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Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS SECRETARIA DA SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA SOCIAL - SSPDS André Santos Costa SECRETÁRIO DA SSPDS POLÍCIA MILITAR DO CEARÁ - PMCE Alexandre Ávila de Vasconcelos - Cel PM COMANDANTE-GERAL DA PMCE ACADEMIA ESTADUAL DE SEGURANÇA PÚBLICA DO CEARÁ – AESP|CE Juarez Gomes Nunes Júnior – Cel PM DIRETOR-GERAL DA AESP|CE Ivana Coelho Marques Figueiredo DIRETORA DE PLANEJAMENTO E GESTÃO INTERNA DA AESP|CE Roberta Barbosa Monteiro– Ten Cel PM COORDENADOR GERAL DE ENSINO DA AESP|CE Dione Marques COORDENADOR PEDAGÓGICO José Alexandre Soares Nogueira SECRETÁRIA ACADÊMICO DA AESP|CE CURSO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL PARA A CARREIRA DE OFICIAIS POLICIAIS MILITARES - CFPCO/PM DISCIPLINA POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS CONTEUDISTA Antônio Milton Sampaio Almeida - Maj QOPM ATUALIZAÇÃO André Henrique de Araújo Gaya – 1° Ten QOPM REVISÃO DE COERÊNCIA DIDÁTICA Erika Maria da Silva Pereira Francisco José Amaral Lima Jorgeana Reis da Silva Luciana Canito Austregésilo de Amorim Luciana Moreira da Silva Renata Teixeira de Azevedo FORMATAÇÃO JOELSON Pimentel da Silva – Sd PM • 2019 • Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS SUMÁRIO 1. APRESENTAÇÃO E ASPECTOS GERAIS DE UM GRANDE EVENTO .............................................................................. 6 1.1 Os Grandes Eventos Na História ......................................................................................................................... 6 1.2 Evento e Grande Evento: Conceitos ................................................................................................................... 7 1.3 Características de um Grande Evento ................................................................................................................. 8 1.4 Classificação dos Eventos e dos Grandes Eventos .............................................................................................. 8 1.5 Classificação dos Locais de Eventos Quanto ao Tipo de Local .......................................................................... 10 2. DOS ENVOLVIDOS EM UM GRANDE EVENTO ......................................................................................................... 10 2.1 Organizadores ................................................................................................................................................... 10 2.2 Protagonistas do Espetáculo ............................................................................................................................. 11 2.3 Protagonistas Secundários ................................................................................................................................ 12 2.4 Pessoal de Serviço ............................................................................................................................................. 12 2.5 Público ............................................................................................................................................................... 16 3. A PSICOLOGIA DAS MASSAS APLICADA AO POLICIAMENTO DE GRANDES EVENTOS ............................................ 16 3.1 Ciclo Motivacional ............................................................................................................................................. 16 3.2 A Teoria a Respeito da Hierarquia das Necessidades Humanas ....................................................................... 17 3.3 Fatores Psicológicos do Público em um Grande Evento ................................................................................... 18 3.4 O público ........................................................................................................................................................... 18 3.4 Reação do Público aos Estímulos Externos em um Grande Evento .................................................................. 19 3.5 Classificação do Público Quanto ao Comportamento em um Grande Evento ................................................. 20 3.6 Tipos de Público Fanático em um Grande Evento ............................................................................................ 21 4. AS TORCIDAS ORGANIZADAS E SEU IMPACTO NO FUTEBOL BRASILEIRO .............................................................. 22 4.1 Torcidas Organizadas: Conceito e Breve Histórico ........................................................................................... 22 4.2 Torcidas Organizadas: Festa nas Arquibancadas .............................................................................................. 23 4.3 As Torcidas Organizadas e Suas Motivações..................................................................................................... 23 4.4 Padrões de Comportamento das Torcidas Organizadas ................................................................................... 23 4.5 A Violência Protagonizada Pelas Torcidas Organizadas No Brasil .................................................................... 25 4.6 As Torcidas Organizadas e os Fatores Psicológicos da Massa em um Grande Evento ..................................... 25 4.7 Medidas Preventivas Contra a Violência das Torcidas Organizadas ................................................................. 27 5. LEGISLAÇÃO APLICADA AO POLICIAMENTO DE GRANDES EVENTOS ..................................................................... 28 5.1 Considerações Iniciais ....................................................................................................................................... 28 5.2 A Busca Pessoal ................................................................................................................................................. 30 5.3 O Porte de Arma de Fogo em Eventos .............................................................................................................. 32 5.4 Dos Fogos de Artifícios e Outros Artefatos Explosivos em Eventos ................................................................. 34 5.5 As Ações de ‘Guardadores de Carro’, Cambistas e Vendedores Ambulantes .................................................. 35 5.6 Meia Entrada ..................................................................................................................................................... 38 5.7 Legislação Aplicada a Pessoas em Situação Diferenciada ................................................................................. 39 6. DO GERENCIAMENTO DE CRISES EM GRANDES EVENTOS ..................................................................................... 41 6.1 Considerações Iniciais ....................................................................................................................................... 41 6.2 Conceitos Preliminares ..................................................................................................................................... 41 6.3 Características da Crise ..................................................................................................................................... 42 6.4 Objetivos do Gerenciamento de Crise .............................................................................................................. 43 6.5 Critérios Para a Tomada de Decisões ................................................................................................................43 6.6 O Risco e Suas Implicações nas Tomadas de Decisões Relacionadas a Uma Situação de Crise ....................... 43 6.7 Origem das Crises em Eventos .......................................................................................................................... 46 6.8 Fatores Potencialmente Motivadores da Crise ................................................................................................. 46 6.9 Procedimentos Adotados Para a Resolução de uma Crise ............................................................................... 48 6.10 Acionamento dos Apoios Necessários ............................................................................................................ 49 6.11 A Comunicação Relacionada a Uma Situação de Crise ................................................................................... 50 6.12 Procedimentos Operacionais Posteriores à Solução da Crise ......................................................................... 52 7. PLANEJAMENTO OPERACIONAL PARA A SEGURANÇA DE UM GRANDE EVENTO .................................................. 52 Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 5 7.1 Conceitos Iniciais ............................................................................................................................................... 53 7.2 Embasamento Legal Para a Atuação da Polícia Militar em Eventos ................................................................. 53 7.3 Estabelecendo Objetivos e Metas ..................................................................................................................... 53 7.4 Fase Inicial do Planejamento ............................................................................................................................ 