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- -1 COMPORTAMENTO E SOCIEDADE ANTROPOLOGIA E AS FORMAS DE DESCRIÇÃO E INTERPRETAÇÃO DA SOCIEDADE Flávia Cristina Soares - -2 Olá! Você está na unidade Conheça aAntropologia e as formas de descrição e interpretação da sociedade. contextualização dos métodos e das práticas etnográficas, além do conceito da ciência antropológica. É de fundamental importância a compreensão dos objetivos e métodos da antropologia aplicados a construção sociocultural. A partir dos escritos de Talcott Parsons e Max Weber, autores clássicos da fundação da sociologia enquanto ciência, conheça e discuta sobre o conceito de comportamento, para subsidiar a discussão final sobre a ideia de corpo como produto social e a perspectiva antropológica sobre doenças. Conheça também o encontro de conceitos entre antropologia e psiquiatria que nos conduz a chamada etnopsiquiatria. Bons estudos! - -3 1 O Antropólogo e as Práticas Etnográficas Pode-se dizer que os e as são as observadas métodos práticas etnográficas experiências sistematicamente pelo de uma área designada como , ou seja, a ciência antropológica. Para o melhorpesquisador Antropologia entendimento do estudante, a é conhecida pelo estudo do ou da .Antropologia ser humano humanidade Diante disso, esse tópico descreverá o , a e a importância doexercício do antropólogo prática etnográfica pesquisador Clifford James .Geertz Assista aí https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2 /acaec951c8cede529d26de5bda2195b7 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/acaec951c8cede529d26de5bda2195b7 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/acaec951c8cede529d26de5bda2195b7 - -4 1.1 Breve Introdução à Antropologia Em suas raízes, a antropologia tal qual a conhecemos nos dias atuais tem vínculos profundos com a tradição metodológica e teórica francesa, especialmente, a Escola Sociológica liderada por Émile Durkheim e Marcel Mauss. Ambos teóricos destacaram que o da somente é possível a partir de entendimento realidade social (ou conceitos) pré-existentes. Isto é, eles construíram as bases teóricas da antropologia francesa emcategorias um diálogo com a filosofia neokantiana e com os filósofos empiristas. Nesse sentido, Lévi-Strauss sintetiza essas bases teóricas a partir do pressuposto de que “os símbolos são mais reais que aquilo que simbolizam” (Lévi- Strauss, 2003, p. 29). Este argumento destaca que o foco da e de sua prática consiste no antropologia método direcionado às , ou seja, a associação dos (ou informações obtidasetnográfico relações simbólicas dados durante a pesquisa de campo) com os daquela cultura, uma vez que a interpretação antropológicasignificados só se torna possível a partir da percepção destes dois aspectos em conjunto. • Antropologia A surge com o objetivo de pesquisar as sociedades , distintas do meio social do antropologia tribais cientista ou pesquisador. Atualmente, essa disciplina expandiu suas possibilidades de atuação e seus universos de pesquisa, sendo possível aplicar os para e métodos antropológicos interpretação de e . Vale ressaltar que o pesquisador compreensão todo tipo de sociedade formas de vida humana pode ou não fazer parte do grupo que deseja analisar, dado que é possível ao antropólogo estabelecer o distanciamento ou evidenciar sua presença na análise através de métodos etnográficos. • Prática Etnográfica A surge com o propósito de descrever e dar sentido às mais diversas formas de prática etnográfica vida. Tal prática possui suas próprias indagações e fronteiras em função da limitação do pesquisador em descrever as categorias suficientes que possam exprimir as vivências de determinados grupos do qual nunca experienciou. Dessa forma, ressalta-se que há um constante risco de representar e especificar as práticas etnográficas de maneira estereotipada e distorcida. • Fazer Etnográfico O possui uma dimensão , uma vez que serão observados e fazer etnográfico interpretativa símbolos das quais demandam imersão no contexto social para melhor compreensão daquele categorias nativas grupo, sociedade e/ou cultura. É importante salientar que o