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CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE DO ADOLESCENTE CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE DO ADOLESCENTE ORGANIZADORA ANA GABRIELA SILVA ORGANIZADORA ANA GABRIELA SILVA Cuidado Integral à saúde do adolescente Cada indivíduo tem uma maneira de encarar as mudanças que ocorrem na adolescência. Cada um enfrenta de uma forma. Neste livro, vamos tratar de vários aspectos envolvidos no cuidado da saúde do adolescente. Discu- tiremos sobre alguns conceitos relativos a essa fase; situações de vulnera- bilidade, desenvolvimento da sexualidade e o papel da família; saúde e os distúrbios alimentares; e, por �m, saúde ginecológica e uso de álcool e drogas. O conteúdo é explicado de forma didática e clara e traz uma abordagem ampla dos principais focos de atenção para o cuidado da saúde em diversas situações na enfermagem. Bons estudos! gente criando futuro GRUPO SER EDUCACIONAL C M Y CM MY CY CMY K CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE ADOLESCENTE Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, do Grupo Ser Educacional. Diretor de EAD: Enzo Moreira Gerente de design instrucional: Paulo Kazuo Kato Coordenadora de projetos EAD: Manuela Martins Alves Gomes Coordenadora educacional: Pamela Marques Equipe de apoio educacional: Caroline Guglielmi, Danise Grimm, Jaqueline Morais, Laís Pessoa Designers gráficos: Kamilla Moreira, Mário Gomes, Sérgio Ramos,Tiago da Rocha Ilustradores: Anderson Eloy, Luiz Meneghel, Vinícius Manzi Silva, Ana Gabriela. Cuidado integral à saúde do adolescente / Ana Gabriela Silva. – São Paulo: Cengage, 2020. Bibliografia. ISBN 9786555581461 1. Saúde - enfermagem. 2. Adolescência - Saúde. Grupo Ser Educacional Rua Treze de Maio, 254 - Santo Amaro CEP: 50100-160, Recife - PE PABX: (81) 3413-4611 E-mail: sereducacional@sereducacional.com “É através da educação que a igualdade de oportunidades surge, e, com isso, há um maior desenvolvimento econômico e social para a nação. Há alguns anos, o Brasil vive um período de mudanças, e, assim, a educação também passa por tais transformações. A demanda por mão de obra qualificada, o aumento da competitividade e a produtividade fizeram com que o Ensino Superior ganhasse força e fosse tratado como prioridade para o Brasil. O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – Pronatec, tem como objetivo atender a essa demanda e ajudar o País a qualificar seus cidadãos em suas formações, contribuindo para o desenvolvimento da economia, da crescente globalização, além de garantir o exercício da democracia com a ampliação da escolaridade. Dessa forma, as instituições do Grupo Ser Educacional buscam ampliar as competências básicas da educação de seus estudantes, além de oferecer- lhes uma sólida formação técnica, sempre pensando nas ações dos alunos no contexto da sociedade.” Janguiê Diniz PALAVRA DO GRUPO SER EDUCACIONAL Autoria Ana Gabriela Silva Doutora em Ciências pela Universidade Federal de São João del-Rei (2020). Especialista em Programa de Saúde da Família pela Faculdade Batista de Minas Gerais (2019). Especialista em Urgência e Emergência pela Faculdade Batista de Minas Gerais (2019). Mestre em Ciências pela Universidade Federal de São João del-Rei (2017). Bacharel em Enfermagem pela Universidade Federal de São João del-Rei. SUMÁRIO Prefácio .................................................................................................................................................8 UNIDADE 1 - Introdução à adolescência .........................................................................................11 Introdução.............................................................................................................................................12 1 Visão histórica e perspectiva atual da adolescência ..........................................................................13 2 Crescimento e desenvolvimento puberal .......................................................................................... 19 3 Síndrome da adolescência normal ..................................................................................................... 23 PARA RESUMIR ..............................................................................................................................28 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................29 UNIDADE 2 - Situações de vulnerabilidade, desenvolvimento da sexualidade e o papel da família na adolescência ............................................................................................................31 Introdução.............................................................................................................................................32 1 Adolescência, cultura, vulnerabilidade e risco ................................................................................... 33 2 Sexualidade ........................................................................................................................................38 3 Adolescência e família ....................................................................................................................... 41 PARA RESUMIR ..............................................................................................................................47 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................48 UNIDADE 3 - Saúde dos adolescentes e distúrbios alimentares ......................................................49 Introdução.............................................................................................................................................50 1 Atenção integral à saúde do adolescente .......................................................................................... 51 2 Atenção à saúde mental dos adolescentes ........................................................................................ 52 3 Trabalho e saúde na adolescência ..................................................................................................... 53 4 Adolescente portador de patologia crônica ....................................................................................... 55 5 Transtornos alimentares .................................................................................................................... 68 PARA RESUMIR ..............................................................................................................................73 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................74 UNIDADE 4 - Saúde ginecológica e uso de álcool e drogas na adolescência ....................................75 Introdução.............................................................................................................................................76 1 Anticoncepção na adolescência ......................................................................................................... 77 2 Gravidez na adolescência ................................................................................................................... 79 3 Teste rápido de gravidez e pré-natal na adolescência ........................................................................80 4 Doenças sexualmente transmissíveis e saúde reprodutiva na adolescência .....................................82 5 Álcool e drogas na adolescência ........................................................................................................ 85 6 Violência ............................................................................................................................................887 Risco de suicídio na adolescência ...................................................................................................... 90 PARA RESUMIR ..............................................................................................................................92 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................93 A adolescência é um período de várias transformações e que ensejam muitos cuidados e orientações para o enfrentamento. Neste livro, vamos abordar os principais temas para ajudar o profissional de enfermagem em seus estudos e na sua atuação, em quatro unidades: introdução à adolescência; situações de vulnerabilidade, desenvolvimento da sexualidade e o papel da família na adolescência; saúde dos adolescentes e os distúrbios alimentares; e, por fim, saúde ginecológica e uso de álcool e drogas na adolescência. Na primeira unidade, você verá uma introdução à adolescência, ou seja, abordaremos o conceito de adolescente ao longo da história e sua perspectiva atual. Os marcos históricos dos direitos dos adolescentes também serão assunto desta unidade. Falaremos também sobre como ocorre o crescimento e o desenvolvimento do corpo e de que maneira impacta no biológico e no psicológico do indivíduo. Por fim, você aprenderá sobre a síndrome da adolescência normal, ou seja, quais são as alterações que ocorrem em um adolescente normal e como podemos identificar o que é anormal. Na segunda unidade, falaremos sobre as situações de vulnerabilidade, desenvolvimento da sexualidade e o papel da família na adolescência. Discutiremos sobre os fatores de vulnerabilidade e risco na adolescência e, também, sobre a sexualidade, o papel do serviço de saúde no reconhecimento e na expressão da sexualidade. Por fim, falaremos sobre o papel da família na vida do adolescente e como ela pode auxiliar no enfretamento dos fatores de risco, vulnerabilidade e no processo de descobrimento da sexualidade. A saúde dos adolescentes e os distúrbios alimentares serão os temas da terceira unidade. Discutiremos sobre a saúde integral e a saúde mental do adolescente, além de abordar a importância