54 7.5 Fase Intermediária do Planejamento ................................................................................................................ 55 7.6 Fase Final do Planejamento .............................................................................................................................. 57 7.7 Considerações Finais ......................................................................................................................................... 57 8. TÉCNICAS E TÁTICAS EMPREGADAS NO POLICIAMENTO DE GRANDES EVENTOS ................................................. 58 8.1 Fases do Policiamento de um Grande Evento .................................................................................................. 58 8.2 O Campo de Jogo em Estádios de Futebol ........................................................................................................ 68 8.3 Atuação do Policiamento em Situação de Pânico no Local do Evento ............................................................. 68 8.4 Considerações Diversas ..................................................................................................................................... 69 9. CONTROLE DE DISTÚRBIO CIVIL EM GRANDES EVENTOS – CDC ............................................................................ 69 9.1 Conceitos Preliminares ..................................................................................................................................... 69 9.2 Atuação Baseada Na Doutrina de CDC Convencional ....................................................................................... 70 9.3 Formações a Partir da Doutrina de CDC Convencional ..................................................................................... 72 9.4 Objetivos do CDC em Grandes Eventos ............................................................................................................ 73 9.5 Desencadeamento das Ações de CDC em Grandes Eventos ............................................................................ 73 10. HISTÓRICO DO POLICIAMENTO DE EVENTOS NO CEARÁ ..................................................................................... 75 Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 6 1. APRESENTAÇÃO E ASPECTOS GERAIS DE UM GRANDE EVENTO O policiamento de grandes eventos compreende bem mais do que a utilização de técnicas e táticas objetivando a garantia da ordem pública num local de espetáculo. Outros fatores, muitos deles de natureza burocrática, também compõem o mosaico que define a segurança de todos os envolvidos em um grande evento, sejam eles os protagonistas, o público assistente ou o pessoal de serviço. A presença policial ostensiva e preventiva num local de evento é tão somente a parte visível de uma estrutura maior, mais técnica e organizada, responsável por todos os detalhes que garantirão a realização do evento com a tranquilidade e a segurança desejadas. Assim, antes que se proceda à utilização das técnicas e táticas de policiamento de grandes eventos, é imprescindível conhecer os pormenores de um evento, seus tipos, os locais onde ocorre, seu público, sua passagem pela história e suas peculiaridades nos dias atuais, como meio para a formação de uma doutrina capaz de nortear as ações policiais militares, sejam eles de pequeno, médio ou grande porte. Neste trabalho, será apresentado o processo de planejamento e execução de um grande evento a partir de conceitos e definições previstas em lei, na doutrina e na experiência laboral dos policiais militares que fazem a segurança dos eventos no Estado do Ceará. 1.1 Os Grandes Eventos Na História O ajuntamento de pessoas formando uma assistência em torno de um evento seja ele religioso, artístico ou esportivo remonta aos tempos antigos, quando sacrifícios de animais e, também, de humanos, objetivavam angariar a boa vontade dos deuses para favorecer os povos com boas colheitas ou vitórias nas guerras. Com o passar do tempo, não só os sacrifícios, mas, também, os jogos, as competições e suas disputas passaram a contar com um número expressivo de pessoas compondo a assistência. Em alguns casos, também a morte violenta era motivo de celebração, de exultação e de alegria. 1.1.1 No Mundo Ficou famosa através dos séculos a expressão latina ‘Panis et Circencis’, significando ‘pão e circo’, segundo a qual os imperadores da Roma Antiga entendiam que o povo estaria satisfeito unicamente se lhes fossem dados pão (comida) e circo (diversão). Diversão essa que, no mais das vezes, traduzia-se pela morte daqueles que protagonizavam o espetáculo, como no caso dos ‘gladiadores romanos’. Antes dos romanos, porém, os gregos antigos já promoviam eventos que reuniam um grande número de assistentes. As Olimpíadas são a maior expressão desses espetáculos. Durante os jogos olímpicos, os gregos paravam de guerrear e se dedicavam a competir através de disputas entre aqueles mais bem preparados física e intelectualmente, escolhidos entre os melhores de cada cidade-estado da Grécia. Outros povos antigos também promoveram eventos esportivos. As primeiras civilizações no Egito e na Mesopotâmia, milênios antes dos Jogos na Grécia antiga, tinham a tradição de atividades atléticas, já em 3.000 a.C., tudo registrado em templos e tumbas. Também, dos campos de batalha medievais, a ‘justa’ se tornou um esporte e estava longe de ser uma atividade segura. Dois cavaleiros, pesadamente revestidos por armaduras, montavam em seus cavalos em lados opostos da arena, com o objetivo de apenas atingir e derrubar o oponente ao passar por ele. Mas, não só de violência se constituíam os espetáculos dos tempos antigos. Os gregos (sempre eles) tinham uma especial predileção pelas artes cênicas. A encenação de peças teatrais era um dos pontos fortes dos gregos no mister de entreteras pessoas. Todos esses espetáculos eram, e continuam a ser, motivo para a reunião de um grande número de pessoas, todas ávidas por divertimento, através do qual podem se esquecer dos seus problemas cotidianos e dar vazão, quase sempre, a sentimentos reprimidos de alegria, tristeza, raiva, decepção, euforia ou frustração. Tudo, enfim, extravasado através de cânticos, lágrimas, gritos ou, nos piores casos, brigas com resultados desastrosos para todos. 1.1.2 No Brasil É um país multicultural, fruto de uma colonização que contou com a participação de culturas muito diferentes entre si, mas extremamente ricas de elementos. Nesse contexto, a religião constitui um dos elementos mais poderosos na formação da cultura brasileira. A fé do homem branco português e sua devoção extrema aos santos do catolicismo, aliada ao culto aos deuses dos negros africanos e dos índios da América pré-colombiana, ainda hoje são motivos da realização de grandes eventos em torno do qual se reúnem multidões, como na Procissão do Círio de Nazaré, em Belém do Pará ou na Festa de Iemanjá em Salvador, na Bahia. Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 7 As artes no Brasil também sofreram influência direta desses três povos: europeu, africano e americano pré-colombiano. O carnaval, expressão maior do samba. A capoeira, o Bumba Meu Boi, as quadrilhas juninas, enfim, tudo é fruto da miscigenação dos povos e suas culturas a que foi submetido o povo brasileiro. Finalmente, o futebol, esporte bretão que encontrou no nosso país um terreno fértil ao plantio e cultivo dessa atividade que é, sem dúvida nenhuma, a maior e mais festejada manifestação esportiva do mundo. Em se tratando de grandes eventos no Brasil, não é incorreto afirmar que os eventos a seguir podem ser considerados ‘marcos’ no calendário brasileiro, porquanto são os tidos como os maiores e mais emblemáticos de seus gêneros, haja vista serem inéditos: Evento esportivo: 1950 – Copa do Mundo de Futebol; Evento religioso: 1980 – Visita do Papa João Paulo II; Evento artístico: 1985 – Rock In Rio. Evento esportivo: 2016 – XXXI Jogos Olímpicos de Verão (Rio de Janeiro). Tem-se, que os carnavais do Rio de Janeiro e Bahia estão entre os maiores festejos populares do mundo, mas a primeira edição do Rock In Rio, em janeiro de 1985, constituiu um marco na realização de grandes eventos no Brasil, pela quantidade e diversidade de artistas presentes ao festival, além da gigantesca estrutura montada e da multidão de fãs que estiveram presentes aos shows. Outro grande evento marcante foram os Jogos Olímpicos de Verão 2016, os primeiros realizados na América do Sul, no Rio de Janeiro. A cerimônia de abertura foi vista por aproximadamente 4,5 bilhões de pessoas no mundo todo, participaram cerca de 10.700 atletas de 205 nações. 