antropólogo deve exercitar a relativização das categorias pré-concebidas e as pressuposições culturais por parte do pesquisador, dado que deve-se colocar em perspectiva e refletir criticamente sobre como seu ponto de partida pode interferir no entendimento da cultura nativa. • • • - -5 Figura 1 - O antropólogo e as práticas etnográficas Fonte: Microgen, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Na imagem, pode-se observar uma antropóloga escavando o solo com o objetivo de encontrar restos mortais para interpretar a cultura de sociedades antigas. Assista aí https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2 /5f00e9c6107c78123a8915893a95f260 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/5f00e9c6107c78123a8915893a95f260 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/5f00e9c6107c78123a8915893a95f260 - -6 1.2 Clifford James Geertz: um dos antropólogos mais influentes dos Estados Unidos Clifford James foi considerado um dos antropólogos mais influentes dos Estados Unidos, dedicando osGeertz seus estudos às questões do posicionamento interpretativo do pesquisador em campo. Para exemplificar melhor, o exercício do pesquisador deve a sua em um dado grupo, sociedade ou cultura atravésdescrever experiência da sua perspectiva, captando as diferenças de significado dos fenômenos sociais, buscando o “ponto de vista ” (GEERTZ,1997). Assim sendo, para entender essa perspectiva, não é preciso viver ou morar comdos nativos eles, mas procurar conversar e se situar com a finalidade de captar o sentido das ações sociais que são compartilhados entre os indivíduos. Deste modo, o etnógrafo “deve atentar-se para o comportamento e, com exatidão, pois é através do fluxo do comportamento – ou mais precisamente, da ação social – que as formas culturais encontram articulação” (GEERTZ, 2008, p.27). Em um artigo clássico escrito por Clifford James Geertz (2008) intitulado “Descrição densa: rumo a uma teoria descritiva da cultura”, o autor afirma sobre a impossibilidade de entendermos uma cultura caso se adote uma atitude de registrar os fatos de forma isolada.Para ele, cabe ao antropólogo, de maneira dramaticamente diversa, os , tentando interpretar fenômenos o que eles para a comunidade em questão. A apreender significam título de ilustração da construção teórica de Geertz, vejamos o exemplo apresentado pelo autor ao se referir a “piscadela” de olhos de dois meninos: Num deles, esse é um tique involuntário; no outro é uma piscadela conspiratória a um amigo. Como movimentos, os dois são idênticos; observando os dois sozinhos, numa observação “fenomenalista”, Fique de olho Para saber mais sobre , veja o documentário “Filosofia Ressignificações daAntropologia Realidade” . Além disso, lei o artigo “Tão longe, tão perto: sociologia & antropologia no limiar de uma década”. - -7 ninguém poderia dizer qual delas seria um tique nervoso ou uma piscadela ou, na verdade, se ambas eram piscadelas ou tiques nervosos. No entanto, embora não retratável, a diferença entre um tique nervoso e uma piscadela é grande [...]. (GEERTZ, 2008, p. 16). Conforme podemos observar no trecho de Geertz (2008) e no vídeo indicado, a pessoa que pisca o olho está se comunicando, geralmente de forma especial e transmitindo uma mensagem especifica e dentro de uma codificação socialmente estabelecida. A partir desse exemplo, podemos entender como uma partícula (até mesmo um ato de menos de um segundo) é um sinal de cultura através de um gesto. A partir desse exemplo, podemos verificar a diferença entre “ ” e “ ” (um sinal intencional),comportamento gesto traçada por Geertz (2008). Cabe aqui entender que a construção teóricade Geertz nos traz ao ponto que as formas culturais podem ser lidas através de milhões de sinais intencionais. A partir desse ponto, uma cultura será lida como um texto, ao qual o etnógrafo faz a redação e depois irá interpretar os significados e sentidos. A interpretação antropológica será tão rica e complexa quanto forem as nuances de significados absorvidos da cultura analisada. Fique de olho Para uma ilustração dos diferentes tipos de “piscadela”, veja o vídeo: “A piscadela de