA é representado por um
conjunto de características muito específicas que afetam diretamente o desenvolvimento de muitas
formas, causando alguns comprometimentos ligados às áreas de habilidade social. Os indivíduos com
TEA, em sua maioria, tendem a apresentar padrões de atividades restritos, comportamentos
estereotipados e interesses em situações limitados.
Ao longo da história, as formas de compreensão do TEA vêm se modificando, desde o nível de
causalidade até a forma de diagnóstico e de tratamento, sendo a psicanálise o modelo técnico e
teórico mais estudado. Nesta aula, veremos:
A contribuição de Bruno Bettelheim para a compreensão do autismo.
Contribuições de autores klenianos e pós-klenianos.
A teoria winnicottiana.
A contribuição da psicanálise para o processo de ensino-aprendizagem.
Esperamos que você aprecie e encontre nesta aula uma fonte útil de conhecimentos. Nossa
intenção é apresentar um estudo que possa contribuir com o saber a respeito da presença da
psicanálise no fazer educativo junto aos indivíduos com TEA, bem como sobre a aplicação dos
conteúdos aqui adquiridos, além da compreensão no trato junto aos indivíduos com TEA em suas
fases de desenvolvimento.
TEMA 1 – BRUNO BETTELHEIM
Figura 1 – Bruno Bettelheim
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Crédito: Votava/DPA/Fotoarena.
Bruno Bettelheim, psicólogo e educador, nasceu em Viena, em 28 de agosto de 1903, em uma
família da pequena burguesia judaica assimilada. Foi preso pela Gestapo, sendo violentamente
espancado, e foi transferido depois para o campo de concentração de Buchenwald, onde encontrou
Ernst Federn, filho de Paul Federn, companheiro de Freud. Naquele universo de medo, angústia e
humilhação permanentes, começou a fazer um trabalho de resistência consigo mesmo (Roudinesco,
1994).
Após sua libertação dos campos de concentração, Bettelheim ingressou na Escola Ortogênica da
Universidade de Chicago, a qual coordenou por quase 30 anos. Ele publicou 16 livros e outro
inúmeros artigos e ensaios científicos. A principal temática de sua escrita foi a aplicação de princípios
psicanalíticos aos problemas da educação, da sociedade e da família, e seu livro mais conhecido é A
Psicanálise dos Contos de Fadas. Nesse livro, o psicólogo utiliza dos contos de fadas em suas formas
originais que continham situações de violência mais explícita, bem como temáticas consideradas
tabus, como o incesto, defendendo que esses temas são inerentes aos seres humanos e, por isso, são
de interesse do público infantil (Zelam, 1993; Silva, 2010).
Além disso, Bettelheim defende que esses contos de fadas recriavam também a saga do herói,
isto é, a busca por nossas origens, o enfrentamento dos problemas que todos passamos ao longo da
vida e a superação dessas dificuldades até sermos capazes de obter sucesso. A jornada do herói seria
responsável por demonstrar o desenvolvimento interior da criança e os rituais de passagem pelos
quais elas passam em suas diversas etapas de desenvolvimento (Silva, 2010).
O psicólogo argumenta que fazer uso das ficções com as crianças as auxiliam a recriar
internamente suas dificuldades pessoais, pois essas ficções permitiam que elas se imaginassem
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vivenciando as histórias e assim abria-se a possibilidade de elas aprenderem a lidar com seus
conflitos interiores. Por meio dessas narrativas, as crianças começariam a compreender quais são os
meios pelos quais devem lidar com seus medos, suas falhas, assim como solucionar aquilo que
apareceria como entrave para seu desenvolvimento (Silva, 2010).
Com base nessa explanação, é possível identificar que o trabalho do psicólogo era voltado para
o desenvolvimento infantil, tendo sido desenvolvido primordialmente na Escola Ortogênica da
Universidade de Chicago. Nessa instituição, à qual esteve vinculado desde 1943, ele teve contato e
desenvolveu sua teoria acerca de crianças que eram classificadas como autistas. Contudo, esse
instituto, que se orientava pela psicanálise, possuía características contraditórias no que concerne a
questões de acesso ao exterior e autonomização dos indivíduos, visto que Bettelheim escreveu
longamente que os jovens gravemente perturbados devem ser removidos do ambiente que promove
seus sintomas e alojados em um ambiente de tratamento especialmente projetado, baseado em
princípios psicanalíticos. O próprio fez muitas publicações que abordavam suas modificações da
psicanálise para se ajustar ao ambiente que ele criou para jovens que considerava gravemente
perturbados (Zelam, 1993).
Afora as críticas ao seu trabalho com a psicanálise na Escola Ortogênica, o psicólogo é
duramente criticado por aqueles que estudam o autismo e é um dos principais nomes utilizados por
aqueles que criticam o tratamento psicanalítico para pessoas que se encontram dentro do espectro.
Entretanto, vale ressaltar que ele não utilizou o modelo conceitual psicanalítico para explicar o
autismo, mas sim estabeleceu a analogia entre a sua própria experiência pessoal passada nos campos
de concentração nazistas e o funcionamento mental do autista (Zelam, 1993).
