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CEDERJ – CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Curso: Geografia Disciplina: Mundo Contemporâneo I Conteudistas: Gabriel Siqueira Corrêa e Mariana Martins de Meireles Aula 10 – Descolonização no Continente americano: os casos do México e dos EUA META: Entender aspectos relacionados aos processos de descolonização na América, especificamente o caso da América do Norte. OBJETIVOS: 1 - Compreender os processos de descolonização e independência das colônias. 2 - Analisar aspectos da descolonização estadunidense, observando práticas territoriais/populacionais e a influência destas no continente americano. 3 - Problematizar o processo de descolonização Mexicana, considerando a perda territorial para os Estados Unidos e suas implicações para as populações originárias; PRÉ-REQUISITOS: É importante que você tenha dominado os conteúdos das aulas anteriores que debateram a colonização na América. Assim como os seguintes conceitos: Eurocentrismo, Colonialismo e Colonialidade. Introdução Até aqui, nossas aulas abordaram elementos comuns sobre o processo de colonização do continente americano com ênfase nas especificidades da América Latina. Nesta aula (e na próxima), vamos aprofundar o debate através do estudo de casos que nos ajudam a compreender os projetos de descolonização na América como um todo. Para construir este percurso, optamos por iniciar o debate a partir da realidade dos países da América do Norte. Neste caso, os Estados Unidos da América assumem centralidade, primeiro pela a influência que exerce na América Latina, segundo, pelo fato de se configurar atualmente como a maior potência econômica e mundial, e, por fim, em termos históricos, por ter sido a primeira colônia a declarar independência. Não nos aprofundaremos no caso do Canadá, por se tratar de um país que embora receba muitos imigrantes no período recente, não teve um impacto nos países latino americanos na configuração territorial recente, porém, teceremos alguns comentários na conclusão da aula. Algumas questões colaboram para problematizar a temática desta aula, vamos pensar juntos: você sabe como ocorreu o processo de descolonização dos Estados Unidos da América? Quais elementos motivaram a independência das treze colônias? Quais as consequências desse evento para os demais países da América? Será que primeira colônia a declarar independência, também, colaborou para que outras colônias se tornassem independentes? Quais medidas foram adotadas pelos EUA após seu processo de descolonização? Nesta aula vamos dialogar, também, sobre a descolonização mexicana, um dos países que mais sofreu com a intervenção dos Estados Unidos da América. Para tanto, vamos discutir aspectos relacionados à descolonização levando em consideração a realidade dos zapatistas e as consequências deste evento para população mexicana, destacando o conceito de “colonialismo interno”, cunhado pelo intelectual mexicano Pablo González Casanova, que pode ser facilmente aplicado em outras realidades da América. 1 - Descolonização sem descolonialidade: mudanças conservadoras e manutenção da subalternidade Para iniciar este debate te convidamos a observar o mapa do continente americano, prestando atenção especificamente nos países que compõem a América do Norte, a saber: Estados Unidos, Canadá e México. Figura 01: Mapa do Continente Americano Autor: Keepscases Fonte:https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/69/Organization_of_A merican_States_%28orthographic_projection%29.svg Você já parou pensar como estes países se tornaram independentes após o período de colonização? Será que o processo de descolonização ocorreu no mesmo período, assumindo as mesmas intenções e características nestes países? Vamos tentar responder estas e outras questões ao longo desta aula. Antes de aprofundarmos especificamente a discussão sobre descolonização da América do Norte, vamos retomar questões debatidas nas aulas anteriores. Em uma de nossas aulas vimos que nos séculos XV e XVI, através das “grandes navegações”, um novo continente foi encontrado, nomeado pelos europeus de “América”. Segundo a historiografia, Portugal e Espanha colonizaram a https://commons.wikimedia.org/w/index.php?title=User:Keepscases&action=edit&redlink=1 América do Sul e Central, enquanto a América do Norte foi dominada mais tarde pela Inglaterra, com algumas influências francesas. A colonização tardia da América do Norte decorre das situações (políticas, econômicas e religiosas) conturbadas vividas pela Inglaterra naquele período. Há indícios de que a Inglaterra jamais arquitetou um projeto político de colonização para a América do Norte, e que a colonização foi ocorrendo por motivos diversos, que iam desde grupos religiosos fugindo de perseguições, até empresários e aventureiros buscando a sorte no “novo mundo”. Entretanto, podemos inferir que, todo projeto colonial justificou-se por argumentos econômicos e diplomáticos. Anos depois, a independência destes países, pôs fim ao colonialismo, dando abertura para ensejar caminhos descoloniais. Mas afinal, o que entendemos por independência? No imaginário social a noção de independência tem a ver com um movimento de libertação, de autonomia e insubordinação. Será que de fato isto aconteceu com a América? De antemão, sinalizamos que as experiências da América comprovaram que o processo de independência colonial não esteve associado a um projeto de descolonização. Ou seja, as transformações em termos políticos e territoriais, não impactou a organização social estabelecida anteriormente. Você sabe por que e como isso aconteceu? A princípio, vale dizer que o processo de independência não modificou a estrutura do sistema colonial, por isso dizemos que o fim do colonialismo não significou o fim da colonialidade, ou seja as mudanças foram marcadas pelo conservadorismo de poderes, mantendo-se de certa maneira a subalternidade dos países que, por ora, se tornaram independentes de suas antigas metrópoles. Na verdade, no período republicano, as relações de dominação colonial se fortaleceram com a articulação de pactos entre as elites e as ex colônias, produzindo uma espécie de “colonização interna” (QUIJANO, 2005) ou como discutiremos mais à frente “colonialismo interno” (CASANOVA, 2007). Segundo a Declaração dos líderes espirituais dos povos de Abya Yala (1992), ocorre neste período a intensificação da fragmentação dos territórios com as nações ancestrais o que implicou na divisão da “Abya Yala”. Deste processo de demarcação das fronteiras, nasceram os países e Estados Nações. Início do Box explicativo Estado-nação Aquilo que chamamos de moderno Estado-nação é uma experiência muito específica. Trata-se de uma sociedade nacionalizada e por isso politicamente organizada como um Estado-nação. [...] Um Estado-nação é uma espécie de sociedade individualizada entre as demais. Por isso, entre seus membros pode ser sentida como identidade. Porém, toda sociedade é uma estrutura de poder. O poder aquilo