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DIREITO MARIANNE PESENTE SOARES PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E SUA APLICABILIDADE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO. Presidente Prudente - SP 2019 DIREITO MARIANNE PESENTE SOARES PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E SUA APLICABILIDADE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO. Trabalho de Conclusão, apresentado a Faculdade de Ciências Jurídicas, Administrativas e Contábeis, Curso de Direito, Universidade do Oeste Paulista, como parte para a sua conclusão. Orientador: Lucas Ferreira Furlan. Presidente Prudente - SP 2019 MARIANNE PESENTE SOARES PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E APLICABILIDADE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO Trabalho de Conclusão, apresentado a Faculdade de Ciências Jurídicas, Administrativas e Contábeis Curso de Direito, Universidade do Oeste Paulista, como parte dos requisitos para a sua conclusão. Presidente Prudente, ... de .......... de 2019. BANCA EXAMINADORA _______________________________________________ Prof. Lucas Ferreira Furlan Universidade do Oeste Paulista – Unoeste Presidente Prudente- SP _______________________________________________ Prof. Airton Roberto Guelfi Universidade do Oeste Paulista – Unoeste Presidente Prudente- SP DEDICATÓRIA Esse trabalho é dedicado à minha família, por sua capacidade de acreditar е investir em mim. Mãe, sеυ cuidado е dedicação foram o que me deram, em alguns momentos, а esperança pаrа seguir. Pai, meus pensamentos em seus ensinamentos em vida foi o que me deu força, dedico também a minha irmã, com vocês tenho a certeza de qυе não estou sozinha nessa caminhada. AGRADECIMENTOS Agradeço, em primeiro lugar, à Deus, que está sempre à frente da minha vida possibilitando-me alcançar todos os meus objetivos e sonhos. Agradeço também ao meu orientador Lucas Ferreira Furlan a realização deste trabalho só foi possível, graças a orientação e disponibilidade dele. Por fim, a todos os professores que fizeram parte da minha vida acadêmica, contribuindo para minha formação profissional e até mesmo pessoal. Muito obrigada a todos! “A menos que modifiquemos à nossa maneira de pensar, não seremos capazes de resolver os problemas causados pela forma como nos acostumamos a ver o mundo”, (Albert Einstein) RESUMO O Princípio da Insignificância e sua aplicabilidade no Direito Penal Brasileiro. O princípio da Insignificância tem como objetivo excluir a tipicidade dos crimes considerados de bagatela, ou seja, aqueles de pouca ou nenhuma relevância para o direito penal, esse princípio por sua vez não está expresso em lei, gerando controvérsias quanto a sua aplicação. No decorrer do trabalho será abordado pontos importantes para o conhecimento e aplicação desse princípio, tais como seu conceito, origem, uma breve explicação sobre a teoria do crime, entendimentos jurisprudenciais, afim de, demonstrar como o Supremo Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal se posicionam a respeito desse princípio, além de expor os requisitos exigidos para a efetiva aplicação. A valoração do princípio da insignificância é outro ponto importante do trabalho, para definir o que é considerado insignificante diante de todo o exposto. Por fim, mostra a repercussão social desse princípio, priorizando o impacto na sociedade e como ele é visto pela sociedade por se tratar de uma excludente de tipicidade, aborda o questionamento sobre se esse princípio é um avanço para a sociedade ou se incentiva o aumento da criminalidade com base na impunibilidade. Palavras-chave: Princípio da Insignificância. Tipicidade. Relevância. Jurisprudência. Requisitos. Valoração e repercussão social. ABSTRACT The Principle of Insignificance and its applicability in Brazilian Criminal Law. The principle of Insignificance aims to exclude the typicity of crimes considered as trifling, that is, those of little or no relevance to criminal law, this principle in turn is not expressed in law, generating controversies as to its application. In the course of the work, important points will be addressed for the knowledge and application of this principle, such as its concept, origin, a brief explanation of the theory of crime, jurisprudential understandings, in order to demonstrate how the Supreme Court of Justice and the Federal Supreme Court position themselves on this principle, in addition to exposing the requirements required for the effective application. The valuation of the principle of insignificance is another important point of the work, to define what is considered insignificant in the face of all the above. Finally, it shows the social repercussion of this principle, prioritizing the impact on society and how it is seen by society because it is a typical exclusion, addresses the questioning of whether this principle is a breakthrough for society or encourages the increase of based on imputability. Keywords: Principle of Insignificance. Typicality. Relevance. Jurisprudence. Requirements. Valuation and Social Repercussion. LISTA DE SIGLAS AGRG- Agravo Regimental CPM- Código Penal Militar HC- Habeas Corpus MIN- Ministro REL- Relator STF- Supremo tribunal Federal STJ- Superior Tribunal de Justiça SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 9 2 TEORIA DO CRIME. .................................................................................... 11 2.1 Do Crime ...................................................................................................... 11 2.1.1 Tipicidade Penal ......................................................................................... 13 3 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA .............................................................. 18 3.1 Origem ......................................................................................................... 18 3.2 Conceitos .................................................................................................... 20 3.2.1 Princípios ...................................................................................................... 20 3.2.2 Princípio da intervenção mínima................................................................... 22 4 ENTENDIMENTOS JURISPRUDÊNCIAIS .................................................. 25 4.1 Requisitos para a aplicação do princípio segundo o STF e o STJ. ........ 25 4.1.1 Mínima ofensividade da conduta do agente ................................................. 25 4.1.2 Ausência de periculosidade social da ação. ................................................. 26 4.1.3 Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento ................................. 27 4.1.4 Inexpressividade da lesão jurídica ................................................................ 27 4.2 Inaplicabilidade do Princípio da Insignificância ...................................... 28 5 VALORAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA ............................... 30 6 REPERCUSSÃO SOCIAL DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA ............ 32 6.1 O impacto da aplicação do princípio da insignificância na sociedade .. 33 6.2 Princípio da Insignificância como causa de absolvição .........................33 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................29 REFERÊNCIAS.............................................................................................36 9 1 INTRODUÇÃO O presente trabalho trata sobre o princípio da insignificância que é um tema bastante discutido no cenário jurídico, que no decorrer do tempo teve sua aplicação cada vez mais implantada em teses de defesa no Direito Penal. O princípio da Insignificância tem como objetivo excluir a tipicidade dos crimes considerados de bagatela, ou seja, aqueles de pouca ou nenhuma relevância para o direito penal, esse princípio por sua vez não está expresso em lei, gerando controvérsias quanto a sua aplicação. Sendo assim quanto à sua aplicação, é necessária extrema cautela, devendo ser somente considerado o realmente insignificante, observando as circunstâncias objetivas e subjetivas de cada caso concreto, para que inexista a abertura para qualquer tipo de impunidade. Ainda quanto a sua aplicação em geral, o Brasil busca a aplicação do princípio da insignificância, tendência essa que vem aumentando, tendo em vista a busca por um direito mais humanizado e eficaz, limitando-se a agir quando tiver real necessidade. Porém, ainda existem divergências sobre o assunto, existindo posições contrárias, ainda hoje ocorrem casos