1.1.3 No Ceará No Brasil, o Estado do Ceará tem apresentado destaque positivo no calendário de comemorações, sejam religiosas, artísticas ou esportivas. Em julho de 1980, durante a visita do Papa João Paulo II ao Brasil, Sua Santidade visitou a capital cearense, e o Estádio Castelão que ainda não tinha chegado à sua primeira década de vida, recebeu aquele que é considerado, ainda hoje, o seu maior público: 120.000 pessoas. Na década seguinte, no início dos anos 90, Fortaleza passou a promover um dos maiores carnavais fora de época do Brasil: o Fortal, como é conhecida essa micareta. É realizado sempre no último fim de semana do mês de julho, numa despedida festiva e alegre das férias escolares do meio do ano. A capital cearense recebe milhares de foliões, todos ávidos pela diversão proporcionada nos três dias em que acontecem esse festival de música, dança, cores e muita alegria. Completando o conjunto de grandes eventos ocorridos no Ceará, nas últimas quatro décadas, além da visita do Papa João Paulo II e do Fortal, Fortaleza também promoveu jogos das duas maiores competições futebolísticas do planeta: Copa das Confederações Brasil 2013 e Copa do Mundo Brasil 2014, sendo, ambos, eventos da FIFA, que é a maior entidade do futebol no mundo todo. Para se ter uma noção exata da importância da capital cearense nesse contexto, basta que se diga que nos anos de 2013 e 2014, pelos gramados do Estádio Castelão desfilaram nada menos do que dezesseis (16) títulos mundiais, dos vinte (20) já disputados até hoje, representados pelas seguintes seleções, das quais, as quatro últimas campeãs mundiais: Alemanha com 4 títulos (campeã em 2014); Espanha com 1 título (campeã em 2010); Itália com 4 títulos (campeã em 2006); Brasil com 5 títulos (campeã em 2002); e Uruguai com 2 títulos. De todas as seleções campeãs mundiais de futebol até hoje, apenas Inglaterra, Argentina e França não visitaram a capital cearense. 1.2 Evento e Grande Evento: Conceitos Segundo Zanella (2006 apud Santos e Sousa, 2012) “evento é uma concentração ou reunião formal e solene de pessoas e/ou entidades realizada em data e local especial, com objetivo de celebrar acontecimentos importantes e significativos, podendo ser classificados de diversos modos: comerciais, culturais, esportivos, religiosos, artísticos, familiares, científicos etc”. O Manual de Policiamento em Eventos (M-10- PM) da PMESP define como evento as atividades de lazer ou acontecimentos que geram multidões, por qualquer meio e para fins esportivos, sociais, cívicos, políticos ou religiosos, os quais são realizados em vias públicas ou em áreas internas, públicas ou privadas, e causam reflexos na mobilidade urbana, na segurança do sistema viário e na ordem pública. A Secretaria Extraordinária de Segurança Para Grandes Eventos - SESGE, órgão do Ministério da Justiça, por sua vez, por conta da realização da Copa do Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 8 Mundo FIFA Brasil 2014, elaborou o ‘Plano Tático Integrado de Segurança’, segundo o qual “A identificação e a caracterização de um evento como ‘grande evento’ requer que ele possua atributos específicos que o façam ser destaque e referência local e/ou global e na mídia.” 1.3 Características de um Grande Evento De acordo com a o M-10-PM, Os Grandes Eventos são caracterizados por possuírem locais, horários de ocorrência e características operacionais conhecidas, fatores estes que os diferenciam dos eventos emergenciais e catastróficos. Os Grandes Eventos também se caracterizam segundo este manual: pelos impactos urbanos, pois alteram o cenário arquitetônico, a infraestrutura, o sistema de transporte e trânsito, os fluxos, a mobilidade e a acessibilidade (Carvalho et al., 2012); pelo significado histórico, político e de popularidade; pela ampla cobertura dos meios de divulgação e/ou presença de meios internacionais de divulgação; pela participação de cidadãos de diferentes países e/ou grupos-alvo; pela participação de VIP e dignitários; pelo elevado número de pessoas; por possuir um potencial de ameaças, podendo exigir cooperação e assistência internacionais (EU SEC, 2008). 1.4 Classificação dos Eventos e dos Grandes Eventos 1.4.1 Quanto à Categoria O plano da Secretaria Extraordinária de Segurança Para Grandes Eventos – SESGE traz uma classificação dos grandes eventos em categorias ou tipos, segundo o quadro abaixo: CATEGORIA EXEMPLOS PÚBLICO ALVO POLÍTICO Assembléia Geral da ONU Chefes de Estado, Governantes Internaciona Conferência do G8 e do G20 Conferência da OTAN, OMC Conferência Ambiental is e afins ECONÔMICO Convenções Organizador es, empresários e afins Feira de Negócios, diversas ESPORTIVO Copa do Mundo de FutebolChefes de Estado, autoridades, organizador es, atletas, turistas, população local Jogos Olímpicos Campeonatos Internacionais e Nacionais Jogos Pan-Americanos COMEMORA TIVO Festivais Organizador es, turistas e afins Religiosos Culturais NATURAIS Terremotos, tsunami População local, turistas e afins Enchentes, desabamentos EXTRAORDI NÁRIO Negociações de Paz Chefes de Estado e Governantes Interacionais Reuniões internacionais diversas Quadro 2: Categorias de um Grande Evento Fonte: Plano Tático Integrado de Segurança Para a Copa do Mundo FIFA Brasil 2014/SESGE/MJ. Dentre os vários tipos de grandes eventos, este estudo tratará principalmente dos dois mais significativos, porquanto mais recorrentes, a saber: esportivos e comemorativos. 1.4.1.1 Eventos Esportivos Caracterizam-se pela realização de jogos com grande poder de atração de público, como no caso dos Campeonatos de Futebol Profissional ou do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia. No Brasil: Em razão da paixão dos brasileiros por futebol, os jogos do Campeonato Brasileiro de Futebol Profissional, acabam constituindo o maior e mais bem acabado exemplo de grande evento esportivo no país. 1.4.1.2 Eventos Comemorativos Presta-se a celebrar uma data ou um fato histórico/tradicional, homenagear personagens histórico/folclóricos, ou, simplesmente, festejar um acontecimento que, por sua importância e impacto na sociedade, tornam-se merecedores de festas e homenagens diversas. 1.4.1.2.1 Eventos Festivos -*-/Culturais Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 9 São espetáculos protagonizados por artistas reconhecidos do público nas suas respectivas áreas de atuação, seja a música, a dança ou o teatro. No Brasil: O maior evento festivo do país é o carnaval. Durante três dias o país para e comemora essa data, com a realização de inúmeras festas em todo o território nacional. No Ceará: Além do carnaval, que é uma festa nacional, o estado também conta com outros grandes eventos festivos ou culturais, como, por exemplo, o Fortal, que é considerado um dos maiores ‘carnavais fora de época’ (micareta) do país. 1.4.1.2.2 Eventos Religiosos São aqueles cujos atrativos para os participantes estão alicerçados na fé. No Brasil, como visto anteriormente, a realização de eventos religiosos encontra raízes na colonização do país, com o encontro do povo nativo (índio) com o africano e o europeu, numa mistura de crenças que continham elementos tão diferentes quanto ‘os deuses da floresta’, os ‘orixás’ e os ‘santos católicos’. No Ceará, partir da morte do Padre Cícero Romão Batista, ainda na primeira metade do século passado, a figura do ‘Padim Ciço’ constituiu a força motriz do desenvolvimento do município de Juazeiro do Norte, cuja economia local ainda hoje sofre grande influência das romarias ocorridas em torno da fé no Padre Cícero. Eventos de natureza política também requerem a presença de um policiamento de eventos. Contudo, dada a presença de várias forças de segurança trabalhando com as autoridades protagonistas, e à restrição de acesso aos locais onde se dão as reuniões e encontros, cabe ao policiamento de eventos reforçar a segurança nas imediações dos acessos, evitando o fluxo de pessoas não autorizadas no local. 1.4.2 Quanto à Quantidade de Público Presente Segundo o Manual de Policiamento em Espetáculos Públicos, o ‘M-10-PM’, da Polícia Militar do Estado de São Paulo, 4ª Edição, literatura consultada e tomada como referência neste trabalho, os eventos estão assim classificados, segundo a quantidade de público presente. 1.4.2.1 Eventos de Pequeno Porte: Até dez mil (10.000) espectadores. 1.4.2.2 Eventos de Médio Porte: entre dez mil (10.000) e trinta mil (30.000) espectadores. 1.4.2.3 Eventos de Grande Porte: Acima de trinta mil (30.000) espectadores. 1.4.2.4 Eventos Clássicos: Independem do número de espectadores, mas está intimamente ligado ao grau de motivação que o espetáculo desperta no público, e ao momento histórico em que se dá esse evento, o que requer atenção e cuidados dispensados aos eventos de grande porte, como no caso de uma partida de futebol entre os times do Ceará e do Fortaleza, conhecida como ‘Clássico Rei’. Mesmo quando disputado no Estádio Presidente Vargas, cuja capacidade não chega a vinte mil (20.000) torcedores, esse evento sempre foi tratado com os cuidados inerentes a um evento de grande porte. 1.4.3 Quanto à Área Destinada ao Público A área destinada ao público constitui um dos mais importantes elementos a serem levados em consideração, quando da elaboração de um plano de policiamento para um determinado evento. 1.4.3.1 Evento em Área Aberta É aquele realizado em áreas que não dispõem de estruturas físicas que delimitem o acesso, o fluxo ou a permanência do público. São os logradouros públicos em geral, como praças, ruas e avenidas, calçadões, aterros etc. Também pode ocorrer em grandes áreas fechadas, cujas dimensões sejam comparáveis às de uma área pública aberta, como no caso do evento ‘Queremos Deus’, realizado no ‘Condomínio Espiritual Uirapuru – CEU’, no bairro Dias Macedo, na capital cearense. Outro exemplo clássico de evento em área fechada, mas tratada como sendo uma área aberta, foi o famoso festival de música ‘Woodstock’, realizado em uma fazenda na cidade de Bethel, interior do Estado de Nova Iorque, nos Estados Unidos da América. 