que articula formas de existência social dispersas e diversas numa totalidade única, uma sociedade. Toda estrutura de poder é sempre, parcial ou totalmente, a imposição de alguns, frequentemente certo grupo, sobre os demais. Consequentemente, todo Estado-nação possível é uma estrutura de poder, do mesmo modo que é produto do poder. Em outros termos, do modo como foram configuradas as disputas pelo controle do trabalho, seus recursos e produtos; do sexo, seus recursos e produtos; da autoridade e de sua violência específica; da intersubjetividade e do conhecimento (QUIJANO, 2005, p. 118-119). Fim do Box explicativo Esta realidade imposta e forjada por mecanismos de dominação, ratifica que a colonizaçãose caracterizou como um processo violento e totalizante, material e simbólico, físico e subjetivo. Nesse sentido, o fim do colonialismo, enquanto sistema de poder que formalmente dominava e explorava as colônias, se configurou apenas como a primeira etapa do processo de descolonização. De fato, este passo, embora importante, estava longe de representar o fim dos estigmas produzidos entre os envolvidos na relação colonial, bem como o distanciamento econômico, com tentativas de explicação como a “teoria da dependência”. O caminho descolonial é temporalmente longo e exige investidas de muitos lados. Além da independência política e econômica, uma das principais revoluções deste processo é epistemológica, neste caso, outros sentidos e outras lógicas orientam a superação da subalternidade e dos processos de dominação (PAZ, 1992). Aos poucos vamos compreendendo que a expressão “descolonizar” não se traduz de forma simples, ela implica abertura para outras questões e convoca a ampliação dos saberes que, historicamente, foram inferiorizados, ocultados e hierarquizados pelo projeto colonial e sua macronarrativa. Ainda é preciso entender que as estruturas coloniais pouco se alteraram nos processos de colonização e descolonização, cabendo então a pergunta: o acesso à terra foi democratizado? Essas e outras indagações nos ajudam a perceber que o processo de descolonização possui muitas faces e reclama outras óticas para pensar/ver o mundo e a sua diversidade. Trata-se de uma mudança complexa e estrutural no campo político, ideológico, epistemológico e, obviamente espacial. Por isso, falamos que o processo de descolonização se estabeleceu mantendo estruturas conservadoras de poder e de espacialidades – o que em partes explica a segregação em termos de moradia na América Latina -, portanto sem descolonialidade. Nesta linha de pensamento, lançamos duas questões que colaboram para esta reflexão: i) A independência da América representou a descolonização do território? ii) O que significou o projeto de descolonização para a América e seus povos? Nos próximos tópicos desta aula, vamos seguir nos indagando sobre os processos de independência da América, a partir da experiência da América do Norte. Para este exercício reflexivo observe os atores e as relações hierárquicas estabelecidas. Considere neste percurso os modos de dominação e as estratégias de fragmentação dos territórios, bem como as formas de manutenção de poder que engendram tais projetos de descolonização. Nesta aula, reconhecemos que o recorte territorial apresentado é múltiplo e diversificado. Em razão dessa amplitude, outras questões contemporâneas serão debatidas nos fóruns da disciplina, bem como nos textos complementares indicados. A extensão do conteúdo sobre Estados Unidos e México, considerando seus elementos históricos constitutivos justificam-se pela relevância que possui a historicidade nos processos de produção e organização espacial. Estas considerações colaboram para entendermos que: se não há espaço atemporal, também, não existe uma história a-espacial. Vamos aos casos! 2 - Estados Unidos da América A primeira experiência de independência e descolonização que vamos discutir diz respeito aos Estados Unidos da América. Isso se explica por dois motivos: i) os EUA foi a primeira colônia europeia a se tornar independente no mundo; ii) com a consolidação da sua independência, este país implementou um modelo de neocolonialismo agressivo em todo continente americano. A síntese a seguir nos ajuda introduzir este debate. Vejamos: Fonte: https://studymaps.com.br/independencia-dos-estados-unidos/ Ao longo desta aula, abordaremos elementos sinalizados nesta síntese. Inicialmente vamos falar sobre a organização espacial. Como colônia inglesa, a ocupação dos EUA foi realizada a partir de iniciativas privadas, com uma população diversificada, entre mulheres e homens pobres que viviam da plantação e pequenos comércios, além de religiosos fugindo de perseguições na Inglaterra, principalmente da Igreja Anglicana. Observe que esse movimento, principalmente no final do século XVII e Início do século XVIII, também tem relação com o fechamento de terras comunais em território inglês, o que implicou na expulsão de um grande número de camponeses de sua terra durante o processo de industrialização, gerando mão de obra excedente em áreas centrais de manufaturas O território dos Estados Unidos da América foi dividido em colônias. Você já deve ter ouvindo falar nas treze colônias, certo? Pois bem, esta fragmentação/organização territorial não nasceu de um projeto específico, tal como foi feito em outros espaços da América, por isso, alguns o consideram uma colônia de exploração, conceito questionável, à medida que toda colônia se constituiu, também, pelo povoamento, embora as finalidades tenham sido diversificadas. A dimensão territorial estadunidense proporcionava uma geografia múltipla no que diz respeito às formas de relevo, tipos de solo e de clima, resultando em estratégias diferentes de produção. https://studymaps.com.br/independencia-dos-estados-unidos/ Mapa 02 - “As treze colônias” Fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Treze_Col%C3%B4nias#/media/File:Map_of_territorial_grow %20h_1775.svg A localização privilegiada do sul estadunidense favorecia uma produção agrícola para exportação devido ao clima e ao solo. Essa geografia resultou em uma organização espacial no modelo da plantation - monocultura, escravidão e latifúndio - experiência que foi reproduzida na maior parte da América Latina, demandando um grande número de africanos escravizados, como observamos na aula anterior. Já o norte do país, além de um relevo desfavorável possuía um clima rigoroso, de muitas mudanças, o que não favoreceu a produção agrícola em larga escala, assim como havia sido adotado no Sul. Dessa forma, a organização espacial e do trabalho pautou-se no mercado interno, para circulação de mercadorias e formação de uma elite intelectual e comercial. 