absurdos, que ocasionam resultados e danos irreversíveis quanto à moralidade pessoal do indivíduo. O princípio da insignificância não se encontra expresso no direito positivo brasileiro, embora a doutrina e a jurisprudência, de modo geral, reconhecem a sua existência e a aplicação no dia a dia. Porém, importante observar que, apesar da grande aplicação do princípio, não há posição pacífica quanto o assunto, podendo ser encontrados os mais diversos posicionamentos, tanto na interpretação, quanto na efetivação. Após breve reflexão, o estudo em tela, intitulado Princípio da Insignificância e sua aplicação no direito penal brasileiro, tem por objetivo esclarecer esse princípio jurídico, que se trata de um tema muito discutido nos tribunais, que visa, sobre a não aplicação penal diante de pequenos delitos, cuja importância reflete na discussão acadêmica de um princípio, que suscita aprofundamento e, consequentemente, as atitudes tomadas atualmente, acerca desse assunto e as linhas de raciocínio adotadas pelos tribunais, visando minimizar “injustiças e traumas” que podem ser causados pela 10 condenação injusta de indivíduo que agiu de forma despretensiosa de ato que não feriu nenhum bem jurídico protegido. Trata-se de uma reflexão embasada em diversos autores, fundamentada em leis, jurisprudências, entre outros. Cientificamente, é importante, pois oferece a oportunidade de aprofundar o conhecimento e contribuir para que o respectivo tema ganhe espaço efetivo no conhecimento e seja fonte de formação de opiniões da comunidade acadêmica de ciências jurídicas. 11 2 TEORIA DO CRIME. Podemos definir infração penal como um todo no qual engloba os crimes, os delitos e as contravenções, o Brasil adota a teoria bipartido, sendo assim ele divide de um lado os crimes e os delitos e de outro as contravenções penais. (GRECO, 2017) O que diverge o crime da contravenção é bem simples e está explicita no art.1º do Código Penal. Art. 1º Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. (BRASIL,1940) Essa regra foi quebrada pela lei nº11343/06, pelo seu art.28, que diz sobre as penas relativas ao delito de consumo de drogas, que não fez previsão de qualquer pena privativa de liberdade, nem pecuniária, o que faz gerar dúvidas se nesse caso estamos diante de um crime ou uma contravenção penal. (GRECO, 2017) Portanto a maioria dos doutrinadores definem as contravenções como sendo pequenos delitos ou como chamam delitos-anões, que são aquelas infrações que não ofendem bens jurídicos tão relevantes, essas podem ser facilmente “abraçadas” pelo princípio da insignificância. 2.1 Do Crime O código penal não traz um conceito de crime, porém algumas doutrinas trazem o conceito de em sua obra. Vários doutrinadores, tentaram da melhor forma estabelecer o conceito de delito e chegaram a conclusão dos seguintes conceitos que analisaremos: formal, material e analítico. Quanto ao aspecto formal e material Rogério Greco (2017, p.226) diz que Sob o aspecto formal, crime seria toda conduta que atentasse, que colidisse frontalmente com a lei penal editada pelo Estado. Considerando-se o seu aspecto material, conceituamos o crime como aquela conduta que viola os bens jurídicos mais importantes. Na verdade, os conceitos formal e material não traduzem com precisão o que seja crime. Através deste, surge o conceito chamado de analítico, esse sim aborda realmente as características que compõem a infração Penal. Alguns autores, dizem que o crime é composto pela ação típica, ilícita e culpável. Podemos dizer também, sem nos afastarmos desse conceito, em vez de 12 ação típica, fato típico, pois o fato, abrange a conduta do agente, o resultado dela advindo, bem como o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado. Portanto, não vislumbramos diferença que mereça destaque entre as expressões ação típica ou fato típico. Rogério Greco (2017, p.227) diz que Para que se possa falar em crime é preciso que o agente tenha praticado uma ação típica, ilícita e culpável. Alguns autores, a exemplo de Mezger e, entre nós, Basileu Garcia, sustentam que a punibilidade também integra tal conceito, sendo o crime, pois, uma ação típica, ilícita, culpável e punível. Estamos com Juarez Tavares, que assevera que a punibilidade não faz parte do delito, sendo somente a sua consequência. O crime é um todo unitário e indivisível, pois para cometê-lo deve o agente cometer de fato o delito que é composto de fato típico, ilícito e culpável, senão presente esses pressupostos, o fato será considerado um indiferente penal. O “pai” do princípio da insignificância, Roxin (apud. Rogério Greco,2017, p.227) afirma que Quase todas as teorias do delito até hoje construídas são sistemas de elementos, isto é, elas dissecam comportamento delitivo em um número de diferentes elementos (objetivos, subjetivos, normativos, descritivos etc.), que são posicionados nos diversos estratos da construção do crime, constituindo algo como um mosaico do quadro legislativo do fato punível. Esta forma de proceder acaba levando a que se votem grandes esforços à questão sobre que posicionamento no sistema do delito deve ocupar esta ou aquela elementar do crime; pode-se descrever a história da teoria do delito nas últimas décadas como uma migração de elementares dos delitos entre diferentes andares do sistema. O Brasil, de acordo com a visão analítica, conceitua o crime como sendo o fato típico, ilícito e culpável. Considerando fato típico sendo toda conduta dolosa ou culposa, comissiva ou omissiva, com um resultado e que esteja presente o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado, assim como a tipicidade seja ela formal ou conglobante. Já o fato ilícito, Rogerio Greco (2017, p.228) define como: A ilicitude, expressão sinônima de antijuridicidade, é aquela relação de contrariedade, de antagonismo, que se estabelece entre a conduta do agente e o ordenamento jurídico. A licitude ou a juridicidade da conduta praticada é encontrada por exclusão, ou seja, somente será lícita a conduta se o agente houver atuado amparado por uma das causas excludentes da ilicitude previstas no art. 23 do Código penal. Além das causas legaisde exclusão da antijuridicidade, a doutrina ainda faz menção a outra, de natureza supralegal, qual seja, o consentimento do ofendido. 13 Por último, mas não menos importante o fato deve ser culpável, Rogério Greco (2017, p.228) define o que é culpabilidade Culpabilidade é o juízo de reprovação pessoal que se faz sobre a conduta ilícita do agente. São elementos integrantes da culpabilidade, de acordo com a concepção finalista por nós assumida: a) imputabilidade; b) potencial consciência sobre a ilicitude do fato; c) exigibilidade de conduta diversa. Damásio, Dotti, Mirabete e Delmanto (apud Rogério Greco, 2017, p.229) “entendem que o crime, sob o aspecto formal, é um fato típico e antijurídico, sendo que a culpabilidade é um pressuposto para a aplicação da pena”. 2.1.1 Tipicidade Penal Primeiramente devemos notar a diferença entre tipo e tipicidade. O tipo é considerado a formula que pertence a lei, já a tipicidade está ligada diretamente a conduta. Cezar Roberto Bitencourt (2011, p.738) diz que A teoria do tipo criou a tipicidade como característica essencial da dogmática do delito, fundamentando-se no conceito causal de ação, concebida por Von Liszt. Reconhecendo, desde logo, a unidade do delito, destacamos a necessidade metodológica de distinguir os estágios ou degraus valorativos que permitem a atribuição de responsabilidade penal, quais sejam, a tipicidade, a antijuridicidade e a culpabilidade, facilitando o estudo, a compreensão e a análise do fenômeno delitivo na sua totalidade. Podemos dizer que o Tipo Penal é o próprio artigo da lei e que, o Fato típico é inerente a norma penal. Acerca disso, Cezar Roberto Bitencourt (2011, p.738) considera que Tipo é o conjunto dos elementos do fato punível descrito na lei penal. O tipo exerce uma função limitadora e individualizadora das condutas humanas penalmente relevantes. É uma construção que surge da imaginação do legislador, que descreve legalmente as ações que considera, em tese, delitivas. Tipo é um modelo abstrato que descreve um comportamento proibido. Cada tipo possui características e elementos próprios que os distinguem uns dos outros, tornando-os todos especiais, no sentido de serem inconfundíveis, inadmitindo-se a adequação de uma conduta que não lhes corresponda perfeitamente. Cada tipo desempenha uma função particular, e a falta de correspondência entre uma conduta e um tipo não pode ser suprida por analogia ou interpretação extensiva. Seguindo isso a maioria dos doutrinadores, define o fato típico como sendo, toda conduta seja ela de ação ou omissão descrita em lei como infração penal, ou seja, crime ou contravenção. Diante disso definimos tipicidade como a qualidade que se dá a esse fato, ou seja, a relação entre um comportamento e o tipo legal de crime. 