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2 Princípios

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PRINCÍPIOS: LIMITES
Muñoz Conde (apud Busato, P. 23, 2015) propõe que “a norma penal não pode ser ‘desconectada de um determinado sistema social’”, sendo que os princípios o indicam. Assim, o princípio da legalidade está associado ao Estado de Direito, o princípio da intervenção mínima ao Estado Social e o princípio da culpabilidade ao Estado Democrático.
Desse modo, eles buscam limitar a limitação da liberdade que o direito penal provoca para garantir a segurança (o que, segundo Busato, não é definido pelo Estado, mas “brota de sua correspondência às aspirações sociais” - BUSATO, P. 22, 2015), além de a ela conferir legitimidade. 
Força irradiadora e constitucionalidade
Segundo o Prof. Ingo Sarlet, a Constituição tem força irradiadora, refletindo seus preceitos aos demais ramos do direito (sendo necessário observar a sua constitucionalidade). São, então, alguns princípios constitucionais que limitam a ação do direito penal:
· Art. 1º, III CF/88 – Dignidade: deve ser considerada a dignidade tanto da vitima quanto do acusado, sendo necessária a igualdade; 
· Art. 3º, IV CF/88 – Preconceitos: é necessário desconsiderar preconceitos ao aplicar uma pena ou assistir uma vitima;
· Art. 4º, II, CF/88 - Direitos humanos: há um controle de convencionalidade que observa se as decisões dos tribunais brasileiros estão de acordo com as convenções internacionais relativas a direitos humanos;
· Art. 5º CF/88: II, III, VIII, X, XI, XII, XXXIX, entre outros.
Um exemplo contrário, onde a legislação infraconstitucional não está de acordo com a Constituição é o CPP de 2008. A Constituição adota um sistema processual acusatório (ao definir a função de cada parte do processo, devendo o juiz julgar e as partes – acusação e defesa – produzirem provas) enquanto o código de processo penal adota sistema inquisitorial devido ao juiz poder produzir provas (art. 156). Mesmo assim a ideia de Sarlete é a adotada no âmbito técnico, sendo comuns diferenças entre a técnica e a prática.
Dimensão positiva e negativa
Os direitos protegidos pela constituição possuem dimensão positiva (exigindo do Estado ações que protejam aquele direito) e negativa (exigindo uma falta de ação do Estado para que não atinja aquele direito).
Princípio de proporcionalidade 
Segundo Sarlete, ele constitui um dos pilares do Estado Democrático de Direito e da correspondente concepção garantista do direito. Realiza a vedação do excesso e da insuficiência na ação do Estado ao efetuar uma punição (nem demais, nem de menos). Ele cita argumentos que defendem essa dupla visão, já que apenas a primeira costuma ser observada:
· Enquanto a proibição de intervenção/excesso controla a legitimidade constitucional de uma intervenção os imperativos de tutela (proibição da insuficiência) observam uma omissão ou ação insuficiente (mesmo que tendo em vista níveis mínimos).
· É diversa a intensidade de vinculação do poder público à proibição da insuficiência ou do excesso, por conta da diferente vinculação entre a defesa e a prestação dos direitos fundamentais, uma vez que no âmbito da proibição de insuficiência é assegurada uma margem significativamente maior aos órgãos estatais, de modo especial ao legislador, que tem, inicialmente, apenas o dever de delinear as medidas protetivas, havendo uma violação apenas quando nenhuma medida é tomada ou as medidas forem inteiramente inadequadas ou ineficazes. Assim o legislador tem maior participação na proibição da insuficiência que do excesso. 
· Enquanto no âmbito da proibição do excesso o requisito da necessidade constitui uma grandeza vinculada a uma determinada e concreta medida legislativa (de modo que seu controle limita-se ao âmbito interno da lei), o âmbito da proibição de insuficiência diz com uma grandeza que transcende o ato legislativo concreto e baseada diretamente em um valor de natureza constitucional.
Este princípio é constituído por três critérios:
a) Adequação/conformidade: viabilidade, idoneidade técnica de alcançar um fim, se aquele meio vai mesmo atingir aquele fim, pois a execução de um fim em detrimento de outro mais adequado ou eficaz pode estar motivada por interesses pessoais;
b) Necessidade/exigibilidade: se não há um meio menos agressivo para atingir o mesmo fim;
c) Equilíbrio entre meios e fins/proporcionalidade em sentido estrito: se há um equilíbrio entre o meio e o fim, se a agressividade do meio é proporcional à importância do fim.
Pode ser representado pelo balanço entre o número mínimo e máximo de “tempo” de prisão. 
Princípio da legalidade.
Prevê a submissão da regra à lei. É o maior condicionante penal, sua pedra angular, uma reserva absoluta ou geral, sendo geralmente afastado por regimes totalitários. 
Tem como base a CF/88, em seu art. 5º, XXXIX e o CP em seu Art. 1º: “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Confere segurança jurídica, expõe a necessidade de se prever as condutas criminais e suas respectivas penas. 