2.1 – O processo de independência Pois bem, até aqui abordamos brevemente esses aspectos para entendermos o contexto colonial estadunidense, e como, em linhas gerais, foi organizada a colonização. Mas e a independência? https://pt.wikipedia.org/wiki/Treze_Col%C3%B4nias#/media/File:Map_of_territorial_grow%20h_1775.svg https://pt.wikipedia.org/wiki/Treze_Col%C3%B4nias#/media/File:Map_of_territorial_grow%20h_1775.svg O contexto para se chegar até ela envolve cobranças abusivas de impostos e uma legislação repressora por parte da metrópole inglesa. Desse modo, destaca-se a revolta frente aos impostos cobrados pela coroa inglesa que buscava equilibrar os gastos pelo envolvimento em conflitos, a exemplo da Guerra dos sete anos no século XVIII. Além disso, sua indústria nascente precisava de matéria prima e mercado consumidor. Início do Boxe multimídia Filme: O último dos moicanos O filme usa como contexto histórico a guerra dos sete anos, que envolveu o conflito entre os Ingleses e Franceses pela posse de territórios na América do Norte (o mesmo acontecia na África e na Ásia). Nessa guerra tanto franceses, quanto ingleses usaram guerreiros de diferentes comunidades indígenas, como estratégia para vencer a guerra. Embora o filme possua uma narrativa romântica, é interessante perceber como os indígenas foram usados/explorados por grupos ocidentais, observando o papel que eles tiveram nesse conflito. Fim do boxe multimídia Entre as principais cobranças que geraram insatisfação dos colonos, destacam- se a Lei do açúcar de 1764, que taxava carregamentos de açúcar não ingleses por todo território, estabelecendo uma prática não de monopólio, mas que favorecia o mesmo; a Lei do selo de 1765, que exigia que todos os documentos oficiais tivessem o selo da Inglaterra,medida que feria a autonomia, e além de representar um custo, era também um reforço da soberania inglesa no território, e por fim a lei do chá de 1773, que obrigava que todo chá consumido tivesse origem da Inglaterra. Em todas essas medidas observam-se práticas que reforçam o pacto colonial, com extração de riquezas ou vantagens comerciais das colônias. Tais ações motivaram os movimentos separatistas, através de boicote aos produtos ingleses; reações na imprensa; e desobediência civil, com o não cumprimento das leis. Um caso curioso e marcante, foi a revolta contra o monopólio do chá, em que remessas de chás ingleses foram destruídas e jogadas ao mar. Este evento ficou conhecida como “boston tea party” e resultou em uma ação de fechamento do porto onde a revolta aconteceu. Três anos mais tarde, em 1776, os colonos rompem os laços com a metrópole e proclamam a independência, o que resulta em diversos conflitos com a Inglaterra. Apenas em 1783, com o apoio dos franceses, grandes rivais econômicos da Inglaterra no período, as colônias vencem, tendo sua independência reconhecida pelo Tratado de Paris. Em 1787 os Estados Unidos proclamam sua constituição, apresentando ideias que reforçam um sentimento de liberdade. Mas será que havia liberdade para todos nas colônias? E acima de tudo, como declarar independência e liberdade com a permanência de modelos autoritários e padrões econômicos díspares? Como iniciar um projeto de criação de um símbolo identitário, se a maior parte da população não tinha acesso a bens básicos? 2.2 – Situação dos povos originários nos Estados Unidos da América pós independência É notório que as condições de brancos pobres permaneciam precárias, sem contar com os indígenas alocados em “reservas” e a continuidade da escravidão, o que destoava da noção de descolonização enquanto emancipação social e de liberdade, tão difundidos pelos estadunidenses. Além disso, a disparidade no campo político, econômico, social e geográfico entre o Sul e o Norte, demarcava um processo tenso, que gerou nos anos posteriores, a “guerra da secessão”. A primeira colônia independente [EUA] adotou uma política agressiva de dominação nos seus vizinhos mais próximos. Dois casos são destacados por estarem relacionados às novas colonizações e também ao avanço e expansionismo territorial: Canadá e México. Tal expansão esteve associada ao processo de Marcha para o Oeste, que fomentou uma ampliação territorial. Mapa 3 - Aquisições territoriais dos EUA Fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Evolu%C3%A7%C3%A3o_territorial_dos_Estados_Unidos#/medi a/File:Us_historic_territories.jpg A Guerra de Secessão, mobilizou em 1862 a criação, pelo governo, do Ato de propriedade rural - homestead Act. Nesta ação, concedia-se a posse das terras de até 160 acres (cada acre mede aproximadamente 4 mil metros quadrados) a quem tivesse interessado em produzir e cultivar na terra por no mínimo cinco anos. A possibilidade de ganho de terras atraiu milhares de imigrantes europeus para os Estados Unidos, motivando a ocupação de terras, sem considerar a ocupação indígena presente naquelas regiões. Este foi um processo orientado dentro da lógica do “mito difusionista no vazio”, discutida na aula anterior. A partir desta configuração, a fronteira tornou-se um espaço de possibilidade e não da existência de civilizações dos seus criadores. Essa foi uma das primeiras medidas que consolidaram a ocupação promovida pela Marcha para o Oeste, estimulada ainda pela própria industrialização estadunidense. Ao promover a entrada maciça de imigrantes, garantia-se mercado consumidor para a burguesia industrial nascente, além de possibilitar ganhos de reservas minerais, com a possibilidade de encontrar ouro. https://pt.wikipedia.org/wiki/Evolu%C3%A7%C3%A3o_territorial_dos_Estados_Unidos#/media/File:Us_historic_territories.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Evolu%C3%A7%C3%A3o_territorial_dos_Estados_Unidos#/media/File:Us_historic_territories.jpg Duas das ideologias políticas que justificaram esse processo, já foram debatidas por nós em outra aula, a saber: Doutrina do Destino Manifesto e Doutrina Monroe. Nesta aula, vamos retomar alguns dos elementos constitutivos da Doutrina do Destino Manifesto, visto que, tal doutrina envolveu diretamente a orientação política, além de justificar e legitimar a expansão territorial: Inicialmente, cabe destacar que: i) a Doutrina do Destino Manifesto, foi baseada nos escritos do jornalista John o’Sullivan, este autor defendia que as terras que iam do Atlântico até o Pacifico deveriam ser ocupadas pelos EUA; ii) que os indígenas, tratados como selvagens e não civilizados, não eram capazes de trazer desenvolvimento para essas áreas; iii) que brancos e puritanos - praticamente de um cristianismo mais rígido - eram eleitos por Deus para desenvolver o país. A seguir, observem parte do texto de O’sullivan sobre o Destino Manifesto: Por que, foram outros desejos razoáveis, em favor de agora levantar esta questão da recepção do Texas à União, fora da região inferior das nossas divergências partidárias, até o nível adequado de alta e ampla nacionalidade, seguramente devem ser encontradas, encontradas com abundância, de forma que outras nações afirmaram comprometer-se e interferir entre nós e as partes interessadas, num espírito de interferência hostil contra nós, pelo objeto declarado de impedir nossa política e dificultando nosso poder, limitando nossa grandeza e impedindo a realização do nosso destino manifesto de espalharmo-nos sobre o continente atribuído