Com base nessa experiência nos campos de concentração nazista, Bruno Bettelheim constrói o
conceito de situação extrema ou destrutiva. Esse conceito define uma situação que acarretaria à
desumanização do indivíduo, e ele se questiona se as crianças autistas não teriam vivido alguma
coisa de semelhante para chegarem à retirada do mundo, tal como ele observou nos campos de
concentração (Vidigal; Guapo, 1997).
Um ano após se vincular à Escola Ortogênica, Bruno Bettelheim afirmou que a causa primordial
do autismo é um problema na matriz relacional da família, porém dessa matriz ele se focou na figura
materna, estabelecendo taxativamente a culpa do autismo a ela, cunhando o termo mãe-geladeira
(Gonçalves; Silva; Menezes; Tonial, 2017).
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O psicólogo se orientou pelo que foi divulgado pelo psiquiatra austríaco Leo Kanner a respeito
das prováveis causas do autismo: as dificuldades de interação e trocas afetivas entre a família.
Concluiu, desse modo, que uma mãe frígida, um pai ausente e a ineficácia nos cuidados com a
criança resultariam nos comportamentos autísticos (Gonçalves; Silva; Menezes; Tonial, 2017).
A principal ideia de Bettelheim era que, devido à criança ter sofrido algum tipo de angústia por
causa de sua incapacidade de se amparar na família, é necessário estabelecer um grupo de pessoas
centrais em sua vida na escola; essas pessoas deveriam ser responsáveis pelo desenvolvimento das
características afetivas das crianças. Utilizando-se de termos psicanalíticos, pode-se dizer que essas
pessoas seriam pilares da vida da criança e funcionariam como apoio do ego a esses jovens
extremamente carentes de afeto, cujo funcionamento do ego havia sido arruinado diversas vezes ao
longo de anos antes de serem admitidos na Escola Ortogênica (Zelam, 1993).
TEMA 2 – CONTRIBUIÇÕES DE AUTORES KLEINIANOS E AUTORES
PÓS-KLEINIANOS
Melanie Klein tornou-se membro da sociedade psicanalítica húngara em 1919, com base em um
artigo no qual relatava observações de crianças em idade escolar, sua curiosidade e seus problemas
de indagação. Dois anos após seu ingresso, em 1921, ela se mudou para Berlim, onde começou a
desenvolver uma técnica terapêutica específica para o trabalho com crianças. Essa técnica foi baseada
estritamente na psicanálise deadultos. Ela argumentou que se o método adulto exigisse que o
paciente associasse livremente pensamentos em sua mente, então o equivalente em crianças seria a
brincadeira livre (Abram; Hinshelwood, 2018).
De acordo com Roudinesco e Plon (1998), Melanie Klein foi o principal expoente do pensamento
da segunda geração psicanalítica mundial. Deu origem a uma das grandes correntes do freudismo, o
kleinismo, assim como Lacan, pois ela não simplesmente se utilizou da teoria psicanalítica criada por
Freud, mas a modificou inteiramente estabelecendo novos conceitos e instaurando uma nova prática
de análise. Essa nova prática baseia-se em regras precisas e em um manejo da transferência que
exclui a realidade física em favor da realidade psíquica.
Klein foi a responsável por transformar totalmente a doutrina freudiana clássica criando não
apenas a psicanálise de crianças, mas também uma nova técnica de tratamento e de análise didática.
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Sua obra é composta basicamente por cerca de 50 artigos científicos e de um livro, A Psicanálise de
Crianças, sendo acrescentada aqui uma autobiografia (Roudinesco; Plon, 1994).
Em 1926, Klein deixou Berlim para unir-se à Sociedade Psicanalítica (BPS, na sigla em inglês). Essa
mudança foi a causadora de intensos conflitos, pois Anna Freud estava em desacordo com a
psicanálise infantil proposta por Melanie Klein e as duas psicanalistas entraram em intensos entraves,
sendo Anna apoiada por seu pai (Roudinesco, 1994).
Dois anos após adentrar na BPS, em janeiro de 1929, começou a tratar de uma criança autista de
quatro anos, filho de um dos seus colegas da BPS, tendo dado a ele o nome de Dick. A psicanalista
acabou percebendo que o menino apresentava sintomas com os quais ela nunca havia se deparado
antes. Ele não expressava qualquer tipo de emoção, nenhum tipo de apego às pessoas e não se
interessava pelos brinquedos tradicionalmente de interesse infantil. A história desse caso acabaria se
tornando famosa, pois demonstraria como alguns psicanalistas não seriam capazes de dar aos filhos
o amor que esperam deles (Roudinesco, 1994).
De acordo com Abram e Hinshelwood (2018), os principais princípios que orientavam o trabalho
de Klein são:
Quadro 1 – Princípios de orientação do trabalho de Melanie Klein
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Fonte: Simão, 2020.