1.4.3.2 Evento em Área Fechada É aquele realizado em ambientes cujas estruturas físicas delimitam o acesso, o fluxo ou a permanência do público. Exemplos desse tipo de Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 10 eventos são os jogos realizados nos ginásios, estádios, ou as festas realizadas em clubes, teatros etc. São os mais comuns e mais recorrentes. 1.5 Classificação dos Locais de Eventos Quanto ao Tipo de Local Ainda em relação aos tipos de locais, este trabalho se reporta ao Manual de Policiamento em Eventos, o ‘M-10-PM’, da Polícia Militar do Estado de São Paulo, 4ª Edição, aqui já citado, que traz outras classificações quanto ao local de realização dos eventos, conforme se vê a seguir. 1.5.1 Quanto à cobertura: Cobertos; descobertos; cobertos em parte. 1.5.2 Quanto à estrutura: De concreto; de madeira; de pedra; de alvenaria; metálicos; de combinação dos materiais citados; de outros materiais. 1.5.3 Quanto ao acesso ao interior do local específico do espetáculo: Com ou sem túneis de acesso; com ou sem alambrados; com ou sem fosso; com ou sem entradas especiais. 1.5.4 Quanto aos planos de pavimentos: De um só pavimento; de dois pavimentos; de três ou mais pavimentos. 1.5.5 Quanto à propriedade: Públicos; privados. 1.5.6 Quanto ao acesso de público: acesso gratuito, com controle por bilhetes; acesso pago; acesso misto, com ingressos gratuitos em parte; acesso gratuito, sem controle por bilhetes. 1.5.7 Quanto à finalidade de uso: específicos para o uso a que se destinam; adaptados para outros tipos de uso; improvisados. 1.5.8 Quanto à atividade principal a que se destinam: Futebol; Basquetebol; futsal; voleibol; handebol; Hóquei; beisebol; Shows artísticos e culturais; Tênis; ‘Show-ball’; Box; Artes marciais; Demonstrações e ginástica; Corridas de cavalos e de trote; Corridas de automóveis e motocicletas; Corrida de bicicletas; Pedestrianismo; Provas aquáticas; Futebol americano (rugby); Competições especiais, não comuns ao modo de vida local. Essas classificações não podem ser encaradas como definitivas, rígidas, haja vista que as características de cada local de eventopodem se apresentar como combinações ou variações destas que foram aqui mostradas. 2. DOS ENVOLVIDOS EM UM GRANDE EVENTO O policiamento de eventos compreende bem mais do que a utilização de técnicas e táticas objetivando a garantia da ordem pública num local de espetáculo. Há muitos elementos a se considerar, dentre os quais destacamos como o mais importante o elemento ‘humano’, o que nos leva a buscar um correto entendimento do comportamento e das ações das pessoas envolvidas no evento, sejam elas os organizadores, os protagonistas do espetáculo, o público assistente ou o pessoal de serviço, para que o planejamento e a execução do policiamento satisfaçam as demandas por segurança, conforto e tranquilidade de todos. 2.1 Organizadores ou Promotores do Evento Compreende o pessoal envolvido desde a concepção do projeto que visa à realização do evento, passando pelo planejamento, coordenação, organização e controle das ações levadas a termo antes, durante e após o evento. Muito embora não caiba à Polícia Militar praticar ingerência na organização do evento, cabe à corporação policial militar conhecer antecipadamente todos os elementos contemplados na concepção do projeto ou no plano de ação, os quais possam causar impacto na segurança do evento, a fim de opinar com PODER DE DECISÃO que ratifique ou retifique o que tiver sido discutido ou decidido, até ali, pela organização do evento. 2.1.1 Participação/Impacto na Segurança do Evento São os organizadores quem primeiro cuida de arregimentar os meios humanos e materiais que possibilitarão a realização do evento. A eles cabe a responsabilidade de, num primeiro momento, dar ciência aos órgãos públicos sobre a intenção de se realizar um evento, informando local, data, hora, atrações, estimativa de público, histórico do evento e necessidade de policiamento, dentre outros pontos relevantes, tais como: Contratação de seguranças privados e orientadores de público; Venda de ingressos; Disponibilização de equipe médica com profissionais em número suficiente para atender ao público presente; Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 11 Contratação de empresa responsável pela alimentação do público; Contratação de empresa responsável pela limpeza do local; Iluminação e sinalização do local de evento, principalmente aquelas referentes às saídas de emergência; Elaboração do PLANO DE AÇÃO para o Evento; Controle de lotação do espaço de evento; Solicitação da emissão dos alvarás requeridos por lei para o funcionamento do evento; Responsabilizar-se pelo comportamento dos protagonistas (objeto de cláusulas contratuais legais); Tratar com os meios de circulação e transporte, para fins de atendimento de demandas extras. 2.1.1.1 Em Eventos Esportivos Com o advento da Lei 10.671, de 15/05/2003, conhecida como Estatuto de Defesa do Torcedor, ou Estatuto do Torcedor, a participação dos organizadores desses eventos ficou bem definida, notadamente no que diz respeito à segurança dos torcedores, nos termos do artigo 14 dessa lei, conforme se vê abaixo: Art. 14. Sem prejuízo do disposto nos Arts. 12 a 14 da Lei nº 8.078, de 11/09/1990, a responsabilidade pela segurança do torcedor em evento esportivo é da entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo e de seus dirigentes, que deverão: I – solicitar ao Poder Público competente a presença de agentes públicos de segurança, devidamente identificados, responsáveis pela segurança dos torcedores dentro e fora dos estádios e demais locais de realização de eventos esportivos; II – informar imediatamente após a decisão acerca da realização da partida, dentre outros, aos órgãos públicos de segurança, transporte e higiene, os dados necessários à segurança da partida, especialmente: a) o local; b) o horário de abertura do estádio; c) a capacidade de público do estádio; e d) a expectativa de público; III – colocar à disposição do torcedor orientador e serviço de atendimento para que aquele encaminhe suas reclamações no momento da partida, em local: a) amplamente divulgado e de fácil acesso; e b) situado no estádio. 2.1.1.2 Em Eventos Comemorativos (Religiosos ou Festivos /Artísticos) São os responsáveis pela montagem e desmontagem das estruturas inerentes ao evento, tais como palco, camarins, camarotes, arquibancadas, posto de comando, dentre outras que requerem atenção dos órgãos de segurança. Também cuidam de contratar seguranças privadas e orientadoras de público em números suficiente para atender às demandas de rotina ou inopinadas. 2.2 Protagonistas do Espetáculo Qualquer pessoa ou grupo de pessoas que constituam o alvo principal da atenção do público presente. São os artistas, jogadores, atletas, religiosos ou outros que, por sua participação no evento, ainda que de forma coadjuvante, como no caso da equipe de arbitragem de uma partida de futebol, atraiam sobre si a atenção da plateia. Em outras palavras, os protagonistas do espetáculo são o motivo real da presença do público no evento. 2.2.1 Participação/Impacto na Segurança do Evento Como dito anteriormente, os protagonistas são o motivo de o público comparecer ao evento. Desse modo, a sua participação é, indiscutivelmente, a razão de ser do espetáculo. Os protagonistas constituem um elemento importantíssimo na segurança do evento, uma vez que sua atuação antes ou, principalmente, durante o espetáculo pode contribuir sobremaneira para desdobramentos prejudiciais à segurança do evento. Muitos são os exemplos de protagonistas que, valendo-se de sua posição de destaque, extrapolam o seu mister de entreter ou distrair a massa, levando as pessoas na assistência a reagirem de modo extremo e arriscado, algumas vezes desencadeando uma ação generalizada do público até mesmo contra o policiamento. A seguir, algumas considerações sobre como a ação dos protagonistas pode influenciar diretamente nas ações de segurança, principalmente na execução do policiamento, seja para o bem ou o mal estar dos envolvidos no evento. 2.2.1.1 Em Eventos Religiosos Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 12 O apelo à emoção dos fiéis pode ser um fator de risco à segurança de um evento. Para tanto, basta que o protagonista faça declarações polêmicas ou instigue, de algum modo, os fiéis a praticarem atos que ponham em risco a segurança das pessoas. 2.2.1.2 Em Eventos Artísticos Não é raro acontecer de artistas famosos valerem-se de sua condição de protagonista principal do espetáculo e, contrariando as regras de segurança ou a lei, em alguns casos, insultar as forças de segurança pública ou privada e incitar a massa, provocando manifestações ofensivas ou violentas contra a segurança privada ou o policiamento presente no local. Artistas que se jogam do palco para a plateia também constituem fator de preocupação para o policiamento, por conta dos riscos a que estão se auto impondo os protagonistas. 