Geertz”, disponível em: <http://estudoscomplementares.blogspot.com/2013/09/antropologia-ii- piscadela-de-geertz.html>. Acesso em: 26 abr. 2020. - -8 2 Religião e Sociedade Este tópico descreve a religião a partir dos estudos sociológicos, um aspecto de fundamental importância para o entendimento em relação à concepção e definição deste fenômeno. - -9 2.1 Religião: breve contextualização A corrente sociológica conhecida como “Sociologia da Religião” possui como principal objetivo e observar os fatos empíricos para e as . Assimdescrever entender interpretar relações entre a religião e a sociedade sendo, tomemos como referência o conceito de religião que possui origem no latim " " usado na vulgata,religio que significa "prestar culto a uma divindade", “ligar novamente", ou simplesmente "religar". Diante disso, a religião pode ser definida como um conjunto de relacionadas com aquilo que parte da humanidadecrenças considera como extra natural, sobrenatural, divino, sagrado ou mesmo transcendental. Além disso, os estudos sobre a religião também focam nos conjuntos de e que derivam dessas crenças.rituais códigos morais Cabe salientar que a palavra religião e todos os seus significados, dizem respeito a uma tradição Europeia, ligada a práticas do e principalmente. Em outras civilizações, o conceito não existia até acristianismo judaísmo, aplicação do mesmo de acordo com os critérios europeus. Por exemplo, o antigo, não era entendidohinduísmo como uma religião e sim como uma “ ”, uma palavra que diz respeito a harmonia entre os seres humanosrita interligados a ordem cósmica do mundo. Assim, ler a cultura como um texto e as variantes nos ajudam a compreender diversos fenômenos como processos de colonização. O termo “rita” usado no hinduísmo antigo, antes de ser substituído por religião, foi adequado também ao termo (lei divina e eterna), que também édharma utilizado para designar o budismo. Figura 2 - Nossa Senhora Aparecida – padroeira do Brasil e símbolo da Igreja Católica Fonte: Sidney de Almeida, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Na imagem, pode-se observar a estátua da Nossa Senhora Aparecida – padroeira do Brasil e símbolo da Igreja Católica. - -10 O conceito e a ideia de “ ” relacionava-se com o que Joseph Campbell (1990) chamou de primeirasrita manifestações humana de um sentimento religioso. Estima-se que essa manifestação se deu nos períodos Paleolítico e Neolítico, e que designava um vínculo entre os povos, a Terra e a Natureza, adorando aos ciclos e a fertilidade. Nesse sentido, Campbell (1990) aponta que a adoração à Deusa mãe, à Mãe Terra ou Mãe Cósmica é a primeira forma identificada na história da humanidade do que que hoje chamamos de religião. 2.2 Religião: definição A definição de religião pode ser verificada em muitas crenças e filosofias diferentes. As diversas manifestações religiosas do mundo são de fato muito diferentes entre si. Entre os padrões perceptíveis é possível estabelecer uma característica em comum entre todas elas, uma vez que toda possui um religião sistema de crenças no , geralmente envolvendo ou . A estrutura das religiões se dá em torno desobrenatural divindades deuses grandes narrativas, que explicam o começo do mundo ou que justificam a sua existência. O exemplo mais comum é a narrativa do Génesis na tradição judaico cristã ocidental. Ainda entre os padrões observáveis nas religiões, é costume que estas tenham sua própria cosmologia, ou seja, sua versão sobre a origem do Universo, da Terra e dos homens, além de uma definição e previsão sobre o que acontecerá após a morte. Max Weber (2004), em seu estudo “Ética protestante e o Espirito do Capitalismo” definiu a religião como um A partir disso, os grupos humanos formulam as suas razões de ser da vida esistema estruturado de símbolos. suas visões do mundo em que vivem, além de que, a organização religiosa conduz a especialização de papéis Mais que um fenômeno individual, as religiões só existem e ganham poder à medida que se tornam sociais. , que focam principalmente em , , e fenômenos sociais valores morais condutas organização social senso de .pertencimento a uma comunidade Fique