do trabalho na adolescência e os impactos para a saúde física e mental que os profissionais de saúde precisam estar atentos. Você terá oportunidade também de conhecer as principais patologias crônicas que podem acometer o adolescente. Os transtornos alimentares anorexia e bulimia serão tratados ao final da unidade. Na unidade quatro, saúde ginecológica e uso de álcool e drogas na adolescência, falaremos sobre a anticoncepção na adolescência e como o enfermeiro deve atuar nessa situação. Você entenderá como deve ser a conduta nos casos de gravidez e como auxiliar o adolescente durante esse momento de mudança. Além disso, saiba a importância de acolher adolescentes e como orientá-los para que possam realizar o PREFÁCIO pré-natal de maneira segura e saudável. As doenças sexualmente transmissíveis e as formas de prevenção serão também discutidas aqui, além de oferecer um panorama de como deve ser a conduta no trato com adolescentes que fazem uso de álcool e drogas, bem como qual deve ser o suporte que os profissionais de saúde devem oferecer a eles. Por fim, trataremos de um importante aspecto sobre como reconhecer e lidar com adolescentes em situação de violência e risco suicida. Um livro didático e muito bem explicado que leva você a aprender os principais aspectos dos cuidados com os adolescentes. Bons estudos! UNIDADE 1 Introdução à adolescência Olá, Você está na unidade Introdução à adolescência. Conheça aqui sobre o conceito de adolescente ao longo da história e sua perspectiva atual. Você conhecerá também os marcos históricos dos direitos dos adolescentes. Além disso, você verá como ocorre o crescimento e o desenvolvimento do corpo e como isso pode afetar o biológico e o psicológico do indivíduo. Por fim, você aprenderá sobre a síndrome da adolescência normal, ou seja, quais são as alterações que ocorrem em um adolescente normal e como podemos identificar o que é anormal. A adolescência é uma fase que todos os adultos vivenciaram, mas o enfrentamento e as mudanças podem ser encarados de maneiras diferentes por cada indivíduo. Bons estudos! Introdução 13 1 VISÃO HISTÓRICA E PERSPECTIVA ATUAL DA ADOLESCÊNCIA O termo adolescência refere-se a um período de passagem entre a infância e a vida adulta. No entanto, não é apenas uma passagem que ocorre nesse momento, mas a construção e a compreensão do ser como um todo. Essa compreensão não ocorre de maneira simples, pois, na adolescência, o indivíduo não é mais uma criança e ainda não é um adulto, assim, ele encontra-se em uma condição perturbadora e com muitas mudanças psicológicas, biológicas e sociais. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), adolescentes são todos os sujeitos entre dez e 19 anos de idade. No Brasil, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os indivíduos entre 12 e 18 anos são considerados adolescentes. Esse estatuto traz essa idade como uma demarcação legal dos direitos e um marco civil, que é a maioridade, mas descarta os dois primeiros anos da adolescência (dez e 11 anos), em que ocorrem as mudanças corporais, e o último ano (19 anos), que marca a mudança psíquica, caracterizando o indivíduo como um adulto. 1.1 Evolução histórica da adolescência A adolescência é marcada como uma etapa transitória entre a infância e a vida adulta, sendo essa uma classificação contemporânea que foi definida no século XX. Contudo, sabemos que essas mudanças são fisiológicas e ocorrem de maneira natural durante o desenvolvimento da criança, sendo uma fase de mudanças corporais e sociais, conforme Brasil (2017). O início da puberdade é um marco importante na compreensão da construção histórica e social da adolescência. Ela possibilita a inserção do indivíduo no mundo adulto, permitindo um rito de passagem que mantém um significado simbólico para a sociedade. Socialmente, isso marca a transformação, transposição e autoafirmação que o jovem irá vivenciar. O adolescente, então, passa por todas as mudanças, porém sofre interferência do meio em que está inserido, sendo influenciado pelos aspectos culturais e sociais. 14 Figura 1 - Adolescentes Fonte: Monkeybusinessimages, iStock, 2020. #ParaCegoVer: a imagem mostra um grupo de seis adolescentes sorrindo. Nesse sentido, o indivíduo deixa de ser produto dos pais, consumindo apenas o que é ofertado, e passa a questionar e solicitar novas informações, definindo os seus próprios padrões de consumo. Isso ocorre de acordo com o meio que está inserido, com as informações que possui, com os amigos, redes sociais e a própria escola. Um adolescente inserido em um meio de outros jovens que praticam exercícios, têm alimentação balanceada e buscam atividades recreativas como cinema e teatro, por exemplo, tendem a relacionar-se buscando uma inserção nessas atividades. Porém, quando ele está inserido em um ambiente de violência, uso de drogas e sem opções de atividades culturais, poderá envolver-se no crime e passar a fazer parte daquele meio, considerando-o como algo normal dentro do que é oferecido para ele. Isso não quer dizer que o adolescente é puramente produto do meio em que está inserido, mas sim que ele busca as oportunidades conforme o que é oferecido para ele neste meio, visto que ele está passando pela sua construção social para iniciar a vida adulta. É importante definirmos puberdade e adolescência, pois esses termos muitas vezes são usados como sinônimos, mas não são. A puberdade está dentro do período da adolescência. Ela é caracterizada pelas mudanças físicas e corporais da criança, ocorrendo de maneira fisiológica para que o indivíduo possa se reproduzir, ou seja, é o amadurecimento do corpo da menina e do menino preparando-se para o início da reprodução. Já a adolescência é um momento maior que irá compreenderdesde as mudanças físicas do corpo até a formação psicológica e social do indivíduo para o início da vida adulta, segundo Brasil (2017). A puberdade, então, constitui um conjunto de alterações biológicas que ocorrem no corpo infantil transformando-o em um corpo adulto, sendo esta um dos elementos que fazem parte da adolescência. Nesse período inicial, ocorre o crescimento físico (estatura), a maturação 15 sexual com o desenvolvimento dos órgãos reprodutores e o surgimento dos caracteres sexuais secundários. A partir do desenvolvimento das características e do amadurecimento dos órgãos sexuais, surge a sexualidade que, por sua vez, envolve a identidade de gênero, orientação sexual, erotismo, prazer, intimidade e reprodução. A sexualidade pode ser tratada de formas diferentes ao longo da história e de acordo com a cultura. No Ocidente, por exemplo, durante a Idade Moderna, ela era considerada como pecado ou até mesmo uma patologia, na visão da religião. Sendo associada sempre a valores morais, sociais, religiosos e históricos, não existe um padrão social que a define, ou seja, em cada grupo social ela irá ser expressa de uma maneira particular. A expressão da sexualidade deve ser compreendida, portanto, do ponto de vista de cada grupo social, não devendo ser julgada pelo ponto de vista de quem está de fora, prestando uma assistência à saúde por exemplo. A adolescência, desde a antiguidade, é um momento que todas as crianças percorrem até chegarem na fase adulta, quando passam ter plena responsabilidade sobre si e sobre todas as suas atitudes e escolhas. Dessa forma, o jovem é historicamente considerado como transgressor das regras, malfeitor e preguiçoso e, além disso, como um ser que exalta a vaidade. O termo adolescência que utilizamos atualmente não existia na Antiguidade e nem na Idade Média. Nesse período, ocorria apenas a troca das roupas infantis para as de adulto, associadas ao surgimento fisiológico dos caracteres sexuais secundários, como o aparecimento de pelos nas axilas, na genitália, na face dos meninos e o amadurecimento dos órgãos sexuais. Assim, ocorria uma passagem direta entre a infância e a idade adulta. Somente a partir da Revolução Industrial foi que o jovem passou a ter sua formação intelectual e profissional controlada e direcionada a uma educação especializada, ou seja, a educação passa a ter uma base educacional. Além disso, os pais e seus filhos passaram a ter uma interação maior. Apesar disso, ainda não existia uma diferença entre infância e adolescência bem compreendida. Algumas obras literárias mostram bem os aspectos dramatizados da adolescência nesse período, como as obras Hamlet e Romeu e Julieta de Shakespeare. Assim, apenas no século XIX ocorreu a evolução conceitual da adolescência, fornecendo base para os estudos atuais. Porém, ainda hoje existe uma disparidade de pontos de vista quanto ao início e o término da adolescência, sendo que o seu início apresenta um consenso devido às mudanças físicas que ocorrem, mas o seu final ainda permanece como um conceito divergente. 