Além desses pilares da teoria kleiniana, seus estudiosos, de acordo com Zimmermann (2004),
apontam como pontos favoráveis dessa teoria:
1. Abertura para a análise de crianças por meio da utilização de técnicas lúdicas, utilizando-
se de brinquedos e jogos sem nunca abandonar o rigor analítico que foi estabelecido para a
análise clássica de adultos.
2. Início à análise de psicóticos, preservando a mesma técnica que a utilizada com os
pacientes neuróticos comuns, à medida que ela foi configurando e divulgando os primitivos
mecanismos psíquicos que acompanham o bebê desde o nascimento.
3. Existência de uma descrição de uma angústia de aniquilamento e mecanismos de defesa
que seriam mais primitivos que aqueles propostos pelas teorias de Freud, de Anna Freud.
4. Concepção do fenômeno da identificação projetiva e o seu conceito de posição esquizo-
paranoide e de posição depressiva.
5. Valorização da relação mãe-bebê.
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6. Valorização das pulsões agressivas.
7. Posição firme na manutenção rigorosa do setting apregoado e na recomendação de que
os analistas deveriam trabalhar e interpretar sistematicamente a neurose de transferência.
Esses mesmos estudiosos também pontuam as principais críticas ao modelo teórico estabelecido
por Melanie Klein, conforme Zimmermann (2004):
1. O paciente adulto estaria sendo encarado e tratado como um bebê.
2. Interpretações muito fechadas em si mesmas.
3. infantilização do paciente adulto.
4. Não valorização dos aspectos ligados diretamente ao narcisismo e à importância que
representa a condição de incompletude do ser humano.
5. Uso de interpretações com características superegoicas, mescladas com expectativas do
analista a serem cumpridas pelo paciente, impedindo a abertura de novas percepções e
pensamentos do paciente e dele próprio.
6. Ênfase exagerada na interpretação da inveja, além do fato de que a crença na noção de
uma inveja primária inata já condiciona negativamente a atitude psicanalítica do terapeuta.
7. Excesso de radicalismo no setting terapêutico instituído, a ponto de não tolerar a
introdução de qualquer parâmetro, por mínimo e necessário que ele fosse.
8. Não valorização das funções e representações do ego, comparativamente ao id.
9. Uso abusivo de interpretações sistematicamente voltadas para um reducionismo.
10. Interpretações centradas em órgãos sexuais e funções primitivas podem induzir a uma
doutrinação intelectual do paciente.
11. Acentuado descaso pelos fatos da realidade exterior contidos nas narrativas dos
pacientes.
Os psicanalistas pós e neokleinianos têm feito sensíveis modificações na técnica que os
seguidores tradicionais de Klein utilizavam, no sentido de uma relativa, porém bastante significativa,
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maior flexibilidade na aplicação dos princípios técnicos rígidos, sem perder sua essência
(Zimmermann, 2004).
Exemplos das alterações propostas são os estudos de Rosenfeld sobre organizações narcisistas,
os de Bion, relativos às funções do pensamento e conhecimento (Bion pode ser considerado um dos
mais importantes autores pós-kleinianos tendo desenvolvido teoria própria com base nos princípios
teóricos estabelecidos por Klein, porém, com modificações bastante profundas), e os de John Steiner
sobre a relação perversa entre partes cindidas do ego. As principais alterações que esses autores
propuseram à teoria de Klein estão justamente relacionadas às críticas elencadas anteriormente
(Zimmermann, 2007).
No quadro 2, a seguir, estão elencados os principais nomes de autores que tiveram seus
trabalhos orientados pelas teorias de Melanie Klein.
Quadro 2 – Principais autores kleinianos, pós-kleinianos e neokleinianos
Autores kleinianos Autores pós-kleinianos Autores neokleinianos
P. Heimann H. Segal; H. Rosenfeld B. Joseph
H. Racker D. Meltzer J. Steiner
J. Rivière W. Bion
S. Isaacs
Fonte: Simão, 2020.
A corrente psicanalítica kleinismo, representada pelos diversos partidários de Melanie Klein,
incluindo autores pós-kleinianos, surgiu em oposição ao annafreudismo. Seu surgimento teve como
origem controvérsias existentes entre as duas psicanalistas que culminaram em uma clivagem da BPS
em três tendências, uma delas o kleinismo (Roudinesco; Plon, 1994).
O kleinismo não é uma simples corrente, mas uma escola comparável ao lacanismo, pois possui
uma doutrina com coerência e corpo conceitual próprio, um saber clínico autônomo ao de Freud e
que possui um modo de formação e didática particular. Contudo, apesar de ser considerada uma
corrente psicanalítica como o lacanismo, o kleinismo não revisou os fundamentos epistemológicos
ou propôs uma teoria do sujeito (Roudinesco; Plon, 1994).
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Klein e seus sucessores, conforme descrito por Roudinesco e Plon (p. 443, 1994), consolidaram a
teoria
integrando na psicanálise o tratamento das psicoses (esquizofrenia, borderlines, distúrbios da
personalidade ou do self), inventando o próprio princípio da psicanálise de crianças (por uma
rejeição radical de qualquer pedagogia parental) e, por fim, transformando a interrogação
freudiana sobre o lugar do pai, sobre o complexo de édipo e sobre a gênese da neurose e da
sexualidade numa elucidação da relação arcaica com a mãe, numa evidenciação do ódio primitivo
(inveja) próprio da relação de objeto e, por último, numa busca da estrutura psicótica (posição
depressiva/posiçãoesquizo-paranóide) que é característica de todo sujeito. Assim, os kleinianos, tal
como os lacanianos, inscreveram a loucura bem no âmago da subjetividade humana.