de olho Para saber mais sobre as , veja o documentário chamado “O nascimento da religião”,religiões disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=rUjKxw60r6E >. Acesso em: 19 abr. 2020. - -11 3 Comportamento Este tópico abordará a perspectiva do formulado por e em seuscomportamento Talcott Parsons Max Weber estudos sociológicos. Espera-se que você possa compreender os conceitos de ambos os autores e, por fim, serão indicados alguns estudos sobre a desenvolvida por .Terapia Cognitivo Comportamental Aaron Beck 3.1 Sociologia e psicologia As , seus e são interesses comuns às , sendo ainterações sociais contextos consequências ciências sociais sociologia responsável por estudar o comportamento humano em relação com os meios sociais, enquanto a estuda os em sua . Cabe a focar nas observações sobre psicologia indivíduos singularidade sociologia padrões que se repetem nas relações sociais e embasar, a partir destas, suas generalizações, mas também atentar-se aos eventos raros. Para a , os fenômenos são compreendidos a partir da construída entre o psicologia subjetividade e o de maneira singular e/ou particular.sujeito mundo exterior Sociologia A Sociologia, como ciência evoluiu, tornando-se a área de estudos responsável pelos aspectos da vida social. Isto possibilitou a apresentação de um “leque” imenso de abordagens sobre comportamento. No entanto, para traçar uma linhagem regular com a discussão anterior, selecionamos um recorte teórico que estabelecerá sua análise desde compreender o funcionamento de estruturas macrossociológicas como o Estado, a classe social ou processos históricos de transformação social (o que chamamos de escala macro de análise), até à questão e estudo do comportamento dos indivíduos num nível microssociológico (o que chamamos de escala micro de análise). Não se deve jamais esquecer-se de que o homem como o conhecemos só existe em sociedade e a sociedade, por sua vez, será determinante na composição da sua identidade social. Sociologia Microssociológica e Psicologia Social Em relação a sociologia microssociológica e psicologia social, elas direcionam seu enfoque aos comportamentos sem levar em consideração as estruturas sociais. A psicologia social se preocupa com as motivações “exteriores”, aquelas que levam o indivíduo a agir de uma forma ou de outra. Já o enfoque da sociologia é na ação dos grupos ou em sociedade. - -12 3.2 Os pensamentos de Max Weber sobre o comportamento Um dos estudos mais referenciados nesse sentido, foi desenvolvido pelo sociólogo clássico . Para oMax Weber autor, a sociologia é uma ciência que procura compreender a . Isto quer dizer que se deve consideraração social o indivíduo e suas ações como ponto chave da investigação, sempre evidenciando o que para o autor a sociologia deve buscar a compreensão e a percepção do que a pessoa atribui à sua .sentido conduta Toda conduta e todo ato em sociedade é definido pelo conceito de . Isto quer dizer que umação social comportamento humano é atribuído pelo indivíduo através da sua conduta com um significado ou sentido próprio. Esse sentido próprio se relaciona com o comportamento de outras pessoas. O principal objetivo de Max Weber ao forjar esse conceito foi compreender o sentido que cada pessoa dá a sua conduta e perceber assim a sua estruturainteligível. Sendo assim, para Weber, comunidade e sociedade coexistem. A é umacomunidade instância que existe no interior da sociedade, como por exemplo, a família (é uma comunidade) que existe dentro da sociedade (brasileira). Max Weber considerava o comportamento do indivíduo e a inteligibilidade de suas ações como ponto chave da investigação evidenciando o que para ele era o ponto de partida para a Sociologia, a compreensão e a percepção do sentido que a pessoa atribui à sua conduta. Fique de olho A possui uma abordagem chamada . EstaPsicologia Terapia Cognitivo Comportamental abordagem foi desenvolvida por . Para saber mais, sugerimos e leitura do artigoAaron Beck intitulado “Contribuições da terapia cognitivo-comportamental para as dificuldades de adaptação acadêmica”. - -13 4 Corpo e Sociedade: práticas culturais Neste