14 A tipicidade trata-se de um ato valorativo, atributivo, levando-se em consideração que nenhum crime ou melhor dizendo nenhuma infração penal é igual a outra, sendo necessário o frequente uso da analogia. A tipicidade penal visa determinar o tipo ou tipos penais de determinada conduta ilícita, se é de fato punível, se a conduta determinou um risco a algum bem jurídico tutelado pela Constituição Federal e se esse risco se confirmou, se existem excludentes de tipicidade. O conteúdo da tipicidade penal, no decorrer do tempo e da evolução jurídica, tem se aprimorado e tem sido ampliado de modo a atender a constante evolução social. São atribuídos ao tipo penal, diversas funções, dentre elas estão a função indiciária que delimita a conduta penalmente ilícita, a função de garantia conhecida como a fundamentadora ou limitadora pois define o tipo de injusto e a função diferenciadora do erro, que está ligada a teoria do tipo com função importante diante da teoria do erro jurídico-penal. A tipicidade penal, é necessária para a caracterização do fato típico, biparte- se em formal e conglobante. O juiz comprova a tipicidade analisando e comparando a conduta particular e concreta com a individualização típica, para só assim definir se ela se adequa ou não. Podemos entender como tipicidade formal sendo a adequação perfeita da conduta do agente ao modelo abstrato previsto na lei penal. Cleber Masson (2011, p.244) considera que Tipicidade formal é o juízo de subsunção entre a conduta praticada pelo agente no mundo real e o modelo descrito pelo tipo penal. É a operação pela qual se analisa se o fato praticado pelo agente encontra correspondência em uma conduta prevista em lei como crime ou contravenção penal. Observando essa linha da tipicidade, estaríamos diante da rejeição do princípio da insignificância abordado na tipicidade, pois esta apoiaria uma corrente mais extremista na doutrina que entende que todo e qualquer bem merece a proteção do Direito Penal, desde que haja previsão legal para tal. Essa parte da doutrina nos levaria à fatos inusitados e absurdos tais como cita Rogerio Greco (2017, p.144) Dois jovens namorados, Pedro e Júlia, ambos com 18 anos de idade, resolvem ir ao cinema. Estudantes, somente possuem o dinheiro exato para 15 o ingresso na sessão. Ao passarem por uma loja de doces, Pedro, delicadamente, retira um caramelo de leite deixado à exposição do público, desembrulha-o e o leva à boca. Júlia, romanticamente, como se fosse dar um beijo em Pedro, parte o caramelo que a esperava entre os lábios do namorado. Quando ambos já estão prestes a entrar no cinema, eis que surge, esbaforido, o segurança da loja de doces, que os havia perseguido até o cinema, e os prende por terem praticado o delito de furto, uma vez que se deliciaram, mas não pagaram o caramelo de leite pertencente à empresa comercial. Para os mais radicais, Pedro e Júlia responderiam, vejam só, por um crime de furto. Mas não somente por um simples crime de furto, e sim por um furto qualificado pelo concurso de pessoas, cuja pena mínima é de dois anos, nos termos do art. 155, § 4º, IV, do Código Penal, haja vista que, com unidade de desígnio e unidos pelo liame subjetivo, subtraíram e dividiram, amorosamente, ainda no interior da loja de doces, o caramelo por eles consumido. Após dado o exemplo e nos levando a reflexão Rogerio Greco (2017, p.145) nos questiona da seguinte forma “Será que o legislador, ao criar o delito de furto, quis proteger todo e qualquer tipo de patrimônio, ou se preocupou somente com aqueles que, efetivamente, tivessem alguma importância?”. Após analisar e pensar sobre, como resposta a essa pergunta Carlos Vico Manãs (apud. Rogério Greco,2017, p.145) diz que “Ao realizar o trabalho de redação do tipo penal, o legislador apenas tem em mente os prejuízos relevantes que o comportamento incriminado possa causar à ordem jurídica e social. Todavia, não dispõe de meios para evitar que também sejam alcançados os casos leves. O princípio da insignificância surge justamente para evitar situações dessa espécie, atuando como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal, com o significado sistemático político-criminal da expressão da regra constitucional do nullum crimen sine lege, que nada mais faz do que revelar a natureza subsidiária e fragmentária do direito penal.” Assim, nossos Tribunais Superiores têm entendido pela possibilidade da aplicação desse princípio nos delitos patrimoniais cometidos sem violência, que tenha como resultado pequeno dano ou objetos de pequeno valor. Já a tipicidade conglobante, é preciso verificar dois aspectos, primeiramente se a conduta do agente é antinormativa e se o fato é materialmente típico. O princípio da insignificância reside na tipicidade conglobante ou tipicidade material. Cleber Masson (2011, p.246-247) afirma que a tipicidade conglobante foi Criada peio penalista argentino Eugênio Raúl Zaffaroni, essa teoria sustenta que todo fato típico se reveste de antínormatívidade, pois, muito embora o agente atue em consonância com o queestá descrito no tipo incriminador, na verdade contrária a norma, entendida como o conteúdo do tipo ilegal. O nome “conglobante” deriva da necessidade de que a conduta seja contrária ao ordenamento jurídico em geral, conglobado, e não apenas ao Direito Penal. Não basta a violação da lei penal. Exige-se a ofensa a todo o ordenamento jurídico. Em suma, para a aferição da tipicidade reclama-se 16 a presença da antínormatívidade. Sendo assim, entende-se que não há formula exata para o direito, mas que precisamos agir da forma mais justa, pela busca real da justiça, tendo em vista que o legislador não consegue acompanhar a evolução social na mesma proporção que ela ocorre, procurando sempre situações análogas para obter um melhor e mais justo resultado para cada demanda. O tipo do delito, que é definido por uma ação licita ou ilícita deve conter a proibição da conduta descrita, assim como o aspecto fático sobre o qual se espelha a valoração e a própria proibição da norma, além de demonstrar o elemento valorativo que demonstra o seu conteúdo material. Há dentro da tipicidade penal, elementos objetivos e subjetivos, os objetivos são aqueles que possuem validade externa, que podem ser constatadas por outras pessoas, já o subjetivo, por sua vez, são aqueles fenômenos relativos do agente como o dolo, a intenção, motivos especiais. Vale lembrar que não há conduta delitiva sem que haja elemento estrutural do aspecto objetivo do crime. Haverá a possibilidade de excludente de tipicidade nos casos em que houver a aplicação da coação física absoluta, na aplicação do princípio da insignificância, assim como no princípio da adequação social e na teoria da tipicidade conglobante. Inclusive o art.22 do Código Penal (BRASIL,2015) “Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem”. Esse artigo trata da coação moral, mas não da coação física irresistível, pois esta tira a voluntariedade do comportamento, deixando por esse fato de existir a conduta, se a mesma for resistível somente beneficiara o agente como atenuante. A coação física irresistível estará ligada a conduta em si. O Princípio da Insignificância deve ser estudado a luz da tipicidade material. Segundo esse princípio o Direito Penal só estaria limitado a agir nos delitos em que houvesse a extrema necessidade da proteção de determinado bem jurídico, não devendo, assim, se ocupar com bagatelas nome dado a pequenas coisas. A infração bagatelar por sua vez expressa um ataque a um bem jurídico no qual não requer ou não necessita da intervenção penal. 