1.2 Marcos históricos Os direitos humanos são universais, indivisíveis e independentes, segundo a Constituição Brasileira. Contudo, isso teve início em 1948 a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela Organização das Nações Unidas. A partir de então, várias convenções internacionais e 16 a elaboração de estatutos globais de cooperação mútua e mecanismos de controle passaram a garantir a não violação e o exercício, pelo cidadão, de um conjunto de direitos básicos à vida digna. Os Pactos Internacionais de Direitos Civis e Políticos e de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, foram ratificados pelo Brasil 1992, reconhecendo os direitos humanos como universais no plano individual, coletivo e social. Além disso, o direito da criança e do adolescente à especial proteção do Estado, da sociedade e da família foram garantidos e implementados pelas nações, de acordo com Brasil (2007). Os seguimentos que são considerados frágeis como os negros, mulheres, crianças, adolescentes e idosos tiveram medidas criadas de maneira específica a fim de garantir os seus direitos universais. O objetivo dessas medidas específicas são eliminar qualquer forma de discriminação racial e garantir que os seus direitos sejam respeitados. No Brasil, os direitos humanos são direitos garantidos a todos os cidadãos, reconhecidos na legislação brasileira como cláusulas pétreas, cuja efetivação é protegida e garantida. A Constituição Federal Brasileira de 1988 aborda no seu artigo 227 que [é] dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Outras leis auxiliam nesse comprometimento de garantir os direitos, a assistência e os cuidados com os adolescentes, tais como: Lei número 8.069, de 13 de julho de 1990 Regulamentou o Estatuto da Criança e do Adolescente que já havia sido garantida pelo o artigo 227 da Constituição Federal, conforme Brasil (1990). Lei número 8.080, de 19 de setembro de 1990 A Lei Orgânica da Saúde regulamentou e concebeu a saúde como um direito social, independente de contribuição criando o Sistema Único de Saúde (SUS), com base na Constituição Federal, segundo Brasil (1990). Lei número 8.742, de 7 de dezembro de 1993 A Lei Orgânica da Assistência Social regulamentou o direito constitucional à assistência social do Estado, garantindo a proteção especial à adolescência e ao amparo aos adolescentes carentes, independente de contribuição. 17 Lei número 9.394, de 20 de dezembro de 1996 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira regulamentou o direito à educação também como direito público subjetivo de todo cidadão. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: odas essas legislações procuram descentralizar a política e a administração dos serviços, visando a participação social na formulação das políticas sociais. Assim, garante que todos tenham seus direitos respeitados e a assistência garantida, pois não é apenas uma responsabilidade política, mas sim uma responsabilidade social. 1.3 Direitos e normas voltados a condições especiais na adolescência Outras leis garantem direitos em situações especiais como a lei número 6.202, de 17 de abril de 1975, que estabelece o direito de adolescentes gestantes a partir do oitavo mês de gestação e no primeiro trimestre após o parto poderem receber os conteúdos escolares em casa. As atividades avaliativas podem ocorrer normalmente, porém devem ser realizadas no domicílio da adolescente nesse período. Garantindo-se, assim, a continuidade dos estudos, de acordo com Brasil (1975). Em relação à licença maternidade, é garantida pela Constituição Federal Brasileira de 1988 por um período de quatro meses, contando a partir do dia do nascimento da criança. É importante lembrar que a licença maternidade só é concedida para as gestantes que estão com vínculo empregatício, nos casos das domésticas ou mães que estão desempregadas não é garantido esse auxílio. Outra lei, a de número 9.263, de 12 de janeiro de 1996, regulamenta o planejamento familiar. Essa lei não aborda expressamente sobre a saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes. Porém, isso não é uma barreira para o acesso aos serviços de saúde, constituindo também um direito do 18 adolescente ao atendimento integral e incondicional, já garantidos pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, por meio do Sistema Único de Saúde. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: O adolescente tem direito ao atendimento e à assistência à saúde conforme a sua necessidade, de forma integral. Ao buscar atendimento no serviço de saúde com ou sem acompanhante,ele deve ser ouvido e atendido, de maneira que tenha seus problemas psicobiológicos resolvidos. Ainda hoje, não é incomum o profissional de saúde, ao assistir um adolescente, solicitar a presença de um acompanhante, mas devemos lembrar que o adolescente pode escolher o atendimento sem a presença de nenhum familiar ou acompanhante, por exemplo. Devemos atentar para o fato de que, apesar de ser um grupo vulnerável, os adolescentes têm a capacidade de escolha e de compreensão para escolher o que acreditam ser o melhor para si. Nos casos em que houver suspeita ou denúncia por parte do adolescente sobre violência sexual, ele deve ser assistido sem julgamento e as medidas necessárias tomadas, como a averiguação da situação, denúncia aos órgãos competentes e proteção do adolescente para que a situação não ocorra novamente. . 19 Figura 2 - Problemas da adolescência Fonte: Alexander Raths, Shutterstock, 2020. #ParaCegoVer: a imagem mostra um adolescente sentado, de cabeça baixa, entristecido e sozinho. A Portaria MS/GM número 104, de 25 de janeiro de 2011, atribui como notificação compulsória sobre casos de violência doméstica, sexual e/ou outras violências. Sendo que os profissionais de saúde devem realizar a notificação, em todos os serviços de saúde, públicos ou privados. O Ministério da Saúde traçou diretrizes em nível nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes na Promoção, Proteção e Recuperação da Saúde em 2010, buscando sensibilizar os gestores para uma visão humanizada. Além disso, destaca a importância de construir estratégias intersetoriais que atendam as vulnerabilidades dos adolescentes, permitindo que esse grupo possa ter um desenvolvimento saudável. 2 CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO PUBERAL A puberdade/adolescência não pode ser estudada isoladamente, pois a puberdade corresponde às modificações biológicas e a adolescência, a um período em que ocorrem as transformações biopsicossociais em que elas se inserem, ou seja, puberdade está relacionada com as mudanças dos aspectos físicos e biológicos que se iniciam ao final da infância. Durante a puberdade, a criança perde o modo infantil e começa a sentir as primeiras modificações corporais, como o crescimento pôndero-estatural; a modificação da composição corporal (desenvolvimento esquelético e muscular e as modificações na quantidade e distribuição de gordura); desenvolvimento do sistema cardiorrespiratório (aumento da força e da resistência); e desenvolvimento do aparelho reprodutor. 20 2.1 Desenvolvimento físico e corporal A palavra puberdade tem origem do latim pubertate, significando idade fértil. Já a palavra pubis é traduzida como pelo ou penugem. Assim, a puberdade é um conjunto de mudanças somáticas da adolescência que engloba o estirão, que é o crescimento rápido seguido pela desaceleração do crescimento ponderal e estatural; alteração da composição e proporção corporal devido às mudanças decorrentes do crescimento esquelético, muscular e redistribuição do tecido adiposo; e desenvolvimento dos sistemas orgânicos, com ênfase no sistema circulatório e respiratório. Além disso, ocorre o amadurecimento sexual, com o desenvolvimento das características sexuais secundárias, conforme Ministério da Saúde (2017). A estatura, ou altura, apresenta, durante a puberdade, um processo dinâmico entre o crescimento e o tempo, ocorrendo um crescimento mais rápido que, posteriormente, desacelera e para, chegando o indivíduo à sua estatura máxima. Durante o período da adolescência, ocorre um aumento total de dez a 30 centímetros, sendo o crescimento médio de 20 centímetros. A média de crescimento para o sexo masculino é de dez centímetros por ano e para o sexo feminino de nove centímetros por ano, sendo que os meninos apresentam o período de estirão entre os 13 e 14 anos de idade, enquanto as meninas entre 11 e 12 anos de idade. Após esse desenvolvimento rápido, ocorre uma desaceleração do crescimento, que pode durar de três a quatro anos, até que o indivíduo chega à sua estatura máxima e o crescimento chega ao final, segundo Ministério da Saúde (2017). A idade óssea é caracterizada pelas alterações evolutivas da maturação óssea e acompanha a idade cronológica, sendo um indicador biológico. Essa idade pode ser calculada através da comparação de radiografias de punho, de mão e de joelho com padrões estabelecidos de tamanhos e forma dos núcleos dessas estruturas. O crescimento em estatura não ocorre de forma semelhante em todos os indivíduos, não somente pela diferença de sexo. O Brasil é um país heterogêneo que apresenta uma grande variedade populacional. A população da região nordeste apresenta uma estatura mais baixa, já a população da região sul, uma estatura mais alta, o que tem influência direta no padrão de crescimento durante a puberdade. O profissional de saúde, ao acompanhar o crescimento e desenvolvimento do adolescente, deve estar atento aos problemas hormonais e nutricionais, por exemplo, que podem afetar o crescimento e desenvolvimento dele. Os órgãos do corpo humano acompanham o crescimento do corpo durante a puberdade, sendo que apenas o tecido linfoide e a gordura subcutânea apresentam um decréscimo nesse período. A gordura tem o seu acúmulo desde os oito anos de idade até a puberdade, reduzindo quando ocorre o estirão. O sistema muscular sofre hipertrofia e hiperplasia, sendo mais visível nos meninos, 21 justificando a sua maior força muscular. A medula óssea apresenta uma redução sua na cavidade, sendo maior nas meninas, o que explica o maior volume medular nos meninos. Além disso, os meninos apresentam maior estimulação da eritropoetina devido ao hormônio testosterona. Eles apresentam, consequentemente, maior concentração de células vermelhas, hemoglobina, e de ferro sérico, de acordo com Ministério da Saúde (2017). O desenvolvimento das características sexuais ocorre devido ao hipotálamo estimular a hipófise a produzir hormônios de crescimento e amadurecimento sexual. As meninas apresentam um aumento do estrogênio e da progesterona, que são os hormônios responsáveis por essas características, e também pelo desenvolvimento dos órgãos sexuais para que possa ocorrer a reprodução. Nos meninos, ocorre o aumento da produção testosterona, sendo esse hormônio responsável pelas características secundária e