O conceito da transferência é caro aos kleinistas. Ele pode ser definido classicamente como
sendo um fenômeno psíquico em que todas as fantasias, ansiedades e defesas que compõem o
mundo interno são expressas nas situações vividas no cotidiano. Já para Klein e seus seguidores, a
transferência era considerada um resultado da externalização devido à ansiedade de relações
internas. Para os analistas kleinianos o essencial na transferência não está atrelado à relação entre
passado e presente, como é comum nos trabalhos de Freud, mas sim na relação entre mundo interno
e mundo externo (Neves, 2007).
Esse conceito de transferência é fundamental para a escola kleinista. Com base nele, são
concebidas as relações que as crianças estabelecem com figuras parentais, já que possuem partes de
uma transferência, pois as crianças baseiam seu relacionamento com os pais não naquilo comportado
pela realidade, mas por meio da percepção já influenciada pelas introjeções e projeções (Neves,
2007).
TEMA 3 – WINNICOTT
Figura 2 – Donald Woods Winnicott
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Crédito: Mark Gerson Photography/Bridgeman Images/Fotoarena.
Donald Woods Winnicott nasceu em Plymouth, em 7 de abril de 1896. A princípio, ele foi um
seguidor de Melanie Klein, tendo realizado supervisão psicanalítica com ela, mas acabou por romper
com a psicanalista. Contudo, alguns pontos da teoria desenvolvida por Klein permaneceram com
Winnicott ao longo de seus trabalhos. Pode-se inferir que um dos motivos que levou a essa ruptura
se deve ao momento em que Winnicott começou sua formação psicanalítica na sociedade britânica
de psicanálise, ocasião que passava por uma crise devido a conflitos opondo os partidários de Anna
Freud aos de Melanie Klein a propósito da psicanálise de crianças (Roudinesco; Plon, 1994).
Diferentemente de Melanie Klein, Winnicott tinha menos interesse pelos fenômenos de
estruturação interna da subjetividade do que o interesse que nutria pela dependência do sujeito em
relação ao ambiente no qual estava inserido. Ele também não acreditava na explicação fornecida por
Freud sobre a agressividade em termos de pulsão de morte e definiu a psicose como um fracasso da
relação materna com a criança. Desse interesse e dessa descrença na proposta freudiana, surgiu a
crença winnicottiana de uma normalidade fundada nos valores de um humanismo. Para o psicanalista
um funcionamento considerado bom dependia do vínculo estabelecido com a mãe, pois este
permitiria à criança organizar seu eu de maneira sadia e estável (Roudinesco; Plon, 1994).
A figura materna era primordial na teoria de Winnicott e, após desenvolver um trabalho durante
o período de guerra com crianças refugiadas e consequentemente privadas da presença materna, ele
desenvolveu um novo conjunto de acepções sobre a relação mãe-bebê.
Em sua opinião, a dependência psíquica e biológica da criança em relação à mãe tem uma
importância considerável. Daí o célebre aforismo de 1964: “o bebê não existe.” Winnicott queria
dizer com isso que o lactente nunca existe por si só, mas sempre e essencialmente como parte
integrante de uma relação. Se a mãe estiver incapaz, ausente ou, pelo contrário, demasiadamente
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intrusiva, a criança se arrisca à depressão ou a condutas antissociais, como o roubo ou a mentira,
que são maneiras de reencontrar, por compensação, uma “mãe suficientemente boa”. (Roudinesco;
Plon, p. 784, 1994)
O trabalho de Donald Winnicott evoluiu em três fases cronológicas, à medida que avançaram as
principais teorias psicanalíticas que afetaram radicalmente a prática da psicanálise. O núcleo de suas
investigações se concentrou na experiência do meio ambiente do sujeito e em como isso moldou a
crescente mente e senso de si (Abram; Hinshelwood, 2018).
Quadro 3 – Fases cronológicas de Winnicott
Winnicott construiu um corpo teórico e prático completamente novo, sendo que sua principal
contribuição, visto que ele também é integrante do kleinismo, é a valorização do precoce vínculo real
mãe-bebê no desenvolvimento emocional primitivo, além de pressupor a existência de segurança
estabelecida pelo que ele chama de uma mãe suficientemente boa e de ter criado os conceitos de
verdadeiro e de falso self e de fenômenos, espaços e objetos transicionais (Zimmermann, 2007).
Zimmermann (2004) mostra alguns pontos considerados favoráveis na teoria de Winnicott:
1. Resgate da importância do ambiente facilitador ou complicador, representado
principalmente pela mãe da realidade física em contraposição ao que era propagado por
Melanie Klein e seguido pelos analistas kleinianos da época.