17 Sendo assim, a desnecessidade da pena consiste em diversos fatores, que serão analisados caso a caso, perante aquilo que o legislador prevê e o que é justo para determinado delito, apresentando uma solução menos gravosa para cada caso concreto. A teoria da adequação social, portanto, faz o papel de ligação entre as teorias da causalidade e finalista, usando a relevância social como critério em comum a todas as formas de comportamento, eximindo o crime. A tipicidade conglobante como já observado anteriormente, é aquela que entende que o Estado não pode condenar conduta tolerada por ele, não sendo uma corrente positivista, pois não adota exclusivamente o que está previsto em lei. 18 3 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA 3.1 Origem Antes de conhecermos mais a fundo o Princípio da Insignificância é de suma importância conhecermos sua origem, para um melhor aproveitamento do conteúdo que será exposto acerca de seu conceito, aplicação e finalidade, segue desse modo uma breve explicação sobre a sua origem histórica. A historicidade é essencial para a compreensão de todo e qualquer assunto, no Direito isso não se torna diferente. O princípio da insignificância por sua vez e no decorrer do tempo tem ganhado cada vez mais espaço no cenário jurídico, sendo alvo de elogios e críticas quanto a sua aplicação e finalidade, por isso é necessário entender de onde e como surgiu esse princípio e como seu desenvolvimento ocorreu no decorrer do tempo e na evolução da sociedade. Cleber Masson (2011, p.25) diz que O princípio da insignificância ou da criminalidade de bagatela surgiu inicialmente no Direito Civil, derivado do brocardo de mínimus non curai praetor. Em outras palavras, o Direito Penal não deve se ocupar de assuntos irrelevantes, incapazes de lesar o bem jurídico. Na década de 70 do século passado, foi incorporado ao Direito Penal pelos estudos de Claus Roxin. Com essa afirmativa podemos dizer que o Direito Penal só poderia ser provocado em casos de extrema importância e em situações de eminentes riscos de lesar o bem jurídico de modo geral, atualmente esse princípio compõe o Direito Penal, juntamente com vários outros de extrema importância para o perfeito funcionamento desse ramo do Direito. Há controvérsias quanto a sua origem, porém, não há dúvidas que o princípio tomou forma e validade após a implementação de Claus Roxin, que é considerado o nome mais importante para o desenvolvimento e aplicabilidade desse princípio , que de forma gradual foi adquirindo espaço e entendimento no ordenamento jurídico, o Brasil por sua vez adota esse princípio de forma justa e dinâmica abordado tanto pela doutrina como pela jurisprudência. De acordo com Ivan Luiz da Silva (2010, p.87) “o aspecto histórico do princípio da insignificância é devido a Claus Roxin, que no ano de 1964, o formulou como base de validez geral para a determinação do injusto”. 19 Antes disso, porém, já era possível verificar alguns vestígios desse princípio, ao menos no que se refere à sua base, ao questionarem doutrinadores mais antigos, sobre a sobrecarga do Direito Penal, com causas irrelevantes, de pouca ou nenhuma lesividade a nenhum bem jurídico, ocorrendo assim o uso excessivo da pena. Podemos facilmente imaginar que algum fato específico deve ter dado origem definitiva a esse princípio, tal princípio surgiu decorrido da enorme expansão e evolução que o Direito Penal conheceu nos últimos anos, se tornando uma das saídas para satisfazer os anseios sociais, como objetivo inicial de livrar a apreciação do Direito Penal quanto aos delitos insignificantes, ou seja, aqueles de pouca importância ou lesividade. Como fato determinador para a inserção do princípio da insignificância ,segundo os doutrinadores alemães, pode ter se dado devida a criminalidade de bagatela ,que surgiu por causa das crises sociais provenientes das grandes guerras, mais precisamente após a primeira guerra mundial e em maior escala após a segunda guerra mundial, pois se verificou o grande aumento de delitos patrimoniais decorrentes do excesso de desemprego que acarretou na falta de alimentação, entre outros fatores que geraram um surto de furtos de pequena relevância, devido ao caos do período. Sendo assim o principal motivo para o surgimento da criminalidade de bagatela, foi o estado de necessidade que os cidadãos viviam naquela época pós- guerra, que deixou a população com a visão de um futuro incerto para si e seus familiares, além da forte pressão, encontrando assim nos pequenos delitos um modo de sobrevivência para aquele período. Com base em todo o exposto, pode-se observar que, a origem do Princípio da Insignificância está vinculada ao princípio da legalidade, que estabelece segundo o art. 1º do Código Penal Brasileiro (2015) “que não há crime sem lei anterior que o defina, nem há pena sem prévia cominação legal”. Dito isso é possível notar o real motivo do princípio em estudo estar ganhando cada vez mais destaque. Esse princípio tem sido acolhido de forma majoritária pela jurisprudência nacional, podemos dizer que se trata de uma grande evolução para o direito em seu atual sistema, auxiliandono desafogamento do judiciário de certa forma, que por sua vez anda repleta de demandas para serem solucionadas, além de auxiliar na 20 resolução de um outro grande problema, evitando a superlotação carcerária brasileira, colocando na balança justiça e humanidade, para solucionar os casos de menor relevância de acordo com os fatos e pensamentos medidos e analisados pelo magistrado de acordo com o homem-médio. 3.2 Conceitos 3.2.1 Princípios O sistema jurídico é formado por regras e princípios, restando aqui a necessidade de conceituá-los e identificar suas funções para uma abrangente compreensão do tema em estudo. Dessa forma, podemos dizer que os princípios tratam-se de um conjunto de normas a serem seguidos por uma pessoa ou pela coletividade, e estão relacionados ao início de algo, ou seja, são os pontos iniciais para um determinado assunto. O dicionário jurídico por sua vez conceitua princípio como “Lei, doutrina ou acepção fundamental em que outras são baseadas”. (p.225, 2015) Com a constante evolução social, surgiu o Estado Democrático de Direito, devido ao modo em que a própria sociedade foi se organizando e se desenvolvendo. Alexandre de Moraes, caracteriza o Estado Democrático de Direito da seguinte forma (2015, p.6) O Estado Democrático de Direito, caracterizador do Estado Constitucional, significa que o Estado se rege por normas democráticas, com eleições livres, periódicas e pelo povo, bem como o respeito das autoridades públicas aos direitos e garantias fundamentais. Não podemos deixar de lembrar dos princípios constitucionais que são de extrema importância para o entendimento específico e técnico do princípio da insignificância, os princípios constitucionais são os valores basilares da ordem jurídica. Incluem os princípios fundamentais e os jurídicos- constitucionais, nenhuma decisão jurídica pode ser reconhecida se ferir esses princípios pois são eles que regem todo o ordenamento jurídico. O princípio em estudo não se mostra positivado em lei, mas decorre da interpretação das próprias normas e construções doutrinarias, devendo ser observadas e aplicadas nos casos em que o mesmo seja cabível. Os princípios foram muito valorizados com a criação da Constituição Federal de 1988, diante dela novos vetores, paradigmas e interpretações ganharam destaque 21 no cenário jurídico brasileiro. O Estado desligou-se do antigo modelo político constitucional baseado no Estado de Direito, definindo sua adesão ao Estado Democrático de Direito. As leis passaram a se caracterizar por possuir conteúdo e adequação social, ao invés de apenas garantir a igualdade formal entre todos. Esse novo aspecto das leis fundamenta-se no princípio mestre da nação brasileira, qual seja, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. A Constituição Federal Brasileira destaca a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, em seu artigo 1º, inciso III (BRASIL, 1998) Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [..] III - a dignidade da pessoa humana. O Direito Penal por sua vez na visão da maioria das pessoas tem a função de promover a máxima punição a qualquer infrator da lei, porém não é dessa forma que funciona. O Estado Democrático preza pela liberdade das pessoas, havendo assim a necessidade de criar regras para o funcionamento correto do Estado, dentre os instrumentos de controle da ordem, há o Direito Penal, considerado o mais severo, por estipular sanções que podem privar uma pessoa de sua liberdade, não havendo a necessidade de punir toda e qualquer pessoa que cometa uma infração, pretendendo punir somente apenas o comportamento humano absolutamente errado e se esse for efetivamente e comprovadamente ofensivo a um interesse social relevante. Podemos então dizer que o Direito Penal tem como real função limitar o poder punitivo do Estado, protegendo bens jurídicos mais relevantes contra os possíveis atos lesivos. Diante disso podemos dizer que a evolução de modo geral no âmbito jurídico e não somente no Direito Penal, contribuiu para o desenvolvimento de vários princípios que norteiam a nossa legislação como um todo e o aprimoramento e adequação da norma juntamente com o desenvolvimento social e cultural da sociedade, fez com que a busca por um país mais justo, se tornasse possível. Tanto é verdade que antes da Constituição Federal de 1988, bastava que o fato praticado se adequasse à letra da lei, para ser considerado como crime, com o surgimento do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana norteando os demais ramos 22 do Direito, além desse elemento formal, para um fato ser chamado de crime ou infração penal, passou a ser necessária a análise de um novo elemento, denominado material, que significa que, além de fato dever estar previsto em lei como crime, ainda deve colocar em perigo bens jurídicos tutelados e considerados importantes, de relevância para o social. É então a partir dessa nova visão que surge, de forma clara, no cenário jurídico brasileiro, o Princípio da Insignificância, em decorrência do novo elemento, o material, componente da infração penal. 