pela Providência para o livre desenvolvimento dos nossos milhões de habitantes que anos passados anos se multiplicam (O’SULLIVAN, 1845). Este discurso foi influenciado pela leitura calvinista de que “deus escolhe os eleitos”, que no caso seriam os colonos, levando sabedoria e conhecimento, tratados em termos civilizatórios, para os povos selvagens que ocupam as terras. Cabe destacar que, o termo “Destino Manifesto” só ganha destaque a partir do terceiro uso por O’Sullivan, quando grupos políticos se apropriaram do termo para simbolizar o desejo de expansão estadunidense. Isso ocorreu, porque o termo “destino manifesto” era de fácil compreensão e difusão para estímulo da “Marcha para o Oeste”. Nesse processo de muitas particularidades, as terras eram compradas da Inglaterra, França e México, e quando este último não aceitou, a aquisição foi feita a partir da guerra. A expansão foi tratada como algo natural para os povos estadunidenses, pois esse seria o destino dos mesmos. O critério étnico-racial também foi mobilizado, pois os mexicanos, considerados nativos inferiores, contrariavam a vontade de Deus a ocupar aquele espaço, o que justificaria as violências provocadas. A conquista territorial nas décadas seguintes também alcançou colônias espanholas (Cuba, Porto Rico, Filipinas e a ilha de Guam). Nesse sentido, além de uma narrativa divina, o Destino Manifesto se estabeleceu, em termos políticos, como missão que garantiu a expansão territorial até o século XX. Notem que esta doutrina foi orientada por uma leitura nacionalista e de superioridade étnico-racial. Figura 2. Progresso americano de 1872 Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Doutrina_do_destino_manifesto Aqui, retornamos a figura já utilizada nas aulas anteriores que representa a “Doutrina do Destino Manifesto”. A pintura intitulada "Progresso Americano", https://pt.wikipedia.org/wiki/Doutrina_do_destino_manifesto produzida por John Gast em 1872, faz alusão ao desenvolvimento dos Estados Unidos da América. Observe que na figura uma mulher imponente os acompanha durante a marcha para o Oeste, conduzindo diferentes estadunidenses ao progresso. Esta pintura simboliza, de certo modo, a representaçãodessa conquista. Embora seja possível abordar várias consequências deste projeto expansionista, focaremos em uma das consequências que foi comum a realidade latino americana. No caso dos EUA, a expansão resultou na dizimação de vários grupos indígenas, já que estes foram expulsos e/ou assassinados durante a expansão territorial. Até mesmo os indígenas considerados civilizados como os “Cherokees” (maior grupo indígena remanescente nos EUA) e os “Choctaws” que viviam em relativa harmonia no sul dos EUA, foram afetados pelo “indian removal act”, ou seja, ato de remoção indígena. Este tinha como objetivo o deslocamento de grupos indígenas para áreas de reservas. Os grupos que resistiram tiveram suas casas queimadas e foram perseguidos por soldados. Os que cederam ao deslocamento tiveram que enfrentar longas viagens. Uma dessas ficou conhecida como a “trilha das lágrimas”, em que um grupo de 15 mil indígenas, pertencentes aos Choctaws, marcharam durante o inverno para o seu destino. A morte de cerca de 6 mil pessoas durante este trajeto demonstra a violência desta imposição. Figura 03. A trilha das Lágrimas Fonte: Extraído de http://perdidanahistoria.blogspot.com/2011/07/trilha-de-lagrimas.html Figura 04. Pintura Louisiana Indians Walking Along a Bayou de Alfred Boisseau de 1846, que faz referência aos índios removidos do grupo Choctaw Fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Trilha_das_L%C3%A1grimas#/media/File:Louisiana _Indians_Walking_Along_a_Bayou.jpg Início boxe Livro: “Enterrem meu coração na curva do Rio” O livro “Enterrem Meu Coração na Curva do Rio” relata a destruição sistemática dos índios da América do Norte. A obra lança mão de várias fontes como: registros oficiais, autobiografias, depoimentos e descrições de primeira mão. Para compor esta narrativa Dee Brown faz grandes chefes e guerreiros das tribos Dakota, Ute, Soiux, Cheyenne e outras contarem com suas próprias palavras sobre as batalhas contra os brancos, os massacres e rompimentos de acordos. Todo o processo que, na segunda metade do século XIX, terminou por desmoralizá-los, derrotá-los e praticamente extingui-los. Publicado originalmente em 1970, este livro foi traduzido para diversas línguas. Com esta obra, Dee Brown, especialista em história norte-americana, buscou mudar o modo do mundo ver a conquista do Velho Oeste e a história do extermínio dos peles-vermelhas. (Sinopse extraída do livro). Fim do boxe http://perdidanahistoria.blogspot.com/2011/07/trilha-de-lagrimas.html https://pt.wikipedia.org/wiki/Trilha_das_L%C3%A1grimas#/media/File:Louisiana_Indians_Walking_Along_a_Bayou.jpg https://pt.wikipedia.org/wiki/Trilha_das_L%C3%A1grimas#/media/File:Louisiana_Indians_Walking_Along_a_Bayou.jpg Ainda em relação aos grupos indígenas, vale destacar que, a legitimação dessa expansão fez parte também do imaginário dos filmes. Você já deve ter ouvido falar do gênero conhecido no Brasil como faroeste (do inglês far west - oeste distante), cuja a narrativa é composta por cenas de ações e muito “bang bang”. Estes filmes tiveram um papel no início do cinema estadunidense de naturalizar o processo de expansão e assassinato indígena, ao tratá-los como selvagens e incivilizados. O cenário era representado usualmente por um deserto, em que “peles vermelhas” atacavam estadunidenses, sendo defendidos por xerifes armados. 2.3 – Situação da população negra nos Estados Unidos pós independência No que se refere a população negra, o processo de independência também não veio acompanhado por um processo de descolonização, afinal, a continuidade da escravidão foi algo marcante na formação dos Estados Unidos da América. Somente após a Guerra de Secessão os negros escravizados foram declarados livres pela constituição americana, através da 13º emenda, conforme trecho a seguir: “Não haverá, nos Estados Unidos ou em qualquer lugar sujeito a sua jurisdição, nem escravidão, nem trabalhos forçados, salvo como punição de um crime pelo qual o réu tenha sido devidamente condenado”. Início do boxe multimídia A 13º emenda 13th (A 13ª Emenda) é um documentário estadunidense de 2016 dirigido por Ava DuVernay e escrito por DuVernay e Spencer Averick. Centrado no sistema carcerário e étnico no país de origem do filme, o título é uma referência à décima terceira alteração na Constituição dos Estados Unidos, a qual, segundo o filme, foi uma alternativa de manter trabalhos braçais mesmo após a abolição da escravidão, com o processo de encarceramento em massa. O filme foi premiado pelo Bafta de 2017, e indicado ao oscar de melhor documentário. Fonte: Sinopse extraída do https://pt.wikipedia.org/wiki/13th_(filme) Fim do boxe multimídia https://pt.wikipedia.org/wiki/13th_(filme) Todavia, mesmo com o fim da escravidão, aspectos do racismo e dos legados coloniais permaneceram. Assim como