2. Relativamente à mãe real, de certa forma inspirado em Lacan, deu especial importância
ao olhar materno.
3. Retirada da ênfase técnica prioritariamente dirigida às pulsões sádico-destrutivas
resultantes da inveja primária, segundo a escola kleiniana. Por exemplo, Winnicott cunhou o
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conceito de crueldade sem ódio para conceituar que crianças poderiam ter atitudes agressivas
sem estarem movidas por um ódio destrutivo.
4. Conceito de mãe suficientemente boa
5. Concepção de objeto, espaço e dos fenômenos transicionais são totalmente originais em
psicanálise.
6. Criação do conceito de hesitação frente à tomada de decisões.
7. Argumento de que o paciente e o terapeuta devem exercer atividade lúdica até
construírem um insight.
8. Concepção de verdadeiro self e de falso self, ambos convivendo concomitantemente no
psiquismo de um mesmo sujeito.
9. Flexibilidade no setting terapêutico.
10. Recurso técnico de formular paradoxos para os pacientes.
11. Trabalho relativo ao conceito de contratransferência que era tido como tabu entre os
psicanalistas de sua época.
Muitas das críticas dirigidas a Winnicott se devem ao fato de que sua técnica psicanalítica
sempre esteve em contradição com os padrões da Associação Psicanalítica Internacional (IPA, na sigla
em inglês). O psicanalista não respeitava as orientações relativas à forma de conduzir as sessões no
que condizia com a neutralidade e o tempo, não hesitando também em estabelecer relações de
amizade com seus pacientes, pois acreditava que essa relação transferencial seria uma réplica do laço
materno (Roudinesco; Plon, 1994).
Zimmermann (2004) aborda que os críticos de Winnicott pontuavam que a atitude que
consideravam humanística por parte do psicanalista prejudicava uma necessária imposição de
frustrações necessárias, o que dificultava o surgimento de sentimentos que acompanham a vida de
qualquer pessoa.
TEMA 4 – A PSICANÁLISE E O PROCESSO DE ENSINO-
APRENDIZAGEM
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Conforme estipulado por Leite (2011), o processo de ensino-aprendizagem dentro de uma visão
psicanalítica envolveria o conceito de transmissão. A autora argumenta que transmitir conhecimento
seria diferente de simplesmente ensinar, pois, quando algum saber é transmitido, o sujeito que o
receberá estará sendo instigado a produzir um saber próprio.
O conceito de transmissão comportaria uma ideia que passa de um indivíduo para o outro
dentro de um campo comum. Ao passar de uma pessoa para outra, a autoria da ideia seria perdida e
se tornaria irrelevante. O indivíduo, por sua vez, após receber a ideia seria o responsável por elaborá-
la por um determinado período de tempo até ser capaz de transformá-la em um conceito; ele
apareceria então com o autor reconhecido de fato (Leite 2011).
Partindo desse conceito, então, é possível afirmar que muito mais importante do que aquilo que
é dito para alguém, ou em outras palavras, do que se ensina para alguém, é o que esse alguém
consegue seapropriar e desenvolver. Portanto, o processo de construção do conhecimento passa por
vias que aquele que ensina ignora (Leite, 2011).
Ao pensar no processo de ensino-aprendizagem estabelecido nas escolas regulares, Leite (2011)
discorre sobre dificuldades de impor um modelo psicanalítico de transmissão do conhecimento, visto
que a psicanálise só pode ser transmitida por psicanalistas e que a maioria dos professores nunca
passou por um processo de análise própria. Contudo, ela considera que aqueles que possuem
disposição para se aventurar nessa área devem estar cientes daquilo que lhes falta.
Um professor que passa a reconhecer os limites impostos pela psicanálise passa a ser capaz de
permitir à criança elaborar um estilo individual a partir de seu próprio desejo. Esse professor, ao
ensinar, passa a transmitir seu estilo particular de aquisição e elaboração de conhecimento e o aluno,
ao observar essas características, constrói seu estilo individual. Isso implica que, por mais que o
processo de ensino-aprendizagem ocorra de determinada maneira, cada indivíduo sujeito tem sua
maneira pessoal de lidar com ele e empregá-lo, pois dada ação sofre a influência das experiências
pessoais, de maneira que não torna possível replicar perfeitamente o estilo de outra pessoa (Leite,
2011).
Acerca da temática da aprendizagem, especificamente, não é possível encontrar nenhum texto
escrito por Freud. A psicanálise a qual nos referimos aqui considera a educação como uma ação que
participa da constituição do sujeito. Educar é, dessa perspectiva, possibilitar que o sujeito possa
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acessar, pelo menos em parte, saberes que o antecedem e que possa também ela ser capaz de se
inserir nas relações humanas (Fonseca, 2017).
No entanto, como Freud tinha uma posição individual frente ao conhecimento, o fundador da
psicanálise se questionava sobre quais seriam os mecanismos psíquicos envolvidos para levar alguém
a ser um desejante de saber. Investigando esses mecanismos, Freud culmina em um momento
decisivo do desenvolvimento de todo o ser humano: as descobertas da diferença sexual anatômica.