também pela produção de espermatozoides. Além disso, a testosterona também está relacionada com o desejo sexual, a agressividade, o crescimento em estatura e a força física dos meninos, conforme Ministério da Saúde (2017). Ocorrem também alterações no sistema tegumentar, ficando a pele mais oleosa, principalmente nos meninos, o que propicia o surgimento de acne. Em alguns casos, isso não afeta a vida do adolescente, mas quando a acne é excessiva, causa desconforto e até mesmo lesões na pele. Dessa forma, o adolescente deve ser encaminhado para um atendimento especializado, no caso, de um dermatologista. Nas meninas é comum o surgimento das espinhas, porém relacionada ao ciclo hormonal, devido à menstruação. Pode ser necessário encaminhar as meninas para o acompanhamento ginecológico, em casos de espinhas excessivas e também nos casos de dismenorreia frequente. As meninas e os meninos apresentam um ganho de peso de aproximadamente nove a dez quilos, mas esse acúmulo ocorre para os meninos em forma de músculo e para as meninas em forma de tecido adiposo. É importante observar e acompanhar o ganho de peso, pois o excesso pode gerar a obesidade. A obesidade pode influenciar no crescimento ósseo, devido à sobrecarga de peso, e é um fator de risco para o desenvolvimento da diabetes tipo II na adolescência e das doenças cardiovasculares. FIQUE DE OLHO Durante o crescimento dos meninos, as mãos e os pés desenvolvem-se primeiro, sendo seguido pelo desenvolvimento dos braços e das pernas. Isso ocorre antes do estirão de crescimento do tronco e da altura, o que ocasiona, no crescimento dos meninos, desproporcionalidade temporária, que podeocasionar problemas psicológicos devido a visão distorcida do próprio corpo. 22 2.2 Etapas do crescimento O crescimento em estatura começa pelos pés, seguido pelo das extremidades e do tronco dos indivíduos. O diâmetro biacromial cresce com maior intensidade no sexo masculino, enquanto que, no sexo feminino, observamos o alargamento pélvico. Em relação ao aparecimento dos pelos, primeiro surgem os pubianos, sendo seguidos pelos axilares, que ocorrem cerca de dois anos depois deles. Nos homens, os pelos da face surgem junto com os axilares. As mudanças na laringe alteram as cordas vocais, tornando a voz dos homens mais grave. Essa mudança ocorre em um prazo médio de seis meses até que a voz torne permanente, ou seja, a voz do adulto. Com respeito às mudanças sexuais, no sexo masculino, observamos que os hormônios folículo-estimulante e luteinizante estimulam o aumento dos testículos. A partir dos testículos aumentados, ocorre o aumento da luz dos túbulos seminíferos e ocorre a proliferação das células intersticiais de Leydig. Essas células liberam a testosterona e elevam os seus níveis séricos, segundo Ministério da Saúde (2017). Os testículos aumentam o seu volume em aproximadamente quatro centímetros cúbicos, sendo a primeira manifestação do início da puberdade masculina. Em seguida, ocorre o surgimento dos pelos pubianos e, por fim, o desenvolvimento do pênis. O pênis apresenta aumento no seu comprimento e diâmetro. Quanto ao sexo feminino, os hormônios folículo-estimulante e luteinizante estimulam os ovários a iniciarem a síntese hormonal de estrógeno e progesterona. Esses dois hormônios são os responsáveis pelas transformações puerperais na menina. O início da puberdade é marcado pelo surgimento do broto mamário, seguido pelo aparecimento dos pelos pubianos e, por fim, a menarca (primeira menstruação da menina). A evolução do desenvolvimento e da distribuição dos pelos pubianos ocorre de forma semelhante em ambos os sexos. Isso ocorre de maneira progressiva, surgindo os primeiros pelos mais finos, seguidos pelo seu espessamento e aumento da pigmentação (escurecimento). FIQUE DE OLHO A primeira menstruação da menina, a menarca, não marca o início da função reprodutiva. Nem todas as meninas apresentam o corpo completamente desenvolvido para a reprodução, ou seja, os primeiros ciclos podem ser anovulatórios. Porém, é importante lembrar que nem todas as meninas se comportam de forma semelhante e pode ocorrer gravidez na menarca. 23 3 SÍNDROME DA ADOLESCÊNCIA NORMAL A fase da adolescência é um processo que envolve o ser humano em um processo de admitir e compreender a si mesmo e as mudanças psicossociais e biológicas que estão ocorrendo. Esse período é marcado como uma fase de ousadia, timidez, urgência, apatia e conflitos afetivos, religiosos e sociais. Mas tudo isto faz parte da síndrome normal da adolescência. O adolescente precisa conviver e superar os três lutos que correspondem à perda do corpo infantil, à perda da identidade da infância e à perda da figura protetora dos pais. A partir disso, o adolescente começa a ver o seu mundo interno fortificado e torna-se, então, menos conflitivo e perturbado. 3.1 Busca da sua identidade Os pais e os profissionais de saúde não devem apontar a infância ou a adolescência como fase de preparação para a maturidade. Esses dois períodos devem ser compreendidos como parte do desenvolvimento natural do indivíduo. A criança apresenta dificuldade quando passa para a adolescência, pois é um período de incertezas e conflitos decorrentes das mudanças biológicas e psicológicas que estão ocorrendo simultaneamente. A adolescência tem seu início marcado pela puberdade, uma fase que apresenta mudanças físicas que acarretam no aumento do tamanho (estatura), do peso corporal, das proporções físicas e da fisiologia corporal. Todas essas modificações acarretam em mudanças da imagem corporal e, consequentemente, da sua representação para o sujeito da mudança. Associadas a essas mudanças, ocorre também a formação da identidade, como uma verdadeira experiência de autoconhecimento. A busca de identidade pelo jovem pode ocorrer em situações que se apresentam como favoráveis ao momento vivenciando e por meio de pessoas que estão próximas dele no convívio social, como, por exemplo, amigos que oferecem e proporcionam ao jovem segurança e estima pessoal. Porém, também pode ocorrer o comportamento inverso, quando o adolescente se identifica com figuras negativas, como quem transgride as regras. Isso é um problema, pois pode levar à um comportamento agressivo, radical e até o envolvimento com uso de drogas ilícitas. Quando a transgressão não é identificada no início ou é tratada como algo passageiro, pode vir a ser um problema maior, em que o adolescente se envolve com crime e, muitas vezes, não consegue se regenerar sem ajuda profissional e apoio dos familiares, de acordo com Aberastury e Knobel (2003). Ainda existem comportamentos que são comuns aos adolescentes, como o uso de identidades transitórias. Nesse sentido, tem-se, por exemplo, a identidade machista no homem com o objetivo de seduzir garotas. Assim, o jovem pode apresentar identidades ocasionais em situações novas, como no primeiro encontro ou primeira festa, ou identidade transitória quando está em público 24 com os pais, em que muda o comportamento comparando-se ao que apresenta quando está em casa. Conforme Aberastury e Knobel (2003), essas são mudanças com o intuito de autoafirmação. Figura 3 - Busca pela identidade Fonte: SolStock, iStock, 2020. #ParaCegoVer: a imagem mostra uma montagem com diferentes fotos de diferentes jovens que compõem um mesmo adolescente. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 25 Durante a infância, ocorre a identificação da criança com os pais, incorporando imagens deles como seres bons e ruins, permitindo, assim, a elaboração de situações mutáveis que irão ocorrer a partir do início do período da adolescência. Nesse período, a busca pela identidade é iniciada, sendo que o jovem passa por situações em seu cotidiano que irão demandar decisões próprias e isso pode ser uma das suas maiores dificuldades. As primeiras mudanças são notáveis em sua relação com os pais, mudando o seu comportamento frente a eles, pois, a partir desse momento, ele é um ser que tem decisões próprias, não sendo mais uma criança totalmente submissa às decisões familiares. Além disso, ocorrem mudanças biológicas que são irreversíveis, como suas alterações corporais, que também serão parte da sua identidade como pessoa adulta. Por fim, ele, agora, é responsável pelos seus cuidados, não sendo isso mais atribuição dos pais, o que acarreta em uma separação por completo dos pais e dos filhos, tornando esses seres individuais, segundo Aberastury e Knobel (2003). 