ocorreria no Brasil duas décadas depois com a lei Aurea. Nos EUA, a população negra recém-saída da escravidão teve dificuldade no acesso a empregos formais. Neste contexto, dois conjuntos de leis acabaram por criminalizar a população negra. Além de ordenamentos jurídicos que criminalizavam a chamada “vadiagem”, haviam leis segregacionistas, principalmente - mas não exclusivamente - no sul. Estas leis excluíam e/ou separavam negros em espaços públicos e escolares, vigorando entre 1876 a 1965. Durante esse período, vários movimentos de contestação apareceram. Vamos conhecer duas personalidades importantes em diferentes contextos que combateram e desgastaram o sistema excludente. Em ordem cronológica, temos o empresário Marcos Garvey, que embora fosse jamaicano, teve atuação de destaque nos EUA. Ele estimulava o pan-africanismo e construiu diversas estratégias para empregar negros em melhores condições no mercado de trabalho, adotando premissas liberais. Marcos Garvey se destacava pela leitura em escala mundial da situação dos negros e por uma atuação dentro do campo religioso e econômico, estimulando o contexto liberal. Outra personalidade que demonstrou uma postura interessante de revolta, através da insubordinação civil, foi Rosa Parks. Possivelmente você já deve ter escutado falar nesta mulher. Rosa Parks ficou conhecida mundialmente porque em 1955 se recusou a levantar de um ônibus no estado do Alabama (conhecido como estado mais racista dos EUA), para dar lugar a pessoas brancas como a legislação indicava. A sua prisão, por desobediência civil, inflou os movimentos que lutavam por igualdade, e resultou na queda as leis segregacionistas. Início do boxe explicativo Rosa Louise McCauley Rosa Louise McCauley, mais conhecida por Rosa Parks (Tuskegee, 4 de fevereiro de 1913 – Detroit, 24 de outubro de 2005), foi uma costureira negra norte-americana, símbolo do movimento dos direitos civis dos negros nos Estados Unidos. Ficou famosa, em 1º de dezembro de 1955, por ter se recusado frontalmente a ceder o seu lugar no ônibus a um branco, tornando-se o estopim do movimento que foi denominado boicote aos ônibus de Montgomery e posteriormente viria a marcar o início da luta antissegregacionista Extraído de: https://pt.wikipedia.org/wiki/Rosa_Parks Fim do boxe explicativo Os exemplos dos desdobramentos da independência dos Estados Unidos abordados neste tópico, demonstram que as experiências de emancipação das metrópoles europeias, em termos políticos, não configuraram efetiva mudança nas condições de vida da população, principalmente daqueles considerados inferiores - os não brancos. Por essas e outras questões, seguimos nos indagando: a independência dos EUA resultou em descolonização, ou melhor, em descolonialidade? Atividade 1 - Atende ao objetivo 1 e 2 É possível dizer que nos EUA a independência política significou o fim da colonialidade? Explique sua resposta.(Diagramação, deixar 10 linhas) Resposta comentada Para compor esta resposta, o estudante deverá elaborar um pequeno texto, apresentando elementos que justifiquem que independência política dos EUA não representou o fim do colonialidade. Para tanto, deve utilizar como argumento, por exemplo, a manutenção de práticas racistas (no caso dos negros) e violentas (no caso dos indígenas), sinalizando a permanência de posturas hierárquicas e de mecanismos de poder e dominação entre os povos. Ademais é possível apresentar discussões sobre a desigualdade social, e no acesso a condições de trabalhas dignas entre trabalhadores do norte e do sul geográfico. Por fim, ainda é possível discutir a permanência de leis segregacionistas, que distoam da narrativa de liberdade individual estadunidense. Fim da atividade https://pt.wikipedia.org/wiki/Rosa_Parks 3 - México e o colonialismo interno O processo de descolonização do México apresenta elementos diferentes em relação aos Estados Unidos, a começar pelo colonizador. Porém, cabe dizer que este processo tem um aspecto em comum que se repete por toda a América, estamos falando da expressiva presença indígena e de seu projeto de extinção. No caso da América estima-se que o genocídio dos povos indígenas tenha chegado ao número de 70 milhões - o maior massacre da história - só no território que corresponde atualmente o México esse número chega a 25 milhões, mais de um terço do total. Figura 05. Vista da Avenida dos Mortos a partir da pirâmide da Lua. Sítio arqueológico, Teotihuacán-México. Fonte: acervo pessoal dos autores A colonização mexicana foi feita pela coroa espanhola e se caracterizou por ser a mais letal das américas. Ao longo do processo de conquista, várias comunidades indígenas e até impérios, como os Astecas, foram dizimadas em virtude das resistências engendradas por estes grupos que lutavam para continuar em suas terras. Estes povos tinham concentração populacional e experiência em guerras, o que ocasionava um combate mais duradouro e violento com europeus. Quanto ao nome, cabe ressaltar que primeiramente a Espanha o chamou de “Vice Reino da Nova Espanha”, após a sua conquista em 1522. Este nome foi alterado quase três séculos depois, posteriormente a independência do país em 1821. Você sabe o representa a denominação “México”? Pois bem, ela demonstra as marcas da ocupação indígena, uma vez que, o nome tem origem na língua falada pelos astecas e a palavra significaria “centro da lua”. No que tange a independência, destaca-se que este projeto foi organizado pela própria elite, tal qual o processo estadunidense, e pouco alterou as relações internas no país. Os grupos que controlavam os espaços urbanos e agrários continuaram exercendo o poder, sobretudo, do ponto de vista econômico. Por outro lado, para a Espanha esta mudança provocou impactos, tendo em vista que o México era uma das principais colônias em extração de riqueza. Data-se desse período, inclusive, a perda de força espanhola em relação ao restante das colônias na América, o que explica, em partes, a decadência do país frente a outras potencias europeias como Inglaterra e França. Somente depois de uma década, após a independência, aboliu-se a escravidão. No México, o processo de escravidão reuniu indígenas, africanos escravizados e seus descendentes. A historiografia revela que a abolição pouco alterou as relações de expropriação existente no país, ou atenuou o processo de violência contra a população indígena, tão pouco modificou as condições de acesso à terra. Podemos citar como exemplo, as políticas que iniciaram o ciclo de perdas territoriais mexicanas, motivadas pela presença indígena. Com o estímulo para a entrada de imigrantes estadunidenses no Texas, antiga posse da Coroa Espanhola, esperava-se que os nativos fossem expulsos. Por falar em perdas territoriais, cabe dizer que, o México sofreu dois ciclos para os EUA diretamente associadas a marcha para o Oeste estadunidense (ver mapa 3). O primeiro refere-se ao Texas, que em 1836 declarou independência. Nesse caso, a ocupação dos colonos norte-americanos foi iniciada após um acordo firmado entre os EUA e o México. Neste acordo, os mexicanos permitiam a entrada de estadunidenses, buscando o desenvolvimento da região e a limpeza étnica na área, já que muitos indígenas a ocupavam. Porém, os colonos passaram a rejeitar as regras estabelecidas pelo México como: i) imposição religiosa de matriz católica, ii) cobrança de impostos, e iii) fim da escravidão. O apoio e anexação do Texas pelo EUA, desagradou o México, que ainda assistiu em 1845 o pedido de compra de parte de seu território pelos EUA. Em uma ação de retaliaç-ão foi declarado guerra ao EUA, que em pouco mais de dois anos venceu os mexicanos. Com o final da guerra o México perdeu mais territórios, e teve outros comprados posteriormente. O resultado final foi a cessão do território do Novo México, Nevada, Arizona, parte do Colorado e da Califórnia, com a assinatura do tratado de Guadalupe Hidalgo. 