Se antes as crianças acreditavam que todas eram detentoras do mesmo órgão sexual, agora passam a
compreender que o mundo é dividido desencadeando um processo de angústia.
A criança descobre diferenças que a angustiam. É essa angústia que a faz querer saber. Só que a
abordagem direta é difícil, justamente porque envolve angústia. Os instrumentos de que a criança
pode dispor são o que Freud chamou de investigações sexuais infantis”. Essas investigações são
sexuais, mas não claramente sexuais. (Kupfer, p. 80, 1989)
Isto posto, Pedroza (2010) estabelece uma relação de longa data entre psicanálise e educação,
recuperando um interesse que Freud demonstrou pela pedagogia no intuito de proporcionar melhor
compreensão por parte dos educadores sobre o desenvolvimento da criança e do adolescente.
Os educadores, de acordo com o autor, são aptos a exercerem grande influência sobre as
crianças, pois elas estão investidas na relação afetiva que originariamente era dirigida ao pai. Os
sentimentos de admiração e de respeito são transferidos do pai para o professor. Isso significa dizer
que a aprendizagem não está focada somente nos conteúdos, mas, sobretudo, na questão que se
impõe entre professor e aluno, e isso pode estimular ou não o aprendizado, independentemente dos
conteúdos ministrados.
Um conceito fundamental a ser trabalhado quando se quer compreender o processo de ensino e
aprendizagem dentro dos moldes psicanalíticos é o conceito de transferência. A primeira vez que
Freud mencionou esse conceito foi com relação aos sonhos. Para ele, alguns acontecimentos do dia,
o que ele chamou de restos diurnos, eram transferidos para o sonho e modificados pelo trabalho do
próprio sonho (Kupfer, 1989).
Algum tempo depois Freud passou a perceber que esse processo de transferência que acontecia
nos sonhos também estava ocorrendo dentro do setting terapêutico entre analista e analisando. O
analista funcionaria para o analisando da mesma maneira que os restos diurnos funcionariam para o
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sonho, pois este transferiria para ele imagens que se relacionavam com experiências passadas do
paciente com outras pessoas (Kupfer, 1989).
Revelada no campo específico da relação médico-paciente, Freud se deu conta da constância com
que a transferência também ocorria nas diferentes relações estabelecidas pelas pessoas no decorrer
de suas vidas. Entendida como “a repetição de protótipos infantis vivida com uma sensação de
atualidade acentuada”, nada impede que a transferência se dirija ao analista ou a qualquer outra
pessoa. Freud chega a afirmar que ela está presente também na relação professor-aluno. Para ele,
trata-se de um fenômeno que permeia qualquer relação humana. É isso o que nos autoriza a
substituir a expressão “relação analista-paciente” pela expressão “relação professor-aluno”. (Kupfer,
p. 88, 1989)
Na relação pedagógica, a transferência faz com que o aluno se volte para a figura do professor e
este é para seus alunos aquele que saberá como ensiná-los. O conceito de transferência na relação
entre professor e aluno se faz fundamental para a compreensão do processo de ensino e
aprendizagem (Ribeiro, 2014).
Para Ribeiro (2014), o mecanismo transferencial é antes de mais nada o transferir sentidos e
representações, que no contexto educacional escolar ganha vida na relação estabelecida entre
professores e alunos. Os alunos repetiriam no tempo presente na escola impulsos e fantasias que
marcaram seus primeiros anos de vida, partindo das relações desse período com seus pais e irmãos
que foram decisórias à sua constituição como sujeito. No ambiente escolar, portanto, o professor,
conforme um analista e independentemente de sua vontade, pode provocar afetos em seus alunos
para além daquilo a que ele próprio tem noção conscientemente. E o mesmo pode acontecer ao
professor por parte do aluno.
Partindo desse raciocínio e analisando agora o professor como figura de autoridade para com
seus alunos, é possível perceber que essa autoridade não é exatamente imposta pelo professor, mas,
na verdade, são os próprios alunos que a conferem a ele.
Podemos observar, então, que o conceito de transferência traz de arrasto a questão do poder e
autoridade que são investidos no professor a partir do aluno, e também a de desejo tanto do aluno
quanto do professor. Somente se o professor ocupar esse lugar de saber que sua palavra terá
poder suficiente para ser ouvida pelo aluno como algo que anime seu interesse. Não adiantam as
técnicas pedagógicas mais atuais, o aparato tecnológico mais moderno se esse pequeno detalhe
não estiver em jogo. Da educação infantil à universidade, a transferência torna-se a mola
propulsora do processo ensino-aprendizagem. (Mariotto, p. 38, 2017)
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Para Fonseca (2017), o encontro da psicanálise com a educação proporcionaria uma
oportunidade de os indivíduos se aperceberem de que não existe apenas uma pessoa que seria
detentora de todo o saber. Para ele, apesar de Freud afirmar que a educação deve inibir, proibir e
suprimir, deve ser encontrado um ponto de encontro favorável para a educação, para que ela possa
realizar o máximo e prejudicar o mínimo.