3.2 Tendência grupal A necessidade da busca da identidade no adolescente leva-o a um comportamento defensivo e à procura de uniformidade, que pode proporcionar segurança e estima pessoal. A partir disso, surge o espírito de grupo. Nesse período, há um processo de identificação em massa, em que os adolescentes se identificam com outro indivíduo da mesma idade. Esse processo pode ser intenso, fazendo com que a separação do grupo pareça impossível e o indivíduo sinta-se como parte do grupo de semelhantes e não mais como um membro de um grupo familiar. Assim, conforme Aberastury e Knobel (2003), o indivíduo não consegue se separar da turma nem de suas atividades ou ações diárias e escolares, tornando-se, inclusive, submisso às regras do grupo, especialmente em relação a modas, vestimenta, costumes e preferências de todos os tipos, por exemplo. A busca por grupos é, na maioria das vezes, uma busca de oposição aos pais, sendo, para o adolescente, uma maneira de estabelecer sua identidade diferente da deles. Isso é possível em grupos, pois os jovens encontram um reforço no aspecto mutável do ego durante esse período, sendo a autoafirmação, muitas vezes, a partir deatitudes contrárias à dos pais, o que é possível dentro do grupo, de acordo com Aberastury e Knobel (2003). O grupo tem uma importância diferente para o adolescente em relação àquela que ele mantinha no convívio familiar, em especial com os pais. Esse comportamento constitui uma transição entre o mundo interno (infância) e o mundo externo (adulto). Dessa forma, as experiências vividas em grupo têm um tempo de importância para o desenvolvimento, porém chega um ponto da evolução do adolescente em que ele começa a distanciar do grupo, mais ao final da adolescência, começando a assumir sua identidade de adulto. Isso não significa que ele se desvincule de suas amizades grupais, mas já não há mais a necessidade de convivência somente com o grupo. Nessa fase, ele passa, então, a assumir sua nova identidade e a buscar sua independência. Aqui, os pais tornam-se fundamentais e desempenham um papel ativo, auxiliando os filhos a conseguirem sua 26 independência social, segundo Aberastury e Knobel (2003). Figura 4 - Apoio familiar Fonte: Threerocksimages, Shutterstock, 2020. #ParaCegoVer: a imagem mostra um pai abraçando e acolhendo um filho chorando. Devemos diferenciar a conduta “psicopática” considerada normal do adolescente, que é mais evidenciada na convivência grupal. Nessa fase, ocorre uma confusão mental e revolta do adolescente pela perda do seu papel infantil, ocorrendo mudanças no comportamento que são expressas através condutas de desafeto, de crueldade, de indiferença e de falta de responsabilidade. Essas expressões são típicas em psicopatas, porém na adolescência ela é normal, pois é circunstancial e transitória, não sendo considerada o caráter psicopata. 3.3 Intelectualização e fantasia Os adolescentes necessitam de intelectualização e fantasias, sendo uma das formas típicas de expressarem seus pensamentos. Isso ocorre devido aos conflitos que acontecem com relação às mudanças corporais, a perda da identidade infantil e a mudança em sua relação com as figuras dos pais. Assim, o adolescente passa a fantasiar em busca de recompensar essas mudanças e as perdas vivenciadas. Dessa forma, a fantasia e a intelectualização são situações que fortificam o adolescente a vivenciar essas mudanças, conforme Aberastury e Knobel (2003). Por isso, é comum a variação da identidade no adolescente, pois ele projeta uma variação até a incorporação das suas características definidoras. O enfrentamento dessa variação ocorre através da expressão da sua intelectualização, buscando conhecimentos filosóficos, éticos e sociais que fundamentem o seu pensamento. Assim, é comum o adolescente desenvolver suas filosofias a fim de salvar a humanidade e de se envolver em movimentos políticos, por exemplo, para que possa expressar a sua intelectualização, principalmente em grupos. Outro comportamento é o desenvolvimento da escrita de versos, contos e pequenos textos para expressar seus sentimentos, 27 além de aumentar o tempo no envolvimento de atividades literárias e artísticas. Mas devemos lembrar que isso não significa comprometimento com os estudos, pois o adolescente busca realizar apenas as atividades que ele considera como prazerosas, deixando as obrigações muitas vezes em segundo plano, segundo Aberastury e Knobel (2003). 3.4 Deslocamento temporal Uma outra mudança é o pensamento do adolescente com respeito tanto ao aspecto temporal quanto ao espacial, uma vez que adquire características muito especiais. É possível dizer que o adolescente vive com uma “deslocalização” temporal, convertendo o tempo em presente e ativo numa tentativa de manejá-lo. As urgências para realização de algumas atividades ou mesmo ações são enormes e, às vezes, as postergações são aparentemente irracionais. Podemos citar dois casos hipotéticos. No primeiro, a mãe recrimina o filho para que ele estude, porque tem uma prova no dia seguinte, porém, para o filho, há tempo suficiente, uma vez que o exame é somente no outro dia. Já no segundo caso hipotético, uma adolescente chora angustiada queixando-se da atitude desconsiderada da mãe que não comprou o vestido novo para seu próximo baile que será somente daqui um mês. Ambas as situações mostram como a percepção do tempo é diferente para ambos, segundo Aberastury e Knobel (2003). Por fim, os pais não ficam alheios a essa mudança da temporalidade dos filhos e são muitas vezes sujeitos a ansiedade devido ao desprendimento dos adolescentes. O ambiente cultural e social em que a família e o adolescente vivenciam apresentam uma influência significativa para as transformações comportamentais destes, influenciando também na aceitação e enfrentamento dos pais. Assim, devemos lembrar de que a adolescência é, na maioria das vezes, reconhecida como um período hostil e cheio de estereótipos com os quais se tenta definir, caracterizar, assinalar e isolar os adolescentes do mundo dos adultos, de acordo com Aberastury e Knobel (2003). 28 Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • aprender sobre a evolução do adolescente na história; • conhecer os marcos legais para a saúde do adolescente; • estudar sobre o desenvolvimento corporal e físico do adolescente; • aprender sobre as etapas do crescimento e quais as mudanças que ocorrem em cada uma delas; • conhecer sobre a síndrome do adolescente normal e quais as mudanças que ocorrem nessa síndrome. PARA RESUMIR ABERASTURY, A.; KNOBEL, M. Adolescência normal: um enfoque psicanalítico. São Paulo: Editora Artmed, 2003. BRASIL. Marco legal: saúde, um direito de adolescentes. Brasília: Ministério da Saúde, 2007. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: DOU, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 05 de maio de 2020. BRASIL. Lei número 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e da outras providencias. Brasília: DOU, 1990a. Disponível em: . Acesso em: 05 de maio de 2020. BRASIL. Lei número 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e da outras providencias. Brasília: DOU, 1990b. Disponível em: . Acesso em: 05 de maio de 2020. BRASIL. Lei número 6.202, de 17 de abril de 1975. Dispõe sobre o regime de exercícios domiciliares. Brasília: DOU, 1975. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/1970-1979/l6202.htm. Acesso em: 05 de maio de 2020. BRASIL. Ministério da Justiça. Fundação Nacional do índio. Relatório de gestão 2008. Revista Adolescência e Saúde. v. 10, n. 3, p. 22-27, jul.-set. 2013a. Disponível em: . Acesso em: 05 de maio de 2020. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Proteger e cuidar da saúde de adolescentes na atenção básica. Brasília: Secretaria de Atenção à Saúde, 2017. Disponível em: < https://bvsms.saude.gov. br/bvs/publicacoes/proteger_cuidar_adolescentes_atencao_basica.pdf>. Acesso em: 05 de maio de 2020. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UNIDADE 2 Situações de vulnerabilidade, desen- volvimento da sexualidade e o papel da família na adolescência Olá, Você está na unidade Situações de vulnerabilidade, desenvolvimento da sexualidade e o papel da família na adolescência. Conheça aqui sobre os fatores de vulnerabilidade e risco na adolescência. Aprenda sobre a sexualidade e no que ela pode influenciar na vida do jovem. Entenda também qual é o papel do serviço de saúde no reconhecimento e na expressão da sexualidade. Por fim, conheça qual é o papel da família na vida do adolescente e como ela pode auxiliar no enfretamento dos fatores de risco, vulnerabilidade e no processo de descobrimento da sexualidade. Bons estudos! Introdução 33 1 ADOLESCÊNCIA, CULTURA, VULNERABILIDADE E RISCO O período da adolescência é um momento de transformação social do indivíduo. Ele passa por uma inserção dentro da sociedade, deixando de ser uma criança protegida pelos pais e passa a ser um indivíduo responsávelpor si. Esse período oferece muitas mudanças sociais e experiências novas. Devido às várias situações vivenciadas pelos adolescentes em um período de tempo curto, eles tornam-se vulneráveis em diversas situações. Figura 1 - Adolescência Fonte: Take a Pix Media, Shutterstock, 2020. #ParaCegoVer: a imagem mostra uma adolescente no ambiente escolar, encostada em uma parede, segurando sua mochila nas costas. 1.1 Vulnerabilidade e adolescência A vulnerabilidade é considerada como uma exposição do indivíduo a fatores que possibilitam o adoecimento do corpo ou da mente, ou seja, vulnerabilidade psicológica e/ou biológica. Assim, na tentativa de prevenção, propõem-se medidas que busquem minimizar situações de risco do indivíduo ou do coletivo, a fim de reduzir a vulnerabilidade individual, social e a programática (vulnerabilidade do sistema). Quando pensamos na vulnerabilidade individual, estamos nos referindo ao grau de informação que o indivíduo possui em relação ao problema a que está exposto, ou seja, o seu conhecimento sobre a situação atual. Associada a isso, temos a capacidade individual de assimilar e incorporar o problema, a fim de buscar prevenção ou solução que reduza, minimize ou acabe com o risco. Isso é importante na adolescência, pois esses indivíduos nem sempre conseguem identificar o problema, como, por exemplo, quando estão expostos ao uso de drogas. Neste caso, eles acham 34 que não se trata de uma adversidade e acreditam que isso não irá afetar sua vida, porém estão expostos ao risco do vício e também a uma porta aberta para outras situações, como o tráfico e a violência. O adolescente fica exposto a muitas informações e, muitas vezes, não as assimilam rapidamente, sendo importante conhecer cada indivíduo de maneira particular e única para que a prevenção possa ser efetiva. É imprescindível conhecer também o ambiente social em que ele está inserido, pois, geralmente, a exposição a fatores de risco em comunidades carentes, por exemplo, é maior devido às condições socioeconômicas. O trabalho educativo com o adolescente sobre as temáticas que oferecem risco e são frequentes, como, por exemplo, as doenças sexualmente transmissíveis, a sexualidade e o uso de álcool e drogas, tem efetividade, uma vez que eles ficam expostos a esses fatores em busca de algo novo ou do desafio