3.1 Colonialismo interno O debate sobre desigualdades internas não se restringe somente ao México, mas a toda América. Um importante intelectual mexicano, chamado Pablo Gonzáles Casanova (2007), cunhou o conceito de “colonialismo interno”, buscando compreender as diferentes situações de independência sem igualdade ocorridas no continente americano. Nesse sentido, “o colonialismo interno tem antecedentes na opressão e exploração de alguns povos por outros” (CASANOVA, 2007, p. 03). Essa forma de colonialismo, segundo o autor, inicia-se com a experiência da colonização, em que as populações nativas não são exterminadas, mas passam a fazer parte, primeiro do Estado colonizador, e posteriormente do Estado que se forma após a independência. Mesmo em movimentos de liberação e entrada em outros sistemas econômicos - socialista ou capitalista - estes grupos continuam a ser subalternizados, e no Estado-Nação sofrem condições semelhantes aquelas do Imperialismo internacional. Ou seja, o autor aponta que as estruturas coloniais de dominação se mantém mesmo com a nova organização do Estado. Início do boxe explicativo Pablo Gonzales Casanova Autor, coautor ou coordenador de mais de sessenta livros e de duzentos artigos para revistas ou capítulos de obras coletivas, além de diretor de importantes coleções sobre ciências sociais, Pablo González Casanova é referência obrigatória para a compreensão dos problemas atuais das sociedades latino-americana e mundial, tendo presidido por duas vezes (1968-1972 e 1983-1985) a Associação Latino- americana de Sociologia (ALAS).Em seu país é membro, entre outras associações, do Instituto de Pesquisas Sociais (IIS) da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), da qual chegou a ser reitor (1970-1972). Na UNAM deixou profundas marcas na docência e na pesquisa: reestruturou o modelo das carreiras profissionais em Ciências Sociais, criou o Sistema de Universidade Aberta e o Colégio de Ciências e Humanidades. Paralelamente, foi presidente do Centro Latino-americano de Pesquisas Sociais da Unesco, presidente do Comitê Diretivo da Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (Flacso) e coordenador de projeto na Universidade das Nações Unidas. Deu aulas nas universidades de Oxford, Cambridge e Complutense de Madri e na Escola Nacional de Ciências Políticas de Paris. Entre seus reconhecimentos se contam, entre outros, doze títulos de doutor honoris causa e o de professor e pesquisador emérito da UNAM em 1984, ano em que recebeu o Prêmio Nacional de Ciências e Artes em História, Ciências Sociais e Filosofia. Em 1989, ganhou o Prêmio Universidade Nacional na categoria Pesquisa em Ciências Sociais. Em 2003, obteve o Prêmio Internacional José Martí, outorgado pela Unesco, e, em 2004, a OrdemJosé Martí, concedida pelo governo de Cuba. É membro regular, entre outras, da Academia Mexicana de Pesquisa Científica, da The New York Academy of Sciences e da American Association for the Advancement of Sciences, de Washington, D.C. Fonte: http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/g/gonzalez-casanova-pablo Fim do boxe explicativo Para entender essas estruturas de dominação e subalternidade, mesmo após os processos de independências dos países, o referido autor identifica sete elementos do “colonialismo interno” comuns a esses grupos: 1) habitam em um território sem governo próprio; 2) encontram- se em situação de desigualdade frente às elites das etnias http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/a/alas http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/u/unam http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/f/flacso http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/c/cuba http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/g/gonzalez-casanova-pablo dominantes e das classes que as integram; 3) sua administração e responsabilidade jurídico-política concernem às etnias dominantes, às burguesias e oligarquias do governo central ou aos aliados e subordinados do mesmo; 4) seus habitantes não participam dos mais altos cargos políticos e militares do governo central, salvo em condição de ―assimilados; 5) os direitos de seus habitantes, sua situação econômica, política social e cultural são regulados e impostos pelo governo central; 6) em geral os colonizados no interior de um Estado-nação pertencem a uma ―raça distinta da que domina o governo nacional e que é considerada ―inferior, ou ao cabo convertida em um símbolo ―libertador que forma parte da demagogia estatal; 7) a maioria dos colonizados pertença uma cultura distinta e não fala a língua ―nacional (CASANOVA, 2007, p. 03). Observando essas características você consegue traçar paralelos com outras situações no continente americano e africano? Fazemos essa pergunta, pois perceberemos que estes elementos vão aparecer também na próxima aula. De certo modo, Casanova (2007) identifica também a leitura proferida por liberais e por grupos que participaram das revoluções emancipatórias de diferentes Estados Nações. Nessas leituras estes grupos também apontam problemas sociais, mas indicam que os motivos e as soluções são diferentes dos discutidos a partir do conceito de “colonialismo interno”. Vejamos três dessas narrativas. A primeira destaca que os aspectos da desigualdade são de origem cultural. Afinal, aquelas eram sociedades consideradas ‘tradicionais’, que iriam desaparecer com os processos de modernização. Assim, as suas culturas, as posicionariam em condições inferiores aos que comandaram o processo de emancipação. A segunda narrativa, difundia a ideia de este seria um problema de “integração nacional”, resolvido com a construção de um Estado-homogêneo, onde todos falassem a mesma língua e tivessem a mesma cultura. Quanto a esse argumento, cabe perguntarmos que língua e que cultura seriam essas? Este estado homogêneo não seria um Estado assimilador e eurocêntrico? Segundo o autor, ambas as posições sustentaram que, mesmo que existisse o colonialismo interno, ele acabaria mediante ao progresso e desenvolvimento. Se as desigualdades persistem, seria porque esses grupos permaneciam primitivos e atrasados. Com essa ideia, mobilizava-se a noção de “darwinismo social”, já discutida por nós na terceira aula. A terceira narrativa era vinculada aos Teóricos do Estado-Nação e do direito individual, que rechaçavam concepções do colonialismo interno. Eles afirmavam que seria apenas necessário que os cidadãos fossem iguais perante a lei, independentemente de serem maiorias ou minorias, e o que deveria sobressair seria o direito individual, e não os supostos direitos de povos e etnias de origem colonial. Esse discurso afirmava a necessidade de um Estado unido para fazer frente a outras potências. Para isso, seria necessário acabar com as diferenças étnicas e construir um Estado de cultura e nação única e sólida. 