Condiciona o direito penal à lei em sentido formal, ou seja, proposta, analisada e aprovada exclusivamente pelo legislativo (ordinária e complementar), descrita pelo art. 22, I, CF/88: “Compete privativamente à União legislar sobre: direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho.” O mesmo artigo, porém, prevê eventual permissão para que os estados legislem sobre questões exclusivas à união quando autorizados por lei complementar.
Busato aponta o caráter político, além do jurídico, deste princípio, por representar a predominância do poder legislativo frente aos demais, como representante da vontade popular. Assim, pode também ser fundamentado na separação dos poderes.
Consequências
Com relação à lei, Busato aponta três questões que surgem como consequência dele:
a) Reserva absoluta da lei: ela pode ser entendida com relação à lei em sentido amplo (norma escrita, incluindo decretos e outros) e estrito (exclusivamente vinda do legislativo). Em ambos os sentidos, porém, observamos duas consequências:
· Costume e analogia não tem força para criar norma penal devido também à diversidade de costumes encontrados em contraste com a centralização do direito (exceções são apenas indígenas isolados, não integrados à cultura brasileira). Parte da doutrina aponta, porém, que o costume poderia revogar norma penal, em sentido formal (revoga a lei) ou material (apenas a faz perder a eficácia). 
· Vedação à analogia se refere apenas ao seu uso “in malan partem” (para prejudicar o réu). Isto pois estas fontes poderiam formular o que Busato chama de causas de justificação: situações que ao contrario de definir como criminal uma conduta assim aparente servem para justificar sua prática (como a legítima defesa);
b) Lei anterior ao fato (salvo para beneficiar o réu), irretroativa, de acordo com a CF/88 em seu art. 5º, XL. Segundo Busato, isto se dá pois a norma constitui o reconhecimento de uma condute desvalorada socialmente, de modo que a conduta precisa ser anterior à norma, além de ser necessário para que possa exercer seu caráter preventivo.
c) Comando de determinação: É necessário lembrar que isto não se aplica apenas ao legislador, mas também ao juiz na pronúncia de sua sentença. 
· O legislador precisa legislar de maneira clara e precisa (a lei precisa ser clara e certa), sendo que os problemas de incerteza não se referem apenas aos enunciados legais, mas também ao significado que carregam, havendo abuso das cláusulas gerais. Além de reais erros técnicos, porém, há a discussão sobre a necessidade de um grau de indeterminação dos preceitos primários (conduta), relativizando o referido princípio e deixando a interpretação a cargo do juiz, como interpretar um termo presente na lei. Por exemplo, a definição do homicídio culposo não traz uma definição de culpa pela impossibilidade de o legislador prever todas as hipóteses nas quais um homicídio seria culposo.
· O juiz deve ser claro em suas sentenças, além de lembrar a vedação à analogia in mala parten. Ressalta Busato também a necessidade de sedistinguir a analogia/interpretação analógica da interpretação extensiva, pois enquanto esta última “importa na aplicação da lei de um fato situado além de seu alcance literal, mas sem estar fora do espírito ou sentido da mesma, na analogia, estende-se a aplicação da lei a um caso similar ao legislado, mas não compreendido em seu texto.” Desse modo a vedação que se dá não se refere à interpretação extensiva.
Ou com relação ao sujeito, sendo as garantias individuais apontadas por Busato como derivadas desse princípio: criminal (não podem haver crimes que não os previstos), penal (não podem haver penas que não as previstas), jurisdicional (não pode haver sanção se não com base em sentença proferida por juiz ou Tribunal com competência prevista, seguindo previsto processo) e de execução (a pena deve ser executada da maneira prevista).
Origem histórica
Tem sua origem histórica nas ideias iluministas sendo acolhido por Beccaria em Dos Delitos e das Penas (1764). Mas sua consagração foi dada pelo alemão Feuerbach como: “nullum crimen, nulla poena sine lege”, ou seja, nulo o crime, nula a pena sem lei. Apesar de hoje estar vinculado ao referido princípio, entretanto, a frase inicialmente representava a necessidade de previsão da pena pela lei para que a lei pudesse ser conhecida e, logo, o sujeito fosse motivado a segui-la pela coação psicológica. 
Princípio da intervenção mínima
Prevê o uso mínimo do direito penal, o controle mais agressivo, apenas em último caso, em “última ratio”, quando os demais controles do direito (formais) e mesmo outros controles sociais (informais - compondo uma escala de controle, do familiar, religioso e escolar até o penal) não forem suficientes e tendo sido examinadas as causas para essa insuficiência, bem como ocorrida a tentativa de solucioná-las. Além disso, o desenvolvimento das ciências sociais evidencia que a mera severidade teórica da pena não previne o delito, mas sua eficácia.
Este principio impõe a subsidiariedade e a fragmentariedade do direito penal:
Subsidiariedade
Condiciona a aplicação do direito penal aos casos em que os demais ramos do direito não são suficientes, agindo como subsidiário.