2.2.1.3 Em Eventos Esportivos Não é raro acontecer de um protagonista em um evento esportivo interagir com os outros envolvidos, a ponto de provocar reações que mobilizem a força policial para evitar riscos à segurança do evento. Na hora em que marcam um gol, por exemplo, há jogadores que optam por ofender a torcida adversária, fazendo gestos provocativos. Há ainda os que jogam a camisa para a torcida, fazendo com que muitos torcedores se arrisquem junto aos fossos ou muretas de proteção. Nesse último caso, havendo um acidente provocado pela atitude do jogador, o protagonista pode ser responsabilizado? Nessa situação, quais procedimentosdevem ser adotados pelos agentes de segurança, notadamente os policiais militares, para evitar que ou os atletas não interajam com os torcedores dessa maneira, ou os torcedores não se comprimam junto à barreira física? Essas são indagações muito pertinentes e que não são tão fáceis de responder. Por agora, deixaremos as questões ‘no ar’, para serem respondidas mais adiante, quando formos falar sobre a legislação aplicada aos grandes eventos e, também, do planejamento operacional e das táticas e técnicas aplicadas a um grande evento. Há, ainda, as situações de brigas entre jogadores ou comissões técnicas. Felizmente, já não são mais tão comuns quanto ha uma década. Contudo, briga entre os jogadores ainda é capaz de ‘inflamar’ os ânimos entre os torcedores ou entre membros das delegações, o que constitui um risco para a segurança do evento, porquanto, nesse momento, além das próprias lesões mútuas que podem ser causadas pelos protagonistas, alguns torcedores podem se sentirem encorajados a invadir locais de acesso proibido, como a área de competição e o próprio campo de jogo. 2.3 Protagonistas Secundários São aqueles que têm uma função definida junto aos protagonistas principais, e também podem vir a ser o centro das atenções, ainda que temporariamente, haja vista que interagem diretamente no evento por serem essenciais ao bom andamento do espetáculo. É o caso dos árbitros que, durante o desenrolar do seu trabalho, podem vir a desencadear nos protagonistas ou no público assistente um sentimento de raiva e agressividade catalisadora de atos de violência. Os locutores de rodeio, locutores de estádios, as animadoras de torcida, assim como os ‘apanhadores de bola’ (gandulas) também estão na condição de protagonistas secundários, pois desenvolvem seus trabalhos dentro da área de competição, muito próximo dos jogadores e podem acabar interagindo de modo decisivo numa partida de futebol. 2.4 Pessoal de Serviço São os profissionais envolvidos na execução das ‘ações de bastidores’ durante a realização do evento e imediatamente após o término deste. A relação desses profissionais, suas qualificações e quantitativo, podem variar de acordo com o tipo de evento, o local onde será realizado, o protagonista principal e a quantidade de público estimada, o que fica definido, normalmente, no Plano de Ação feito pela organização e apreciado antecipadamente pelos órgãos de segurança pública. 2.4.1 Participação/Impacto na Segurança do Evento Este trabalho não contemplará todos os componentes possíveis de serviço em um evento, mas somente aqueles que, por sua qualificação e responsabilidade, executam atividades que impactam na segurança do evento, e que, independentemente do tipo de evento, têm atribuições iguais ou similares durante o espetáculo. 2.4.1.1 Polícia Militar O trabalho da Polícia Militar varia de acordo com o tipo de evento. Contudo, o mister constitucional Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 13 desse órgão de segurança pública não pode sofrer qualquer tipo de intervenção que diminua ou impeça o pleno exercício de suas atribuições legais. Assim, em eventos como ‘apresentações de artistas ou religiosos famosos’, em que o ânimo do público é, em tese, pacífico e ordeiro, o policiamento quase sempre se restringe a patrulhar o entorno da multidão, fazendo incursões esporádicas em meio à massa, a fim de impedir a ação de delinquentes que se aproveitam dos momentos de distração das pessoas. Por outro lado, em eventos como o ‘Clássico Rei’, partida de futebol disputada entre os times do Ceará e do Fortaleza, a atuação da Polícia Militar é bem mais incisiva e rigorosa. Nesses casos, abordagens a pessoa ou grupo de pessoas, prisões e ações de controle de distúrbio civil são comuns e recorrentes, por conta do comportamento agressivo, violento e, muitas vezes, criminoso de certos grupos de pessoas que vão ao estádio, como os membros das torcidas organizadas. 2.4.1.2 Segurança Privada De acordo com o Decreto Federal Nº 89.056, de 24/11/1983, Art. 30. São considerados como segurança privada as atividades desenvolvidas em prestação de serviços com a finalidade de: I - proceder à vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, e à segurança de pessoas físicas; O Departamento de Polícia Federal, através da Portaria nº 3.233/2012-DG/DPF, de 10/12/2012, assim se pronuncia em relação à atividade de segurança privada: Art. 19. A atividade de vigilância patrimonial em grandes eventos, assim considerados aqueles realizados em estádios, ginásios ou outros eventos com público superior a três mil pessoas deverão ser prestadas por vigilantes especialmente habilitados. Parágrafo único. A habilitação especial referida no caput corresponderá ao curso de extensão em segurança para grandes eventos, ministrado por empresas de cursos de formação de vigilantes, em conformidade ao disposto nesta Portaria. ... Art. 156. São curso de formação, extensão e reciclagem: ... XI - curso de extensão em segurança para grandes eventos (Anexo XI). 2.4.1.3 Orientadores de Público Pode-se dizer que o conceito de ‘orientadores’ é relativamente novo no Brasil. Foi a partir do advento do Estatuto de Defesa do Torcedor que esse tipo de profissional ganhou mais espaço nos eventos, embora se saiba que os orientadores não trabalham somente em eventos esportivos. Sua atuação é de fundamental importância em ambientes com grande número de pessoas, de tal sorte que as orientações prestadas por esses profissionais podem impactar significativamente no bem estar do público, trazendo-lhe comodidade e segurança, ou, ao contrário, gerando risco à integridade física das pessoas. Com a escolha do Brasil para sediar os dois eventos futebolísticos mais importantes envolvendo seleções mundiais, a saber, a Copa das Confederações Brasil 2013 e a Copa do Mundo FIFA Brasil 2014, eis que surge um novo e importantíssimo personagem no contexto ‘segurança de grandes eventos’: o ‘steward’, cujo conceito pode ser assim entendido, a partir de uma tradução livre do texto constante do dicionário ‘Cambridge Advanced Learner’s Dictionary’, 3ª Edição: “Pessoa responsável por atender ao público de um evento, providenciando serviços e cuidados que garantam às pessoas o conforto e a segurança devidas.” Em termos mais específicos, a atuação dos orientadores de público (stewards), em qualquer tipo de evento, pode ser mais bem esclarecida a partir do texto constante do Plano Tático Integrado de Segurança Pública Para Copa do Mundo 2014, documento da Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos – SESGE, no seu item ‘6’, que trata da ‘Visão Geral da Operação de Segurança’, subitem ‘6.15’, que trata dos ‘Stewards’, tudo nos seguintes termos. Aos novos atores que alteram o conceito e o processo de segurança conhecido em eventos de futebol no Brasil, incumbe reforçar a política de segurança do estádio, através das seguintes atribuições: 1) Atuar na organização e orientação ao público, prevenção e gerenciamento de conflitos; 2) Facilitar a atuação das forças públicas de segurança; 3) Exercer o controle de acesso ao estádio e orientar os espectadores adentrando, saindo ou ao redor do estádio, facilitando o fluxo de pessoas; 4) Garantir que os espectadores ocupem os assentos de acordo com seus ingressos, assegurar que todos os pontos de entrada e de saída, incluindo todas as saídas e rotas de emergência, permaneçam desobstruídas; Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 14 5) Proteger jogadores e funcionáriosao entrar, sair, ou enquanto se encontram no campo de jogo; 6) Reconhecer as condições da multidão, garantir a dispersão segura dos espectadores e evitar superlotação; 7) Fornecer primeiros socorros; 8) Responder a incidentes e emergências, ativar alarmes e tomar as medidas imediatas necessárias, de acordo com o plano de contingência e emergência do estádio. Os Stewards deverão ser posicionados em torno ao campo de jogo, inclusive para prevenir e responder à intrusão, sem que isto signifique exclusão das forças públicas de segurança. Os stewards não utilizarão armas de fogo ou menos do que letais, armas ou lançadores de gás ou sprays para controle de distúrbios, bem como não utilizarão coletes táticos, capacetes ou escudos. Como bem se vê a palavra ‘jogadores’ pode perfeitamente ser substituída por ‘artistas’, ‘músicos’, ‘religiosos’ ou ‘políticos’, de tal modo que a atuação dos orientadores (stewards) em eventos esportivos, artísticos ou religiosos é rigorosamente a mesma: “1) Atuar na organização e orientação ao público, prevenção e gerenciamento de conflitos; 2) Facilitar a atuação das forças públicas de segurança.” 2.4.1.4 Profissionais de Outros Órgãos Públicos A realização de um grande evento passa, invariavelmente, por uma reunião na qual são discutidos todos os pontos que envolvem a segurança no local. Um desses pontos é a instalação de um ‘Posto de Comando’, ou ‘Central de Comando’, onde ficam posicionados os órgãos de segurança pública e, em alguns casos, órgãos do Poder Judiciário. Assim acontece em eventos como o ‘Réveillon do Aterro da Praia de Iracema’, o ‘Fortal’ e a ‘Expocrato’, para ficarmo-nos mais conhecidos no Ceará. Com isso, quase sempre, órgãos como a Polícia Civil, o Corpo de Bombeiros, a Guarda Municipal, o Juizado da Infância e da Juventude, além dos órgãos de socorro de urgência, mantém profissionais no posto de comando, prontos para atenderem às demandas inerentes às suas respectivas competências legais. 