tópico, apresentaremos a noção de e as suas relações com as , principalmente, acorpo práticas culturais partir dos estudos antropológicos realizados por . Sendo assim, esperamos que você possaMarcel Mauss compreender como a concepção de corpo é construído socialmente a partir do contexto cultural em que o indivíduo está inserido. - -14 4.1 O conceito de corpo social para Marcel Mauss É importante salientar que a ciência sociológica possui uma parceria de diálogo científico com a antropologia. Sendo assim, o é visto como fonte inesgotável de . Com isso, ressalta-se que os sãocorpo símbolos símbolos considerados de cada ser humano, mas também o de produção e expressão de e patrimônios locus sentidos . Os símbolos e/ou patrimônios são as primeiras aquisições adotadas pelos indivíduos ao nascer,ações sociais uma vez que a família já concebe o nascimento do filho em um contexto dotado de um sistema de significações. Para tanto, estabelecer dualidades e referências para construção do debate é um dos primeiros passos no fazer etnográfico e científico, além de perceber os contrastes e diferenciações, como por exemplo, a entre dicotomia e . Isto possibilita salientar que não somente trazem duas percepções e representaçõescorpo nu corpo vestido antagônicas sobre o corpo, mas também nos propiciam a iniciar uma discussão sobre como as práticas culturais incidem no corpo, principalmente, se considerarmos as formas de distinção e/ou oposição entre e natureza .cultura Para nossa melhor compreensão faremos uma breve imersão teórica, recorrendo ao trabalho do antropólogo Marcel Mauss (1872-1950), sobrinho do sociólogo clássico Émile Durkheim. partilhava deMarcel Mauss algumas ideias do seu tio, principalmente, no que tange à concepção de uma ciência social que dependia de olhar para os com o devido distanciamento, tratando-os objetivamente como , a fim de seremfatos sociais coisas comparados com outros fenômenos próprios da vida em sociedade. Além de perceber os fenômenos, nos estudos de Durkheim e Mauss, os autores trataram como “fatos sociais” o fazer sociológico e os estudos sobre o corpo. Os teóricos tinham a necessidade de dassistematização informações e de uma abordagem que desse conta da análise do homem não como resultado de estados individuais de consciência, nem como fruto de observação da sociedade como um conjunto de hábitos exóticos. A partir dessa necessidade, Mauss (2003) organiza suas reflexões sobre o ser humano, elaborando noções como a de Fato Social Total, Homem Total, Dádiva, Técnicas do Corpo e outras presentes em sua obra. Para tanto, no presente momento, utilizaremos do referencial antropológico de Mauss, as noções de “tradição” e de “hábitos” Fique de olho Para saber mais sobre discussões e conceitos sobre o “corpo” na literatura e sociologia veja o vídeo Michel Foucault “Corpo e Poder”, disponível em: < https://www.youtube.com/watch? v=zILgN1teXSc >. Acesso em: 26 abr. 2020. - -15 para explicar os modos como os indivíduos “fazem usos de seus corpos”. Esse termo foi utilizado por Mauss em “As técnicas do corpo”, ao postular que o corpo é o primeiro e mais importante instrumento do homem. Nesse ponto, Mauss vai além de uma visão utilitarista. A intenção é demonstrar como nossas são técnicas corporais e nossos nada têm de naturais, mas são produzidos por “ ” e repassadas atradicionais gestos normas coletivas partir da cultura adquirida. Em outro texto “O ensaio sobre a Dádiva”, Mauss (2003) lapida esse postulado ao relacionar as formas corporais aos “fatos sociais totais”. Isto implica a compreensão de que, em qualquer realização do ser humano, podem ser encontradas as dimensões , e . Sendo que esta abordagem completa só ésociológica psicológica biológica possível de ser alcançada porque tais dimensões constituem uma unidade “o homem”, e só podem ser observadas a partir da experiência de qualquer indivíduo membro de determinada sociedade, conforme posteriormente Lévi-Strauss (1950) afirma ao comentar sobre a obra de Mauss. Ainda na teoria de Mauss sobre Corpos e Práticas Culturais, outra noção interessante é a “imitação prestigiosa” (MAUSS, 1974). A partir deste conceito