Fragmentariadade
O conceito de bem jurídico que limita a atuação do direito penal é considerado por muitos demasiado impreciso buscando fixa-lo como aqueles definidos pela Constituição. Entretanto, Busato relembra a existência de constituições totalitárias que definem como bem comum a ser protegido a vontade do ditador e a observação de garantias fundamentais da constituição que não são protegidas pelo direito penal, como a liberdade de culto. 
Assim é possível dizer que não são todos os bens jurídicos que recebem proteção penal, mas apenas os mais essenciais.
Segundo Muñoz Conde (apud Busato, P. 58, 2015) “este caráter fragmentário do Direito penal aparece em uma tripla forma [...] defendendo o bem jurídico só contra ataques de especial gravidade, tipificando só uma parte do que nos demais ramos do ordenamento jurídico se estima como antijurídico e deixando sem castigo, em princípio, as ações meramente imorais”.
Conclui Busato ser a fragmentaridade “essa seleção de bens jurídicos e de níveis de gravidade de ataque”. (BUSATO, P. 59, 2015)
Busato também lembra a atual proteção aos bens coletivos, metaindividuais, como o meio ambiente. Ressalta, porém, que assim como quando se trata dos demais, é necessário que ocorra uma agressão a um bem jurídico coletivo fundamental para o desenvolvimento individual para que haja a intervenção penal de modo a não sobrepor os interesses coletivos em detrimento dos individuais.
Princípio da insignificância
Segundo ele, apesar de uma conduta ser descrita pela lei como criminosa, ela não ofende o bem jurídico, de modo a não ser possível punir o sujeito (uma vez que o objetivo é a proteção do bem jurídico).
Princípio da culpabilidade
O termo “culpabilidade” pode ser entendido como princípio, elemento do crime e critério para fixação da pena. Busato aponta que os dois últimos derivam do princípio da culpabilidade, pois funcionam como garantia contra os excessos da responsabilidade objetiva e como exigência que se soma à relação de causalidade para reconhecer a possibilidade de impor pena.
Como princípio, é entendida como vedação à atribuição da responsabilidade objetiva, na qual não é necessária a intenção de causar prejuízo ou a aceitação do risco. Assim não basta apenas o resultado (naturalístico/visível – como o homicídio ou jurídico/não visível – como um crime contra a honra), mas é também um vínculo de vontade ou de aceitação do risco entre ele e o sujeito. Desse modo, os crimes baseados na culpa (sem vínculo de vontade ou aceitação), e não no dolo, são exceções cuja possibilidade de punição precisa ser expressa no texto legal.
Entretanto, historicamente, violações do princípio são encontrados, havendo condenações não pelo que alguém fez, mas pelo que era, sem a exigência de um resultado doloso (um exemplo é o caso dos judeus no contexto da segunda guerra mundial).
Atualmente, ressalta Busato, ele recebe certa crítica, relacionada à impossibilidade ou dificuldade de comprovar que o agente, no caso concreto, poderia ter atuado de outro modo, que seu ato foi fruto de sua vontade. Entretanto, se não é possível demonstrar que o sujeito poderia ter agido de outro modo, tampouco é possível responsabilizá-lo por sua escolha e, se não é possível mensurar as opções que tinha à sua disposição, menos ainda é possível determinar a carga penal que lhe corresponde. O mesmo vale para o caso do ato não ser fruto da vontade, mas de condições pré-determinadas.
Consequências 
1. Responsabilidade pessoal/intranscendência (art. 5°, XLV, da CF – HC 143641 STF): uma vez dependente da vontade (elemento subjetivo) de um sujeito, a responsabilidade penal é pessoal, não vai além, não transcende a pessoa do condenado. 
2. Responsabilidade pelo fato: vedação da punição “pelo que a pessoa é”, constituindo um direito penal do autor, em vez do direito penal do fato, em que a punição é dada “pelo que a pessoa fez”. Apesar de ser o segundo o sistema adotado no Brasil, o primeiro apresenta resquícios como no art. 59 do CP, que prevê a observação da personalidade do sujeito. Busato ressalta que esta consequência exclui, então, a possibilidade de punibilidade do chamado “delito de acumulação: sua punibilidade se justificaria perante o risco que a ausência de repressão e o consequente incentivo a uma atitude repetitiva e cumulativa contra o mesmo bem jurídico”.
3. Presunção de inocência: a pessoa só é dita condenada após o transito em julgado, o esgotamento dos recursos, veda a execução provisória da pena (antes do fim dos recursos). Sobre este tema, podemos apontar uma oscilação jurisprudencial no Brasil:
3.1 De 2009 a 16/02/2016 esse posicionamento era seguido;
3.2 Em 17/02/2016 o STF determinou a possibilidade da execução provisória da pena caso o a condenação seja mantida no primeiro recurso em decorrência da Operação Lava Jato;
3.3 Em setembro de 2017 o Minisro Lewandowski (e não o STF como um todo) vedou esta execução provisória da pena com relação a militares.
HC 137888 – Caso de violência doméstica sem lesão corporal (não deixou vestígios), constituindo então vias de fato (art. 21 do Decreto 3688/41 – recebido pela CF/88). O sujeito foi condenado a 20 dias de prisão simples.

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