2.4.1.4.1 Diferença de atuação das Forças Públicas e Privadas Mesmo com toda a riqueza de informações acerca da função de cada uma das forças de segurança, sejam elas públicas ou privadas, alguns profissionais/gestores/organizadores de eventos ainda debatem e questionam qual o real limite e as funções de cada uma das delas. Para ajudar a definir estas atribuições o Ministério dos Esportes lançou em 2016 o MARCO DE SEGURANÇA NO FUTEBOL, GUIA DE RECOMENDAÇÕES PARA ATUAÇÃO DAS FORÇAS DE SEGURANÇA PÚBLICA EM PRAÇAS DESPORTIVAS, que faz a seguinte diferenciação na atuação das forças de segurança: Primeiro nível Refere-se à orientação inicial e direcionamento de público, prevenção e ações que não resultem em necessidade de contato físico e preferencialmente deverá ficar a cargo dos agentes de segurança privados, cabendo às forças de segurança pública a atuação nesse nível por demanda. É razoável a hipótese de intervenção direta das forças de segurança pública, se verificadas situações e circunstâncias que exijam a intervenção imediata. Segundo nível Corresponde às intervenções das forças de segurança pública, quando esgotada a capacidade ou poder de agir dos agentes de segurança privada, observando o uso seletivo da força e a dosimetria na resolução de cada problema apresentado. Neste nível, as ações policiais serão desenvolvidas de forma altamente ostensiva, empregando todos os meios operacionais disponíveis para que o policiamento seja atuante e visto em todos os deslocamentos, percursos e locais de concentração de público, sem grande interferência nos deslocamentos ou comemorações, com foco precípuo na detecção de ilícitos. Terceiro nível Corresponde às intervenções policiais que exijam o emprego de forças especiais, de acordo com a necessidade apresentada, quando extrapoladas a capacidade ou poder dos policiais empregados na atividade convencional. 2.4.1.5 Outros Profissionais Em Fortaleza-CE, foi sancionada a Lei nº 9.477, de 9/04/2009, que faz referência à venda e ao consumo de bebidas alcoólicas no entorno dos estádios e ginásios desportivos, em dias de jogos, ressaltando-se a participação dos fiscais das Secretarias Executivas Regionais, órgãos da Prefeitura Municipal de Fortaleza, na fiscalização do cumprimento da lei, com o apoio da Guarda Municipal de Fortaleza e da Polícia Militar, tudo nos seguintes termos: Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 15 Art. 8º - Fica proibida a venda e o consumo de bebidas alcoólicas, em dias de jogos, no entorno dos estádios de futebol e ginásios esportivos localizados no Município de Fortaleza. Parágrafo Único - A proibição de que trata a caput dar-se-á das 3 (três) horas que antecedem o início do jogo até 1 (uma) hora após seu término, num raio de distância de 100,00m (cem metros) dos limites dos estádios e ginásios. (FORTALEZA, 2009) ... Art. 10... § 2º A fiscalização do cumprimento das normas desta lei será exercida pela Administração Municipal, através de suas Secretarias Executivas Regionais (SER) e da Guarda Municipal de Fortaleza, com a participação dos órgãos de segurança pública do Governo do Estado do Ceará. DESTACOU-SE Os órgãos de trânsito e de mobilidade urbana também fazem parte do ‘colegiado’ que desenvolvem ações impactantes na realização de um grande evento. Seus respectivos planos de operações contemplam ações que causam impacto significativo em determinados grupos de pessoas, as quais, embora não necessariamente interessadas no evento, têm suas rotinas fortemente alteradas pela realização do espetáculo. 2.4.1.6 Imprensa Cuida de coletar todas as informações possíveis e necessárias a respeito do evento, com o fim de repassá-las ao público. A imprensa, nesse sentido, constitui uma importante ferramenta para repassar às pessoas interessadas dados importantes como locais, datas, horas e preços do ingresso do evento, além de informar a respeito de alterações no trânsito e na mobilidade urbana que possam alterar a rotina da vizinhança, onde ocorrerá o evento, como veste anteriormente, na questão que trata dos órgãos de trânsito e mobilidade urbana. 2.4.1.6.1 Relacionamento Polícia Militar & Imprensa A despeito das dificuldades encontradas pelos órgãos policiais no trato com a imprensa em algumas situações, é certo que polícia militar e imprensa são atores importantes e essenciais dentro do grupo que compõe o ‘pessoal de serviço’ em um grande evento, sendo salutar e essencial para a segurança de todos que esses dois atores atuem em conjunto, respeitando- se, obviamente, a esfera de atribuição de cada um. Para que haja um bom relacionamento da polícia militar com a imprensa nos serviços em grandes eventos, necessário se faz, dentre outras coisas, que se conheça e entenda o papel da imprensa, o que pode ser conseguido a partir de contatos prévios que criem um vínculo de confiança entre esses dois atores, situação essa que é benéfica e que gera bons resultados para a segurança dos grandes eventos. 2.4.1.6.2 Papel da Imprensa O papel da imprensa, em resumo, é transmitir informações ao público. Ocorre que, para tanto, algumas vezes, o profissional de imprensa assume posição dentro do teatro de operações que coloca em risco sua própria integridade física. Exemplo recente dessa situação é a morte do cinegrafista da Rede Bandeirante, no ano de 2013. Outro caso foi o que aconteceu durante os confrontos entre as forças de segurança pública e os manifestantes ‘blackblocs’ em junho de 2013, aqui em Fortaleza. Durante uma manifestação no início da Avenida Alberto Craveiro, repórteres cinematográficos procuraram abrigo em uma casa de sobrado a qual também servia de abrigo para os manifestantes. De lá eram jogadas bombas caseiras contra os policiais,os quais usaram munição química para retirar os manifestantes da casa. Ocorre que os gases também atingiram os profissionais da imprensa, em virtude de eles terem assumido posição junto dos manifestantes. Em outros casos, a dinâmica de trabalho dos dois atores, polícia militar e imprensa, acaba criando um antagonismo desnecessário no local do evento, por vezes fruto de vaidades ou do desconhecimento mútuo do mister de cada um dos atores, levando a uma antipatia recíproca que pode resultar em confrontos verbais ou físicos, os quais, uma vez ocorridos, são amplamente divulgados pelos meios de comunicação, representando prejuízos significativos à imagem da Corporação Policial Militar. Tal situação pode ser mitigada ou anulada a partir de coletivas de imprensa, em que se discutam o roteiro das ações de segurança no teatro de operações, não necessariamente em sua totalidade ou com riqueza de detalhes, posto que haja dados confidenciais que devem ser restritos aos integrantes da segurança pública, de tal maneira que se esclareçam pontos de interesse comum a esses envolvidos no evento, como, por exemplo, a definição de áreas de acesso, fluxo ou permanência proibidas durante a atuação da polícia militar. 2.4.1.6.3 Legislação Pertinente à Imprensa Abaixo estão elencados alguns dispositivos legais pertinentes à atividade de imprensa no Brasil. Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 16 Art. 5o da CF/88 XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; Direito Honra, de Imagem e de Marca, Incisos X e XXIX do Artigo 5º da CF/88; Lei n° 5.250/67 Lei de Imprensa. 2.4.1.6.4 Montagem da Pauta Para conseguir se organizar diante da quantidade de assuntos a serem noticiados, os profissionais de imprensa precisam montar uma pauta com prioridades dentro de suas linhas de trabalho. A polícia militar, nesse contexto, pode contribuir sugerindo assuntos para a pauta, apresentando-lhes temas relevantes e de interesse da população, tais como: Local/Data/Hora do evento; Hora de abertura dos portões; Melhor itinerário até o local do evento; Locais de venda dos ingressos. Classificação etária; Objetos ou substâncias de acesso proibido nos eventos; Local de acesso das torcidas no estádio/ginásio. Isso previne contra o encontro de torcedores com histórico de animosidade ou violência; Resultados da operação desenvolvida no evento; Direito de resposta; Outras informações. 2.5 Público Trata-se do elemento envolvido no evento que merece maior atenção neste estudo, uma vez que o desenvolvimento das ações policiais no local pode variar de acordo com o comportamento e atos praticados antes, durante e logo após o evento. O público que comparece a um evento, seja ele de grande, médio ou de pequeno porte, certamente o faz em busca de satisfação quanto ao lazer, ao sentimento de fazer parte de um grupo, ou, simplesmente, por curiosidade. Tal satisfação faz parte de algo maior, mais complexo e que tem definido o comportamento das pessoas que compõem a plateia de um grande evento, que é o ciclo motivacional, objeto de nosso estudo nos capítulos seguintes. 