o autor discorre sobre o imitar e o aprender gestos de pessoas que se admira ou que de alguma forma se constituem como referências, seja a partir do prestígio social ou outra perspectiva de valor. Essa noção de imitação prestigiosa diz respeito ao que, em tempos modernos, discutimos como o desejo de se enquadrar em determinados padrões, como, por exemplo, ser magro, ser bonito, ser famoso, ser puro, ser habilidoso, ser forte, entre outros. - -16 4.2 Outros estudos sobre o corpo e as práticas culturais Pierre Bourdieu é outro sociólogo que retoma a discussão sobre o corpo e a enriquece ao discutir sobre os usos . Para o autor, nós aprendemos pelo corpo e a partir do corpo (BOURDIIEUdo corpo no cotidiano apud MEDEIROS, 2011, p. 283). A ordem social se inscreve por meio das vivências que temos. (2002, p.Wacquant 118), reforça tal construção teórica ao discutir sobre como interiorizamos uma série de disposições que são ao mesmo tempo mentais e físicas. A partir dessa construção teórica, entendemos que o é nosso meio de corpo , e este processo depende da habituação dos gestos e dos socialização comportamentos. Assim sendo, a prática orienta “escolhas”, que apesar de não serem deliberadas a cada ação, não deixam de ser sistemáticas, uma vez que há um precedente processo de desejo. O destaque para a construção teórica de Mauss (2003) sobre o corpo tem relação com o fato deste ser um precursor nos estudos sociológicos e antropológicos sobre o tema, influenciando diversos autores posteriormente ao destacar sobre como seres humanos diferentes utilizam seu corpo de formas diferenciadas. (Mauss, 1974). Para Mauss, o corpo humano é, ao mesmo tempo, “matéria-prima” e “ferramenta” da cultura Assim, podemos entender que os gestos mais “naturais” são fabricados por normas coletivas, existindo um processo de . As dicotomias sobre estudos do corpo superadas porconstrução social do corpo e dos gestos Mauss são, posteriormente, reforçadas por Bourdieu (2009) e sua ideia de um corpo que é socialmente inscrito, com gostos, desgostos, preferências e outros aspectos. - -17 5 Antropologia e Doença Mental Esta seção apresentará a sobre a , para que possamos compreender deperspectiva antropológica doença forma contextualizada, como o conceito e a ideia de doença foram construídos socialmente pela sociedade. Além disso, é importante ressaltar a concepção de doença mental pela , para que possamos refletiretnopsiquiatria sobre essas questões tão presentes nas sociedades modernas. - -18 5.1 Perspectiva antropológica sobre a doença Sintetizar perspectivas antropológicas sobre um determinado aspecto da vida social sempre será uma reeducação da vastíssima literatura. No entanto, através de um recorte objetivo de algumas perspectivas, podemos verificar que as análises antropológicas sobre o universo sociocultural do doente é uma mudança de paradigmas das práticas terapêuticas. O contexto cultural deixa de servisto como obstáculo maior à efetividade dos programas e práticas terapêuticas e passa a ser entendido como um contexto onde se enraízam as concepções sobre as doenças, as explicações fornecidas e os comportamentos diante destas. Enquanto vertente de estudo, a desenvolveu um robusto conjunto de conceitos e métodos paraantropologia um das maneiras de e de associadas à . A partir das quais éestudo sistemático culturais pensar agir saúde possível examinar as relações (interações e contradições) entre os modelos de prática, entre estes considerando a organização dos serviços, os programas de prevenção, as intervenções terapêuticas e as inserções culturais dos pacientes. As noções vigentes de e , referem-se a fenômenos complexos que conjugam fatores , saúde doença biológicos , , e . A complexidade do fenômeno, carece de análises cada vezsociológicos econômicos ambientais culturais mais complexas que considerem tais fatores em relação, e não apenas discursos sobre a saúde privilegiando diferentes fatores e sugerindo estratégias de intervenção e de pesquisas isoladas. A antropologia, ao debater sobre doenças, aponta os limites e a insuficiência da tecnologia biomédica quando se trata de mudar de forma