TEMA 5 – CLÍNICA PSICANALÍTICA NO BRASIL
O Brasil foi primeiro país latino-americano a implementar o freudismo. O país recebeu a
psicanálise progressivamente desde o início do século XX, principalmente nos estados do Rio de
Janeiro e da Bahia. Contudo, o nascimento oficial da psicanálise brasileira é definido a partir da
chegada dos psicanalistas reconhecidos pela Associação Psicanalítica Internacional (IPA, na sigla em
inglês) mais para meados do século. Esses psicanalistas ficaram encarregados da transmissãoe
divulgação das ideias freudianas aos candidatos brasileiros que concorriam ao título de psicanalista,
fundando as primeiras sociedades ditas oficiais de psicanálise no Brasil (Torquato, 2015)
Reynaldo Lobo, ao discutir o contexto histórico que marca a chegada da psicanálise no Brasil,
apresenta um cenário de grandes transformações políticas, sociais, econômicas e culturais:
O final da primeira guerra trouxe, portanto, um quadro histórico absolutamente diferente em vários
níveis de atividade social e humana: a industrialização se acelerou, ainda que não em graus e em
qualidade tecnológica só conhecidos após a Segunda Guerra Mundial; a legitimidade do sistema
político, dominado pelos partidos republicanos (PRS) dos latifundiários cafeeiros e criadores, foi
questionada; uma profunda alteração cultural e ideológica ocorreu entre as elites intelectuais. Um
paradoxo do período foi a combinação de racionalismo crescente e voraz importação de novos
modelos e novas ideias, vindas sobretudo da Europa. Os mais esclarecidos queriam saber de tudo o
que se passava lá fora, “não para copiar”, mas para “entender a realidade nacional”. O advento da
psicanálise foi um dos efeitos secundários desta mutação nacional: a modernização burguesa
propiciou o aparecimento de projetos iluministas, como a criação da USP, no início dos anos 30, e
mesmo a chegada “das coisas freudiana”, como disse Mário de Andrade. (Lobo, p. 50, 1994)
Assim, podemos concluir que a chegada da psicanálise em terras brasileiras encontrou um
momento histórico de grandes conflitos e mudanças de perspectivas, e que por isso o discurso
psicanalítico foi capaz de incorporar diferentes grupos, mas que possuíam em comum o objetivo de
estabelecer projetos de nação e nacionalidade, ainda que tais projetos fossem diferentes entre si
(Torquato, 2014).
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Duas categorias se destacaram na difusão do saber psicanalítico: médicos e psiquiatras das
cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro. Desde as décadas iniciais do século XX, as ideias freudianas
foram recebidas por essas categorias como uma novidade científica e assim foram rapidamente
sendo transformadas em teorias de grande interesse do setor acadêmico da sociedade, convertendo-
se em temática de teses e discussões nas faculdades de medicina. Além disso, a psicanálise começa a
ser referenciada em várias conferências nas sociedades de medicina e educação nesse período, mas,
essas categorias não foram as únicas responsáveis pela propagação da psicanálise:
No entanto, não é da via psiquiátrica a primazia na expansão da psicanálise em São Paulo: foi
também graças à grande difusão no meio intelectual e, sobretudo, literário, que as ideias freudianas
ganharam corpo no país. Ao visitarmos as produções artísticas e literárias produzidas durante o
período em questão, podemos perceber que o pensamento psicanalítico já circulava entre os salões
intelectuais brasileiros desde a década de 1910. Além dos psiquiatras que se informavam das teorias
freudianas por meio de artigos de revistas especializadas, alguns viajantes – como o próprio
modernista Oswald de Andrade – tiveram contato com a Paris moderna e traziam as propostas
freudianas, ainda que a partir de uma leitura de Freud contaminada pelas vanguardas europeias
(Torquato, p. 12, 2014).
No que concerne mais especificamente ao campo da psiquiatria, devemos ressaltar que desde
meados do século XIX uma política higienista referente à saúde mental da população estava sendo
adotada. Essa política objetivava com enclausurar e corrigir a loucura e durante esse período
histórico, a divulgação e os estudos das teses freudianas acabavam se limitando a interpretações que
a destinavam a uma posição de instrumento diagnóstico, terapêutico e moral. Nessa época, para ser
considerado um psicanalista bastava demonstrar algum interesse acerca de temáticas que se
relacionavam com o desenvolvimento da sexualidade humana (Torquato, 2014).
No Quadro 4, a seguir, estão elencados os principais marcos históricos da implementação da
psicanálise no Brasil durante o final do século XX e a primeira metade do século XXI.
Quadro 4 – Marcos históricos da psicanálise no Brasil
Ano Acontecimentos
1899 Juliano Moreira, professor catedrático na faculdade de medicina de salvador, foi o primeiro brasileiro a citar,
em conferência, artigos científicos de Freud (Salim, 2010).
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1914 Genserico de Souza Pinto, médico cearense, defendeu a primeira tese psicanalítica intitulada Psicanálise – a
Sexualidade nas Neuroses (Salim, 2010).