3.2.2 Princípio da intervenção mínima. O princípio da intervenção mínima, também conhecido como ultima ratio, limita o poder punitivo do Estado, impondo que o Direito Penal só deve se preocupar com a proteção dos bens mais importantes e necessários para manter a harmonia na vida em sociedade. Segundo Muñoz Conde (apud Rogerio Greco,2017, p.127) entende que O poder punitivo do Estado deve estar regido e limitado pelo princípio da intervenção mínima. Com isto, quero dizer que o Direito Penal somente deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais importantes. As perturbações mais leves do ordenamento jurídico são objeto de outros ramos do Direito. Sendo assim, o Direito Penal deve atuar somente quando os outros ramos do Direito forem incapazes de resolverem os conflitos existentes naquele determinado caso, sendo incapazes de dar a assistência devida a bens relevantes na vida da sociedade, quando se tornar indispensável a ação do Direito Penal, somente assim ele deverá intervir para reestabelecer a ordem jurídica, caracterizando assim uma função subsidiária. Quanto a origem desse princípio Cezar Roberto Bittencourt em sua obra diz que (2011, p.98) Apesar de o princípio da intervenção mínima ter sido consagrado pelo Iluminismo, a partir da Revolução Francesa, “a verdade é que, a partir da segunda década do século XIX, as normas penais incriminadoras cresceram desmedidamente, a ponto de alarmar os penalistas dos mais diferentes parâmetros culturais. Critica-se, portanto, o abuso da criminalização e da penalização, indo contra o princípio da intervenção mínima, quando se deixa de lado a sua função subsidiária, 23 colocando em questionamento o caráter e significado, do que é justo e do que faz a justiça. Quanto ao caráter subsidiário do Direito Penal, Roxin (apud Rogério Greco ,2017, p.128) assevera que A proteção de bens jurídicos não se realiza só mediante o Direito Penal, senão que nessa missão cooperam todo o instrumental do ordenamento jurídico. O Direito penal é, inclusive, a última dentre todas as medidas protetoras que devem ser consideradas, quer dizer que somente se pode intervir quando falhem outros meios de solução social do problema – como a ação civil, os regulamentos de polícia, as sanções não penais etc. Por isso se denomina a pena como a ‘ultima ratio da política social’ e se define sua missão como proteção subsidiária de bens jurídicos. É importante ressaltar que a sociedade muda constantemente e o Direito de forma geral tem que acompanhar essas mudanças, sendo assimo que era relevante para o Direito há anos atrás, atualmente pode não ser mais considerado como tal, não havendo a necessidade da aplicação do Direito Penal, por ter critério subsidiário e podendo ser solucionado por outros ramos do Direito. O Direito Penal tem como objetivo proteger os bens jurídicos de maior relevância que através do trabalho do legislador são definidas quais as condutas que devem ser sancionadas pelo Estado, que por sua vez tem o poder de punir aqueles que não observam a lei. O Princípio da Insignificância, por sua vez decorrente do princípio da Intervenção Mínima, foi inserido no mundo jurídico com a finalidade de afastar a incidência penal os delitos de pequena relevância, para que o Direito Penal por sua vez, possa se concentrar em apenas reprimir condutas que realmente afetam os bens jurídicos de relevância e desafogar o sistema punitivo, analisando caso a caso quando esse princípio poderá ser aplicado. Tal princípio tem aplicação a qualquer tipo de delito que com ele seja compatível, ainda que excepcionalmente, e não apenas aos crimes contra o patrimônio, exceto nos crimes praticados com emprego de violência à pessoa ou grave ameaça, pois os reflexos daí resultantes não podem ser considerados insignificantes, ainda que a coisa subtraída apresente ínfimo valor econômico. A jurisprudência é atualmente pacífica, no sentido de não ser possível a aplicação do princípio da insignificância aos crimes praticados com grave ameaça ou violência contra a vítima. 24 Lembra Rogério Greco (2017, p.144) que Existe, premissa, vênia, uma corrente mais radical da doutrina que entende que todo e qualquer bem merece a proteção do direito penal, desde que haja previsão legal para tanto, não se cogitando, em qualquer caso, do seu real valor. Alguns doutrinadores divergem sobre a natureza jurídica desse princípio criando três correntes a saber: excludente de tipicidade, de antijuricidade ou de culpabilidade. A primeira corrente e mais aceita, defende a tese de que as condutas que provocam um dano insignificante são atípicas, portanto excluem a tipicidade da conduta que, mesmo causando um dano irrelevante, são abrangidas pela descrição abstrata do tipo penal. A segunda e menos expressiva defende a exclusão da antijuridicidade como natureza jurídica, entretanto não é muito debatida pela doutrina. A terceira e última corrente tem a excludente de culpabilidade como natureza jurídica do princípio da insignificância. 25 4 ENTENDIMENTOS JURISPRUDÊNCIAIS 4.1 Requisitos para a aplicação do princípio segundo o STF e o STJ. Como já sabemos o Princípio da Insignificância é bastante usado por nossos tribunais, como causa de exclusão de tipicidade, sendo necessária uma interpretação do Direito Penal aplicada ao caso concreto, de tal modo que a análise da insignificância da ação do agente não fique relacionada apenas a dimensão econômica do dano causado a vítima, analisando-se um todo. Para o Supremo Tribunal Federal, para caracterizar e justificar a aplicação de tal princípio é necessário estar presente alguns requisitos objetivos autorizadores como “a mínima ofensividade da conduta, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica” (STF, HC 84.412-0/SP, Rel. Ministro CELSO DE MELLO,DJU 19/11/2004.) Destarte ao lembrar do fato de que o reduzido valor do objeto material não autoriza, por si só, o reconhecimento da bagatela é necessário também além dos requisitos objetivos a presença de alguns requisitos subjetivos, Cleber Masson (2011, p.25) diz que segundo o STJ Há que se conjugar a importância do objeto material para a vítima, levando- se em consideração a sua condição econômica, o valor sentimental do bem, como também as circunstâncias e o resultado do crime, tudo de modo a determinar, subjetivamente, se houve relevante lesão. Se presentes todos os requisitos descritos e o caso analisado em todos os aspectos, o principio deverá ser aplicado e ter a sua eficácia plenamente reconhecida. 