permanente o estado de saúde de uma população. Ela destaca como o éestado de saúde de uma população associado a e aos universos sociais e culturais.modos de vida Figura 3 - Transtornos mentais Fonte: Cyrsiam, Shutterstock, 2020. - -19 #PraCegoVer: Na imagem, pode-se observar a ilustração de um homem apresentando transtornos mentais, de acordo com a perspectiva psiquiátrica. Tomemos como exemplo a corrente em voga da . Esta estuda a distribuição das doenças (ou deepidemiologia condições relacionadas à saúde) em determinados contextos e em determinadas populações com o objetivo de entender os fatores determinantes dessa distribuição. Nos estudos epidemiológicos, predominam as abordagens sobre os e os que são utilizados. A análise sobre acomportamentos dos indivíduos métodos quantitativos prevalência ou a incidência de uma patologia e as características de indivíduos apresentando ou não essa doença são determinadas a partir dos padrões individuais com o propósito de identificar os perfis de distribuição da patologia e grupos ou fatores de risco. Na , os problemas de saúde são apreendidos emabordagem sociológica sua e não individual.dimensão social Há de modo geral um pressuposto que embasa os programas de saúde de que a informação gera uma transformação automática dos comportamentos das populações frente às doenças. A partir da antropologia da saúde/doença evidenciamos como essa abordagem negligencia os diferentes fatores sociais e culturais que intervêm na adoção desses comportamentos. A doença, ora vista como um problema físico ou mental, ora como biológico ou psicossocial, conduz à fragmentação do objeto de análise, o que por sua vez gera a fragmentação das abordagens. A descontinuidade entre as diferentes abordagens interfere na compreensão domultidimensional objeto. O valor da contribuição da antropologia é exatamente este, ao ressituar nossas premissas básicas, tornando possível uma perspectiva crítica frente as nossas "verdades" mais fundamentais e favorecendo a construção de um novo paradigma para a abordagem da saúde e da doença. A antropologia considera que a saúde e o que se relaciona a ela (conhecimento do risco, ideias sobre prevenção, noções sobre causalidade, ideias sobre tratamentos apropriados, entre outros) são e fenômenos culturalmente construídos culturalmente . A partir disso, podemos entender que doença pertence não só às histórias científicas einterpretados tecnológicas, mas também às , e ligados às . A história culturaltradições práticas saberes estruturas sociais das doenças abre um leque muito fértil às pesquisas, que não se restringem aos saberes eruditos. Assista aí https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2 /be6e2f3cce9e51657ae881f044107a68 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/be6e2f3cce9e51657ae881f044107a68 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/be6e2f3cce9e51657ae881f044107a68 - -20 5.2 Doença mental: etnopsiquiatria O conceito de tem fortes influências na obra de Georges Devereux, o etnólogo e psicanalista. Eleetnopsiquiatria definiu a etnopsiquiatria como a ciência e (DEVEREUX, 1977, p. 350 - 351),pluridisciplinar multidimensional a qual pretende abordar a relação de complementaridade entre o indivíduo, a sociedade e a cultura, tratadas nos tópicos anteriores. As bases desta nova ciência estão relacionadas com questões da inserção cultural e da sublimação. As patologias individuais e socioculturais são objetos de análise dessa corrente científica que pretende identificar situações, fenômenos e patologias a partir do reconhecimento das diferenças humanas e da legitimidade das experiências. A vastidão de horizontes epistemológicos e trajetórias de alteridade é o ponto central da etnopsiquiatria. Os percursos subjetivos de cada pessoa devem ser reconhecidos a partir de sua inserção em uma comunidade. Assim, para a leitura do contexto, é fundamental entender o nível de integração desta comunidade, analisando as tensões sociais existentes, e questionando se há, por exemplo, um momento de transformação em curso. Basicamente, a etnopsiquiatria repensa os encontros clínicos, tratando-os como um compromisso