3. A PSICOLOGIA DAS MASSAS APLICADA AO POLICIAMENTO DE GRANDES EVENTOS O estudo do comportamento das massas passa, invariavelmente, pelo entendimento do que seja o ciclo motivacional, cuja ocorrência se dá a partir da quebra da homeostase, ou homeostasia, termo cunhado em 1929 pelo fisiologista norte americano Walter B. Cannon, que vem a ser a capacidade que o corpo humano tende manter estáveis as condições internas do organismo face às contínuas alterações do meio exterior. Muito embora esteja fortemente relacionado ao termo ‘equilíbrio’, como se tratando de algo parado ou inalterado, a homeostase não é uma situação estática, ela varia dentro de limites precisos e ajustados, constituindo um equilíbrio buscado por todos os mecanismos vivos, por mais variados que sejam segundo ensinou em 1859 o fisiologista francês Claude Bernard. É a quebra desse sentimento de equilíbrio que dá início ao ciclo motivacional, a partir do surgimento de uma necessidade, força dinâmica que persiste e provoca o comportamento humano a buscar restaurar a homeostase perdida. 3.1 Ciclo Motivacional Trata-se de um sistema composto por elementos cuja existência motiva o surgimento de outros elementos, os quais se interligam criando um ciclo, cujo objetivo é manter o organismo humano em um estado dinâmico de equilíbrio, através de variações das condições internas da pessoa, como resposta aos estímulos externos responsáveis pela quebra da homeostase. Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 17 Figura 1: Fases do ciclo motivacional. Fonte: O conteudista. Ocorre que a necessidade nem sempre pode ser satisfeita. Por vezes ela é frustrada, o que faz com que a tensão criada pela necessidade não seja liberada. Diante desse quadro de represamento da tensão no organismo, este, naturalmente, procura uma saída que reconduza à homeostase, valendo-se da via psicológica, através de demonstrações de agressividade, descontentamento, apatia, tensão emocional ou indiferença, ou da via fisiológica, por meio de tensão nervosa, insônia, repercussões cardíacas ou digestivas. Pode acontecer, ainda, de a necessidade não ser nem satisfeita nem frustrada, mas transferida ou compensada, o que ocorre quando a frustração causada pelo insucesso de satisfazer a necessidade inicial é reduzida ou aplacada pela satisfação de uma outra necessidade. Desse modo, o ciclo motivacional passa a mostrar a seguinte configuração: ESTADO DE EQUILÍBRIO COMPENSAÇÃO ESTÍMULO (Incentivo) CICLO MOTIVACIONAL (Com frustração) OUTRO COMPORTAMENTO DERIVATIVO NECESSIDADE FRUSTRAÇÃO BARREIRA TENSÃO Figura 2: Configuração do ciclo motivacional. Fonte: O conteudista. 3.2 A Teoria a Respeito da Hierarquia das Necessidades Humanas Ainda na primeira metade do século passado, o psicólogo norte americano Abraham Maslow desenvolveu um trabalho de pesquisa que resultou na sua mais famosa obra sobre motivação humana: ‘A Teoria a Respeito da Hierarquia das Necessidades Humanas’. Também conhecida como ‘Pirâmide de Maslow’, essa teoria é uma divisão hierárquica proposta pelo psicólogo, segundo a qual as necessidades de nível mais baixo devem ser satisfeitas antes das necessidades de nível mais alto. Por esse entendimento, cada pessoa deve “escalar” essa hierarquia de necessidades para que possa atingir a auto realização. Maslow define um conjunto de cinco necessidades descritas na pirâmide da figura abaixo. Figura 3: Pirâmide de Maslow. Fonte: Internet. Disponível em http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/6/65/Hie rarquia_das_necessidades_de_Maslow.svg/2000px- Hierarquia_das_necessidades_de_Maslow.svg.png. Capturado em 07/03/2015. Na base da pirâmide encontram-se as necessidades fisiológicas, que vêm a ser as mais básicas do ser humano, tais como a fome, a sede, o sono, o sexo, a excreção, a homeostase. As necessidades fisiológicas, segundo Maslow, devem ser atendidas primeiro, antes que se busque a realização das demais necessidades. As outras necessidades, por ordem hierárquica de‘atendimento’, são: 3.1.1 Segurança, que vão da simples necessidade de sentir-se seguro dentro de casa a formas mais elaboradas de segurança como um emprego estável, um plano de saúde ou um seguro de vida; Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 18 3.1.2 Sociais ou de Amor, afeto, afeição e sentimentos tais como os de pertencer a um grupo ou fazer parte de um clube; 3.1.3 Estima que passam por duas vertentes, o reconhecimento das nossas capacidades pessoais e o reconhecimento dos outros face à nossa capacidade de adequação às funções que desempenhamos; 3.1.4 Auto realização, em que o indivíduo procura tornar-se aquilo que ele pode ser:. Figura 4: Pirâmide de Maslow estilizada. Fonte: Internet. Disponível em http://gestaonossadecadadia.com.br/wp- content/uploads/2013/01/Pir%C3%A2mide-de-Maslow.jpg. Capturado em 07/03/2015. É neste último patamar da pirâmide que Maslow considera que a pessoa tem que ser coerente com aquilo que é na realidade "... temos de ser tudo o que somos capazes de ser, desenvolver os nossos potenciais". 3.3 Fatores Psicológicos do Público em um Grande Evento Conforme visto anteriormente, as pessoas vão a um grande evento em busca de satisfação quanto ao lazer, ao sentimento de fazer parte de um grupo, ou, simplesmente, por curiosidade. Tal satisfação faz parte de um sistema conhecido como ‘ciclo motivacional’, dentro do qual se encontra o elemento “comportamento”, que se revela através de certos fatores psicológicos perfeitamente notáveis nas pessoas presentes em um grande evento, conforme bem explica o Manual de Policiamento em Eventos (M- 10-PM), da Polícia Militar do Estado de São Paulo, 4ª Edição, já citado nesta apostila, que traz, no seu Capítulo II, o seguinte texto: 3.4 O público 1.0 - DOS FATORES PSICOLÓGICOS. 1.1 - Considerações. 1.1.1 - O espectador, quando envolvido numa massa, geralmente deixa de raciocinar e agir como indivíduo isolado, passando a reagir na proporção em que a massa reage, uma vez que sofre influências de fatores psicológicos, como: 1.1.1.1 - número; 1.1.1.2 - sugestão; 1.1.1.3 - contágio; 1.1.1.4 – imitação; 1.1.1.5 - novidade; 1.1.1.6 - anonimato; 1.1.1.7 - expansão de emoções reprimidas; 1.1.1.8 – sensação de impunidade. São esses fatores que passaremos a estudar, a partir de agora. 3.3.1 Número: Inserida na massa, a pessoa contempla a si mesma não mais como um ente único, isolado e indefeso, mas como parte de um corpo maior e mais poderoso, capaz de impor suas vontades aos demais envolvidos no evento, ainda que de maneira moralmente repreensível ou delituosa. Quanto maior o número de indivíduos, maior a sensação de poder e segurança para o cometimento de atos lícitos ou ilícitos. Para minimizar a influência deste fator psicológico, deve-se cria setores no local do evento e áreas de circulação utilizando grades de balizamento para direcionar e dividir o público durante o acesso. 3.3.2 Sugestão: O comportamento da pessoa, nesse caso, é fruto de uma ideia surgida de um indivíduo do grupo, que se propaga entre os demais, que a aceitam de maneira tácita e inconsciente, sem discussão ou contestação, como se fosse a ideia proposta por um líder. Podem ser positivas ou negativas. É assim com os cânticos, com a famosa ‘ola’ nas arquibancadas, com as brigas em frente ao palco nos shows de hard rock e, em casos extremos, com os confrontos com as forças de segurança. Para minimizar os efeitos deste fator psicológico é necessário orientação, fiscalização e aproximação da PM com o público. 3.3.3 Contágio: Uma vez aceita a sugestão, a pessoa se torna receptiva aos estímulos vindos da massa, deixando-se contagiar pelo movimento conjunto da maioria, num processo que leva o indivíduo a tentar atrair novos participantes da ação, criando-se uma corrente de comportamentos idênticos, reflexo de um acatamento natural daquilo que está sendo feito por todo o grupo. No contágio Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 19 não há análise ou raciocínio do comportamento adotado, faz-se de forma impulsiva e desapercebida, ao contrário do que ocorre na imitação. 3.3.4 Imitação: A exemplo da ‘sugestão’ e do ‘contágio’, e em conjunto com esses dois fatores, a ‘imitação’ também exerce papel fundamental no comportamento de um indivíduo inserido numa massa. Ao presenciar atos praticados por um ou mais indivíduos, a pessoa pode sentir um desejo de imitar esses atos, deixando-se contagiar pela euforia, a ponto de abdicar de seu pudor, seus costumes ou, até mesmo, sua segurança e passar a fazer parte da massa que age irracionalmente, sem liderança ou controle. 3.3.5 Novidade: Este é outro fator psicológico muito influente no comportamento do público em um grande evento. Estimulado ou confrontadas por circunstâncias novas e desconhecidas, o indivíduo pode vir a ignorar, inconscientemente, suas experiências passadas, reagindo de modo contrário ao que os seus princípios e normas de boa convivência pregam como solução para os problemas cotidianos. Um exemplo clássico é o indivíduo que tira “selfie” ao entrar em contato com o “novo”. 3.3.6 Anonimato: Talvez seja o fator psicológico com maior poder de influenciar a pessoa a agir conforme a massa. Acobertado pelo grande número de pessoas que compõem o seu grupo, o indivíduo sente que está em uma situação ‘confortável’ no tocante à dificuldade de ser identificado, restando-lhe, portanto, uma sensação concreta de impunidade, que o encoraja a agir de forma irresponsável e completamente fora de seu padrão de preservação da autoestima. Para minimizar os efeitos deste fator psicológico, tanto o organizador do evento como a polícia militar deve usar de monitoramento por câmeras, fotos, patrulhas ostensivas e facho de luz para evitar que o indivíduo perca os freios morais. 