oferecido, segundo Aberastury e Knobel (2003). Quando refletimos sobre o individual devemos pensar também nas características de cada um, tais como situações que envolvem preconceito, violência e a desigualdade de gênero, que podem ser algo comum na infância do jovem e que afetam diretamente o seu modo comportamental e de enfretamento das mudanças que vivencia durante o desenvolvimento da sua adolescência. Quando uma criança foi submetida a violência sexual, por exemplo, na adolescência, ela pode apresentar dificuldades em situações que envolvam assuntos relacionados ao sexo, ou até mesmo à sua própria sexualidade. Em relação à vulnerabilidade social, afirma-se que ela está relacionada diretamente com a obtenção das informações, bem como a sua incorporação e assimilação. Sendo a comunicação, a escola e disponibilidade de recursos materiais de informação e as políticas sociais fatores que influenciam na vulnerabilidade social. Apesar das políticas públicas visarem atender as condições sociais de todos os indivíduos, devemos traçar medidas diferencias de acordo com cada grupo social. Por exemplo, medidas de informação para adolescentes de uma comunidade carente podem não ser as mesmas de adolescentes com um nível social maior, devido os meios que conseguem informações, de acordo com Aberastury e Knobel (2003). Quando analisamos o contexto social, além dos aspectos econômicos que proporcionam uma desigualdade social, temos o acesso a informações, acesso aos recursos mínimos para a sobrevivência individual, à violência vivenciada no cotidiano, às desigualdades relacionadas à etnia e ao acesso aos serviços de saúde. Todos esses aspectos influenciam diretamente em como a sociedade consegue agir frente a fatores que os colocam em risco. Já a vulnerabilidade programática ou do sistema está relacionada aos recursos que as políticas públicas oferecem. Sendo a qualidade, os recursos, a gerência e o monitoramento da efetividade das políticas fundamentais para o seu sucesso. As medidas de prevenção podem ser traçadas de maneira geral para a população, porém os grupos mais vulneráveis devem ter medidas que 35 complementem as medidas gerais, com o objetivo de minimizar os riscos. Uma das medidas políticas está na construção de ações direcionadas às necessidades da comunidade, como, por exemplo, o grande número de doenças sexualmente transmissíveis em adolescentes, oferecendo informações de como prevenir e também garantindo o acesso aos preservativos gratuitamente disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O profissional de saúde, ao pensar na vulnerabilidade, deve estar atento ao fato de que ela não ocorre de forma unitária, sendo, na verdade, gradativa e podendo estar em vários graus diferentes e modificáveis. Os fatores que influenciam os riscos podem ser mudados ao longo do tempo, pois os fatores que, no passado, colocavam os adolescentes em risco não são os mesmo de hoje. Observa-se que houve mudanças, como aumento da violência, maior facilidade ao acesso a drogas, aumento no uso e abuso de álcool, por exemplo. Portanto, não podemos dizer que as pessoas são vulneráveis, mas que estão vulneráveis, pois isso é algo mutável ao longo por tempo e do espaço em que ela vive, conforme Aberastury e Knobel (2003). Quando pensamos apenas nos adolescentes, devemos lembrar dos fatores associados e mais comuns a eles que são: • a gravidez não planejada; • o aborto; • o sexo inseguro; • os múltiplos parceiros sexuais; • o uso e abuso de álcool e drogas; • maior exposição a situações de violência Todos esses fatores o tornam mais vulnerável e podem comprometer a sua saúde e qualidade de vida. Apesar de usarmos o termo adolescente como algo similar e único, deveríamos usar o conceito de adolescências, pois cada grupo de adolescente será influenciado pelo seu meio social, cultura e econômico. Assim como a forma de vivenciar e de amadurecer em cada grupo será distinta e as vulnerabilidades também serão diferentes. Alguns fatores serão comuns, como as mudanças comportamentais e os períodos em que os jovens irão apresentar características como audácia, descoordenação, desinteresse, urgências e apatia. A maioria também passa por um período de crise religiosa, podendo oscilar desde o ateísmo até o misticismo fervoroso. Não é incomum que os adolescentes também apresentem variação na autoestima, estando em alguns momentos baixa e em outras elevada, como se fossem onipotentes. Isso pode estar relacionado ao uso de substâncias psicoativas e também à displicência sexual. 36 Alguns adolescentes tornam-se mais vaidosos, ficando expostos, muitas vezes, à mídia e buscando padrões de beleza nos estereótipos sociais. Isso pode influenciar também no consumismo, querendo comprar coisas que não são necessárias, apenas pelo desejo de sentirem- se poderosos e aumentar a sua autoestima, podendo ocorrer revolta quando eles não conseguem o que desejam, mudando o humor e o comportamento momentaneamente. Quando o adolescente sente que é onipotente, isso oferece um risco, pois justificam as suas ações baseadas na crença de que não serão atingidos negativamente” e acabam ficando expostos a riscos como gravidez indesejada, sexo desprotegido e overdose devido ao consumo excessivo de drogas. A onipotência é uma característica importante, principalmente para a autoafirmação do adolescente, mas isso deve ocorrer de maneira que não o coloque em risco. Para isso, é importante que ele tenha informação sobre os riscos e sobre as formas de prevenção. A percepção temporal e a sua relação com as consequências não são claras para o adolescente, logo, ele não pensa que umarelação sexual desprotegida pode acarretar em uma gravidez que irá mudar toda a sua vida ou uma doença sexualmente transmissível que poderá acarretar em problemas temporários ou permanentes como no caso do HIV. O início da vida sexual ativa, atualmente, é precoce, variando dos 12 aos 17 anos, o que aumenta a chance de gravidez em até 20 vezes, pois nem sempre as medidas contraceptivas são adotas devido à falta de informação ou até mesmo pelo desafio do novo. Os pais, muitas vezes, não sabem sequer que os filhos já iniciaram a vida sexual, devido ao tabu que existe em torno do assunto. Além disso, quando os pais são questionados sobre conversarem com seus filhos sobre sexo, muitos relatam não conversar, devido à dificuldade em tratar desse assunto, de acordo com Aberastury e Knobel (2003). O comportamento grupal é outro fator que pode ser protetivo ou não para o adolescente. Quando ele está inserido em grupos que buscam um comportamento mais tranquilo, sem buscar medidas que ofereçam risco à saúde ou transgressão às regras sociais, por exemplo, os jovens ficam mais protegidos e se expõem menos aos riscos. No entanto, quando ele busca no grupo formas de vivenciar novas experiências de maneira não racional e que transgridam as regras, isso pode ser perigoso. A maioria dos adolescentes buscam grupos em que ele possa se identificar e, quando não ocorre essa assimilação, ele pode mudar seu comportamento para se enquadrar em outro grupo. A mudança de comportamento para pertencer e ser aceito em um grupo pode ser positivo, quando não precisa, por exemplo, encarar desafios que mostrem que ele é digno do grupo, como usar alguma droga, consumir álcool ou até mesmo dirigir sem habilitação. 1.2 Exposição ao risco Durante o período da adolescência, é comum a vivência de situações de risco. Quando pensamos no risco, ele assume vários sentidos para o adolescente como o risco de perder sua identidade a partir da submissão a um grupo social ou ao grupo familiar; o risco de não 37 conseguir se inserir em um grupo social; o risco de não conseguir algo desejado e o risco de não ser uma pessoa de sucesso. Todos esses riscos são, muitas vezes, psicológicos e nem sempre são reais na vida do adolescente. Contudo, isso pode acarretar em ações autodestrutivas com o objetivo da conquista de algo. Por isso, o adolescente pode assumir ações autodestrutivas como o uso de drogas em geral, envolvimento em brigas e em situações de violência e até mesmo o autoextermínio, por exemplo. Outro risco é a busca de um padrão de beleza e estética corporal que leva a mudanças radicais no padrão alimentar e pode acarretar em bulimia ou anorexia. Isso pode ser influenciado até pela própria família que incentiva, na maioria das vezes, as meninas a buscarem um corpo magro como um padrão de beleza e aceitação social. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: As atitudes agressivas fazem parte do indivíduo, até mesmo como um mecanismo de defesa. Essas atitudes são modificadas ao longo dos anos, mas sofrem influência direta do ambiente em que o indivíduo está inserido. Quando bebê, a pessoa tem a sua primeira relação com as atitudes agressivas, estando relacionada diretamente com o ambiente familiar. Já na adolescência, essa relação pode mudar, não ocorrendo a agressividade física com o outro, mas com o próprio indivíduo, como, por exemplo, no isolamento social, atitudes de mutilação corporal e na própria delinquência. Assim, o ambiente social irá predizer como o jovem irá lidar com as atitudes agressivas, pois se ele estiver em um ambiente que leve à privação e a situações de exclusão, ele irá reagir a isso de forma violenta, segundo Aberastury e Knobel (2003). A violência na adolescência torna-se um fator que aumenta a sua exposição ao risco, pois geralmente está relacionada ao não acesso a recursos básicos como educação, saúde, lazer e trabalho. Outros riscos para o adolescente são criados pelo próprio sistema de saúde, pois a busca deste ao serviço de saúde para obtenção de informação ou até mesmo o tratamento de alguma patologia normalmente está associada à presença dos pais ou de um responsável. Isso pode 38 dificultar a adesão ao tratamento, principalmente quando a busca for relacionada a sexualidade ou ao uso de drogas. Em geral, o adolescente não busca o sistema de saúde, pois não quer que a família fique sabendo que iniciou a vida sexual ou que fez uso de alguma droga, por isso eles tendem a se esquivar do sistema e buscam resolver seus problemas dentro do grupo em que estão inseridos, sem sucesso na maioria das vezes. Então, os serviços de saúde precisam estar atentos em relação à busca do serviço pelos adolescentes, realizando o acolhimento e o atendimento, se necessário, sem a presença de um acompanhante, criando, assim, um vínculo e também propiciando um ambiente em que possa haver a troca de informações e, consequentemente, a redução dos riscos a que o jovem possa se expor, conforme Aberastury e Knobel (2003). Dessa forma, é possível criar um ambiente de resposta social às necessidades dos adolescentes, ampliando o seu acesso a informações e a recursos de proteção. Além disso, pode- se propiciar uma transformação social mais profunda que possibilitará a troca de conhecimento entre o serviço de saúde e o adolescente, oferecendo informações sobre prevenção e saúde e conhecendo as necessidades dos adolescentes daquela comunidade, por exemplo. A partir disso, existirá uma troca saudável de informações e a redução dos riscos para os adolescentes. 