3.2 - População indígena e constituição zapatista. Neste subtópico vamos discutir aspectos relacionados a população indígena e a constituição da luta engendrada pelos Zapatistas, que a todo tempo reclamavam por descolonização. Liderado por indígenas o movimento revolucionário de esquerda denominado Zapatismo foi inspirado Emiliani Zapata, guerrilheiro indígena que lutou contra a ditadura de Porfírio Diaz na Revolução mexicana de 1910. Este movimento de luta por território era formado por camponeses indígenas pertencentes a distintos grupos dos maias e ocorreu no Estado dos Chiapas, um dos mais pobres do México. Figura 06: placa em território zapatista Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_zapatista#/media/File:Mexico.Chis.EZLN.01.jpg Início do Box Multimídia Um lugar chamado Chiapas Em 1º de janeiro de 1994, o Exército Zapatista de Libertação Nacional, composto de índios Maias pobres do estado de Chiapas, tomou mais de cinco cidades e 500 fazendas no sul do México. O Governo enviou suas tropas, e pelo menos 145 pessoas morreram na batalha que se seguiu. Lutando por indígenas mexicanos para recuperar o controle sobre suas vidas e sua terra, o Exército Zapatista, começou a enviar sua mensagem ao mundo através da Internet. O resultado foi o que o The New York Times chamou de "a primeira revolução do mundo pós- moderno". A cineasta Nettie Wild viajou para os "canyons" da selva do sul do México para filmar a vida indescritível e frágil da insurreição. Sua câmera de forma eficaz e comovente capta as dimensões humanas por trás desta guerra de símbolos. Fonte: https://filmow.com/um-lugar- chamado-chiapas-t48222/ficha-tecnica Fim do Box Multimídia O movimento colaborou para a constituição do Exército Zapatista de Libertação Nacional, destacando-se, principalmente em 1994, após o protesto que reivindicava a entrada do México no Tratado de Livro Comércio da América do Norte, o Nafta. Além disso, outro aspecto justificava a insurreição do grupo, desta vez, tratava-se do artigo 27 da constituição de 1992. Tal artigo tinha como princípio privatizar as terras de propriedades coletivas para favorecer o funcionamento do Nafta, o que originou mobilizações por parte do Exército Zapatista de Libertação Nacional. Início do Box Explicativo Contexto de implementação do Nafta e irrupção do Zapatismo O contexto de implementação do Nafta, assim como da irrupção zapatista, foi o da desaceleração da economia nacional na primeira metade dos anos 1990. A crise alcançou seu nível mais profundo no final de 1994 e no curso de 1995, quando ocorreu um crescimento negativo próximo a 7%. A recuperação do Produto Interno Bruto do México em 1996 (4,5%) obedeceu a três causas: ao regresso dos capitais externos https://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_zapatista#/media/File:Mexico.Chis.EZLN.01.jpg https://filmow.com/um-lugar-chamado-chiapas-t48222/ficha-tecnica https://filmow.com/um-lugar-chamado-chiapas-t48222/ficha-tecnica http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/e/economia depois da crise financeira do final de 1994, ao grande dinamismo das exportações e à moderada reanimação da demanda interna. Apesar da recuperação, o produto por habitante contraiu-se em 1% em relação a 1980, golpeando com força as classes trabalhadoras, os camponeses, os indígenas, ou seja, a maioria da população. A deterioração social agravou-se com a aplicação das políticas neoliberais de ajuste estrutural e de austeridade impulsionadas pelos governos neoliberais subsequentes de Ernesto Zedillo (1994-2000) e de Vicente Fox (2000-2006). Fonte: http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/z/zapatismo Fim do Box Explicativo O movimento ficou conhecido mundialmente por sua radicalidade e pelo não respeito à propriedade privada, retomando as terras comunais, fragmentadas na ditadura do início do século XX no México.Destacou-se por representar grupos que antes eram marginalizados com protagonistas do processo histórico. É bom lembrar que, cada grupo social possui suas demandas e lutas, acirrando um campo de disputas. Tais fatores devem ser considerados quando analisamos os distintos projetos de descolonização no mundo. Os zapatistas buscaram por fim ao “racismo” existente entre as relações com o Estado e a sociedade, questionando as precárias condições de vida das comunidades indígenas no país. Eles escancaram a farsa de um projeto hegemônico neoliberal que tinha como pretexto modernizar a nação. A revolução armada do EZLN colocou no centro do debate a luta pelos direitos dos povos indígenas no México. Início de Box Explicativo Emiliani Zapata Emiliano Zapata (1879-1919), nasceu na pequena vila de San Miguel Anenecuilco, no sul do México. Foi uma das figuras mais marcantes e centrais do processo revolucionário pelo qual passou o México em 1910. Zapata liderou a Revolução Mexicana, a partir do sul do México, comandando o Exército Libertador do Sul contra os latifundiários que monopolizavam as terras e os recursos hídricos para produzir cana-de-açúcar. Levou a cabo a reforma agrária, devolvendo aos camponeses suas terras, num movimento que é conhecido como “Zapatismo”. Fonte: https://www.todamateria.com.br/emiliano-zapata/. http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/z/zapatismo https://www.todamateria.com.br/emiliano-zapata/ Fim do Box Explicativo Início de Box Explicativo David Harvey reconhece a influência dos zapatistas Pesquisador de revoltas recentes ao redor do mundo, o geógrafo britânico David Harvey reconhece a influência dos zapatistas nos novos levantes que têm surgido. Mas ele pondera que algumas das suas características são ignoradas pela esquerda em diversos países. O geógrafo concedeu uma entrevista à reportagem de Carta Capital, na qual fala sobre o legado do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), que há vinte anos tomou o controle de parte da pobre província mexicana de Chiapas. Harvey destaca as novidades trazidas pelo levante, como a ênfase no direito das mulheres. Ele, porém, se diz “cansado” das pessoas acharem que a revolução “sairá de Chiapas”. Para o geógrafo, a esquerda deve achar uma forma própria de se organizar na cidade. Entrevista completa, acesse: https://outraspalavras.net/outrasmidias/david- harvey-ser-zapatista-nao-e-endeusar-marcos/ Fim do Box Explicativo Atividade 2 - Atende ao objetivo 3 Apresente uma crítica sobre o processo de descolonização mexicana, considerando neste relato as perdas territoriais e suas implicações para as populações originárias. (Diagramação, deixar 10 linhas) Resposta comentada Neste relato deve-se priorizar o debate sobre os processos de desigualdades e os aspectos de poder e dominação decorrentes do projeto de independência mexicana. Alguns pontos de crítica devem ser abordados pelos estudantes, tal como: as perdas territoriais para os Estados Unidos da América; o genocídio indígena em todo país; a escravidão dos negros, além de outros elementos (políticos, sociais e espaciais) que demonstram a conservação de estruturas de poder colonial, bem como a manutenção da subalternidade e da insubordinação dos povos. Recomenda-se que esta crítica seja acompanhada pelo debate sobre https://outraspalavras.net/outrasmidias/david-harvey-ser-zapatista-nao-e-endeusar-marcos/ https://outraspalavras.net/outrasmidias/david-harvey-ser-zapatista-nao-e-endeusar-marcos/ “colonialismo interno”, bem como pelos movimentos revolucionários que emergiram deste cenário, neste caso os Zapatistas. Em notas conclusivas, pode- se relacionar os conceitos de independência, descolonização e colonialidade considerando o caso mexicano. 4 – Conclusão Nos dois casos de independência apresentados nesta aula, percebemos que as práticas adotadas pelos países não os levaram a uma completa descolonização, pois mantiveram laços autoritários e padrões de desigualdade, principalmente contra grupos indígenas e negros. Essas consequências são sentidas e vistas até hoje, através dos processos de desigualdade que nos fazem entender as práticas de colonialismo interno, aludidos por Casanova (2007). Porém, há de se considerar neste contexto que os EUA conseguiram estabelecer um padrão de poder econômico, militar e epistêmico, que o colocou em condições semelhantes aos países europeus, com um alcance considerável da sua influência. Isso foi resultado da diferença adotada entre México e o EUA. Enquanto o México sofreu com a perda de territórios, inclusive para os Estados Unidos da América, este outro, adotou uma política expansionista, a partir da Doutrina do Destino Manifesto, adquirindo assim, territórios e abrangendo sua área de influência, embora mantivesse, a partir de leis segregacionistas, o seu próprio “colonialismo interno”. A leitura da “América para os americanos”, configurou-se em “América Latina para os estadunidenses”. Embora não tenhamos nos aprofundado aqui na situação do Canadá, vale dizer que a sua condição não foge à regra dos outros dois países debatidos. Habitado originalmente por indígenas, este território sofreu com as mortes durante o processo de colonização francesa e inglesa. Atualmente os descendentes indígenas correspondem a 3.5% da população. Cabe destacar que a França perdeu força no Canadá após a guerra dos sete anos, quando cedeu o território aos ingleses. Registra-se a manutenção da presença de ingleses e franceses (que com base no último censo originam 41% da população, a frente dos escoceses e irlandeses). A união (ainda subordinada a Inglaterra), só veio a acontecer no século XIX, após a tentativa de invasão por parte dos EUA, dentro da doutrina expansionista discutida durante a aula. Por fim, a completa autonomia do parlamento britânico aconteceu em 1982, com o “ato canadense”. Atividade Final Aponte semelhanças e diferenças entre os processos de independência dos EUA e México, explicando-as. Resposta comentada Nesta pergunta o estudante deve atentar para os caminhos adotados por cada um dos países. Embora práticas como reforma agrária (ainda que conservadora) tenha ajudado a construir um cinturão de produção em ambos os países, as estratégias de expansão foram distintas. O EUA adotou uma estratégia de expansão territorial, buscando: a) aumentar o seu mercado consumidor; b) garantir matérias primas; c) atrair europeus para o seu território; d) esvaziar a presença indígena. Junto a essa estratégia observou-se também a manutenção de laços coloniais na divisão entre negros e brancos, pois, mesmo após o fim da escravidão, e até mesmo as faltas premissas científicas que classificavam negros como inferiores a brancos, existiram leis segregacionistas que criavam privilégios a grupos brancos. Quanto a própria reforma agrária identificada aqui, cabe dizer que os Estados Unidos criaram grande cinturões de produção (os belts), que impulsionaram seu setor agrícola, enquanto o México, mesmo com as reformas, ainda mantinha laços do latifúndio de baixa produtividade. Quanto aos caminhos políticos, no México, embora a limpeza étnica fosse um dos caminhos adotados – tendo em vista o estímulo a ocupação do Texas, por exemplo - houveram disputas nacionalistas e muitos levantes indígenas, que mesmo após as milhares de mortes, eram um número considerável. Ademais, ao contrário do seu vizinho, o México não via a necessidade de adotar políticas externas de influência, e, ainda vivenciou um contexto de instabilidade política até meados do século XX. Resumo Na aula de hoje tivemos como objetivo abordar os aspectos vinculados a descolonização dos países da América do Norte, entendendo a importância de ambos para os regimes de poder estabelecidos na América Latina. Inicialmente foi preciso abordar a diferença entre independência e descolonização, traçandoainda, um paralelo com o debate sobre colonialidade. Na segunda parte da aula, discutimos, de forma resumida, alguns dos processos que envolveram a organização espacial dos Estados Unidos da América, bem como a independência. Nessa direção, discutimos as políticas expansionistas e as consequências para as populações indígenas e negras que ocupavam o território. Por fim, apresentamos o contexto mexicano, destacando o debate sobre colonialismo interno, e o papel dos zapatistas, como um dos processos de tencionamento da colonialidade. Bibliografia GONZÁLEZ CASANOVA, Pablo. Colonialismo interno (uma redefinição). In: BORON, Atilio; AMADEO, Javier; GONZALEZ, Sabrina (Org.). A Teoria Marxista Hoje: problemas e perspectivas. São Paulo: CLACSO, 2007. MARQUES, A.; BERUTTI, F.; FARIA, R. (Org.). Historia moderna através de textos. 11. ed. São Paulo: Contexto, 2005. QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, Edgardo. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais perspectivas latino-americanas. Buenos Aires-Clascso, 2005. PAZ, O. O labirinto da solidão. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. O’SULLIVAN, John. "Annexation" United States Magazine and Democratic Review 17, no.1 July-August 1845. Acesso: http://web.grinnell.edu/courses/HIS/f01/HIS202- 01/Documents/OSullivan.html Site visitado e indicado para consulta: Enciclopédia Latino Americana - http://latinoamericana.wiki.br/@@verbetes http://web.grinnell.edu/courses/HIS/f01/HIS202-%2001/Documents/OSullivan.html http://latinoamericana.wiki.br/@@verbetes
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