4.1.1 Mínima ofensividade da conduta do agente A mínima ofensividade da conduta refere-se ao comportamento do agente delituoso no momento em que pratica o ato, não tratando em si do dano sofrido pela vítima, importando principalmente o grau de ofensividade da conduta cometida, ou seja, se em sua conduta houver ao menos exposição de perigo a bem jurídico relevante, como por exemplo, a vida, estaria ausente este vetor. Como exemplo desse requisito podemos citar o indeferimento de um Habeas Corpus no Crime de moeda falsa: HABEAS CORPUS. CRIME DE MOEDA FALSA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.DESCARACTERIZADA A MÍNIMA OFENSIVIDADE DA CONDUTA. HABEAS CORPUSDENEGADO; 1. Ainda que as cédulas falsificadas sejam de pequeno valor, não é possível aplicar o princípio da insignificância ao crime de moeda falsa, pois se trata de delito contra a fé pública, que envolve a credibilidade do Sistema Financeiro Nacional, o que descaracteriza a mínima ofensividade da conduta do agente de modo a excluir atipicidade do fato. Precedentes do STF e do STJ. 2. Habeas corpus 26 denegado. (Goiás, Superior Tribunal de Justiça, HC: 187.077, Relator: Min. Laurita Vaz, 2013) No caso acima nota-se que o STJ descaracterizou o pedido da defesa, em razão de estar ausente a mínima ofensividade da conduta do agente, já que o mesmo ferio a fé-publica que é considerado um bem jurídico, não caracterizando, portanto, a insignificância no caso. 4.1.2 Ausência de periculosidade social da ação. A ausência de periculosidade social da ação está entrelaçada com o vetor anterior, pois se na conduta do agente houver lesão ou trouxer perigo a bem jurídico tutelado, automaticamente estará ausente este, bem como estariam também ausentes o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, que, consequentemente, não estaria presente a inexpressividade da lesão jurídica causada, caracterizando um “efeito dominó”, devendo então se verificar a ausência de periculosidade social da ação, sendo analisado em um todo a conduta do agente e sua possível descriminalização na sociedade. Quanto a esse requisito podemos usar como exemplo o julgado do STF no Habeas Corpus 122507 em que foi instalada a rádio religiosa clandestina, que não afeta o cotidiano de ninguém não gerando dano algum a população EMENTA Habeas Corpus. Penal. Desenvolvimento de atividades clandestinas de telecomunicação. Artigo 183 da Lei nº 9.472/97. Princípio da insignificância. Possibilidade, em razão das particularidades do caso concreto. Precedente. Inexistência de lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora. Demonstração da ausência de periculosidade social da ação e do reduzido grau de reprovabilidade da conduta. Ordem concedida. 1. O exame pericial elaborado pela ANATEL, que demonstrou que a suposta operação de rádio clandestina seria de baixa potência, não comprovou a sua efetiva interferência nos serviços de comunicação devidamente autorizados, o que demonstra a ausência de potencialidade lesiva ao bem jurídico tutelado pelo tipo penal incriminador. 2. A constatação da fiscalização de que a programação da rádio era basicamente constituída de conteúdo evangélico (fl. 9 do anexo 3) permite concluir a ausência de periculosidade social da ação e o reduzido grau de reprovabilidade da conduta do paciente, o que abre margem para a observância do postulado da insignificância, já que preenchidos os seus vetores. 3. Ordem concedida. (Espírito Santo, Supremo Tribunal Federal, HC: 122507, Relator: Min. Dias Toffoli, 2014) Esse requisito seve para que a ausência da periculosidade social da ação determine quando for violado tanto a integridade física e moral da vítima ou de terceiros. 27 4.1.3 Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento O reduzido grau de reprovabilidade docomportamento, trata-se da opinião e visão da sociedade perante a conduta delituosa, se é ou não algo que causa incomodo, repulsa ou insegurança da sociedade ou incredibilidade a justiça, ou seja, o comportamento do agente deve ser inexpressível e de possível aceitação a sua conduta e seus atos devem ser compreensíveis. Para mostrar a aplicação desse requisito, usaremos como exemplo, o julgado de Habeas Corpus pelo STF, em que o princípio não foi aplicado em razão da ausência deste requisito. Ementa: HABEAS CORPUS. PENAL MILITAR. PACIENTE CONDENADO PELO CRIME DE DESERÇÃO. ABSOLVIÇÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. RAZOÁVEL GRAU DE REPROVABILIDADE DA CONDUTA. ORDEM DENEGADA. I A aplicação do princípio da insignificância, de modo a tornar a conduta atípica, exige, além da pequena expressão econômica dos bens que foram objeto de subtração, um reduzido grau de reprovabilidade da conduta do agente. II É relevante e reprovável a conduta de um militar que abandona o serviço militar, apesar do dever de cumpri-lo até seu desligamento na forma legalmente estabelecida, o que demonstra desrespeito às leis e às instituições castrenses de seu País. III O crime de deserção ofende aos princípios da hierarquia e da disciplina, preceitos constitucionais sobre os quais se fundam as Forças Armadas, constituindo a ausência injustificada de militares ilícito penal, na medida em que a ofensa ao bem jurídico tem impacto direto sobre o efetivo militar e as bases de organização das Forças Armadas. IV A aplicação do referido instituto, na espécie, poderia representar um verdadeiro estímulo à prática deste delito, já bastante comum na Justiça Militar, o que contribuiria para frustrar o interesse da instituição castrense em contar com o efetivo previsto em lei. V Ordem denegada. (Paraná, Supremo Tribunal Federal, HC: 118255, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, 2013) O elemento principal desse requisito é a possibilidade de compreensão pela sociedade sobre o fato delitivo, quando essa não acontece enseja na inaplicabilidade do princípio da insignificância na conduta. 4.1.4 Inexpressividade da lesão jurídica A inexpressividade da lesão jurídica pode ser caracterizada pelo fato de não ser possível reconhecer a lesividade da conduta devida a sua insignificância perante os demais delitos, ou até mesmo a sua incapacidade de gerar dano significativo á algum bem juridicamente tutelado. Usaremos como exemplo o julgado do STF DIREITO PENAL. ATIPICIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PARÂMETROS E CRITÉRIOS. INEXPRESSIVIDADE DA LESÃO JURÍDICA PROVOCADA. AUSÊNCIA. INAPLICABILIDADE. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. A questão de direito tratada neste writ, consoante a tese exposta pelo recorrente na petição inicial, é a suposta atipicidade da conduta realizada pelo paciente com base na teoria da insignificância, por falta de 28 lesividade ou ofensividade ao bem jurídico tutelado na norma penal. 2. Registro que não considero apenas e tão somente o valor subtraído (ou pretendido à subtração) como parâmetro para aplicação do princípio da insignificância. Do contrário, por óbvio, deixaria de haver a modalidade tentada de vários crimes, como no próprio exemplo do furto simples, bem como desapareceria do ordenamento jurídico a figura do furto privilegiado (CP, art. 155, § 2º). Como já analisou o Min. Celso de Mello, no precedente acima apontado, o princípio da insignificância tem como vetores "a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada." (HC 84.412/SP). 3. No presente caso, considero que tais vetores não se fazem simultaneamente presentes. Consoante o critério da tipicidade material (e não apenas formal), excluem-se os fatos e comportamentos reconhecidos como de bagatela, nos quais têm perfeita aplicação o princípio da insignificância. O critério da tipicidade material deverá levar em consideração a importância do bem jurídico possivelmente atingido no caso concreto. 4. No caso em tela, a lesão se revelou significante, não obstante o bem subtraído ser inferior ao valor do salário mínimo. Vale ressaltar, que há informação nos autos de que o valor "subtraído representava todo o valor encontrado no caixa (fl. 11), sendo fruto do trabalho do lesado que, passada a meia-noite, ainda mantinha o trailer aberto para garantir uma sobrevivência honesta." Portanto, de acordo com a conclusão objetiva do caso concreto, entendo que não houve inexpressividade da lesão jurídica provocada. 5. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus. (Rio de Janeiro, Supremo Tribunal Federal, RHC: 96813, Relator: Min. Ellen Gracie, 2009, grifo nosso). Já esse requisito ressalta que não basta o valor ser considerado pequeno, para a aplicação do princípio devem estar presentes todos os requisitos estipulados pelo STJ. 4.2 Inaplicabilidade do Princípio da Insignificância Em tese o princípio da Insignificância tem aplicação a qualquer espécie de delito que seja compatível com ele, porém, o STJ definiu alguns delitos que seriam incompatíveis com esse princípio. O STJ através de um e seus julgados entendeu não ser aplicável o princípio da insignificância nos crimes contra a administração pública, a fim de resguardar não somente o ajuste patrimonial, mas também a moral administrativa. (Cleber Masson, 2011, p.27) Assim como regra, tal princípio também não será admitido em crimes praticados com emprego de violência ou grave ameaça a pessoa, pois os resultados advindos dessas condutas não podem ser considerados insignificantes, já decidiu o STJ. O STF e o STJ, tem posicionamentos consolidados quanto a não aplicação do princípio também nos casos de tráfico de drogas, por se tratar de delito de perigo abstrato, ou seja aquele em que não é necessária a comprovação concreta do risco, praticado contra a saúde pública, porém há divergências quanto a aplicação em 29 relação ao artigo 28 da lei nº 11343/06, que fala sobre o porte de drogas para consumo pessoal, o que ainda não foi pacificado