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Tetralogia de Fallot O defeito do septo ventricular na tetralogia de Fallot é frequentemente descrito como um tipo de desalinhamento, uma vez que o septo conal é deslocado anteriormente. Esse septo deslocado se projeta para a via de saída pulmonar, muitas vezes resultando em obstrução e hipoplasia das estruturas a jusante, incluindo a valva pulmonar, artéria pulmonar principal e ramos da artéria pulmonar. Defeito do septo ventricular normalmente é grande; portanto, as pressões sistólicas nos ventrículos direito e esquerdo (e na aorta) são iguais. A fisiopatologia depende do grau de obstrução do fluxo de saída do ventrículo direito. Obstrução leve pode produzir derivação da esquerda para a direita líquida através do DSV; uma obstrução grave ocasiona derivação da direita para a esquerda, acarretando saturação arterial sistêmica baixa (cianose), que não responde à suplementação com oxigênio. Crises hipercianóticas Em algumas crianças com tetralogia de Fallot não reparada, geralmente aquelas com alguns meses até 2 anos de idade, podem ocorrer episódios súbitos de cianose e hipóxia grave (crise hipercianótica), que podem ser letais. Uma crise pode ser desencadeada por qualquer evento que diminua lentamente a saturação de oxigênio (p. ex., choro, evacuação) ou que subitamente reduza a resistência vascular sistêmica (p. ex., brincadeiras, esticar as pernas ao despertar) ou por crise súbita de taquicardia ou hipovolemia. O mecanismo de uma crise hipercianótica permanece incerto, mas vários fatores são provavelmente importantes para provocar elevação da derivação da direita para a esquerda e queda da saturação arterial. Os fatores incluem aumento da obstrução do fluxo de saída do ventrículo direito, aumento da resistência vascular pulmonar e/ou diminuição da resistência sistêmica — um círculo vicioso causado pela queda inicial na PO2 arterial, que estimula os centros respiratórios e provoca hiperpneia e eleva o tônus adrenérgico. O aumento das catecolaminas circulantes, então, estimula a contratilidade elevada, que aumenta a obstrução do fluxo de saída. Sinais e sintomas: Neonatos com obstrução (ou atresia) grave do fluxo de saída ventricular direito têm cianose e dispnéia graves durante a amamentação, o que resulta em baixo ganho de peso. Neonatos com obstrução leve podem não apresentar cianose em repouso. Crises hipercianóticas podem ser precipitadas por atividade e são caracterizadas por hiperpnéia paroxística (respirações rápidas e profundas), irritabilidade e choro prolongado, aumento da cianose e diminuição da intensidade ou o desaparecimento do sopro cardíaco. As crises ocorrem com maior frequência em lactentes, com pico de incidência entre 2 e 4 meses de idade. Crise grave pode ocasionar prostração, convulsão e, ocasionalmente, morte. Durante as brincadeiras, algumas crianças pequenas podem assumir posição de cócoras, a qual faz diminuir a resistência vascular sistêmica e a pressão aórtica, que elevam a derivação ventricular da direita para a esquerda e, portanto, incrementa a saturação arterial de oxigênio. A ausculta detecta sopro rude, mesossistólico grau 3 a 5/6, audível na borda esternal superior esquerda (ver tabela Intensidade do sopro cardíaco). O sopro na tetralogia é decorrente de estenose pulmonar; em geral, o defeito do septo ventricular é silencioso porque é grande e não tem gradiente de pressão. O B2 é normalmente único porque o componente pulmonar está acentuadamente reduzido. Pode haver impulso ventricular direito proeminente e frêmito sistólico. Diagnóstico: O diagnóstico da tetralogia de Fallot é sugerido por anamnese e exame físico, complementado por radiografía de tórax e ECG e corroborado por ecocardiograma 2D com Doppler colorido. A radiografia de tórax mostra coração em forma de bota, com o segmento principal da artéria pulmonar côncava e acentuada diminuição da trama vascular pulmonar. Há arco aórtico à direita em 25% dos casos. O ECG evidencia hipertrofia ventricular direita e também pode exibir hipertrofia atrial direita. O cateterismo cardíaco é raramente necessário, a menos que haja suspeita de anomalia coronariana que possa afetar a abordagem cirúrgica (p. ex., anterior descendente surgindo da artéria coronária direita), que não pode ser esclarecida com o ecocardiograma. Tratamento definitivo A correção completa da tetralogia de Fallot consiste no fechamento com retalho do defeito do septo ventricular, ampliação da via de saída do ventrículo direito com ressecção muscular, valvoplastia pulmonar e, quando justificado, aumento do retalho da artéria pulmonar principal. Se houver hipoplasia significativa do ânulo da valva pulmonar, coloca-se um retalho transanular. A cirurgia é quase sempre realizada eletivamente aos 2 a 6 meses de idade, mas, pode ser realizada a qualquer momento se houver os sintomas ou se a obstrução da via de saída do ventrículo direito for grave. Em alguns neonatos com baixo peso ao nascimento ou anatomia complexa, um paliativo inicial pode ser preferido para a reparação completa; o procedimento usual é uma derivação Blalock-Taussig-Thomas modificada, na qual a artéria subclávia é conectada à artéria pulmonar ipsilateral com enxerto sintético. Mais recentemente, a intervenção transcateter para implantar stent na via de saída do ventrículo direito tem sido utilizada como um procedimento paliativo alternativo com bons resultados. A taxa de mortalidade perioperatória para correção completa é < 5% para a tetralogia de Fallot não complicada. Para pacientes não tratados, a sobrevida é de 55% em 5 anos e 30% em 10 anos.