3.3.7 Expansão das Emoções Reprimidas: A necessidade de “oportunidades para se expressar”, muitas vezes não satisfeita no cotidiano do indivíduo, por conta das regras e valores éticos e morais a que ele está submetida, gera uma tensão que encontra na massa presente a um evento o ambiente propício para que as emoções reprimidas sejam liberadas, criando-se uma compensação que dá prosseguimento ao ciclo motivacional desse indivíduo. Pode ser percebido através de xingamentos, pulos, gritos, gestos ofensivos e caretas. 3.3.8 Sensação de Impunidade: É o fator psicológico que gera no indivíduo a falsa impressão de que seus atos não terão consequências, que não haverá punição pelos ilícitos cometidos em meio ao público, e que se houver serão insignificantes. Para minimizar os efeitos deste fator psicológico o Policial Militar deverá ter “tolerância zero” com o cometimento de crimes e contravenções. 3.4 Fatores Exógenos - Reação do Público aos Estímulos Externos em um Grande Evento Os fatores exógenos são estímulos externos que influenciam o comportamento do público tais como bebidas alcoólicas, drogas, fome, sede e etc. Estas substâncias podem gerar problemas de saúde no grupo como desmaio, mal súbito e confronto. Estudamos que os fatores psicológicos são capazes de levar o indivíduo a reações incomuns no dia a dia das pessoas que compõem o público. Agressividade, violência, desrespeito e euforia exacerbada são respostas imediatas aos estímulos externos vindos da massa; estímulos esses algumas vezes insignificantes, mas com poder de influenciar coletivamente um número muito grande de pessoas, levando-as a praticarem atos como: Comportamento semelhante à histeria; Provocações verbais através de ofensas; Arremesso de objetos, como copos, garrafas,sacos plásticos, contendo água ou outra substância, tênis/sapatos; Detonação de fogos de artifícios ou, em casos extremos, de bombas de fabricação caseira; Disparo de armas de fogo. 3.4.1 Fatores Ambientais São fatores relacionados a infraestrutura física dos locais de eventos e a prestação do serviço. Ambientes, controlados, limpos, modernos e com tratamento adequado às pessoas fazem com que os indivíduos tenham um comportamento mais ordeiro. Prova disso são as novas arenas construídas para a Copa do Mundo FIFA 2014 no Brasil, apesar do histórico de problemas persistir, não se pode negar que os ambientes dos estádios estão melhores e proporcionando mais qualidade aos torcedores. 3.4.2 Fatores Naturais São fatores relacionados a fenômenos da natureza como chuva, sol, calor, frio, dentre outros, que geram consequências, como horário de chegada e Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 20 saída do público e até mesmo aglomerações e certos setores. Por último é importante lembrar que os fatores de comportamentos psicológicos, exógenos, ambientais e naturais podem afetar também o Policial Militar de serviço, levando o mesmo a fazer uso errado dos equipamentos. Portanto é de suma importância que todo PM tenha conhecimento dos fatores para que saiba como lidar com eles. 3.5 Classificação do Público Quanto ao Comportamento em um Grande Evento Classificar pessoas segundo critérios psicológicos pode não ser uma tarefa com cem por cento de certeza de acerto quanto à classificação. Contudo, os fatores psicológicos já estudados aqui são uma referência segura para o planejamento e execução do policiamento de um grande evento. Para efeitos didáticos, classificaremos o público em dois tipos: a) Eventual; b) Fanático. 3.5.1 Público Eventual: Constitui-se de indivíduos geralmente pacatos, que não vão a grandes eventos com frequência. Por isso mesmo, desconhecem ou estranham a rotina de obrigações a que são submetidos, como, por exemplo, a relação de materiais não permitidos no interior do local do espetáculo ou jogo. Também, não se prestam a ‘idolatrar’ os protagonistas a ponto de usarem trajes espalhafatosos ou pinturas corporais com referências aos artistas/atletas. No máximo, vestem uma camisa com o nome ou a logomarca/brasão do seu artista/conjunto musical/time de preferência. Outros aspectos característicos do público eventual: Muito comum nas cidades do interior; Faz do show/jogo um momento de lazer e descontração com a família; Protagoniza problemas de pequena relevância; São vítimas preferenciais dos cambistas e dos ‘guardadores de carros’ (flanelinhas). 3.5.2 Público Fanático: Constitui-se de indivíduos que demonstram excesso de admiração pelos protagonistas do espetáculo ou do jogo. O estado psicológico desse tipo de público chega a ser irracional e persistente, resultando em comportamentos que beiram o delírio. Em geral, são pessoas entusiasmadas, apaixonadas e obstinadas, capazes de atos moral e legalmente repreensível, unicamente para demonstrarem sua excessiva admiração pelos protagonistas do espetáculo. Os aspectos característicos desse grupo de indivíduos, segundo a 1º Ten. PMESP Letícia, em sua apostila sobre ‘Comportamento Social’, do Curso de Especialização de Oficiais – Policiamento de Eventos, da Polícia Militar do Estado de São Paulo, são: Constância no comparecimento aos eventos; Indivíduo, via de regra, mais extrovertido; Por outros motivos pode não atentar para o evento; Ostenta vestimentas características de seu time/ídolo; Tem tatuagens no corpo com referências ao objeto de sua admiração; Conhece muito sobre seu time/ídolo; É capaz de cometer atos de violência ou de vandalismo; Muitas vezes são integrantes de grupos organizados; Suas atitudes, muitas vezes, são imprevisíveis. A apostila da Ten. Letícia, da Polícia Militar de São Paulo, traz, ainda, uma classificação do público fanático, de acordo com o comportamento do indivíduo no evento. 3.5.2.1 Pacífico Esse tipo de indivíduo, embora fanático, não se envolve e nem participa de ações violentas. Eventualmente pode se envolver em confusões, o que acontece, quase sempre, de forma involuntária. Sua paixão e devoção constituem-se de um profundo sentimento de carinho e admiração, exteriorizado através das vestimentas, das tatuagens e demais sinais ou marcas que o identifique com seus ídolos. 3.5.2.2 Violento Apresenta uma agressividade excessiva, fruto de um ódio cultivado a partir da ideia dicotômica do bem e do mal, em que o mal se traduz por tudo aquilo ou todos aqueles que pensam ou agem contrariamente ao seu modo de pensar. Tal radicalismo, muito frequentemente, faz o indivíduo adotar comportamentos violentos, em resposta à tensão provocada pela ira e o inconformismo diante de situações contrárias ao que ele considera correto. Academia Estadual de Segurança Pública do Ceará – AESP|CE Curso de Formação Profissional para a Carreira de Oficiais Policiais Militares - CFPCO/PM POLICIAMENTO EM GRANDES EVENTOS 21 Alguns fanáticos violentos não tomam a iniciativa de gerar tumultos, brigas, desordens, mas reagem com violência se forem provocados. Geralmente esse tipo de público é mais comum em eventos esportivos, quando praticam atos de violência para ‘proteger e honrar sua torcida organizada’. A maioria dos fanáticos violentos, contudo, comparecem aos eventos essencialmente para causar confusões, “através de atos previamente planejados, visando provocar outros grupos com o intuito de realizar verdadeiros confrontos, inclusive contra a polícia, organizadores e empresas de segurança.” (1º Ten. PMESP Letícia) Um exemplo de público fanático violento seria as ‘torcidas organizadas’ ou ‘torcidas uniformizadas’, cujos membros têm protagonizado as cenas mais violentas e reprováveis jamais vistas nos estádios de futebol, nos últimos anos. Por conta da complexidade do assunto ‘torcida organizada’, deixaremos para discuti-las mais adiante. 3.6 Tipos de Público Fanático em um Grande Evento Mais essa vez, nosso estudo recorrerá à doutrina em uso na Polícia Militar do Estado de São Paulo, cuja missão de policiar eventos remonta à primeira metade do século passado. A seguir, apresentamos uma relação com os tipos mais comuns de público fanático, todos muito comuns em estádios de futebol, adaptada da apostila da 1º Ten. PMESP Letícia, já citada neste trabalho. 3.6.1 O Leal: Devota sua vida ao seu clube/artista; O seu time nunca atua mal, ele apenas “tem algumas dificuldades”; O show do seu artista/banda nunca é ruim, a aparelhagem ou regulagem do som é que não ajuda; São fiéis consumidores; compram qualquer coisa que se identifique com seu artista/clube de preferência; Agem com uma parcialidade total e obsessiva. 3.6.2 O Especialista: Sabe mais do seu time do que o próprio treinador; É altamente crítico e detalhista; Atualiza todos ao seu redor; Quando erra, tem sempre desculpas para suas previsões erradas; Mostra-se sempre erudito após o jogo, quase sempre ‘adequando’ o resultado da partida às suas previsões. 3.6.3 O Brincalhão: É o torcedor que cria um repertório de comentários cáusticos (inoportunos) e divertidos; É um gozador; As observações são quase sempre grosseiras, insultos. 3.6.4 O Furioso: Assim como o brincalhão, ele grita, porém suas observações são grosseiras e baseadas na fúria; Restringe-se sempre a insultos simples e com endereço certo; Fala mal do próprio time, da mãe do juiz ou dos jogadores adversários como seu “inimigo mortal”, estejam eles errados ou não; É comum outros torcedores se reunirem e lhe dizerem para se calar;
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