2 SEXUALIDADE A sexualidade é uma parte inerente ao ser humano, fazendo parte da sua vida e da sua saúde. Ela é um fenômeno que possui aspectos biológicos, culturais, históricos, sociais e psicológicos que influenciam na maneira de compreender e viver do indivíduo como homem ou mulher. Ela não está relacionada apenas com a reprodução, mas, sim, com aspectos culturais e sociais que são expressos nos sentimentos amorosos, desejos pessoais e nas práticas sexuais. 2.1 Sexualidade na adolescência A Constituição Brasileira estabelece os direitos humanos e, dentre entres, está garantido o direito sexual e reprodutivo do indivíduo. Assim, a sexualidade é garantida, mas precisa ser vivenciada respeitando o próprio corpo e o corpo do outro, cabendo ao indivíduo escolher seu parceiro sem medo, vergonha ou crenças falsas. Além disso, a relação sexual não tem apenas fins reprodutivos, podendo a pessoa exercer sua orientação sexual livremente. Em relação à educação sexual e reprodutiva, todos têm direito a orientações sobre o planejamento familiar, quando assim desejarem, segundo Brasil (1988). Qualquer pessoa tem o direito de escolher se quer ou não ter filho e, quando decidir por tê-los, pode escolher quantos deseja ter e qual o melhor momento da sua vida para isso. Também é garantido que todos tenham acesso às informações sobre os métodos contraceptivos e acesso gratuito a eles, podendo exercer sua sexualidade de maneira livre, sem discriminação, coerção e violência. 39 Figura 2 - Preservativos Fonte: Ducu59us, Shutterstock, 2020. #ParaCegoVer: a imagem mostra três preservativos masculinos embalados em diferentes cores. No entanto, para que ocorra a expressão da sexualidade de maneira livre, é importante que as relações humanas sejam consideradas e o conceito de gênero esteja claro. O gênero refere- se à construção social do sexo. Isso que dizer que cada cultura tem o seu universo masculino e feminino e, a partir disso, cada grupo social cria os seus papéis sobre o comportamento, o direito e a responsabilidade de cada gênero. Como se trata de uma divisão cultural, irá variar de acordo com o local social inserido pelo indivíduo, como, por exemplo, o papel da mulher no Islã que é diferente do seu papel no Brasil, não existindo, portanto, certo ou errado, mas sim papéis culturais diferentes. No adolescente, a sexualidade é manifestada a partir do início da puberdade, momento em que ocorrem diferentes sensaçõescorporais, surgindo os primeiros desejos, por meio da interação interpessoal. A partir disso, o adolescente expressa sua sexualidade, porém ela é influenciada diretamente pela qualidade das suas relações emocional e afetiva, estando ligada à sua relação na infância e na vivência atual. Além disso, ocorre relação com o seu grupo de pares e as transformações físicas, psicológicas e sociais vivenciadas. As crenças individuais, as tradições da família e do próprio adolescente também influenciam na expressão da sua sexualidade, de acordo com Ministério da Saúde (2017). 2.2 Papel do serviço de saúde na expressão da sexualidade do adolescente O adolescente, quando inicia a busca da sua sexualidade, apresenta inseguranças, dúvidas e desconhecimentos, além de vergonhas, medos e preconceitos. Ademais, pode tornar-se 40 vulnerável, principalmente quando não encontra suporte familiar, social e político para que possa buscar informação e esclarecer suas dúvidas, entendendo, assim, a sua sexualidade. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: A maioria das políticas de saúde voltadas para os adolescentes nem sempre consideram a sua sexualidade como parte do seu desenvolvimento. Além disso, os serviços de saúde nem sempre estão preparados para entender as singularidades e para a visão integral das necessidades em saúde dos adolescentes, não considerando ainda as desigualdades e as diferenças relacionadas com a percepção do crescimento e do desenvolvimento do corpo dos jovens. Os profissionais de saúde apresentam dificuldades em lidar com o tema sexualidade, principalmente com os adolescentes. Isso ocorre devido a uma visão muitas vezes preconceituosa e carregada de códigos morais ou religiosos. Entretanto, eles devem estar abertos para ouvir os adolescentes em suas escolhas, auxiliando-os a lidar com situações difíceis, frequentemente relacionadas à sua sexualidade. É importante ouvi-los e, quando for explicar algo ou esclarecer dúvidas, utilizar uma linguagem simples, porém com terminologias adequadas, evitando as gírias, mas fazendo-se entender pelos jovens, segundo Ministério da Saúde (2017). Além disso, é importante que o profissional de saúde realize práticas educativas para a formação de adolescentes que facilitem a troca de informação e permita o conhecimento sobre o ato do sexo seguro. O ambiente escolar é um espaço ideal para essa prática, permitindo alcançar um grande número de adolescentes em um ambiente conhecido e seguro para eles. Os serviços de saúde podem realizar ações articuladas com as instituições de ensino, realizando rodas de discussões com a escuta ativa, palestras direcionadas a problemas específicos como gravidez na adolescência e também trabalhos sobre o tema podem ser desenvolvidos pelos próprios adolescentes, permitindo conhecer a visão deles sobre o assunto. Além dos alunos, é importante capacitar os professores e os funcionários das escolas para que possam ser um outro ponto de apoio para os adolescentes. 41 A educação sobre a sexualidade deve assumir um papel de empoderar o jovem, tornando-o o centro da atenção e quem tem o poder de escolha sobre o que é melhor e mais saudável para si. A partir do empoderamento e da obtenção de informações, os adolescentes tornam- se multiplicadores das informações dentro do seu grupo social e fortalecem a busca pelo autocuidado e a prevenção da sua saúde. 3 ADOLESCÊNCIA E FAMÍLIA No século XX, a sociedade industrial ocidental provocou diversas mudanças sociais, especialmente no modelo de família que, até então, era patriarcal, burguês e marcado intensamente pelos valores judaico-cristãos, e passou para um modelo de família plural, descentrada da figura paterna e com diferentes arranjos. A mudança de um modelo tradicional não pode ser classificada como melhor ou pior, mas deve ser repensada, pois estabelece e possibilita diferentes funções e responsabilidades sociais que, até o momento, não existiam e passam a fazer parte da sociedade, precisando ser incorporadas pelas políticas sociais e de saúde. Uma outra mudança compreende as questões jurídicas, pois a constituição familiar pode se encontrar dentro de uma grande pluralidade, inclusive sem a presença dos pais, como nos casos em que os jovens são criados pelos próprios avós, conforme Ministério da Saúde (2017). O conceito de família, no século XXI, é definido por um grupo de pessoas que apresentam um grau de intimidade entre si, que possuem uma história comum e que buscam para si um futuro junto. A estruturação está relacionada com o meio social inserido, sendo esse um determinante para sua formação e ocupação em relação ao espaço, hábitos, valores, projetos de vida e relações internas e externas. Os grupos familiares passam a ter como função: Função 1 A proteção de seus membros. Função 2 FIQUE DE OLHO O adolescente que é pai deve ser valorizado como potencial fonte de apoio, cuidado e proteção para a saúde da parceira e da criança em todo processo gestacional e no pós-parto, sobretudo durante a amamentação. 