nos Tribunais Superiores. Guilherme Nucci (2009, p.35) ao falar sobre esse tema especifico chega à conclusão de que em tese, seria viável, neste contexto, a aplicação do princípio da insignificância, afastando-se a tipicidade quando a quantidade da droga apreendida fosse mínima. Entretanto, pela atual disposição legal, não nos soa mais razoável que assim se faça. O delito de porte de drogas par consumo próprio adquire caráter de infração de mínimo potencial ofensivo, tanto que as penas são brandas, comportando, inclusive, mera advertência. Por isso, ideal é haver, pelo menos, aplicação de sanção amena, por menor que seja quantidade de tóxico. Evita-se, com isso, o crescimento da atividade do agente, podendo tornar-se traficante ou viciado. Não sendo possível também a aplicabilidade nos casos do crime de posse de drogas em estabelecimento militar, definido no art. 290 do decreto-lei n°1001/69- CPM. O STF entende que (Cleber Masson, 2011, p.29) Assentou-se que a prática da conduta prevista no referido dispositivo legal ofenderia as instituições militares, a operacionalidade das Forças Armadas, além de violar os princípios da hierarquia e da disciplina na própria interpretação do tipo penal. (...) Em seguida, reputou-se inaplicável, no âmbito do tipo previsto no art. 290 do CPM, o princípio da insignificância. Também não se admite no crime de tráfico internacional de arma de fogo, por se tratar de crime de perigo abstrato e atentatório a segurança pública. Há vários outros casos em que o princípio não será aplicado, afinal o princípio deve ser analisado em cada caso concreto, de acordo com as suas especificidades, e não no plano abstrato. 30 5 VALORAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA A valoração da insignificância, para determinar o que é insignificanteque ser determinado após a análise de caso a caso, não há estipulação de valor ou de quantidade para definir o que por regra seria insignificante. Vale lembrar que o princípio da insignificância abrange vários casos e não somente os patrimoniais, sendo assim é de extrema importância a analise isolada de casos para que não haja injustiça na aplicação do princípio aos casos concretos. O delegado de polícia aposentado Antônio Edilson Fracelin disse em seu artigo que O princípio da insignificância deverá incidir em elo com a “coisa subtraída” e seu valor específico, verificando certa proporcionalidade, uma valoração desprezível, chegando a não prejudicar de forma brutal a “psique” e a condição de fortuna do sujeito passivo. Esse instituto deve ser aplicado com cautela, discernimento e equidade de Justiça.1 O uso da insignificância por sua vez deve então observar o valor do bem jurídico para a vítima e a ofensividade da conduta para a sociedade, desse modo o importante não é o valor econômico do bem e sim a lesão causada, observando o prejuízo para a vítima e o risco para a sociedade, além do padrão de vida da vítima frente ao prejuízo sofrido que será o que determinara a aplicação ou não do princípio para aquele determinado caso. Assim os Tribunais Superiores têm julgado os delitos que aparentemente deveriam ser alcançados pelo princípio da insignificância pelo pequeno valor do objeto subtraído ou da lesão, mas que na maioria das vezes não o alcança por motivos e justificativas irrelevantes diante da análise do caso concreto. Como por exemplo o Recurso Ordinário em Habeas Corpus 86813: o caso concreto trata de furto de R$ 40,00 de um carro de lanches, por tratar-se do fruto de trabalho de uma noite inteira, que seria utilizado para o sustento da vítima, não se pode considerar a lesão inexpressiva. Neste sentido, mesmo através de juízo de valor pelo magistrado, que não houve insignificância: a fundamentação esclarece qualquer dúvida acerca da afastabilidade da aplicação do princípio. Em seu voto, o ministro Eros Grau elucida a questão: 12. O juiz, ao aferir se o bem juridicamente protegido é ou não de pequeno valor, há de mensurar a capacidade econômica da vítima. A quantia furtada 1 Informação fornecida pelo Delegado de Polícia aposentado Antônio Edilson Fracelin em um artigo online, disponível no site https://antoniofrancelin.jusbrasil.com.br/artigos/136366553/o-instituto-do-principio-da- insignificancia-parte-i. https://antoniofrancelin.jusbrasil.com.br/artigos/136366553/o-instituto-do-principio-da-insignificancia-parte-i https://antoniofrancelin.jusbrasil.com.br/artigos/136366553/o-instituto-do-principio-da-insignificancia-parte-i 31 não pode ser tida, no caso, como de pequeno valor; consubstancia valor necessário ao suprimento das necessidades básicas da vítima.” (HC 96.813-9, Relator(a): Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, julgado em 31/03/2009). Situação oposta ocorreu no caso do jovem que furtou fitas de videogame, avaliadas no valor de R$ 25,00. No relatório, o ministro Celso de Mello, relator do julgado, observa que uma testemunha relatou que o autor teria subtraído o bem com o intuito de devolvê-lo, e, ademais, a vítima teria a intenção de retirar a queixa, o que não ocorreu pelo caráter indisponível da ação penal. EMENTA: Princípio da insignificância – identificação dos vetores cuja presença legitima o reconhecimento desse postulado de política criminal – consequente descaracterização da tipicidade penal em seu aspecto material – delito de furto – condenação imposta a jovem desempregado, com apenas 19 anos de idade – “Res furtiva no valor de R$ 25,00 (equivalente a 9,61% do salário mínimo atualmente em vigor) – doutrina – considerações em torno da jurisprudência do STF – pedido deferido. [...] O direito penal não seve se ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor – por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes – não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. (HC 84.412-0, Relator(a): Min. Celso de Mello, Segunda Turma, julgado em 19/10/2004). Em ambos os casos podemos notar que o magistrado considerou todo o exposto e a lesão causada a vítima de forma social e não somente o prejuízo financeiro em cada caso. É disso que se trata o princípio da insignificância uma ferramenta jurídica para estabilizar a justiça seguindo seus requisitos e respeitando o princípio da individualização da pena. 32 6 REPERCUSSÃO SOCIAL DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA A repercussão social sobre a aplicação do princípio da insignificância no cenário jurídico penal é fonte de diversas discussões e incertezas, alguns doutrinadores dizem que a aplicação desse princípio pode abalar a segurança social, pois temem o aumento e a aceitação de pequenos delitos ou crimes considerados irrelevantes , por outro lado leva-se em conta a aplicação do princípio para a punição justa e adequada a cada caso concreto, além de desafogar o judiciário. A grande questão é se seria justo e moral estipular pena para pessoas que praticam crimes considerados irrelevantes, ou seja, aqueles que não afetam nenhum bem jurídico tutelado de forma significante, da mesma maneira que se estipula a pena para aqueles que praticam crimes causadores de prejuízos efetivos as vítimas e a sociedade. O princípio da insignificância surgiu justamente para solucionar esse dilema e abraçar aqueles que cometem delitos irrelevantes, porém, a punibilidade não deve ser descartada em um todo diante desses fatos, visto que ela tem como função desestimular a pratica de novos delitos, por isso se torna necessário preencher todos os requisitos exigidos além da análise de cada caso concreto. Paulo César Busato (2015, p.72) diz que há várias formas de se definir a danosidade social, porém, a mais usada é aquela que afirma Que a danosidade social de um fato se determina quando se lesionam ou se põem em perigo bens jurídicos fundamentais que ponham em risco a perfeita convivência social. Contudo, só pode ser bem jurídico o que antes é considerado um bem. Os bens não têm existência com a norma, mas são prévios a ela, estabelecidos pela realidade social de onde emanam. Sendo assim, após detectar a lesividade social do crime e se aquele atingiu algum bem jurídico tutelado pelo Estado, só então será possível determinar qual e em que intensidade será aplicada a pena, para que haja uma aplicação justa. O Estado é responsável por indicar as condutas que merecem reprovação, porém, por vivermos em um estado democrático de direito, esse poder não é absoluto, sendo necessário a análise de outros fatores para determinar de fato a reprovação devida a cada caso. Isso é assegurado pelo princípio da individualização da pena, onde se verifica qual é a pena mais adequada, levando em conta as