1919 Franco da Rocha, professor de neurologia e psiquiatria da faculdade de medicina de São Paulo, considerado o
precursor da psicanálise no Brasil, deu sua aula inaugural com base na psicanálise em um assunto psiquiátrico
que foi transformado em artigo de jornal publicado no o Estado de São Paulo, com o título Sob o Delírio em
Geral (Salim, 2010).
1924 Durval Bellegarde Marcondes, psiquiatra, introduziu as ideias da psicanálise na atividade clínica brasileira
(Salim, 2010).
1927/1928 Fundação da Sociedade Brasileira de Psicanálise, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Primeiro número da Revista
Brasileira de Psychanalyse (Salim, 2010).
1936 Dra. Adelheid Koch (1896-1980), primeira psicanalista com formação reconhecida pela IPA a atuar na América
Latina e a exercer a análise didática veio ao Brasil (Salim, 2010).
1944 A Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo renasceu como Grupo Psicanalítico de São Paulo (Salim,
2010).
1948 Mark Burke, membro da Sociedade Britânica de Psicanálise, vem morar no Rio de Janeiro (Salim, 2010).
1949 O psicanalista alemão Werner Kemper vem morar no Rio de Janeiro para formar candidatos em psicanálise
(Salim, 2010).
1951 -
1969
Fase da institucionalização do movimento nos moldes da IPA com a criação dos organismos de formação e
prática em São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre (Oliveira, 2002).
Fonte: Simão, 2020.
A partir dos anos de 1970, começa a ocorrer a expansão da psicanálise para outras regiões do
país além dos polos já citados. Essa expansão proporcionou nascimento de outras escolas e
tendências e a emergência das diferentes psicoterapias (Oliveira, 2002).
Na década seguinte, nos anos de 1980, o que marcou significativamente a psicanálise brasileira
foi sem sombra de dúvidas a introdução de modo mais acentuado da escola psicanalítica lacaniana,
que resultou, nos anos de 1990, em uma mudança na configuração psicanalítica no país, uma vez que
diversos egressos do movimento lacaniano permaneceram ou vieram a se engajar nas sociedades
ligadas à IPA, passando a criticar seu funcionamento (Celes, 2010).
Como as críticas estavam vindo do próprio interior das sociedades, muitas de suas estruturas
sofreram modificações e hoje é possível encontrar diversidade e flexibilidade em aspectos que eram
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muito formais e mesmo essenciais à formação anteriormente considerada muito rígida. Em
sequência, as associações lacanianas e as vinculadas à IPA multiplicaram-se devido a
desentendimentos internos teóricos, políticos e até mesmo éticos (Celes, 2010).
As sociedades psicanalíticas atuantes no Brasil hoje são diversas e, por isso, há alguns
desencontros no que concerne à formação do psicanalista brasileiro. Entretanto, de acordo com a
Federação Brasileira de Psicanálise, essa formação se orienta conforme os moldes estipulados em sua
criação baseando-se em três atividades complementares e indissociáveis: a análise pessoal conduzida
por colega comprovadamente experiente e competente, o analista didata; o estudo da teoria durante
quatro anos de seminários e grupos de estudos, num total aproximado de 960 horas, e a prática
clínica supervisionada, durante 200 a 300 horas, em média (Febrapsi, 2019).
50 anos depois de ter a primeira sociedadereconhecida pela IPA, a psicanálise brasileira passa a
fazer parte dos países do primeiro escalão no que se refere à cena freudiana mundial. De acordo com
Wilson Amendoeira, presidente da Associação Brasileira de Psicanálise, que tem sua sede no Rio de
Janeiro, o país tem hoje o dobro de analistas que a Inglaterra, principal centro da psicanálise desde
que Freud foi obrigado a se mudar para lá em 1939. Contando apenas os credenciados pela IPA,
existem 980 psicanalistas no Brasil, contra 442 nas ilhas britânicas (Singer, 2000).
Apesar de a história da psicanálise do país ter mais de um século de história, ela não está
elencada no rol de profissões regulamentados pela Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). Em
função disso, hoje tramitam no Senado Federal dois projetos de lei que almejam essa
regulamentação do ofício da psicanálise. São eles: o PLS 174/2017, que regulamenta o exercício da
profissão de terapeuta naturista e inclui o psicanalista nessa classificação, e o PLS 101/2018, que
regulamenta a profissão de psicanalista (Febrapsi, 2019).
NA PRÁTICA
Com base no conhecimento adquirido e levando em consideração as ideias sobre a psicanálise
apresentadas nesta aula, elabore um quadro com a síntese sobre o Transtorno do Espectro Autista e
o movimento psicanalítico, descrevendo, segundo seu entendimento, as principais características.
FINALIZANDO
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Nesta aula, estudamos o transtorno do espectro autista e o movimento psicanalítico, bem como
a contribuição da psicanálise para o processo de ensino-aprendizagem. Compreendemos como
Bruno Bettelheim, Winnicott e outro autores kleinianos e pós-kleinianos colaboraram com pesquisas
em torno do tema sobre o comportamento humano e como isso reflete até hoje no trabalho com o
autismo.
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