42 A busca pelas garantias de subsistência. Função 3 As trocas afetivas estruturantes dos sujeitos que os compõem. Função 4 A transmissão de valores éticos e recursos econômicos de uma geração para outra. As famílias atuais constituem, então, um sistema social baseado principalmente nas relações de convivência e geradoras de amorosidade. Isso não exclui os conflitos, pois existe a relação social entre pessoas e também a transformação e evolução ao longo dos anos, o que pode resultar em conflitos em alguns momentos. A família atual é formada por adultos que são cuidadores e provedores, podendo ter ou não a figura da criança e do adolescente. Os provedores podem ser mãe e pai, mãe solteira, pai solteiro, casais homoafetivos, grupos de amigos, grupos de irmãos ou grupos de familiares que cuidam uns dos outros, segundo Ministério da Saúde (2017). Assim, com essa pluralidade de família, a convivência com crianças, adolescentes e outros adultos passa a ser dependente da escolha do adulto em gerir e cuidar de uma nova vida, que passa a fazer parte da família. Os filhos, atualmente, são escolha da família, e não mais uma convivência obrigatória, como em tempos passados. Dessa forma, com os arranjos familiares apresentando uma estruturação plural, o adolescente pode estar inserido em um ambiente múltiplo. Além da estruturação da família que foi alterada, as relações familiares também se tornaram diversas como as relações de conjugalidade, de parentalidade, de filiação (natural ou adotiva) e de fraternidade. Essa mudança na relação da família é marcada por uma tensão e pode sofrer adversidades que desafiam a convivência. Dentre as principais adversidades, podemos destacar fatores que tornam as famílias vulneráveis ou possibilitam o seu fortalecimento, dependendo da estrutura e da capacidade de enfrentamento de cada um deles, de acordo com Ministério da Saúde (2017): • o nascimento de um novo membro da família; • a morte de um desses membros; • o casamento de um dos membros; • o divórcio; • o abandono; 43 • a presença de uma patologia; • a dependência química; • a incapacitação física ou intelectual; • o desemprego. Os conflitos de uma família podem ser resolvidos, muitas vezes, através da comunicação, mudança de atitudes, mudanças de descrições e a busca do grupo por melhorias na convivência. Porém todos os membros da família precisam estar dispostos a conviver no grupo, adaptando-se, cedendo e aprendendo juntos. Apesar de ser comum aos adultos a mediação para resolver os conflitos, isso pode ocorrer entre eles também, ou ainda entre os adultos e o adolescente, por exemplo. Assim, o importante não é a ausência do conflito, mas a sua resolução e o retorno da estabilidade e harmonia familiar. A presença de um adolescente na família é algo que gera um esforço dos adultos no sentido de que precisam prover as condições básicas de alimentação, vestimenta, afetividade, educação, segurança,desapego, autoestima e autonomia progressiva. Isso demanda um tempo e um esforço para os adultos, pois precisam de recursos financeiros para as necessidades básicas e de tempo para que possam realizar a educação dos filhos. A família tem um papel desafiador que é o desenvolvimento psicológico do adolescente, o que demanda uma atenção desde a infância até o início da sua vida adulta. Os pais ou responsáveis precisam, então, de um ambiente seguro, contato com o adolescente e o cuidado físico-afetivo, sendo importante o vínculo para que a educação possa ser realizada com êxito. Um outro desafio é auxiliar o adolescente a conseguir sua consciência como uma pessoa humana, com desejos, valores e poder de escolha. A liberdade oferecida ao jovem precisa ser clara e não pode ser confundida com a libertinagem, que é uma liberdade sem regras. A vida em sociedade necessita de regras para que todos possam ter um bom convívio social, por isso as regras fazem parte de todo ambiente familiar e social, segundo Ministério da Saúde (2017). Quando falamos na dimensão ética-moral, é preciso que os pais e os responsáveis pelo jovem tenham essa dimensão clara para que possa esclarecer e transmiti-la ao adolescente. Uma família que não tem seus valores estabelecidos, bem como regras e condutas claras, pode apresentar um comportamento volátil frente ao adolescente, que também vivência um momento transitório e conflituoso, chegando, assim, a um conflito diário entre o adulto e o adolescente. A família pode buscar apoio social para ser auxiliada no enfrentamento das dificuldades dos jovens, como nas escolas e nos serviços de saúde, mas a responsabilidade da criação do sujeito como um ser humano é dela mesma, não podendo ser transferida a outro órgão. Apesar de a família ser a responsável pelos adolescentes, eles também precisam entender que são sujeitos e 44 têm um papel social a cumprir, não sendo apenas passíveis do outro, pois já apresentam opinião sobre alguns assuntos e sabem do que gostam e do que não gostam, buscando ter isso respeitado. Os adultos que fazem parte do convívio social do adolescente, como, por exemplo, os professores e os profissionais de saúde, também devem contribuir para a construção e formação pessoal do jovem, mas sempre os respeitando como sujeitos plenos e nunca os tratando como sujeitos submissos e sem expressão de sentimentos e vontades. A família e o ambiente social devem ser ambientes tranquilos e seguros para o adolescente, utilizando sempre do diálogo como meio para resolver os conflitos que possam surgir entre os adultos e os adolescentes, ou em ações de transgressão das regras por parte dos adolescentes, de acordo com Ministério da Saúde (2017). A sociedade e a família precisam estar associadas, pois não há como descontextualizar o adolescente da sua família deixando apenas a comunidade responsável pela educação, lazer e cultura, assim como não é dever apenas da família proporcionar isso. Ambos têm sua participação na formação do adolescente. A segurança, por exemplo, só pode ser garantida quando a família e a sociedade trabalham juntas. Devemos, ainda, lembrar que não é comum a perda de espaço da família na vida do adolescente, pois faz parte do seu desenvolvimento em busca da sua identidade. Entretanto, os fatores adquiridos como condição emocional, autoestima, responsabilidade e valores familiares ganham uma força nesse momento como fatores protetivos para o jovem. Dessa forma, é necessário atentar-se ao fato de que uma mesma experiência pode ser um fator positivo pra um jovem e negativa para outro, não existindo uma fórmula correta em relação ao seu desenvolvimento psicológico e social. O convívio social é um fator de risco, pois não é possível a família monitora-lo o tempo todo, estando o adolescente vulnerável. Mas isso pode ser um fator positivo, como um apoio no convívio social, sendo importante existir políticas que ofereçam a segurança dos jovens para que eles possam frequentar esses ambientes. A qualidade das relações em todos os espaços de convívio social é fundamental para manter a proteção individual e não deixar os adolescentes vulneráveis. No contexto social, a família tem papel restrito e não é possível oferecer suporte, o que também é saudável, pois o adolescente precisa do convívio em grupo para a construção da sua identidade. A convivência dos adolescentes em grupo pode influenciar diretamente na sua orientação em relação ao gênero, orientação sexual, orientação profissional, desenvolvimento de habilidades e gostos específicos, o que apresenta um lado positivo, quando essas influências não os colocam em situações de risco como a exposição a doenças sexualmente transmissíveis. Nesse momento, a família é um fator protetor, pois se for oferecida a oportunidade para diálogo e um ambiente 45 para conversar abertamente, decisões e escolhas em grupos podem ser discutidas no ambiente domiciliar e dúvidas podem ser esclarecidas, além de propiciar uma oportunidade para corrigir conceitos e atitudes erradas, conforme Ministério da Saúde (2017). Figura 3 - Convivência em grupo Fonte: Milles Studio, Shutterstock, 2020. #ParaCegoVer: a imagem mostra nove adolescentes reunidos com trajes semelhantes. Contudo, em algumas situações, a família pode ser um risco, quando os adultos são superprotetores ou permitem tudo. A comunicação inadequada e falha também pode colocar o adolescente em situações de vulnerabilidade. Os jovens demandam um tempo menor de monitorização do adulto, o que precisa ser assimilado pelos cuidadores para que não se tornem superprotetores e nem fiquem alheios à vida do adolescente. A convivência familiar precisa funcionar de maneira complementar à vida escolar e social do jovem, participando de forma ativa e conhecendo as suas rotinas e amizades. Isso não significa controlar a vida do adolescente, pois ele pode fazer algumas escolhas, mas os limites são fundamentais, assim como ficar claro que os pais ou responsáveis estão atentos à sua vida e dispostos a ajuda-los sempre que precisarem. Quando a família não apresenta limites, não estabelece rotinas e nem segue regras, os filhos tendem a seguir o mesmo estilo de vida. A melhor educação em família é o exemplo para os filhos, buscando estilo de vida que seja ideal para a convivência e formação do jovem. As famílias tendem a ser mais protetivas com as meninas e oferecerem maior liberdade para os meninos, sendo essa diferença cultural, não cabendo a nós julgar como correto ou errado. Todavia, o ideal é um equilíbrio entre a educação dos meninos e das meninas, de maneira coerente, com respeito e responsabilidades. As informações sobre a adolescência, o que está mudando no corpo e na mente é importante, sendo os pais ou responsáveis os primeiros a oferecerem essas informações e suportes para enfrentamento da transição entre a infância e à idade adulta. 46 Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: A busca pelos serviços de saúde nem sempre é feita de maneira direta pelos adolescentes. Muitas vezes, eles conversam com seus familiares e expressam seus sintomas e suas necessidades e estes, então, os levam ao serviço de saúde. Quando o assunto é relacionado a anticoncepção, o uso de drogas ou o uso de álcool, por exemplo, muitos jovens tendem a não conversar por medo da repreensão ou do conflito que isso poderá gerar na família. Isso acaba piorando a sua situação, uma vez que os jovens permanecem em situação de risco e isso pode acarretar em consequências mais graves, como uma gravidez não planejada ou a morte por abuso do uso de drogas. FIQUE DE OLHO A estrutura familiar sólida e com espaço aberto ao diálogo proporciona ao jovem um fator protetivo para trocar experiências, relatar seus medos e anseios da mudança. Além disso, propicia um ambiente para que ele possa buscar conhecimento e esclarecimento de suas dúvidas, de maneira que não se exponha a riscos desnecessários. 47 Nesta unidade, você teve a oportunidade de:
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