características pessoais de cada réu. 33 6.1 O impacto da aplicação do princípio da insignificância na sociedade Atualmente devido ao aumento da violência, a sociedade desenvolveu um sentimento coletivo de justiça e insegurança, sentimento esse que cresce cada vez mais, a busca pela justiça para que a paz e a tranquilidade voltem a reinar no convívio social. A busca incessante por um mundo sem violência e sem crimes, ou por um mundo onde todos aqueles que cometem algum ato ilegal sejam punidos para que não mais os pratique, acaba gerando uma visão fantasiada do Direito penal perante a sociedade, onde muitos questionam até mesmo a sua eficácia. Devemos lembrar que o Direito Penal, só deve se preocupar com assuntos relevantes, que gerem dano ou risco eminente a bens juridicamente tutelados, sendo assim o Direito penal tem a função de ultima ratio, só devendo agir quando nenhuma outramedida ou ramo do direito conseguir resolver o conflito. O princípio da insignificância à primeira vista pode parecer injusto, afinal quem comete um crime deve ser punido por ele, entretanto, deve ser punido de forma equivalente ao delito cometido, se não houve dano capaz de lesar o bem jurídico não se deve falar em pena para quem o cometeu. Podemos então dizer que o princípio da insignificância veio proteger aqueles que por um deslize ou por necessidade comete um ato ilegal perante a lei, mas que se acredita que não voltará a cometê-lo e não para despenalizar delitos. 6.2 Princípio da Insignificância como causa de absolvição O princípio da insignificância como causa de absolvição, gera um grande questionamento, acerca de se pode ser considerado um avanço social ou se contribui para o aumento da criminalidade com base na impunibilidade. Vale lembrar que grande parte da doutrina caracteriza como avanço social, vez que o princípio é aplicado pois não é considerado justo punir aqueles que cometeram crimes bagatelares, além de contribuir com a economia jurídica e evitar a superlotação carcerária. Porém é notório que o fato desse princípio ser aceito, pessoas de má-fé podem usá-lo como pretexto para praticarem crimes considerados irrelevantes, não temendo a punição, mas vale lembrar que não é bem assim, pois cabe ao juiz decidir sobre a aplicabilidade do princípio e ele irá analisar o caso concreto para só assim formular sua decisão. 34 Seria errado generalizar uma ou outra conduta, mas podemos dizer que há uma evolução social de modo geral, o direito está em constante aperfeiçoamento para acompanhar o desenvolvimento da população, o princípio da insignificância como dito antes veio para cessar o uso excessivo e desnecessário do direito penal, que estava sobrecarregado com assuntos irrelevantes. 35 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS O desenvolvimento do presente estudo foi elucidado devido a sua significativa importância, a fim de esclarecimentos sobre o Princípio da Insignificância e sua aplicabilidade. Com a análise desenvolvida nesse trabalho acerca desse princípio, observa- se que sua evolução se deu de forma gradativa ao decorrer do tempo, incluindo sua possível origem. Esse princípio que ganhou força assim como todos os demais a partir da constituição federal de 1988, tem sido cada vez mais utilizado em teses de defesas em todo o Brasil. O princípio da insignificância se trata de uma excludente de tipicidade dos crimes considerados de pouca ou nenhuma relevância também conhecido como crimes de bagatela. Após abordar o conceito de crime e entender que se considera crime todo fato típico, ilícito e culpável. Os crimes de bagatela por ser considerado insignificante sendo assim considerados incapazes de provocar lesão grave a um bem juridicamente tutelado ou a sociedade, torna inexistente a tipicidade conglobante e sem ela o fato deixa de ser típico e consequentemente deixa de ser crime. A grande maioria da jurisprudência tem entendido pela aplicação do princípio estudado. Como não há legislação especifica tratando do princípio da insignificância o STF definiu alguns requisitos para a aplicação do princípio da insignificância. O trabalho abordou também como o princípio da insignificância pode refletir no meio social, se é uma evolução social ou se é um modo de impunidade aqueles que cometem pequenos delitos. Diante de todo o exposto, chega-se à conclusão de que o princípio da insignificância é uma evolução social, um modo de obter justiça de acordo com cada caso concreto e suas respectivas características, um princípio no qual vem se desenvolvendo junto com a sociedade e sua aplicabilidade tem cada vez ganhando mais força e credibilidade diante de todo o ordenamento jurídico e perante a sociedade. 36 REFERÊNCIAS BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral 1. 17ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. E-book. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988 BRASIL. Vade Mecum: Código Penal. Coordenação de Camilla Furegato da Silva.16ªed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Direito Penal. Atipicidade. Princípio da Insignificância. Parâmetros e critérios. Inexpressividade da lesão jurídica provocada. Ausência. Inaplicabilidade. Habeas Corpus Denegado. Recurso em Habeas Corpus 96813. Relator: Ministra Ellen Gracie, 31/03/2009. Diário da Justiça 24/04/2009. Decisão unanime. BRASIL. Supremo Tribunal Federal, 2ª turma. Principio da Insignificância. Identificação dos vetores cuja presença legitima o reconhecimento desse postulado de politica criminal. Consequente descaracterização da tipicidade penal, em seu aspecto material. Considerações em torno da jurisprudência do STF. Medida liminar concedida. Relator: Ministro Celso de Mello, 26/06/2004. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus. Penal Militar. Paciente condenado pelo crime de deserção. Absolvição. Principio da Insignificância. Inaplicabilidade. Razoável grau de reprovabilidade de conduta. Ordem denegada. Habeas Corpus. Adriano Alcides Pereira, Defensoria Publica da União, Defensor Público-Geral Federal, Superior Tribunal Militar. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski. Acórdão 19/11/2013. Diário da Justiça 03/12/2013. Decisão unanime. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus. Penal. Desenvolvimento de atividades clandestinas de telecomunicação. Artigo 183 da lei nº9472/97. Principio da insignificância. Possibilidade, em razão das particularidades do caso concreto. Procedente. Inexistência de lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora. Demonstração da ausência de periculosidade social da ação e do reduzido grau de reprovabilidade da conduta. Ordem concedida. Habeas Corpus 122507. Renato da Conceição de Souza, Defensoria Publica da União, Defensor Público- Geral Federal. Relator: Ministro Dias Toffoli. Acórdão 19/08/2014. Diário da Justiça 07/10/2014. Vencidos os ministros Luiz Fux e Marco Aurélio. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus. Crime de moeda falsa. Principio da Insignificância. Descaracterizada a mínima ofensividade da conduta. Habeas corpus denegado. Habeas Corpus 187.077. Gilvane da Silva Pereira, Defensoria Publica da União, Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Relatora: Ministra Laurita Vaz. Acórdão 07/02/2013. Diário da Justiça 18/02/2013. Decisão unanime. BUSATO, Paulo César. Fundamentos para um Direito Penal Democrático. 5ª edição. São Paulo: Editora Atlas, 2015. E-book. 37 DA SILVA, Ivan Luiz. Princípio da Insignificância no Direito Penal. 1ª edição. Curitiba: Juruá, 2004. FRANCELIN, Antônio Edison. O Instituto do Princípio da Insignificância.Jusbrasil. Disponível em:https://antoniofrancelin.jusbrasil.com.br/artigos/136366553/o-instituto- do-principio-da-insignificancia-parte-i. Acesso em: 06 abril 2019. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 19ª edição. Niterói- RJ: Editora Impetus,2017. E-book. GUIMARAES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Universitário Jurídico. 19ª edição. São Paulo: Editora Rideel,2014. p.225. MASSON, Cleber. Direito Penal: Parte Geral esquematizado. 4ª edição. São Paulo: Editora Método, 2011. MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 31ª edição. São Paulo: Editora Atlas, 2015. NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais comentadas. 4ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. https://antoniofrancelin.jusbrasil.com.br/artigos/136366553/o-instituto-do-principio-da-insignificancia-parte-i https://antoniofrancelin.jusbrasil.com.br/artigos/136366553/o-instituto-do-principio-da-insignificancia-parte-i
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