entre e , onde terapeuta paciente o paciente deve ser visto além de seu corpo biológico, mas em função de sua O etnopsiquiatra deve a cada atendimento ir além dainserção sociocultural, história, econômica e política. alteridade e buscar reerguer a casa de acordo com o que é fornecido por seu paciente. Considerando a existência de determinadas invariantes, dentro daquilo que pode ser a doença mental conforme proposto por François Laplantine (1991), e donde estes podem ser compreendidos, é, portanto, um exercício crítico a ser praticado, para não cair num universalismo absoluto, nem num relativismo absoluto. São os riscos gerados pelas aplicações do conceito de cultura e por uma aplicação excessiva dos instrumentos e estratégias metodológicas dos antropólogos e dos psiquiatras que estudam as emoções humanas. Embora existam correntes que Helman (1994) chama de , está é focada no estudo e napsiquiatria transcultural comparação da doença mental nas diferentes culturas. É um dos ramos da antropologia médica e importante fonte para o estudo da natureza da saúde e seus problemas nas diversas regiões do mundo. A etnopsiquiatria Fique de olho Para saber mais, é de fundamental importância que um estudante de psicologia possa adquirir conhecimento através do filme , disponível em: < https://www.“Nise: o coração da loucura” youtube.com/watch?v=bOrymJuwVvI&t=8s >. Acesso em: 20 abr. 2020. - -21 deve manter postura crítica em relação a psiquiatria transcultural, embora a segunda adicione o conceito de “cultura” nas suas investigações e nas suas recorrentes práticas clínicas, a sua aplicação tem sido por vezes arbitrária, acabando por desaguar num falso relativismo acerca das diversas representações de saúde e doença. Foram sendo transportados os vários conceitos produzidos ao longo da sua história para uma configuração da diferença cultural, sem que exista, efetivamente, um cuidado especial na forma de olhar para uma essencial diversidade. Assim, a etnopsiquiatria deve esforçar-se não em catalogar formas de manifestação ou identificação de doenças mentais, e sim encontrar a legitimidade inerente que outras vozes têm sobre o corpo, sobre a dor, sofrimento e respectivas etiologias, sem procurar objetificar qual categoria nosográfica que se colocam. é isso Aí! Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • aprender sobre os métodos e as práticas etnográficas; • compreender o conceito de Antropologia; • assimilar o conceito de religião e sociedade; • entendero conceito de comportamento a partir dos estudos realizados por Talcott Parsons; • compreender o conceito de comportamento a partir dos estudos realizados por Max Weber; • constatar o corpo como um produto social; • conhecer a perspectiva antropológica sobre a doença; • aprender o conceito de etnopsiquiatria. Referências BOTELHO, A.; BRASIL JR., A.; HOELZ, M. Tão longe e tão perto: sociologia & antropologia no limiar de uma década. , Rio de Janeiro, v. 9, n. 3, p. 717-739, Dec. 2019.Sociologia e Antropologia BOURDIEU, P. . São Paulo: Perspectiva, 2009.A economia das trocas simbólicas CAMPBELL, J.; MOYERS, B. . São Paulo: Palas Atena, 1990.O poder do mito DEVEREUX, G. . Paris: Flammarion, 1977.Ethnopsychanalyse complementariste GEERTZ, C. “Do ponto de vista dos nativos": a natureza do entendimento antropológico. In: GEERTZ, C. O saber . Petrópolis: Vozes, 1997. p. 85-107.local: novos ensaios em antropologia interpretativa GEERTZ, C. Uma Descrição Densa: Por Uma Teoria Interpretativa da cultura. In: GEERTZ, C. A. Interpretação das . Rio de Janeiro: Zahar, 2008. culturas p. 13-41. HELMAN, C.G. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.Cultura, saúde e doença . • • • • • • • • - -22 LAPLANTINE, F. São Paulo, Martins Fontes, 1991.Antropologia da Doença . LÉVI-STRAUSS, C. Introdução à obra de Marcel Mauss. In: MAUSS, M. . São Paulo:Sociologia e Antropologia Cosac & Naify, 2003. MAUSS, M. As técnicas corporais. In: MAUSS, M. São Paulo: EPU/EDUSP, 1974.Sociologia e antropologia . MAUSS, M. São Paulo: Cosac & Naify, 2003.Sociologia e antropologia . MEDEIROS, C. C. C. de. 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